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ANEXO I
RESENHA
FERREIRO, E; TEBEROKY, A. Psicogênese da língua escrita. São Paulo: Artmed, 1999.
Cíntia de Souza Adelino - UEM1
Simoni de Souza Adelino Jorge - UEM2
O livro Psicogênese da Língua Escrita trata de uma pesquisa desenvolvida pelas
autoras Emilia Beatriz María Ferreiro Schavi e Ana Teberosky. Ambas adotam a teoria
piagetiana, e a partir de 1974, na Universidade de Buenos Aires, desenvolveram uma série de
atividades com crianças que deu origem a obra em questão, que foi publicada em 1984,
originalmente em espanhol, com o título Los sistemas em el desarrollo del niño.
A presente resenha foi elaborada a partir da edição comemorativa dos vinte anos de
publicação, no qual se tornou um grande clássico da psicologia e da pedagogia. A obra
apresenta os processos de aprendizagem das crianças, chegando a conclusões que puseram em
questão os métodos tradicionais de ensino da leitura e da escrita. De acordo com as autoras,
1 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico: cintia-
adelino@hotmail.com. 2 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
simoni.souza_65@hotmail.com.
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[...] objetivo deste livro é mostrar que existe uma nova maneira de considerar
esse problema. Pretendemos demostrar que a aprendizagem da leitura,
entendida como o questionamento a respeito da natureza, da função e do valor
do objeto cultural que é a escrita, inicia-se muito antes do que a escola
imagina, transcorrendo por insuspeitados caminhos. Pretende-se ainda
demonstrar que além dos métodos, dos manuais, dos recursos didáticos, existe
um sujeito buscando a aquisição de conhecimento; sujeito esse que se propõe
problemas e trata de soluciona-los seguindo sua própria metodologia.
Essa é uma obra da psicologia e contribui muito para pesquisadores que possuem
objetivos semelhantes ao das autoras, ou seja, mostrar a interação do sujeito com a escrita. A
partir de seus estudos as autoras buscaram responder alguns questionamentos a cerca da
aquisição da técnica de leitura e escrita, já que mesmo que inconsciente o homem faz uso do
alfabeto para se comunicar através da fala. Porém, confronta as diferentes situações sociais entre
crianças de Classe Baixa (CB) e crianças de Classe Média (CM) e parte desse pressuposto para
analisar o fracasso escolar nas series iniciais e a alta taxa de evasão escolar.
As pesquisadoras destacam logo no início do livro que a atividade de ensinar a ler e a
escrever continuava sendo, assim como ainda hoje, uma das tarefas mais especificamente
escolares. Elas chamam a atenção para o fato de que, à época, um número muito significativo de
crianças fracassava nos primeiros anos da alfabetização. Mobilizadas por essa situação, as
pesquisadoras escreveram o livro, com o objetivo de mostrar que existia uma nova maneira de
considerar tal fato. Tinham a intenção de explicar que a aprendizagem da leitura, compreendida
como o questionamento a respeito da natureza, função e valor desse objeto cultural que é a
escrita, começa antes do que a escola concebia, ocorrendo por insuspeitados caminhos.
A pesquisa chama a atenção para a existência de um sujeito-criança que busca a
aquisição de conhecimento (língua escrita), que se propõe problemas e trata de os solucionar,
seguindo sua própria metodologia. A partir dos resultados da investigação, foi possível às
pesquisadoras constatar que o processo de aprendizagem das crianças pode ir por vias
insuspeitadas para o docente. A pesquisa foi realizada com crianças da cidade de Buenos Aires
com idades entre 4, 5 e 6 anos na primeira parte da pesquisa foram entrevistadas 108 crianças já
na segunda parte entrevistaram mais de 800 crianças. Dessa forma propuseram também a
mostrar que a criança por mais simples que seja ao chegar às instituições de ensino já carregam
alguns conhecimentos de leitura e escrita no qual inda não possuem consciência do uso cultural
e sua real significação social, pois já são capazes de reconhecer alguns símbolos, cartazes e ate
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mesmo rótulos e embalagens. Outro fator muito importante que as autoras levam em
consideração são os diferentes momentos na aprendizagem da lecto-escrita, a mesma coloca se
em níveis diferentes. Diante desse fato as autoras ainda apontam os problemas de metodologia
de ensino e as disputas entre métodos de ensino existentes.
Ferreiro e Teberosky afirmam que os métodos de ensino de leitura e escrita confrontam
se em disputas constantemente na briga para provar qual o melhor método alfabetizador o
sintético, analítico ou o fonético, porem dessa forma o que se constatou foi que sempre acabava
por privilegiar uma habilidade em particular e deixando de lado as outras funções, ignorando a
competência linguística e as capacidades cognitivas das crianças na qual fazem relações com a
teoria de inteligência de Piaget. Assim seguiram a pesquisa pautada no método clinico
desenvolvido por Piaget no qual apresentavam figuras as crianças e pediam para identificar e
posteriormente pediam que escrevessem, as crianças passavam por processos de percepção,
identificação, classificação e interpretação.
No decorrer da pesquisa observou crianças em vários níveis o que possibilitou a
percepção da dificuldade da criança nesse momento de aquisição de leitura e escrita. O processo
de diferenciação entre desenhos e letras, posteriormente a diferenciação entre as próprias letras,
Ferreiro e Teberosky denomina esse momento de pré-silábico, passando para o silábico
alfabético ate chegar de fato ao alfabético.
Este livro foi dividido em oito capítulos para que de fato as autoras pudessem relatar a
experiência vivenciada por elas e pelas crianças. No primeiro capítulo elas relatam um
panorama geral da educação na América latina, apresentando os métodos tradicionais do ensino
de leitura e escrita, e ainda frisa a importância da teoria de Piaget nessa busca de compreensão
desses processos levando em conta a psicolinguística contemporânea.
No segundo capítulo demonstram os aspectos formais do grafismo, observando as
características formais que deve possuir um texto para permitir a leitura, respeitando os
principais mecanismos sendo eles: letras, números e os sinais de pontuação. Devendo sempre se
organizar em variação e quantidade de caracteres, estabelecer relação entre números letras e
reconhecer uma a uma de maneira individual, criando e estabelecendo distinção entre letras e
sinais de pontuação adotando critérios de orientação espacial da leitura.
O terceiro capítulo aborda sobre a leitura como imagem, ou seja, apresentando a escrita
como objeto substituto, mostrando que no inicio as crianças não conseguem definir de fato as
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diferenças entre desenho e escrita, acreditando na possibilidade da escrita como rótulo do
desenho nos quais as propriedades dos textos fornecem indicadores que possibilitam a sustentar
a antecipação feita a partir da imagem, propiciando mais tarde a leitura de orações através da
diferenciação entre desenho e escrita e propriedades gráficas. Dentro desse capítulo ainda
buscam responder a busca de correspondência termo a termo entre os fragmentos gráficos e as
suas segmentações sonoras, ou seja, segmentos silábicos e gráficos, assim também estabelece a
busca pela progressão evolutiva das crianças e analisam a leitura de palavras e orações.
O quarto capítulo contempla a leitura sem imagem e a interpretação dos fragmentos dos
textos priorizando as separações entre as palavras da nossa escrita e ainda coloca o ponto de
vista da criança e suas superações a partir da leitura de uma oração e a distribuição e elaboração
de respostas. Já no quinto capítulo as autoras apresentam os atos de leitura à interpretação da
leitura silenciosa, em voz alta e a contextualização entre o começo de diferenciação entre a
língua oral e a língua escrita.
O sexto capítulo fala da evolução da escrita, e a distribuição dos níveis de escrita por
idade e procedência social e as transformações de nomes e faz um comparativo de como as
crianças escrevem sem a ajuda escolar, os próprios nomes e como essas mesas crianças
escrevem os nomes com ajuda escolar. O sétimo capítulo contempla e demostra a ideologia e o
dialeto que estão embutidos dentro da leitura.
O oitavo capítulo contextualiza toda trajetória percorrida durante a pesquisa e faz
conclusões a cerca dos problemas que as crianças colocam; fala da necessidade de entender que
todo trajeto de leitura como decifrado, copia e coloca ainda progressos da lectoescrita com
avanços no decifrado e na exatidão da copia gráfica. Mostra também as consequências
pedagógicas e as soluções históricas dadas ao problema da escrita e suas implicações.
Considerando o percurso realizado pelas autoras, o tempo em que se dedicaram a obra,
vimos a contribuição importante para o professor e para o psicólogo no que diz respeito
formação da linguagem de uma criança dentro de uma abordagem piagetiana. Contribui
trazendo novas questões evolutivas aos contextos das diferentes histórias porém a criança que
esta lá é a mesma criança ao qual Piaget sempre se reportou, as autoras replicam assim a ideia
de Piaget.
ANEXO II
RESENHA
SMOLKA, A. L. B. A criança na fase inicial da escrita: a alfabetização como processo
discursivo. 11 ed. São Paulo: Cortez, 2003.
Glaysi Kelly dos Santos - UEM1
Este trabalho visa apresentar a obra da autora onde ela realizou o trabalho, na rede oficial
de ensino de Campinas, contou nos anos de 1983, 1984 e 1985, com o auxílio financiado do
INEP, SESU e FLE, como “Projeto de Incentivo à Leitura: Subsídios Metodológicos para
professores da Primeira Série do Primeiro Grau”.
Este livro foi escrito em sua primeira edição no ano 1988. A obra está estruturada em
cinco partes com subtítulos, a qual começa partindo, de alguns pontos de partida para discursão
do assunto, fazendo um percurso no trabalho, das relações entre salas de aula e ensino,
discutindo também alguns pontos de vista da emergência do discurso na escritura inicial e as
interlocuções.
A primeira parte do livro segundo Smolka, o processo de alfabetização tem se mostrado
uma das questões sociais mais fundamentais por suas implicações políticos e econômicos
evidenciados instrumento e vínculo com as políticas educacionais com uma ideologia que
1 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico: glay.si@hotmai.com
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democratizou a alfabetização em nossa sociedade que se criou uma ilusão de vagas para todos,
ou seja, alfabetização pela escolarização no processo de produção em massa as práticas
pedagógicas. Ou seja, se criou uma ilusão que há vagas para todos no sistema de ensino que
todos são ensinados e alfabetizados.
Neste cenário Smolka, com sua pesquisa sobre linguagem escrita e alfabetização e
leitura como processo discursivo trata da seguinte questão da alfabetização de dar condições de
se comunicar, interagir saber se colocar tem em situação e condições de falante e ouvinte,
souber ler e interpretar um texto e escrito, visto que estas condições só se tomam possível, por
meio da alfabetização e o ensino da linguagem escrita.
Smolka não aponta um caminho como modelo pronto de se alfabetizar as crianças ao
contrário nos aponta caminhos para chegar até um caminho, mas eficaz. Desta feita o processo
discursivo que e saber fazer uso da comunicação é um processo de interlocução que dar
condições para o sujeito se interagir por meio da fala e da escrita.
As dimensões do discurso vão além da própria comunicação e da fala partem de outros
discursos como: o discurso interior que é a alfabetização antes da escrita, ou seja, são
concepções antônimas adquiridas pela criança pelo meio sócia- cultura construída fora do
espaço escolar, que não deixam de ser conhecimento, este discurso interior parte da própria
criança, e já o discurso escrito que e a comunicação já representada pela escrita, e onde a
criança já produziu seu discurso interior sistematizou a fala em sua mente e com o discurso
escrito ela representa o que até então era só pra si em sua mente.
Na segunda parte a autora tratou da questão das salas de aula e ralações com o ensino,
para ela a alfabetização implica leitura e escrita como momentos discursivos do próprio
processo de aquisição também vão se dando numa sucessão de momentos discursivos de
interlocuções, de interação.
A questão apontada pela autora é que as escolas desde muito tempo vêm desenvolvendo
um processo de alfabetização com moldes tradicionais e convencionais como, por exemplo, em
grande parte sem generalizar as escolas, elas alfabetizam por meio da silabação que é pela
sílaba a alfabetização e pela palavração que é pela palavra a alfabetização.
Para Smolka, estes métodos de se alfabetizar precisam ser repensados e analisado para se
tornar eficaz o ensino, porque a alfabetização não se baseia simplesmente ensinar a ler e
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escrever, mas sim ensinar conteúdos relevantes para a formação da criança e não só ler e
escrever como formação fundamental.
Neste contexto, as políticas públicas decorrentes as necessidades de ser ter um modelo a
seguir como guia para o educador (as) como manual que auxiliaria as práticas pedagógicas do
educador (a) e que facilitaria a aprendizagem do aluno e que surge neste debate o livro didático
para ampliar o ensino nas escolas.
Como já dito, o livro didático entra em ação para facilitar o trabalho do educador e para
as crianças em especial uma fonte de conhecimento de mundo. Porém segundo a autora será
mesmo que o livro apresentado para as crianças alunos e alunas como fonte de conhecimento de
mundo tem realmente funcionamento, conteúdo vinculados para suprir as necessidades do
apender.
Já na terceira parte a autora discute pontos de vista, Smolka se apresenta nestas
perspectivas considerando a linguagem escrita mais que um instrumento, mais sim uma fase de
interação e interlocução. No movimento das interações sociais e nos momentos das
interlocuções, a linguagem escrita ela se cria, transforma, constrói, como conhecimento
humano.
Sendo assim, Smolka, quando apresenta a alfabetização como processo discursivo, ela
trata da questão que a alfabetização não tem um modelo único, porém, por meio da
alfabetização que aprendemos a se comunicação sendo pela linguagem falada ou escrita.
Entretanto as instâncias das dimensões interdiscursivas, a emergência da escritura como
prática discursiva faz com que a criança elabore a escrita como forma de diálogo possibilitando
momentos do discurso da linguagem escrita.
Outro apontamento que a autora levantou foi na quarta e quinta parte do texto onde ela
demostra sua preocupação com a emergência do discurso na escrita inicial.
A autora parte dos pressupostos teóricos de Vygotsky, onde ele contextualiza que o
sujeito é um ser social que depende do meio para se desenvolver que o mesmo acredita que a
figura do adulto para criança ou seu papel com mediador é imprescindível na relação da
formação, criação e desenvolvimento humano da criança.
Vygotsky analisa então a escrita com a forma de linguagem levando em conta a
dimensão discursiva da escrita, sendo assim a linguagem não pode ser vista como um processo
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mecânico, mas um processo social. A alfabetização também não deve ser entendida como
aprendizagem de escrita, leitura, palavras e orações somente.
O processo de alfabetização impõe necessidades de uma nova relação e visão de ensino,
segundo a outrora a alfabetização e pautada na prática discursiva da escrita.
Smolka propõe em sua obra por meio de sua pesquisa realizada com crianças, entender
como são colocados os procedimentos do ensino e da leitura nas escolas, e como os educadores
desenvolver o trabalho em sala de aula.
O grande erro das escolas e dos educadores (as) eles esperam que as crianças já cheguem
à escola sabendo tudo, em uma entrevista com cada criança os primeiros meses de cada revelou
que: todos tinham experiências com a escrita, porém não esclarecimento, mas queriam aprender.
Mas para aprenderem é preciso estimular as crianças dar oportunidades para mostrarem
que são capazes de aprender a ler e escrever. Smolka como já dito não traz um modelo pronto
para seguimos, mas em especial apontou sua preocupação com o ensino em especial nas séries
inicias que é o primeiro contato da criança com o ensino sistematizado.
Para a autora na fase inicial e onde a criança começa a entender que tudo que elas sabem
falar tem uma palavra que representa sua fala. Portanto a questão da relação pedagógica e dos
procedimentos da escola e que tem se ensinado para as crianças a escrever, e não fazer menção
a dizer – e sim, repetir – palavras e frases pela escritura. Porém a escola não percebe que este
procedimento faz com que crianças que não conseguem aprender com esta metodologia sejam
banidas e rotuladas como crianças problemas.
As escolas jugam e culpa as crianças de não estarem aprendendo por falta de
incompetência, défice de atenção falta de comportamento entre outros, mas nunca param para
pensar se de fato a culpa de não aprender e somente da criança ou da escola.
A escola é um espaço entendido pela sociedade com espaço de transmitir conhecimento
de mundo para as crianças e formar um sujeito com capacidades para poder viver em igualdade,
sendo assim a escola não dever se remeter só no ensinar a ler a escrever, esperando que os
mesmos se tornem leitores e escritores.
A escola deve então proporcionar um espaço de descobertas para as crianças ensina uma
leitura eficaz e não de memorização, afinal existem várias e inúmeras formas de se trabalhar
para se desenvolver aprendizagem da leitura e alfabetizar criança independente de seu contexto
social e econômico.
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Desta forma a autora explica em sua a pesquisa com a escrita e leitura como um projeto
de incentivo para professores nas séries iniciais em linguagem e escrita no ensino para as
crianças.
A autora nos traz informações a respeito da importância de se ter um cuidado em se
ensinar as crianças a obra de Smolka, é um livro que nos amplia o horizonte nas práticas
pedagógicas. Portanto para ela os educadores (as) em especial de séries iniciais devem rever
suas práticas de ensino de como estão estabelecendo a relação de alfabetizar e ensinar se estão
realmente sendo satisfatório o ensino para a formatação da criança.
Smolka chegou a uma conclusão que se falta muito para mudar e transformar o ensino,
ela considera que a alfabetização deve ser repensada analisada, e que as escolas também devem
rever suas práticas de como se alfabetizar e direcionar este processo durante a vida escolar.
Contudo ela acredita que a alfabetização seja possível e viável e que e preciso na prática
pedagógica ser reavaliada.
Portanto, esta pesquisa de alfabetização com crianças de diferentes contextos sociais,
considera que a escrita está inserida em diversos âmbitos, desta feita, a leitura de livros, a
prática de alfabetizar, a escrita e a escolarização devem fazer parte da formação da criança
independente se seu contexto social.
ANEXO III
RESENHA
KLEIN, L. R. Alfabetização: quem tem medo de ensinar? 5 ed. São Paulo: Cortez; Campo
Grande: Editora da Universidade Federal de Mato Grasso do Sul, 2008.
Glazieli Melo Alves - UEM1
Natália Carolina Português - UEM2
Lígia Regina Klein aprendeu com sua mãe, Dona Ondina, professora de Didática na
Escola Normal, no interior do Paraná, a arte difícil e apaixonante do magistério. Nunca mais
desaprendeu e atualmente é professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Paraná. Foi autora das propostas de alfabetização dos Estados do
Paraná e Santa Catarina e tem inúmeros artigos publicados na área de alfabetização e educação
de adultos.
Em março de 1992 ela escreve seu livro Alfabetização: quem tem medo de ensinar? Pois
naquela época tem se um grande número de analfabetismo e um grande fracasso escolar nos
últimos anos. Temos a presença de alunos desinteressados e sem vontade de aprender, então se
1 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
glazielimeloalves2014@gmail.com 2 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
natalia.portuga@hotmail.com
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percebe um método que não está dando certo naquela época, o método tradicional, onde a autora
deste livro faz críticas ao mesmo, e propõe o uso de novas metodologias de ensino o
Construtivismo proposto Jean Piaget e o modelo de Escola Nova. As novas propostas
pedagógicas se importam com que a criança pensa, onde cabe ao professor desenvolver projetos
que estimulem esses alunos a buscar o conhecimento. A literatura é uma forma interessante de
despertar um interesse novo no aluno, onde é possível encontrar um conhecimento libertado.
A autora aborda neste livro três capítulos no primeiro capítulo a autora aborda a crise da
educação brasileira, presente na literatura pedagógica essa crise configura-se no fracasso na
aprovação e permanência dos alunos oriundos, predominantemente, das classes trabalhadoras e
esse fracasso se manifesta de maneira significativa nas séries iniciais, sendo assim um grande
fracasso na alfabetização. No segundo capítulo ela aborda as propostas de mudanças na prática
pedagógica na tentativa de superação do fracasso escolar. No terceiro e último capítulo a autora
aborda as considerações teóricas, bem como as propostas de encaminhamento metodológico e a
aquisição da escrita.
A formação dada aos professores é direcionada para trabalhar com alunos de classes
mais altas, ou um aluno com um perfil diferente do que se chega à escola pública. A escola não
está preparada (não da maneira como está formulada), para trabalhar com as características
socioculturais destes alunos.
Dada à evasão escolar e o fracasso escolar que pode ser dito como fracasso da
alfabetização, é devido a um método tradicional que já não dá conta de ensinar. É proposto desta
forma um método novo, totalmente oposto ao antigo. Se um preza a memorização, o outro presa
a espontaneidade, um se centra no professor o outro no aluno, um tem muito autoritarismo o
outro prevê a liberdade total.
Esse novo método proposto tem embasamento em Jean Piaget e defende que a criança
pode aprender de forma espontânea, ou seja, o professor vira somente um facilitador, prepara o
meio para que através deste a própria criança possa criar mecanismos de aprendizagem, o que
de acordo com a nova teoria, é possível após algum tempo de interação com o ambiente.
Esta nova proposta é imposta aos professores de cima para baixo, sem muitas
explicações e capacitações, com o objetivo de resolver o problema da alfabetização e a
incapacidade da escola em ensinar. Muitos professores já acostumados à antiga proposta
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tradicional, não aceitam esse novo método. Mas a grande pergunta é: não aceitam ou não
entendem?
A resposta a pergunta é simples, muitos deles não compreendem o novo papel do
professor, qual o significado da palavra ensinar. O professor para de ser transmissor do
conhecimento e passa a ser um facilitador, mas o método muitas vezes não explica como se dá
este processo. Sendo assim muitos educadores mais tradicionais encontram dificuldades de
aplicar a nova teoria em suas salas de aulas, e pedem desta forma um “guia”, algo que lhes diga
o que fazer, e como fazer. Muitos dizem que este novo método priva o professor de usar sua
criatividade, pois a tira de seu papel central de ensinar o aluno.
A ideia sempre existe primeiro na matéria, ou seja, a ideia surge de algum
comportamento humano, são duas coisas diretamente vinculadas. Este conceito está presente na
teoria Marxista e Hegeliana, onde sempre frisam que a vida determina a consciência. Sendo
assim as palavras, sempre utilizadas por autores nos textos, são carregadas, impregnadas de toda
uma construção histórica nelas embutidas, trazem em si significados que foram sendo
construídos durante séculos, são componentes históricos, culturais e de várias divergências no
decorrer dos anos.
Esclareceremos agora o conflito entre a escola tradicional e a nova proposta pedagógica,
a Escola Nova. Realizaremos este esclarecimento com base em quatro afirmações. Primeiro que
escola tradicional se direciona a um aluno abstrato, de classe dominante e, não para as classes
populares, que é a clientela que mais procura a escola pública. Segundo a escola tradicional
prima por um saber fragmentado, ensinando aspectos isolados, em cima disto é proposto à busca
da totalidade. Em terceiro o tradicionalismo preza um saber pronto e acabado, formando alunos
ingênuos, já a nova proposta busca formar alunos críticos. Em quarto o antigo modelo incube
somente o professor de uma ação pedagógica, excluindo o saber do aluno, contra isso se propõe
que o aluno seja agente de sua própria história. A nova proposta vem baseada no Marxismo,
pois utiliza termos como, história, luta de classes, totalidade. Vejamos quais como são propostas
as novas mudanças.
Passa-se a buscar o aluno concreto, ou seja, buscar a realidade do aluno, para que a partir
dela possam ser desenvolvidas as atividades pedagógicas e assim a escola se torne mais efetiva
no seu papel de ensinar. O problema é que muitas vezes esse termo de realidade do aluno é mal
compreendido, leva-se em conta somente a cotidiano imediato, onde ele vive qual sua classe
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social, sua rotina e seus problemas corriqueiros e, esquece-se no fim, que todos fazem parte de
uma mesma sociedade.
Não devemos particularizar cada caso da educação, em cada lugar, de acordo com suas
especificidades, mas sim, encontrar em meio às lutas e os problemas a essência que os tornam
iguais, pois desta forma seria possível realmente chegar ao aluno concreto, que faz parte de uma
sociedade capitalista presente em todo território nacional.
O novo modelo pedagógico propõe a busca pela totalidade, tanto do aluno quanto do
conteúdo. Entende-se por totalidade do aluno, que o mesmo já é total, o indivíduo em si é um
ser total e não fragmentado. Desta nova perspectiva que nasce a ideia de respeitar as
individualidades de cada um, respeitar seu ritmo, e o conhecimento que cada um já traz consigo
mesmo. Assim a totalidade do aluno é levar em conta seu caráter emocional, afetivo, biológico e
cultural.
Mas quando tratamos da totalidade de conteúdo tão buscada, temos algumas
complicações, a sugestão que se dá para alcançar a totalidade de conteúdo seria um currículo
interdisciplinar, onde um conteúdo de matemática estaria ligado ao que é trabalhado em língua
portuguesa, levando sempre em consideração a realidade do aluno. De certa forma, isso pode
sim tornar a escola mais interessante, e uma matéria estando conectada a outra, fazer com que, o
aluno aprenda melhor o conteúdo. Mas a grande questão ai passa a ser, o questionamento de por
que tantas matérias, e tantas disciplinas. Desta maneira, a busca pela totalidade do conteúdo
ainda é um desafio enfrentado pelas escolas e educadores.
Outra crítica feita pela nova proposta à antiga é a de que o professor transmitia um saber
pronto e acabado, e isso faz com que o aluno perca sua capacidade de criação e indagação,
assim como a ideia de que os conhecimentos são coisas estáveis e imutáveis. A nova proposta é
que o professor não deve transmitir nenhum conhecimento, mas fazer com que o aluno chegue a
certas conclusões por ele mesmo.
Cabe ao professor criar mecanismos que façam o aluno discutir, indagar, aprender a
partir das experiências e observações, a criar conhecimento a partir dele próprio. Pois, de acordo
com a escola nova, o conhecimento transmitido pelo professor, já vem embutido de ideias
burguesas que fazem com que o aluno, tenha certa alienação, e não aprenda a ser crítico.
O saber na verdade é algo em constante mudança, e jamais algo pronto, pois é social e
cultural. A sociedade assim como a ciência e o conhecimento mudam de acordo com as relações
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que os homens possuem com as mesmas. Sendo assim, o saber nunca acaba, mas está em
constante movimento. O aluno precisa ter possibilidades de chegar a esse saber e entender que
ele jamais estará acabado, mas em constante mudança. O professor neste novo contexto
começa-se a se questionar sobre seu papel e a buscar alternativas do que fazer em sala de aula.
Uma saída vista pelos professores citada pela autora foi o de trazer a culinária para a
escola, pois por meio das receitas, os professores faziam com que os alunos experimentassem e
observassem o que acontecia, propiciando assim, que os estudantes pudessem tirar suas
conclusões sobre o conteúdo, através de perguntas e discussões com todos em sala de aula.
No terceiro capítulo a autora coloca a construção de conhecimento que tem como matriz
teórica, a psicologia genética de Jean Piaget a ideia de interação está em que o professor vai
desempenhar um papel menos relevante do que destinava no ensino tradicional, uma vez que
não lhe cabe mais ensinar, mas criar um ambiente alfabetizador.
Esse princípio para chegar ao objeto é necessário à relação do sujeito e objeto, de fato para
chegar ao objeto, é necessário que o sujeito entre em relação com os outros sujeitos que estão
pela função social que lhe atribuem, constituindo esse objeto enquanto tal. Nesse sentido, é
preciso esclarecer que não opomos a afirmação de que o aprendiz é o sujeito de conhecimento.
No entanto a atividade do sujeito-aprendiz e seu conato com o objeto por mais rico que sejam
não garantem a sua aprendizagem, pelo fato de sua inserção real, afetiva, no conjunto de
relações humanas outros sujeitos.
Podemos perceber isso como primeiro passo na função social da escrita, pois a sociedade
utiliza a escrita por que precisa dela, porém, em nenhuma sociedade constata-se o exercício da
escrita como uma necessidade de todos os homens enquanto indivíduos.
No cotidiano das pessoas, inúmeras situações que exigiam a escrita passaram a ser resolvidas
pelo uso de outros meios, tão eficazes: o telefone, a televisão, o fax, etc. Por isso é necessário
que explique a criança a serventia da escrita e nesse sentido que o professor deve levar em
consideração a realidade do aluno. Ler e escrever são uma exigência natural.
A natureza da língua escrita na alfabetização ocorre, também, com outros conhecimentos
cujo uso social não se realiza em todos os homens. Parece existir a exigência de que essa relação
ensino e aprendizagem não sejam meramente imitativas, mas se processe um esforço de
sistematização que propicie a compreensão da relação entre dois códigos de natureza diferentes,
produzidos, todavia, em relação com o outro.
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Ensino e aprendizagem estão em relação, constituem uma relação necessariamente
articulada, é necessário compreender como se aprende, como se ensina e como se configura o
objeto que se pretende ensinar, o que é mais importante à forma como os homens produzem e
utilizam o objeto.
O professor deve respeitar as características individuais, mas é preciso não confundir o
atendimento individual, ás vezes necessário, às vezes único possível com aprendizado
individual com respeito às características do indivíduo, ou seja, estar respeitando as
características individuais e limites de seu aluno.
O professor deve respeitar o erro dos alunos, porque construtivo antes de apontar o erro e
encaminhar soluções, cabe ao professor colocar o aluno em situação de desiquilíbrio, ou seja, de
conflito cognitivo, para que ele mesmo, constatando a ineficiência de sua solução, se mobilize
na busca de outras possibilidades. Lembrando que a „‟ criatividade‟‟, em sendo humana, é,
também ela, produzida, decorrente, portanto, de uma intervenção da sociedade o indivíduo se
humaniza.
O aprendizado da língua escrita implica o domínio de fatos do código que ocorrem
sempre como resposta à necessidade de clareza que o texto deve ter, e que são ou explicados por
sua relação coma oralidade, ou pela própria natureza escrita.
A questão metodológica deve conter dois aspectos constitutivos da língua: código e
significado é evidente que se deve admitir tentativas de escrita que poderão resultar em formas
que não necessariamente corresponderam à forma correta, no entanto, é preciso ter claro que
essa tentativa, uma vez realizada, deverá ser imediatamente corrigida no sentido de se
explicitarem, para o aluno, as implicações que o problema formal trará ao conteúdo para que o
aluno se aproprie da compreensão de que embora a língua possibilite várias formas de relação
letra e fonema, no entanto, exige, para cada palavra, o uso de uma única relação.
Ressalva-se que essa correção não é sinônima de constatação de punição ou de erro. O
procedimento, no ato de correção, deverá implicar, primeiro, a consolidação daquilo que, na
tentativa do aluno, configura acerto e num segundo momento, numa reflexão sobre as
possibilidades genéricas da língua e a exigência especifica no caso da palavra, frase ou texto
corrigido isso sem ter atitudes grosseiras, desagradáveis, colocando o aluno em posição
humilhante, é essa atitude na correção que deve ser condenada.
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Sendo assim, este texto nos traz uma reflexão predominantemente no quadro da educação
brasileira, onde é necessário o respeito e o limite do aluno, deixar as repetições exaustivas e
muitas vezes não fundamentadas na autoridade do professor, trocando para as novas
metodologias em uma proposta voltada para o aluno, no ensino aprendizagem, na construção de
conhecimento dos alunos e fundamentada.
O presente livro atinge o seu o seu objetivo, o qual é mostrar como são feitas a propostas
metodológicas e como elas chegam a sala de aula. Importantes reflexões são apontadas pela
autora que através de um contexto histórico e das entrevistas com os professores, nos mostra
como às vezes a teoria se transforma até atingir a prática, e que muitas vezes existe uma falha na
comunicação entre a metodologia e sua execução.
É importante destacar como o livro nos mostra que muitas vezes os métodos sendo
impostos aos professores, de cima para baixo, ao invés de ajudar simplesmente só causa mais
caos no cenário atual da alfabetização brasileiro. Muitas vezes as teorias e propostas
educacionais são sim muito bem elaboradas, como a Escola Nova ou até mesmo o
Construtivismo de Emília Ferreiro, com base em Jean Piaget, mas no momento em que devem
ser aplicadas na educação, como forma de resolver o analfabetismo e a evasão escolar,
simplesmente falham. Por que?
Alguns apontamentos que encontramos é o de que muitas vezes o professor não entende
seu novo papel em cada uma das propostas, qual o seu dever ou como ensinar. Confunde-se o
papel do aluno e do professor, muitas vezes causando uma grande confusão na cabeça dos
educadores que não tem clareza de qual caminho devem seguir. Mais importante ainda é que o
problema da evasão escolar e da repetência, todavia ainda não foram resolvidos.
As novas propostas pedagógicas criticam que a pedagogia tradicional se focava no
professor, no conhecimento acabado, no livro, e que ao contrário de se importar em como se
ensina, deve-se focar em como se aprende, pregando que o aluno é construtor de seu próprio
conhecimento.
Sendo assim ao professor cabe achar seu lugar neste largo contexto da educação
brasileira, procurar um equilíbrio e entre tantas propostas edificar suas aulas sobre uma delas, o
importante é que cada educador possua clareza do que está fazendo e porque está seguindo
aquele caminho, talvez seja possível alcançar algum êxito no seu papel de ensinar e do seu
aluno de aprender.
ANEXO IV
RESENHA
MORTATTI, M. R. L. Educação e letramento. São Paulo: UNESP, 2004.
Grazielly Rodrigues Garcia - UEM1
Mariana dos Santos - UEM2
Laryane Serafim Teodoro - UEM3
O livro Educação e Letramento (2004), com autoria de Maria do Rosário Longo Mortatti
(2004), professora titular da UNESP, licenciada em Letras pela Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras de Araraquara-SP, mestre e doutora em Educação pela Unicamp, já publicou vários
livros no campo das ciências da educação e da linguagem, tem como objetivo discutir sobre a
relação entre educação e letramento no Brasil. No ano em que o livro foi publicado, a autora era
professora da Pós-graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília –
UNESP e livre-docente pela UNESP.
1 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
grazielly_garcia_2011@hotmail.com 2 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico: mariana-
biasotto@hotmail.com 3 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
laryane.2008@hotmail.com
18
O livro está em sua 1ª edição (2004), publicado pela Editora UNESP com o apoio
Projeto Pedagogia Cidadã, incluído na Coleção Paradidáticos, está sendo criada pela Editora
UNESP com a finalidade de tornar acessível obras de pesquisadores acadêmicos brasileiros para
o público em geral, apresentando temas científicos e culturais significativos e conhecimentos
socialmente relevantes, incentivando as novas gerações à pesquisa. A coleção é voltada para
autores que aceitam discorrer sobre assuntos complexos presentes nos debates científicos e
culturais vigentes.
A obra estudada discute a relação entre educação e letramento no âmbito do
analfabetismo no Brasil, já que em 2003 o então ministro de Estado da Educação, Cristovam
Buarque, divulgou um artigo onde evidenciava que ainda havia cerca de vinte milhões de
analfabetos no Brasil, mesmo sendo um dever do Estado proporcionar aos indivíduos as
condições necessárias, através da educação, para o acesso à cultura elaborada e inclusão social e
política, com o objetivo da democracia, que teria como premissa a aquisição da leitura e da
escrita. Levando como ponto de partida a análise de termos relacionados: “alfabetização” e
“analfabetismo” (mais antigos), “letramento” e “iletrado” (atuais), construídos no decorrer do
processo histórico, passando por conflitos e busca de soluções para um problema há muito
tempo presente na realidade brasileira: o analfabetismo, sua relação com a escolarização e a
educação, a alfabetização e o significado do termo atualmente usado: letramento. O objetivo da
autora é lançar considerações para o leitor ter um ponto de partida para uma pesquisa,
dependendo de sua necessidade.
O livro é dividido em cinco capítulos, de forma a explicar toda a problemática envolvida
nas questões da educação e do letramento, termo cunhado no âmbito brasileiro em meados dos
anos de 1980, o porquê do surgimento dessa palavra e sua relação com a alfabetização e a
escolarização, em simultaneidade com as transformações das relações políticas, sociais,
econômicas, culturais da sociedade brasileira desde o Brasil colônia, fazendo um retrospecto
histórico, em síntese.
A autora propõe abordar no primeiro capítulo as relações existentes entre o
analfabetismo, alfabetização, educação e escola, lançando dados estatísticos da permanência do
analfabetismo no percurso histórico do Brasil; no segundo capítulo analisa os termos:
alfabetização, alfabetismo, alfabetizar, alfabetizado, analfabeto, analfabetismo, letramento,
iletrado e letrado, no contexto de três dicionários da língua portuguesa nos séculos XIX e XX e
19
três dicionários técnicos de alfabetização e linguística mais recentes; no terceiro capítulo, ainda
levando em consideração os termos analisados no capítulo anterior, a autora remonta o percurso
histórico da alfabetização e da educação, desde a colonização do Brasil até os dias mais atuais;
no quarto capítulo, tomando como base o termo letramento, a autora analisa seu uso em textos
acadêmicos, a partir dos anos de 1980, de pesquisadores brasileiros; e no quinto capítulo, é
abordado mais sobre o letramento, e sua relação com a alfabetização, a escolarização e a
educação.
O primeiro capítulo: “Analfabetismo, alfabetização, escola e educação”, traz a discussão,
entre qual seria o dever do Estado no que cerne à educação e alfabetização dos indivíduos nos
moldes da sociedade atual, a relação com o analfabetismo há muito presente na sociedade
brasileira, e o papel da escolarização nesses termos.
A autora introduz o capítulo indicando que, de acordo com Cristovam Buarque, ministro
de Estado da Educação, em 2003, o Brasil possui cerca de vinte milhões de analfabetos, devido
aos quinhentos anos de governo das elites.
Desde o período colonial no Brasil existiam muitas pessoas que não tinha acesso à
leitura e a escrita. Essa situação se evidenciou como analfabetismo, devido a política no final do
período imperial, com a proibição do voto dos analfabetos (Lei da Câmara dos Deputados de
1881/ lei Saraiva, de 1882), que ganhou força através dos ideais do liberalismo e pela taxa de
analfabetismo publicado pelo censo de 1980.
O analfabetismo se destacou no decorrer do século XX, como um problema político,
social, econômico e cultural, enfatizando a marginalização e a discriminação social.
A autora utiliza de dados informativos dos censos da época para ilustrar o problema do
analfabetismo e a forma como era visto. De modo geral, cabia aos censos pesquisar a
quantidade de pessoas que não sabia ler ou escrever. Essa avaliação até 1940 era baseada na
própria declaração da pessoa em relação a sua capacidade de leitura e escrita. No entanto, esse
processo sofreu mudanças de critérios no decorrer do tempo, a partir de 1950, para ser
considerada alfabetizada a pessoa tinha que saber ler e escrever um bilhete simples no idioma
que conhecesse, no censo de 2000 a pessoa tinha que saber ler e escrever um bilhete simples no
idioma que conhecesse, no entanto, aquela pessoa que aprendeu a ler e a escrever mas esqueceu
e sabia apenas assinar o nome eram consideradas analfabetas.
20
De acordo com a Unesco, comparado a outros países em desenvolvimento, o Brasil tem
um dos maiores índices de analfabetismo dos indivíduos com mais de quinze anos. Dessa forma,
pode-se dizer que o analfabetismo está comprometendo o futuro do país, contribuindo para o
crescente número da marginalização.
O processo de analfabetismo no Brasil decorre de um processo histórico, herdado do
passado, onde o Estado não consegue garantir que a educação escolar consiga superar esse
problema de forma totalmente eficaz.
A autora caracteriza o termo educação como uma atividade específica humana, que tem
por objetivo formar o indivíduo, para que ele desenvolva características tipicamente humanas e
seja capaz de aprender, como também de ensinar, em diferentes contextos.
Assim, a autora faz uma pequena análise da influência da educação e o processo de
alfabetização. Na Europa, principalmente a partir do século XVI, passou-se a depositar muitas
expectativas na educação, como forma de transformação racional da sociedade, sobretudo na
educação escolar transmitida de forma sistemática. Essas expectativas estão ligadas ao conceito
de infância, que foi se transformando a partir do século XVIII, relacionado ao sentimento da
classe social.
No século XIX, a educação foi ganhando força no mundo ocidental, onde aos pouco
houve a transição do modo de ensino com sentido religioso para um sentido “moderno”. A
escola passou a assumir a importante função como instrumento de progressão e de
transformação da nação.
No entanto, desse conceito surgiu à problemática de conciliar escola, ensino e
aprendizagem iniciais da leitura e da escrita: a alfabetização. Deu-se então início a uma série de
debates entre políticos sobre a universalização da instrução elementar, criando assim, leis
escolares de 1980. Essas leis estabeleciam a obrigatoriedade, a gratuidade, e a laicização da
educação, se tornado instrumento de transformação aos iletrados e fator de integração social. A
partir dessa lei, ensinar ler e escrever se tornou papel fundamental da escola obrigatória, gratuita
e laica, nos moldes ocidentais, onde para poderem ser ensináveis, a escrita e a leitura passaram e
serem organizadas sistematicamente e metodicamente, necessitando assim, de profissionais
especializados.
De acordo com a autora, saber ler e escrever e usar a escrita em diferentes contextos
cotidianos são necessidades fundamentais para o exercício da cidadania e para o progresso de
21
uma nação. Sendo o termo alfabetização bastante conhecido e utilizado, porém o termo
letramento foi introduzido recentemente em nossa língua e está ligado a novos fenômenos de
ordem social, política, econômica e cultural.
O segundo capítulo, “De “analfabeto” a “letramento””, tem como objetivo explicar os
termos relacionados à alfabetização, tendo como base três importantes dicionários da língua
portuguesa como: Dicionário de língua portuguesa, de Antonio de Moraes Silva, Novo
Dicionário da língua portuguesa, de Aurélio Buarque e Dicionário Houaiss da língua
portuguesa.
Em primeiro lugar a autora aborda o termo "analfabeto", o mais antigo, surgido em
meados do século XVIII, seu significado permanece até os dias atuais, sendo considerado
analfabeto o indivíduo que seja ignorante das letras do alfabeto, que não consiga ler e nem
escrever, ou seja, não possua instrução primária e não tenha conhecimento sobre determinado
assunto. Com base no termo "analfabeto", ao final do século XIX surge então uma nova palavra
relacionada ao assunto: o "analfabetismo", para explicar o problema existente na sociedade, em
seguida a palavra que passou a ser utilizada no final do século XIX é "iletrado" que em primeiro
lugar se remete a negação, mais possui o mesmo significado que o "analfabeto".
O antônimo desses termos surge na língua portuguesa no século XVIII, o termo
"letrado", que não possui relação direta com o termo "analfabeto". "Letrado" remete-se a
condição de quem sabe ler e escrever claramente.
De acordo com a análise de Mortatti, quando dizemos que alguém está "alfabetizado" o
indivíduo está instruído, isto é, ele sai do estágio de "analfabeto", e com a instrução,
"alfabetização" e o "alfabetismo", busca-se encontrar a extinção do "analfabetismo".
Mortatti elabora seus estudos baseada também em dicionários técnicos de alfabetização e
linguística: Dicionário de alfabetização: vocabulário de leitura e escrita, organizado por
Theodore L. Harris e Richard E. Hodges, o Dicionário de linguagem e linguística, de R. L.
Trask, e o Dicionário de análise do discurso, de Patrick Charraudeau e Dominique Mainguenau,
abordando os mesmos termos já citados, e acrescentando novas palavras, decorrente da
construção do processo histórico das discussões sobre a alfabetização e o letramento, tendo
como base Emília Ferreiro, a qual explica o termo "lectoescrita" constituindo a
indissociabilidade da leitura e escrita em torno do processo de alfabetização, com base no
processo construtivista.
22
Contudo, de acordo com a autora, os termos já discutidos anteriormente e comparando
com o dicionário técnico, os significados estão muito próximos, principalmente no que se refere
à relação do saber ou não a ler e escrever e a não instrução primária, o que leva a uma confusão
de significações.
No capítulo três, “Das primeiras letras ao letramento”, a autora aborda o processo
histórico de significação do termo letramento abrangendo as relações de educação e
alfabetização, desde a colonização do Brasil até os dias mais atuais. Inicialmente, apresenta as
ações tomadas pelos padres jesuítas no processo de colonização e catequização do Brasil e seus
nativos, da forma como se encontravam. Os jesuítas tinham como objetivo escolarizar o índio
para assim convertê-lo a religião católica, fazendo-o servir aos interesses da Igreja.
Mortatti discorre sobre o processo que levou a esse fim: primeiramente, houve a criação
de uma escrita alfabética para a língua materna dos índios, o tupi; então o ensino de uma
segunda língua, o português, oral e escrito, impondo-se a transposição de uma cultura centrada
na oralidade, para uma cultura letrada e civilizada, que já possuía um sistema alfabético.
Portanto, antes de aprender as primeiras letras o índio teria que aprender uma nova cultura e
uma nova língua.
A autora pontua a expulsão dos jesuítas em 1759, em consequência das reformas
pombalinas, que inspiradas em ideais iluministas, tinham como objetivo formar o homem para o
Estado português e não mais para a Igreja católica, o que levou a uma nova organização da
instrução pública, através das “aulas régias”.
Com a Proclamação da Independência em 1822, procurou-se instituir, de forma mais
abrangente, uma nova organização para a instrução pública, encaminhando à Constituição
Imperial de 1824 e a regulamentação pela lei de 1827, na gratuidade da instrução pública, o que
foi considerado pela autora, como a primeira tentativa de se organizarem as diretrizes nacionais
para a instrução pública.
Porém, não foi possível concretizar de forma ampla o objetivo proposto, já que havia
deficiências de recursos humanos, físicos e administrativos. Com a libertação dos escravos e a
chegada de imigrantes, alastraram-se as discussões a respeito da educação elementar e da
instrução popular, fazendo surgirem algumas propostas para organizar o ensino.
Diante de todo o esforço, Mortatti coloca que a iniciação nas primeiras letras ainda ficou
impossibilitada para uma parcela da população ou privada ao meio familiar. Ainda comenta
23
sobre o peso da colonização portuguesa no âmbito da instrução primária, que no censo realizado
em 1872, demonstrou que cerca de 85% da população era analfabeta.
Dessa forma, a autora ressalta o destaque que foi dado ao analfabeto e ao analfabetismo
ao final do Império, principalmente com a proibição do voto dos analfabetos, em 1881/1882,
que fez esse problema surgir como algo político.
Em 1889, com a Proclamação da República, a autora destaca a nova necessidade de
institucionalizar a formação do cidadão, por meio da educação e da instrução primária, como
forma de reverter a situação em que a população se encontrava naquele período. Assim, a
escolarização das práticas de leitura e escrita, foi entendida como meio de esclarecer a
população, para que assim os problemas de ordem social, econômica e política chegassem a
uma situação desejada.
Mortatti analisa a influência que essa nova necessidade gerou em São Paulo, que serviu
de modelo para outros estados. Esse modelo foi sintetizado e institucionalizado pela reforma
Caetano Campos de 1892, baseado em novas e modernas soluções, como a criação de escolas
normais, para a formação de professores primários; a introdução de novos métodos para o
ensino, entre outras.
A autora comenta que a relação entre os ideais republicanos, o processo de
sistematização do ensino público e a escolarização e metodização do ensino da leitura e da
escrita, levou a uma gama de novas pesquisas e estudos, tentativas de normatizações e
experiências sobre o ensino da leitura e da escrita, deixando-os em uma posição de destaque,
que, segundo a autora, levou a uma nova forma de compreender a leitura e a escrita.
Mortatti discorre sobre a importância que davam ao ensino da leitura, deixando a escrita
em segundo plano, mesmo com discussões indicando o ensino simultâneo de ambos. A leitura é
entendida como um processo sobre o qual comunicam-se com o pensamento de outra pessoa,
através da escrita, que aqui é entendida como caligrafia, uma qualidade complementar.
A autora coloca que nos anos de 1890, foi combatido o método de silabação e soletração
de ensino da leitura, considerado antigo e deficiente, propondo-se, desde os anos de 1870, o
método analítico como forma de ensino da leitura.
Nesse período, segundo a autora, o analfabeto era considerado o culpado das mazelas
das condições da sociedade, assim, a Constituição republicana de 1891, continua proibindo o
voto dos analfabetos, alegando que essa atitude incentivaria os indivíduos a saírem da
24
ignorância, escapando da responsabilidade de oferecer a instrução pública primária gratuita e
obrigatória. Surgem algumas discussões divergentes dessa visão, considerando os analfabetos
capazes de elegerem um representante, porém a Constituição continua os discriminando.
Ao analisar as duas primeiras décadas do século XX, Mortatti discute o uso mais
frequente de termos relacionados com o ensino da leitura e da escrita: alfabetização,
analfabetismo, analfabeto e alfabetizado. Em relação ao uso dessas palavras, duas figuras se
destacaram no estado de São Paulo: os professores, Oscar Thompson e Antônio de Sampaio
Dória, ambos já tendo participado da administração da instrução pública no estado.
Segundo a autora, Thompson tinha como objetivo implementar uma escola moderna, de
forma a resolver o problema do ensino da leitura e da escrita aos analfabetos, tendo oficializado
o método analítico para o ensino da leitura e escrita nas escolas, em um Relatório de 1918,
utiliza o termo alfabetização para denominar o ensino da leitura e da escrita, oficializando o
termo.
Em uma Carta Circular, de 1918, Thompson pede sugestões para resolver o problema do
analfabetismo, uma das respostas foi de Antônio de Sampaio Dória, que via o analfabetismo
como o mal responsável pelos problemas da nação, que impedia o progresso, e o livre exercício
da cidadania democrática. Propondo assim, uma medida que resolvesse o problema, levando
três conhecimentos ao indivíduo: saber ler, escrever e contar.
Essa proposta de uma alfabetização para todos, sem distinção, foi o pressuposto que
norteou a Reforma de 1920, quando Sampaio Dória foi diretor da Instrução Pública. Na
Reforma, para solucionar a alfabetização da população, o ensino primário reduziu de quatro
para dois anos, estabelecendo a autonomia didática, mas, segundo a autora, o método analítico
continuou sendo considerado o melhor.
Assim, a autora discorre sobre as primeiras décadas do século XX, com os termos
alfabetização, analfabetismo, analfabeto e alfabetizado, sendo amplamente utilizados em novos
sentidos, nas campanhas levantadas contra o analfabetismo, sendo constatado o sucesso da
alfabetização pelas aprovações e número de matrículas.
Aqui, Mortatti discute sobre a influência do ideário escolanovista nas reformas da
instrução pública de outros estados. Agora as discussões não se restringem à alfabetização,
procuram uma função da escola concordante com a sociedade.
25
A autora cita alguns reformadores, cada um em seu estado: Lourenço Filho, no Ceará;
Francisco Campos, em Minas Gerais; e Anísio Teixeira, na Bahia. Todos têm em comum o
objetivo de reformar não somente o que concerne à alfabetização, mas a instrução pública que
forme um indivíduo inserido em uma sociedade, um cidadão.
Com essas discussões, a instrução pública ganha um novo olhar, fazendo em 1930, que a
educação e o ensino tivessem uma unificação dessas experiências estaduais, elaborando
diretrizes federais. Assim, a Constituição de 1934, estabelece a gratuidade e obrigatoriedade do
ensino primário de quatro anos, estendendo aos adultos.
Dessa forma, Mortatti evidencia a disseminação de um lado, a tentativa em inserir a
população nas escolas existentes, e por outro a disseminação dos princípios escolanovistas,
baseados em uma perspectiva psicofisiologica, que demandavam uma nova organização, com o
aluno no centro, os métodos ativos e racionais e os testes de inteligência.
Agora, segundo Mortatti, a escrita é vista como instrumento de comunicação e
linguagem, devendo ter uma intervenção diferenciada; a leitura por sua vez, é vista como um
meio para ampliar as experiências e capacidades mentais.
Diante dessas reformulações, as discussões sobre o ensino da leitura e da escrita se
direcionam ao método misto ou ao método global, dando lugar para os aspectos psicológicos da
aprendizagem da leitura e da escrita, principalmente se voltando a alfabetização de adultos.
Ao analisar os censos, a autora constata que na década de 1950, ainda havia 36% de
analfabetos no Brasil em idade escolar, porém nessa mesma época, o que consideravam como
analfabeto muda de sentido, agora é necessário saber ler e escrever um bilhete simples, para ser
considerado alfabetizado.
Assim, segundo Mortatti, a alfabetização ganha um novo sentido em meio aos ideais
escolanovistas e de democratização da cultura e social. Dessa forma, a palavra alfabetização
ganha o sentido de um processo escolarizado e científico, onde há o ensino simultâneo da leitura
e da escrita, que tem o objetivo de ser um instrumento de adaptação do indivíduo ao meio que se
encontra inserido.
Com um novo sentido dado a alfabetização, muitos discursos, práticas pedagógicas, e
cartilhas de alfabetização foram surgindo na década de 1960, inclusive um movimento social e
político relacionado com a educação popular e alfabetização de adultos, onde Paulo Freire tem
papel destacado. Este educador deu uma nova visão ao que concerne à alfabetização,
26
entendendo-a como uma “leitura de mundo”, de forma à atuação e transformação social e
política.
A autora ainda cita leis importantes para a educação: a primeira Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, nº4024, de 1961, a Constituição de 1967, a Lei 5692, de 1971, que
estenderam o ensino obrigatório e gratuito para a população. Porém, essas leis, propiciaram uma
nova corrente pedagógica a se instalar, o tecnicismo, e com essa ampliação, uma camada social
menos privilegiada entrou na escola, fazendo com que o fracasso escolar aumentasse.
Mortatti esclarece que, a partir de meados de 1980, a alfabetização passou a ser discutida
em outros âmbitos, principalmente pela nova organização política e social, devido a ditadura
militar e a abertura política. Agora, as discussões a respeito da educação se ampliaram para os
âmbitos políticos, econômicos, sociais e pedagógicos, a partir de uma perspectiva teórica
sociológica dialético-marxista, divulgada por pesquisadores acadêmicos de diversas áreas do
conhecimento, principalmente Filosofia, História, Sociologia e Educação.
Dessa forma, a autora discute a mudança que houve na visão das relações entre educação
e sociedade, agora vista como dialética e contraditória, onde as finalidades sociais e políticas da
escola são produzidas histórica e socialmente.
Com o alto índice de fracasso escolar presente, Mortatti discute algumas propostas que
surgiram para tentar resolver o problema, como a educação compensatória. Dessa forma, coloca
que, para alcançar a democratização das oportunidades, a escola deveria irromper como espaço
de transformação social, dando suporte político e cultural para as classes sociais dominadas,
relacionado com a formação da cidadania.
Assim, no que concerne à uma escola democrática, o fracasso escolar passa a ser
considerado responsabilidade da escola e não do indivíduo, a escola deveria oferecer um ensino
de qualidade. O ensino da leitura e da escrita nesse aspecto deveria ser visto como uma questão
política, que auxiliaria na luta contra as desigualdades sociais.
Mortatti pontua, assim, um clima de intensas discussões e proposições de novos modelos
e métodos para uma educação democrática. Nesse ambiente são formuladas a Constituição de
1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº 9394, de 1996, e os Parâmetros
Curriculares Nacionais, articulados com as novas pesquisas sobre alfabetização e educação.
Assim, a autora discute sobre cada uma dessas formulações e as mudanças que trouxeram,
inclusive notando a ampliação do conceito de educação nas normatizações.
27
A autora coloca sobre as diversas iniciativas estaduais e nacionais, nas décadas de 1970
e 1980, que apareceram em relação a essa mudança no conceito de educação, e dos estudos
referente à educação e alfabetização, no meio universitário, de formação continuada de
professores, criação de centros de pesquisa, entre outros, além da implantação do Ciclo Básico
de Alfabetização, pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, em 1983.
Mortatti discorre sobre a nova organização curricular de um ciclo de alfabetização,
destacando a nova orientação didático-pedagógica: o construtivismo. A partir desta teoria a
alfabetização ganha uma nova compreensão. O construtivismo foi disseminado no Brasil em
meados de 1980, resultado das pesquisas de Emília Ferreiro e colaboradores sobre a psicogênese
da língua escrita, baseada na psicologia genética de Jean Piaget, e na psicolinguística de Noam
Chomsky.
Ferreiro propunha um novo olhar no processo de alfabetização, sem se centralizar no
ensino e em métodos até então defendidos, sem propor um método, o construtivismo vem
questionar todas essas questões. A leitura e a escrita deveriam ser ensinadas simultaneamente, o
que foi denominado lectoescrita. Dessa forma, a autora postula os princípios do construtivismo,
demonstrando a mudança de paradigma sobre o processo de alfabetização, onde a criança
poderia se alfabetizar, sendo considerado alfabetizado aquele que compreendeu o sistema
alfabético da escrita.
Postula a expansão da influência dos estudos de Linguística e Psicolinguística no Brasil,
mudando o que se conhecia como alfabetização.
Além do construtivismo, discute a influência de outra corrente, o interacionismo
linguístico, que designa alfabetização o processo de ensino-aprendizagem da leitura e da escrita,
voltado para a relação entre professor e aluno na sala de aula. Assim, alfabetizado seria aquele
que sabe ler e escrever textos, com finalidades além da escolar, relacionadas com as práticas
sociais.
A partir das concepções de construtivismo e interacionismo, a autora destaca alguns
aspectos que considera importante, que remete à proposta de ambas de ampliar o conceito de
alfabetização, e a prática no Brasil de utilizar de ambas as concepções nos discursos oficiais,
como nos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Além dos aspectos Linguísticos e Psicolinguísticos, a alfabetização ganhou discursos nas
áreas de sociologia e história, em meados dos anos de 1990.
28
Dessa forma, a autora coloca o surgimento do termo letramento, nos discursos
acadêmicos de 1980, com um sentido diferente do que é conhecido como alfabetização. No
começo foi restrito ao meio acadêmico, mas atualmente é possível perceber seu significado
presente nos dicionários de língua portuguesa, em textos de formação continuada, cartilhas,
entre outros.
Mortatti discute que o surgimento da palavra letramento, vem colocar certo esgotamento
teórico e prático do termo alfabetização. Porém, enfatiza que o uso de ambos os termos ainda
não entrou em consenso, muitas vezes havendo certa confusão de significação. No documento
oficial, Parâmetros Curriculares Nacionais – Língua Portuguesa, de 1997, há o uso desses dois
termos, sendo alfabetização o mais utilizado, com orientação do construtivismo o do
interacionismo linguístico. O termo letramento tem poucas passagens no texto, sendo
relacionado com as práticas sociais que utilizam da escrita.
A autora assim conclui o capítulo, fazendo um esclarecimento sobre o parâmetro
histórico da educação e da alfabetização, em quinhentos anos da história do Brasil, o qual
sintetizou. Coloca então, que o termo letramento surgiu a partir da construção histórica dos
termos alfabetização e analfabetismo.
No capítulo quatro, “De „literacy‟ a „letramento‟”, Mortatti traz a discussão sobre o
termo “letramento”, que começou a ganhar ênfase somente na década de 1980, quando passou a
ser utilizado em estudos e pesquisas acadêmicas sob influência do inglês “literacy” que até
meados de 1990, significava “alfabetização” e recentemente passou a ser designado
“alfabetismo”.
A autora explica que a introdução do termo letramento não ocorreu apenas no Brasil,
mas também em outros países desenvolvidos, quando se aumentou a necessidade de se saber ler
e escrever, e à medida que a questão do analfabetismo foi sendo solucionada se expandiu a
educação básica.
Mortatti relata que mesmo com a ampliação dos conceitos, a palavra alfabetização ainda
continua sendo muito utilizada em nosso país. Com as novas necessidades sociais os termos
“alfabetismo” e “letramento”, ganham destaque sendo possível encontrar seu novo significado
em diversos dicionários de língua portuguesa.
Segundo a autora, o termo letramento possui constantes oscilações, justificados
supostamente por sua recente introdução e pelas diferentes formas de se caracterizar as
29
demandas sociais pelo uso da leitura e da escrita. O letramento está relacionado ao uso social da
leitura e da escrita e com o passar do tempo vem crescendo o número de produções acadêmicas
sobre o tema. São apresentados textos de alguns autores com definições e considerações sobre o
letramento e sua aplicação em diferentes contextos.
No capítulo cinco, “Letramento, alfabetização, escolarização e educação”, Mortatti
desenvolve uma discussão sobre as relações do letramento com a sociedade, a escola, a
educação e a alfabetização. Pontua que o letramento está envolvido totalmente com a língua
escrita, estando relacionado com as sociedades organizadas, em um sistema de escrita, nos
textos, e tem importância fundamental na vida de todos. Isto pode ser entendido como uma
cultura em que os valores, crenças são repassadas através da linguagem escrita, na qual a ênfase
é o saber ler e escrever ainda mais seguro do que falar e ouvir.
Certamente as sociedades letradas atuais estão ainda mais elaboradas do que das décadas
passadas, isto ocorre em decorrência do desenvolvimento cultural, industrial e econômico,
promovendo e aprimorando diversos modos de produção e atingindo também o espaço da
escrita.
A autora postula que, a leitura e escrita fazem parte dos bens culturais, dando acesso à
cultura escrita a todos os indivíduos e grupos sociais efetivos de uma sociedade letrada. O saber
ler e escrever são condições essenciais para transformação tanto para o indivíduo, como para os
grupos sociais. Leitura e escrita são processos diferentes, que possuem habilidades e
conhecimentos distintos, como os processos de ensinos e aprendizagem. O processo de ler e
escrever se encontram em vários estágios intermediários para verificar níveis de habilidade e
conhecimento.
Atualmente o Brasil vem adotando nova perspectivas de abordagem do letramento, esse
modelo se denomina como “modelo autônomo” seu objetivo é evidenciar a dimensão técnica e
individual do letramento, nesta realidade pode-se imaginar o letramento no singular. Já o
modelo anterior “modelo ideológico”, se direciona na dimensão social do letramento, são
consideradas atividades sociais que se habitem no tempo e espaço da sociedade, assim como nos
projetos políticos e culturais.
Mortatti evidencia que, um indivíduo alfabetizado, nem sempre está letrado, o acesso a
tecnologia do ler e escrever não está disponível a todos, assim como os materiais impressos que
dependem da sociedade, do momento histórico e cultural, para que possam ser gerados e
30
utilizados. Os processos de escolarização não se restringem a alfabetização, tanto é que a escola
não é o único lugar em que se pode ocorrer o processo de alfabetização, cada faixa etária
(crianças, jovens e adultos) estabelece um modelo para que possam ser alfabetizados.
Segundo a autora, o ganho da leitura e escrita, não garante um bom nível de letramento,
e nem só a alfabetização está sendo garantida para a população brasileira. No Brasil o
letramento e analfabetismo se resulta na definição por parte do IBGE, no qual se evidencia o
índice de “analfabetismo funcional”.
Atualmente, os livros didáticos vêm promovendo uma interação entre alfabetização e
letramento, em ação de formação continuada de professores da educação básica. Portanto, para a
autora, não se deve separar letramento da alfabetização, da escolarização e muito menos da
educação, pois todos buscam tornar a sociedade melhor e mais culta.
Mortatti em suas considerações finais, constata que não há uma conclusão para o tema
no livro abordado, a relação entre educação e letramento. Seu objetivo era o de dar suporte
teórico para pesquisadores ou acadêmicos que pretendem estudar sobre o tema. Ressalta que,
educação e letramento possuem um inter-relacionamento, ao se ampliar o conceito de educação,
os sentidos de alfabetização também se modificam. Conclui a importância de se discutir sobre
analfabetismo, alfabetização e educação, como meio de superar toda uma dívida com os
excluídos da participação social, cultural e política do país.
Diante de todo o exposto, é possível fazer considerações importantes sobre a obra
resenhada. Por trazer a análise do tema, educação e letramento, abre vários leques para uma
pesquisa acadêmica, sendo esse o objetivo da coleção a qual pertence. Traz profundas
contribuições para discussões a respeito do analfabetismo no Brasil, um tema atualmente
polêmico. Portanto, essa obra traz uma base teórica riquíssima para pedagogos ou pesquisadores
e acadêmicos que têm interesse no tema educação, alfabetização e analfabetismo no Brasil.
ANEXO V
RESENHA
BARBOSA, J. J. Alfabetização e leitura. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1997.
Keila Cristina Barbosa da Silva - UEM1
Fernanda Cristina de Souza – UEM2
José Juvêncio Barbosa, professor Formado pela Universidade de São Paulo, na época
em que o livro foi escrito trabalhava na Fundação para o Desenvolvimento da educação,
coordenando projeto na área de documentação sobre alfabetização. Possui artigos importantes
publicados como, por exemplo, Alfabetização: catalogo da base de dados.
O livro Alfabetização e Leitura teve sua primeira publicação em 1990, posteriormente a
segunda em 1994 e a versão mais recente (terceira edição), sendo publicada em 2013. A obra
1 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
keila.cris02@hotmail.com 2 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
fernandamily@outlook.com.
32
objeto dessa resenha foi a segunda edição, da Coleção Magistério 2º grau- Serie formação do
professor. A obra foi escrita no período entre a constituição de 1988 e a elaboração da LDB de
1996, período que trouxe importantes contribuições para a educação brasileira.
Barbosa, faz uma pesquisa historiográfica trazendo os indícios de metodologias para se
alfabetizar encontrados na história, constituindo uma documentação de dados históricos, e
evidenciando os fatos e necessidades que fizeram com que estas metodologias fossem
modificadas e aprimoradas. A obra é dividida em duas partes, onde na primeira estão explicitas
questões relacionadas a alfabetização e leitura. A segunda parte traz questões a serem pensadas
pelo alfabetizador. Aponta de modo geral que não é somente por meio das intervenções de
ensino que a aprendizagem de fato acontecerá, mas também pelas assimilações e
reinterpretações realizadas pelo educando do conteúdo passado por estas intervenções.
Na primeira parte o autor relata sobre o analfabetismo, a história da escrita e uma breve
história das metodologias. Os anos passam e com eles surgem as modificações necessárias para
acompanhar as demandas de cada época, com a alfabetização não foi diferente, somente em
1789(marco inicial) ainda com a escola republicana vigente, que a alfabetização começa a ser
moldada para o modelo que vemos hoje, antes o processo de escrever era visto separado da
leitura e consistia em uma educação individual, pois somente os pais mais favorecidos podiam
custear os preceptores de ensino para seus filhos. No século XIX essas duas práticas começam a
caminhar juntas, logo em 1815 tem-se a publicação do guia do ensino mutual a fim e orientar
este novo ensino. Começa-se a expandir o ensino para as crianças do povo também, logo os pais
aceitavam por acreditar ser a saída do serviço pesado do campo.
Parte da população possui a capacidade de ler e escrever devidamente, porem muitos
ainda não adquiriu tal processo sendo eles assim analfabetos, logo devido a grande precisão de
Mão de obra qualificada o analfabetismo tem sido um grande problema a ser enfrentado.
Encontra-se também o analfabeto funcional sendo aquele que não domina todo o processo, mas
parte dele. Gera-se a disputa de métodos a fim de encontrar a melhor forma de alfabetizar. Por
muitos anos prevaleceu o método sintético que hora fora julgado um método lento e mecânico.
Mas no início do século XIX este se aperfeiçoa, mudando a ênfase do nome da letra para o som
da letra. Outro importante método fora o analítico- sintético (global) que se concretiza com base
na psicologia da forma ou Gestalt no final do século XIX. Em 1876 surge a importante cartilha
maternal do poeta João de Deus. A partir de 1930 o número de cartilhas cresce bastante, como
33
também os manuais para os professores que subsidiavam o trabalho, mas não dava suporte
algum ao aluno. Segundo Barbosa (1996, p. 56) as cartilhas "Concretizam o modelo idealizado
pelas metodologias tradicionais, tornando o ensino da leitura uniforme, cumulativo e
homogêneo."
Mais adiante surge a psicogênese da língua escrita, onde a base passa a ser na psicologia
genética de Piaget centrando as investigações na assimilação do sujeito, no que ele já sabe e de
acordo com a sua capacidade de aprendizagem. No Brasil Lourenço Filho traz os testes ABC,
avaliando aptidões e habilidades precisas para que a criança possa ser devidamente alfabetizada.
A partir dos anos 50 acontece a fusão entre Psicologia e linguística, gerando a Psicolinguística
que se preocupa com as relações entre linguagem e pensamento, logo Barbosa (1994, p. 88)
evidencia suas bases " De início, esses estudos tiveram por base os postulados neobehavioristas,
que já concebiam uma mediação interna entre o estimulo e resposta dos behavioristas."
Na segunda parte, Barbosa aponta sobre fatores que vem influenciar na leitura. Até o
final do século XVIII, os leitores tinham um prazer por ler que não se restringia apenas à leitura
mais a todo conteúdo que o livro trazia inclusive a parte estética. “Até o final do século XVIII,
os livros eram muito diferentes do que são hoje, e o prazer do leitor não se limitava apenas no
texto: havia um prazer estético, ligado a aspectos gráficos” (BARBOSA, 1992, p.96). A leitura
era algo restrito e era encontrada apenas em livros, diferente dos dias atuais, que são
encontradas em diversos lugares com cartazes, placas de transito, nos alimentos, afinal em
diversos luares do cotidiano.
Na antiguidade, os textos eram transmitidos de forma oral, por que assim os filósofos
acreditavam que tinha uma maior compreensão. “O diálogo, estratégia básica de transmissão e
avanço do saber “[...] O escrito era visto como sucedâneo do oral e, assim, pouco valorizado”
(BARBOSA, 1992, p.97). Um exemplo é Sócrates que nada escreveu, assim como Buda. Na
idade média, a escrita desaparece, um motivo é o monopólio da igreja católica. “É bastante
severa a censura estabelecida pela Igreja, seja através das obras selecionadas pela transmissão
no pergaminho, seja através da prática usual do raspar manuscritos antigos para neles fazer
novos escritos" segundo Bárbara Giovannini apud (BARBOSA, 1992, p. 98). Nesse período
ensinava-se para as crianças em Latim, e para aprender elas tinham que decorar o conteúdo.
Os textos eram lidos em voz alta por acreditar que para ler precisava ouvir o som das
palavras, existia um local reservado para a leitura, onde poderia ler em voz alta o que foi
34
captado pelos olhos. Isto até Santo Agostinho começar a analisar os costumes de Santo
Ambrósio que lia apenas com os olhos, uma leitura silenciosa. “Uma nova concepção de leitura
despontava: a leitura silenciosa, onde o sentido do texto é produzido sem o intermédio do som.”
(BARBOSA, 1992, p.100). Surge então um novo tipo de letra, a Carolina, junto com ela os
espaços em branco entre as palavras, a introdução de sinais de pontuação e a ortografia da
língua latina, foi levada a cabo pelos gramáticos de Carlos Magno, esses reduziram os
obstáculos para a leitura.
No século XVIII os escritores não tinham grande importância, e geralmente não
sobreviviam de suas obras, eles vendiam as obras por um preço estipulado e a editoras que
lucravam mais com as obras. Não se dava muito valor aos romances, pois eles não eram vistos
com bons olhos.
Em 1761, porém, Rousseau publica o romance La Nouvelle Héloise, talvez o maior
Best-seller do século XVIII, que provocou a primeira epidemia de emoção da história da
literatura. A procura de exemplares ultrapassou o fornecimento dos livreiros chegara a alugar o
livro por dia e até por hora. A partir de Rousseau, cria-se o novo mito do culto do escritor. No
campo recém-surgido da história da leitura, esse fato marca uma revolução da leitura, ocorrido
na Europa quase no fim do século XVIII. (BARBOSA, 1992, p. 105) Neste século, os livros
começam a tocar sentimento das pessoas, é quando surge e expressão: ler chorando.
Nos dias em que se passa o período do livro, o autor mostra que a escrita está presente
em nossa vida no dia a dia, em todos os momentos. Existem diversos tipos de textos e formas de
leituras, por isso não podemos adotar um padrão para todas as leituras. É importante que o leitor
saiba interpretar o texto e não apenas decodificar os códigos, isso é importante tanto para ler um
livro de poesias quanto uma bula de remédio, por que não basta saber ler se não souber receber
a mensagem que texto traz.
Durante muito tempo acreditava-se que para aprender a criança precisava apenas de
repetição, e não se levava em conta a interpretação. “No caso do ensino da leitura, essa
concepção levava a crer que era suficiente o professor mostrar a palavra escrita (mesa, por
exemplo) para a criança perceber e reproduzir o estimulo (mesa)” (BARBOSA,1992, p.128).
Muitas crianças não querem aprender a ler
Um dos motivos que pode levar a criança a não querer aprender a ler é o risco que toda
aprendizagem supõe. O medo de enfrentar uma situação desconhecida, o receio de não ser
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capaz, “[...] tudo isso pode desenvolver na criança um bloqueio que dificulte a aprendizagem”.
(BARBOSA, 1992, p. 135)
Assim, para se ensinar uma criança o processo da leitura é preciso mostrar à ela a
importância de saber ler para assim ir despertando o interesse dela, para que ela não veja isso
apenas como uma imposição.
Durante o momento de aprendizagem da leitura devem ser valorizados na criança os
diversos tipos de texto que ela tem contando explorando se ela consegue interpretar que
mensagem está sendo passada ali. O professor nesse momento deixa de ser apenas um
transmissor de conhecimentos e passa a ser aquele que vai estimular e orientar na aprendizagem.
“O professor deixa de ser um mero transmissor de conteúdos e técnicas e assume o papel de
orientador, de facilitador da aprendizagem.” (BARBOSA, 1992, p.137). Não se pode dizer que
existe um método para se ensinar a leitura, “Não devemos imaginar que seja possível a
existência de uma metodologia de ensino perfeita [...] “(BARBOSA, 1992, p. 139), como
estamos discutindo sobre o assunto, existem vários fatores que influenciam nesse momento de
aprendizagem.
A Coleção Magistério 2º grau - Serie formação do professor, tem como objetivo orientar
professores da formação de docentes, dando um suporte para o estudo. O livro traz um
conhecimento geral sobre a área de alfabetização e leitura sendo assim uma base para os estudos
da área. No final de cada tópico tem atividades complementares, sugestões de leituras para um
aprofundamento em cada assunto. O livro tem uma linguagem acessível, sendo de fácil
entendimento.
ANEXO VI
RESENHA
CARVALHO, Marlene. Alfabetizar e letrar: um diálogo entre a teoria e a prática. 8 ed.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2005.
Mariana Silveira Araujo - UEM1
Thais Goerll - UEM2
Este trabalho tem como base a análise a obra Alfabetizar e Letrar: um diálogo entre a
teoria e a prática, livro que traz relatos de experiências em alfabetização e letramento, como o
próprio nome já diz. Escrito pela Autora Marlene Carvalho, a qual lecionou durante mais de dez
anos em escolas municipais enfrentando as dificuldades que aborda no livro. A mesma é
formada em pedagogia pela UFRJ, onde fez seu Mestrado em Educação, concluiu seu
Doutorado na Bélgica onde escreveu uma tese sobre alfabetização. No momento é professora do
1 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
mariana.silveira@hotmail.com 2 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
thaisgoerll@hotmail.com
37
mestrado em Educação da UCP e assessora pedagógica do Programa de Alfabetização de jovens
e adultos pela UFRJ.
O livro traz uma literatura que relata experiências gostosas de serem lidas e analisadas, a
autora ainda cita grandes autores, um deles é Graciliano Ramos em relatos de experiência de
leitura e não compreensão de palavras como “terteão”, o que seria isso na visão de uma criança?
Era necessário que os preceptores ou professores, estivessem mais preparados para essa
“empreitada” de ensino aprendizagem. Carvalho traz conhecimentos acerca da alfabetização e
seus métodos, teorias e experiências de funcionamento dos mesmos, e também revela
conhecimentos relacionados ao letramento, como a apropriação da leitura, quais a séries se
enquadram na mesma, como o professor deve trabalhar em relação à aplicação desse letramento
e o uso de auxílios como a contação de histórias, poesias, cartas, entre outros meios que levarão
a futura alfabetização.
Na primeira parte do livro a autora traz alguns relatos angustiantes, onde observamos
que os métodos de ensino a leitura e escrita estão ligados a forma com que são ensinados,
compreendem-se que os mesmos dever ser ensinados com cautela, e não como uma obrigação.
Se o tutor ensinar com paciência o aluno aprenderá com mais facilidade, se não a dificuldade já
começará ai. Já se tratando da teoria, ela traz três teorias que tentam explicar como a criança
aprende: por meio de estimulo e resposta (associação), a ação do sujeito sobre o objeto
(construtivismo, proposto por Piaget) e pelo sóciointeracionismo (ação do sujeito sobre o objeto,
vista pelo aprendiz e compreendida pelo mesmo). Temos ainda neste início algumas situações
que dificultam todo o processo de ensino, como as condições inadequadas das escolas com
turmas muito numerosas, materiais didáticos e equipe pedagógica sem muito preparo e
estruturas precárias de salas auxiliares. Se tratando do ambiente não escolar as dificuldades
também existiam, pois, as famílias muitas vezes eram iletradas, a iniciação do aluno era tardia
no âmbito escolar, faltava acesso aos materiais, pois em sua maioria isso acontecia com famílias
de baixíssima renda. Porem a autora ressalta que estes não eram motivos que justificavam o
“fracasso escolar”, pois cada caso e um caso.
A educação se transforma conforme a necessidade da sociedade. Observamos isso em
nossos estudos cotidianos, e em relação à obra temos o exemplo do voto, apenas o saber
escrever o nome já dava ao cidadão o direito a voto, porém o mesmo escreve seu nome, mas não
deve compreender as letras. Temos ainda a falha do sistema educacional, pois as pessoas tinham
38
o conhecimento das letras à medida que fosse necessário assinar um nome, ou passar um recado,
aqui então à autora mostra a necessidade da escola pública, pois a mesma leva as pessoas a
conhecerem e compreenderem melhor letramento e alfabetização, para que pudessem
desenvolver funções maiores. Mas não eram apenas os alunos que passavam por desigualdade,
os professores, também sofriam com isso, como até hoje existe essa diferença, um exemplo é a
sala de aula cheia de alunos, para um único profissional dar conta. É necessário que o mesmo
esteja ciente de um método de aplicação, ainda que o método não seja o centro, ele é importante.
Quando estudado o construtivismo de Piaget, haveria maior compreensão, sendo assim método
e prática poderiam caminhar juntos, mas a autora nos traz que faltava tempo para a realização
dos estudos no momento. Não ignorando o método já citado acima, ela ainda s traz o sintético
(letra-som, ou silaba-palavra) e o analítico (contação, oração ou frase), é necessário ainda a
quem vai ensinar, compreender o porquê escolheu o método que vai trabalhar, a fundamentação
teórica do mesmo, observar o material que será usado se é de fácil acesso entre outros.
Depois de citados os métodos, Carvalho leva-nos a entender um pouco melhor a
silabação, que se trata da separação das letras e silabas, baseia-se inicialmente em compreender
as letras, para depois unificá-las e formar as palavras. A silabação era aplicada através de
cartilhas, porém não foi muito eficaz pelo fato de não trazer o real aprendizado, o uso das
cartilhas era de certo modo rigoroso e perdurou por um bom tempo. A cartilha é usada até os
dias de hoje por alguns professores, muitas delas nem constava o nome do autor, o método
ensinava combinações entre letras e sons, o ensino das letras e palavras aconteciam muitas
vezes, ainda que não compreendido o significado, mas por meio da memorização, entretanto a
leitura propriamente dita ficava para uma segunda etapa, onde o aprendiz já consegue associar
palavras a objetos, ou entender a palavra ou texto por inteiro, pelo fato de o mesmo possuir um
contexto e não estar embasado na cartilha.
Temos também o método fônico, tem o objetivo de fazer com que a criança se volte para
a sonoridade das palavras e em seus fonemas, aqui a autora traz que a criança consegue
compreender frases, pois não acontece à memorização, onde ao compreender os sons, o aluno
vai entendendo a palavra e o seu significado. No Método da abelhinha de Alzira S Brasil da
Silva; Lúcia Marques Pinheiro e Risoleta Ferreira Cardoso, primeiro é necessário a sintetização
dos sons, conforme a união das palavras e depois a análise delas pela separação dos sons das
mesmas, esse é conhecido como método Misto sintético-analitico, e segundo as escritoras não
39
devemos confundi-lo com soletração/silabação. A casinha Feliz de Iracema Meireles, método
que se relaciona a uma forma mais lúdica do aprendizado, onde teatros são usados para ensinar
a ler e escrever, o qual demorou um pouco para achar uma forma de seu funcionamento, mas
teve um resultado positivo e fez até que houvesse a introdução do mesmo em uma escola
pública da época. Para a aplicação de ambos é necessário que o professor esteja preparado com
uma fala eloquente, onde não exista uma dificuldade de entendimento das palavras, havendo
também diferentes formas de se caracterizar palavras e sons por exemplo.
Ao contrário dos métodos fônicos que partem da palavra curta até a simples, temos os
globais, onde o apego não está no “pequeno” e sim parte da visão geral para a particular,
primeiro é necessário que o todo seja compreendido, e depois os detalhes. Nesta metodização é
feito o uso de contos, do ideovisual de Declory, Natural de Freinet, onde a criança aprenderá por
textos que as interessem e estejam relacionados às suas experiências, Marlene ainda nos traz
métodos como o de Paulo Freire, o natural, entre outros.
Ainda na fase da alfabetização esse capítulo nos traz o uso de textos para a alfabetização,
sendo o mesmo um campo muito amplo a ser explorado e trabalhado. Esses textos podem ser
trabalhados de várias maneiras, de forma escrita, através de histórias narradas, poesias cantadas,
interpretação da história contada, feita pelo aluno, ou seja, releitura da história na visão dos
alfabetizando, entre outros. É importante aqui que a criança compreenda que a maneira que a
história será contada não pode ser a mesma que ela será escrita, pois para escrevê-la é
necessário “seguir as regras” da língua portuguesa. Carvalho traz dicas de como trabalhar os
textos, como decidir qual será o assunto trabalhado, trazendo ainda opções de atividades para
serem aplicadas em sala.
Na segunda parte do livro Marlene Carvalho traz um maior entendimento acerca do
letramento, ainda que para muitas suas funções aparentemente estejam relacionadas, alfabetizar
e letrar possuem uma grande diferença de conceito. Carvalho relata que, alfabetizar é ensinar o
código alfabético e letrar é familiarizar o aprendiz com os diversos usos sociais da leitura e
escrita, sendo assim ela nos traz que ser uma pessoa alfabetizada, é ser alguém que sabe
identificar os códigos das letras e palavras, sabem formar algumas frases e até textos simples,
todavia ser alguém letrado é ter um maior conhecimento das palavras, onde textos de conteúdos
mais complexos são compreendidos quando lidos, o que mostra que o indivíduo em questão é
40
alguém que teve uma boa apropriação da escrita e da leitura, podendo se utilizar das palavras,
frases e textos para exercer uma função social.
Neste momento ainda é abordado o analfabetismo no Brasil, as causas que o cercam
como o desemprego das famílias impossibilitando as crianças a terem acesso a escola, e até
mesmo os adultos que não tem o conhecimento. Porém em países onde o analfabetismo já está
superado, o objetivo da escola é formar o indivíduo, um indivíduo letrado. Para formar um
indivíduo letrado é necessário um trabalho gradativo da escola, sendo o mesmo não rigoroso.
O letramento traz um maior entendimento para leituras, existem vários tipos de leituras,
mas o gosto pela mesma nem sempre existe, uns gostam por verem seus familiares lendo, outros
por simplesmente gostar e outros precisam desenvolver esse gosto literário, nem sempre é fácil
mais é possível. Vale ressaltar aqui que o professor se bem preparado é o mais apto a
desenvolver esse gosto na fase da alfabetização, depois de concretizado esse processo o
letramento fará uma diferença enorme para a vida pessoal, profissional e cultural do aluno em
questão. Para haver o letramento é necessário um trabalho bem desenvolvido, e o entendimento
de que muitos alunos têm dificuldade de aprendizagem, às vezes por mera insegurança, então
não basta apenas conhecer o conteúdo a ser aplicado, é necessário reconhecer que cada um tem
seu ritmo e respeitar isso.
Para alfabetizar letrando é preciso que haja um trabalho intencional de sensibilização,
através de atividades de comunicação. A criança deve ser mediada pelo professor de modo a
entenderas variações de escritas, de acordo com cada gênero textual e com os objetivos do autor
para cada texto. Tendo isto em vista, Carvalho mostra diferentes tipos de textos que devem ser
trabalhados ao decorrer Ensino Fundamental, como por exemplo: As narrativas, listas, poemas,
receitas de cozinha, quadrinhos, bilhetes, convites, cartazes, diários, textos didáticos,
reportagens, relatórios, bulas e instruções. Tento em vista observar como cada texto tem sua
função social, o local que será encontrado, como e a quem deverá se destinar e a “silhueta” do
texto, ou sejas, as formas gráficas, o autor do texto, os objetivos deste autor, o assunto a ser
abordado, o título e o gênero textual do qual o texto se trata.
Em seu último capítulo, Carvalho ressalta que os três campos de conhecimento que
produzem maior parte dos trabalhos científicos relacionados com a alfabetização e a formação
de profissionais desta área é o campo da linguística, da pedagogia e da psicologia. Ela apresenta
depoimentos de alunas que participam das pesquisas práticas de leituras e escritas do Ensino
41
fundamental, onde podemos notar muitas ideias distintas em relação à alfabetização, em que as
próprias professoras precisavam naquele momento de respostas para questões que nem elas
conseguiam resolver no âmbito de sala de aula. Notamos também no relato das educadoras que
a posição da alfabetização é um tanto quanto delicada, pois as mesmas mudavam seus
procedimentos pedagógicos conforme mudava o governo e a equipe da escola. Ao final das
entrevistas, após relacioná-las com a teoria vista no conteúdo do livro dos capítulos um e dois,
podemos perceber que encontramos ecos de construtivismo Piagetiano, quanto às práticas de
alfabetização. Notamos também que o método fônico e a palavração são as bases dos trabalhos
das educadoras da entrevista, pode se dizer também que as mesmas aplicam métodos mistos.
Carvalho nos coloca essas pesquisas, a fim de que possamos nos questionar e argumentar sobre
as metodologias utilizadas pelas educadoras.
Ao final de seu livro, Carvalho nos traz uma incrível exposição abordando como nós
professores devemos nos posicionar diante da alfabetização, ela nos expõe uma crítica aos
professores que utilizam de receitas para alfabetizar, acreditando que todos os alunos devem ser
tratados da mesma maneira e que todos têm o mesmo ritmo de aprendizado. Ela propõe que o
correto é deixar o aluno expor seus conhecimentos e que nos professores devemos fazer troca de
ideias com nossa turma, fazer leituras em voz alta, mostrar coisas escritas que as crianças não
têm contato ou não conhecem, deixar que eles ajudem uns aos outros e por fim nos coloca algo
que é muito interessante, que o professor tem que estudar também junto com seus alunos e
também nos diz que podemos criar, inovar, e que isso dará uma forma muito mais gratificante
de trabalho.
Ao estudarmos a obra de Marlene Carvalho, foi possível abrangermos conhecimentos
mais profundos, como a significativa diferença entre alfabetizar e letrar, assim como o uso de
relatos de experiências pessoais e até mesmo o de outros autores, acabou por ampliar a nossa
visão em relação a erros frequentes e nem sempre notáveis, na aplicação de conteúdo, na forma
de tratamento do aluno por preceptores, ou cuidadores responsáveis pelo ensino das letras, entre
outros. As atividades trazidas pela escritora ainda nos ensinaram muito, pois, as mesmas nos
trouxeram uma base teórica acompanhada de grande teor de conhecimento, principalmente no
que se relaciona a alfabetização. A leitura da obra de Carvalho foi de grande aprendizado para
nós.
ANEXO VII
RESENHA
TRINDADE, I. M. F. A Invenção de uma nova ordem para as cartilhas: ser maternal,
nacional e mestra. Queres ler? 2001. 524f. Tese (Doutorado) – Curso de Doutorado em
Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2001.
Caroline Domenech - UEM1
Jéssica de Paiva Gonçalves – UEM2
Iole Maria Faviero Trindade é graduada em Pedagogia pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, fez mestrado e doutorado em Educação pela mesma universidade. Possui vasta
experiência na área da alfabetização, com ênfase na atuação sob os temas: Alfabetização e
letramente, cartilhas e livros didáticos de alfabetização, discursos entre outros, centrados
principalmente em seu estado natal o Rio Grande do Sul. Na atualidade é professora aposentada
1 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
carol_domenech@hotmail.com 2 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. Endereço eletrônico:
jessyca_paiva@hotmail.com
43
pela universidade supracitada. A tese aborda a história das cartilhas e demais materiais
destinados a alfabetização no Rio Grande do Sul, a partir da adoção por esse estado da “Cartilha
Maternal ou Arte do Aprender” logo após a proclamação da República, o trabalho destina-se a
estudantes envolvidos com a educação e profissionais como professores e pedagogos.
A autora inicia a exposição de sua tese apresentando uma breve biografia de João de
Deus, relatando entre outras informações que ele nasceu em Portugal em 1830, se formou em
Direito, mas nunca atuou na área e que escreveu a Cartilha Maternal em 1876.
Ao falar da mesma, evidencia o quanto a Cartilha é considerada polêmica quando
lançada, pelas diferenças metodológicas que apresenta em relação a materiais destinados ao
ensino de leitura e escrita já consolidados em Portugal. Fala também do êxito do material que
chega a ser adotado nas chamadas “escolas móveis” em Portugal com o intuito de levar escola
em todas as localidades que precisassem, combatendo o analfabetismo. E mais tarde também
nos Jardins- Escola João de Deus cuja principal característica é a iniciação a leitura a partir dos
cinco anos e meio.
Trindade apresenta detalhadamente as principais características dos dois métodos
consolidados em Portugal e que inevitavelmente confrontaram com o método de João de Deus,
respectivamente o de João de Barros denominado “Cartinha de aprender a ler” (1539), e o de
Antônio Castilho chamado de “Método Português”.
O primeiro caracterizado por apresentar todas as letras do alfabeto em sua ordem
habitual, e exigir que todas as letras fossem decoradas para então formar silabas e finalmente
palavras, esse método é classificado como de soletração.
Já o método português de Antônio Feliciano Castilho não seguia a ordem alfabética para
ensinar as letras, e antes de apresentar a grafia das letras o professor devia ensinar o som de
cada uma para quando as crianças aprendessem a desenhá-la já conhecessem seus valores. Outra
diferença desse método em relação ao de João de Barros era a valorização dos princípios do
método intuitivo, baseado na atividade no movimento na experiência. Assim, o método de
Castilho passa a ser visto como uma inovação e os seus defensores passam a julgar o método
anterior quase uma tortura para a criança.
Finalmente quanto ao método de João de Deus expresso na Cartilha Maternal (1876),
Trindade coloca que o mesmo sustenta o princípio de que as mães seriam as mais indicadas para
ensinar a criança a ler e escrever, pois teriam nessa tarefa a mesma facilidade que possuem no
44
ensino da fala. E também o princípio de que o ensino deve ocorrer de forma natural para a
criança, seguindo uma sequência lógica para a mesma.
No método de João de Deus as letras seriam apresentadas, por “grupos”, primeiro o
grupo das vogais (chamadas pelo autor de “vozes”) e seus valores fonéticos e depois os grupos
das consoantes (chamadas de “articulações”) e seus valores. A cada grupo trabalhado palavras
com as letras estudadas seriam formadas, assim como seriam discutidos os seus significados,
esse último passo é um ponto importantíssimo do método.
Trindade, ao falar do uso do método, coloca que mesmo antes de sua edição, em
Portugal e também no Brasil, já se ensinava com o mesmo. No Brasil, Joaquim Teixeira de
Castro o Visconde de Arconzello foi um adepto do método, reconhecido pelo seu
comprometimento em divulgá-lo por aqui, de forma que diversas edições da Cartilha Maternal
lhe foram dedicadas. Outros nomes como Pessanha Povoa e Antonio Silva Jardim são citados
pela autora, como empenhados divulgadores do Método. Conforme coloca Trindade, o autor se
empenhava e acompanhava esse processo de disseminação tanto em Portugal como em outros
países como no Brasil, sempre se comunicando com seus “discípulos” por meio de cartas, em
uma dessas cartas o professor universitário português Zeferino Cândido em meio as palestras de
divulgação que veio proferir no Brasil, referem-se a João de Deus que, aparentemente, tinha até
mesmo o apoio de D. Pedro II.
Trindade fala ainda de modificações ocorridas na cartilha a partir do início do século
XX, como a retirada das “notas” de roda pé da mesma, para serem publicadas separadamente
em forma de Guia. Em 1912 o título de capa passa a conter somente “Cartilha Maternal” e o
restante dele “...ou arte de leitura” aparece somente na folha de rosto. A segunda parte da
cartilha que continha textos e era intitulada “Deveres dos Filhos”, perde esse título e é publicada
como integrante do todo da cartilha, também nesse ano aparecem as Ilustrações na capa
(ramalhete de flores e uma borboleta) e contra capa (mulher lendo juntamente com uma
menina).
Segundo a autora, o método continua sendo utilizado até os dias atuais em Portugal,
principalmente nos Jardins-Escola João de Deus, que utilizam a cartilha pouco antes das
crianças completarem seis anos até os oito anos mais ou menos, os alunos avançam nas lições
conforme seu próprio ritmo, assim dificilmente todos seguem as mesmas lições aos mesmo
45
tempo, e nesses jardins as professoras contam com o auxílio de alunos e alunas da Escola de
Educação Superior João de Deus.
Após apresentar João de Deus e a Cartilha Maternal, assim como os materiais com os
quais a mesma confrontou em Portugal e também falar sobre a introdução da mesma no Brasil, a
autora no capítulo dois discorre sobre o contexto brasileiro no final do século XIX e início do
XX, que acaba favorecendo a introdução de novos métodos e maneiras de ensinar nas escolas do
país. Assim, fala que no Brasil a partir da metade do século XIX as escolas eram precárias,
introduziu-se o método mútuo no país, com o intuito de maximizar o número de alunos
atendidos, essa iniciativa fracassa tento por principal motivo a transferência da responsabilidade
de expandir as escolas públicas do governo central para os regionais e o custo para subsidiar o
método mútuo julgados nesse momento alto.
No início do século XX com a mudança da ordem política e social, ou seja, quando o
Brasil deixa de ser império e passa ser república, as ideias que embasam essa nova ordem
vindas do iluminismo e difundidas principalmente a partir da revolução francesa, requerem
cientificidade para educação. O método considerado adequado ao ideário republicano é o
intuitivo, uma vez que o mesmo se baseia na racionalidade, no trabalho com o concreto e na
valorização da experiência por parte do aluno.
O método intuitivo assim como o mútuo terá dificuldades para ser desenvolvidos no
país, uma vez que requer certa estrutura por parte das escolas e qualificação dos professores.
Dessa forma Trindade segue discorrendo como ocorreu a implementação do método intuitivo no
caso do Rio Grande do Sul começando pela iniciativa no estado de formar grupos escolares.
Os grupos escolares considerados uma forma de racionalizar a organização estrutural e
administrativa das escolas, assim reuniriam todas as escolas isoladas de uma determinada região
em um prédio que de preferência deveria ser localizado na área urbana central, pois
representariam a mudança trazida pela república.
A preocupação higienista influencia tanto na localização dos prédios como nas
instalações que teriam que ter, como ventilação, luz e espaços adequados, como quantidade de
salas para instalar as turmas e biblioteca, refeitório, secretaria etc. A preocupação higiênica se
justificava pelo zelo com o desenvolvimento das crianças, visando assim eliminar qualquer
empecilho ao mesmo. Desta forma, segundo a autora, as escolas desse período acabam sendo
produto dos discursos político, pedagógico, higienista e da área da construção, com os
46
engenheiros e arquitetos. Outra característica marcante dos prédios construídos, pelo menos
inicialmente, foi a preocupação estética, muitos deles eram tidos como monumentais, e isso se
justifica pela já citada função das escolas de serem expoentes das vantagens da ordem
republicana.
A questão da mobília adequada também é ressaltada pela autora, pois principalmente as
carteiras deviam seguir regulamentação especifica que proporcionasse aos alunos de várias
idades as condições necessárias a seu desenvolvimento, sem prejuízo de sua saúde.
Com a implementação do método intuitivo para o ensino nas escolas é adotado também
o modo simultânea, e mais especificamente para o ensino da leitura e escrita o método de João
de Deus é adotado no estado oficialmente em 1899.
Trindade analisa relatórios dos inspetores de ensino do Rio Grande do Sul, com o intuito
de analisar como ocorreram essas mudanças de método e formas de ensinar seguindo as
determinações oficiais. Segundo a análise de Trindade os inspetores em suas visitas as escolas
analisavam além da estrutura e o empenho do professor se o método intuitivo e o modo
simultâneo de ensino estavam sendo utilizados e como se encaminhava o ensino da língua
portuguesa em lugares onde predominavam outras línguas, principalmente a alemã. Essa
questão é relacionada pela autora a necessidade de consolidar a unidade nacional, por conta da
implementação da republica, era importante que apesar da diversidade cultural derivada da
imigração que ocorre principalmente após a abolição da escravatura, as pessoas se sentissem
parte de uma nação e passassem a ter características em comum, como o domínio da língua
oficial.
Outra mudança importante que ganha destaque juntamente as mudanças metodológicas é
a predominância feminina em relação ao magistério, essa mudança que segundo Trindade vem
ocorrendo desde a metade do século XIX se consolida no início do XX de forma que essa passa
a ser uma profissão considerada essencialmente feminina.
Os relatos dos inspetores falavam sobre a forma tranquila como ocorria a transição entre
os métodos consolidados até então, para os determinados recentemente, mas indicavam
eventuais problemas que acabavam por interferir nesse processo. Um problema citado quanto ao
modo de ensino simultâneo é a questão das faltas por parte dos alunos que não poderiam
ocorrer, uma vez que prejudicaria a continuidade do ensino, esse problema era recorrente nas
áreas rurais, onde os alunos, principalmente os meninos tinham que ajudar seus pais no trabalho.
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Com relação ao método de ensino para a leitura e escrita de João de Deus, também
foram constados problemas em sua implementação, uma vez que os professores tinham
dificuldade em abandonar os métodos sintéticos que utilizavam até então. O método de João de
Deus segundo a autora foi adotado oficialmente juntamente com o método intuitivo e o modo
simultâneo, por ter sido desenvolvido visando minimizar o sofrimento da criança e por
valorização a analise fonética das palavras estimulando a observação e a reflexão, visando a
atribuição de sentido por parte da criança. Assim, segundo Trindade o método se aproximava
das ideias de ensino modernas.
O modo simultâneo também foi adotado, juntamente com os métodos citados acima,
segundo Trindade isso ocorre por que o mesmo oferecia uma forma de organizar as classes de
forma a dedicar o espaço e tempo necessário a cada matéria segundo as recomendações do
método intuitivo. O método de João de Deus tem sua ligação com o modo simultâneo, por
permitir que o ensino seja feito em grupos se não com toda a sala. Isso se dá pela existência dos
quadros parietais, recomendados por João de Deus para além da cartilha, nesses quadros as
lições das cartilhas apareciam em letras grandes. Apesar de João de Deus recomendar o ensino
individual, a existência desses quadros permitia o ensino simultâneo.
A adoção dos métodos citados acima de forma oficial no Rio Grande do Sul e no
restante do país, no entanto com diferenças e peculiaridades de cada contexto, exigiam além da
mudança estrutural, também a distribuição de materiais adequados. Nesse sentido, Trindade
encontra em sua pesquisa, pedidos por parte das escolas justificados pela adequação as
recomendações oficiais. As lousas individuais teriam que ser substituídas por cadernos e livros
iguais para todas as classes, e o quadro ou murais adequados para o modo simultâneo de ensino,
haviam também pedidos de instalação de bibliotecas com obras e outros materiais para o
aperfeiçoamento dos professores.
Com relação ao método João de Deus, também são descritos os materiais necessários.
Assim, além das cartilhas deveriam ter os quadros parietais, o tripé para colocar esses quadros e
o ponteiro para indicar onde o aluno deveria ler. Esses materiais também eram requeridos pelos
diretores e inspetores para a efetiva utilização dos métodos oficiais.
Trindade analisou também atas e documentos dos órgãos oficiais, responsáveis no Rio
Grande do Sul por avaliar os materiais didáticos produzidos no estado, a fim de manter a
unidade em relação aos métodos adotados oficialmente. Com relação ao ensino da leitura, os
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materiais como pré-livros, cartilhas e livros de leitura aprovados e adotados oficialmente para o
ensino nas escolas públicas deveriam se basear no método de João de Deus.
Para esclarecer, o pré-livro segundo a autora se tratava de um material de preparação
para a alfabetização, as cartilhas eram para o efetivo ensino da leitura e escrita e os livros de
leitura eram utilizados para exercitar a leitura de forma que os alunos adquirissem fluência.
Esses materiais também eram requeridos pelos diretores e inspetores para a efetiva utilização
dos métodos oficiais.
No capítulo três vários materiais e seus respectivos autores são citados pela autora, a
mesma busca ressaltar os materiais adotados pelo governo para a instrução pública. No entanto,
Trindade coloca que para os materiais serem aprovados e adotados teriam que se aproximar
muito da metodologia de João de Deus e os autores tinham um pouco de dificuldade em adequar
seus métodos as exigências oficiais do Estado, mas surge uma cartilha praticamente idêntica a
Cartilha Maternal de João de Deus, sem autoria apenas denominada “A Cartilha primária/
Primeiro livro por um professor” que é adotada oficialmente, em função de brechas na lei
referente aos direitos autorais no Brasil. Essa Cartilha e outras muito parecidas com a Cartilha
Maternal são chamadas por Iole de Contrafações.
De 1897 a 1906 o órgão oficial responsável pela análise dos materiais no Rio Grande
do Sul foi o Conselho Escolar a partir de 1906 essa atribuição passa a ser do Conselho de
Instrução com menor número de membros e novas normas para apresentação de materiais e
novas prioridades como a preocupação com o custo para distribuir os materiais para a instrução
pública e destaque especial ao aspecto nacionalizador nos materiais, visando a promoção do
civismo com esses materiais. É também ressaltado pela autora a partir da análise das atas o
interesse do Conselho em substituir as cartilhas, por mapas murais, que seriam o mesmo quadro
parietais já citados, e seriam fornecidos junto com o aparato necessário para o seu uso.
Alguns dos autores que submeteram os seus materiais a avaliação do Conselho de
Instrução citados pela autora são: Francisco Viana, Miguel Garcia Junior, Arnaldo Barreto, João
Köpke, Osvaldo Vergara e Theodoro de Moraes sendo este último destacado pela autora pelo
conteúdo nacionalista de seus materiais, além de não ser um autor gaúcho, o que indica a
abertura por parte do governo gaúcho para avaliação e adoção de obras produzidas por autores
de outros estados. Dentre as normas para avaliação dessas obras por parte do Conselho de
49
instrução, no que diz respeito aos livros de leitura Trindade destaca a exigência pela valorização
do nacional, como a geografia, história e os heróis nacionais.
A autora explica que as cartilhas não eram métodos, mas concretizações de métodos,
elas podiam estar na gama das sintéticas ou das analíticas e dentro dessas haviam variações, no
caso das analíticas poderiam partir da palavra, sentença ou texto, e na sintética poderiam partir
da letra fonema ou silaba. Sendo assim as cartilhas poderiam seguir o mesmo método, mas
terem inúmeras diferenças.
Em 1921 é criada a Comissão Permanente para Exames de Obras Pedagógicas em
substituição ao Conselho de Instrução. Assim, Trindade analisa documentos desta comissão
destacando que os aspectos pedagógicos que orientavam as decisões como a valorização do
método intuitivo e do nacionalismo e civismo permaneciam.
Trindade relata que aparentemente a comissão enumerava as obras de acordo com o seu
valor didático. Assim, em duas das listas de recomendação apresentadas em 1929 pela comissão
gaúcha o livro de leitura “Queres ler?” ocupava o primeiro lugar, destaca que essa é uma
evidencia da mudança de orientação em relação aos métodos de alfabetização e cartilhas no Rio
Grande do Sul.
Quanto a circulação das cartilhas Trindade fala sobre as normas para a distribuição das
mesmas. Nesse processo, os professores públicos deveriam fazer relações anuais contendo o
número de alunos pobres que atendiam para que fossem encaminhados os materiais, o mesmo
era responsável pela avaliação da condição do aluno, caso fosse constatado que algum aluno da
relação não era considerado pobre o professor arcaria com o reembolso do valor dos materiais
fornecidos a este aluno.
Uma observação importante sobre a produção e adoção dos materiais usados na
instrução é sobre o constrangimento sofrido pelos autores, pois tinham que produzir de acordo
com certas normas e ideias pedagógicas para terem suas obras aceitas e também os professores
passavam por constrangimentos para receber os materiais, evidenciando o controle tanto na
produção como na distribuição ou circulação de materiais didáticos nesse estado entre 1890 e
1930.
Trindade analisou também em sua pesquisa, mapas e livros de registro do
almoxarifado da Instrução pública, aonde encontrou dados que lhe permitiram saber um pouco
mais sobre quais materiais foram adotados e distribuídos para a educação pública entre 1889 e
50
1921, período que abrange a constituição da república no Brasil e sua consolidação. A autora
destaca nessa analise a distribuição significativas das chamadas contrafações da Cartilha
Maternal, diante da quantidade ínfima da cartilha original de João de Deus que era distribuída, a
mesma conclui então que contrafações como a Cartilha Samorim e a Cartilha primária/
Primeiro Livro/ por um professor rio-grandense são uma forma de diminuir os custos com os
materiais, uma vez que a distribuição da Cartilha original do poeta português custaria muito
mais, diante da importância desse material.
A autora analisa também livros de registro das aulas públicas, feitos pelos professores,
com intuito de relacionar as informações com as que encontrou nos documentos dos órgãos
oficiais. Assim, ela conclui que os professores seguiam orientações oficiais para requerer os
materiais e recebiam o material que estava em voga segundo a adoção oficial, essa adoção
mudava com certa frequência por conta dos custos de alguns materiais. Os registros dos
professores em concordância com os mapas e registros do almoxarifado, mostram que o livro de
leitura “Primeiro livro do Abílio” foi distribuído antes da República, e nos primeiros anos da
mesma é predominante a distribuição da “Cartilha Nacional” substituída algum tempo depois
pela “Cartilha mestra” e a partir de 1890 até 1930 predominam as contrafações da “Cartilha
Maternal” no Rio Grande do Sul. A partir de 1924 se tem nesse estado, a aprovação do livro de
leitura “Queres ler?”, indicando mudanças que segundo Trindade devem ser estudadas de
acordo com as adoções oficiais de República “Nova”.
No quarto capítulo a autora se deterá na análise dos primeiros livros de leitura ou
cartilhas adotadas com a proclamação da República. Considerando que o governo teve
dificuldade na implementação da unidade, pois consideravam que a unidade seria garantida
apenas com a adoção de livros de um mesmo autor, porém eles elaboraram novas estratégias,
passando a considerar, e aceitar “contrafações” de algumas obras, já que Cartilhas como a
maternal era de alto custo.
Com a unidade também em relação aos métodos com a já citada adoção do método
intuitivo, Trindade faz então, uma discussão acerca dos métodos, considerando que de acordo
com o conhecimento produzido, vão se concretizando novos métodos, e o que era considerado
novo se torna antigo.
Se atendo então na Cartilha Maternal a autora passa a discutir as mudanças no método
João de Deus, diante dos mais diversos contextos, de onde foi produzido (Portugal) para o
51
estado do Rio Grande do Sul, onde foi reorganizado de acordo com as necessidades locais, com
tal intuito ela tomara as considerações do próprio João de Deus e do relato de uma professora
gaúcha, demonstrando as adaptações do método no contexto gaúcho.
Antes de expor a primeira lição da Cartilha Maternal, Trindade lembra-nos que João de
Deus se ateve apenas na arte da leitura, sendo que a escrita não é privilegiada pelo poeta luso.
Assim na primeira lição ele apresenta as vogais, e explica o porquê de serem apresentadas todas
elas juntas. Ainda nesta primeira lição, ele já inicia o ensino das palavras, porém estas têm que
ser usais, ou seja, precisam ser palavras que as crianças já estão habituadas a ouvir. Já a
professora gaúcha também apresenta as vogais na primeira lição, porém não se dão na mesma
ordem da Cartilha.
Mas o governo não exigia apenas o ensino da leitura, mas o ensino da leitura e escrita
demandava alguns materiais como a lousa, o quadro negro e o caderno. O ato de escrever se
fazia, a partir da imitação, assim o professor escrevia na lousa e o aluno imitaria o mesmo
traçado ou na lousa ou no caderno.
Trindade afirma que a professora gaúcha e João de Deus se distanciam, pois a professora
em cada lição faz o uso do diálogo, já João de Deus faz uso do mesmo, apenas a partir da 15ª
lição quando começa a se trabalhar as consoantes compostas certas e incertas.
A autora destina um tópico para falar das contrafações da Cartilha Maternal, para tanto
ela faz comparações entre a Cartilha Maternal a Cartilha Nacional e a Mestra.
As cartilhas apresentam em suas lições as letras e os seus valores, porém estas se
diferenciam na quantia de lições. A autora ressalta que ambos os autores, tanto Hilário Ribeiro
quanto Samorim Gustavo de Andrade, afirmam ter como base o poeta luso, para escreverem as
suas Cartilhas.
Hilário Ribeiro autor da Cartilha nacional empregou o seu método pela primeira vez
ainda no período Imperial, e garantiu que no fim de 32 lições o aluno se torna um leitor
corrente. Ao contrário da Cartilha maternal a Cartilha nacional, não garantia ao aluno apenas o
aprendizado da leitura, mais também da escrita. Já a Cartilha mestra se mostrou fiel a maternal e
se ateve apenas no ensino da leitura. Fazendo uma relação entre os três autores, Trindade
observa que há semelhança entre eles, pois a distribuição das letras, o alfabeto e a sons da fala,
são parecidos.
52
A cartilha mestra apresenta ilustrações desde a sua primeira lição, e assim se diferencia
das outras duas cartilhas, já que a Maternal apresenta ilustrações apenas em edições posteriores,
enquanto a nacional, apresenta apenas na segunda parte de suas lições. As ilustrações foram
bem recebidas pelo discurso da época, já que ela teria a função de acelerar a compreensão.
Trindade também aponta que os dois autores brasileiros por ela estudados, não seguem
ainda o português brasileiro, pois observamos em suas cartilhas o uso do português de Portugal.
Como já vimos a Cartilha mestra e a Cartilha nacional, foram adotadas com o objetivo
de baratear o custo da educação, pois a Cartilha maternal considerada adequada para o ensino
era de valor altíssimo, sendo assim, o governo escolheu essas duas Cartilhas que se
aproximavam do método de João de Deus.
O governo gaúcho considerava essas duas Cartilhas “contrafações inconvenientes”, ou
seja, por não serem exatamente iguais à Cartilha maternal eram inconvenientes. No próximo
tópico a autora nos apresentara uma nova Cartilha gaúcha bem similar à maternal, sendo assim,
uma “contrafação conveniente”.
A autora observou em seu levantamento o uso constante da lousa para o aprendizado da
escrita, o que acontece pelo fato de o valor do papel ser de alto custo, e no intuito de baratear a
educação era, portanto usado o quadro negro.
A Cartilha primaria foi adotada pelo governo como a Cartilha que mais se aproxima do
método de leitura oficial, além disso, ela era de menor custo, comparada a Cartilha maternal e
ainda diferentemente das demais Cartilhas até então adotadas ela levou em conta o português do
Brasil e não mais o de Portugal. Esta Cartilha também se diferenciou da cartilha maternal por
adotar o ensino da leitura e escrita, mais em fim, ela se demonstrou como uma contrafação
perfeita da Cartilha maternal. Trindade nomeou esta Cartilha como a “Cartilha Maternal/edição
de Sebalch”.
Em um próximo tópico a autora fala do deslize da unidade e da diversidade dos métodos,
e a construção de uma nova unidade com o Livro Queres Ler? Alguns professores, entre as
quais esta as autoras do livro acima citado foram a uma missão no Uruguai para observar o
método que lá se aplicava, constataram então o método fonético, sendo que para estas
professoras, este método foi classificado como o analítico-sintético do Brasil.
53
Queres ler? É um livro que parte do método analítico. O que corresponde às exigências
nacionais, enquanto a Cartilha maternal passa a corresponder o método sintético, e apesar de
passar por uma desqualificação ainda continua sendo usada nas escolas gaúchas.
Este livro, assim como a Cartilha maternal foi uma adaptação de um outro livro, só que
desta vez uruguaia. A obra original do Livro Quieres Lerr? é de José Henríquez Figueira, e a
obra brasileira é das autoras Olga Acauan e Branca Diva Pereira de Souza.
O livro Queres ler? foi adotado no Brasil ao fim da primeira Republica, e para fazer a
análise deste livro Trindade usa de dois exemplares e constata que não há muitas mudanças
entre os mesmos a não ser nas ilustrações.
Por fim, a autora diz que os métodos de leitura e de escrita deixam suas marcas nas
Cartilhas e nos Livros, como também no professor e no aluno. E que o livro Queres Ler?
modificou a adoção dos métodos de leitura no Rio Grande do Sul ao substituir a Cartilha
Maternal.
No capítulo cinco a autora vai falar da formação de uma identidade nacional brasileira, e
que as cartilhas foram um dos instrumentos de formação nacional, o uso da língua nacional nas
cartilhas foi o primeiro passo para a formação de uma identidade brasileira.
As cartilhas abordavam em suas lições aula de geografia e de história brasileira, com o
objetivo de ensinar desde cedo o respeito à bandeira ao hino, e apresentar as riquezas naturais, a
extensão do território, as datas cívicas, entre outros, construindo assim, uma unidade nacional
tão desejada durante a República.
Na primeira Republica então, surge à necessidade de nacionalizar a língua portuguesa a
tornando-a língua oficial do Brasil, porém ela não se tornou apenas oficial ela veio para acabar
com todas as outras línguas existentes no Brasil quer indígenas quer estrangeira. E o ensino
desta língua se daria pelos livros escolares inclusive a cartilha. Assim sendo eles adotaram a
contrafação conveniente da cartilha maternal, ou seja, a cartilha primaria, pois a cartilha
primaria aborda a língua portuguesa abrasileirada, reforçando a unidade nacional.
Trindade também diz que tanto os professores quanto os alunos sofreram dificuldades.
Sendo que quando os professores não obtivessem sucesso no ensino da língua portuguesa e no
ensino cívico, estes eram censurados.
Logo em seguida a autora fala que a nacionalização a partir da cartilha não permaneceu
apenas na língua e nos textos, a cartilha também se tornou um meio de valorização dos símbolos
54
nacionais, além disso, houve outros apetrechos escolares que contribuíram para a nacionalização
da população.
Os autores das cartilhas buscavam atender as exigências nacionais, e ao pegarmos uma
cartilha na mão, já podemos observar tal fato, antes mesmo de abri-la, pois os títulos das
cartilhas, as ilustrações que compõe a capa, já nos deixa claro a preocupação dos autores em
demonstrar o patriotismo de suas cartilhas. Entre essas cartilhas estão: a Cartilha nacional, a
Cartilha brasileira e a Cartilha maternal/ edição de Selbach que apresenta em sua capa a
bandeira brasileira.
A autora considera que essa expressão de amor à pátria que estava sendo implantada na
república brasileira, era inspirada na terceira república francesa, pois as duas demonstram
primeiro o investimento na educação primaria, segundo invenção de cerimônias públicas para
que o povo amasse e legitimasse a pátria, e terceiro a produção de monumentos que
representassem o novo regime, que no caso do Brasil não permaneceu apenas nas estatuas,
como na França, mais se expandiu para a construção de prédios imponentes, inclusive de
escolas.
No último capítulo a autora vai falar da escolarização da educação e da alfabetização,
assim ela inicia abordando as reinvenções da escola ao longo da modernidade, cujo o objetivo
era o de escolarizar a infância, acreditando que seria possível contribuir para o desenvolvimento
social, político e econômico do país. Portanto essas mudanças ocorriam, a fim de contribuir não
apenas para o progresso individual, mais também social.
A educação então estaria disposta para formar o cidadão republicano, que respeitasse a
pátria e que tivesse hábitos adequados e higiene. Sendo assim o papel da educação já não era
instruir apenas intelectualmente. Tal fato já se observava desde a cartilha ou primeiros livros de
leitura. Trindade destaca que ao realizar uma análise das cartilhas ou primeiro livro de leitura do
fim do século XIX, são constatadas algumas lições de boas maneiras, de respeito e de tolerância,
e que no início do século XX, tais textos foram modificados e dessa vez passa a se abordar as
brincadeiras do mundo infantil, tratando-o como um mundo a parte, mais alguns temas como o
trabalho, foram infantilizados, tornando-os comuns pra as crianças.
A escolarização foi uma forma de civilizar as massas, e a alfabetização era o meio para
alcançar este objetivo, sendo assim não é para promover a alfabetização, mais sim controlá-la, a
fim de civilizar.
55
A autora faz então uma análise dos relatórios dos inspetores, e observa que tanto as
crianças da zona rural quanto as crianças da zona urbana, não concluía o nível de escolarização,
e muitos frequentavam a escola elementar, até aprender a ler, escrever e contar, e logo os pais os
colocavam no trabalho, tanto agrícola, quanto industrial ou comercial.
A autora completa dizendo que as cartilhas que circularam no estado do Rio Grande do
Sul não ensinavam apenas a ler e escrever, pode se considerar então que a alfabetização
ultrapassa essas habilidades, pois um de seus objetivos é a formação do cidadão.
No último tópico do capítulo sete, Trindade aponta os índices de alfabetismo e
analfabetismo, porém nos deixa uma questão, pois afinal o que é ser considera alfabetizado. É
saber ler? É saber escrever? É saber ler e escrever? Ou é saber ler, escrever e contar?
A autora considera que não é possível estabelecer um significado para alfabetismo, pois
este depende do contexto, porque em alguns períodos eles consideravam apenas ler, em outros
ler e escrever o nome, já em outros era saber ler e escrever, e depois saber ler escrever e contar,
assim ela conclui que é de difícil interpretação, os dados obtidos com os relatórios, já que alguns
não apresentam se quer a data, e muito menos o que era de fato considerado ser alfabetizado.
Trindade conclui o capítulo dizendo que são infinitas as análises que ela poderia ter feito
a respeito de cada página, de cada texto, de cada palavra, de cada imagem e de cada autor, das
cartilhas adotadas no Rio Grande do Sul.
Enfim, na tese a autora busca ressaltar as diferenças da Cartilha Maternal em relação aos
materiais utilizados até o momento de sua publicação, isso tanto em Portugal como no Brasil,
onde a cartilha chega em um momento de mudanças na ordem política e não por acaso, percebe-
se que o material se consolida principalmente no Rio Grande do Sul em função de suas
características adequadas ao método intuitivo e ao modo simultâneo de ensino, adotados por sua
vez por propiciarem uma organização racional do ensino, mais adequada por tanto as ideias
republicanas.
O método de João de Deus é aceito de forma surpreendente no estado do Rio Grande do
Sul, mas é interessante como a Cartilha Maternal em si é muito pouco utilizada, dando lugar as
chamadas contrafações da mesma, essas se apresentam como alternativas para o cumprimento
das determinações oficiais do estado diante da necessidade de contornar o alto custo que a
adoção da Cartilha Maternal original representaria. Nesse sentido a autora analisa
56
cuidadosamente as “replicas” da Cartilha, as denominando contrafações inconvenientes ou
convenientes em função das semelhanças maiores ou menores em relação a original.
Outra questão ressaltada reiteradas vezes por Trindade é a representação nos materiais e
no ensino das ideias republicanas que visavam a consolidação dessa ordem política, nesse
sentido a mesma identifica que na maioria dos materiais adotados no estado do Rio Grande do
Sul, de forma menos ou mais explicita tem-se elementos que visam a unificação do país e o
despertar do nacionalismo.
A obra fornece subsídios para as discussões em alfabetização, à medida que Trindade faz
um levantamento histórico da educação no Rio Grande do Sul, reportando-se a influência de
João de Deus e de sua cartilha, para a organização do ensino.
A autora apresenta sólidos conhecimentos a respeito das cartilhas adotadas no estado e
empenha-se em apresentar clara e detalhadamente as circunstancias e características das
mesmas, em especial as cartilhas Nacional, Maternal e Mestra e o livro Queres Ler? levando-
nos a compreender a influência que os contextos sociais políticos e econômicos exerceram sobre
as cartilhas, bem como a Cartilha Maternal que contribuiu para a elaboração das cartilhas
brasileiras.
As comparações realizadas pela autora nos auxiliam na compreensão das diferenças,
entre o ensino proposto por João de Deus e o ensino ministrado no Brasil, mais especificamente
no estado rio-grandense, além de facilitar a compreensão das diferenças das cartilhas adotadas
pela educação pública do estado.
Esta leitura exige conhecimentos prévios, pois para o seu bom entendimento é necessário
que o leitor já tenha certo conhecimento acerca do tema alfabetização e do período histórico em
que o Brasil se torna Republica, caso contrário não será atribuído a leitura o significado
necessário para a sua compreensão.
Finalmente, com o estudo desta tese, podemos amadurecer em relação as cartilhas, pois
estas foram produzidas em diferentes contextos que por sua vez apresentavam as suas
limitações, no entanto nos seus respectivos períodos históricos elas contribuíram para a
educação e são elementos importantes da história da alfabetização.
ANEXO VIII
RESENHA
FRAGO, A. V. Alfabetização na sociedade e na história: vozes, palavras e textos. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1993.
Fernanda Pegoraro da Silva - UEM1
Bruna Aparecida Ravazio de Aquino - UEM2
Antonio Viñao Frago foi professor de Teoria e História da Educação na Faculdade de
Educação da Universidade de Múrcia. Foi Decano das Faculdades de Filosofia, Psicologia e
Ciências da Educação na Universidade de Múrcia, bem como membro do Comitê Executivo da
International Standing Conference for the History of Education entre os anos de 1994 e 2000.
Atualmente, é presidente da Sociedade Espanhola de História da Educação. As suas principais
linhas de investigação são os processos de alfabetização, escolarização e profissionalização
docente, a história do currículo e o ensino secundário, assim como a análise das políticas e
reformas educativas nas suas relações com as culturas escolares.
1 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM. 2 Acadêmica do Curso de Pedagogia, Campus de Cianorte, da Universidade Estadual de Maringá e Bolsista do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/UEM.
58
Com essa experiência e estudos nos processos de alfabetização, Frago ira tratar nesta
obra sobre: cultura oral e cultura escrita, a leitura e a escrita enquanto práticas sociais e
culturais, o espaço e o tempo escolares, conceituando assim o analfabetismo e os tipos de
analfabetos. Sendo estes: o semi-analfabeto, analfabeto funcional, analfabetismo cultural e
analfabeto secundário.
O semi-analfabeto era mais comum no século XIX, sendo considerado que sabia ler e
não escrever. Alguns aspectos que reforçavam o semi-analfabetismo eram que: essas
aprendizagens não eram simultâneas, também haviam diferenças quanto a aprendizagem da
escrita, pois algumas pessoas sabiam ler em um tipo de letra e quando mudava não conseguiam
ler.
O analfabeto funcional é aquele que não sabe ler, tem dificuldade em ler uma bula de
medicamento, ou fazer uma lista de compras, não consegue identificar um nome de rua ou uma
marca de determinado produto.
O analfabetismo cultural o qual as pessoas sabem ler e escrever, porém em alguns
aspectos esse conhecimento é insuficiente, sendo incapazes de redigir textos de um assunto
determinado (textos literários, políticos, científicos).
E o analfabeto secundário, que mesmo sabendo ler e escrever não faz o uso desta prática,
tem uma memória atrofiada e faz um pobre uso de ambas às habilidades (ler, escrever e falar),
os meios ideais do seu cotidiano são os usos de novas tecnologias (televisão).
Diferentemente do ser alfabetizado que conhece e usa a escrita, o analfabeto se expressa
oralmente. É preciso que a oralidade e a alfabetização encaminhem juntas para que seu
desenvolvimento realmente aconteça. A oralidade faz parte de todo o processo de humanização
das sociedades, para que se possa chegar ao processo de alfabetização.
Existem analfabetos pelo fraco ensino e por falta de condições de se chegar a esse
ensino. É preciso uma cultura pratica e comunicativa, além de uma política cultural. Frago traz
novas investigações e enfoques que nos informa: o decrescente número de pessoas analfabetas,
o porcentual de diferença no processo de alfabetização entre países protestante e católicos, entre
outras. Informações estas analisadas e retiradas de diferentes países, regiões e momentos
históricos e que levam a novas formulações, métodos e técnicas.
59
As transformações tecnológicas os meios de comunicação modificam os modos de
pensar, refletir e de se expressar não focando mais no analfabetismo e sim a alfabetização como
processo.
Esta obra foi traduzida e publicada no Brasil em 1993. Se consideramos que nos anos
1990 aconteciam discussões para definição da LDB, a qual foi oficializada em 1996, podemos
pensar em um possível embasamento para que a mesma fosse aprovada.
60
ANEXO IX
ARTIGO
CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM SÓCIO-INTERACIONISTA: UMA PROPOSTA
COM O GÊNERO PIADA
Samara Macedo Tomaz3
Bruna Moraes Oliveira4
RESUMO: O presente trabalho pretende apresentar uma proposta de sequência didática no
ensino da língua materna para o ensino fundamental, desenvolvido a partir da concepção
interacionista sociolinguística de Bakhtin e Vygotsky, utilizando o gênero piada. Para tanto, em
um primeiro momento apresentaremos características do gênero escolhido, em seguida
apresentando os motivos da escolha acerca da concepção teórico-metodológica e
subsequentemente será realizada uma análise explicativa de todas as suas partes, tais como o
trabalho com gênero textual no ensino da leitura, escrita e análise linguística. Os estudos
desenvolvidos indicam que o trabalho com o gênero piada dentro dessa perspectiva interacional
contribui para o ensino e aprendizagem do indivíduo, visto que, por meio deste a leitura e a
escrita são concebidas como uma prática social, que é primordial para a sua interação e
permanência na sociedade, assim como para sua alfabetização e letramento.
Palavras-chave: Gêneros textuais. Piada. Concepções de Linguagem. Interacionista
sociolinguística.
3 Acadêmica de Pedagogia UEM/PR/BR/Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência –
PIBID, da CAPES – Brasil. Enedereço eletrônico: samara_macedotomaz@hotmail.com 4Acadêmica de Pedagogia UEM/PR/BR/Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência –
PIBID, da CAPES – Brasil. Enedereço eletrônico: bmobruna@gmail.com
61
1 INTRODUÇÃO
Atualmente é estabelecido ao professor o trabalho com gêneros textuais para a
alfabetização e letramento, estando presente em documentos tais como Os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) e as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná, que tem a
finalidade de dar respaldo ao trabalho do docente. Este artigo trabalha com a mesma perspectiva
que os documentos abordam em relação ao trabalho com gênero, sendo a concepção de
linguagem como forma de interação.
A proposta de sequência didática aqui apresentada foi produzida na disciplina de
metodologia do ensino da língua portuguesa do curso de Pedagogia, abordando o gênero piada.
Assim, nosso objetivo é apresentar o trabalho com o gênero piada abordando seus três eixos
(leitura, produção textual e análise linguística) para sua construção dentro dessa perspectiva
(RITTER, 2010). Primeiramente, é necessária, uma breve explicação a respeito dos motivos da
escolha do gênero piada, suas características e sua função social.
Nossa sociedade está organizada em práticas sociais, sendo que cada uma demanda um
determinado tipo de ação e linguagem e os gêneros textuais auxiliam no processo de interação
dentro da sociedade, visto que nas práticas sociais os utilizamos e que eles nos orientam em
relação as mesmas. De acordo com Saito e Nascimento:
Podemos considerar as práticas sociais como construções sociais e as
atividades como ações dos indivíduos exigidas por essas práticas. [...]
Estas definem não apenas as atividades de linguagem, mas instituem
papéis e lugares sociais para os que nela se envolvem.(2010, p.25)
Com base em tal afirmação podemos constatar que o conhecimento e domínio dos
gêneros textuais nos permite um melhor desempenho dentro de tais práticas sociais, ou seja, a
cada prática social alteramos os gêneros utilizados e consequentemente a nossa linguagem e
ações, como afirma Saito e Nascimento (2010, p.27):
[...] o homem, nas inúmeras situações sociais de exercício da cidadania,
responde às exigências da comunicação social, adequando seus
enunciados às características próprias de diferentes gêneros orais ou
escritos que foram criados pelas gerações que o procederam.
Tendo como base tais informações é notória a necessidade de uma ampla utilização de
gêneros textuais, por parte do professor, na sua prática pedagógica para com os alunos, visto que
62
muitas vezes acaba por utilizar uma lista restrita de gêneros para o ensino, limitando seu
desempenho nas práticas sociais.
Tendo em vista os elementos apresentados propomos que se pense no gênero piada a ser
trabalhado dentro do âmbito escolar como conteúdo de grande relevância para a formação do
indivíduo. O gênero piada é amplamente utilizado na sociedade sendo possível observar sua
presença nas mídias como televisão, rádio, internet, revistas, etc. e também nas relações
normalmente informais entre os indivíduos. Em relação a ele Possenti menciona que:
Além de serem bons exemplos para explicitar princípios de análise
lingüística, as piadas fornecem excelentes argumentos para várias teses
ligadas às teorias textuais e discursivas [...]. A propósito de sentidos, as
piadas ilustram de forma brutalmente clara a tese da ambigüidade, ou,
ainda melhor, do equívoco que a linguagem pode produzir. (2002, p.37)
É relevante analisar que esta afirmação nos possibilita perceber que a piada pode ser uma
fonte de importantes conceitos a serem trabalhados com os alunos. Possenti (2002, p. 39)
considera a piada “como um texto que parece falar de uma coisa, mas que fala de outra, ou
melhor, fala das duas, colocando ora uma ora outra em primeiro plano”. Isso demanda do aluno
capacidade de posicionamento diante de diferentes significados que devem estar em
consonância com um contexto geral como salienta Possenti (2002, p. 39) “[...] havendo dois o
mais óbvio deles deve de alguma forma ser posto de lado, e o outro, o menos óbvio, é aquele
que, em um sentido muito relevante, se torna dominante”. Sendo assim o trabalho com ele, nos
leva a formar um aluno crítico, pois ele passa a interpretar as diferentes significações e
intencionalidades presentes no texto.
Apresentaremos as principais concepções de linguagem existentes, dando destaque a da
linguagem como forma de interação, que direciona o presente trabalho. Em seguida iniciaremos
a exposição da sequência didática na dimensão da leitura, escrita, análise linguística e da
produção textual realizando uma explicação de sua composição e estrutura. Ao final
apresentaremos as conclusões com base nas análises realizadas no decorrer das exposições
sequenciais.
2 CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM
63
O professor do ensino fundamental na atualidade se depara com diversos materiais para
auxiliar sua prática pedagógica, como livros, projetores, computadores, jogos pedagógicos,
entre outros equipamentos que contribui para o ensino aprendizagem, no entanto o conteúdo de
suas aulas é direcionado conforme a concepção adotada sobre a linguagem.
Segundo perfeito (2010), há três principais concepções sobre a linguagem, cada uma
desenvolvida em diferente período histórico, atendendo a diferentes interesses e objetivos sobre
a formação do indivíduo, a primeira é a linguagem como forma de expressão do pensamento, a
segunda linguagem como instrumento de comunicação e a terceira linguagem como forma de
interação. No entanto apesar de terem se destacado em determinados momentos, alguns modelos
perpetuam até os diais atuais.
Na primeira teoria, a da linguagem como forma de expressão de pensamento, é
caracterizada pela valorização do bem falar das pessoas, tendo suas bases na gramática grega.
Segundo Perfeito (2010, p. 28) podemos dizer que:
A concepção de linguagem como expressão de pensamento é um
princípio sustentado pela tradição gramatical grega, passando pelos
latinos, pela idade média e moderna e, teoricamente, só rompida no
início do século XX, de forma efetiva, por Sassure.
Sendo assim, utilizam-se regras para o ensino da língua remetendo a gramática-teórico
normativa. Nesta concepção a gramática a leitura e a escrita se dão de maneira
descontextualizadas umas as outras, ou seja, não a nexo entre os eixos sobre o assunto discutido.
A forma do trabalho com a leitura se aproxima da oratória, já a “interpretação‟‟ era vista como
extração dos sentidos do texto, descrevendo exatamente com o ponto de vista do autor,
contribuindo apenas para seu ensino mecânico/reprodutivista. Na produção textual, o tema da
redação não tem relação alguma com o conteúdo estudado e para a escrita é utilizado regras e
princípios para a arte do bem escrever. (PERFEITO, 2010). Esta concepção é encontrada no que
conhecemos como Pedagogia Tradicional.
Na concepção da linguagem como instrumento de comunicação, tem inicio no século
XX, a língua é vista como a-histórica utilizando sentido o literal das palavras, não sendo
64
consideradas as relações sócio-históricas. Em relação a esta concepção, Perfeito (2010, p. 34.)
afirma que:
Nessa ótica, a linguagem, como já posto, é entendida como código. E o
estudo da língua materna, apesar da proposição de inovações, ainda
tende ao ensino gramatical. Mas a leitura e a produção textual começam
a ganhar maior relevância na escola, ao lado dos elementos da teoria da
comunicação.
Assim a língua é transmitida sem que esteja de fato vinculada a sua utilização real,
porém se inicia neste período uma maior atenção no que diz respeito ao ensino da leitura e da
escrita. No Brasil esta teoria chega em 1964 conhecida como o tecnicismo, período em que
foram produzidos grandes números de livros didáticos obrigando o cumprimento das atividades
propostas nestes. Na gramática, buscava-se a internalização inconsciente do conteúdo, ou seja,
por meio da repetição deveria ocorrer a aprendizagem. Alguns livros acabam por apenas
abordando de maneira superficial junto à literatura, técnicas de redação e a gramática. Na leitura
segue o mesmo esquema da concepção anterior, estando o sentido no texto, mas agora com suas
bases no estruturalismo, dando origem ao ensino da leitura-decodificação, partindo-se do
específico para o geral. Defendem-se métodos objetivos de leitura com seleção de alternativas
onde a ideia deve coincidir com a do autor. (PERFEITO, 2010)
Na produção textual são trabalhadas as tipologias narração, descrição e dissertação,
sendo utilizadas em forma de técnicas de redação, ou seja, o aluno segue uma forma já
estabelecida ao realizá-la e de maneira descontextualizada com os assuntos trabalhados nos
eixos da leitura e da gramática, sendo encontrada dentro da Pedagogia Tecnicista.
Na concepção discutida atualmente a linguagem como forma de interação, temos a
valorização do trabalho sócio-histórico, ponto que já se distancia das duas vertentes anteriores
passando a considerar o trabalho coletivo. Os assuntos trabalhados são relacionados com uma
finalidade real, onde o aluno aprende de maneira contextualizada. Para o estudo linguístico e
literário o leitor é considerado tão importante quanto o autor da obra trabalhando como co-
produtor de sentidos, com diferentes formas de analisar o mundo. O leitor nesta perspectiva
serve para “atualizar o texto” com seu conhecimento, trabalhado com a interpretação textual, o
resultado é a contribuição do leitor com o autor. Este resultado tem suas restrições onde são
aceitos mais de uma resposta, porém nem todas as respostas são corretas, havendo critérios tais
como coerência das respostas com o texto apresentado (PERFEITO, 2010).
65
A respeito desta forma de ensino Radaelli (2014, p. 9) afirma que:
Bahktin destaca a importância da interação com “o outro”, que gera a nossa
fala e Vygotsky, as zonas de desenvolvimento, em que esse “outro” pode e
deve ser no caso da escola a professora ou um colega mais experiente, para
que, em trabalhos em grupo, o aluno consiga se envolver e se comunicar de
forma compreensível pelo seu interlocutor.
Assim Vygotsky considera as interações que o aluno realiza, conforme a interação do
ser com o assunto a aprendizagem se da mais rapidamente, a escola vem com a função de fazer
o aluno avançar neste conhecimento. Já para a mesma autora, Backtin, considera que as palavras
se dão nas formas de interação e somente somos capazes de entende-las se compreendermos o
social onde elas estão inseridas.
A linguagem nesta perspectiva não é vista meramente para transmissão de informações,
mas como forma de atuar e agir, “os indivíduos recebem/sofrem as ações da linguagem
(socialmente construídas), mas também agem com a linguagem (procurando atingir objetivos,
em relação ao interlocutor)” (PERFEITO, 2010, p. 55).
Para estudo de textos são trabalhados com gêneros textuais organizando o processo
discursivo, assim os PCN‟s sustentam que o ensino de textos deve ser norteado pelos gêneros
divididos por séries trabalhando a diversidade dos mesmos. A respeito da análise linguística é
apresentado e trabalhado junto ao gênero textual, estabelecendo um sentido ao ser analisado.
(PERFEITO, 2010). O aluno reflete sobre as normas e regras ao observar este ao texto
vinculando ao seu uso real. Por fim a respeito da produção textual, se dá por resultado de todo
um trabalho já realizado com a leitura e analise linguística do gênero em ênfase, sempre
trabalhando com variedades.
Neste processo de construção da escrita é necessário que se realize uma reescrita do
trabalho do aluno, a fim de que se observem os erros tais como a coerência do conteúdo, em
relação aos erros ortográficos e a pontuação, o professor deve assinalar os problemas, mas de
forma que o próprio aluno consiga readequar seu texto. (PERFEITO, 2010). Diferente das
outras concepções, nesta forma o aluno passa a entender, os conteúdos são todos
contextualizados conforme seu uso dentro da sociedade, assim o aluno é capaz de se comunicar
e interagir se posicionando criticamente.
66
3 LEITURA
Ratificamos que o trabalho com os gêneros abrange mais utilizações da linguagem e
consequentes participações dentro da sociedade, pois estes são utilizados com a finalidade dos
indivíduos se comunicarem dentro dela, ao passo em que ampliam as utilizações,
consequentemente acontece o mesmo com a visão sobre o ensino/aprendizagem. Nesta
perspectiva a finalidade proposta é de “alfabetizar letrando”, a qual o trabalho de mediação do
professor é fundamental, em conjunto com a utilização de suas ferramentas escolhidas para
auxiliar o acesso ao mundo letrado. De acordo com Saito e Nascimento (2010, p. 28), “[...] o
letramento passa a ser visto como um conjunto de práticas sociais aliadas a leitura e a escrita,
realizado pelos indivíduos mergulhados em um contexto social de produção[...].” logo, o
processo de alfabetização e letramento podem acontecer em consonância, por meio das práticas
sociais na qual a criança deve ser inserida.
De acordo, com Saito e Nascimento para que isto ocorra é primordial “[...] que a escola,
ao reconhecer o letramento como prática social se constitua, cada vez mais, como agente desse
letramento[...].” O papel do professor nesse processo é elementar, pois ele implementará em sua
prática pedagógica o trabalho com o objetivo da interação nas práticas sociais.
Para utilizarmos os gêneros existem alguns fatores que estabelecem condições
enunciativas que estão presentes em toda produção de linguagem, estes são: a esfera de
comunicação, a identidade social dos interlocutores, a finalidade, a concepção de referente, o
suporte material e a relação interdiscursiva por (BRONCKART, 2003). É necessário que a
escola explore os gêneros de modo a mostrar sua utilização na esfera social, para que se possa
compreender que tal é um meio para agir nas situações de comunicação com eficácia. Para tanto
o gênero é entendido também como um instrumento, que é destinado alguém, em uma
determinada situação com uma determinada finalidade e o conhecimento dele se torna quesito
básico para desempenhá-lo diante das diversas situações de linguagem, logo o gênero em si e
seu conhecimento (domínio) são necessários para as interações sociais.
A reflexão sobre o texto e o questionamento dos fatores que o compõem, permitem que
seja realizada uma leitura crítica do mesmo, como por exemplo; quem é o emissor? Qual a
67
finalidade? Em que momento histórico foi produzido? Entre outras. A perspectiva de
enunciativo-discursiva da linguagem de Bakthin considera que na interação verbal e no
enunciado que é possível encontrar a “verdadeira substância da língua”. Os gêneros são o objeto
de ensino, para Saito e Nascimento (2010, p. 34) “[...] o texto é a materialização do gênero, mas
o objeto de ensino são os gêneros textuais.”, por esse motivo se torna primordial o professor
fazer com que o gênero vá além do texto, evidentemente essa didatização do gênero é fictícia
por não ser a utilização concreta, mas cabe ao professor aproximar este da realidade.
Bakthin (1992) propõem a caracterização do gênero de acordo com o tema, a sua
composição e seu estilo, sendo o tema o elemento da unidade de sentido, a sua origem, assim
sua composição a estrutura, na qual está organizado, e o seu estilo, mostrando as diferentes
formas da língua possíveis de serem utilizadas. Em relação a qual gênero deve ser trabalhado
em sala de aula há dois critérios pelos quais ele pode se orientar: o das esferas de comunicação
proposto por Bakthin e de agrupamentos de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), esse
agrupamento é baseado em: narrar, relatar argumentar, expor e prescrever, sendo analisados
pelos critérios de domínio social de comunicação, aspectos tipológicos e capacidades de
linguagens dominantes.
O planejamento das atividades do professor esta dividido em leitura, produção e análise
linguística, para tanto há uma proposta de ensino em espiral formulada por Dolz (2009) que
segundo Saito e Nascimento (2010, p. 41):
Ensino espiral é o contrário daquele ensino linear, em que se trabalha com um
tipo de texto e depois se passa a outro, e outro, subindo degraus de
dificuldades, como, por exemplo: o professor da 5ª série (6°ano) deixava para
trabalhar os gêneros do argumentar (artigo de opinião, dissertação
argumentativa, carta ao leitor, debate regrado, etc.) para a 8ª série (9°ano) e
trabalhava com os gêneros do relatar e do narrar nas séries iniciais.
Na perspectiva de o ensino em espiral determinados gêneros considerados mais simples
não são pré-requisitos para outros considerados mais complicados, é possível trabalhar com
diferentes e os mesmos gêneros em todas os anos, o que vai ser alterado é o grau complexidade
exigido no trabalho com o gênero em determinado momento do desenvolvimento da criança, de
forma a contribuir para o processo de letramento desde o início de sua atividade escolar. Apesar
do grau de complexidade nos primeiros ciclos ser menor em relação aos demais ciclos, há
68
elementos que deve ser ensinado para que a compreensão acerca do gênero seja positiva, como
pontuam Saito e Nascimento (2010, p.42) “[...] finalidade, intenção, tema, imagens recíprocas,
papéis sociais, maior ou menor intimidade entre os integrantes, valoração apreciativa de cada
gênero no grupo social em que circula.” É primordial que os gêneros sejam ensinados de modo
que na sua produção passe a ser adaptados ao contexto de produção e ao tema.
A concepção de leitura que o professor tem direciona diretamente sua prática
pedagógica, as perguntas de leitura têm como função avaliar e desenvolver a compreensão e
interpretação dos alunos em relação ao texto lido. Existem diferentes concepções sobre a leitura,
que focam em diferentes elementos como: no autor, no texto, no leitor e na interação autor-
texto-leitor. Cada uma foi desenvolvida em um determinado contexto sócio-historico, e,
portanto objetivam diferentes resultados. A perguntas de leitura podem ser utilizadas no
momento anterior, durante e após a leitura.
A leitura que possui o foco direcionado ao autor tem por premissa que o leitor deve
receber as informações que tal transmite, de modo inerte, sem que o leitor considere seus
próprios conhecimentos, ele deve apenas identificar os sentidos propostos pelo autor. Desta
forma, o aluno acaba por se valer de duas estratégias para que consiga responder as questões:
uma buscar alguma parte da questão no texto lido, tornando a resposta apenas uma cópia, um
recorte, e outra é responder de modo amplo, sem utilização de argumentos específicos, mas sim
generalizantes a fim de que o professor lhe dê a solução que será atribuída à característica de
verdade absoluta, ou seja, esta concepção não contribui para o desenvolvimento da criticidade
do aluno, posto que suas próprias leituras do texto são deixadas de lado.
A leitura que direciona seu foco para o texto se caracteriza por demandar do leitor
apenas o ato de codificação, ler o código, ou seja, são reconhecidos somente o sentido das
palavras e estruturas do texto. Considera a leitura de forma passiva e um elemento marcante é
que quanto mais se exerce ela, menos se desenvolve a capacidade dos alunos de formular seus
próprios sentidos, quando utilizada sozinha não consegue desenvolver a leitura.
A leitura focalizada no leitor se caracteriza pela valorização dos conhecimentos prévios
do aluno, aceitando diferentes tipos de respostas e não considerando os aspectos que
diferenciam as opiniões de uns em relação a outros. Portanto esta gera um “vale-tudo”, visto que
toda resposta é possível, o que gera um não desenvolvimento na capacidade crítica do leitor.
69
Já na concepção da leitura com o foco direcionado na interação autor-texto-leitor, tanto o
leitor quanto o autor são considerados em um processo de diálogo que ocorre no texto. São
considerados o contexto social, histórico e cognitivo de produção dos sujeitos, não existe uma
resposta acabada, uma verdade absoluta e incontestável, no entanto não há também um “vale-
tudo” há um limite de possibilidades de compreensão e respostas dentro do texto. Nesta leitura,
o aluno conta com o professor para mediar seu conhecimento de modo que os conhecimentos
prévios do aluno são considerados, assim como os do professor, o que os difere é que os do
professor são ordem mais elevada que os do aluno, apesar de serem considerados os
conhecimentos prévios, eles devem ser elevados a um nível maior de complexidade.
É primordial que pontuemos que cada concepção representa um avanço em relação à
leitura, esta afirmação pode aparentar ser contraditória, no entanto, é uma questão simples. O
desenvolvimento da leitura demanda um processo de complexificação das questões sobre os
textos que façam com que o aluno reflita sobre tal em uma dimensão contextual ampla para que
se torne um leitor crítico. De acordo com Menegassi (2010, p.179) apud Solé (1998) Existem
três tipos diferentes de perguntas que devem ser realizadas para o desenvolvimento do leitor
crítico: Pergunta de resposta textual (decodificação), pergunta de resposta inferencial
(inferência) e pergunta de resposta interpretativa (interpretação). A pergunta de resposta textual
demanda a procura direta no texto, no entanto ela não se caracteriza como cópia, segundo
Menegassi (2010, p.179) elas “São perguntas que exigem do aluno a compreensão do seu
enunciado e um trabalho efetivo de interação com o texto, para que a resposta seja produzida.”
As perguntas de resposta inferencial estão contidas no texto, no entanto elas não estão
explicitas, são questões que demandam o conhecimento completo do texto e de seu contexto
para que ele possa inferir algo. As perguntas de resposta interpretativa demarcam o ponto de
extrapolação do texto, ou seja, o leitor deve buscar as respostas no seu próprio conhecimento,
nas suas experiências, mas se baseando no texto. Assim ele consegue expor a sua opinião e
experiências com argumentos coerentes com o que esta sendo pedido. Nem uma nem outra são
mais importantes, o conjunto das diferentes necessidades que elas demandam é que permitem
que o leitor aprimore sua leitura crítica.
3. 1 Leitura – Gênero Piada
70
Na sequência didática desenvolvida com o gênero piada, direcionada ao 3° ano do
Ensino Fundamental trabalhando com a leitura, utilizamos as perguntas de leitura no momento
anterior e posterior a das piadas, o objetivo desta aula é o reconhecimento de características das
piadas, bem como sua finalidade. A piada “É Lógica” foi uma das utilizadas:
Em um momento posterior foram elaboradas algumas questões de pré-leitura, que
contribuem para a reflexão acerca do gênero que está sendo trabalhado.
Estas perguntas objetivam conhecer como o aluno se depara diante deste gênero, ou seja,
qual o seu conhecimento prévio acerca de tal, pois com base nele é que o professor consegue
estabelecer o ponto de partida e de chegada do conhecimento. Na sequência da leitura do texto
seguem as perguntas da leitura direta do texto:
As questões acima apresentadas se encontram dentro das que demandam respostas de
decodificação, pois elas estão explícitas no mesmo. No entanto não descartam a leitura do texto.
Piada 1) Questões:
4) Quais os dois sentidos que a pergunta da professora nos faz entender?
É Lógica!-
A professora pergunta aos alunos:
- Se eu for à feira e comer 3 peras, 7 bananas, 15 laranjas
e 1 melancia, qual será o resultado?
Do fundo da sala, alguém grita:
- Uma dor de barriga!
1. Vocês já viram esse tipo de texto?
2. Vocês já produziram esse tipo de texto?
3. Vocês costumam ouvir piadas? Quando?
Piada 1) Questões:
1) Qual a pergunta que a professora faz aos alunos?
2) Qual a resposta dada pelo aluno?
3) O que a professora na verdade gostaria de saber realizando esta pergunta?
71
Neste momento a questão demanda a inferência, pois ela esta contida no texto, mas de
forma implícita, estas questões exercem em grande escala a capacidade de compreensão do
texto.
Piada 1) Questões:
5) Já aconteceu alguma vez com você ou com alguém conhecido de realizarem
uma pergunta com dois sentidos diferentes?
6) Como a professora deveria ter realizado a pergunta para que o aluno
compreendesse o sentido correto?
Já estas questões são as que demandam do leitor interpretar o texto e utilizar seus
conhecimentos nas respostas, de modo que utilizem de argumentos condizentes. A avaliação
pode ser realizada tanto pelo registro escrito, tanto quanto pelo oral, neste caso utilizamos a
avaliação oral das atividades com a finalidade de interagir diretamente em seus discursos orais,
assim como desenvolver sua capacidade de diálogo com os demais no desenvolvimento de sua
leitura.
4 ANÁLISE LINGUÍSTICA
Em relação ao trabalho com a análise linguística, dentro da perspectiva abordada a
autora Lilian Ritter nos dá subsídios de como trabalhar a gramática com os três eixos a fim de
que o indivíduo desenvolva sua fala, leitura e escrita sendo capaz de se relacionar em sociedade
de maneira crítica frente a “diferentes modos de concretização que a linguagem apresenta”
(RITTER, 2010, p.87). Nesta perspectiva, são postos objetivos na analise linguística distintos
das outras concepções que a tinham com fim em si mesmo. Segundo Ritter, a gramática deve:
(...), dar condições para que ele tenha, o domínio de atividades verbais como
ler criticamente, escrever para alguém ler, falar para auditórios diferenciados
dentro da modalidade adequada e refletir sobre a própria linguagem-
salientamos a necessidade de a instituição escolar possibilitar que o aluno
aprenda a lidar com os diferentes modos de concretização que a linguagem
apresenta. (RITTER 2010, p. 87)
72
Deste modo, o indivíduo aprende em qual função social e contexto se deve utilizar determinada
linguagem, diferente das anteriores onde era apenas utilizado de forma mecânica. A análise
linguística não é apenas um estudo gramatical, é mais que isso, é compreender sua utilização
contextual, compreendendo a forma em que está inserido (HÜBES, 2010).
Esta forma de utilização dos gêneros discursivos para o ensino da analise linguística já
são abordados nos PCNs e na DCE do estado do Paraná em língua portuguesa. Seguindo tal
proposta o trecho abaixo nos mostra a importância dada aos PCNs para o trabalho com os
gêneros, sendo assim este documento (BRASIL, 1997, p. 25) defende que:
A importância e o valor dos usos da linguagem são determinados
historicamente segundo as demandas sociais de cada momento.
Atualmente exigem-se níveis de leitura e de escrita diferentes e muito
superiores aos que satisfizeram as demandas sociais até bem pouco
tempo atrás - e tudo indica que essa exigência tende a ser crescente. Para
a escola, como espaço institucional de acesso ao conhecimento, a
necessidade de atender a essa demanda, implica uma revisão substantiva
das práticas de ensino que tratam a língua como algo sem vida e os
textos como conjunto de regras a serem aprendidas, bem como a
constituição de práticas que possibilitem ao aluno aprender linguagem a
partir da diversidade de textos que circulam socialmente.
Nesta perspectiva de trabalho com gêneros os PCNs propõem que os textos utilizados
sejam vinculados com sua real função, onde o trabalho da gramática é realizado de forma
contextualizada resultando na aprendizagem eficaz, formando alunos críticos frente ao conteúdo
gramatical.
Nas diretrizes também é afirmado o trabalho com os gêneros. Na parte da análise
linguística é considerado essencial que se realize uma reflexão sobre o ensino da língua
portuguesa, pontuando neste documento que (PARANÁ, 2008, p. 78):
[...] a interlocução como ponto de partida para o trabalho com o texto, os
conteúdos gramaticais devem ser estudados a partir de seus aspectos funcionais
na constituição da unidade de sentido dos enunciados. Daí a importância de
considerar não somente a gramática normativa, mas também as outras, como a
descritiva, a internalizada e, em especial, a reflexiva no processo de ensino de
Língua Portuguesa.
73
A respeito dos dois documentos, fica claro que a analise linguística deve ser trabalhada
dentro do gênero, onde o professor por meio da mediação faz o aluno refletir sobre como deve
ser utilizada tal palavra em determinados contextos, ou forma como utiliza-la. Assim há uma
crítica no que diz respeito a gramática normativa, da qual é utilizada nas escolas até os dias
atuais apesar de seu caráter reprodutivista, trabalhando na perspectiva tradicional. Esta antiga
forma de trabalho é posto como mecânica, considerando assim os extremos certo e errado, não
realizando um exercício de reflexão no aluno sobre seu uso contextual, caracterizando-se como
forma artificial de aprendizagem (RITTER, 2010).
Assim a autora Hubes (2010), reforça a atual forma de trabalho sendo a seguinte:
A prática de análise linguística é, assim, um trabalho de reflexão sobre a
organização do texto (oral ou escrito), tendo em vista a situação social de
produção e de interlocução, o gênero selecionado, a seleção lexical que dá
conta da situação de interação, os mecanismos de textualização empregados
naquele contexto e as regras gramaticais necessárias para a situação de uso da
língua.
Desta forma, a análise linguística não pode ser trabalhada de maneira solta e mecânica
como algumas escolas vêm fazendo, mas a partir da leitura ou produção textual já desenvolvida
com o aluno, o fazendo por meio deste refletir sobre as formas adequadas dentro do discurso de
utilizar as regras gramaticais e não apenas decorar sem saber utiliza-las posteriormente. A seguir
será apresentado fragmentos da nossa proposta de estudo nesta perspectiva sobre a análise
linguística
4.1 Análise Linguística- Gênero Piada
Em nossa sequencia didática, trabalhamos a análise linguística a partir do gênero piada,
para o 3º ano do Ensino Fundamental. É proposto dentro desta perspectiva, estudar o sentido
denotativo e conotativo a fim de que identifiquem neste e em outros gêneros textuais. A piada
escolhida para o estudo é a seguinte:
74
Joia
O politico estava no aeroporto
embarcando suas malas quando passa um
colega e diz:
- joia?!
Então o político responde:
- não, roupas.
(piada criada para o plano)
Para tanto é necessário uma reflexão do aluno sobre onde circulam esta forma de texto
realizando perguntas pertinentes a provocar tal reflexão. A respeito das perguntas de pré-leitura,
Ritter (2010, p 103) argumenta que deve ser explorado “[...] características sócio-discursivas
desse suporte a partir de procedimentos que levem à reflexão [...]”. Abaixo são escritos
algumas questões de pré-leitura proposto em nossa sequencia didática:
1. Vocês já viram esse tipo de texto? Onde?
2. Vocês já produziram esse tipo de texto?
3. Vocês costumam ouvir piadas? Quando?
4. O que vocês acharam dessa piada?
Trabalhando nesta perspectiva a análise linguística segundo Ritter (2010), inicia em
epilinguística realizando uma reflexão a respeito dos vocabulários e sua melhor colocação para
posteriormente realizar as atividades metalinguística, para analisar a própria linguagem. Sendo
trabalhada nesta ordem a atividade metalinguística fará sentido ao aluno por anteriormente ter
sido realizado uma reflexão sobre o contexto social em que estas se dão por meio da analise
epilinguística.
Assim, após provocar por meio das perguntas de pré-leitura uma reflexão e análise da
vinculação social do gênero piada, é dada uma explicação sobre os conceitos de conotação e
75
denotação, pedindo para o aluno responder uma série de palavras com sentido ambíguo. Após
este exercício, é solicitado que o aluno encontre na piada esta ambiguidade:
Identifique na piada „joia”, em que trecho se encontra a palavra que
possui sentido denotativo e conotativo? No que se dá o humor da piada?
Justifique.
Assim a respeito do caráter metalinguístico, Ritter (2010, p. 93) afirma que:
Sendo assim, entende por atividade metalinguística aquela que se realiza na
parte final do processo de produção de sentidos do texto, em que se reflete
sobre o escrito como objeto de uma análise que constrói um sistema para falar
sobre a língua. Sendo assim, entende por atividade metalinguística aquela que
se realiza na parte final do processo de produção de sentidos do texto em que
se reflete como objeto de análise, com o Objetivo de sistematizar conceitos e
normas da língua, ou seja, classificar, conceituar aquilo que foi considerado
como aspecto mais importante da gramaticado texto lido e estudado [...].
Nesta proposta, realizamos primeiramente o exercício epilinguistico refletindo sobre a
utilização do gênero piada analisando todas suas características. Após tal reflexão, realizamos o
estudo metalinguístico ficando nítida sua real utilização, por meio deste exercício o aluno passa
a analisar o duplo sentido das palavras em seu cotidiano, entendendo que dependendo do
contexto ora, predomina um, ora outro significado. A avaliação nesta etapa será realizada
continuamente, ou seja, com base na participação oral, nas discussões sobre o assunto e durante
a realização e correção oral do exercício proposto.
5 PRODUÇÃO TEXTUAL
Cada concepção de linguagem finda por gerar diferentes produções textuais, posto que
como cada um direciona seu foco a diferentes elementos o resultado de tais acaba por não ser
igual. Na concepção da linguagem como uma forma de pensamento, a escrita é entendida como
algo que reflete o pensamento do aluno. Segundo Hila (2010, p. 61) “[...] acredita-se que a
76
expressão é construída no interior da mente do aluno, sem quaisquer influências externas.”
Escrever demanda dominar a norma-padrão, e seu foco esta na frase.
Na concepção de linguagem como instrumento de comunicação a escrita é
compreendida como algo que se imita, que se aprende com base em modelos, sendo assim A
escrita é concebida como um dom, com algo inato, logo a intencionadade da ação da mediação
do professor não é levada em consideração ao processo de desenvolvimento e aprendizagem.
Escrever é saber seguir o modelo pré-estabelecido, onde o foco é o texto.
A concepção de linguagem como forma de interação concebe a escrita como algo pelo
qual interagimos com a sociedade, possuindo um papel ativo dentro da mesma. Desta forma os
textos a serem utilizados devem atender a necessidade de interação, aqueles que utilizamos para
permear dentro da sociedade, a fim de ensiná-los a produzi-los. Hilo (2010, p.65) afirma que:
[...] além de nos comunicarmos por esses tipos de textos, eles não dão conta de
desenvolver as capacidades de leitura e de escrita necessárias para a
participação efetiva do indivíduo em um mundo multissemiótico, no qual há
necessidades de leitores e escritores não apenas do texto verbal, mas de textos
que trazem múltiplos sistemas de linguagem (verbal, visual, audiovisual,
gestual), denominados gêneros multimodais, como, por exemplo, história em
quadrinhos, tiras em quadrinho, canção, anúncio publicitário, reportagem;
propaganda televisiva etc.[...].
É primordial que se tenha o acesso a uma ampla quantidade de gêneros textuais, pois
quanto mais domínio sobre eles se tem, mas domínio das práticas sociais obterá. A produção
textual demanda que se aprenda realmente a escrever, e de acordo com os Parâmetros
Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997, p.48) “[...] um escritor competente é alguém que
planeja o discurso e consequentemente o texto em função do seu objetivo e do leitor a que se
destina, sem desconsiderar as características específicas do gênero”. Assim saber escrever
demanda a capacidade de saber identificar o melhor gênero para se expressar, assim como
atender sua estrutura de maneira completa.
O momento da produção demanda alguns elementos básicos para que se possa realizar o
comando solicitado com destreza, para tal Hila (2010, p. 71) apud Geraldi (1993) pontua
algumas condições:
a) Se tenha o que dizer;
b) Se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer;
77
c) Se tenha para quem dizer que se tem a dizer;
d) O locutor se constitui como tal, enquanto sujeito que diz para quem diz
(o que implica responsabilizar-se, no processo, por suas falas);
e) Se escolham as estratégias para realizar (a), (b), (c), e (d).
Essas condições possibilitam que o aluno realizar a produção do texto, a condição de
“ter o que dizer” esta relacionada ao conhecimento que ele possui acerca do tema, é
fundamental que ele saiba da importância do ato, é o ponto inicial para desenvolver o texto. A
condição de “ter uma razão para dizer” está relacionada ele tenha a necessidade de realizar a
produção, pois ela deve ser significativa. A condição de se “ter alguém para dizer” é o elemento
que caracteriza a necessidade de haver um interlocutor para texto, a quem o autor destina aquilo
que será escrito. A de que o “locutor se constitua como tal” esta ligada diretamente a anterior,
pois a partir do momento em que se assume que o que está sendo escrito é direcionado a um
interlocutor se passa a ser o locutor. A última relacionada a “escolha de estratégias” diz respeito
a necessidade de escolha do gênero que se enquadre dentro da proposta de escrita, assim como
as características que ele possui.
O professor ao propor a produção de textos deve priorizar tais elementos, para que possa
orientar seus alunos sobre a execução de tal atividade, visto que o conteúdo deve estar claro ao
professor para que ele possa mediá-lo. Toda atividade proposta da produção escrita deve estar
dividida em alguns momentos, de acordo com Hila (2010, p. 76):
A respeito dos momentos ou fases da escrita: momento de planejamento (no
qual o professor ensina as estratégias necessárias à elaboração do texto);
momento da textualização (da elaboração do texto propriamente dito);
momento da revisão (que deve ser visto como etapa natural do processo de
produção e não como erro ou castigo imputado ao aluno); momento da
reescrita (na qual o aluno pensa conscientemente sobre os aspectos que
precisam ser modificados no seu texto).
Estes momentos organizam a produção dos textos, pois estabelecem uma sequência pela
qual o aluno por meio da mediação de seu professor conseguirá efetuar com êxito. Não
estabelecemos que será uma produção em um primeiro mais fácil, pois demanda um maior
empenho por parte de professor e aluno, no entanto é o caminho para um real aprendizado.
O ato de revisão e reescrita é um dos elementos fundamentais na produção textual, eles
possibilitam que o aluno seja crítico sobre seu próprio trabalho e também que o torne cada vez
mais coerente para que tal ocorra é essencial que o professor possa mediar essas ações, visto que
78
ele tem a função de elevar o conhecimento de seus alunos a um patamar mais complexo que
anteriormente e também, tanto a revisão quanto a escrita ir além da ortografia, e voltar o olhar
para os sentidos do texto, sua coerência e coesão. É interessante que o professor elabore para
esses momentos fichas de revisão, pelas quais os alunos possam orientar seu trabalho, a fim de
que eles consigam aos poucos produzir com cada vez mais autonomia.
5.1 Produção textual – Gênero Piada
A proposta da sequência didática, aqui apresentada, do gênero Piada voltada a produção
textual tem por objetivo ampliar a capacidade de produção dos alunos em relação ao mesmo.
Não há uma ordem absoluta de como trabalhar com os gêneros, no entanto escolhemos a ordem
apresentada neste trabalho por acreditar que seja mais condizente com as necessidades do aluno,
de modo que como a produção é um momento e que o aluno deve ter claro o gênero escolhido,
optamos por ser o ultimo elemento a ser trabalhado. Para tanto no início da produção deixamos
como elemento primário um lembrete ao aluno:
Este lembrete tem a finalidade de orientar o aluno, para que ele se recorde do que é
fundamental no gênero, pois assim ele consegue ter uma “dica” que o auxiliará em caso de
dúvida. Posteriormente apresentamos o comando:
LEMBRE-SE: A piada tem por principal característica, o humor, e ele é produzido
de elementos como: PALAVRA COM DUPLO SENTIDO, DESFECHO
INESPERADO E EXAGERO.
79
Neste comando podemos observar que os alunos terão que utilizar para sua produção
suas experiências, seus conhecimentos prévios, evidentemente dentro da composição do
determinado gênero. Além disso há também um interlocutor pré-estabelecido no qual eles
devem considerar e também uma finalidade para a produção. Para o momento de revisão e
reescrita elaboramos algumas perguntas que são utilizadas com o intuito de conferir os
elementos presentes na piada:
Para orientar e auxiliar na produção de sua piada, você deve conferir se ela possui ou
responde os seguintes elementos:
Qual o tema da piada? Sobre o que ela fala?
Quem são os personagens?
O que eles estão fazendo?
Fato que altera o esperado desfecho?
Que palavras tem seu sentido alterado (conotação e denotação)
É possível perceber que cada pergunta esta relacionada à um elemento necessário na
produção da piada e que são perguntas que embora simples demandam do aluno a identificação
no texto dos elementos e o próprio ato de revisão e caso necessária a reescrita. O trabalho do
professor em todos os momentos de trabalho com o gênero é fundamental, ele como já dito é o
mediador, e portanto contribui diretamente para o desenvolvimento de seus alunos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Levando em consideração a discussão realizada em sala de aula e os textos lidos,
produza uma piada em grupo de três alunos, inventando situações do ambiente escolar
como perguntas dos alunos ao professor, diálogo entre dois alunos no intervalo,
situações vivenciadas entre outros que envolvam o ambiente escolar. Por fim, iremos
expor as piadas produzidas no mural da escola.
80
De acordo com a análise realizada, podemos considerar que na concepção de linguagem
como forma de interação, o estudo é posto com o objetivo de formar o aluno crítico baseando
nas situações vivenciadas na vida real, mas indo além delas. Entendemos que a sociedade é
dividida em práticas sociais orientadas pelos gêneros textuais, onde cada gênero se refere a uma
prática social distinta. Quando é posposto o trabalho nesta perspectiva, o conhecimento de cada
gênero textual pelo aluno implica conhecer sua prática, assim o indivíduo é capaz de discernir a
forma correta em cada momento dentro da sociedade com sua linguagem. Diante dessas
informações é possível estabelecer que esta proposta se enquadra dentro das necessidades de
formação do aluno em um cidadão crítico, capaz de discernir e atuar dentro da sociedade. No
caso do gênero piada, proposto aqui por nós, o aluno reflete sobre sua circulação textual, como
se dá sua estrutura e características, a piada como já exposto no decorrer do artigo, possibilita ao
aluno analisar uma informação em suas diversas dimensões possíveis, o que na formação crítica
é fundamental, pois demanda dele ir além do óbvio. Todos esses elementos possibilitaram
concluir que esta concepção de linguagem é a mais condizente com a função e necessidade de
formação humana, assim como o trabalho com diferentes e inusitados gêneros pode ser muito
relevante dentro dos pressupostos dela.
REFERÊNCIAS
BACKTHIN, M. O Problema do Texto. In:_______. Estética da Criação Verbal. SP: Martins
Fontes, 1992. p. 327-358.
BACKTHIN, M. Os gêneros do Discurso. In:_______. Estética da Criação Verbal. SP:
Martins Fontes, 1992. p. 277-326.
BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro
e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa. Brasília, DF: MEC/SEF, 1998.
COSTA-HÜBES, Terezinha da Conceição. Uma tentativa de análise linguística de um texto do
gênero "relato histórico''. Ling. (dis)curso (impr.), Tubarão/SC, v. 10, n. 1, abr. 2010.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1518-
76322010000100009&script=sci_arttext>. Acesso em: 09 set. 2014.
81
HILA, Claudia Valéria Doná. Escrita e Ensino: A produção de textos nos anos iniciais. 2. ed.
Maringá: Eduem, 2010. Cap. 3.
MENEGASSI, Renilson José. Leitura e Ensino: perguntas de leitura. 2. ed. Maringá: Eduem,
2010. Cap. 7. p. 167-194.
PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes curriculares da rede pública de
Educação básica do Estado do Paraná: Língua Portuguesa. Curitiba: SEED, 2006.
PERFEITO, Alba Maria. Concepções de linguagem, teorias subjacentes e ensino de língua
portuguesa. In: PERFEITO, Alba Maria. Concepções de linguagem e ensino. Maringá:
EDUEM, 2010. Cap. 2. p. 27-76.
POSSENTI, S. Os humores da língua: análise lingüística de piadas. Campinas: Mercado de
Letras, 2002.
RADAELLI, Maria Eunice. Contribuições de Vygotsky e Bakthin para a linguagem:
interação no processo de alfabetização. Faculdade Assis Gurgac. Disponível em:
http://www.fag.edu.br/admfag/php/arquivo/1322760690.pdf. Acesso em: 29/08/2014.
SAITO, Claudia Lopes Nascimento; NASCIMENTO, Elvira Lopes. Os gêneros como
instrumento para o ensino e aprendizagem da leitura e escrita. In: MENEGASSI, R. J.;
SANTOS, A. R.; RITTER, LCB. Escrita e Ensino. 2. ed. Maringá: Eduem, 2010. Cap. 2. p. 25-
57.
82
ANEXO X
ARTIGO
REFLEXÕES SOBRE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS PARA A ALFABETIZAÇÃO E A
ORGANIZAÇÃO DO ENSINO DA LINGUAGEM ESCRITA
Juliana Piovesan Vieira - UEM5
RESUMO: Dados quantitativos do Censo Escolar revelam que o número de alunos
alfabetizados não é satisfatório. Na busca de dados para compreender essa problemática,
privilegiamos o livro didático de alfabetização, por ser um instrumento de apoio ao professor e
revelar uma perspectiva de ensino. Há que se destacar que uma proposta de ensino é o resultado
da tentativa de ruptura com as práticas de ensino já estabelecidas. Portanto, para
compreendermos as práticas pedagógicas para a alfabetização, examinamos a história dos
métodos. Como o objeto de análise é a alfabetização, entendemos ser necessário o estudo sobre
o processo de apropriação dos signos escritos. Dos estudos observa-se um ensino que não
direciona a atenção do alfabetizando sobre o objeto da aprendizagem – linguagem escrita.
Palavras-chave: Método. Alfabetização. Apropriação da Leitura e da Escrita.
1 INTRODUÇÃO
Ao descobrir um meio de representar graficamente sua linguagem fonética por meio do
signo escrito, o homem potencializou a maneira de transmitir os significados generalizados que
se consubstanciam na linguagem e que revelam a experiência social, iniciando um processo de
acumulação do saber que possibilitam às gerações posteriores a apropriação e o
desenvolvimento de conhecimentos com base no acervo disponível.
5 Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Maringá. Docente na Rede Municipal de Ensino de
Cianorte e Supervisora do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência -
Pibid/Pedagogia/UEM/CRC. Endereço eletrônico: jupiovesanvieira@hotmail.com
83
Todavia apenas o registro não é suficiente para que todos os sujeitos tenham acesso ao
conteúdo que está registrado; o que possibilita essa apropriação é a leitura. A decodificação da
escrita é o meio pelo qual podemos ter acesso aos conhecimentos sistematizados, logo, aprender
a ler e a compreender o que se lê é condição para a inserção, como indivíduo, na vida do gênero
humano.
Tendo em vista essa necessidade, e percebendo que a escola, enquanto espaço
privilegiado para o ensino da leitura e da escrita, vem mostrando dificuldades em cumprir
efetivamente essa função, já que, segundo o Ministério da Educação, os dados do censo de 2010
revelam que a média nacional de crianças não alfabetizadas aos oito anos no Brasil é de 15,2%,
logo, é preciso identificar a problemática desse processo.
Ante ao exposto, torna-se fulcral investigar: como é organizado o ensino que visa
promover a aprendizagem da leitura e da escrita?
Na busca de dados para a análise da organização do ensino da alfabetização,
privilegiamos o livro didático, porque é um dos elementos que mais diretamente tem servido de
apoio ao professor, bem como revela uma perspectiva de ensino. Por ser um recurso disponível
nas escolas, por vezes, o livro didático é seguido e reproduzido em sala de aula, determinando o
conteúdo e a metodologia de ensino. Porém, há que se destacar que uma proposta de ensino é o
resultado da tentativa de ruptura com as práticas de ensino já estabelecidas. Nessa perspectiva,
para compreendermos as práticas pedagógicas para o ensino da leitura e da escrita no contexto
atual, é necessário examinarmos a história das metodologias para a alfabetização.
Como o objeto de análise desse trabalho é a organização do ensino da linguagem escrita,
há também a necessidade de entendermos o processo de apropriação dos signos escritos,
buscando identificar o papel deste para o desenvolvimento cognitivo dos sujeitos. Nesse
propósito, este trabalho busca apoio nas obras dos autores da Teoria Histórico-Cultural.
2 A DEMOCRATIZAÇÃO DA LINGUAGEM ESCRITA
Ao buscarmos elementos para a compreensão sobre a problemática dos dados
quantitativos de crianças não alfabetizadas de acordo com o censo de 2010, encontramos
indícios a respeito da maneira como é concebido o processo de alfabetização.
84
Sem dúvida, as práticas alfabetizadoras é uma questão importante, pois uma proposta de
ensino decorre da tentativa de romper com práticas ou métodos de ensino já estabelecidos em
função de circunstâncias e necessidades sociais e econômicas.
Para iniciar esta discussão, nos remetemos à primeira tentativa de generalização da
alfabetização: a Revolução Francesa, final do século XVIII.
Um dos objetivos da Revolução Francesa foi o estabelecimento da escola pública para
todos os cidadãos, com uma proeminência no ensino da língua escrita. Isso se deve porque a
Europa passava por transformações no campo econômico, político, social e cultural e há a
afirmação de uma nova classe social: a burguesia.
Nesse contexto, enraíza-se um entendimento de que o homem pode interferir e modificar
a natureza, independentemente de qualquer ação religiosa, o que significava recusar a ideia da
providência divina sobre todas as coisas. Entretanto, esse fervor de transformações não ocorreu
de maneira harmônica; houve um embate entre a velha ordem feudal e a nascente sociedade
burguesa. O afrontamento entre o conhecimento a ser preservado e o conhecimento a ser
questionado, investigado e descoberto, colocou em dúvida a fé.
A nova forma de pensar, fruto do Renascimento – o qual se estendeu por todo o período
da História Moderna (do século XV ao XVIII) –, foi possibilitada pela burguesia emergente,
também chamada de mecenas, que para estabelecer sua posição na sociedade, financiou artistas,
cientistas, arquitetos e intelectuais para dar forma às novas realidades sociais (MOTA, 1986).
Dentre os descritos, os intelectuais, chamados de humanistas, buscaram na cultura
clássica – greco-latina – o material teórico para a (re) construção e difusão das ideias
renascentistas, particularmente nos campos da literatura, filosofia, educação e política (MOTA,
1986).
Até a Revolução Francesa, a aprendizagem da leitura e da escrita era privilégio da elite
aristocrática, a partir de então, se torna socialmente necessário que os usos da linguagem escrita
se democratizem, pois a sociedade precisava de cidadãos produtivos e alfabetizados. Em
decorrência, as práticas pedagógicas se reformularam com o objetivo de atender as novas
necessidades sociais (BARBOSA, 1992).
O material utilizado para promover o processo de aprendizagem da leitura e da escrita,
até mesmo antes das mudanças revolucionárias, era a cartilha. Sobre a sua origem, Cagliari
(2007, p. 53) descreve:
85
[...] a palavra „cartilha‟ veio da palavra „carta‟. Cartilha era o diminutivo
de „carta‟ porque antigamente se usava o método das cartas para
alfabetizar. Essas „cartas‟ eram tabelas com diferentes padrões silábicos.
O termo „cartilha‟ apareceu mais recentemente. O objetivo da
alfabetização pelas cartinhas ajudava as crianças a conhecerem o
catecismo. Até então, a alfabetização não era uma questão de
escolaridade. Vamos encontrar essa situação a partir do século XVI (ou
do final do século XV).
Segundo Cagliari (2007), a “cartinha” 6 ou cartilha surgiu em Portugal, com o objetivo
de catequizar as crianças da metrópole e os súditos das colônias. Esse material didático é uma
invenção da Língua Portuguesa. Outros países copiaram e adaptaram o modelo à sua língua
vernácula.
Antes da Revolução Francesa, os textos das cartilhas eram rezas e ensinamentos
religiosos, como os mandamentos de Deus; o processo de alfabetização tinha um caráter
individual, isto é, os sujeitos, individualmente, se interessavam em ser alfabetizados. Após a
Revolução Francesa o processo de alfabetização tornou-se coletivo, nas escolas públicas para o
povo, exigindo um programa oficial e um tempo exato para a aprendizagem. Nessa
circunstância, “[...] as cartilhas tiveram de adaptar-se ao currículo escolar, cobrindo com
atividades um período de um ano de escola” (CAGLIARI, 2007, p. 56).
A partir desse momento, o material didático definia as ações educativas. Além disso,
“[...] as orações e os textos religiosos foram substituídos por textos morais, patrióticos ou de
utilidade para a sociedade” (CAGLIARI, 2007, p. 56).
3 A ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL
Segundo Mortatti (2000), no Brasil, no final do século XIX, a nacionalização do livro
didático, produzido por autores brasileiros, acompanha o desejo de organização republicana da
instrução pública. Ao mesmo tempo, ocorre a expansão do mercado editorial brasileiro, o qual
encontra na escola lugar excepcional de circulação e público consumidor de seus produtos.
6 “A primeira „cartinha‟ mais famosa, que chegou até nós, é a Cartinha de João de Barros, [...] foi publicada pela
primeira vez em 1539. Talvez ela seja ainda mais antiga” (CAGLIARI, 2007, p. 54).
86
Nessa circunstância, o ensino da linguagem escrita é tomado como índice para medir a
eficiência da escola em relação ao acesso à cultura letrada. Tem-se, assim, início um movimento
de escolarização das práticas de leitura e escrita e sua identificação com os métodos de ensino.
Passam, então, a tomar lugar de destaque “[...] as tematizações, normatizações e concretizações
sobre esse ensino e sobre um tipo particular de livro didático, a cartilha, na qual se encontram o
método a ser seguido e a matéria a ser ensinada, de acordo com certo programa oficial
estabelecido previamente” (MORTATTI, 2000, p. 42).
As primeiras cartilhas brasileiras baseavam-se nos métodos de marcha sintética
(soletração e silabação – leitura de letras, posteriormente, formação de sílabas, palavras, e,
então, frases isoladas ou agrupadas). Em relação à aprendizagem da escrita, esta se limitava no
exercício da caligrafia, cópia, ditado e formação de frases (MORTATTI, 2000).
De acordo com Mortatti (2000), no início do século XX, as cartilhas baseavam-se no
método de marcha analítica (processos de palavração e sentenciação). Conforme Barbosa
(1992), para essa concepção ler é mais importante que decifrar, a ênfase incide na compreensão
da leitura e não na decodificação, da qual é entendida como um domínio externo ao processo de
leitura. Segundo Mortatti (2000, p. 44), nesse contexto:
[...] observa-se um movimento de institucionalização do método
analítico, que se consolida com a publicação das Instruções práticas para
o ensino da leitura pelo methodo analytico – modelos de lições,
expedidas pela Directoria Geral da Instrucção Publica do Estado de São
Paulo, em 1915. Nesse documento passa-se a priorizar a historieta
(conjunto de frases relacionadas entre si por meio de nexos lógicos),
como núcleo de sentido e ponto de partida para o ensino da leitura,
enfatizando-se as funções instrumentais desse ensino.
Mortatti (2000) afirma que a partir dos anos de 1930, os métodos mistos ou ecléticos,
analítico-sintético, serviram de base às cartilhas. Nesse contexto, o método deixa de ser
importante, uma vez que o como ensinar passa a ser entendido como subordinado à maturação
da criança. A partir de então, manuais para o professor acompanhavam as cartilhas, bem como a
ideia da importância de um período preparatório se difunde.
Porém, em 1980, os pensamentos construtivistas e interacionistas sobre a aprendizagem
da linguagem escrita, resultantes das pesquisas sobre a psicogênese da língua escrita
87
desenvolvidas por Emília Ferreiro e colaboradores, influenciaram, segundo Mortatti (2000), o
desenvolvimento de questionamentos quanto à necessidade dos métodos e das cartilhas de
alfabetização. Isso ocorreu porque se deslocou a linha de discussão “[...] dos métodos de ensino
para o processo de aprendizagem da criança (sujeito cognoscente), o construtivismo se
apresenta, não como um método novo, mas como uma „revolução conceitual‟” (MORTATTI,
2006, p. 10), provocando o abandono das teorias e práticas tradicionais.
Posto em dúvida a qualidade do ensino da linguagem escrita, Galuch e Sforni (2009)
observam que as atividades de prontidão, as cartilhas e os exercícios de caligrafia foram
praticamente eliminados da escola. Assim, apareceram novas práticas para o ensino da língua,
como:
[...] incentivo à produção e uso de vários tipos de texto, dentre eles, os
„portadores de textos do cotidiano‟ (jornais, receitas culinárias, bulas de
remédio, dentre outros); as diferentes formas de o aluno grafar uma
mesma palavra passaram a ser consideradas hipóteses e não mais erros;
o tempo para a alfabetização extrapolou a primeira série de ensino
fundamental e, com isso, o professor desta série deixou de ter a
responsabilidade de que os alunos comecem a segunda série dominando
a leitura e a escrita (GALUCH; SFORNI, p. 113-114).
Além disso, alertam as autoras, o ensino da ortografia e da gramática passou a ocupar
espaço secundário nas atividades escolares. Passou-se a defender que esses conhecimentos
apenas poderiam ser trabalhados em textos produzidos pelos alunos.
Segundo Cagliari (2007), muitos pesquisadores acreditam que a escola não deve somente
treinar os estudantes a ler e a escrever, a decodificar e a produzir palavras, frases e textos
escritos, ou seja, alfabetizar não é tudo. É necessário habilitar os alunos para os usos da leitura e
da escrita em nossa sociedade. A aquisição dessa habilidade foi nominada de letramento, como
um significado ampliado do que vem a ser alfabetização.
Concordando com o autor, essa visão originou, em alguns casos, a ideia segundo a qual
alfabetizar não é aprender a decodificar, mas a compreender textos. Por esta razão, “[...] surgiu
uma nova abordagem de ensino e de aprendizagem, baseada tão-somente em atividades de
interpretação de textos”. Tal maneira de conceber a aprendizagem da linguagem escrita “[...]
tem sido a mais catastrófica da história da alfabetização e, em parte, da escola atual, que
88
substituiu o estudo da gramática pela legenda de um tipo de interpretação de texto, que se
tornou moda entre nós, recentemente”. A educação escolar “[...] tem muitas funções, mas
alfabetização, no sentido técnico, ainda continua sendo a habilidade de saber ler, ou seja, de
decifrar o que está escrito” (CAGLIARI, 2007, p.68).
Destarte, assistimos a metáfora, segundo Galuch e Sforni (2009, p. 114), da “curvatura
da vara” no ensino da linguagem escrita: “[...] da cartilha excessivamente estruturada, passa-se à
ideia da impossibilidade de planejar com antecedência quaisquer sequências didáticas, ou até
mesmo definir conteúdos mínimos da língua escrita a serem dominados em cada série”.
Para exemplificar o ensino da linguagem escrita nas séries iniciais do ensino
fundamental no contexto atual, apresentamos uma atividade expressa em um livro didático
destinado para o 1º ano:
Quadro 1: Projeto Prosa: Letramento e Alfabetização
O MISTÉRIO NO ZOOLÓGICO
Que mistério será esse?
Ouça a leitura do bilhete que está na mão do funcionário do zoológico:
Zé,
Não sei o que aconteceu no zoológico.
De repente ouvi um barulho e, logo depois, todos os animais sumiram.
Estou preocupado e confuso.
Fui procurar o segurança para nos ajudar.
Volto já!
Leopoldo
1. Quem escreveu o bilhete? Circule o nome da pessoa.
2. Para quem o bilhete foi mandado? Pinte no bilhete o nome da pessoa.
3. Por que você acha que Leopoldo escreveu um bilhete para o Zé?
4. Se Leopoldo tivesse encontrado o Zé, ele precisaria escrever o bilhete? Por quê?
Converse sobre isso com os colegas e o professor.
5. Na sua opinião, o que aconteceu no zoológico? Converse com os colegas e o
professor.
6. Como começa o bilhete?
7. Escreva a despedida do bilhete.
8. Você já escreveu algum bilhete? Qual foi o assunto?
Fonte: Prado; Hülle (2011, p. 104-105)
89
Por meio do exemplo é possível observar a preocupação em possibilitar às crianças o
acesso a um tipo de texto presente em nossa sociedade: o bilhete. Portanto, revela a intenção em
habilitar as crianças para os usos da linguagem escrita em nosso contexto. Todavia, tendo em
vista o público a que se destina essa atividade (alunos em processo de alfabetização), ela não
garante a conscientização da linguagem escrita, pois a atenção dos estudantes se dirige para o
conteúdo do bilhete, para os elementos que compõe o bilhete ou ainda, para a emissão de
opinião sobre o assunto do texto e não para a escrita das palavras. Fazemos tal colocação a
partir do entendimento de que “[...] o objeto da consciência é aquele para o qual se dirige a
atenção do sujeito” (LEONTIEV, 1983, p. 198), isso significa que a apropriação da linguagem
escrita não ocorre de maneira voluntária, mas a sua conscientização exige atividades que dirijam
a atenção dos alunos para a assimilação do código.
4 PRINCÍPIOS ORIENTADORES PARA A ORGANIZAÇÃO DO ENSINO DA
LINGUAGEM ESCRITA
A concepção de desenvolvimento que fundamenta as reflexões pretendidas neste texto
defende a natureza social do homem, enquanto processo dependente de leis sociais e objetivas.
Ao contrário do desenvolvimento filogenético dos animais, cujas aquisições se firmam
em forma de mudanças na organização biológica, no desenvolvimento do cérebro, as aquisições
do desenvolvimento histórico da humanidade consolidam-se em objetos materiais e intelectuais
– linguagem, ciência – criados pelos homens.
Dada essa condição, Leontiev (2004) afirma que para se apropriar dos fenômenos
externos da cultura material e intelectual é indispensável “[...] desenvolver em relação a eles
uma atividade que se reproduza, pela sua forma, os traços essenciais da atividade encarnada,
acumulada no objeto” (LEONTIEV, 2004, p.286). Em outras palavras, o processo de
apropriação é sempre “[...] um fenômeno ativo. Para „se apropriar‟ dos fenômenos é preciso
empreender uma atividade adequada ao conteúdo no objeto ou no fenômeno dado”. Por
exemplo, “quando dizemos [...] que a criança „assimila‟ instrumentos, isto significa que começa
a usá-los com precisão, que forma as correspondentes ações e operações motoras e mentais”
(LEONTIEV, 2005, p.94). Portanto, “[...] a assimilação no homem é um processo de
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reprodução, nas propriedades do indivíduo, das propriedades e aptidões historicamente
formadas na espécie humana” (LEONTIEV, 2004, p. 288).
Tomando por base esse pressuposto, observamos que a escrita é um produto
psicossocial, que traz em si os traços característicos de conquistas intelectuais humanas, como a
descoberta de que podemos representar a linguagem oral por meio de símbolos (escrita) e as
operações mentais empreendidas em sua elaboração: os processos de codificação e
decodificação. Essas características fizeram da escrita um “[...] simbolismo de segunda ordem,
que compreende a criação de sinais escritos representativos dos símbolos falados das palavras”
(VIGOTSKI, 1998, p.153). Com efeito, a aprendizagem da leitura e da escrita consiste em
compreender a função simbólica dos signos escritos e a assimilação das faculdades formadas em
sua elaboração. É ao mesmo tempo um processo de formação ativa, porque permite o
desenvolvimento de funções psíquicas novas, funções psicológicas superiores que “hominizam”
os indivíduos na esfera cognitiva.
Entretanto, indagamos: pode o sujeito adquirir essas capacidades mediante a relação
direta com a linguagem escrita? Pautando-nos em Leontiev, a resposta a essa questão é negativa.
Na visão do autor:
As aquisições do desenvolvimento histórico das aptidões humanas não
são simplesmente dadas aos homens nos fenômenos objetivos da cultura
material e espiritual que os encarnam, mas são aí apenas postas. Para se
apropriar destes resultados, para fazer deles as suas aptidões, „os órgãos
da sua individualidade‟, a criança, o ser humano, deve entrar em relação
com os fenômenos do mundo circundante através de outros homens, isto
é, num processo de comunicação com eles. (LEONTIEV, 2004, p. 290).
O conteúdo, as ações e as operações mentais estão contidos na linguagem escrita; logo,
são alheios aos sujeitos. Se o desenvolvimento das aptidões humanas e do conhecimento é
produto da experiência sócio-histórica, sua aquisição surge sob a influência do próprio homem.
Como isso ocorre?
Na acepção de Vigotski, todas as funções psicológicas superiores aparecem duas vezes
no processo de desenvolvimento de cada pessoa. Primeiramente no plano social, interpsíquico;
posteriormente no plano individual, intrapsíquico. Nas palavras do próprio autor:
Todas as funções do desenvolvimento da criança aparecem duas vezes:
primeiro, no nível social, e, depois, no nível individual; primeiro, entre
pessoas (interpsicológica), e, depois, no interior da criança
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(intrapsicológica). Isso se aplica igualmente para a atenção voluntária,
para a memória lógica e para a formação de conceitos. Todas as funções
superiores originam-se das relações reais entre indivíduos humanos. A
transformação de um processo interpessoal é o resultado de uma longa
série de eventos ocorridos ao longo do desenvolvimento (VIGOTSKI,
1998, p.75).
O reconhecimento da unidade entre os processos inter e intrapsíquicos revela que a
apropriação do conhecimento e com ele o desenvolvimento das capacidades complexas do
pensamento, em cada sujeito, depende das interações a que ele está submetido, logo, a
apropriação da linguagem escrita está sujeita à intervenção pedagógica. Esse reconhecimento
traz implicações à educação escolar, porque é em seu contexto que ocorre, de modo particular, o
ensino da leitura e da escrita, mediante as quais os sujeitos se apropriam dos conteúdos das
várias ciências.
A frequência com que a criança está imersa nas significações sociais e na interação com
seus pares levou Vigotski (1998) a concluir que ela não inicia sua aprendizagem na escola; ao
contrário, quando ingressa nessa instituição, traz uma série de conhecimentos do mundo que a
cerca. Essa história prévia da aprendizagem escolar diz respeito aos conhecimentos cotidianos,
espontâneos, adquiridos informalmente no intercâmbio entre pessoas, nas vivências diárias. São
adquiridos, também, pela observação e experiência imediata que a criança realiza; por isso, nem
sempre esse tipo de conhecimento leva à compreensão dos fatos.
O conhecimento prévio da criança pode também estar relacionado à capacidade de
perceber, por meio de outro sujeito mais experiente, os elementos simbólicos impressos em
nossa sociedade, como a escrita.
Na história humana, a escrita tornou-se um dos principais mecanismos de comunicação,
interação e apropriação do conhecimento. Por isso, esse sistema simbólico está presente em toda
parte: outdoors, placas de trânsito, embalagens, bulas, manuais de instrução, folhetos,
propagandas; enfim, a linguagem escrita faz parte da vida dos homens. Por essa razão, não
podemos ignorar o fato de que crianças que habitam sociedades culturalmente letradas têm
contato com a escrita antes de ingressarem em uma classe de alfabetização.
Na relação direta com o símbolo linguístico, como o caso do nome de um produto, não
significa que a criança tenha consciência do sistema da escrita, que compreenda a relação entre
92
grafema e fonema. No entanto, na escola, a aprendizagem da leitura e da escrita torna o símbolo
linguístico um processo consciente.
Vigotski (2000) entende que toda aprendizagem escolar, tomada no aspecto psicológico,
gira em torno de dois eixos: a tomada de consciência e a apreensão. A leitura e a escrita
constituem-se o meio pelo qual a consciência se desenvolve e o conhecimento é apreendido.
Em seus experimentos, Vigotski mostra que a aprendizagem da escrita exige operações
mentais superiores. De acordo com o autor, o desenvolvimento da linguagem escrita não repete
a história do desenvolvimento da fala. “A escrita é uma função lingüística distinta, que difere da
fala oral tanto em estrutura como no funcionamento. Até mesmo o seu nível de
desenvolvimento exige um alto nível de abstração” (VIGOTSKI, 2008, p.123). Isso se deve à
atividade cognitiva das gerações anteriores que passaram a representar suas ideias por meio de
signos escritos. Porquanto, para escrever a criança precisa “[...] abstrair o aspecto sensorial da
sua própria fala, passar a uma linguagem abstrata, que não usa palavras, mas representações de
palavras” (VIGOTSKI, 2000, p.313).
A escrita exige uma ação analítica por parte da criança, ao passo que na fala ela não tem
consciência dos sons que emite e das operações mentais que realiza. Para escrever, explica
Vigotski, ela “[...] tem que tomar conhecimento da estrutura sonora de cada palavra, dissecá-la e
reproduzi-la em símbolos alfabéticos, que devem ser estudados e memorizados antes”
(VIGOTSKI, 2008, p.124). Em outra obra, afirma: “Na escrita, [...] ela [a criança] deve ter
consciência da estrutura sonora da palavra, desmembrá-la e restaurá-la voluntariamente nos
sinais escritos” (VIGOTSKI, 2000, p.316).
Amparando-nos no conceito de apropriação de Leontiev (2004), entendemos que para a
aquisição da linguagem alfabética é necessária uma atividade que reproduza as conquistas
empreendidas pelos homens no desenvolvimento desse “conjunto de sinais”, como a apreensão
das diferentes possibilidades que desenvolveram para as letras serem grafadas (letras
maiúsculas, minúsculas, imprensa, cursiva), a relação entre grafema (letra) e fonema (som) e as
combinações das letras para a formação de sílabas e palavras. Observamos que a aprendizagem
da leitura e da escrita passa por um sistema, uma determinada estrutura sistemática:
compreensão da ideia de símbolo, abstração do aspecto sonoro das letras, codificação de
palavras, decodificação da palavra escrita.
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É importante enfatizar que, em consonância com Vigotski (1998), a transformação de
um processo interpessoal em um processo intrapessoal é o resultado de uma série de etapas, o
que significa que o domínio da leitura e da escrita por meio da mediação docente é o resultado
de uma longa série de ações que levam o aluno ao domínio do código. Isso ocorre, segundo
Bogoyavlensky e Menchinskaya (2005, p.74), porque:
[...] a capacidade de usar adequadamente as ações mentais surge como
resultado de um exercício mais ou menos prolongado. A aquisição de
ações mentais consiste no fato de que as ações mentais se convertem em
hábitos, que se manifestam com grande liberdade e facilidade
(BOGOYAVLENSKY; MENCHINSKAYA, 2005, p.74).
Mediante esse ponto de vista, podemos inferir, no caso da aprendizagem da leitura e da
escrita de palavras do sistema alfabético, que a reconstrução da atividade psicológica
desenvolvida em seu processo de criação, aparece como resultado de uma ação que adquiriu
certa frequência, na intenção de provocar o domínio das várias operações envolvidas neste
sistema de signos. Para tanto, é indispensável estabelecer certo hábito para seu domínio. À
medida que o aluno vai se apropriando dos mecanismos próprios da linguagem escrita, as
operações empreendidas em sua criação convertem-se em hábito e integram-se à ação
excepcionalmente humana: a ação consciente.
Há que se questionar ainda: o domínio da leitura é suficiente para que o aluno, ao ler um
texto, compreenda seu conteúdo?
Os significados dos signos – palavras – não são estáticos. Os significados atribuídos às
palavras pelos homens evoluem conforme a idade e o grau de instrução de cada sujeito, porque
as mediações entre o indivíduo e o meio sociocultural enriquecem seu repertório simbólico e
tornam mais vasto o campo das significações.
Conforme afirma Vigotski (2000, p.246):
Em qualquer idade, um conceito expresso por uma palavra representa
uma generalização. Mas os significados das palavras evoluem. Quando
uma palavra nova, ligada a um determinado significado, é apreendida
pela criança, o seu desenvolvimento está apenas começando; no início
ela é uma generalização do tipo mais elementar que, à medida que a
criança se desenvolve, é substituída por generalizações de um tipo cada
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vez mais elevado, culminando o processo na formação dos verdadeiros
conceitos (VIGOTSKI, 2000, p.246).
Se o significado da palavra se altera na dinâmica social e em diferentes níveis de idade,
consequentemente, quanto maior o conhecimento dos conceitos consubstanciados nas palavras
que uma pessoa possui, maior capacidade ela terá para refletir, abstrair e generalizar. Porquanto,
se ao ler um texto o aluno não possui o conhecimento do conceito de uma palavra ou de várias
palavras, isso pode lhe comprometer a compreensão do conteúdo escrito.
Ao investigar o processo de formação de conceitos, Vigotski (2008) levanta um aspecto
de ampla importância para o ensino escolar: a diferenciação entre o processo de
desenvolvimento dos conceitos cotidianos e científicos.
Como já pontuamos, o autor explicita que, na idade pré-escolar, as crianças adquirem os
conceitos cotidianos, os quais são apreendidos em situações em que a consciência está voltada
para o objeto, o fenômeno e não propriamente ao conceito nele presente; há, portanto, uma
assimilação espontânea, não voluntária, de conhecimentos. Logo, esse tipo de pensamento se
desenvolve independentemente da escola.
Já os conceitos científicos não estão evidentes nos objetos, fenômenos, contextos, por
isso são portadores de um nível mais elevado de abstração, ou seja, neles estão
consubstanciados pensamentos complexos dos homens, mobilizados a serviço da resolução de
problemas e do conhecimento. Por conseguinte, citando Vigotski (2000, p. 256), o processo de
desenvolvimento dos conceitos ou significados das palavras exige uma série de operações
mentais superiores, como “[...] a atenção arbitrária, a memória lógica, a abstração, a
comparação, e a discriminação”, que dirigem a consciência ao próprio conceito, à ação de
pensar e que permite, portanto, o desenvolvimento da consciência reflexiva. Logo, o acesso aos
conceitos científicos ocorre por meio da instrução.
Os pressupostos da Teoria Histórico-Cultural deixam evidente que devido ao poder de
atuação que os signos conferem à mente humana, eles se constituem em ferramentas
psicológicas, porquanto, neles estão consubstanciados pensamentos humanos complexos. A
linguagem escrita e os conceitos científicos, por serem parte desse conjunto de sistemas
simbólicos, quando assimilados, desencadeiam processos psíquicos superiores enraizados na
cultura humana.
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Quando um sujeito se apropria das operações mentais plasmadas na linguagem escrita
como “órgãos da sua individualidade”, não passa apenas por uma experiência pessoal, mas pela
experiência de todo gênero humano. No entanto, para que cada sujeito internalize as ações
mentais que envolvem a leitura e a escrita é necessário que o mesmo passe por intervenções.
Isso implica, para a educação escolar, mediação docente e um ensino intencionalmente
organizado.
Quanto a esse último, compete um ensino que direcione a tomada de consciência do
objeto da aprendizagem – linguagem escrita – e da atividade psíquica que permita que ele seja
assimilado. O estudo apresentado revela os limites do processo de alfabetização no contexto
atual, cujas ações pedagógicas não explicitam o ensino da linguagem escrita.
É possível perceber que a cartilha excessivamente estruturada dirigia a atenção da
criança para a assimilação do código, em contrapartida, em razão de não ser o seu objetivo, não
valorizava os usos da linguagem escrita em nossa sociedade.
Porém, hoje, como verificamos no exemplo de atividade do quadro um, não propõe
ações que possibilitam aos alunos a assimilação do signo escrito. Da forma como o ensino foi
organizado, supõe-se que a criança já domina a leitura e a escrita. Apenas as atividades um,
dois, seis e sete se ocupam em solicitar aos estudantes a identificação de palavras. No entanto,
as atividades não exploram a tomada de consciência da estrutura sonora das palavras, se
assemelhando ao processo de aprendizagem da fala, onde o sujeito não tem consciência dos
sons que pronuncia.
Além disso, as outras questões (três, quatro, cinco e oito) exigem a emissão de pareceres
pessoais sobre o assunto do texto, eliminando a necessidade de o aluno recorrer ao conteúdo
escrito para responder às questões e até mesmo ao conceito social do bilhete. Em decorrência,
certamente, a atividade levará as crianças a exporem respostas superficiais.
Os conceitos científicos, entre as formas superiores de ação consciente, como uma
maneira desenvolvida de os sujeitos refletirem cognitivamente suas experiências e
conhecimentos, estão cristalizados e disponíveis na linguagem. Logo, o modo como a
linguagem escrita se expressa nos diferentes tipos de textos (bilhete, poesia, propaganda,
receita...), bem como todos os conteúdos da língua (pontuação, paragrafação, concordância
verbal e nominal, ortografia, entre outros), também são elaborações conceituais.
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Dessa ideia, resulta que o processo de apropriação da leitura e da escrita deve ocorrer em
situações que visam promover a compreensão desses conteúdos socialmente estabelecidos, bem
como o foco, essencialmente, na assimilação do código. Essas aprendizagens exigem sequência
e direcionamento didático.
Portanto é necessário superar a visão dicotômica da escrita, dos métodos sintéticos,
analíticos ou a mistura de ambos, desvinculadas de seu uso social, e o ensino da escrita no
contexto atual, que dilui sua aprendizagem em atividades de interpretação de texto.
5 CONCLUSÃO
A partir da breve periodização da história da alfabetização, observa-se que as
concepções de ensino da linguagem escrita ora dão ênfase ao estudo dos elementos da língua,
ora à aprendizagem do seu uso social, atrelando alfabetização e letramento, e no contexto atual,
a ênfase ao querer letrar antes de alfabetizar.
A partir do estudo elaborado com base na Teoria Histórico-Cultural podemos afirmar
que os conteúdos a serem ensinados: linguagem escrita e a elaboração conceitual devem ser
organizados de maneira que os sujeitos tomem consciência deles.
Para a alfabetização, significa direcionar o trabalho não só com vistas ao estudo do
sentido e significado do texto, mas, além disso, e porque não dizer, sobretudo, a reflexão do
signo escrito. Essa ideia nos alerta para os limites das ações pedagógicas para o ensino da
linguagem escrita no contexto atual, cujo objetivo é superar o ensino tradicional e tornar
secundária a habilidade de saber ler e escrever, logo, um dos motivos que geram a problemática
de crianças não alfabetizadas.
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