ATIVISMO JUDICIAL: uma análise contemporânea …...Prof. Antonio Minhoto Montesquieu disseminou a...

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ATIVISMO JUDICIAL:

uma análise contemporânea do

caso brasileiro

Prof. Antonio Minhoto

Montesquieu

disseminou a

ideia de

repartição do

poder estatal

como forma de

limitar o

exercício desse

poder.

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A ideia inicial da repartição do poder

estatal, era, assim, limitar o poder

estatal por meio de uma mútua

fiscalização entre os poderes, o que,

posteriormente, ficou conhecido como

“CHECKS AND BALANCES” (freios e

contra-pesos)

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A busca dessa maior eficiência adquiriu

especial relevo a partir do século XX em

que o Estado, notadamente após a 1ª

Guerra Mundial, foi instado a assumir

tarefas cada vez mais complexas, o que

certamente incluiu o Poder Judiciário e

a prestação jurisdicional.

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O juiz, porém, ainda seguia um modelo

ortodoxo em que sua função era limitada a

revelar o conteúdo da lei, sem

interpretação. Esse modelo era chamado

de “JUIZ BOCA DA LEI” (bouche de laloi). Esse modelo entra em crise (1950 em

diante), uma vez que o juiz tinha que julgar

questões complexas (meio-ambiente, p. ex)

o que lhe exigia uma interpretação mais

ampla do caso.

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“Hoje, já é assente o entendimento de que a função jurisdicional é uma atividade genuinamente criadora, pois, a concepção da sentença ou da decisão como sinônimo de silogismo caiu em descrédito. A obra do órgão jurisdicional traz sempre (...) um aspecto novo, o qual não estava contido na norma geral” (Profa.

Sabrina Dourado Andrade)

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Desse modo, não somente a interpretação, mas também a criatividade, se revela como um fator importante no ato de julgar.

Uma questão, contudo, surge: como evitar o abuso dessa criatividade, como evitar o arbítrio, como garantir os limites do ato de julgar?

“O problema do ativismo surge

exatamente no momento em que a Corte

extrapola os limites impostos pela

Constituição e passa a fazer política

judiciária, seja para o ‘bem’, seja para o

‘mal’” (Lenio Streck)

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E por que, afinal, o judiciário pode ser

levado a exacerbar de suas funções,

avançando sobre atribuições do

legislativo e executivo?

1. Legislativo e executivo se mostram

mais desgastados junto à população

(políticos)

(cont.)

13

(cont.)

2. O judiciário viu-se com a atribuição de

concretizar valores dispostos na

constituição federal

Especialmente o STF – Supremo

Tribunal Federal, julgou, nos últimos

anos, diversas questões cuja regulação

ou normatização deveria ter sido feita

pelo legislativo. O STF, assim, exerceu

um papel originário do legislador.

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Julgou, p. exemplo, a questão das Cotas

Étnicas nas universidades, decidindo

que estas eram CONSTITUCIONAIS.

Outro julgamento marcante foi o da União

Homossexual. O STF não apenas regulamentou

tal união, como decidiu que os homossexuais

poderiam casar diretamente nos cartórios,

“revogando” o contido no Código Civil, que exige

diversidade de sexos.

Relevante foi o

julgamento sobre a

manipulação de

embriões, com vistas a

auxiliar na cura de

doenças degenerativas.

O tema claramente

deveria ter sido objeto

de lei específica, mas o

STF julgou e regulou a

matéria por completo.

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Um julgamento

interessante foi o da

demarcação da

reserva indígena

Raposa Serra do Sol,

em Roraima. Claro

que não é papel do

STF demarcar reserva

indígena, mas foi

exatamente o que o

Supremo fez, inclusive

expulsando não-índios

da área demarcada.

“Ambos os arts. 231 e 232 da Constituição Federal são de finalidade nitidamente fraternal ou solidária, própria de uma quadra constitucional que se volta para a efetivação de um novo tipo de igualdade: a igualdade civil-moral de minorias que só têm experimentado (...) desvantagens comparativas com outros segmentos sociais” – Trecho Voto Min.

Ayres Brito (Rel. no STF)

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Esses julgamentos são bons exemplos de

um ativismo judicial que, por vezes e

em alguns pontos, pode ser visto como

excessivo/abusivo, mas, vem sendo

praticado e aceito pela sociedade, talvez

porque esta última esteja mais focada

no resultado prático dos julgamentos.

Esse ambiente é especialmente

emblemático no caso da chamada

Operação Lava-Jato.

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Lava-Jato em números (até Março 2019):

2476 procedimentos instaurados

1196 buscas e apreensões

277 conduções coercitivas

155 prisões preventivas

155 prisões temporárias

6 prisões em flagrante

11 acordos de leniência

242 condenações criminais contra 155 pessoas

548 pedidos de cooperação internacional 24

O principal personagem desta operação é o

juiz Sérgio Moro (hoje Ministro da Justiça),

tratado por alguns como alguém acima do

bem e do mal, ou, no mínimo, um super-

herói.

Como a atuação de Moro se mostrou, ao

menos aparentemente, eficaz, eventuais

abusos seus foram tratados como itens

menores/inevitáveis para se alcançar um

objetivo maior: punir corruptos e

corruptores.

O TRF-4, instado a se manifestar sobre a

conduta de Moro, decidiu que a Operação

Lava Jato “traz problemas inéditos e [por

isso] exige soluções inéditas”.

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O ativismo judicial, identificado na figura de Sérgio

Moro é tão palmar que sua figura transcendeu ao

campo judicial e se tornou política, tendo sido

nomeado, segundo as palavras do Presidente Jair

Bolsonaro, “Super Ministro da Justiça”

A questão que fica é: isso é bom ou ruim? Bons

modelos que inspirem a toda a sociedade parece

ser algo desejável, mas depender disso para

articular ações na esfera pública já não parece ser

tão bom.

A questão da suposta efetividade/eficácia no caso,

precisa ser vista com reservas, pois, se um juiz

decide de modo abusivo, ele poderá assim agir

contra quem não gostamos e amanhã contra

quem gostamos, ou até nós mesmos. Nasce,

assim, um juiz idiossincrático, voluntarioso.

Moro agora, já não mais como juiz, mas como

Ministro da Justiça, experimenta um jogo

totalmente diferente, em que suas decisões

não são imediata e integralmente acatadas,

como ficou claro na nomeação de Ilona

Szabó para o Conselho de Política Prisional,

indicação posteriormente revogada a mando

de Bolsonaro.

O prestígio popular construído como juiz, não

tem a mesma eficácia no campo político.

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O pacote anti-crime de Moro (um projeto do

Ministro Alexandre de Moraes, na vdd), traz boas

propostas, como a prisão em 2ª instância com

possibilidade de recurso com efeito suspensivo e

a criação da figura do informante interno, o

whistle blower.

O ponto, contudo, não é o pacote em si, mas o jogo

político, bem diferente da atividade jurisdicional.

O pacote, no Congresso, estará exposto a outras

forças, ao jogo democrático do debate.

Certamente será modificado.

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Enquanto isso...o Judiciário continua praticando

ativismo judicial, como o recente julgamento

(ainda não concluído) da criminalização da

homofobia mostrou.

Trecho Voto Min. Celso de Mello – Março 2019

“Dar interpretação conforme à Constituição, em face dos mandados constitucionais de incriminação inscritos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Carta Política, para enquadrar a homofobia e a transfobia(...) nos diversos tipos penais definidos na Lei nº 7.716/89, até que sobrevenha legislação autônoma, editada pelo Congresso Nacional, seja por considerar-se, (...) que as práticas homotransfóbicasqualificam-se como espécies do gênero racismo, na dimensão de racismo social consagrada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento plenário do HC 82.424/RS (caso Ellwanger) (...)” (cont.) 35

(...) (cont.) “(...) na medida em que tais condutas importam em atos de segregação que inferiorizam membros integrantes do grupo LGBT, em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero, seja, ainda, porque tais comportamentos de homotransfobia ajustam-se ao conceito de atos de discriminação e de ofensa a direitos e liberdades fundamentais daqueles que compõem o grupo vulnerável em questão”

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De novo: não se está questionando a relevância do

tema, mas a forma como está sendo tratado, por

meio de um julgamento junto ao STF. Matéria de

competência clara do parlamento, mas regulada

pelo Judiciário.

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O papel do Judiciário, convém lembrar, é

contra-majoritário. O judiciário deve aplicar

as leis e prestigiar o sistema jurídico-

normativo, mesmo que de modo impopular.

E o juiz deve ser um personagem

COMEDIDO.

O professor Mauro Cappeletti diz que o “juiz

é um homem livre dentro de sua cela”,

justamente para transmitir essa ideia de

uma atividade rigidamente demarcada e

limitada. 38

Por outro lado, o juiz “boca da lei” está morto. Seria inadequado, assim, pretender que o julgador contemporâneo julgasse baseado num modelo superado de justiça.

É preciso conciliar limitação com liberdade,

buscar um equilíbrio entre ambas.

Sugere-se a observância de três aspectos

relevantes neste tema:

1. O campo político deve ser, tanto quanto

possível, a área fundamental das grandes

discussões sociais, eis que formado pelo voto

popular.

2. O limite ao exercício da função

jurisdicional deve ser observado para se evitar

o arbítrio e o abuso de poder.

41

(cont.)

3. Não há solução mágica. O poder judiciário

obviamente exerce uma função fundamental,

mas a ele não devem ser endereçadas

atribuições tipicamente afetas aos outros

poderes. Antes, a pressão e manifestação

populares, aliadas a reformas vitais a serem

implementadas em tais poderes, parece ser o

caminho mais adequado.

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Obrigado pela atenção !

Antonio Celso Baeta Minhoto

antonio@baetaminhoto.com.br