Post on 14-Apr-2017
AUTO DA BARCA DO INFERNO
GIL VICENTE
Madalena FernandesESPAN 2012/13
"Segundo António José Saraiva, o enorme sucesso das obras dramáticas de Gil Vicente vem da sua extraordinária vivacidade mimética e do talento para criar aquilo que é especificamente dramático: situações e personagens. Duas grandes forças atuam no teatro vicentino: a paródia (nem sempre satírica), para fazer rir, de vários tipos sociais, em geral estereotipados; e a preocupação didático-religiosa, que se destina a transmitir a doutrina da Igreja Católica, especialmente o mistério da Encarnação e a luta entre o Bem e o Mal. Esses personagens e essas forças estão unidos no Auto da Barca do Inferno." (Pedagogia&Comunicação,pg 3)
Para se compreender o “Auto da Barca do Inferno” deve-se ter presente que esta obra foi escrita num período da história que corresponde à transição da Idade média para a Idade Moderna. O seu autor, Gil Vicente, enquadra-se justamente nesse momento de transição, ou seja, está ligado tanto ao medievalismo quanto ao humanismo. Esse conflito faz com que Gil Vicente pense em Deus e ao mesmo tempo exalte o homem livre.
O reflexo desse conflito interior é visto claramente na sua obra, pois ao mesmo tempo que critica, de forma impiedosa, toda a sociedade do seu tempo, adotando assim uma postura moderna, tem ainda o pensamento voltado para Deus, característica típica do mundo medieval.
Para além de ser uma peça de crítica social, Gil V.
classificou-a de “AUTO DE MORALIDADE”(p.54).
“Auto”, na Idade Média, designava uma peça de teatro
que tratava, normalmente, de temas religiosos.
Geralmente, o auto de moralidade transmitia
ensinamentos morais, isto é, “lições” sobre o bem e o mal,
as virtudes e os vícios.
«
«RIDENDO CASTIGAT MORES»« A R I R S E C O R R I G E M O S C O S T U M E S » , O U, “A
R I R S E D I Z E M A S V E R D A D E S ”
Este é o lema de todo o teatro vicentino.
Criticar, provocando o riso, não era só mais divertido e adequado, como
também permitia que a crítica fosse mais facilmente aceita.
O cómico é um dos meios utilizados para atingir o seu objetivo (criticar os
comportamentos e as mentalidades das diferentes classes sociais da época).
moralidade
3 TIPOS DE CÓMICO
Cómico de linguagem: utilização do calão, das pragas, etc.
Cómico de situação: Ex. : o Frade entra a cantar e a dançar
com uma moça.
Cómico de caráter: o Parvo, por ser tolo, não tem consciência
dos seus atos nem das suas palavras.
Ao cómico prende-se a um recurso expressivo
a ironia.
EXEMPLOS ATUAIS DE CÓMICO
Cómico de situação: uma pessoa vai para se sentar e , não reparando que a cadeira foi desviada, senta-se e cai.
Cómico de caráter: uma menina de 5 anos que tenta passar por adulta (quer ser igual à mãe): calça sapatos de salto alto, veste uma saia da mãe e pinta os lábios e os olhos,
Cómico de linguagem: um aluno, no meio de uma exposição oral sobre Gil Vicente, usando um registo cuidado, diz: “Gil Vicente foi um dramaturgo altamente.”
A ironia pretende-se sugerir o contrário
daquilo que se diz com as palavras ou daquilo que se
pensa.
A ironia assemelha-se à hipocrisia.
O “Auto da Barca do Inferno”foi apresentado pela primeira vez em 1517, no Natal, à «muito católica rainha Lianor”.
Este Auto tem como cenário um porto imaginário, onde estão ancoradas duas barcas: uma, com destino ao paraíso, tem
como comandante o Anjo; a outra, com destino ao inferno, tem
como comandante o Diabo, que traz consigo um companheiro.
Todas as almas, assim que se desprendem dos corpos, são obrigadas a passar por esse lugar para serem julgadas. Dependendo dos atos cometidos em vida, são condenadas à Barca da Glória ou à do Inferno.
“Embora o Auto da Barca do Inferno seja o auto do julgamento das almas, a expressão “barca do Inferno” indica a tendência de as almas seguirem, na grande maioria, na barca que as leva ao Inferno.” (p.52)
“A barca é o símbolo da viagem” e “do meio de passagem para o Outro Mundo”. (p.52)
SIMBOLOGIA DA BARCA
O ESTILO
Quanto ao estilo, pode-se dizer que todo o Auto
é escrito em tom coloquial, ou seja, a
linguagem aproxima-se da fala, revelando assim
a condição social das personagens.
O Auto possui um único ato, dividido em cenas, nas quais predominam os diálogos entre as almas que estão a ser julgadas com o Anjo e com o Diabo. As personagens do Auto, com exceção do Anjo e do Diabo, são representantes típicos da sociedade da época (personagens-tipo). Raramente aparecem identificados pelo nome, pois são designadas pela ocupação social que exercem. Exemplo : o onzeneiro, o judeu, sapateiro etc.
ESTRUTURA EXTERNA
ESTRUTURA EXTERNA
Cenas PersonagensI (Anjo), Diabo e o
companheiroII Anjo, Diabo, Fidalgo e o
Pajem
III Anjo, Diabo e o Onzeneiro
IV Anjo, Diabo e JoaneV Anjo, Diabo e o SapateiroVI Anjo, Diabo, o Frade e a
MoçaVII Anjo, Diabo e a
AlcoviteiraVIII Anjo, Diabo e o Judeu
IX ( a cena da justiça) Anjo, Diabo, o Corregedor e o Procurador
X Anjo, Diabo e o Enforcado
XI Anjo, Diabo e os 4 Cavaleiros
ALGUMAS DAS PERSONAGENS -TIPO
PERSONAGEM-TIPO
É uma personagem plana* que pretende caracterizar um grupo
social ou profissional. O seu comportamento não o
individualiza, dado que o objectivo é expressar as qualidades
e/ou defeitos do conjunto a que pertence.
Personagens planas: são aquelas que não tem profundidade
psicológica. Não tem uma caracterização psicológica, que não a
faz evoluir durante a narrativa da história.
O FRADE
Representa o
clero.
PERSONAGENS ALEGÓRICAS
O Anjo e o Diabo são personagens alegóricas, porque
representam respetivamente o Bem e o Mal, o Céu e
o Inferno.
OUTRAS FIGURAS ALEGÓRICAS
A justiça é representada por uma mulher de olhos vendados que segura uma balança;
A paz é figurada por uma pomba;
A crueldade por um tigre.
ESTRUTURA INTERNA
Este auto não é constituído por uma ação que se desenvolve da
exposição ao desenlace, mas por um conjunto de várias mini-ações
paralelas.
Cada uma destas mini-ações funciona como um tribunal.
Ao longo de toda a obra, o Diabo e o Anjo desempenham o papel de
advogados de acusação e, ao mesmo tempo, de juízes. Não existe
advogado de defesa e são os réus que, bem ou mal, vão
apresentando os argumentos para tentarem defender-se.
ESTRUTURA INTERNA
A ação corresponde ao desenrolar dos acontecimentos e organiza-se:
o Exposição: parte inicial que apresenta as personagens e a situação;
o Conflito: apresentação dos argumentos de acusação e de defesa;
o Desenlace: Sentença: Paraíso ou Inferno.
“Gil Vicente fez, no Auto da Barca do Inferno, uma reflexão crítica acerca da sua época, dos costumes e dos homens e das mulheres de que o mundo contemporâneo ainda hoje pode colher ensinamentos.”(p.53)
É, por isso, uma obra intemporal e atual.
CONCLUSÃO
O Auto da Barca do Inferno do século XXI