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. Promovendo um massacre
O mundo era um lugar muito diferente em 10 de setembro de 2001,quando
Donald Rumsfeld subiu ao pódio do Pentágono para fazer um de seus primei-
ros longos discursos como secretário da Defesa do presidente George W. Bush.
Para a maioria dos americanos, a Al Qaeda não existia,e Saddam Hussein aindaera o presidente do Iraque.Rumsfeld já havia ocupado aquele cargo uma vez —
sob o presidente Gerald Ford, entre 1975 e 1977 —, mas voltara ao posto em
2001 com idéias ambiciosas.Naquele dia de setembro do primeiro ano da admi-
nistração Bush,Rumsfeld dirigiu-se aos funcionários do Pentágono encarregados
de supervisionar os altos negócios dos contratos de defesa — gerenciando as
Halliburtons, DynCorps e Bechtels. O secretário estava diante de um ruidoso
grupo de ex-executivos da Enron, Northrop Grumman, General Dynamics e
Aerospace Corporation — gente que ele havia inserido como seus altos delega-dos no Departamento de Defesa — e fez uma verdadeira declaração de guerra.
“O assunto de hoje é um adversário que representa uma ameaça,uma séria
ameaça à segurança dos Estados Unidos da América”, trovejou Rumsfeld.1 “Esse
adversário é um dos últimos bastiões do planejamento central no mundo de
hoje. Seu governo se faz com base em planos qüinqüenais. De uma única capi-
tal, ele tenta impor suas exigências por meio de fusos horários, continentes,
oceanos e mais além.Com brutal coerência,sufoca o pensamento livre e esmaga
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novas idéias.Desorganiza a defesa dos Estados Unidos e põe em risco as vidas de
homens e mulheres de uniforme.” Fazendo uma breve pausa em prol do efeito
dramático,Rumsfeld — ele próprio um veterano da Guerra Fria — disse entãoa sua nova equipe:“Talvez esse adversário lembre a antiga União Soviética,mas
ela é um inimigo que não existe mais: hoje, nossos inimigos são mais sutis e
implacáveis.Talvez vocês imaginem que eu esteja descrevendo um dos últimos
ditadores decrépitos do mundo. Mas os dias desses ditadores também estão
quase terminados,e eles não são páreo para a força e o tamanho do adversário a
que me refiro. Esse adversário está mais perto de casa. É a burocracia do Pentá-
gono.” Rumsfeld estava propondo uma mudança geral na administração do
Pentágono,a substituição da velha burocracia do Departamento de Defesa por
um novo modelo,baseado no setor privado. O problema, explicou ele, era que,
diferentemente dos negócios,“os governos não podem morrer; por isso,preci-
samos encontrar outros incentivos que façam a burocracia se adaptar e melho-
rar”. O que estava em jogo, declarou, era assustador — “uma questão de vida e
morte, em última instância, para todos os americanos”. Naquele dia,Rumsfeld
anunciou uma grande iniciativa para modernizar a capacidade de intervenção
do setor privado nas guerras empreendidas pelos Estados Unidos, e previu que
sua iniciativa encontraria feroz resistência.“Alguns poderão perguntar: ‘Como
pode o secretário de Defesa atacar o Pentágono diante de seus próprios funcio-nários?’”,continuou Rumsfeld,dirigindo-se a sua platéia.“A esses, respondo que
não tenho intenção de atacar o Pentágono;quero libertá-lo.Nós precisamos sal-
var esta instituição de si mesma.”
Na manhã seguinte,o Pentágono seria literalmente atacado, quando o vôo
77 da American Airlines — um Boeing 757 — chocou-se contra sua face oeste.
Rumsfeld ficaria famoso por ajudar a resgatar corpos dos escombros. Mas não
demoraria muito para que ele, o grande mestre do militarismo, aproveitasse a
quase inimaginável oportunidade oferecida pelo 11 de setembro para acelerarsua guerra pessoal, exposta apenas um dia antes. O mundo havia mudado de
maneira irreversível,e num instante o futuro da mais poderosa força militar do
planeta se tornara uma tela em branco, na qual Rumsfeld e seus aliados pode-
riam pintar sua obra-prima.A nova política do Pentágono dependeria muito do
setor privado,daria ênfase a operações secretas, a sofisticados sistemas de arma-
mentos e ao grande uso de forças especiais e de prestadores de serviço. Isso ficou
conhecido como a Doutrina Rumsfeld.“Precisamos promover uma abordagem
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mais empresarial:uma abordagem que incentive as pessoas à pronta ação, e não
à reação, e a se comportarem menos como burocratas e mais como capitalistas
empreendedores”, escreveu Rumsfeld, no verão de 2002, num artigo para arevista Foreign Affairs intitulado “Transformando os militares”.2 A abordagem
“minimalista”de Rumsfeld abriu a porta para uma das mais significativas tran-
formações na guerra moderna — o amplo uso de prestadores de serviço,ou con-
tratados, em todos os aspectos da guerra, inclusive em combate.
Entre os que logo receberam chamados da administração para se juntar a
uma “guerra global ao terror”, a ser lutada de acordo com a Doutrina Rumsfeld,
havia uma companhia pouco conhecida que funcionava em um campo particu-
lar de treinamento militar perto de Great Dismal Swamp,um pântano da Caro-
lina do Norte.Seu nome era BlackwaterUSA.Depois da grande tragédia do 11 de
setembro, praticamente da noite para o dia uma empresa que mal existia até
poucos anos antes se tornaria peça central na guerra global desencadeada pelo
império mais poderoso da história. “Trabalho no ramo de treinamento há qua-
tro anos e estava começando a ficar um pouco cínico quanto à seriedade com
que as pessoas encaram a segurança”, disse o proprietário da Blackwater, Erik
Prince, ao entrevistador da Fox News, Bill O’Reilly, pouco depois do 11 de
setembro.“Agora, meu telefone não pára de tocar.”3
Mas a história da Blackwater não começa no 11 de setembro,nem com seusexecutivos ou mesmo com sua fundação. De certa forma, ela resume a história
da guerra moderna.Em essência, a Blackwater é o coroamento da obra de uma
vida inteira daqueles que formaram o cerne da equipe de guerra da administra-
ção Bush.
Durante a Guerra do Golfo, em 1991, Dick Cheney — grande aliado de
Rumsfeld — era secretário da Defesa.Na época,dez por cento das pessoas posi-
cionadas na zona de guerra estava ali por força de um contrato privado, uma
porcentagem que Cheney tinha o firme propósito de aumentar.Antes de deixaro cargo, em 1993, ele encomendou um estudo a uma companhia que acabaria
por dirigir: a Halliburton.Tratava-se de um estudo sobre como privatizar rapi-
damente a burocracia militar. Quase da noite para o dia, a Halliburton criaria
sozinha uma indústria de prestação de serviços militares aos Estados Unidos no
exterior, com um potencial de lucros aparentemente infinito. Quanto mais
agressivamente os Estados Unidos expandissem seu alcance militar, melhor
para os negócios da Halliburton.Era um protótipo para o futuro. Nos oito anos
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seguintes do governo Bill Clinton, Cheney trabalhou no American Enterprise
Institute, influente grupo neoconservador de pesquisas interdisciplinares que
liderou a investida por uma aceleração no processo de privatização do governoe das Forças Armadas norte-americanas. Por volta de 1995, Cheney estava no
comando da divisão da Halliburton que se tornaria o maior prestador de servi-
ços de defesa aos Estados Unidos.O presidente Clinton apoiou em grande parte
esses planos de privatização,e a empresa de Cheney — assim como outras pres-
tadoras de serviços — fechou lucrativos contratos durante o conflito dos Bálcãs,
nos anos 90, e na guerra do Kosovo, em 1999. Em meados da década de 90,uma
empresa de consultoria militar baseada na Virgínia, a Professional Resources
Incorporated, dirigida por graduados oficiais aposentados, foi autorizada pela
administração Clinton a treinar tropas croatas para sua guerra separatista con-
tra a Iugoslávia dominada pelos sérvios; um contrato que em última análise
desequilibrou a balança naquele conflito. Esse contrato foi o prenúncio de um
tipo de envolvimento do setor privado que se tornaria padrão na guerra ao ter-
ror.Mas a privatização foi apenas parte de um programa mais abrangente. Che-
ney e Rumsfeld foram membros-chave do Projeto para um Novo Século Ame-
ricano (PNAC), iniciado em 1997 pelo ativista neoconservador William Kristol.4
O grupo fez pressão para que Clinton promovesse uma mudança de regime no
Iraque,e seus princípios,que advogavam “uma política de força militar e clarezamoral”,5 formariam as bases de grande parte da política externa da administra-
ção Bush.
Em setembro de 2000, apenas meses antes de seus membros passarem a
integrar o núcleo central do governo Bush, o Projeto para um Novo Século
Americano lançou um relatório chamado Rebuilding America’s Defenses: Stra-
tegy, Forces and Resources for a New Century [Reconstruindo as defesas dos
Estados Unidos: estratégia, forças e recursos para um novo século]. Ao expor a
visão do PNAC sobre a revisão da máquina de guerra norte-americana,o relató-rio reconhecia que “o processo de transformação, ainda que portador de
mudanças revolucionárias, provavelmente será longo, caso não haja algum
evento catastrófico ou catalisador — como um novo Pearl Harbor”.6 Um ano
depois, os ataques do 11 de setembro forneceriam o necessário catalisador:
uma justificativa sem precedentes para o avanço desse programa radical,
moldado por um pequeno núcleo de agentes neoconservadores que haviam
acabado de assumir o poder oficial.
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Paralelamente às guerras do período posterior ao 11 de setembro,desenro-
lou-se um subenredo freqüentemente ignorado: o da terceirização e da privati-
zação que esses conflitos possibilitaram. Desde o momento em que a equipe deBush tomou o poder,o Pentágono abarrotou-se de ideólogos como Paul Wolfo-
witz,Douglas Feith,Zalmay Khalilzad e Stephen Cambone,bem como de ex-exe-
cutivos de grandes empresas — muitas delas grandes fabricantes de armamentos
—, como o subsecretário de Defesa Pete Aldridge (Aerospace Corporation), o
ministro do Exército Thomas White (Enron), o ministro da Marinha Gordon
England (General Dynamics) e o ministro da Aeronáutica James Roche (Northrop
Grumman).A nova liderança civil do Pentágono chegou ao poder com dois obje-
tivos principais: a mudança de regime em nações estratégicas e a implementação
da operação de privatização e terceirização mais abrangente da história militar
dos Estados Unidos — uma revolução nos assuntos militares. Depois do 11 de
setembro,essa campanha não pôde mais ser detida.
A rápida derrota do Talibã no Afeganistão revigorou Rumsfeld e o governo,
o que possibilitou o planejamento da pedra angular da cruzada neoconserva-
dora: o Iraque.Desde o primeiro momento em que as tropas dos Estados Unidos
começaram a se agrupar,durante os preparativos para a invasão,o Pentágono fez
dos contratos particulares parte integral das operações. Mesmo enquanto o país
aparentava publicamente envidar esforços diplomáticos, a Halliburton se prepa-rava,a portas fechadas,para a maior operação de sua história.Quando os tanques
norte-americanos entraram em Bagdá, em março de 2003, transportavam com
eles o maior exército de prestadores de serviços já empregado numa guerra. Ao
final do mandato de Rumsfeld,estima-se que havia cerca de 100 mil contratados
em território iraquiano — quase um para cada soldado norte-americano em
ação.7 Para grande satisfação da indústria da guerra, antes de sair, Rumsfeld
tomou a extraordinária medida de classificar esses prestadores de serviços como
parte oficial da máquina de guerra dos Estados Unidos. Na Revisão Quadrienaldo Pentágono de 2006, Rumsfeld esboçou o que chamou de um “guia para a
mudança”no Departamento de Defesa,que afirmou ter começado em 2001.8 O
documento definia a “Força Total do Departamento” como “os componentes
militares ativos e da reserva,bem como os servidores civis e contratados — cons-
titui[ndo] nosso efetivo e nossa capacidade de guerra. Membros da Força Total
servem em milhares de lugares ao redor do mundo,desempenhando vasta gama
de tarefas no cumprimento de missões críticas”.
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Da maneira como foi feita, em meio a uma guerra global sem limites ou
definição precisa, essa oficialização formal representou uma negação radical
dos agourentos alertas lançados pelo presidente Eisenhower em sua mensagemde despedida à nação,décadas antes,advertindo para o que ele via como as “gra-
ves implicações”da ascensão do “complexo militar-industrial”. Em 1961, Eise-
nhower declarava: “O potencial para a ascensão desastrosa de um poder mal
exercido existe e continuará existindo.Não devemos jamais permitir que o peso
dessa combinação ponha em perigo nossas liberdades e nossos processos demo-
cráticos. Nada está garantido.Somente uma cidadania alerta e bem informada
pode manter o entrosamento apropriado da grande maquinaria industrial e
militar de defesa com nossos métodos e metas pacíficos,de tal forma que a segu-
rança e a liberdade possam prosperar juntas”. O que se concretizou nos anos
seguintes, e em especial na administração Bush, não foi nada menos do que o
exato cenário que Eisenhower profetizara de forma sombria.
Embora a guerra ao terror e a ocupação do Iraque tenham dado origem a
inúmeras empresas, poucas tiveram uma ascensão tão meteórica quanto a
Blackwater ao poder, ao lucro e à proeminência — talvez nenhuma outra. Em
menos de uma década, a Blackwater saiu de um pântano na Carolina do Norte
para se tornar uma espécie de Guarda Pretoriana da “guerra global ao terror”
movida pela administração Bush. Hoje, ela tem mais de 2,3 mil soldados parti-culares operando em nove países,inclusive dentro dos Estados Unidos.Mantém
um banco de dados com 21 mil ex-agentes e soldados das Forças Especiais, além
de policiais aposentados, que pode convocar a qualquer momento. A compa-
nhia tem também uma frota particular de mais de vinte aeronaves,incluindo-se
aí helicópteros de combate e uma divisão de zepelins de reconhecimento. Seu
quartel-general de 28 quilômetros quadrados em Moycock, na Carolina do
Norte,é a maior instalação militar privada do mundo, treinando por ano deze-
nas de milhares de agentes da lei, locais ou federais,bem como soldados de paí-ses estrangeiros “amigos”. A Blackwater tem sua própria divisão de inteligência
e conta,entre seus executivos,com ex-oficiais de inteligência e ex-militares gra-
duados.Recentemente, iniciou-se a construção de novas instalações na Califór-
nia (“Blackwater West”) e em Illinois (“Blackwater North”), assim como de um
campo de treinamento na selva filipina. A companhia possui mais de 500
milhões de dólares em contratos com o governo — e isso não inclui seu orça-
mento secreto de operações “clandestinas” para agências de inteligência dos
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Estados Unidos ou para empresas, indivíduos e governos estrangeiros. Como
observou um congressista norte-americano,em termos estritamente militares,
a Blackwater poderia depor muitos governos do mundo.É,portanto,um Exército particular,controlado por uma única pessoa:Erik
Prince, um megamilionário cristão de extrema direita que tem sido um dos
maiores financiadores não apenas das campanhas do presidente Bush, como
também da direita cristã em geral. Na verdade, até a elaboração deste livro,
Prince nunca havia doado um tostão para um candidato democrata — certa-
mente um direito seu, mas,por outro lado, um comportamento incomum para
o proprietário de uma empresa tão poderosa em serviços bélicos e que revela
tanto sobre a sinceridade de seu compromisso ideológico. A Blackwater tem
constituído um dos batalhões mais eficientes na guerra de Rumsfeld no Pentá-
gono,e Prince fala com ousadia do papel de sua companhia na radical transfor-
mação da força militar dos Estados Unidos.“Quando você envia alguma coisa e
quer que ela chegue no dia seguinte, usa o correio ou a FedEx?”, perguntou ele
durante um recente painel de discussão com oficiais militares. “Nossa meta é
fazer pelo aparato de segurança nacional o que a FedEx fez pelo serviço postal.”9
Talvez o sinal de transformação mais revelador tenha sido dado quando a
Casa Branca terceirizou o serviço de proteção a funcionários governamentais
mais graduados no Iraque,entregando-o à Blackwater a partir de 2003.QuandoL. Paul Bremer, enviado de Bush no primeiro ano da ocupação, instalou-se em
Bagdá para implementar os planos do presidente, estava sob a proteção da
Blackwater, assim como sob sua proteção estiveram todos os sucessivos embai-
xadores norte-americanos no Iraque.Em comparação com os soldados da ativa,
muito mal remunerados,os guardas da Blackwater recebem salários de seis dígi-
tos.“Antes,os salários comuns para profissionais de segurança pessoal [no Ira-
que] giravam em torno de trezentos dólares [por pessoa] por dia”, relatou a
revista Fortune na época. “Quando a Blackwater começou a recrutar homenspara seu primeiro grande trabalho, dar proteção a Paul Bremer, o pagamento
saltou para seiscentos dólares por dia.”10 Quase sem nenhum debate público, a
administração Bush terceirizou funções historicamente conduzidas pelos mili-
tares. E, em grande medida, essas companhias particulares não prestam contas
aos contribuintes norte-americanos, de quem extraem seus lucros. Alguns
começaram a comparar o mercado mercenário no Iraque com a Corrida do
Ouro no Alasca ou com episódios do Velho Oeste.Como observou o Times lon-
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drino à época:“No Iraque, a indústria que vem florescendo no pós-guerra não é
a do petróleo. É a da segurança”.11
Enquanto esse inaudito exército privado se expandia no Iraque, o últimoato de Bremer antes de se esgueirar para longe de Bagdá, no dia 28 de junho de
2004, foi um decreto conhecido como Ordem 17, isentando de eventuais pro-
cessos penais os prestadores de serviços no país.12 Foi um ato significativo no
mar de políticas (e de ausência de políticas) que regulamentam a ocupação,um
incentivo às forças privadas. Enquanto soldados dos Estados Unidos têm sido
processados por matanças e torturas no Iraque,o Pentágono não impôs as mes-
mas regras às vastas forças privadas. Esse assunto foi abordado durante uma
das raras audiências no Congresso norte-americano sobre os contratados no
Iraque, que ocorreu em junho de 2006.Nela, que ouviu também diversos fun-
cionários governamentais, a Blackwater representou a indústria. O congres-
sista Dennis Kucinich questionou Shay Assad,diretor de licitações e aquisições
do Pentágono — a seção do Departamento de Defesa responsável pela contra-
tação de serviços. Kucinich observou que as tropas norte-americanas, sujeitas
às regras de combate,respondiam a processos por violações de conduta no Ira-
que, o mesmo não acontecendo com os prestadores de serviços. Até a data
daquela audiência, prosseguiu ele,“nenhum fornecedor de segurança privado
havia sido processado”.13 Em seguida, perguntou diretamente a Assad: “Seráque o Departamento de Defesa estaria preparado para um eventual processo
movido contra um prestador de serviço acusado de ter comprovada e ilegal-
mente matado um civil?”.
“Não posso responder a essa pergunta, senhor”, respondeu Assad.
“Uau!”, retrucou Kucinich.“Pense no que isso significa. Esses prestadores
de serviços podem escapar impunes de um assassinato.” Os contratados, disse
Kucinich,“parecem não estar sujeitos a nenhuma lei e, portanto, dispõem de
licença para fazer justiça com as próprias mãos”.A Blackwater já declarou abertamente que suas forças estão acima da lei.Ao
resistir às tentativas de submeter seus soldados ao Código Unificado de Justiça
Militar (UCMJ) do Pentágono — insistindo em que eles são civis —,a companhia
afirmou gozar de imunidade também no tocante a processos civis nos Estados
Unidos,alegando que suas forças são parte do efetivo militar norte-americano,
a chamada Força Total. A empresa tem argumentado em depoimentos legais
que, se os tribunais permitirem que ela seja processada por crimes cometidos
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por seus contratados, isso poderia ameaçar a capacidade bélica da nação:“Para
que prestadores de serviços responsáveis possam acompanhar as Forças Arma-
das dos Estados Unidos no campo de batalha,é essencial que sua isenção de res-ponsabilidade por baixas seja protegida pelo governo federal e aplicada unifor-
memente nos tribunais federais. Nada poderia ser mais destrutivo ao conceito
de Força Total subjacente à doutrina do poderio militar norte-americano —
conceito este que se apóia no amplo voluntariado — do que expor seus compo-
nentes privados aos sistemas de responsabilização penal de cinqüenta estados,
transportados para campos de batalha no exterior [...] Trata-se de matéria que
foge à alçada [dos tribunais] tanto quanto foge também dessa alçada a forma
como o presidente supervisiona e comanda essas operações militares, incluin-
do-se aí as decisões tomadas por meio da cadeia de comando referentes a treina-
mento,movimentação,armamentos,missões,composição,planejamento,aná-
lise,gerenciamento e supervisão de fornecedores militares privados,bem como
de suas missões”.14
Em vez disso, a Blackwater alega que suas forças operam com base num
código de conduta próprio, escrito por sua própria associação, ironicamente
chamada Associação Internacional de Operações de Paz (International Peace
Operations Association). Erik Prince afirma que suas forças são “responsáveis
perante o país”,15 como se declarações de lealdade à bandeira constituíssemprova de motivos ou atos justos, ou como se oferecessem um substituto para
uma estrutura legal independente.
Essa lógica é incentivada não apenas pela imunidade virtual já estendida a
esses prestadores de serviços, como também pelo fracasso do Pentágono em
supervisionar sua maciça força privada, agora oficialmente reconhecida como
parte da máquina de guerra dos Estados Unidos. Tais prestadores de serviços
operam numa zona de legalidade difusa,que dá margem a abusos explícitos.No
final de 2006, uma emenda de uma única linha foi inserida em silêncio nomaciço projeto de lei, submetido ao Congresso em 2007, que trata dos gastos
com a defesa e foi assinado pelo presidente Bush.A emenda permitiria subme-
ter prestadores de serviços em zonas de guerra ao UCMJ do Pentágono, isto é, ao
sistema de corte marcial.16 Os militares,porém, já têm problemas suficientes no
policiameno de suas próprias forças,e não se há de esperar deles que monitorem
com eficiência mais 100 mil contratados privados. Embora a emenda de meras
cinco palavras mal estabeleça um sistema de supervisão independente,os peri-
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tos prevêem que ela ainda enfrentará feroz resistência por parte da indústria pri-
vada da guerra. A despeito do apoio sem precedentes a prestadores de serviços
empregados no Iraque,no Afeganistão e em outros lugares,o governo ainda nãoconseguiu nem sequer contabilizá-los, quanto mais fiscalizá-los. Um relatório
do Gabinete de Responsabilidade Governamental (GAO) informava,em dezem-
bro de 2006,que os militares não dispunham de um sistema eficiente de super-
visão e que “os funcionários do governo não foram capazes de determinar o
número de fornecedores utilizados nas bases do Iraque”.17 O Exército e a Força
Aérea foram incapazes de fornecer aos investigadores doGAO“o número de con-
tratados empregados em localidades ocupadas ou a natureza dos serviços que
esses contratados prestaram às forças dos Estados Unidos”. O GAO concluiu
que “problemas com o gerenciamento e a supervisão dos prestadores de servi-
ços tiveram um impacto negativo nas operações militares e no moral da uni-
dade, prejudicando a capacidade do Departamento de Defesa de afirmar com
alguma segurança se os fornecedores estão de fato cumprindo as exigências con-
tratuais, e se o estão fazendo de forma eficiente em termos de custos”.
Uma semana depois da Rumsfeld deixar o Pentágono, as Forças Armadas
dos Estados Unidos estavam tão sobrecarregadas pela guerra ao terror que o ex-
secretário de Estado,general Colin Powell,declarou:“O Exército ativo está quase
falido”.18 Em vez de repensar suas políticas agressivas e as guerras de conquista, aadministração Bush e o Pentágono falavam da necessidade de aumentar o tama-
nho das forças militares. Prince já havia feito sua proposta: a criação do que ele
chamou de uma “brigada de contratados” para suplementar a força militar con-
vencional dos Estados Unidos.“Existe consternação no Departamento de Defesa
quanto ao aumento de tamanho do Exército permanente”, ele declarou.“Quere-
mos aumentá-lo em 30 mil pessoas, mas nos falaram de custos que variam de 3,6
a 4 bilhões de dólares para tanto. Bem, pela minha matemática, isso dá cerca de
135 mil dólares por soldado [...] Nós certamente poderíamos fazer isso a umpreço mais baixo.”19 Foi uma declaração extraordinária, que só poderia vir de
um homem de posse de seu próprio exército.Prince gosta de caracterizar a Black-
water como um prolongamento patriótico das forças militares norte-america-
nas e, em setembro de 2005, emitiu um memorando para toda a companhia
requerendo que seus funcionários e contratados prestassem o mesmo juramento
de lealdade à Constituição do país que é feito pelos “clientes da Blackwater liga-
dos à Segurança Nacional (ou seja, Pentágono, Departamento de Estado e agên-
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cias de inteligência)”: o de “apoiar e defender a Constituição dos Estados Unidos
contra todos os inimigos, externos ou internos [...]. Com a ajuda de Deus”.20
Porém, a despeito desse retrato da Blackwater como uma empresa pura-mente americana que procura defender os indefesos, alguns de seus projetos
mais secretos e ambiciosos revelam uma realidade bem diferente e assustadora.
Em maio de 2004, ela inscreveu em segredo no Registro Central de Prestadores
de Serviços do governo dos Estados Unidos uma nova divisão: a Greystone
Limited.Mas em vez de estabelecer a companhia na Carolina do Norte, na Vir-
gínia ou em Delaware, como suas outras divisões, a Greystone foi registrada
offshore , em Barbados, no Caribe, e devidamente classificada pelo governo
americano como “entidade empresarial isenta de impostos”.21 Os folhetos pro-
mocionais da Greystone ofereciam aos possíveis clientes “equipes proativas de
assalto” que poderiam ser contratadas “para atender a exigências de segurança
existentes ou emergentes, de acordo com as necessidades dos clientes no exte-
rior.Nossas equipes estão prontas para conduzir medidas de estabilização,pro-
teção e recuperação de ativos, bem como retiradas emergenciais de pessoal”.
Ofereciam também uma grande variedade de serviços de treinamento, até no
tocante a “operações de defesa e ataque para pequenos grupos”. A Greystone
gabava-se de “manter e treinar uma força de trabalho extraída de uma base
variada de ex-membros de operações especiais, defesa, inteligência e de profis-sionais da lei prontos para serem empregados a qualquer momento, em qual-
quer lugar do mundo”. Ela alegava recrutar seus profissionais em lugares como
Filipinas, Chile, Nepal, Colômbia, Equador, El Salvador, Honduras, Panamá e
Peru — países cujas forças em grande parte apresentam fichas corridas de res-
peito aos direitos humanos no mínimo questionáveis.Os formulários de inscri-
ção pediam aos candidatos que indicassem suas qualificações em armas: fuzil
AK-47,Glock 19, fuzis da série M-16,carabinas M-4,metralhadoras,morteiros,
foguetes e granadas antitanques. Entre os profissionais procurados, haviafranco-atiradores, atiradores, peritos em artefatos explosivos e pessoas com
experiência em unidades de assalto.No Iraque, a Blackwater desembarcou inú-
meros mercenários chilenos, alguns dos quais foram treinados e serviram
durante o regime brutal de Augusto Pinochet. “Nós reviramos os confins da
Terra para encontrar bons profissionais”, disse o presidente da Blackwater,Gary
Jackson.“Os comandos chilenos são muito profissionais e se encaixam perfeita-
mente no sistema da empresa.”22
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Com as Forças Armadas domésticas sobrecarregadas até o limite — e
impossibilitadas de novos recrutamentos por motivos políticos —, resta ao
governo dos Estados Unidos batalhar para encontrar aliados que preencham asvagas em sua “guerra global ao terror”.Se os exércitos de outros países não dese-
jam se aliar numa “coalizão da boa vontade”, a Blackwater e seus aliados ofere-
cem outro tipo de solução: a internacionalização das forças militares, com
recrutamento de soldados particulares em todo o planeta. Se os governos
estrangeiros não querem participar do jogo, soldados estrangeiros — muitos
dos quais de países que se opõem às guerras dos Estados Unidos — podem ser
alistados a preços módicos. Esse processo, alegam os críticos, não é senão uma
subversão da própria existência da nação-Estado e de seus princípios de sobera-
nia e autodeterminação.“O uso cada vez maior de contratados,de forças parti-
culares ou do que alguns definiriam como ‘mercenários’ torna mais fácil come-
çar e lutar uma guerra — necessário é apenas o dinheiro,e não a cidadania”, diz
Michael Ratner, presidente do Centro de Direitos Constitucionais (CCR), orga-
nização que abriu processo contra alguns contratados por supostas violações de
direitos humanos no Iraque.23 “Quando uma população é convocada para ir à
guerra, existe uma resistência,que é necessária até para evitar guerras de auto-
engrandecimento, guerras tolas ou,no caso norte-americano,guerras imperia-
listas hegemônicas.Tropas particulares são quase uma necessidade para os Esta-dos Unidos,empenhados em manter um império em declínio.Pense em Roma
e em sua crescente necessidade de mercenários. É o mesmo que acontece hoje
nos Estados Unidos.Se se tornar difícil controlar uma população raivosa e opri-
mida mediante uma força policial obediente à Constituição... as tropas particu-
lares podem resolver esse ‘problema’.”
Assim como a Halliburton, que é a maior prestadora de serviços do Pen-
tágono, a Blackwater se diferencia de outras empresas que simplesmente
lucram com a guerra pelas características específicas da visão de longuíssimoprazo de seus executivos. Essas duas empresas não somente aproveitaram um
momento lucrativo, como muitas de suas concorrentes, mas lançaram-se tam-
bém a cavar um nicho permanente para si próprias por décadas à frente. Toda-
via, as aspirações da Blackwater não se limitam a guerras internacionais. Suas
forças se anteciparam à maioria das agências federais em Nova Orleans, depois
da passagem do furacão Katrina em 2005,quando centenas de mercenários for-
temente armados — alguns recém-chegados do Iraque — espalharam-se pela
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zona de desastre. Em uma semana, eles foram oficialmente contratados pelo
Departamento de Segurança Interna para operar na região, cobrando do go-
verno federal 950 dólares por dia por soldado.24
Em menos de um ano, a Black-water havia se apropriado de mais de 70 milhões de dólares em contratos fede-
rais relacionados com o furacão — cerca de 243 mil dólares por dia.25 A empresa
viu no Katrina outro momento de grande oportunidade, e logo começou a
requisitar permissão para ser contratada pelos governos de todos os cinqüenta
estados americanos. Os executivos da Blackwater reuniram-se com o governa-
dor da Califórnia, Arnold Schwarzenegger, oferecendo-se para intervir no
estado em caso de um eventual terremoto ou de qualquer outro desastre.“Olha,
nenhum de nós gosta da idéia de uma devastação se tornar uma oportunidade
de negócio”, disse o funcionário da companhia que assumiu a direção da nova
divisão de operações formada depois do Katrina.26 “É um fato detestável,mas é
assim mesmo.Médicos,advogados,donos de funerárias,até os jornais — todos
ganham a vida com as coisas ruins que acontecem.Nós também,porque alguém
tem que cuidar disso.” Porém, alguns críticos vêem o emprego de forças da
Blackwater no próprio território norte-americano como um perigoso prece-
dente que pode solapar a democracia no país. “Suas ações podem não estar
sujeitas às limitações constitucionais que se aplicam aos funcionários públicos
federais e estaduais — o que inclui a Primeira Emenda e a Quarta Emenda, queimpedem buscas e apreensões ilegais. Diferentemente das forças policiais,
essas forças não são treinadas para defender os direitos constitucionais”, diz
Michael Ratner,da CCR.“Essa espécie de grupo paramilitar lembra os camisas-
marrons dos nazistas, que funcionavam como um mecanismo de sanção
extrajudicial com direito de operar, e que na verdade operava, fora da lei. O
emprego desses grupos paramilitares é uma ameaça extremamente perigosa
aos nossos direitos.”
O que se mostra particularmente assustador no papel da Blackwaternuma guerra que o presidente Bush chamou de “cruzada” é que os principais
executivos da companhia seguem uma agenda voltada para a supremacia
cristã. Erik Prince e sua família doaram generosos recursos para a guerra dos
direitos religiosos contra a secularização e a favor da expansão da presença do
cristianismo na esfera pública.27 Prince é amigo íntimo e benfeitor de alguns
dos militantes cristãos mais extremistas do país, como o ex-conspirador de
Watergate,Chuck Colson — que acabou se tornando um dos assessores do pre-
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sidente Bush e pioneiro das “prisões baseadas na fé” — e o líder conservador
Gary Bauer, signatário da “Afirmação de princípios” do Projeto de um Novo
Século Americano.Prince,aliás, trabalhou com Bauer na juventude e era amigoíntimo de seu pai. Alguns executivos da Blackwater chegam a se vangloriar de
serem membros dos Cavaleiros Soberanos da Ordem de Malta,28 uma milícia
cristã formada no século XI, antes das primeiras Cruzadas, com a missão de
defender “territórios que os cruzados haviam conquistado dos muçulmanos”.29
Atualmente,a Ordem se gaba de ser “uma organização soberana dentro das leis
internacionais, com constituição própria, passaportes, selos e instituições
públicas”, e de ter “relações diplomáticas com 94 países”.30 A terceirização das
operações militares dos Estados Unidos em países muçulmanos e em socieda-
des seculares, deixadas a cargo desses neocruzados,reforça os maiores temores
de muitos no mundo árabe, assim como de outros oponentes das guerras do
governo Bush.
A maior parte do mundo ouviu falar pela primeira vez em “companhias
militares particulares” depois do infame 31 de março de 2004, quando quatro
soldados da Blackwater caíram em uma emboscada em Fallujah, no Iraque —
um linchamento macabro, que marcou uma guinada na guerra e desencadeou
a resistência iraquiana. Muitos dos relatos da mídia na época (e ainda hoje) se
referem àqueles soldados obscuros como “contratados civis”ou “trabalhadoresestrangeiros para a reconstrução do Iraque”, como se fossem engenheiros, tra-
balhadores de construção,ajuda humanitária ou especialistas em água.O termo
“mercenário”quase não foi usado para descrevê-los. E não por acaso. Na reali-
dade, isso fez parte de uma campanha bastante sofisticada de mudança de ima-
gem organizada pela própria indústria mercenária,e cada vez mais adotada hoje
em dia por políticos, burocratas e demais figuras poderosas de Washington e de
outras capitais ocidentais. Aqueles homens que morreram em Fallujah eram
membros da maior parceira de Washington na “coalizão da boa vontade” —maior em número do que a totalidade das tropas britânicas —,e ainda assim o
mundo não fazia idéia de que eles estavam lá.A emboscada pôs a Blackwater em
papel capaz de alterar as regulamentações que supervisionariam (ou não) uma
indústria que se expandia a todo vapor, e da qual a companhia era a nova líder.
Três meses depois, porém, a empresa assinaria um dos mais valiosos contratos
de segurança internacional do governo dos Estados Unidos,responsabilizando-
se pela proteção de diplomatas em instalações americanas. As mortes larga-
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mente anunciadas de quatro de seus soldados se revelariam a mola propulsora
que poria a companhia no caminho do sucesso pelos anos seguintes.
A história da ascensão da Blackwater é um épico na história do complexomilitar-industrial. A companhia é o símbolo vivo das mudanças forjadas pela
revolução nos assuntos militares e pelo programa de privatização radicalmente
ampliado pela administração Bush, tendo a guerra ao terror como pretexto.
Porém, mais fundamental ainda é que ela é uma história sobre o futuro da
guerra, da democracia e da governança. Essa história vai do início da Blackwa-
ter, em 1996, com seus executivos visionários abrindo um campo de treina-
mento militar privado (a fim de “atender à demanda do governo pela terceiriza-
ção do treinamento em armas de fogo e segurança”); passa pelo aumento do
volume de contratos depois do 11 de setembro; e chega às ruas encharcadas de
sangue de Fallujah, onde os cadáveres dos mercenários foram pendurados em
uma ponte. Mas inclui ainda uma troca de tiros nos telhados da fortaleza de
Muqtada al-Sadr, em Najaf; uma expedição ao mar Cáspio, rico em petróleo,
onde o governo norte-americano mandou a Blackwater construir uma base
militar a poucos quilômetros da fronteira iraniana; uma incursão pelas ruas de
Nova Orleans,devastadas por um furacão;e muitas horas dentro dos centros de
decisão em Washington, onde executivos da empresa são recebidos como os
novos heróis da guerra ao terror. E, no entanto, a ascensão do mais poderosoexército mercenário do mundo começou bem longe dos atuais campos de bata-
lha, na sonolenta cidade de Holland, em Michigan, onde Erik Prince nasceu de
uma dinastia cristã de direita.Foi a família Prince que lançou as bases,gastando
milhões de dólares durante muitas décadas,para que as mesmas forças que pos-
sibilitariam a meteórica ascensão da Blackwater chegassem ao poder.
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