Caso ellnico -...

Post on 23-Sep-2019

2 views 0 download

Transcript of Caso ellnico -...

Caso ellnico

Anemia hemollticaauto-imune - Caso cllnico

A anemia hemolitica e uma entidade caracterizadapor destruic;;ao dos gl6bulos vermelhos mediadapor auto-anticorpos. as mecanismos fisiopatol6-gicos ainda nao estao completamente com preen-didos e a terapeutica e controversa 1-4.as autoresapresentam este caso pela sua particular evolu-c;;ao/resposta terapeutica.

S.R.V.R., sexo feminino, nove anos de idade, rac;;acaucasiana, natural de Lisboa e residente em Ma-fra, internada na Unidade de Imuno-Hematologiado Hospital de Dona Estefania, a 19/09/03, poricterfcia de etiologia a esclarecer.

Nos antecedentes familiares salienta-se sindromeantifosfolipidica mae diagnosticada em 2001 e tio-avo materna em investigac;;ao. Antecedentes pes-soais de anemia ferropenica, aos 30 meses deidade, tendo feito terapeutica marcial durante seismeses. A doenc;;aactual teve inicio subito cerca de72 h antes do internamento e manifestou-se porcansac;;o facil, anorexia, nauseas e posteriormentev6mitos biliosos, icterfcia e coluria. Sem hist6riade doenc;;a infecciosa precedente, viagens recen-tes, ingestao de medicamentos ou de alimentossusceptfveis de desencadear crises hemolfticas.Na primeira observac;;ao foram evidentes icterfciageneralizada, palidez discreta das mucosas, comrestante exame objectivo normal. Nos examescomplementares efectuados destacaram-se: Hb10,2 g/dl; eritr6citos: 3.630.000/\-11; reticul6citos(corrigidos) 88.700/\-11;bilirrubina total 6,37 mg/dl;bilirrubina conjugada 0,27 mg/dl; leucograma,plaquetas, estudo da coagulac;;ao, func;;ao hepaticae renal, exame sumario da urina e ecografia ab-dominal e renal sem alterac;;6es.

Nos primeiros tres dias de internamento observou-se agravamento da palidez, icterfcia e adinamia, edos parametros de hem61ise aguda (Hb 5,2 g/dl;reticul6citos (corrigidos) 125.000/\-11e bilirrubi-na indirecta 7 mg/dl). a teste antiglobulina di-recto (TAD), fortemente positive com especifi-cidade para a classe das imunoglobulinas G(lgG), confirmou 0 diagn6stico de anemia he-molftica auto-imune por auto-anticorpos aquente. Iniciou terapeutica com prednisolonaendovenosa (4 mg/kg/dia) e acido f6lico. Por des-compensac;;ao hemodinamica efectuou transfusaode concentrado eritrocitario (5 cc/kg). Apesar da

Correia T Ferreira A, Almeida T, et al.Unidade de Imuno-Hematologia, Servic;;o 2,Departamento de Pediatria Medica,Hospital de Dona Estefania

terapeutica institufda observou-se agravamentodo quadro clfnico e laboratorial (Hb 3,8 g/dl) quemotivou substituic;;ao da prednisolona por metil-prednisolona endovenosa (6 mg/kg/dia) efectuan-do, ainda, segunda transfusao de concentradoeritrocitario (CE). No entanto, a resposta nao foisatisfat6ria. Manteve hem61ise significativa e sur-giu com reticulocitopenia acentuada, pelo que foiefectuada terceira transfusao de CE e iniciadaimunoglobulina endovenosa (400 mg/kg/dia). Re-gistou-se melhoria clinica e laboratorial progres-siva (aumento dos nfveis de Hb, reticulocitose ediminuic;;ao do titulo de TAD). As serologias paravirus (citomegalovirus, virus Epstein-Barr, parvo-virus B)9' virus das hepatites A, B e C e virus daimunodeficiencia humana), Chlamydia e Myco-plasma foram negativas. Anticorpos antinuclearese anti-DNA negativos. Imunoglobulinas e comple-mento norma is. A crianc;;a teve alta ao 15° dia deinternamento. A Hb atingiu os valores normaispara a idade e a prednisolona foi suspensa ap6suma reduc;;ao lenta das doses, durante oito sema-nas, sem recaidas ate a data.

A anemia hemolitica auto-imune (AHAI) e classica-mente definida como uma anemia por destruic;;aoprecoce e acelerada dos eritr6citos mediada porauto-anticorpos. Doenc;;asinfecciosas (virus Epstein-Barr, citomegalovirus, Mycoplasma spp. e virus daimunodeficiencia humana), doenc;;aslinfoproliferati-vas, tumores s6lidos, doen<;:asdo tecido conjuntivoe inflamat6rias cr6nicas e farmacos (penicilina, qui-nino, algumas cefalosporinas, a-metildopa) podemestar na sua origem, havendo no entanto muitoscasos de etiologia desconhecida14.

Consoante as caracterfsticas serol6gicas dosauto-anticorpos dividem-se em AHAI por anticor-pos a frio e por anticorpos a quente (lgG, rara-mente IgM e ocasionalmente IgA)1,2. A AHAI poranticorpos a quente pode ter uma apresenta<;:aoaguda e transit6ria, com uma dura<;:ao que variaentre os tres e os seis meses, ou cr6nica, poden-do a hem61ise persistir meses a anos. A primeiraforma e a mais comum, 70-80%, ocorre predomi-nantemente em crian<;:as dos dois aos 12 anos ee frequentemente precedida de uma infecc;;aorespirat6ria. Analiticamente observa-se anemiahemolitica extravascular de gravidade variavel,teste antiglobulina directo (Coombs directo) po-sitivo, e em certos casos trombocitopenia (sin-drome de Evans), havendo nestes casos uma

maior gravidadel-4. 0 tratamento de primeira li-nha continua a ser a corticoterapia com predni-solona na dose de 2 a 6 mg/kg/dia14. Ha contro-versia em relaC;;ao ao uso de imunoglobulina e.v.como terapeutica de segunda linha, porem pare-ce ser consensual 0 seu uso nos casos de anemiahemolftica grave e persistente, ou quando SaGnecessarias altas doses de corticoides1.2,5-8. Astransfusoes de CE so devem ser feitas se houverdescompensaC;;ao hemodinamical,2,9. Na nossapaciente 0 agravamento do quadro clfnico e la-boratorial, apesar da corticoterapia em altas do-ses, condicionou a necessidade de tres transfusoesde CE e associaC;;ao de imunoglobulina endove-nosa, com boa resposta. A esplenectomia, agen-tes imuno-supressores (azatioprina, ciclofosfami-da, vincristina), imunomodeladores (anticorpomonoclonal anti-CD20) e a plasmaferese SaG al-ternativas de tratamento nas formas cronicas erefractarias embora com resultados pouco ani-madoresl0,11.

Em termos de prognostico a forma aguda da AHAIe autolimitada, sendo a mortalidade por anemiaintratavel rara. Contrariamente, nas formas croni-cas um numero significativo de doentes desenvol-ve doenc;;as auto-imunes ou linfoproliferativas e a

mortalidade nestes casos depende essencialmen-te da doenc;;a subjacente1-3.

1. Segel G. Autoimmune hemolytic anemias. Em: Behhrman R,KliegmanR,JensenA ledl. 17' ed. NelsonTextbookof Pediatrics1638-40.

2. NathanDG,Oski S. Hematologyof infancy and childhood. 6' ed.2003.

3. Gehrs BC, Friedberg RC.Autoimmune hemolytic anemia. Am JHematol2002;69(4):258-71.

4. Agarwal B. Autoimmune hemolytic anemia. Indian J Pediatr1998;65151:663-8.

5. WisconsinPhysiciansService.ImmuneGlobulin.2003.http://www.wpsic.com/medicare.Part B.

6. KutterD,et al.TransfusionCommitteeMassachusettsGeneralHos-pital ConsensusIndications for IV IgG. 2003.http://www.ccbsma.com/common/en.US.

7. BerkmanSA, et al. Clinical usesof intravenous immunoglobulin.Vol 112.American Collegeof Physicians1990.

8. Rako TA, et al. Recommendationsfor off-label use of intrave-nously administered immunoglobulin preparations. ConsensusStatement.JAMA 1995;2731231.

9. Young PP,et al. Autoantibody formation after alloimmunization:are blood transfusions a risk factor for autoimmune hemolyticanemia?Transfusion2004;4411):5-9.

10. La SpinaM, RussoG. New drugs for childhood anemia. MinervaPediatr2003;55151:483-93,493-8.

11. KerridgeI, et al. Anti-CD20Monoclonal antibody Irituximabl ther-apy in a child with refractorychronic autoimmune hemolytic ane-mia. Intern Med J 2003;33(11):544-5.