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CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CÍVEISFALIMENTARES, DE LIQUIDAÇÕES EXTRAJUDICIAIS,
DAS FUNDAÇÕES E DO TERCEIRO SETOR
CONSULTA N° 17/2015 – Área das Fundações e do Terceiro Setor.
Objeto: Inquérito Civil nº MPPR – 0062.09.000015–9 – Instituição da
Fundação Henrique de Aragão – Imbróglio – Sugestões.
Interessada: 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Ibiporã/PR.
CONSULTA N° 17/2015
1. Trata–se de consulta formulada pela d. Promotora de
Justiça Amarílis F. Picarelli Cordioli, oficiante na 1ª Promotoria de
Justiça da Comarca de Ibiporã/PR, por meio do Relatório com
Determinação de Diligências juntado às fls. 564–569 dos autos do
Inquérito Civil sob n° MPPR–0062.09.000015–9 – o qual foi instaurado
com fins de análise da instituição da Fundação Henrique de Aragão.
Pleiteou–se na mencionada consulta o exame da situação
jurídica e a indicação das medidas cabíveis para a resolução adequada
do imbróglio envolvendo a Fundação Henrique de Aragão.
É, em apertada síntese, o que cumpria relatar. Passa–se à
manifestação.
2. A fim de subsidiar o presente parecer e permitir uma
visualização una e concisa dos fatos, relata–se a seguir, em
subtópicos, o desenrolar da marcha do Inquérito Civil n° MPPR–
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0062.09.000015–9, ao mesmo tempo em que são tecidas algumas
observações preliminares que se entendem pertinentes para
elucidação do caso.
2.1. Extrai–se dos autos que, em agosto de 2009, o Sr.
Joaquim Henrique de Aragão – doravante também denominado
instituidor ou requerente – submeteu à apreciação do Ministério Público
um conjunto de documentos (fls. 04–511) com o objetivo de ver aprovada
a instituição da Fundação Henrique de Aragão.
Pinça-se dos documentos preambularmente apresentados que
o propósito do instituidor consistia na absorção e no
aprimoramento pela Fundação das atividades culturais e artísticas
até então desenvolvidas pela instituição denominada Casa de Artes
e Ofício Paulo VI, tendo em vista a expectativa de que a modalidade
de pessoa jurídica fundacional viabilizaria maior organização e
fiscalização das iniciativas empreendidas (cf. Ata de Reunião de fls.
50/51).
Com base no requerimento de instituição da Fundação
Henrique de Aragão, a d. 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de
Ibiporã/PR elaborou o Parecer n° 01/2009 (fls. 58–62), por intermédio
do qual exigiu a apresentação de Estudo de Viabilidade Econômica, bem
1 Procuração – fl. 06; Estatuto – fls. 07–40; Escritura pública de dotação inicial debens – fls. 41–43; Lei Municipal 527/76 – Reconhece a utilidade pública da Casa deArtes e Ofícios Paulo IV – fl. 44; Documentos pessoais do fundador – fl. 44; Declaraçãode Imposto de Renda do fundador – fl. 45; Ata da reunião de instituição – fl. 50.
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como indicou algumas revisões a serem procedidas na primeira minuta
estatutária apresentada pelo requerente.
Após a adoção das mencionadas providências pelo instituidor
(fls. 65–1082), exarou–se novo parecer ministerial sob n° 01/2010 (fls.
121–123), no qual se apontou para a regularidade dos documentos
apresentados, concluiu–se pela aprovação da instituição da Fundação
Henrique de Aragão, autorizando-se o registro dos respectivos atos
constitutivos, e determinou-se a realização de providências neste
desiderato.
O requerente foi comunicado sobre o conteúdo da precitada
manifestação por meio do Ofício n° 83/2010 (fl. 124) e apresentou os
documentos de fls. 126–1453.
Note–se, neste ponto, que o instituidor não deu cumprimento
ao requisito “e” do Ofício n° 83/2010, de fl. 124, isto é, envio de cópia do
ato de transferência da titularidade dos bens dotados em favor da
Fundação.
2.2. Na sequência, em cumprimento à Resolução–PGJ n°
2434/02 e por orientação da gestão anterior deste Centro de Apoio, os
2 Estudo de viabilidade econômica – fls. 66–75; Estatuto readequado conforme Parecer01/2009 – fls. 77–92 e 93–108; Estatuto da Casa de Artes e Ofícios Paulo VI – fls. 109–120.3 Escritura pública – fls. 126–134; Certidão de registro da ata de instituição – fl. 135;Certidão de registro do estatuto social – fl. 136; Certidão documentos registrados emnome da Fundação – fl. 137; Ata de instalação – fl. 138; Ata de eleição de diretoria – fl.139; Relação e qualificação da diretoria – fls. 140–141; Inscrição no CNPJ – fl. 142;Parecer da Receita Estadual sobre o pedido de isenção do ITCMD – fls. 143–145.
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autos foram remetidos ao Setor de Auditoria para exame do plano de
viabilidade econômica e demais documentos apresentados pelo
requerente às fls. 146–148.
No Parecer n° 41/2010 (fls. 149–152), a Auditoria concluiu
pela inviabilidade econômica da Fundação, tendo em vista a
insuficiência do patrimônio indicado pelo instituidor e a falta de
autonomia econômica e administrativa necessárias para a manutenção
da Entidade.
Percebe–se que o Parecer n° 01/2010, no qual se aprovou a
instituição e o registro dos atos constitutivos da Fundação
Henrique de Aragão, foi lançado anteriormente ao exame do Plano
de Viabilidade Econômica pela Auditoria.
Face ao resultado da análise técnica, oficiou–se ao requerente
para informá–lo sobre as deduções exibidas no Parecer de Auditoria e
impeli–lo à adoção das medidas cabíveis (Ofício n° 383/2010, fl. 158).
Reiterou–se o expediente por meio do Ofício n° 223/2011 (fl. 159) e o
instituidor apresentou manifestação em 27 de junho de 2011 (fls. 160–
171)4.
Nesse pronunciamento, de 27 de junho, o requerente informou
que, desde a ciência da manifestação ministerial que aprovou a
instituição da Fundação (Parecer n° 01/2010 de 25 de fevereiro de
4 Ata de Extinção e Destinação do Patrimônio da Casa de Artes – fls. 164–167.
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2010), foram levadas a cabo diligências para dar cumprimento às
normas estatutárias e tributárias, garantindo o funcionamento da
entidade. Alegou também que não tinha conhecimento da existência
de qualquer óbice ao andamento da Fundação até o recebimento do
Ofício n° 223/2011, em maio de 2011, dando-se ciência do
pronunciamento da Auditoria.
Ademais, prestou esclarecimentos, sustentando que: a) o bem
imóvel doado pela Casa de Artes e Ofícios Paulo VI à Fundação Henrique
de Aragão, e que viabilizaria a criação da entidade fundacional, ainda
não havia sido registrado em nome da Fundação porque a transferência
dependeria da apreciação de pedidos de isenção do imposto apresentado
às Secretarias da Fazenda Pública Municipal e Estadual; b) o valor
correspondente ao imóvel doado pela Casa de Artes não constou no
Estudo de Viabilidade Econômica porque seria necessário que a própria
instituição aferisse com precisão esses valores. Discorreu que a
avaliação foi procedida e que se estimou o valor do imóvel em R$
130.542,46 e das obras de arte em R$ 25.000,00, perfazendo o monte
total de R$ 155.542,46; c) o andamento dos projetos ligados à atividade–
fim da Fundação estaria sujeito à resolução das pendências referentes à
doação dos bens pertencentes à extinta Casa de Artes; e d) por fim,
requereu esclarecimentos quanto à situação jurídica da Fundação e
quanto ao procedimento para a prestação de contas.
Aqui, observa–se que, por período maior que um ano, o
requerente acreditou que a Fundação estivesse regularmente
constituída. Tal expectativa, a princípio, era legítima, tendo em
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vista a prolação de parecer ministerial em favor da aprovação da
instituição da Entidade, bem como da efetivação do registro do
estatuto social.
2.3. Diante dessas colocações articuladas pelo requerente (vide
2.4), oficiou–se ao Tabelionato de Notas de Ibiporã/PR, solicitando-se
informações acerca da existência de fundação de natureza privada
naquele Município (Ofício n° 323/2011, fl. 173).
Em resposta, o Tabelionato aclarou ter localizado duas
escrituras públicas de instituição de fundação.
Da análise dos documentos trazidos pelo Tabelionato,
depreende–se que ambas escrituras referem–se à Fundação Henrique de
Aragão5.
Ainda diante do pedido de esclarecimentos formulado pelo
requerente (vide 2.4), remeteram–se os autos a este Centro de Apoio
com pedido de auxílio no tocante à situação jurídica da Fundação
Henrique de Aragão (Ofício n° 341/2011, fls. 189–191).
A Coordenação pretérita deste Centro de Apoio (fls. 193–197)
entendeu que a Fundação havia sido regularmente constituída, na
medida em que foram observadas as formalidades legais necessárias
5 Escritura Pública de Instituição de Fundação firmada em 05/06/2009 – fls. 175–177(Escritura idêntica àquela juntada às fls. 41–43); Escritura Pública de Instituição deFundação firmada em 11/05/2010 – fls. 178–188.
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para sua criação6. Por outro lado, destacou–se a necessidade de o
estatuto da Fundação ser levado a registro, sendo esta uma condição
para a aquisição da sua personalidade jurídica. Além disso, foram
recomendadas algumas adequações estatutárias a serem promovidas
pela Fundação Henrique de Aragão7.
Nesse particular, é conveniente destacar que a sobredita
manifestação do Centro de Apoio prescreveu a necessidade de o
estatuto da Fundação ser levado a registro, sem verificar que o
documento já havia sido registrado (vide fl. 136).
O fato também não foi considerado pelo Parquet, o qual
oficiou ao instituidor, cientificando-lhe do pronunciamento da gestão
anterior desta Unidade de Apoio e indicando–lhe um prazo para tomada
das providências assinaladas (Ofício n° 378/2011, fls. 199–200).
Em resposta, o requerente explicou que: a) o estatuto já estava
registrado desde a data de 11/05/2010 (cf. fls. 136 e 203); b) as
alterações estatutárias recomendadas foram acatadas e estariam sendo
providenciadas; e c) a transferência do imóvel pertencente à extinta Casa
6 “Ocorre que a análise técnica, no sentido de ausência de viabilidade econômica, se deudepois da constituição da fundação, quando já tinha sido aprovada sua instituição peloMinistério Público, em 25/02/2010, e registrado o ato constitutivo em 11/05/2010, (…)configurando–se ato jurídico perfeito. (…) Ademais, não é caso de inexistência depatrimônio, situação a causar vício de instituição da fundação, mas possível situação deinsuficiência dos bens da dotação inicial” (fl. 194). 7 As alterações sugeridas foram: a) Substituição da figura da Assembleia pela doConselho Curador (§ único do art. 12 do Estatuto); b) Exclusão da cláusula deabertura no rol de finalidades da fundação (inciso X do art. 3º); c) Inclusão dedisposição que limite a recondução de mandato do dirigente e que vede o acúmulo defunções.
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de Artes para a Fundação permanecia suspensa, no aguardo da análise
do pedido de isenção tributária feito perante a Secretaria da Fazenda
Estadual (fls. 201–204 – início 2º volume dos autos).
Verifica–se que foi escorreita a afirmação de que o estatuto
já estava registrado. No entanto, não correspondia a realidade a
informação de que o pedido de isenção tributária aguardava análise, pois
às fls. 143–145 já constava nos autos o Parecer n° 105/2010 exarado
pela Receita Estadual a respeito do tema.
Em setembro de 2011, o instituidor submeteu à apreciação
do MP as alterações estatutárias recomendadas pela antiga
Coordenação deste Centro de Apoio, bem como informou que já
havia realizado o registro das modificações (cf. fls. 206–262)8.
Em outubro de 2011, a d. 2ª Promotoria de Justiça da
Comarca de Ibiporã/PR emitiu a Recomendação Administrativa nº
03/2011, orientando ao Tabelionato de Notas de Ibiporã/PR que
exigisse a comprovação da anuência do MP antes de promover o
registro de alterações estatutárias das fundações, em geral (cf. fls.
263–264).
Na mesma ocasião, oficiou–se àquele Tabelionato (Ofício n°
673/2011, fl. 267), com pedido de remessa de cópia de todos os registros
efetivados em nome da Fundação Henrique de Aragão.
8 Projeto de alteração do estatuto – fls. 207–224 e 225–242; Estatuto originário dafundação – fls. 243–258; Ata nº 07 – Assembleia que aprovou a alteração estatutária –fls. 259–260; Certidão de Registro da Alteração Estatutária – fl. 261.
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Em atenção a este requerimento, a Serventia enviou as
escrituras públicas envolvendo a precitada entidade fundacional.
Vê–se que os registros localizados foram apenas aqueles
que já haviam sido enviados anteriormente ao MP, isto é, as
escrituras públicas datadas de 05/06/2009 e 11/05/2010 (cf. fls.
175–188 e fls. 269–282).
2.4. Em novembro de 2011, o Procedimento Preparatório foi
convertido em Inquérito Civil (cf. fls. 283–284).
Oficiou–se novamente ao Tabelionato de Notas (Ofício n°
763/2011, fl. 285), com solicitação de envio de cópia dos Registros nº(s)
325 e 325–A, referentes ao estatuto da Fundação Henrique de Aragão.
Atendendo ao pedido, o Tabelionato apresentou os documentos de fls.
287–3309.
Às fls. 331–336, o instituidor exibiu cópia da Escritura Pública
de Doação do imóvel da extinta Casa de Artes para a Fundação Henrique
de Aragão.
9 Estatuto originário, registrado em 12/04/2010 – fls. 287–302; Estatuto alterado,registrado em 06/09/2011 – fls. 303–320; Ata nº 07, que aprovou a alteraçãoestatutária – fls. 321–322; Ata nº 03, que trata da eleição para diretoria – fls. 323–324;Ata nº 02, que trata da instalação da fundação – fls. 325–326; Ata nº 01, que aprova acriação da fundação – fls. 327–330.
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Na sequência, a d. 2ª Promotoria de Justiça de Ibiporã/PR
editou a Recomendação Administrativa nº 04/2011 (cf. fls. 338–
348), dirigida ao Cartório de Registro Civil de Títulos, Documentos
e Pessoas Jurídicas de Ibiporã/PR, na qual reproduziu o teor das
diretivas expostas na Recomendação n° 03/2011, alertando para a
necessidade de prévia autorização ministerial para o registro dos
estatutos das fundações e respectivas alterações.
Em seguida, adveio manifestação ministerial em que se
requereu ao instituidor: a) a comprovação da transferência do imóvel
doado pela extinta Casa de Artes à Fundação Henrique de Aragão; b) a
efetiva adequação de alguns artigos do estatuto ao teor das
manifestações ministeriais; e c) a anulação da alteração registrada sem a
devida anuência do Ministério Público.
Em dezembro de 2011 (fls. 350–356), o requerente justificou a
demora na apresentação do comprovante de transferência do imóvel.
Afirmou que as atas de extinção da Casa de Artes foram registradas em
24/05/2011 e que não foi possível registrar a escritura pública de
doação do imóvel diante da afirmação da agente delegada de que só
procederia à anotação mediante autorização da Prefeitura, haja vista que
o imóvel fora doado pelo Município à Casa de Artes (cf. Lei Municipal n°
172/67, que teria formalizado a doação feita pelo ente público).
Em janeiro de 2012 (cf. fls. 364–365), juntou-se nova petição
de lavra do instituidor, contendo a narrativa de que: a) seria promovida
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a modificação no estatuto, excluindo a Assembleia Geral e mantendo
apenas o Conselho Curador da Entidade, conforme orientação
ministerial; b) não houve movimentação financeira a ensejar a prestação
de contas10; e c) não foi realizada a anulação do registro de alteração
estatutária.
Em maio de 2012 (cf. fls. 378–379), o requerente apresentou
manifestação de teor quase idêntico à anterior (364–365) e cópia do
estatuto alterado para apreciação11. Insistiu na alegação de que não fora
possível promover a anulação da alteração estatutária, em razão da
recomendação emitida pelo MP ao Tabelionato de Notas no sentido de
que este só promovesse alterações mediante autorização prévia do
Parquet.
2.5. Em junho de 2012 (cf. fls. 396–397), houve o aditamento
da Recomendação Administrativa nº 04/2011, ocasião na qual se
orientou ao Cartório de Registro Civil de Títulos, Documentos e
Pessoas Jurídicas de Ibiporã/PR que anulasse de ofício o ato de
registro do estatuto da Fundação Henrique de Aragão, assim como
eventuais alterações.
10 Demonstrativo financeiro referente ao ano de 2010 – fls. 366–370; Ata nº 08, sobre ocancelamento do estatuto – fl. 369; Ata nº 09, que aprovou a alteração estatutária – fl.370.11 Proposta de alteração estatutária conforme Recomendação nº 04/2011 MP–PR – fls.380–395.
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O objetivo primordial que orientava o Parquet era a anulação
de uma alteração estatutária que havia sido feita sem a necessária
autorização do MP.
Para evitar que essa irregularidade se repetisse, recomendou–
se ao Tabelionato de Notas e ao Cartório de Registro Civil de Ibiporã/PR
que não procedessem ao registro de alterações em estatutos de
fundações privadas sem confirmar a anuência prévia do MP. Além disso,
requereu-se ao instituidor que solicitasse o cancelamento da alteração
que fora registrada sem autorização ministerial.
O que se esperava era que o requerente procedesse a esse
cancelamento, elaborasse nova minuta de estatuto, incorporando as
sugestões do Centro de Apoio (vide ponto n° 2.6 às fls. 193–197),
submetesse a minuta à apreciação do MP e, por fim, advindo parecer
ministerial favorável, que levasse a alteração estatutária a novo registro.
Contudo, nessa sequência sucederam–se dois equívocos.
Veja–se.
Em primeiro lugar, percebe–se que o requerente apresentara
ao Oficial de Registro Civil um pedido genérico de cancelamento do
estatuto, e não um pedido específico de cancelamento da alteração
estatutária, como deveria ser feito.
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Não fosse por isso, o MP corroborou a alegação formulada
pelo instituidor de que o Tabelionato estaria se recusando a promover o
cancelamento das alterações estatutárias porque entendia estar
inexistente a anuência ministerial. Na tentativa de solucionar o
impasse, o Parquet, então, recomendou ao Cartório de Registro
Civil que promovesse, de ofício, o cancelamento.
Todavia, ao invés de ser solicitado o cancelamento apenas
da alteração estatutária, recomendou–se a anulação “do ato de
registro do Estatuto, bem como eventuais alterações”, isto é, do
próprio ato constitutivo da Fundação. Acredita–se que o MP foi
induzido a erro pelo próprio requerente, à vista dos documentos
anexados às fls. 371 e 372 (confira–se também o documento de fl. 406).
2.6. Em julho de 2012 (fl. 401), o Ofício de Registro Civil das
Pessoas Naturais, Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas de
Ibiporã/PR informou que “o registro do Estatuto da Fundação
Henrique de Aragão foi cancelado”.
Em novembro de 2012 (Ofício n° 980/2012, fls. 402–403),
oficiou–se ao instituidor, com requisição da prova da transferência dos
bens doados pela Casa de Artes, haja vista que a medida ainda não teria
sido comunicada ao Parquet.
Respondendo ao expediente, o requerente argumentou que a
transferência dos bens não fora possível porque a Fundação não está
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oficialmente formada, face a vício em sua criação que o obrigou a requerer
o cancelamento de seu Estatuto de fundação (fl. 404). Aduziu que seria
promovida nova reunião para deliberar sobre a correta formação da
Entidade, bem como acerca da transferência dos bens depois de
concretizada a regular instituição da Fundação.
Em dezembro de 2012 (Ofício n° 980/2012, fls. 407–408),
oficiou–se ao requerente com o escopo de solicitar a lista dos bens que
seriam destinados ao exercício das finalidades sociais perseguidas pela
Fundação, a fim de possibilitar nova análise técnica da viabilidade do
desenvolvimento da instituição.
Apresentada esta lista (fls. 410–414), elaborou–se o Relatório
de Auditoria n° 47/13, por meio do qual se opinou pela viabilidade
econômica da Fundação (fls. 419–420).
Nesse aspecto, é importante notar que o parecer favorável da
Auditoria foi emitido sob o pressuposto de que o patrimônio inicial da
Fundação seria formado por R$ 105.000,00 em obras de arte doadas
pelo instituidor (referência à escritura pública de fls. 40–41) e mais R$
155.542,46 doados pela extinta Casa de Artes (referência à lista de bens
de fls. 410–414). Portanto, o pareceu concluiu pela viabilidade
econômica da Fundação porque pressupôs que o patrimônio total da
entidade fosse de R$ 260.542,46, quantia considerada “suficiente e
condizente à sua efetivação inicial e suas finalidades estatutárias” (cf. fl.
420).
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2.7. Promovida a redistribuição do feito à d. 1ª Promotoria de
Justiça de Ibiporã (fl. 423), em virtude de mudanças no arranjo da
distribuição dos serviços, a Assessoria Jurídica daquele Órgão de
Execução solicitou novo auxílio do Centro de Apoio, no sentido de
ser esclarecida a viabilidade jurídica de algumas disposições
estatutárias pretendidas pelo requerente. Em resposta, encaminhou–
se a Consulta n° 02/2013, constante às fls. 424–433.
As conclusões alcançadas no referido parecer consultivo foram
de que: a) é viável a participação de pessoas físicas em fundações; b) o
bom funcionamento de uma fundação pressupõe a existência de ao
menos três órgãos: Conselhos Curador, Diretor e Fiscal; c) a capacidade
civil é requisito para o exercício do cargo de conselheiro, bem como a
eleição dos conselheiros deve estar em conformidade com a decisão do
Conselho Curador (órgão deliberativo) e com as regras presentes nos
atos de instituição da fundação; c) a exclusão de membro da fundação é
possível por meio de decisão colegiada do Conselho Curador, desde que
se observem o quórum mínimo definido em estatuto e o direito ao
contraditório e a ampla defesa; d) é vedado o mandato vitalício para o
cargo em Conselho; e e) o presidente do Conselho Curador deve ser eleito
entre seus pares, já os membros dos Conselhos Fiscal e Diretor serão
indicados pelo Conselho Curador.
Em setembro de 2013 (cf. Ofício n° 470/2013, fl. 434), oficiou–
se ao instituidor, requestando-se a apresentação de minuta do estatuto
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com as alterações propostas pelo Centro de Apoio. Reiterou–se o
expediente por intermédio do Ofício n° 660/2013 – fl. 436.
Em dezembro de 2013 (fl. 439), o requerente apresentou nova
versão do estatuto, para apreciação do MP (fls. 440–455).
Em abril de 2014 (fls. 456–457), a pessoa do Sr. Célio
Semprebom compareceu à d. 1ª Promotoria de Justiça de Ibiporã/PR e
apresentou documentos referentes à Casa de Artes com o desígnio de ser
apurada a legalidade da extinção desta instituição. Juntou documentos
(fls. 458–527)12.
Dentre as alegações exibidas pelo Sr. Célio, constam
apontamentos de que a Fundação Henrique de Aragão estaria na posse
ilegal do imóvel doado pela Prefeitura Municipal à Casa de Artes.
Em face dessas informações apresentadas pelo Sr. Célio (2.20),
oficiou–se à Prefeitura do Município de Ibiporã/PR (Ofício n° 598/2014 –
fl. 528).
A Prefeitura, a seu turno, prestou os seguintes esclarecimentos
(fl. 529): a) que o imóvel foi doado à Casa de Artes em 12/03/76; e b)
que a Casa de Artes pura e simplesmente doou o imóvel para a
12 Manifestação Sr. Celio Semprebom – fls. 458–459; Ofício encaminhado pelo Sr. Célioà d. Promotora de Justiça – fl.460; Ofício encaminhado pelo Sr. Célio ao Sr. JoaquimHenrique de Aragão – fls. 461–462; Ofício de resposta do Sr. Henrique de Aragão ao Sr.Célio – fls.463–467; Ata de instituição da Casa de Artes – fl. 468; Estatutos da Casa deArtes – fls. 469 a 478, 479 a 483 e 484 a 493; Livro de atas da Casa de Artes – fls. 503–527.
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Fundação Henrique de Aragão, em 15/12/2011. A resposta veio
acompanhada de cópia da matrícula do imóvel em questão (fl. 530) 13.
Após, expediu-se o Ofício n° 1124/2014 (fl. 534) ao Cartório de
Registro Civil das Pessoas Naturais, Títulos e Documentos e Pessoas
Jurídicas de Ibiporã/PR, requisitando-se cópia do ato constitutivo,
juntamente as suas respectivas alterações, da Casa de Artes, bem como
solicitando-se esclarecimentos quanto ao registro da dissolução desta
Entidade.
Em setembro de 2014 (fl. 535), o Oficial encaminhou cópia dos
documentos requestados14 e esclareceu que o cancelamento do estatuto
social da Casa de Artes foi registrado mediante requerimento do
interessado e apresentação da respectiva ata.
Frente a esse conjunto emblemático de ocorrências, a d.
Promotora de Justiça Amarílis F. Picarelli Cordioli, a quem pertence
atualmente a tarefa de presidir o Inquérito Civil em apreço,
determinou a remessa dos autos à atual Coordenação deste Centro
de Apoio, pugnando por auxílio na solução das questões elencadas
às fls. 568 e 569. Requereram–se, em resumo, os seguintes
esclarecimentos:
13 Matrícula do imóvel objeto da doação entre a Casa de Artes e a Fundação Henriquede Aragão – fl. 530; Lei Municipal nº 172/67 – fls. 531–532.14 Estatuto primitivo da Fundação Casa de Arte – fls. 536–540; Primeira alteraçãoestatutária Casa de Artes – fl. 541–555; Cancelamento do estatuto social Casa de Artes– fls. 556–561.
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a) Considerando que a intenção do instituidor é a preservaçãodo acervo de obras artísticas, não seria mais viável que essasobras fossem doadas à Fundação Cultural de Ibiporã?
b) O Ministério Público detém legitimidade para ingressar comação de dissolução de associação?
c) Considerando que a Fundação Henrique de Aragão não existejuridicamente porque foi cancelado seu ato constitutivo, qualdeve ser a destinação dos bens móveis e imóveis que seriamdoados pela Casa de Artes?
2.8. Em 1º de setembro de 2015 este Centro de Apoio recebeu
a informação pela Assessoria Jurídica da Promotoria de Justiça
consulente de que o Sr. Joaquim Henrique de Aragão faleceu.
3. Tecidas essas considerações, inicia-se a explanação
jurídica visando à resposta dos questionamentos formulados pela
consulente.
3.1. Da situação jurídica da Fundação Henrique de
Aragão.
Para que seja constituída uma fundação privada, faz–se
necessária a observância de um conjunto de condições especiais.
Isso porque o ordenamento jurídico brasileiro consagrou um
sistema de reconhecimento condicionado das fundações.
Diferentemente de outros sistemas, em que a aquisição da personalidade
jurídica das entidades fundacionais decorre automaticamente do
cumprimento das exigências legais, no ordenamento pátrio a
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personalização desse tipo de pessoa jurídica depende de autorização
prévia do MP.
A existência de um velamento15 criterioso sobre as fundações
privadas é importante, sobretudo para que sejam coibidos desvios de
finalidade. Assim, ao mesmo tempo em que o Direito reconhece o valor
das fundações, porque destinadas ao desenvolvimento de relevantes
atividades de cunho social, também impõe sobre elas o velamento
ministerial, como forma de garantir o efetivo cumprimento das diretrizes
legais.
Tal condicionamento faz com que os atos de formação da
entidade fundacional sejam desmembrados em mais de um
momento. Nesse tocante, é pertinente a lição do expoente Gustavo Saad
DINIZ:
As fundações se constituem em dois tempos: um é a instituição(ato unilateral, formal e gratuito) e o outro é a constituiçãopropriamente dita. A instituição é o negócio por meio do qualuma pessoa, ou um grupo de pessoas, faz a dotação de umpatrimônio e o destina a um fim. Nesse ato, o instituidor deveprever quem ficará incumbido de organizar a pessoa jurídica,quando, em seguida, dar–se–á um segundo momento, ou seja, aconstituição da fundação, atribuindo–se–lhe a personalidadejurídica (DINIZ, 2006, p. 265)16.
15 Cf. caput do art. 66 do Código Civil: “Velará pelas fundações o Ministério Público doEstado onde situadas”.16 No mesmo sentido, José Eduardo SABO PAES comenta que “existem, portanto, doismomentos: o da criação ou instituição com o registro da escritura pública ou dotestamento; e o da personificação propriamente dita, com a aprovação e registro doestatuto” (SABO PAES, 2013, p. 308).
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É unânime na doutrina especializada, independentemente das
regulamentações específicas de cada estado da Federação, que a
instituição de uma entidade fundacional requer: a) a dotação de bens
livres e desembaraçados em escritura pública ou testamento; b) a
adequação das finalidades sociais aos ditames da lei (cf. art. 62 CC/02);
c) a elaboração de estatuto, em conformidade com os requisitos legais; d)
a aprovação pelo MP; e e) por fim, o elemento derradeiro que torna
perfeito o ato constitutivo e faz surgir a personalidade jurídica, qual seja,
o registro do estatuto fundacional.
Conforme salientado acima, na oportunidade da instituição da
fundação deve–se fazer, por escritura pública ou testamento, uma
dotação especial de bens livres. A dotação inicial a que se refere a lei
deve ser suficiente para que a fundação possa desenvolver as finalidades
para as quais se propõe17.
Além da dotação de bens, na escritura pública ou testamento
constarão as finalidades da fundação e, facultativamente, a maneira de
administrar a entidade.
Depois de firmado perante o Tabelionato de Notas, o
documento elegido para a constituição da entidade (escritura
pública ou testamento) deve ser inscrito no Cartório de Registro
17 Por esse motivo e com amparo na Resolução MP–PR 2.434/2002, as Promotorias deJustiça das Fundações exigem dos instituidores a elaboração de projeto de viabilidadeeconômica da pessoa jurídica a ser criada. De acordo com o art. 12 da Resolução, “aanálise do ato de instituição compreende o projeto de estatuto, a dotação inicial e aviabilidade econômica e financeira da futura fundação”.
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Civil de Pessoas Jurídicas, pois, segundo a regra do art. 45 do CC/02,
a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado tem início com
a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando
necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo (destacou-
se).
Ao comentar a referida norma, Nestor DUARTE (2011)
esclarece que a inscrição a que se refere o CC é equivalente ao
registro no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas, em
conformidade com o art. 114 da Lei de Registros Públicos18.
Com o cumprimento dessa última formalidade registral,
considera–se instituída a fundação. Isto é, a partir do registro da
escritura pública ou testamento no Cartório de Registro Civil de
Pessoas Jurídicas a entidade pode-se considerar existente no mundo
jurídico, embora ainda destituída de personalidade jurídica, segundo
o entendimento majoritário da doutrina.
Entende–se que a escritura pública de instituição ou o
testamento não tem o condão de atrelar personalidade jurídica à
fundação. A personalidade só emerge se completado o processo de
constituição, o qual compreende a apreciação e aprovação do MP e,
por fim, o registro do estatuto da fundação também no Cartório de
Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Apenas com este último registro
18 Art. 114. No Registro Civil de Pessoas Jurídicas serão inscritos:I – os contratos, os atos constitutivos, o estatuto ou compromissos das sociedades
civis, religiosas, pias, morais, científicas ou literárias, bem como o das fundações e dasassociações de utilidade pública;
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a fundação torna–se sujeito de direito e, consequentemente, apta a
exercer direitos e contrair obrigações.
Diante do caráter genérico das normas insculpidas no CC, o
Ministério Público do Estado do Paraná editou a Resolução–PGJ n°
2434/2002 com o objetivo de uniformizar os procedimentos nessa
matéria e torná–los mais eficientes, dentre outros.
Ao tratar do velamento ministerial na fase de instituição da
fundação, o inciso III do art. 7º daquele diploma administrativo
normativo19 recomendou que o pedido de autorização de instituição de
fundação seja instruído com minuta do ato de dotação inicial de bens.
Esse ponto merece destaque porque conforma medida de
grande auxílio para a promoção da segurança jurídica nessa matéria. O
objetivo é que tanto a escritura pública quanto o estatuto passem pela
apreciação do MP antes de serem formalizados, prevenindo-se, assim,
eventuais irregularidades na constituição da entidade fundacional.
19 Art. 7º. O interessado na instituição de Fundação deverá dirigir requerimento escritoà Promotoria das Fundações da comarca correspondente ao município da sede daentidade, instruindo o pedido de autorização com os seguintes documentos:
I– estudo de viabilidade econômica e financeira da fundação; II– projeto de estatuto, em duas vias, subscrito por advogado inscrito na Ordem dos
Advogados do Brasil; III– minuta do ato de dotação inicial constituída de bens e/ou direitos, livres e
desembaraçados, suficientes para o alcance dos fins colimados, demonstrando atitularidade;
IV– documentos pessoais comprobatórios da capacidade civil e da livre disposição dosbens; e,
V– uma cópia da ata da reunião do órgão que deliberou pela instituição e uma cópiado estatuto ou contrato social da instituidora, no caso do instituidor ser pessoa jurídicade direito privado. (Destacou–se).
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3.1.1. No caso concreto sob análise, foram lavradas duas
escrituras públicas de constituição e dotação de bens no
Tabelionato de Notas de Ibiporã/PR. Em 2009, foi lavrada escritura
antes da apreciação do MP e posteriormente, em 2010, editou–se uma
versão mais completa que incorporou as disposições estatutárias então
aprovadas pelo Parquet.
Em 2012, após a declaração da nulidade e o cancelamento do
registro do estatuto da Fundação Henrique de Aragão, a Entidade teve a
sua personalidade jurídica suprimida, tornando–se incapaz para contrair
obrigações na vida civil.
Tendo em vista que o cancelamento do estatuto foi
motivado por hipótese de nulidade absoluta (vide Termo Aditivo à
Recomendação n° 04/2011, fls. 396/397), acredita-se que os seus
efeitos retroagem à data da formação do ato impugnado. Portanto,
para todos os fins jurídicos, considera–se que o estatuto da
Entidade nunca fora sido registrado e, assim sendo, que a Fundação
nunca obteve personalidade jurídica.
Conquanto despersonalizada, a Fundação ainda poderia ser
considerada juridicamente existente, caso perdurasse o registro válido
da escritura pública de instituição no Cartório de Registro Civil de
Pessoas Jurídicas, a teor do art. 45 do CC e do art. 114 da Lei de
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Registros Públicos, conforme explicação teórica apresentada no tópico
anterior.
Porém, no presente caso, a escritura pública foi apenas
lavrada no Tabelionato de Notas, carecendo de anotação no registro
civil competente20. Desse fato decorre que, além de
despersonalizada, a Fundação é efetivamente inexistente para
efeitos legais.
3.2. Do desenlace da Fundação Henrique de Aragão e da
viabilidade de doação do acervo artístico à Fundação Cultural de
Ibiporã.
Tendo em vista que as fundações são condicionadas à
aprovação e ao velamento pelo MP, como já esmiuçado anteriormente,
considera–se que os atos realizados pela entidade fundacional em
formação21 configuram um mero estado de expectativa, sendo
revogáveis enquanto permanecerem nesta condição.
Somente com o registro do estatuto a fundação passa a ser um
sujeito com capacidade legal para expressar validamente sua vontade,
20 Vide fls. 286–330.21 SABO PAES diferencia as fundações “de fato” das fundações “em formação”. Afundação de fato seria aquela que “se apresenta como fundação, se autodenominafundação, age como fundação, mas, em verdade, possui natureza jurídica distinta”. Já afundação “em formação” seria aquela que está em processo de constituição mas aindanão se personificou por completo porque não houve o registro do estatuto (SABO PAES,2013, p. 320).
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tornando válidas e irrevogáveis as declarações feitas durante o estágio de
formação da pessoa jurídica fundacional (art. 64 CC/02).
Nessa linha, entende a doutrina especializada que a dotação
inicial de bens em escritura pública de constituição de fundação
configura um estado de expectativa revogável, enquanto não for
registrado o estatuto, bem como que até esse ponto – vale frisar: do
registro estatutário – os bens dotados em prol da entidade não
saíram da esfera patrimonial do instituidor. Assim leciona
CARVALHO SANTOS:
(…) antes que a instituição adquira personalidade, o ato defundação se limita a criar um estado de expectativa, quepode deixar de vir a produzir efeitos se o fundador revoga asua declaração de vontade. Essa revogação lhe é permitidafazer até o momento em que a instituição adquirepersonalidade (…). Se a instituição é feita por escriturapública, até a aprovação dos estatutos pela autoridadecompetente e o respectivo registro, pode o fundador revogá–la, pois até então os bens não saíram do seu patrimônio(SANTOS apud SABO PAES, 2013, p. 353).(Grifou-se).
Aplicando-se o entendimento doutrinário citado acima ao caso
concreto da criação da Fundação Henrique de Aragão, e considerando
que a sua constituição não se perfectibilizou, é crível que os bens
dotados em favor da pretensa Entidade nunca saíram do patrimônio
do Sr. Aragão, sendo cabível a revogação da declaração de vontade
do instituidor manifestada em escritura pública.
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Logo, uma vez que o Sr. Aragão era o legítimo proprietário dos
bens, percebe–se que ele poderia, em vida, usar, gozar e dispor de seu
patrimônio, conforme autoriza o art. 1.228 do CC.
Dos elementos constantes nos autos do Inquérito Civil,
também se encontram indícios de que o Sr. Aragão estava inclinado a
renunciar ao desejo de instituir a Fundação22.
Levando–se em conta, ainda, o propósito de preservação do seu
acervo artístico, entende–se que era viável, de fato, a doação das
obras para a Fundação Cultural de Ibiporã, se o Sr. Aragão assim
desejasse.
Nesse tocante, era recomendável somente a confirmação da
vontade do instituidor em renunciar à criação da Fundação
Henrique de Aragão e doar suas obras pessoais à Fundação Cultural
de Ibiporã ou, remotamente, de prosseguir no intuito de convalidar
a constituição da Entidade.
Caso ele abdicasse do propósito de instituição da Fundação,
seria conveniente a colheita da revogação da sua declaração de vontade
de criar a pessoa jurídica fundacional e dotá–la com o seu patrimônio22 Veja–se que à fl.568 consta que “recentemente procurou esta Promotoria de Justiça aDra. Rosângela Pacheco, aduzindo que o Sr. Henrique de Aragão encontra–se debilitado,face problemas de saúde e a idade avançada, sugerindo–lhe a referida advogada que oacervo fosse doado à Fundação Cultural de Ibiporã, que já conta com estrutura eprofissionais especializados em obras de arte, uma vez que seria difícil economicamentemanter a existência da fundação, em especial, manutenção do seu acervo. A referidaadvogada, diante dos fatos narrados, tirou cópia dos autos para buscar uma soluçãojunto ao instituidor da fundação”.
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artístico, bem como era oportuno o esclarecimento quanto às possíveis
formas de destinação de seu patrimônio (venda, doação, etc.),
especialmente quanto à viabilidade de doação do acervo à Fundação
Cultural de Ibiporã.
Eventualmente, na hipótese de inércia do instituidor,
caberia ao MP propor Ação Declaratória de ineficácia da escritura
pública com o condão de formalizar a inoperância da declaração de
vontade do instituidor de criar a pessoa jurídica fundacional.
Essa possibilidade é abordada pelo autor José Eduardo
SABO PAES23 nos casos em que a escritura não contém vício de forma
ou conteúdo, mas ainda assim não é apta a produzir seus efeitos e
embasar a instituição de uma fundação. Nesses casos,
(…) imperioso se faz que seja declarada a ineficácia daquelaescritura pública, que, como fonte de obrigações e direitos,mostra–se inteiramente írrita, devendo, então, serdesconsiderada a sua existência como ato jurídico (art. 185do CC). Essa declaração poderá ser proposta pelo MinistérioPúblico, por meio de uma ação de declaração de ineficáciade escritura pública, impetrada em Vara Cível, de acordocom a Lei de Organização Judiciária. Essa legitimidadedecorre do fato de que, se o Ministério Público temlegitimidade para propor ação de extinção de uma fundaçãoregularmente constituída, diante da constatação de ser“impossível a sua manutenção” (arts. 69 do CC e 1.204, II,do CPC), a fortiori o tem para pleitear simples declaração deineficácia de uma escritura de instituição, uma vezverificada a impossibilidade de concretização do objetivoque encerra (SABO PAES, 2013, p. 303).(Grifou-se).
23O autor, por sua vez, menciona já ter identificado esse posicionamento entre curadores de fundações no âmbito do Distrito Federal.
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3.2.1. Com a notícia do falecimento do instituidor, acredita-se
que o caminho para a solução do embaraço desvia-se
moderadamente do rumo indicado acima.
A situação em que se constata a morte do instituidor antes
de se tornar perfeita e acabada a constituição da entidade
fundacional é citada por SABO PAES como exemplo de causa
precursora da ação declaratória de ineficácia de escritura pública.
(…) É possível que, após a lavratura da escritura pública deconstituição de uma fundação no cartório de notas, se essaescritura não contiver qualquer vício de forma ou conteúdo, nãoesteja esse documento de constituição apto a produzir seusefeitos, ou seja, servir de base à regular instituição de umafundação.Tal hipótese poderá ocorrer apenas quando o estatuto dafundação ainda não houver sido registrado no cartório deregistro civil das pessoas jurídicas, os instituidores (aquelaspessoas que figurarem como outorgantes na escriturapública), em decorrência do tempo, vierem a falecer e seussucessores não dispuserem de qualquer informação quanto àefetiva integralização da dotação inicial, bem como se essessucessores não tiverem interesse em encampar o idealdelineado pelos instituidores, pois, inexistindo patrimônio enão havendo possibilidade de obrigar-se quem quer que sejaa constituí-lo, não há que se falar em fundação. Diante dessa hipótese, imperioso se faz que seja declarada aineficácia daquela escritura pública, que, como fonte deobrigações e direitos, mostra-se inteiramente írrita;devendo, então, ser desconsiderada a sua existência comoato jurídico (art. 185 do CC). (…) (SABO PAES, 2013, p. 303).(Grifou-se).
Não se descura que o autor sinaliza a possibilidade de que os
sucessores do falecido encorajarem-se na realização do ideal almejado
pelo de cujos, assumindo o papel de instituidores na empreitada de
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consolidação da instituição da entidade fundacional – o que poderia
esvaziar o interesse ministerial na propositura da ação declaratória.
Todavia, em averiguação dos autos, percebe-se que o Sr.
Aragão era solteiro e não tinha dependentes declarados junto à
Receita Federal (cf. Declaração de Imposto de Renda de fls. 45-49).
Além disso, mesmo que houvesse notícia da existência de algum
herdeiro, entende-se que a probabilidade de sucesso em eventual intento
de consolidação da Fundação por terceiros é remota, bem como
repercutiria no prolongamento da atividade ministerial neste caso sem
expectativa relevante de êxito na estruturação e desenvolvimento da
Entidade.
Por essas razões, diante da aparente inexistência de
herdeiros conhecidos, preconiza-se o direto ajuizamento da ação
declaratória de ineficácia de escritura pública em face da herança
jacente do Sr. Aragão como medida oportuna, requerendo-se ao juiz,
nos pedidos, que dê abertura, ex officio24, ao procedimento de
24ARRECADAÇÃO DE HERANÇA JACENTE. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃODO MÉRITO. ANULAÇÃO DO JULGADO.Tratando-se de herança jacente, a doutrinaentende que resta mitigado o princípio do dispositivo, restando o juiz autorizado àiniciativa do processo e a impulsionar o feito para promover a arrecadação dosbens, conforme art. 1142 do Código de Processo Civil. Ademais, no caso houveefetiva manifestação do Município nos autos, em petição não apreciada pelo juízo,restando afastada a alegação de inércia. Por outro lado, não houve intimação pessoal dointeressado para dar andamento ao feito, sob pena de extinção, na forma do art. 267, §1º, do Codex. Por fim, há evidente interesse da Fazenda Pública no caso, quanto àincorporação dos bens do falecido após declarada a vacância, na forma do art. 1822 doCódigo Civil. Assim, deve ser anulada a sentença, para prosseguimento do feito.DECISÃO MONOCRÁTICA. PROVIMENTO DO RECURSO. (TJ-RJ,APELAÇÃO CÍVEL N.º0006947-87.2004.8.19.0208, Relator: DES. CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA, Data deJulgamento: 28/11/2013, VIGÉSIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL). (Destacou-se).
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herança jacente em incidente apartado, na forma do art. 1.142 do
Código de Processo Civil, no qual deverá ser nomeado curador para
guardar, conservar e administrar a herança e representá-la na ação
declaratória.
Nesse particular, ressalta-se que o procedimento de herança
jacente poderá repercutir na declaração de vacância do patrimônio e, a
partir disso, na transferência dos bens materiais do Sr. Aragão para o
Município (cf. art. 1.822, caput, do CC c/c 1.143 do CPC).
Caso a d. Promotoria de Justiça tome conhecimento da
existência de algum herdeiro do Sr. Aragão, a sugestão acima muda de
figura no tocante à formação do polo passivo da demanda, que deverá
ser composto pelo sucessor, bem como à desnecessidade de
requerimento de instauração do procedimento de herança jacente.
Nessa situação hipotética, a posse do patrimônio material do
Sr. Aragão transmitiu-se aos herdeiros legítimos e testamentários, por
força do princípio da saisine, previsto no art. 1.784 do CC, cabendo a
eles proporem o arrolamento ou inventário e dar aos bens a destinação
que melhor lhes aprouverem, na proporção dos seus respectivos
quinhões.
3.3. Do negócio jurídico de doação de bem imóvel
entabulado entre a Casa de Artes e Ofícios João VI e a Fundação
Henrique de Aragão.
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Seja a entidade inexistente ou apenas despersonalizada,
acredita–se que em ambas hipóteses a Fundação Henrique de Aragão
era incapaz para firmar negócios jurídicos ao tempo do ato de
doação.
Essa conclusão gera impactos na doação do bem imóvel em
que a Casa de Artes e Ofícios Paulo VI figurou como doadora e a
Fundação Henrique de Aragão como donatária25.
Note–se que nunca houve a efetiva transferência da
propriedade do bem. A escritura pública de doação foi lavrada
enquanto a Fundação Henrique de Aragão ainda se encontrava em
fase de formação, motivo pelo qual se pode considerar que esse
documento comunicava uma simples promessa de doação (SABO
PAES, 2013, p. 353), que só se concretizaria caso a Fundação viesse
a adquirir personalidade jurídica. Corroborando o entendimento, cita-
se o posicionamento de SABO PAES:
Após o registro da escritura pública de criação da fundaçãoou da lavratura do testamento, a dotação inicial deverá serefetivamente concretizada. Essa concretização dar–se–á,normalmente, após a aprovação do estatuto do entefundacional pelo órgão do Ministério Público, uma vez quesomente após a aprovação e o registro do estatuto dafundação no Cartório das Pessoas Jurídicas é que a entidadeadquire personalidade jurídica, e, portanto, já pode serlegalmente sujeito de direitos e obrigações, por meio de seusórgãos. Esses órgãos, por intermédio de seus integrantes,colocarão a entidade em funcionamento, tendo como uma dasprimeiras atitudes, depois de instalados o depósito bancário da
25 Escritura pública de fls. 332–333.
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dotação recebida em espécie e a transferência da propriedade,em cartório, de todos aqueles bens imóveis ou direitos reaisrecebidos em doação ou a transferência das ações. (SABO PAES,2013, p. 350).(Destacou–se).
Na medida em que o cancelamento do estatuto se deu com
efeitos ex tunc – os quais implicam na concepção de que a entidade
nunca alcançou personalidade jurídica –, parece coerente sustentar
que a Fundação não poderia figurar como donatária, haja vista que
não detinha capacidade para tanto.
Ausente, portanto, uma das condições essenciais de
validade do negócio jurídico (art. 104, I do CC/02), enxerga–se que a
doação entabulada entre a Casa de Artes e a Fundação Henrique de
Aragão é nula de pleno direito.
Ademais, ainda que se possa considerar que o negócio
entabulado caracteriza-se como uma promessa de doação, o vínculo
obrigacional só seria exigível após a completa formação da Entidade.
3.4. Da situação jurídica da Casa de Artes e Ofícios João
VI.
Os documentos constantes no Inquérito Civil (mormente os de
fls. 536–561) comprovam que a Casa de Artes foi constituída sob a
forma jurídica de Sociedade Civil sem Fins Lucrativos no ano de
1966, ou seja, sob a égide do Código Civil anterior.
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O inciso I do art. 16 do Código Civil de 1916 previa serem
pessoas de direito privado as sociedades civis, religiosas, pias, morais,
científicas ou literárias, as associações de utilidade pública e as
fundações.
Sob a perspectiva de que as sociedades seriam essencialmente
caracterizadas pela “comunhão de interesses morais ou econômicos”
(CARVALHO SANTOS apud REIS, 2010, p. 997), defendia–se naquele
tempo que as entidades sem fins lucrativos poderiam ser constituídas
também sob a forma de sociedades civis.
Já naquela época, diversos autores alegavam a falta de rigor
técnico na redação da norma. Para esses, o termo sociedade deveria ser
reservado às pessoas jurídicas com finalidades econômicas.
O atual CC curvou–se àquelas críticas e passou a distinguir as
sociedades das associações pelo critério da finalidade econômica. Essa
intenção revela–se no contraste entre os arts. 53 e 981 do CC26 e
também na exposição de motivos do seu anteprojeto, que assim
declarou:
26 Art. 53. Constituem–se as associações pela união de pessoas que se organizem parafins não econômicos.
Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigama contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e apartilha, entre si, dos resultados.
Ressalte–se que, mesmo sob a égide do novo Código, há autores que ainda defendema possibilidade de constituição de sociedade civil sem fins lucrativos (c.f. José EduardoSABO PAES), mas essa corrente é minoritária atualmente. De todo modo, é unânime nadoutrina que, à falta de um regime específico, essas sociedades seriam disciplinadaspelo mesmo regime jurídico aplicável às associações.
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Tratamento novo foi dado ao tema pessoas jurídicas, um dospontos em que o Código Civil atual se revela lacunoso evacilante. Fundamental, por sua repercussão em todo sistema, éuma precisa distinção entre as pessoas jurídicas de fins nãoeconômicos (associações e fundações) e as de escopoeconômico (sociedade simples e sociedade empresária),aplicando–se a estas, no que couber, as disposiçõesconcernentes às associações.
Quando o CC/02 faz menção à finalidade não econômica, leia–
se como “não lucrativa”, visto que já é posicionamento assente em nosso
ordenamento que as associações (assim como as fundações) podem
exercer atividades de cunho econômico, desde que as rendas auferidas
com as ações sejam reaplicadas nas finalidades estatutárias e não
distribuídos entre os associados. Nesse sentido, comenta o autor
Gustavo TEPEDINO:
Ao contrário do que poderia sugerir uma primeira leitura, não éo caráter econômico ou não da atividade desempenhada o fatorprimordial para diferenciar as associações das sociedades. Defato, embora o art. 53 do CC/2002 defina as associaçõescomo entidades voltadas para “fins não econômicos”, aexpressão não pode ser interpretada de forma literal. Aantiga concepção da associação como uma entidade altruísticafoi, há muito, superada pela melhor doutrina pátria eestrangeira. É inegável que, ao se unirem para determinado fim,os associados têm como escopo extrair da união alguma espéciede vantagem, que não raro resulta de uma atividade ou serviçoprestado pela associação, havendo aí, por definição, naturezaeconômica. O que não há, nas associações, é finalidadelucrativa, ou seja, o objetivo primordial de produzir lucros ereparti–los entre os associados. Essa persecução do lucro esua partilha são traços que caracterizam as sociedades, e queservem justamente a diferenciá–las das associações, naconcepção mais moderna (TEPEDINO, 2011, p. 79).(Destacou–se).
Em suas disposições transitórias, o CC/02 determinou um
prazo para que as associações, sociedades e fundações constituídas na
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forma das leis anteriores se adaptassem às disposições do novo sistema
(cf. art. 2.031).
No caso de entidade que houvesse sido constituída sob a
denominação de sociedade civil, entende–se que não é obrigatória (ainda
que recomendável) a adoção expressa do termo “associação”, mas é
primordial que esteja explícita a ausência de fins lucrativos da entidade
e também que o estatuto social seja revisto e adequado aos requisitos do
art. 54 do CC/02.
Esclarecidos esses pontos, conclui–se que a Casa de Artes e
Ofícios João VI é submetida ao regime jurídico das associações.
3.4.1. Em decorrência do princípio da liberdade associativa
(inciso XVII do art. 5º), a intervenção do MP nessas entidades é menos
intensa, inexistindo um acompanhamento permanente, tal como no
velamento das fundações.
A dissolução de associação pode ser feita voluntária ou
compulsoriamente. No último caso, faz–se necessária a propositura de
ação de dissolução, pois as associações contam com garantia
constitucional de que só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter
suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo–se, no primeiro
caso, o trânsito em julgado (cf. inciso XIX do art. 5º da CF/88).
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O MP possui legitimidade para propor ação de dissolução
de associação, uma vez que o âmbito de atuação consagrado no caput
do art. 127 da Constituição Federal abrange a atividade de fiscalização
das entidades consideradas de interesse social.
Contudo, em razão das diretrizes constitucionais de respeito à
liberdade associativa (incisos XVII a XX do art. 5º CF/88), a
legitimidade ministerial para propositura da referida ação restringe–
se aos casos em que a associação recebe subvenções públicas ou
contribuições de particulares.
Cumprido esse requisito, a legitimidade ativa do MP ainda
é condicionada ao enquadramento do caso às hipóteses arroladas no
art. 2º do Decreto–Lei n° 41/66. Transcrevem–se os arts. 1º a 3º:
Art. 1º – Toda sociedade de fins assistenciais que receba auxílioou subvenção do Poder Público, ou que se mantenha, no todo ouem parte, com contribuições periódicas de populares, ficasujeita à dissolução nos casos e formas previstas neste Decreto–lei.Art. 2º – A sociedade será dissolvida se:I – deixar de desempenhar efetivamente as atividadesassistenciais a que se destina.II – aplicar as importâncias representadas pelos auxílios,subvenções ou contribuições populares em fins diversos doprevisto nos seus atos constitutivos ou estatutos sociais.III – ficar sem efetiva administração por abandono ouomissão continuada dos seus órgãos ou diretores.Art. 3º – Verificada a ocorrência de alguma das hipóteses doartigo superior, o Ministério Público, de ofício ou porprovocação de qualquer interessado, requererá ao juízocompetente a dissolução da sociedade.Parágrafo único – O processo da dissolução e da liquidaçãoreger–se–á pelos arts. 655 e seguintes do Código de ProcessoCivil.(Destacou–se).
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No caso vertente, acredita-se que a Casa de Artes pode ser
submetida às normas do mencionado Decreto–Lei porque suas
atividades eram desenvolvidas com uso de bem imóvel doado pelo
Município, ou seja, houve transferência de patrimônio público à
Entidade. Além disso, a atuação do MP justifica–se porque houve
comunicação formal de ocorrência de supostas irregularidades e de
inatividade.
3.4.2. Ocorre que, num primeiro momento, parece
desnecessária a propositura de ação de dissolução, uma vez que os
documentos de fls. 556–561 atestam que a Casa de Artes requereu
voluntariamente a extinção no ano de 2011.
A propositura da Ação se revelará pertinente apenas caso
sejam apuradas, de fato, irregularidades no procedimento de
extinção voluntária, conforme explica–se de modo mais detalhado
no ponto 3.5.
Os apontamentos feitos adiante também corroboram com a
conclusão de que, não obstante a Casa de Artes encontre–se em
processo de dissolução, a Entidade ainda é dotada de personalidade
jurídica para a única finalidade de concluir a destinação de bens e
resolver outras eventuais pendências antes de sua extinção
definitiva.
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3.5. Da dissolução da Casa de Artes e Ofícios João VI e da
destinação dos bens que pertenciam à Entidade.
Em que pese se visualize a dissolução voluntária da Casa de
Artes, tendo em vista a denúncia realizada pelo Sr. Célio Semprebom,
entende-se que é recomendável a instauração de Notícia de Fato27
com o escopo de serem analisados mais detidamente os documentos
apresentados (fls. 457–527) e ser investigada a regularidade da
dissolução voluntária.
3.5.1. Se apurada a regularidade da decisão de dissolução,
é conveniente o processamento das demais fases de extinção
administrativa da associação.
O estatuto da Casa de Artes possivelmente prevê as condições
de dissolução da instituição e de destinação de seu patrimônio
remanescente. Porém, considerando que a Casa de Artes não atualizou
seu estatuto após a edição do novo CC, será necessária uma leitura
atenta às disposições legais e doutrinárias aplicáveis.
A extinção de associação não se dá por ato uno e sim por
etapas, principalmente porque é necessário garantir a destinação
adequada dos bens remanescentes. Segundo a caracterização de Anna
Luiza Duarte MAIELLO (2012), com apoio na doutrina do português
Fernando CARDOSO (1989), esse processo tem em sua jornada as
27 Preferencialmente em autos apartados, a fim de evitar tumulto entre os feitos.
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fases de dissolução, liquidação e, por fim, de efetiva extinção.
Leciona a referida autora que:
A dissolução é o início ou a primeira fase do processo deextinção da pessoa jurídica, correspondente à verificação de umfato apto a causar o fim do ente coletivo. É um efeito jurídiconecessário à extinção, mas não suficiente (…). Com adissolução, a pessoa jurídica não se extingue, embora perdure,praticamente, com esta finalidade. As causas da dissolução sãoatos ou fatos jurídicos, sendo a dissolução propriamente ditaum efeito jurídico dos mesmos, estando tais causas sempreligadas à perda ou adulteração de um elemento constitutivo dapessoa jurídica, correspondente ao que fora o seu substratopersonificável (MAIELLO, 2012, p. 197)
No presente caso, a causa imediata da dissolução foi o
requerimento administrativo de dissolução feito pelo interessado,
acompanhado da respectiva ata de deliberação em assembleia. Já as
causas mediatas da dissolução foram a inatividade da associação há
vários anos e também a intenção de ser constituída outra entidade (i.e, a
Fundação Henrique de Aragão) que tornasse viável a retomada das
iniciativas culturais.
Ocorrida a causa de dissolução nos quadrantes da lei e do
estatuto, a primeira fase da dissolução deve ser completada com a
averbação no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (vide § 1º do art. 51
do Código Civil). A averbação da dissolução dá início à fase de
liquidação dos bens remanescentes, como indica SABO PAES:
Ocorrida a dissolução, cumpre à assembleia geral e/ou aospróprios administradores providenciar imediatamente, caso hajapatrimônio e débitos a saldar, a escolha e a investidura de umliquidante. Este liquidante poderá agir com o apoio das normasreferentes à liquidação de sociedades, uma vez que estas se
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aplicam, no que couber, às demais pessoas jurídicas de direitoprivado (§ 2º do art. 51 do CC). Cabe ao liquidante de imediatoaverbar a dissolução da associação no registro em que apessoa jurídica estiver inscrita (§ 1º do art. 51). (SABO PAES,2013, p. 153).(Destacou–se).
A averbação da dissolução consolida e dá publicidade à
vontade de extinção manifestada na assembleia geral. Contudo, a
Entidade ainda manterá sua personalidade jurídica e autonomia
patrimonial até que seja completado o procedimento de destinação dos
bens e definição das relações jurídicas pendentes (BASILE apud
MAIELLO, A., 2012, p. 198). Desse modo, enquanto não concluída a
destinação dos bens, as entidades em dissolução “ainda existem, mas de
forma limitada e provisória” (MAIELLO, 2012, p. 198)28.
Por fim, depois de liquidado o acervo patrimonial e concluída a
sua destinação em conformidade com o estatuto e a lei, tem–se a
extinção definitiva da associação.
A fim de preservar a segurança jurídica, a extinção deve ser
plenamente consolidada e publicizada com o registro de cancelamento
do estatuto junto ao Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas,
segundo defendem MAIELLO e CARDOSO:
28 “No direito português, depois de dissolvida, a associação fica também limitada àprática de atos meramente conservatórios e dos necessários à liquidação do patrimôniosocial e ultimação dos negócios pendentes. Apesar de não haver proibição expressa doCódigo Civil brasileiro à prática de novas operações durante a fase de liquidação daassociação, concluímos que tal restrição também se aplica, em razão da própriafinalidade do procedimento” (MAIELLO, 2012, p. 210).
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A extinção definitiva só ocorrerá com o término da liquidação.(…) Para resguardar a certeza e a segurança do comérciojurídico, o momento da cessação da personalidade jurídicadeve ser o do registro do encerramento da liquidação(MAIELLO, 2012, p. 208).(Destacou–se).
Os documentos que compõem o Inquérito Civil indicam que a
Casa de Artes realizou assembleia geral, na qual se deliberou pela
extinção da entidade e também pela destinação dos bens à Fundação
Henrique de Aragão (fls. 558–560).
Após a deliberação, apresentou–se requerimento de
“cancelamento de estatuto” ao Cartório de Registro de Títulos e
Documentos de Ibiporã–PR (fl. 557). Ao que consta, a dissolução não foi
averbada e tampouco foi cancelado o estatuto no Cartório de Registro
Civil competente.
Em resumo, compreende-se que a conclusão do processo
de extinção da Casa de Artes depende de: a) investigação da
competência das pessoas que deliberaram pela extinção na
assembleia geral; b) superado esse entrave, averbação da ata da
assembleia geral no Cartório Registro Civil de Pessoas Jurídicas; c)
efetiva destinação de todos os bens remanescentes; e d) registro do
cancelamento do estatuto social no Cartório de Registro Civil de
Pessoas Jurídicas.
Quanto à destinação dos bens remanescentes, no âmbito da
extinção administrativa – que, repisa-se, pressupõe a conferência da
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regularidade da deliberação –, acredita-se que a solução mais
recomendada seja a destinação à outra entidade social de fins
congêneres à Casa de Artes, conforme disposição estatutária (art.
61, caput, do CC).
O estatuto originário da Casa de Artes prevê em seu art. 20º
que, em caso de extinção, os bens seriam destinados com precedência à
Obra de Maria ou Movimento Focolares ou a uma sociedade congênere,
legalmente constituída, para serem aplicados nas mesmas finalidades (fl.
540).
Face à alternatividade inserida nas hipóteses do art. 20,
entende-se que não há óbice para que a destinação do patrimônio
remanescente da Casa de Artes seja em benefício à Fundação
Cultural de Ibiporã, o que, essencialmente, significará o retorno do
bem imóvel ao patrimônio público, eis que se trata de entidade
fundacional pública.
3.5.2. Se acaso concluir–se pela irregularidade da
dissolução administrativa da Casa de Artes, em razão da falta de
competência daqueles que deliberaram pelo encerramento da
instituição – dentre outros motivos –, tornar-se–á recomendável a
propositura de Ação de Dissolução, sob o controle do Poder
Judiciário, dada a inviabilidade de seguimento válido dos atos
necessários ao alcance da perfeita extinção administrativa da
Associação.
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Havendo necessidade da propositura de ação judicial de
dissolução, ante eventual nulidade da deliberação administrativa, o
patrimônio da Casa de Artes poderá ser destinado da mesma maneira
sugerida na seara da extinção extrajudicial.
Por fim, ressalta–se que este Centro de Apoio não vislumbra
qualquer impedimento para que o imóvel que foi doado à Casa de Artes
pelo Município seja destinado à outra instituição social de fins
congêneres, pois a doação originária foi feita sem qualquer cláusula
restritiva ou de reversão, em virtude de desfazimento da pessoal jurídica
donatária, por exemplo.
4. Tendo em vista o questionamento formulado e os dados
fornecidos a esta Unidade, são essas as considerações que se revelam
adequadas. Salienta–se que a presente exposição não tem cunho
vinculativo, pois é respeitado o princípio da independência
funcional que baliza a atuação dos membros.
Persistindo dúvidas ou havendo novos questionamentos, este
Centro de Apoio permanece à disposição.
Espera–se que o material e as considerações encaminhadas
auxiliem no deslinde do caso concreto sob a atenção ministerial.
5. À Secretaria deste Centro de Apoio para que: a) seja
anexada a presente manifestação aos autos do Inquérito Civil n° MPPR-
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0062.09.000015–9; b) seja extraída cópia deste parecer, para efeito de
registro e arquivamento da Consulta n° 17/2015; c) sejam remetidos os
autos à d. 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Ibiporã/PR, por meio
de ofício.
Curitiba, 10 de setembro de 2015.
Terezinha de Jesus Souza SignoriniProcuradora de Justiça – Coordenadora
Samantha Karin MunizAssessora Jurídica
Maine Laís TokarskiEstagiária de Pós–Graduação
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Referências bibliográficas:
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de atividades econômicas. 3. ed. São Paulo: Lemos e Cruz, 2006.
DUARTE, Nestor. Código Civil Comentado Doutrina e Jurisprudência. 5 ed.,
São Paulo: Manole, 2011.
MAIELLO, Anna Luiza Duarte. Aspectos fundamentais do negócio jurídico
associativo. 233 f. Tese (Doutorado) – Curso de Direito, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em:
<http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2131/tde–27092012–
101632/fr.php>.
REIS, Lauro Celidônio Gomes dos. Sociedade, associação e fundação:
conceituação em face do direito positivo e da doutrina. Revista dos Tribunais
Online, Doutrinas Essenciais de Direito Civil, v. 3, p. 997–1002, out–2010.
SABO PAES, José Eduardo. Fundações, associações e entidades de
interesse social: aspectos jurídicos, administrativos, contábeis, trabalhistas e
tributários. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
TEPEDINO, Gustavo. As associações e o Código Civil. Revista dos Tribunais
Online, Soluções Práticas – Tepedino, v. 3, p. 79, nov–2011.
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