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ELIANA DA SILVA CRUZ
A NOO DE VARIVEL EM LIVROS DIDTICOS DE ENSINO FUNDAMENTAL: UM ESTUDO SOB A TICA DA
ORGANIZAO PRAXEOLGICA
MESTRADO EM EDUCAO MATEMTICA
PUC/SP So Paulo
2005
ELIANA DA SILVA CRUZ
A NOO DE VARIVEL EM LIVROS DIDTICOS DE ENSINO FUNDAMENTAL: UM ESTUDO SOB A TICA DA
ORGANIZAO PRAXEOLGICA
Dissertao apresentada Banca Examinadora da
Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo, como
exigncia parcial para obteno do ttulo de MESTRE
EM EDUCAO MATEMTICA, sob a orientao do
Prof. Dr. Saddo Ag Almouloud.
PUC/SP So Paulo
2005
ii
Banca Examinadora
________________________________________
________________________________________
________________________________________
iii
A MINHA FAMLIA
AO JUCA,
MEU BEM QUERER
iv
AGRADECIMENTOS
s pessoas que direta ou indiretamente auxiliaram na elaborao e
desenvolvimento deste trabalho.
Ao Prof Dr Saddo Ag Almouloud, pela orientao, pacincia e incentivo.
Prof Dr Silvia Dias de Alcntara Machado, pela ateno, comentrios e
sugestes.
Ao Prof Dr Antonio Carlos Brolezzi, pelos comentrios que tanto
contriburam com esse trabalho.
CAPES, pela bolsa que possibilitou o trmino desta pesquisa.
A todos os professores e funcionrios do Programa de Estudos Ps-
Graduados em Educao matemtica da PUC-SP.
Em especial a Prof Dr Ana Lcia Manrique por ter colaborado diretamente
na realizao desse trabalho.
Aos funcionrios da biblioteca, pela ateno e ajuda.
Aos colegas de graduao que sempre me incentivaram, Rosangela e
Pitgoras.
Aos colegas de mestrado, cuja unio sempre nos motivaram, em especial
as amigas Leila e Marisa.
Ao Rodrigo pela ajuda com os textos em ingls, Alda (abstract) e Edna pela
ajuda com os textos em francs.
A minha me (Nrcia), meu pai (Leonel), minha irm (Silvania) e meu irmo
(Leo), pela compreenso, dedicao, auxlio, e suporte.
Ao Jnior pela pacincia, apoio e compreenso pela falta de tempo.
Deus...
v
RESUMO
A presente dissertao teve por objetivo investigar como a noo de
varivel tem sido abordada pelos livros didticos brasileiros referentes aos 3 e 4
ciclos do Ensino Fundamental. O estudo se props a responder a seguinte
questo de pesquisa: Como os livros didticos abordam a noo de varivel sob
a tica da organizao praxeolgica de Chevallard?.
Para tanto, desenvolvemos uma anlise qualitativa e documental de quatro
colees de livros didticos de 5 8 srie do Ensino Fundamental.
Essa anlise foi desenvolvida tendo por base quatro aspectos que
consideramos de grande relevncia para o estudo exposto: primeiramente
analisamos de que modo os livros didticos vm incorporando as orientaes
dadas pelos PCNs visto que eles relatam estarem de acordo com essas
propostas; em seguida verificamos quais so as abordagem que os autores
utilizam para introduzir e desenvolver a lgebra e por ltimo analisar quais os
diferentes usos dados idia de varivel.
A pesquisa fundamentando-se na Teoria antropolgica do didtico de
Chevallard (1991), fazendo uso de uma adaptao da Organizao Praxeolgica
proposta pelo autor.
Procuramos identificar nos exerccios que atendem cada aspecto qual o
tipo de tarefa proposta, qual a maneira de cumprir essa tarefa, que a tcnica
envolvida, e qual o discurso terico-tecnolgico que esta por traz dessa tcnica.
Percebemos que embora os livros didticos tragam vrias concepes da
lgebra e venha trabalhando as variveis sob diferentes enfoques, ainda h a
predominncia de exerccios para aplicao de tcnicas.
Palavras-chave: lgebra varivel livros didticos organizao praxeolgia.
vi
ABSTRACT
The aim of this paper is to investigate how the notion of variable has been
considered in Brazilian schoolbooks directed to students from the 1st. to the 8th
educational degrees (usually from 7 to 15 years). The study intends to answer the
following research question: How schoolbooks bring up the notion of variable
having in view Chevallards praxis organization?
For this purpose, we developed a qualitative and documental analysis of
four schoolbooks collections from the 5th to the 8th educational degrees.
This analysis has been based on four aspects that we consider significant
for the exposed study: first, we analyzed the way the schoolbooks are
incorporating the orientation given by the National Curricular Parameters (PCNs),
since they reported that they are in accordance to these proposals; next, we
verified the authors approaches to introduce and develop Algebra and, finally, we
studied the different applications given to the idea of variable.
The research has been based on Chevallards Anthropological Theory
(1991), making use of an adaptation of the Praxis Organization proposed by the
author.
We have tried to identify, in the exercises that regard each aspect, which is
the type of the task proposed, which is the way to accomplish this task, which is
the technique involved and which is the theoretical-technologic argument behind
this technique.
We noticed that, though the schoolbooks present several Algebra
conceptions and have been considering variables under different approaches, the
predominance of the exercises for the application of the techniques still subsists.
Keywords: algebra variable schoolbooks praxis organization
vii
SUMRIO
APRESENTAO...................................................................................................1
CAPTULO I: Consideraes Preliminares.........................................................3
1.1 Desenvolvimento histrico da lgebra..........................................3
1.2 Anlise dos PCNs.........................................................................8
1.3 Reviso bibliogrfica...................................................................11
1.3.1 Nobre (1996).................................................................11
1.3.2 Oliveira (2004)...............................................................13
1.3.3 Modanez (2003)............................................................14
1.3.4 Berdnarz, Kieran e Lee (1996)......................................16
1.3.5 Wheeler (1996)..............................................................19
1.3.6 Usiskin (1994)............................................................20
CAPTULO II: Problemtica, Tericos e Procedimentos Metodolgicos..........23
2.1 Problemtica...............................................................................23
2.1.1 Definio de pesquisa...................................................27
2.2 Fundamentos Tericos...............................................................28
viii
2.2.1 A noo de Organizao Praxeolgica.........................28
2.3 Procedimentos Metodolgicos....................................................30
2.3.1 Anlise Documental......................................................30
2.3.2 A escolha dos Livros Didticos................................... .31
2.3.3 Aspectos para anlise dos Livros Didticos..................32
CAPTULO III: Anlise das colees de livros didticos..................................39
3.1 Coleo: A Conquista de Matemtica: a + nova.........................39
3.2 Coleo: Tudo Matemtica......................................................49
3.3 Coleo: Matemtica para Todos...............................................62
3.4 Coleo: Matemtica e Realidade..............................................72
CAPTULO IV: Concluso....................................................................................82
4.1 Introduo...................................................................................82
4.2 Sntese dos resultados...............................................................84
4.2.1 Aspecto 1......................................................................84
4.2.2 Aspecto 2......................................................................85
4.2.3 Aspecto 3......................................................................86
4.3 Respondendo nossa questo de pesquisa.................................86
4.4 Sugestes para futuras pesquisas..............................................90
ix
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...............................................91
x
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1: Livros Didticos de Matemtica para o Ensino Fundamental...........32
QUADRO 2: Comparao entre as concepes de lgebra, segundo Usiskin, e as
abordagens para o ensino de lgebra, de acordo com Berdnarz..........................36
QUADRO 3: Concepo de lgebra e com os diferentes usos das variveis.......37
xi
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1: Mquinas Programadas extrada do livro de DANTE. Tudo
Matemtica, v. 3, p. 112, 2002...............................................................................53
FIGURA 2: Tabela extrada do livro de DANTE. Tudo Matemtica, v. 2, p. 21,
2002.......................................................................................................................55
FIGURA 3: Tabela extrada do livro de DANTE. Tudo Matemtica, v. 4, p. 157,
2002.......................................................................................................................56
FIGURA 4: Tabela extrada do livro de DANTE. Tudo Matemtica, v. 4, p. 156,
2002.......................................................................................................................61
FIGURA 5: Seqncia de figuras extrada do livro de IMENES e LELLIS.
Matemtica para Todos, v. 2, p. 195, 2002............................................................66
FIGURA 6: Esquema para resolver problemas, figura extrada do livro de
GIOVANNI, CASTRUCCI e GIOVANNI JR. Matemtica e Realidade, v. 2, p. 178,
2000.......................................................................................................................74
1
APRESENTAO
O motivo inicial que nos levou a refletir e a levantar questionamentos sobre
a introduo noo de varivel provm de nossa prtica docente.
Aps alguns anos como professora de matemtica do Ensino Fundamental,
pudemos constatar que os alunos tm grandes dificuldades em trabalhar com a
lgebra, principalmente no que se refere a equaes e compreenso do
significado de variveis. Eles aprendem e manipulam equaes mecanicamente,
consistindo, em geral, no procedimento Muda de lado Muda de sinal, sem
qualquer entendimento.
Os alunos apresentam muitas dificuldades no que diz respeito aos
conceitos enfocados nas vrias formas de introduzir a lgebra: soluo de
equaes, manipulao de expresses algbricas, resoluo de problemas e
tratamento de conceitos fundamentais, como os de varivel.
A dificuldade encontrada pelos alunos na compreenso dos assuntos
estudados em lgebra pode estar relacionada, entre outros, ao modo como so
abordadas suas noes. Da por que, quando iniciamos o mestrado, nos
propusemos a estudar a noo de varivel.
Esta pesquisa est inserida no projeto O pensamento matemtico:
formao de ncleo de ensino-aprendizagem,1 e nosso objetivo realizar uma
anlise de livros didticos desenvolvida a partir de uma adaptao da
Organizao Praxeolgica proposta por Chevallard (1991).
Nos ltimos anos, surgiram muitas pesquisas visando diagnosticar as
causas das dificuldades apresentadas no processo de ensino e aprendizagem da
lgebra. Seqncias de ensino tm sido criadas e testadas na Educao
Matemtica, na tentativa de encontrar solues. Na regio que atuamos, assim
como em muitas outras, o livro didtico continua sendo amplamente utilizado por
alunos e professores, por isso desenvolvemos nossa pesquisa com um olhar
1 Referimo-nos ao projeto do grupo G4 da PUC/SP sob responsabilidade do professor doutor Saddo Ag Almouloud.
2
voltado para a anlise desses livros, buscando identificar os tipos de tarefas, as
tcnicas, as tecnologias e as teorias neles contidas.
Este trabalho est dividido em quatro captulos, descritos da seguinte
forma:
No captulo 1, realizamos um breve estudo histrico do desenvolvimento da
lgebra dando nfase noo de varivel, uma anlise dos PCNs apresentando
as propostas para o terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental e a reviso
bibliogrfica composta por pesquisas que dissertam sobre o tema.
O captulo 2 apresenta a problemtica, delimitando nossa questo de
pesquisa e as consideraes tericas de acordo a Teoria Antropolgica do
Didtico proposta por Chevallard (1991). Nesse captulo tambm so expostos os
procedimentos metodolgicos baseados em anlise qualitativa e documental e os
aspectos considerados para escolha e anlise dos livros didticos.
No captulo 3, iniciamos a anlise dos livros de Matemtica do terceiro e
quarto ciclos do Ensino Fundamental.
No captulo 4, so apresentadas as concluses e consideraes finais,
mediante a confrontao dos pontos positivos e negativos que foram observados
na anlise efetuada no captulo anterior.
3
CAPTULO I
CONSIDERAES PRELIMINARES
Este primeiro captulo tem como objetivos:
realizar um breve estudo histrico do desenvolvimento da lgebra, focalizando o desenvolvimento da noo de varivel, visto que uma
Matemtica viva em progresso, ou seja, em construo, surge aos
olhos dos alunos quando se recorre histria da Matemtica
(BROLEZZI, 2000, p. 36);
analisar os PCNs2 do terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental, por apresentarem, nas sries correspondentes a estes ciclos, propostas
de introduo noo de varivel, que pertence ao bloco Nmeros e
Operaes;
apresentar algumas leituras que dissertam sobre o tema, com suas reflexes, argumentaes e indagaes.
1.1 Breve histrico do desenvolvimento da lgebra
No pretendemos neste trabalho realizar uma anlise detalhada da noo
de varivel. O objetivo principal desta investigao apresentar alguns aspectos
da histria da lgebra, que julgamos serem pertinentes para alcanar a
compreenso da noo de varivel preconizadas nos PCNs.
Nestas notas histricas baseamo-nos principalmente na histria da
Matemtica de Boyer (1974) escrita em 1968, assim como a de Eves (1995)
escrita em 1964, que relatam a lgebra presente em diferentes culturas e em
diferentes perodos da histria da Matemtica.
2 Trata-se dos Parmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental, do CNE/MEC, texto legal aprovado e homologado em 1998.
4
De acordo com o dicionrio Houaiss (2001), lgebra parte da
Matemtica elementar que generaliza a aritmtica, introduzindo variveis que
representam os nmeros (...).
Originalmente, a palavra lgebra uma variante latina da palavra rabe al-jabr usada no ttulo do livro Al-jabr wal muqabalah, escrito em Bagd por volta do
ano 825 pelo matemtico rabe Mohammed ibn-Musa al Khowarizmi. O livro
tratava de equaes, e o ttulo referia-se idia de imaginar uma equao como
balana em equilbrio. Considerada um sistema para resolver problemas
matemticos que envolvam nmeros desconhecidos, a lgebra remonta
Antiguidade.
O mais famoso papiro egpcio sobre Matemtica o Papiro Rhind (ou
Ahmes) produzido por volta de 1650 a.C., um texto matemtico contendo 85
problemas da vida cotidiana e suas resolues.
Nele muitos desses problemas so do tipo aritmtico, mas pode-se
perceber que os egpcios resolviam problemas que hoje so designados como
problemas de pensamento algbrico.
De acordo com Boyer (1974), esses problemas no se referiam a objetos
concretos, especficos, nem exigiam operaes entre nmeros conhecidos.
Pediam o que equivale a solues de equaes lineares, da forma x + ax = b ou x
+ ax + b = c, em que a, b e c so conhecidos e x desconhecido.
Neste caso, x assume o papel de incgnita que era chamada por eles de
aha. Notamos aqui a presena de um certo simbolismo para incgnita.
O mtodo de resoluo utilizado pelos egpcios caracterstico de um
processo conhecido como mtodo da falsa posio. Um valor especfico
atribudo para aha, e as operaes indicadas esquerda do sinal de igualdade
so efetuadas sobre esse nmero suposto. O resultado comparado com o
resultado pretendido, usam-se propores at se chegar resposta correta.
Os babilnios empregavam, ainda, uma linguagem geomtrica, chamando
de lado a incgnita x. Percebemos uma preocupao com os nmeros e suas
aplicaes, tanto por parte dos babilnios quanto dos egpcios, havendo, assim,
uma tentativa de algebrizao, o que permite falar em uma lgebra de ambas as
civilizaes. No se sabe, ao certo, se essas civilizaes percebiam os princpios
unificadores da atividade que mais tarde viria a se chamar Matemtica, ou se a
generalizao passou despercebida.
5
Conforme Eves (1995), o desenvolvimento da notao algbrica evoluiu ao
longo de trs estgios. Primeiro a lgebra retrica (ou verbal) em que os
argumentos da resoluo de um problema so escritos sem abreviaes ou
smbolos especficos. A seguir, a lgebra sincopada, em que se adotam
abreviaes de palavras e, finalmente, a lgebra simblica, em que as resolues
se expressam numa espcie de taquigrafia matemtica formada de smbolos.
Tanto a lgebra do Egito como a da Babilnia eram retricas.
Uma tal diviso arbitrria do desenvolvimento da lgebra em trs estgios
naturalmente uma simplificao excessiva; mas serve como primeira
aproximao ao que aconteceu (BOYER, 1974, p. 132).
Na obra de Diofante de Alexandria,3 por volta de 250 d.C., foi encontrada
pela primeira vez a utilizao de smbolos algbricos, sinais especiais para a
incgnita, potncias da incgnita at expoente seis, subtrao, igualdade,
inversos, abreviaes e substituies.
Uma das principais contribuies de Diofante Matemtica foi a
sincopao da lgebra grega. A lgebra retrica continuou de maneira bastante
generalizada no resto do mundo, exceto na ndia, por muitas centenas de anos.
Na Europa Ocidental, a maior parte da lgebra permaneceu retrica at o
sculo XV e, embora a apario da lgebra simblica se desse na Europa
Ocidental no sculo XVI, somente pela metade do sculo XVII esse estilo acabou
se impondo.
China e ndia tambm contriburam para o desenvolvimento da lgebra,
trabalhando em procedimentos de resolues para equaes algbricas.
Os hindus foram hbeis aritmticos, sincoparam sua lgebra e deram
contribuies significativas a ela. Denotavam a incgnita por ya (de yavattaval, de
tanto quanto), as incgnitas adicionais eram indicadas pelas slabas iniciais de
palavras que expressavam diferentes cores, por exemplo, ka (de Kalaka para
preto).
Encontraram solues gerais de equaes quadrticas, inclusive duas
razes, mesmo quando uma delas era negativa, e deram todas as solues
inteiras da equao linear diofantina.
3 Diofante de Alexandria foi o maior algebrista grego, conhecido como pai da lgebra.
6
No entanto, a lgebra s comea a se constituir como um ramo especfico
da Matemtica no Renascimento, desenvolvendo-se plenamente na Europa
moderna e contempornea.
No incio da era moderna, os matemticos realizaram mudanas nas
notaes algbricas, passaram a usar letras para representar as incgnitas,
adotaram os smbolos + para adio, - para subtrao e o sinal = para igualar os termos de uma equao.
Franois Vite (1540-1603) foi um dos que mais se destacaram no perodo.
Adotou o uso de vogais para representar uma quantidade supostamente
desconhecida, ou indeterminada, e consoantes representando uma grandeza ou
nmero suposto conhecido ou dado. Pela primeira vez na histria, tem-se a
distino entre o importante conceito de parmetro e a idia de uma quantidade
desconhecida.
As anotaes atualmente utilizadas nas equaes algbricas, as letras do comeo do alfabeto para parmetros e as do fim como incgnitas, foram
estabelecidas por Ren Descartes, na primeira metade do sculo XVII. No
entanto, pensava-se em parmetro e incgnita como segmentos e no como nmeros.
Durante esse perodo originou-se o conceito de funo ou uma relao
entre variveis, ao longo da histria do desenvolvimento do estudo dos
movimentos.
Segundo Eves, Galileu Galilei (1564-1642) contribuiu para a evoluo do
conceito de funo ao utilizar instrumentos de medidas aprimorados em suas
experincias, expressando relaes funcionais em palavras e em linguagem de
proporo. Galileu estabeleceu a lei segundo a qual a distncia percorrida por
um corpo em queda livre proporcional ao quadrado do tempo de queda (EVES,
1995, p. 354).
A linguagem mostra que ele se refere a variveis e funes, e, com o
desenvolvimento do simbolismo algbrico nesta poca, Galileu estabelece este
relacionamento sob forma simblica: s = gt2/2.
Descartes instituiu uma relao de dependncia entre quantidades
variveis usando uma equao em x e y, possibilitando o clculo de valores de
uma varivel a partir dos valores da outra.
7
Para os gregos, uma varivel correspondia ao comprimento de um segmento, o produto de duas variveis rea de algum retngulo e o produto de trs variveis ao volume de algum paraleleppedo retngulo. Os gregos no iam alm disso. Para Descartes, por outro lado, x2 no sugeria uma rea, antes porm o quarto termo da proporo 1 : x = x : x2, suscetvel de ser representado por um segmento de reta fcil de construir quando se conhece x. Usando-se um segmento unitrio possvel, dessa maneira, representar qualquer potncia de uma varivel, ou um produto de variveis, por meio de um segmento de reta e ento, quando se atribuem valores a essas variveis, construir efetivamente o segmento de reta com os instrumentos euclidianos (EVES, 1995, p. 384).
As primeiras contribuies efetivas para a construo do conceito de
funo surgiram com os trabalhos de Newton (1642-1727) e Leibniz (1646-1716).
Introduziram as palavras: constantes, variveis e funo. Newton estabeleceu pela primeira vez um termo especfico para funo, ao
utilizar o nome de fluentes para representar algum relacionamento entre variveis.
Ele descreve suas idias de funo ligadas noo de curva e a taxas de
variao de quantidades que variam continuamente.
A uma quantidade varivel ele dava o nome de fluente (uma quantidade
que flui) e sua taxa de variao dava o nome de fluxo do fluente (EVES, 1995,
p. 439).
Leibniz introduziu a palavra funo ao se referir a qualquer quantidade
variando ponto a ponto de uma curva: as coordenadas de um ponto, a inclinao
e o raio de curvatura de uma curva.
Leibniz no responsvel pela moderna notao para funo, mas a ele
que se deve a palavra funo, praticamente no mesmo sentido em que usada
hoje (BOYER, 1974, p. 297).
A histria constitui um terreno fecundo para a anlise de alguns fatos que
possam colaborar para uma melhor compreenso desse conceito, porm, ao
realizarmos esse breve estudo histrico sobre o desenvolvimento da lgebra
buscando dar nfase ao desenvolvimento da noo de varivel, percebemos a
dificuldade em encontrar a origem de variveis na histria com preciso.
Constatamos que os babilnios e os gregos na Antiguidade j possuam
instintivamente uma noo de varivel por meio do uso de tabelas babilnicas
8
antigas. Mas mediante conceito de funo que percebemos a varivel como
uma quantidade cujo valor pode mudar.
Verificamos, assim como Berdnarz, Kieran e Lee (1996), que a histria da
lgebra rica em vrios aspectos, permitindo-nos apreciar melhor a
complexidade de conceitos algbricos e as rupturas que ocorrem durante sua
construo; por isso acreditamos que o estudo histrico pode contribuir para
motivar os alunos a observar o modo como se deu a evoluo das idias
matemticas, podendo ser utilizada como ponto de partida do aprendizado.
1.2 Anlise dos PCNs
No Brasil, assim como em outros pases, o ensino de Matemtica nas
dcadas de 1960/1970 sofreu uma grande influncia do Movimento da
Matemtica Moderna, veiculado principalmente pelos livros didticos. A proposta
era aproximar a Matemtica desenvolvida na escola da Matemtica dos
estudiosos e pesquisadores, enfatizando, entre outros, as estruturas algbricas.
No entanto, o que se propunha estava fora do alcance dos estudantes,
principalmente daqueles das sries iniciais do Ensino Fundamental.
Com o Movimento da Matemtica Moderna, as escolas foram foradas a
seguir rumo ao formalismo; os alunos deveriam ser fluentes em tcnicas
algbricas e rigorosos no uso delas. Durante esse longo perodo, houve
preocupaes excessivas com formalizaes, distanciando o ensino das questes
prticas.
Na dcada de 1980, o foco foi a resoluo de problemas, passando a
Matemtica a ser explorada a partir de problemas do cotidiano e encontrados nas
vrias disciplinas. Esse fato ocasiona, ainda hoje, um mal-entendido, na medida
em que, ao se trabalhar apenas com o que supostamente faz parte do dia-a-dia
do aluno, muitos contedos importantes so descartados por no estarem
presentes na realidade do aluno, ou por no terem uma aplicao imediata em
sua vida.
Atualmente, a proposta do currculo de Matemtica para o Ensino
Fundamental, segundo os PCNs, de contemplar o estudo dos Nmeros e das
Operaes no campo da Aritmtica e da lgebra, o estudo do Espao e das
9
Formas no campo da Geometria, e o estudo das Grandezas e das Medidas,
permitindo interligaes entre os campos da Aritmtica, da lgebra e da
Geometria, e de outros campos do conhecimento.
O bloco de Nmeros e Operaes prope que:
Pela explorao de situaes-problema, o aluno reconhecer diferentes funes da lgebra (generalizar padres aritmticos, estabelecer relao entre duas grandezas, modelizar, resolver problemas aritmeticamente difceis), representar problemas por meio de equaes e inequaes (diferenciando parmetros, variveis, incgnitas, tomando contato com frmulas), compreender a sintaxe (regras para resoluo) de uma equao (PCNs, 1998, p. 50).
Um dos objetivos da Matemtica para o terceiro ciclo desenvolver o
pensamento algbrico por meio da explorao de situaes de aprendizagem que
levem o aluno a:
- reconhecer que representaes algbricas permitem
expressar generalizaes sobre propriedades das operaes aritmticas, traduzir situaes-problema e favorecer as possveis solues;
- traduzir informaes contidas em tabelas e grficos em linguagem algbrica e vice-versa, generalizando regularidades e identificar os significados das letras;
- utilizar os conhecimentos sobre as operaes numricas e suas propriedades para construir estratgias de clculo algbrico (PCNs, 1998, p. 64).
No necessrio desenvolver, neste terceiro ciclo, um trabalho
aprofundado das operaes com as expresses algbricas e as equaes;
suficiente que os alunos compreendam a noo de varivel e reconheam a
expresso algbrica como uma forma de traduzir a relao existente entre a
variao de duas grandezas. As noes algbricas podem, ainda, ser exploradas
por meio de jogos, generalizaes matemticas, e no por procedimentos
puramente mecnicos.
De acordo com os PCNs:
provvel que ao explorar situaes-problema que envolvam variao de grandezas o aluno depare com equaes, o que possibilita interpretar a letra como incgnita. Neste caso, o que se recomenda que os alunos sejam estimulados a construir
10
procedimentos diversos para resolv-las, deixando as tcnicas convencionais para um estudo mais detalhado no quarto ciclo (1998, p. 68).
Sendo assim, no quarto ciclo, um dos propsitos do ensino da Matemtica
desenvolver o pensamento algbrico por meio da explorao de situaes de
aprendizagem que levem o aluno a:
- produzir e interpretar diferentes escritas algbricas
expresses, igualdades e desigualdades , identificando as equaes, inequaes e sistemas;
- resolver situaes-problema por meio de equaes e inequaes do primeiro grau, compreendendo os procedimentos envolvidos;
- observar regularidades e estabelecer leis matemticas que expressem a relao de dependncia entre variveis (1998, p. 81).
Como j foi feito, no terceiro ciclo, um estudo preliminar abordando
determinadas situaes que envolvem noes de lgebra, este ser o ponto de
partida para o quarto ciclo, trabalhando com problemas que permitam ao aluno
dar significado linguagem e s idias matemticas.
Ainda de acordo com os PCNs, no quarto ciclo, ento, o aluno poder
reconhecer diferentes funes da lgebra, trabalhando com situaes-problema
bastante diversificadas.
[...] no trabalho com a lgebra fundamental a compreenso de conceitos como o de varivel e de funo; a representao de fenmenos na forma algbrica e na forma grfica; a formulao e a resoluo de problemas por meio de equaes (ao identificar parmetros, incgnitas, variveis) e o conhecimento da sintaxe (regra para resoluo de uma equao) [...] (1998, p. 84).
Segundo os PCNs, os resultados do SAEB apontam que os itens
referentes lgebra raramente atingem o ndice de 40% de acerto em muitas
regies do pas (1998, p. 116).
Tendo em vista que o ensino e a aprendizagem da lgebra apresentam
dificuldades na vida escolar dos alunos, a proposta dos PCNs para o quarto ciclo
desenvolver o pensamento algbrico por meio da explorao de situaes de
aprendizagem que levem o aluno a compreender os procedimentos envolvidos, e
no o exerccio mecnico do clculo.
11
importante destacar que as situaes de aprendizagem precisam estar centradas na construo de significados, na elaborao de estratgias e na resoluo de problemas em que o aluno desenvolve processos importantes como intuio, analogia, induo e deduo, e no atividades voltadas para a memorizao, desprovidas de compreenso ou de um trabalho que privilegie uma formalizao precoce dos conceitos (PCNs, 1998, p. 63).
Para isso, necessrio que o aluno esteja envolvido em atividades que
inter-relacionem as diferentes concepes da lgebra, como Aritmtica
Generalizada, Funcional, Equaes e Estrutural, e de diferentes funes das
letras, como generalizao de modelo aritmtico, variveis para expressar
relaes e funes, incgnitas e como smbolo abstrato.
O fato que os professores acabam por no desenvolverem todos esses
aspectos da lgebra no Ensino Fundamental, privilegiando o estudo do clculo
algbrico e das equaes que, embora necessrios, no so suficientes para a
aprendizagem desses contedos.
1.3 Reviso bibliogrfica
Nossa inteno, nesse momento, descrever alguns estudos que possuem
a interligao com nossa pesquisa. Contemplamos algumas das pesquisas
existentes nesta rea como NOBRE (1996), OLIVEIRA (2004) e MODANEZ
(2003); e trs trabalhos internacionais referentes s concepes de lgebra,
BERDNARZ, KIERAN e LEE (1996), WHEELER (1996) e USISKIN (1994).
1.3.1 NOBRE (1996) Nobre realizou sua pesquisa com quatro alunos estudo de caso de uma
sexta srie, de uma escola pblica do Estado de So Paulo. Os alunos escolhidos
ainda no haviam iniciado o seu estudo da lgebra e o trabalho foi desenvolvido
em duplas.
A autora parte da hiptese de que o aluno, ao ter a oportunidade de criar
seu prprio cdigo e aprimor-lo, no sentido de aproxim-lo da linguagem
12
algbrica formal, dar mais sentido ao uso das letras e isso facilitar sua
aprendizagem inicial da lgebra. O objetivo desse trabalho estudar se o aluno,
em uma situao de comunicao, capaz de criar um cdigo e adapt-lo
paulatinamente notao algbrica usual (NOBRE, 1996, p. 38).
Assim a autora optou por uma pesquisa qualitativa, que permite observar e
registrar como o aluno, ao descrever a resoluo de um problema aritmtico, cria
e desenvolve um cdigo para generalizar a resoluo de problemas anlogos.
Nesse tipo de atividade, o aluno tem a oportunidade de dar sentido s
letras mediante a soluo geral de um problema que ser formulada e
comunicada aos demais elementos do grupo, os quais estaro resolvendo
problemas com o mesmo enunciado, mas com dados numricos diferentes.
As duplas trabalharam na elaborao/leitura de mensagens, e a mensagem
elaborada por uma dupla de alunos sobre a resoluo de um problema aritmtico
enviada a outra dupla, que ir decodific-la, a fim de resolver um problema
semelhante quele solucionado pela dupla emissora.
Este processo consta de trs partes: na primeira, enquanto uma das duplas
resolve um problema, a outra dupla aguarda em outro local. Este problema,
escolhido dentre os habituais de 4 e 5 sries, apresenta dificuldade moderada,
para que seja resolvido e, ao mesmo tempo, possa trazer oportunidade de
discusso.
Aps a resoluo, a dupla instruda para que, por meio de uma
mensagem, ajude a outra dupla a resolver um problema semelhante, mas com
outros dados numricos. Este procedimento pressupe que as instrues na
mensagem sejam precisas e formuladas de um modo geral.
Na segunda parte, a dupla que elaborou a mensagem sai da sala, cedendo
o espao outra, que entra para resolver um problema anlogo ao anterior, mas
com outros dados numricos, utilizando a mensagem deixada pela primeira dupla.
O objetivo da terceira parte a reelaborao da mensagem enviada por
uma das duplas que , ento, feita pela outra dupla ou pelas duas duplas em
conjunto, para que haja uma reflexo do grupo a respeito das mensagens
elaboradas, ou seja, um compartilhar dos avanos obtidos, levando, assim,
melhoria desta mensagem.
13
A autora conclui que os resultados com o trabalho de elaborao/leitura de
cdigos foram significativos, assim constituindo um instrumento facilitador ao
desenvolvimento do ensino inicial da lgebra.
Sustenta a pretenso de utilizar esse processo de codificao e
decodificao de mensagens em salas de aula comuns para reafirmar sua
utilidade. Est idia foi concretizada na pesquisa de Oliveira (2004), que
descreveremos a seguir.
1.3.2 OLIVEIRA (2004) A pesquisa de Oliveira tem como ponto de partida os resultados da
pesquisa de Nobre, a qual acabamos de comentar, e objetiva estudar a aquisio
e o desenvolvimento inicial de significados para a linguagem algbrica em alunos
da 6 srie do Ensino Fundamental II (OLIVEIRA, 2004, p. 6).
A autora assume a hiptese que o jogo codificao-decodificao de
situaes-problema auxilia na constituio de significados para a linguagem
algbrica.
A pesquisa realizada em uma sala de aula comum, como sugere Nobre,
com aproximadamente 35 alunos trabalhando em duplas.
Uma dupla recebe a tarefa de codificar um problema aritmtico elaborando
uma mensagem para que outra dupla a decodifique e utilize na resoluo de um
problema semelhante, mas com dados numricos diferentes.
Portanto, a pesquisa consta de duas fases: na primeira, o trabalho com o
jogo codificao-decodificao; na segunda, o desenvolvimento de atividades que
estabelecessem relaes entre os cdigos elaborados durante o jogo e as
equaes do 1 grau com uma incgnita.
O trabalho foi realizado com duas 6 sries do Ensino Fundamental de uma
escola pblica de So Paulo. A primeira, constituindo o grupo experimental (GE)
em que se desenvolveu a interveno de ensino; a segunda, o grupo de controle
(GC) que recebeu instrues sobre o contedo com a professora da classe, sem
a presena dos pesquisadores. Essas turmas passaram por um pr-teste, um
teste intermedirio e um ps-teste.
Passados por essas fases, a autora analisa os resultados verificando que
ambos os grupos obtiveram baixo desempenho tanto no pr-teste como no teste
14
intermedirio, porm no ps-teste o grupo experimental, o qual vinha tendo
interveno dos pesquisadores, mostrou melhor desempenho.
Oliveira conclui que o jogo por si s no d conta da construo de
significados para a linguagem algbrica, por outro lado o ensino formal, como
apresentado na maioria das escolas, est muito mais distante desse propsito.
Entretanto, o trabalho no qual o aluno tinha de codificar objetos com letras
fez com que essa letra passasse a ter significado como incgnita para uma
determinada situao, entendendo a lgebra como uma ferramenta para
modelagem e resoluo de problemas. Assim, observando a lgebra sob esse
ponto de vista, de que uma ferramenta para resolver situaes-problema e
modelar situaes, os alunos do GE trabalharam com isso efetivamente ao
criarem seus prprios cdigos, ento os Xs e os Ys ganharam significados
(OLIVEIRA, 2004, p. 139).
1.3.3 MODANEZ (2003) A pesquisa foi realizada com 30 alunos de uma 6 srie do Ensino
Fundamental de uma escola municipal da Grande So Paulo. Objetivando
verificar se a introduo ao pensamento algbrico, por meio de seqncias de
padres geomtricos, favorece a superao das principais dificuldades
apresentadas pelos alunos que iniciam o estudo em lgebra (MODANEZ, 2003,
p. 30).
A proposta da autora que a letra surja primeiro como varivel, a fim de
fazer desenvolver o raciocnio do aluno para resolver cada problema apresentado;
assim, quando a letra j estiver bem trabalhada e entendida, poder ento, num
outro contexto, ser empregada como incgnita.
A autora baseou-se nas seguintes hipteses:
- engajar o aluno em atividades que inter-relacionem diferentes
aspectos da lgebra como resoluo de problemas, e no s para encontrar o valor numrico de uma expresso algbrica ou atividades meramente mecnicas;
- propor situaes em que o aluno possa investigar padres, tanto em sucesses numricas como em representaes geomtricas, identificando suas estruturas para que possa descrev-los simbolicamente;
15
- propor situaes que levem o aluno a construir noes algbricas pela observao de regularidades, e no somente manipulaes mecnicas de expresses algbricas (MODANEZ, 2003, p. 32).
Para isso elaborou uma seqncia didtica com oito atividades
experimentais em que os alunos trabalharam em duplas, em situaes que
deveriam discutir, elaborar conjecturas e justificar as respostas encontradas.
Essas atividades tiveram como objetivo provocar a mudana de quadros,
do geomtrico para o algbrico, com a inteno de permitir ao aluno a construo
de conceito de varivel.
Durante a aplicao da seqncia didtica, a professora interrogou cada
dupla sobre as respostas dadas a fim de perceber se os alunos estavam
entendendo o significado destas.
Aps a aplicao de cada atividade a professora fazia a correo da
mesma considerando as diferentes respostas dadas pelos alunos.
Nas atividades 1 e 2 os alunos tiveram apenas um primeiro contato com as
seqncias geomtricas, no tendo havido ainda a necessidade do uso de letras
representando as variveis.
Nas atividades 3, 4 e 5 houve a necessidade do uso de letras como um
smbolo para representar uma posio qualquer na seqncia.
Na atividade 8 o aluno ficou livre para criar uma seqncia qualquer de
figuras, testando assim seus conhecimentos e habilidades.
Mediante a anlise dos resultados a autora pde constatar a validade das
hipteses aqui mencionadas e concluir que nessas condies uma seqncia de
ensino por meio de padres geomtricos pode proporcionar ao aluno a introduo
do pensamento algbrico.
Considerando ainda que os alunos avanaram em seus conhecimentos em
relao ao desenvolvimento do pensamento algbrico, bem como em suas
atitudes e autonomia no sentido de observar, levantar hipteses, tirar concluses
e justificar suas respostas.
Consideramos as pesquisas de Nobre (1996), Oliveira (2004) e Modanez
(2003) importantes para auxiliar na construo de significados para a linguagem
16
simblica algbrica que por muitas vezes se mostra sem sentido algum para os
alunos que apenas a utilizam mecanicamente.
As autoras levantam em seus estudos algumas das dificuldades das
crianas que iniciam em lgebra, entre elas, a atribuio de significados
concretos s letras e a dificuldade de interpretao da varivel. Dada essas
dificuldades, refora nossa idia de analisar como vem sendo trabalhada a noo
de variveis aos alunos do Ensino Fundamental via livros didticos.
1.3.4 BERDNARZ, KIERAN e LEE (1996) Berdnarz, Kieran e Lee afirmam que a introduo da lgebra pode tomar
diferentes direes como:
1 das regras para transformar e resolver equaes (no qual o ensino atual reduz muitas vezes a lgebra); 2 da soluo de problemas especficos ou classes de problemas (que teve historicamente um papel importante no desenvolvimento da lgebra e seu ensino); 3 da generalizao de leis que regem os nmeros (um foco muito importante em certos currculos); 4 da introduo de conceitos de varivel e de funo (que apareceu historicamente bem mais tarde e que tem ocupado uma posio de importncia crescente em alguns programas) e 5 do estudo das estruturas algbricas (que marcou os currculos escolares nos anos 60 sob a influncia da matemtica moderna) (BERDNARZ, KIERAN, LEE, 1996, p. 3).4
Dentre as dificuldades dos alunos em trabalhar os conceitos focados nas
vrias formas de introduzir a lgebra, as autoras destacam a soluo de
equaes, manipulao de expresses algbricas, resoluo de problemas e o
tratamento de conceitos fundamentais como o de varivel.
Assim, Berdnarz, Kieran e Lee (1996) apresentam uma seleo de estudos
que examinam a emergncia e o desenvolvimento da lgebra sob diferentes
perspectivas.
4 The rules for transforming and solving equations (to which current teaching often reduces algebra), the solving of specific problems or classes of problems (which has played an important role historically in the development of algebra and its teaching), the generalization of laws governing numbers (a very strong focus in certain curricula), the more recent introduction of the concepts of variable and function (which appeared much later historically and which occupy a position of growing importance in some programs), and the study of algebraic structures (which marked the school curriculum in the 1960s under the influence of modem mathematics).
17
Perspectivas histricas no desenvolvimento da lgebra A anlise histrica nos permite entender melhor os avanos, oposies e
retrocessos na evoluo de um sistema de conhecimento. A histria da lgebra
rica em vrios aspectos, por exemplo, permitindo melhor apreciar a complexidade
de conceitos algbricos e as rupturas que ocorrem durante sua construo.
Os autores lanam um olhar sobre a evoluo histrica da lgebra,
tornando explcitas algumas das idias-chave no desenvolvimento da lgebra, e
fornecendo indicaes de mudanas que marcaram a transio de um modo de
pensamento algbrico.
Perspectiva da generalizao na introduo da lgebra Atualmente, vm ocorrendo diversas tentativas de introduzir a lgebra por
meio de atividades de generalizao, porm os alunos em contato com essa
abordagem se deparam com algumas dificuldades.
Neste caso, segundo as autoras, a idia encontrar uma abordagem
pedaggica que estruture esse processo, como o caso do trabalho com
manipulao de figuras contendo o processo de generalizao, guiando o aluno
ao encontro de um padro que leve diretamente a uma frmula.
Para citar como exemplo, um dos maiores problemas num experimento
envolvendo adultos no era enxergar um padro, mas encontrar um padro
algebricamente til. A fixao num padro irrelevante ou intil pode vir a ser um
obstculo para os alunos na elaborao de frmulas relevantes, para um
procedimento geral ou uma relao entre quantidades. Com isso, o papel do
professor aumenta, pois ele chamado a administrar esta situao pedaggica;
neste caso, ter uma certa flexibilidade parece ser o ponto de partida para esse
processo de generalizao.
O processo de generalizao tambm depende dos elementos que sero
objetos dessa generalizao, ou seja, depende do conhecimento e das intenes
do observador.
Perspectiva da resoluo de problemas na introduo da lgebra Ainda segundo Berdnarz, Kieran e Lee, no se pode negar o importante
papel da resoluo de problemas no desenvolvimento da lgebra. A diversidade
das palavras usadas para denotar um problema e seus usos na teoria indica uma
18
variedade de concepes subjacentes. Essas concepes atingem desde uma
simples soluo especfica, exigindo uma certa habilidade, a uma soluo mais
geral, para a qual o conjunto de regras usadas e problemas a serem resolvidos
so expandidos.
Tambm importante observar os diversos tipos de raciocnio e estratgias
dos alunos e incorpor-los como ponto de partida necessrio para a
aprendizagem de mtodos sistemticos e gerais da resoluo de problemas.
Associam-se ainda as abordagens de resoluo de problemas com as
interaes entre a formulao de equaes e suas manipulaes no processo de
resoluo.
Perspectiva de modelagem na introduo da lgebra O processo de modelagem sobre uma certa verbalizao que d
significado ao simbolismo que est centrado sobre o real ou aes imaginrias. O
ponto principal no processo de modelagem a fase da formulao que resulta em
criar modelos com base nas hipteses.
A modelagem est baseada no significado que os estudantes do para
representaes simblicas, nas vrias notaes e nos caminhos que eles criam
para usar um modelo matemtico.
Perspectiva funcional na introduo da lgebra Com a chegada dos computadores e o desenvolvimento tecnolgico, o
conceito de varivel e funo est cada vez mais presente em certas abordagens
usadas para introduzir lgebra.
A abordagem funcional semelhante abordagem de modelagem que
est focada sobre uma elaborao e interpretao de certos modelos
matemticos, aqueles que relacionam as situaes reais particulares; entretanto,
difere, em seu foco, na introduo de famlias particulares das funes, ao
contrrio da abordagem de modelagem que mais aberta em sua escolha de
problemas e de modelos.
Essa abordagem sugere um estudo da lgebra centrado em desenvolver
experincias com funes e famlias de funes, por meio de contatos com
situao do mundo real.
19
1.3.5 WHEELER (1996) Wheeler (1996) contribui com algumas reflexes sobre as diferentes
abordagens da lgebra, defendendo lgebra para todos, o que significa que
cada um deve ter uma verdadeira chance de ser introduzido no que ele chama de
cultura da lgebra. Preocupa-se por no saber como fazer para alcanar essa
oportunidade, afirmando ser um trabalho extremamente difcil a se desenvolver.
Questiona o que seria a lgebra, sustentando haver uma certa dificuldade
em encontrar uma definio que mantenha sua essncia. A lgebra um sistema
simblico, lgebra so os clculos, lgebra um sistema representacional;
porm, ela mais que tudo isso. O principal problema pedaggico no ensino da
lgebra encontrar uma razo convincente para a importncia do seu estudo.
O autor observa cada uma das cinco perspectivas, evidenciadas
anteriormente por Berdnarz, Kieran e Lee, para iniciar a lgebra, tentando
perceber como o principiante ser motivado usando estas abordagens. Assevera
que, na verdade, o que temos diante de ns so cinco escolhas, alternativas no
independentes, e o que queremos so estudantes de lgebra que venham a
conhec-la e us-la para solucionar problemas, para modelar situaes, tratar de
funes e fazer generalizaes.
Ao escolher uma nica abordagem como ponto de partida, estaremos
interferindo na forma como as outras abordagens podero ser alcanadas. Cada
abordagem representa, ainda, um leque de possibilidades, sendo ainda possvel
que outras abordagens tenham sido omitidas.
Berdnarz, Kieran e Lee (1996) realizam um estudo que trata da lgebra
sendo introduzida por diferentes abordagens e, dependendo de cada abordagem,
teremos um uso para variveis. Wheeler (1996) acredita que ao escolher uma
abordagem para introduzir a lgebra estaremos interferindo na maneira de
trabalhar com as outras abordagens.
Assim, ser importante ao analisarmos os livros didticos observar sob
qual abordagem est se dando a introduo do pensamento algbrico.
20
1.3.6 USISKIN (1994) Usiskin, em seu trabalho, defende que as finalidades do ensino de lgebra,
as concepes que se possam ter dessa matria e a utilizao de variveis esto
intrinsecamente relacionadas. As finalidades da lgebra so determinadas por,
ou relacionam-se com, concepes diferentes da lgebra que correspondem
diferente importncia relativa dada aos diversos usos das variveis (USISKIN,
1994, p. 13).
Ela faz uma exposio da sua considerao sobre as quatro concepes
da lgebra:
- A lgebra como aritmtica generalizada.
As variveis so generalizadoras de modelos e as instrues-chave para o
aluno so: traduzir e generalizar. Essa concepo trata de tcnicas importantes
no s para a lgebra, mas tambm para a Aritmtica. impossvel estudar
Aritmtica, adequadamente, sem lidar implcita ou explicitamente com variveis.
Segundo o autor, muitas vezes encontramos relaes entre nmeros que
desejamos descrever matematicamente, e as variveis so instrumentos muito
teis nessa descrio. A descrio algbrica assemelha-se descrio numrica.
- A lgebra como um estudo de procedimentos para resolver certos tipos
de problemas.
Nessa concepo, as variveis so incgnitas ou constantes, isto ,
valores numricos desconhecidos que so descobertos pela resoluo de uma
equao ou de um sistema de equaes. As instrues-chaves, nesse caso, so
simplificar e resolver. Usiskin (1994) utiliza um problema para exemplificar:
Adicionando 3 ao quntuplo de um certo nmero, a soma 40. Achar o nmero.
O autor diz que facilmente se traduz o problema para a linguagem da lgebra: 5x
+ 3 = 40, encontrando um modelo geral que utiliza a lgebra como generalizadora
de modelos. Para resolver essa equao, usamos o procedimento de somar -3 a
ambos os membros. Ao solucionar problemas desse tipo, muitos alunos tm
dificuldades na passagem da Aritmtica para a lgebra. Enquanto a resoluo
aritmtica (de cabea) consiste em subtrair 3 e dividir por 5, a forma algbrica 5x
+ 3 envolve a multiplicao por 5 e a adio de 3, ou seja, as operaes inversas
das citadas na resoluo de cabea. Isto , para armar a equao, devemos
21
raciocinar exatamente da maneira contrria que empregaramos para resolver o
problema aritmeticamente (USISKIN, 1994, p. 15).
- A lgebra como estudo de relaes entre grandezas.
Uma varivel um argumento, isto , representa um dos valores do
domnio de uma funo, ou um parmetro, representando um nmero do qual
dependem outros nmeros. Somente no contexto dessa concepo existem as
noes de varivel independente e varivel dependente. As funes surgem
quase imediatamente, pois necessitamos de um nome para os valores que
dependem do argumento ou parmetro x. Trata-se, aqui, de um modelo
fundamentalmente algbrico e a diferena crucial entre a lgebra como estudo de
relaes entre grandezas e a lgebra como um estudo de procedimentos para
resolver certos tipos de problemas est em que, no primeiro caso, as variveis
variam.
Por exemplo, quando se pergunta ao aluno: O que ocorre com o valor de
1/x quando x se torna cada vez maior? A questo confunde o aluno, pois no
pedimos o valor de x, portanto x no uma incgnita, e tambm no pedimos ao
aluno que traduza. H um modelo a ser generalizado, mas no se trata de um
modelo aritmtico (USISKIN, 1994).
- A lgebra como estudo das estruturas
A concepo de varivel, nesse caso, no coincide com nenhuma daquelas
discutidas anteriormente e, quando se faz uso dessa concepo, o aluno tende a
tratar as variveis como sinais no papel, sem nenhuma referncia numrica
(USISKIN, 1994, p. 18).
A lgebra pode ser vista como o estudo das estruturas pelas propriedades
que atribumos s operaes com nmeros reais e polinmios. Nessa concepo,
a varivel um pouco mais que um smbolo arbitrrio.
Segundo Usiskin (1994), o conceito de varivel central no
desenvolvimento do pensamento algbrico. Na ltima dcada, as ferramentas
computacionais forneceram s escolas o acesso nunca antes conseguido de
representar esse conceito como quantidades variveis; no entanto, no s esta
caracterstica que importante, mas observar tambm os efeitos sobre outras
variveis, ou seja, estudar as suas funes.
22
O autor conclui que as diferentes concepes da lgebra relacionam-se
com os usos distintos das variveis e que a lgebra a chave para a
caracterizao e compreenso das estruturas matemticas.
Neste trabalho, Usiskin nos apresenta a lgebra a partir de diferentes concepes que se relacionam com maneiras outras de utilizar as variveis,
chamando, assim, nossa ateno para verificar em nossa anlise se os livros
didticos trazem os vrios usos da varivel.
23
CAPTULO II
PROBLEMTICA, FUNDAMENTOS TERICOS E PROCEDIMENTOS METODOLGICOS
Neste segundo captulo, apresentaremos a motivao e a relevncia da
pesquisa. Para auxiliar o estudo, buscamos apoio na Teoria Antropolgica do
Didtico proposta por Chevallard (1991).
Em seguida, destacamos os procedimentos metodolgicos envolvidos
nessa pesquisa, em que utilizamos como referncia a metodologia qualitativa e
documental. Apresentamos, ainda, a escolha dos livros didticos e os aspectos
considerados para sua anlise.
2.1 Problemtica Dada a nossa experincia em sala de aula, percebemos as dificuldades
dos alunos em relao aos conceitos abordados nas diferentes formas de
introduzir a lgebra.
Assim, uma outra maneira de estudar o processo de ensino e
aprendizagem da lgebra identificar os tipos de erros que os alunos comumente
cometem nessa matria e investigar as razes desses erros.
Booth (1994) realizou um estudo com alunos de 13 a 16 anos e verificou
erros semelhantes em todos eles, mostrando que muitos destes podiam ter
origem nas idias dos alunos sobre aspectos como, entre outros, o significado
das letras e das variveis.
Observou que uma das diferenas mais marcantes entre a Aritmtica e a
lgebra a utilizao, nessa ltima, de letras para indicar valores. Em Aritmtica,
as letras tambm aparecem, mas de forma diferente. Por exemplo, a letra m, em
24
Aritmtica, pode ser utilizada para representar metros, mas no para representar
o nmero de metros, como em lgebra.
Um dos aspectos inerentes da lgebra talvez seja a prpria idia de
varivel. Mesmo quando as crianas interpretam as letras distintas, devem
necessariamente representar valores numricos diferentes.
De uma maneira geral, as pesquisas apontam problemas no ensino da
lgebra, trazendo tona as dificuldades de certas noes ou interpretaes que
os estudantes desenvolvem em relao ao uso das letras, notao, escrita, s
convenes associadas com certos conceitos e ao carter da Matemtica, que
fazem parte do incio da aprendizagem da lgebra.
A noo de varivel, de modo geral, no tem sido explorada no ensino fundamental e por isso muitos estudantes que concluem esse grau de ensino (e tambm o mdio) pensam que a letra em uma sentena algbrica serve sempre para indicar (ou encobrir) um valor desconhecido, ou seja, para eles a letra sempre significa uma incgnita (PCNs, 1998, p. 118).
De acordo com Kieran (1989), a lgebra na escola secundria
normalmente comea com instrues do conceito de varivel. As crianas j
viram as letras sendo empregadas em frmulas, como a rea de um retngulo;
porm, em suas experincias passadas, elas no se relacionaram com os
diversos usos da varivel.
Usiskin (1994) descreve alguns desses muitos usos da varivel afirmando
que, se considerarmos a lgebra como aritmtica generalizada, ento podemos
ter as variveis como generalizadoras de padro; por exemplo, generalizando 3 +
5 = 5 + 3 ao padro a + b = b + a, as habilidades algbricas esto centradas em
traduzir e generalizar relaes conhecidas entre nmeros. Se considerarmos a
lgebra como o estudo de procedimentos para resolver certos tipos de
problemas, ento teremos as variveis como valores desconhecidos; por
exemplo, traduzindo um problema em uma equao, as habilidades algbricas
esto centradas em simplificar e resolver. Se considerarmos a lgebra como o
estudo entre relaes ou entre quantidades, as variveis sero argumentos ou
parmetros. Nesta concepo da lgebra, variveis variam verdadeiramente.
Finalmente, se considerarmos a lgebra como o estudo de estruturas como
grupos, anis, domnios de integridades, corpos, e espao vetorial, ento,
25
variveis so objetos arbitrrios numa estrutura relacionada por certas
propriedades.
, ainda, Usiskin que tenta descrever o que a lgebra na escola mdia, e
a princpio poderia dizer que tem relao com a compreenso do significado das
letras e das operaes com elas, mas logo percebe que a reduo da lgebra
ao estudo das variveis no d conta dessa descrio.
O problema surge em identificar quando uma letra representa uma varivel,
ou no. Comea por considerar algumas equaes, todas com a mesma forma
o produto de dois nmeros igual a um terceiro e observa que cada uma delas
tem um carter diferente.
Segundo o autor, esses caracteres refletem os diferentes usos dados
idia de varivel. No primeiro caso, A = b. h, com carter de frmula, em que A
representa a rea, b a base e h a altura, e tm carter de coisa conhecida. No
segundo caso, 40 = 50x, com carter de equao (ou sentena aberta), em que
pensamos em x como uma incgnita. No terceiro caso, senx = cosx. tgx, com
carter de identidade, sendo x o argumento de uma funo. No quarto caso, 1 =
n.(1/n), com carter de propriedade, generaliza um modelo aritmtico e n
identifica um exemplo do modelo. No quinto caso, y = kx, com carter de equao
de uma funo que traduz uma proporcionalidade direta, x tambm o argumento
de uma funo, y o valor e k uma constante; somente aqui h o carter de
variabilidade, do que resulta o termo varivel.
Na dcada de 1950, a palavra varivel era descrita por Hart como um
nmero mutvel, e que, em cada frmula, as letras representam nmeros. O uso
de letras para representar nmeros a principal caracterstica da lgebra (HART
apud USISKIN, 1994, p. 10).
As concepes de varivel foram mudando com o tempo, e o prprio Hart,
mais tarde, faz uma afirmao mais formal de varivel: Uma varivel um
nmero literal que pode assumir dois ou mais valores durante uma determinada
discusso (apud USISKIN, 1994, p. 10).
Ainda na dcada de 1950, Caraa define o conceito de varivel.
Seja (E) um conjunto qualquer de nmeros, conjunto finito ou infinito, e convencionemos representar qualquer dos seus elementos por um smbolo, por ex: x. A este smbolo,
26
representativo de qualquer dos elementos do conjunto E, chamamos varivel (1951, p. 127).
Para ele, portanto, uma varivel o que for determinado pelo conjunto
numrico que ela representa.
No final da dcada, surgiram novas e diferentes concepes como a de
May e Van Engen (apud USISKIN, 1994, p. 10):
Uma varivel, grosso modo, um smbolo pelo qual se substituem os nomes de alguns objetos, comumente nmeros, em lgebra. Uma varivel est sempre associada a um conjunto de objetos cujos nomes podem ser substitudos por ela. Esses objetos chamam-se valores da varivel.
Segundo Usiskin (1994), na dcada de 1990, a tendncia era evitar a
distino nome-objeto e pensar numa varivel como um smbolo pelo qual se
podem substituir coisas, mais precisamente coisas de um determinado conjunto,
enquanto consideradas indistintas.
Ainda de acordo com o autor, muitos alunos acham que todas as variveis
so letras que representam nmeros. Nem sempre isso verdade, pois muitas
vezes as variveis podem representar proposies, outras vezes uma funo,
podendo ser a representao de uma matriz ou um vetor e, ainda, no
necessariamente serem representadas por letras.
As concepes de varivel mudam com o tempo, tornando-se difcil
encontrar uma nica definio que seja a mais correta ou a nica possvel, e
dificultando, talvez, a aprendizagem destas. Portanto, tentar definir a idia de
varivel poder acarretar uma tal simplificao, no atendendo s muitas
definies, conotaes e smbolos que cabem a ela.
Percebemos que h muitas opes de introduzir a lgebra, mas que
tambm surgem muitas dificuldades, por parte de professores e alunos, ao entrar
em contato com ela. Diante desses obstculos, temos uma questo geral:
Como se d o ensino dos contedos algbricos hoje? Sob quais perspectivas?
Associado a esta questo vem o fato de que, hoje, em todas as escolas
pblicas do estado de So Paulo os alunos recebem o livro didtico distribudo
gratuitamente pelo governo estadual. Os livros didticos so recomendados pelo
27
Programa Nacional do Livro Didtico PNLD e escolhidos pelos prprios
professores. O livro didtico , atualmente, um dos recursos mais eficazes nossa
disposio, fornecendo-nos informaes, propondo atividades, ajudando a
organizar o trabalho em classe, apresentando textos interessantes para leitura,
entre outras funes. Alm disso, em muitos deles, o manual do professor ,
realmente, um auxiliar precioso.
O livro didtico exerce grande influncia sobre a atuao do professor em
sala de aula, pois ele se torna freqentemente a nica ferramenta disponvel para
o seu trabalho (PNLD, 2005, p. 196).
Percebendo sua importncia como instrumento de acesso ao ensino,
surge-nos outras questes:
Como est ocorrendo o desenvolvimento do pensamento algbrico por meio do livro didtico?
Como se trabalham, hoje, os contedos algbricos em sala de aula? Como o livro didtico, presente hoje em todas as escolas, utilizado pelos professores?
Sob quais perspectivas os livros didticos introduzem o pensamento algbrico?
Ser que os livros conseguem dar conta do pensamento algbrico?
2.1.1 Definio da questo de pesquisa Muitas so as questes acerca da introduo da lgebra via livros
didticos, porm h a necessidade de delimitarmos nossa questo de pesquisa.
Nosso objetivo investigar como a noo de varivel tem sido abordada
pelos livros didticos brasileiros referentes aos 3 e 4 ciclos do Ensino
Fundamental.
Com fundamento nesta perspectiva, levantamos a questo: Como os livros
didticos do Ensino Fundamental abordam a noo de varivel sob a tica da
organizao praxeolgica de Chevallard?
28
2.2 Fundamentos Tericos
2.2.1 A noo de organizao praxeolgica A anlise do livro didtico ser desenvolvida a partir de uma adaptao da
Organizao Praxeolgica proposta por Chevallard (1991), na qual buscamos
identificar, no conjunto dos livros escolhidos para nossa anlise, os tipos de
tarefas, as tcnicas, as tecnologias e as teorias.
De acordo com Chevallard, a Teoria Antropolgica do Didtico (TAD)
envolve a atividade matemtica e ento a atividade de estudo em Matemtica, no
conjunto das atividades humanas e instituies sociais.
A Organizao Praxeolgica formada por um conjunto de tcnicas, de
tecnologias e de teorias organizadas para um tipo de tarefas (ALMOULOUD,
2000, p. 162).
Geralmente, uma tarefa e/ou tipos de tarefas se expressam por um verbo,
por exemplo: desenvolver a expresso literal dada.
Alguns pontos devem ser salientados: a noo de tarefa, ou de tipo de
tarefas, supe um objetivo relativamente preciso, por exemplo: calcular o valor de
uma funo em um ponto um tipo de tarefa, mas Calcular, apenas, o que
chamaremos um gnero de tarefas; tarefas, tipos de tarefas e gneros de tarefas
no so dados da natureza, mas artefatos, obras, nas quais a reconstruo em
tal instituio um problema em parte completo, que o prprio objeto da
didtica.
Uma praxeologia relativa a um tipo de tarefa dada determina uma maneira
de cumprir, de realizar tarefas; a essa tal maneira de fazer d-se o nome de
tcnica. Ento, uma praxeologia relativa a um tipo de tarefa contm, a princpio,
uma tcnica relativa a ela, formando-se, assim, um bloco denominado bloco
prtico-tcnico e que se identificar ao que se diz, geralmente, um saber-fazer:
um certo tipo de tarefas e uma maneira de cumprir as tarefas desse tipo.
Neste ponto cabem trs observaes importantes: uma tcnica s tem
sucesso sobre uma parte de tarefas de um tipo ao qual ela relativa, parte que se
nomeia alcance da tcnica; ento, uma tcnica pode ser superior a uma outra,
seno sobre todo tipo de tarefa, pelo menos sobre uma certa parte dela; uma
tcnica no necessariamente de natureza algortmica ou quase algortmica, mas
ela s assim em casos muito raros; tendo uma instituio a respeito de um tipo
29
de tarefa dada, existe geralmente s uma tcnica, ou ao menos um pequeno
nmero de tcnicas institucionalmente reconhecidas, na excluso de tcnicas
alternativas possveis, que podem existir efetivamente, mas em outras
instituies.
Entende-se por tecnologia um discurso racional sobre a tcnica, um
discurso tendo por objeto primeiro justificar racionalmente a tcnica,
assegurando-nos que ela permita cumprir bem as tarefas do tipo de tarefas, ou
seja, realizar o que pretendido. O estilo de racionalidade utilizado varia no
espao institucional, de modo que uma certa racionalidade institucional poder
parecer pouco racional em outro espao institucional.
necessrio, ainda, que apresentemos trs observaes: em uma
instituio, qualquer que seja o tipo de tarefa, a tcnica relativa a ela sempre
acompanhada de ao menos um embrio, ou, mais freqentemente ainda, de um
vestgio de tecnologia; uma segunda funo de tecnologia explicar, tornar
inteligvel, esclarecer a tcnica, ou seja, se a primeira funo que justificar a
tcnica consiste em assegurar o xito da tcnica em relao ao pretendido, esta
segunda funo consiste em expor por que a tcnica tem xito desta forma; uma
terceira funo corresponde a um emprego mais atual do termo tecnologia, ou
seja, a funo de produo de tcnicas, notando, assim, que existem tecnologias
potenciais, esperando tcnicas que sublinharo o fenmeno de sub-exploraes
das tecnologias disponveis, tanto do ponto de vista da justificao como da
explicao da produo.
Esse discurso tecnolgico contm afirmaes, mais ou menos explcitas,
podendo solicitar a razo. Passa-se, ento, a um nvel superior de justificao
explicao produo, o da teoria, a qual retoma, em relao tecnologia, o
papel que esta ltima tem relativamente tcnica.
De fato, a descrio apresentada em trs nveis (tcnica/tecnologia/teoria)
basta, em geral, para dar conta da atividade analtica. Assim, em torno de um tipo
de tarefas encontra-se um trip formado de uma tcnica (ao menos), de uma
tecnologia e de uma teoria, o que constitui uma praxeologia pontual relativa a um
nico tipo de tarefas.
Uma praxeologia, ou organizao praxeolgica, constituda de um bloco
tecnolgico-terico e de um bloco prtico-tcnico. O primeiro bloco identificado
como um saber, enquanto o segundo bloco constitui um saber-fazer.
30
A organizao praxeolgica articula-se em tipos de tarefas, tcnicas,
tecnologias e teorias e, ao identific-los numa situao, estamos organizando o
estudo de um conceito ou tema. 2.3 Procedimentos metodolgicos Nossa proposta analisar os livros didticos de Matemtica do Ensino Fundamental, investigando como abordada a noo de varivel e explicitando
os tipos de tarefas, tcnicas, tecnologias e teorias envolvidas.
Questionando-nos sobre a forma de realizar tal anlise, esta parte deste
captulo tem como objetivo relatar o procedimento metodolgico de nossa
pesquisa, partindo de uma abordagem qualitativa e documental, inclusive o
procedimento quanto escolha dos livros envolvidos.
2.3.1 Anlise documental A anlise documental uma tcnica de abordagem de dados qualitativos.
Os livros didticos esto includos nos tipos de documentos que fazem parte
dessa anlise.
A anlise documental busca investigar informaes factuais nos
documentos a partir de questes ou hipteses de interesse.
Quanto s vantagens de trabalhar com essa abordagem, Cuba e Lincoln
(apud LUDKE e ANDR, 1986) destacam algumas delas: os documentos
constituem uma fonte estvel e rica, podendo servir de base a diferentes estudos
e de onde se podem retirar evidncias para fundamentar afirmaes e
declaraes do pesquisador; sendo uma fonte natural de informaes, tem um
custo muito baixo, e uma fonte no-reativa, permitindo a obteno de dados
quando o acesso ao sujeito impraticvel e, ainda, indicando problemas que
devem ser mais explorados por meio de outros mtodos; acima de tudo, ou por
tudo isto, uma fonte de informao que no deve ser ignorada.
Segundo Bogdan e Biklen (1994), uma das caractersticas bsicas da investigao qualitativa a investigao qualitativa descritiva, em que a palavra
escrita tem grande importncia, primeiro para obter os dados e depois para suas
anlises.
31
[...] esse modo de pesquisar dado pela inteno de atingir aspectos do humano sem passar pelos crivos da mensurao, sem partir de mtodo previamente definido e, portanto, sem ficar preso a quantificadores e aos clculos decorrentes (BICUDO, 2004, p. 105).
2.3.2 A escolha dos livros didticos
Devido diversidade de publicaes foi preciso selecionarmos os livros
didticos que seriam analisados, o que nos fez estabelecer um critrio:
Devido ao fato de tentarmos perceber como o tema tem sido abordado atualmente, consideramos os livros didticos que esto direta ou
indiretamente relacionados com a sala de aula, por isso faremos uso das
obras aprovadas do PNLD.
O que o PNLD?
Em 1995 foi criado o PNLD (Programa Nacional do Livro Didtico) com o
intuito de estabelecer critrios para a avaliao dos livros didticos. A primeira
avaliao dos livros didticos aconteceu em 1996 e no ano seguinte por meio do
Guia do Livro Didtico foi realizada a publicao dos livros aprovados pelo MEC.
Desde ento, de trs em trs anos o MEC divulga a lista dos livros avaliados e
aprovados.
O PNLD uma iniciativa do Ministrio da Educao e Cultura que tem por
objetivo a aquisio e distribuio universal e gratuita de livros didticos para os
alunos das escolas pblicas.
Ao verificarmos quais eram as colees de Matemtica de 5 a 8 sries
indicadas no PNLD, deparamo-nos com 23 colees, o que novamente nos fez
estabelecer um critrio:
Para tal seleo, baseamo-nos nos livros escolhidos pela maioria dos professores do Estado de So Paulo, recorremos Secretaria da
Educao e s quatro maiores editoras de So Paulo, tica, Scipione, FTD
e Saraiva, para sabermos quais os livros mais vendidos nos ltimos anos.
O departamento editorial de Matemtica de cada editora forneceu-nos o
nome de suas colees mais vendidas.
32
A partir dessa ltima seleo, passamos anlise propriamente dita das
quatro colees com maior vendagem:
Quadro 1: Livros didticos de Matemtica para o Ensino Fundamental
Livros Didticos Autores
Coleo A Conquista da Matemtica: a + nova
Jos Ruy Giovanni Benedito Castrucci Jos Ruy Giovanni Jnior
Coleo Tudo Matemtica Luiz Roberto Dante Coleo Matemtica para Todos Luiz Mrcio Imenes
Marcelo Lellis Coleo Matemtica e Realidade Gelson Iezzi
Osvaldo Dolce Antnio Machado
2.3.3 - Aspectos para anlise dos livros didticos Em nossa reviso bibliogrfica, esto os estudos realizados sobre o ensino e aprendizagem da lgebra, os quais nos possibilitaram estabelecer aspectos a
serem utilizados em nossa anlise de livros didticos.
Aspecto 1 Os PCNs e os Livros Didticos Os PCNs visam construo de um referencial que oriente a prtica
escolar de forma a contribuir para que toda criana e jovem brasileiros tenham
acesso a um conhecimento matemtico que lhes possibilite de fato sua insero,
como cidados, no mundo do trabalho, das relaes sociais e da cultura (p. 15).
Para que essa insero do cidado, nosso aluno, ocorra de fato, os PCNs
sugerem que a Matemtica desempenhe seu papel na formao de capacidades
intelectuais, na estruturao do pensamento, na agilizao do raciocnio do aluno,
na sua aplicao a problemas, situaes da vida cotidiana e atividades do mundo
33
do trabalho e no apoio construo de conhecimentos em outras reas
curriculares.
Indicam ainda objetivos gerais quanto ao ensino de Matemtica no Ensino
Fundamental tendo em vista essa construo da cidadania. A proposta levar o
aluno a:
Identificar os conhecimentos matemticos como meios para compreender e transformar o mundo sua volta e perceber o carter de jogo intelectual,
caracterstico da Matemtica, como aspecto que estimula o interesse, a
curiosidade, o esprito de investigao e o desenvolvimento da capacidade
para resolver problemas;
Fazer observaes sistemticas de aspectos quantitativos e qualitativos da realidade, estabelecendo inter-relaes entre eles, utilizando o
conhecimento matemtico (aritmtico, geomtrico, mtrico, algbrico,
estatstico, combinatrio, probabilstico);
Selecionar, organizar e produzir informaes relevantes, para interpret-las e avali-las criticamente;
Resolver situaes-problema, sabendo validar estratgias e resultados, desenvolvendo formas de raciocnio e processos, como intuio, deduo,
analogia, estimativa, e utilizando conceitos e procedimentos matemticos,
bem como instrumentos tecnolgicos disponveis;
Comunicar-se matematicamente, ou seja, descrever, representar e apresentar resultados com preciso e argumentar sobre suas conjecturas,
fazendo uso da linguagem oral e estabelecendo relaes entre ela e
diferentes representaes matemticas;
Estabelecer conexes entre temas matemticos de diferentes campos e entre esses temas e conhecimentos de outras reas curriculares;
Sentir-se seguro da prpria capacidade de construir conhecimentos matemticos, desenvolvendo a auto-estima e a perseverana na busca de
solues;
Interagir com seus pares de forma cooperativa, trabalhando coletivamente na busca de solues para problemas propostos, identificando aspectos
consensuais ou no na discusso de um assunto, respeitando o modo de
pensar dos colegas e aprendendo com eles.
34
Tendo em vista que hoje a maioria dos livros didticos salienta estar de
acordo com os PCNs, recorremos aos objetivos gerais aqui apresentados, assim
como ao estudo j realizado dos objetivos especficos para terceiro e quarto ciclos
do Ensino Fundamental, para compor nosso primeiro aspecto.
Buscaremos observar dois pontos:
9 A Histria da Matemtica 9 Resoluo de Problemas.
Os PCNs destacam algumas possibilidades de trabalho em sala de aula,
dentre elas a de trabalhar com a Histria da Matemtica, levantando alguns
pontos para justificar esse trabalho.
A Histria da Matemtica pode oferecer uma importante contribuio ao processo de ensino e aprendizagem dessa rea de conhecimento.
Ao revelar a Matemtica como uma criao humana, ao mostrar necessidades e preocupaes de diferentes culturas, em diferentes
momentos histricos, ao estabelecer comparaes entre os conceitos e
processos matemticos do passado e do presente, o professor cria
condies para que o aluno desenvolva atitudes e valores mais favorveis
diante desse conhecimento.
Conceitos abordados em conexo com sua histria constituem veculos de informao cultural, sociolgica e antropolgica de grande valor formativo.
A Histria da Matemtica , nesse sentido, um instrumento de resgate da prpria identidade cultural.
O recurso Histria da Matemtica pode esclarecer idias matemticas que esto sendo construdas pelo aluno, especialmente para dar respostas
a alguns porqus e, desse modo, contribuir para a constituio de um
olhar mais crtico sobre os objetos de conhecimento.
Os PCNs apontam a resoluo de problemas como ponto de partida do
aprendizado indo em contrapartida reproduo de procedimentos.
A resoluo de problemas, na perspectiva indicada pelos educadores matemticos, possibilita aos alunos mobilizar conhecimentos e desenvolver a capacidade para gerenciar as informaes que esto a seu alcance. Assim, os alunos tero
35
oportunidade de ampliar seus conhecimentos acerca dos conceitos e procedimentos matemticos bem como de ampliar a viso que tm dos problemas, da Matemtica, do mundo em geral e desenvolver sua autoconfiana (PCNs, 1998, p. 40).
Resolver um problema matemtico significa realizar uma seqncia de
aes ou operaes para se obter um resultado; assim, os PCNs pressupem
que o aluno elabore um ou vrios procedimentos de resoluo, compare seus
resultados com os de outros alunos e valide seus procedimentos.
Os PCNs destacam alguns princpios ao se trabalhar com a resoluo de
problemas:
A situao-problema o ponto de partida da atividade matemtica e no a definio. So necessrias situaes em que os alunos precisem
desenvolver algum tipo de estratgia para resolv-las.
O problema no um exerccio em que o aluno aplica, de forma mecnica, uma frmula ou um processo operatrio. S h problema se o aluno for
levado a interpretar o enunciado da questo que lhe posta e a estruturar
a situao que lhe apresentada.
Um conceito matemtico se constri articulado com outros conceitos, por meio de uma srie de retificaes e generalizaes. O aluno constri um
campo de conceitos que toma sentido num campo de problemas, e no um
conceito isolado em resposta a um problema particular.
A resoluo de problemas no uma atividade para ser desenvolvida em paralelo ou como aplicao da aprendizagem, mas uma orientao para a
aprendizagem.
Os PCNs afirmam que muitos professores consideram que possvel
trabalhar com situaes do cotidiano ou de outras reas do currculo somente
depois de os conhecimentos matemticos envolvidos nessas situaes terem sido
amplamente estudados pelos alunos. Destacam que geralmente os contedos
so abordados de forma linear e os alunos acabam tendo poucas oportunidades
de explor-los em contextos mais amplos.
36
Objetivamos essencialmente buscar respostas ao seguinte
questionamento:
De que maneira os livros didticos vm incorporando os objetivos
sugeridos pelos PCNs?
Aspecto 2 As abordagens para introduzir e desenvolver a lgebra Berdnarz, Kieran, e Lee (1996) apresentam as diferentes abordagens para
introduzir o ensino de lgebra e, de acordo com cada uma delas, teremos um uso
para variveis, ao contrrio de Usiskin (1994), que apresenta as diferentes
concepes de lgebra intrinsecamente relacionadas utilizao das variveis. O
que percebemos que as concepes e o ensino de lgebra se inter-relacionam.
Quadro 2: Comparao entre as concepes de lgebra, segundo Usiskin, e as
abordagens para o ensino de lgebra, de acordo com Berdnarz, Kieran e Lee
Concepes de lgebra
(Usiskin)
Abordagens para o ensino de lgebra
(Berdnarz, Kieran e Lee)
lgebra como Aritmtica generalizada
Generalizao das leis que regem os nmeros
lgebra como um estudo de procedimentos para resolver
certos tipos de problemas
Regras de transformaes e solues de equaes
Soluo de problemas especficos ou classes de
problemas
Como estudo de relaes entre as grandezas
Introduo de conceitos de varivel e funo
lgebra como estudo das estruturas matemticas
Estudo de estruturas algbricas
Como a lgebra pode ser introduzida a partir de uma dessas abordagens,
as quais, na verdade, determinam de alguma forma as concepes algbricas
que os alunos continuaro a manter com a lgebra depois dessa introduo,
estabelecemos nosso segundo aspecto.
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Procuramos na anlise dos livros alguma resposta seguinte questo:
Nos livros didticos, que tipo de abordagem utilizada para introduzir e
desenvolver a lgebra? Apenas uma abordagem trabalhada ou h vrias se
inter-relacionando?
Aspecto 3 Os diferentes usos dados idia de varivel Para Usiskin (1994) as diferentes concepes de lgebra se relacionam
com os usos distintos das variveis, como veremos na tabela a seguir:
Quadro 3: Concepes de lgebra relacionando-se com os usos das variveis
Concepo da lgebra Usos das variveis
Aritmtica generalizada Generalizadoras de modelos (traduzir, generalizar)
Meio de resolver certos problemas
Incgnitas, constantes (resolver, simplificar)
Estudo de relaes Argumentos, parmetros (relacionar, grficos)
Estrutura Sinais arbitrrios no papel (manipular, justificar)
Os PCNs tambm trazem as diferentes interpretaes da lgebra e as
diferentes funes das letras, deixando claro que para garantir o desenvolvimento
do pensamento algbrico o aluno deve estar engajado em atividades que inter-
relacionem as concepes variadas da lgebra e os diferentes usos das
variveis.
Tendo em vista esses aspectos, buscamos na anlise de livros respostas
seguinte indagao:
Nos livros didticos quais so os diferentes usos dados idia de varivel
que eles apresentam? Varivel como coisa conhecida? Incgnita? Argumento?
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Generalizao de modelo aritmtico? Smbolo abstrato? Varivel para expressar
relaes e funes?
Iremos analisar cada coleo, verificar quais critrios ela atende, relacionando cada critrio atendido ao tipo de tarefa a ser desenvolvida.
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CAPTULO III
ANLISE DAS COLEES DE LIVROS DIDTICOS DOS 3 E
4 CICLOS DO ENSINO FUNDAMENTAL
3.1 Coleo A CONQUISTA DA MATEMTICA: a + nova Jos Ruy Giovanni, Benedito Castrucci, Jos Ruy Giovanni Jnior
A conquista da Matemtica uma coleo composta de quatro volumes,
uma para cada srie, de 5 a 8 srie do Ensino Fundamental. Os volumes so
organizados em captulos, subdivididos em tpicos. Cada captulo iniciado com
um texto, em geral na forma de histrias em quadrinhos, seguido da explanao
da teoria contendo exemplos e exerccios.
Os captulos comportam as sees: Troque idias com o colega, em que o
aluno ter oportunidade de trabalhar em grupo; Tratando a informao, um
espao que organiza o trabalho com grficos e tabelas; Explorando, que trata da
Geometria, clculo mental, grandezas e medidas; Calculadora, manuseio das
calculadoras com atividades nos campos dos nmeros e da lgebra; Informaes
matemticas interessantes, mostra a matemtica presente em todos os lugares;
Retomando, com atividades de aplicao e de fixao da aprendizagem.
Ao final de cada volume encontram-se as sees Indicao de leitura,
Bibliografia, Respostas dos exerccios, Glossrio e Projeto.
Cada livro traz ainda o manual do professor contendo orientaes,
sugestes, objetivos especficos e orientao metodolgica.
Aspecto 1 Os PCNs e os Livros Didticos Esta coleo apresenta uma maior concentrao dos contedos do campo numrico no primeiro e segundo volumes (5 e 6 sries) e dos campos algbricos
e geomtricos no terceiro e quarto volumes (7 e 8 sries).
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Entretanto, no segundo volume (6 srie) nos deparamos com as primeiras
noes da lgebra. O volume traz o captulo Estudando as equaes e nesse
momento que se introduz a substituio de nmeros por letras.
A coleo traz a histria da Matemtica em todos os captulos, histria
esta, segundo os autores, fundamental para embasar a construo do
pensamento matemtico. Os textos referentes ao contedo abordado vo sendo
apresentados ao longo dos livros, como no terceiro volume (6 srie) com o
captulo que trata as equaes apresentando o texto As equaes e o papiro
Rhind, relatando o trabalho dos egpcios, gregos e rabes, falando ainda das
equaes nos dias de hoje.
No terceiro volume (7 srie), o captulo Introduo ao clculo algbrico
apresenta um texto relatando o uso de letras para representar nmeros.
No quarto volume (8 srie), junto do captulo Equaes de 2 grau,
apresenta uma leitura relatando que os textos babilnios traziam referncia a
problemas que hoje so resolvidos utilizando equaes de 2 grau.
Percebemos a histria da Matemtica sendo utilizada como recurso
didtico, assim como propem os PCNs. Alguns desses textos assumem um
carter informativo trazendo relatos da vida e obra de matemticos famosos, mas
a outros que se integram com o desenvolvimento do contedo, contribuindo para
a aprendizagem.
A resoluo de problemas destacada nas reflexes apresentadas no
manual do professor, porm esta no a abordagem utilizada para introduzir os
contedos.
H a utiliza