Post on 11-Mar-2016
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DA PRIMAVERA FILOSÓFICA
É a emergência que não permite que o núcleo de estudantes de filosofia, Sexto
Empírico, desarme as suas potencialidades e o seu sentido. No fundo, Sexto Empírico é
sinónimo de impertinência. Não é que a justificação de sua perseverança esteja fundada
numa certa negação de todos os valores e acontecimentos que nos foram sendo legados.
Ao invés, para nós, enquanto membros do Sexto Empírico, o amanhã não é mais que um
adereço do quotidiano. Estamos, portanto, atentos às presentes mobilizações da
juventude, sentimos a angústia da precariedade, de uma espécie de futuro que nos
querem dar como abortado, uma história que não tem mais a realizar, um presente que
nada mais nos tem a oferecer. Temos um sonho! Não nos pensamos condenados à
efemeridade nem a um certo fatalismo português. O ruído de fundo que vivemos é
condição da nossa contemporaneidade, a informação é abundante e está disponível para
todos, não obstante, estamos aprisionados numa frenética espiral que teima em nos
toldar os passos.
Se a filosofia de ontem não precisa de justificações a filosofia de hoje justifica-
se a si mesma, porque, assim o cremos, só esta nos permitirá encetarmos um mundo
melhor, no qual não nos arrependeremos de por ele termos transitado. Por isso,
garantimos, a geração à rasca precisa de mais filosofia, de uma filosofia rejuvenescida
que lhe permita integrar toda uma nova forma de relacionamento com o mundo; não o
mundo abstrato, o mundo metafísico dos grandes pensadores, outrossim, o mundo
natureza, com os seus soberbos recursos, mas limitados. Ética, hoje, não pode ser um
conceito gasto, antes, ela é uma emergência, face à usurpação e violência dirigidas
contra todas as formas de vida, humanas e não humanas.
Então não somos nós a geração mais qualificada de sempre e precisamos, ainda
assim, que outros decidam por nós? Não temos nós hoje, mais que nunca, uma
capacidade de mobilização inaudita, e, porém, ao entardecer não baixamos nós a nossa
bandeira, manchada ainda de indignação? Não nos fechamos de novo nas nossas
redomas, no final dessas flash mobs, sem que tenhamos de facto mudado alguma coisa?
Não sabemos hoje que as aparências nos enganam e ainda assim nos deixamos seduzir
pelos novíssimos profetas da contemporaneidade – políticos, economistas, empresários,
professores e outras marionetas de um pensamento obsoleto e pretensioso? Elites
impregnadas de um vocabulário esotérico e de uma semântica da negação, isto é, da
negação das nossas potencialidades e forças. Por que razão afinal nos calamos enquanto
temos, no nosso íntimo, consciência de tudo isto? Será o masoquismo a mais saliente
virtude contemporânea? Não foi a internet concebida para se solidificarem as relações
dos povos uns com os outros, dos cidadãos uns com os outros, com as suas diferenças e
semelhanças? Não é a internet a possibilidade concreta de aproximarmos as nossas
alteridades? Não é esta a tal “pedra basilar” para a intervenção directa no nosso destino
colectivo, no governo de nossas vidas? Não é a proximidade que mais caracteriza as
sociedades actuais, as polis actuais? A ser isto verdade, porque ao invés de nos
encontrarmos, sistematicamente nos desencontramos? Não é o planeta Terra um
património comum, que não deveria estar sujeito aos mais diversos vilipêndios e
extorsões de toda a ordem? Assim sendo, porque é que uns se asfixiam em bens sobre
os quais já perderam a sua medida, enquanto outros, morrem todos os dias porque estes
mesmos bens lhes foram negados por uma apropriação criminosa e imoral? Porque é a
austeridade para todos, quando a maioria não percebe a sua causa nem se sente
responsável? Ao fim, e ao cabo, todos nós sabemos larachar e estrebuchar com
veemência no café central, todos nós temos as nossas politiquices, mas, afinal, que
práticas concretas nos comprometem? É verdade, em frente à televisão somos, acima de
tudo, passivos. Porém, no derradeiro cá fora, esperamos, com a mesma passividade, o
Dom Sebastião que irá finalmente nos redimir das nossas aporias.
Como vêem a filosofia não é o mutismo da obscuridade, pelo contrário, ela é o
grito da evidência. Todos os seus representantes (da filosofia) devem fazer aquilo para
que foram preparados; estimular individualidades, para as quais o futuro surge como
sendo sua propriedade. Apelamos ao esforço, a um esforço acrescido, para que se
consiga sustentar uma consciência menos embrutecida nas gerações vindouras. O papel
fundamental dos funcionários da coisa em si é, deste sucinto modo, nada mais que
preparar e fortalecer o que de melhor o homem, em ligação umbilical com a natureza,
possui. A filosofia é mais que um plano de estudos e uma pauta reduzida a uma parelha
de dígitos. Agora façam e leccionem o que bem entenderem, desde Tales a Chomsky,
comprometam-se, porém, a não esquecer as vossas responsabilidades ancestrais, que
animam o mais nobre ofício da filosofia.
Pelo Sexto Empírico,
David Santos, Guilherme Castanheira, Luís Mendes.