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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SO PAULO
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
DEPARTAMENTO DE PROJETO
O Juquery: sua implantao, projeto arquitetnico e
diretrizes para uma nova interveno.
Desenho: Sylvio Sawaya e equipe
Aluno:
PIER PAOLO BERTUZZI PIZZOLATO
Orientador:
Prof. Dr. Sylvio Barros Sawaya
So Paulo
2008
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SO PAULO
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
DEPARTAMENTO DE PROJETO
O Juquery: sua implantao, projeto arquitetnico ediretrizes para uma nova interveno.
PIER PAOLO BERTUZZI PIZZOLATO
Dissertao apresentado ao programa de Ps-Graduao do Departamento de Projeto daFaculdade de Arquitetura e Urbanismo daUniversidade de So Paulo para obteno dottulo de Mestre em Arquitetura
Orientador:
Prof. Dr. Sylvio Barros Sawaya
So Paulo
2008
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Declaro que esta dissertao est autorizada para a sua reproduo, desde que
fonte e elaborao sejam citadas.
Direitos autorais do projeto reservados.
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Para meu Pai e para o Juquery.
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AGRADECIMENTOS:
Agradeo ao meu orientador Sylvio, que me direcionou por essa pesquisa, ao grupo de
pesquisa (Alessandra, Cris, Tati, Fbio, Alexandre, Clara, Marcele, Ailton e especialmente
para Profa. Maria Jos) do Vale do Rio Juqueri pelo apoio acadmico e pela camaradagem;
Eliane, que sempre conseguiu dar um jeitinho nos horrios de ambos (Sylvio e eu) para as
nossas reunies; aos funcionrios das bibliotecas tanto da FAU como da Poli. Para In Rosa,
retribuo o agradecimento de sua tese. Ao colega de mestrado Pedro que me ajudou na
formatao do texto.
Agradeo imensamente Diretora do Complexo Hospitalar do Juquery Dra. Maria
Tereza uma verdadeira mecenas moderna que sempre me apoiou e confiou em meu
trabalho. Ao Eng. Petrus, pois sem ele nem saberia onde se localizava o Complexo e pela
fora nos momentos difceis dentro da Instituio; aos meus colegas de setor (Walter, Hlio,
Marcinda, Isabel e principalmente Gustavo), D. Sueli e D. Maria Luiza (do museu OsrioCsar), Dr. Dario da saudosa biblioteca do Juquery, alm de outros tantos colegas do Hospital
que de alguma forma me ajudaram, tanto nas pesquisas quanto na vida cotidiana.
Ao prof. Parada da biblioteca municipal e grande historiador do Juquery.
Aos profissionais da Aldeia d Esperana, pela recepo e monitoria.
Ao Arq. Walter Fragoni do CONDEPHAAT, pela parceria e entendimento.
Ao Prof. Marcos, pela dedicao na minha aula de francs expresso.
Ao Tadeu, pela reviso e pacincia com meu texto.Aos meus amigos Caco, Ivana, Raquel, Hel, Diego, Flvio e tantos outros que
estiveram comigo nestes conturbados trs anos.
No posso me esquecer de meus familiares: meus avs, minha irm e meu sobrinho,
meu pai e minha me que me incentivaram, aturaram nesse tempo de pesquisa e que me
acolheram na difcil volta a casa.
E por fim, minha noiva Alexandra, quem eu reencontrei depois de anos e que viu em
mim coisas que nem eu sabia que existiam e me deu espao para que eu me tornasse umapessoa melhor.
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Palavras-chave:
Juquery, Alienados, Macro-metrpole, Projeto, Interveno, Vila Teraputica.
RESUMO:
A dissertao, seguindo a linha da evoluo construtiva, analisa o desenvolvimento
arquitetnico, tanto do ponto de vista esttico quanto histrico, do Complexo Hospitalar do
Juquery desde a administrao do Dr. Franco da Rocha at os dias de hoje. A finalidade
realizar uma leitura desse espao em vista de possveis modificaes por influncias e
dinmicas scio-urbanas dentro do contexto da Macro-metrpole paulistana, preparando-o,
por meio de novos usos como, por exemplo, projetos sociais - para sua reinveno como
plo indutor da transformao das cidades no Vale do Rio Juqueri.
Key words:Juquery, Insane, Macro-metropolis, Project, Therapeutics Neighborhood.
ABSTRACT:
This dissertation analyses the architectonical development of Juquery Hospitalar
Complex, since the administration of Dr. Franco da Rocha until nowadays. The aim of this
analysis is provide a provide a structure through which can be thought the possible
modifications the Complex can suffer because the socio-urban dynamics, making it able toreceive new uses and keeping it as POLO INDUTOR of the cities in the Rio Juquery Valley.
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SUMRIO
INTRODUO 11
Aspectos his tricos 12
1 CAPTULO - O TERRITRIO 20
Uma reflexo sobre a Regio do Vale do Juqueri 22
Uma reflexo sobre a atuao do Sistema de Sade na Regio 26
A acrpole de So Paulo e o l itoral santista 27
O Cinturo das Chcaras 31
O Cinturo Caipira 35
Sistema Ferrovirio e a Bacia do Rio Juqueri como ordenadores do espao 38
A Formao da Regio da Cantareira como Centro Hospi talar 42
2 CAPTULO A HISTRIA 47
O Asilo de Alienados do Juquery 58
Dr. Antonio Carlos Pacheco e Silva 685 Colnia Psiquitrica Masculina 696 Colnia Psiquitrica Masculina: 701 Colnia Psiquitrica Feminina 71Manicmio Psiquitrico 74Pavilho de Menores Alienados 77Pavilho de Observao 79Assistncia aos Psicopatas Tuberculosos. 80Clnicas Especializadas. 82Servio de Ergoterapia 83Vila Residencial 85Lavanderia 86Cozinha 87Padaria 87A Praa de Esportes 87
ELEMENTOS ARQUITETNICOS ALIADOS TERAPIA 89
Cronologia da evoluo do Complexo Hospitalar do Juquery 95
Asilo de Al ienados de Sain te Anne 107Baro Georges-EugneHaussmann 108A Fazenda Sainte Anne (1833-1863) 109Pavilhes de banho e hidroterapia 114Pavilho de Isolamento 116Pavilho de Classificao 117
O Escritrio de exames 118Asilo Clnico 119Bloco de Segurana 121
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Clnicas para admisso de doentes mentais 121Concluso 122
A relao arquitetnica entre o Juquery e o Sain te-Anne 123
3 CAPTULO - A ARQUITETURA 134Catalogao dos Edifcios existentes no Complexo Hospitalar do Juquery 145
Perodo de compras de terras (1895-1917) 146Perodo de Consolidao de terras (1918-1954) 147Perodo de doao/transferncias de terras (1955-1993) 149
Catalogao dos Edifcios existentes no Complexo Hospitalar do Juquery 1501- Prdio da Administrao (sofreu incndio em 17/12/2005) 1901; 1582- 1 Pavilho Masculino - atual UACP Feminina - 1901 1653- 2 Pavilho Masculino - atual Arquivo Central (prdio destinado ao DPME) - 1901 1674- Rotunda Masculina p/ Agitados - atual Sade do Trabalhador, G.T.V.E. (VigilnciaEpidemiolgica), G.T.V.S (Vigilncia Sanitria) e Reabilitao Fsica - 1901 172
5- Cozinha - atual Padaria e Refeitrio - 1901 1736- 3 Pavilho Masculino - atual Arquivo Central (prdio destinado ao Centro de GerenciamentoAdministrativo antigo GSAI 1) - 1901 1747- 4 Pavilho Masculino - atual Ginecologia e Obstetrcia - 1901; 1768- Lavanderia - atual Centro Cirrgico, Centro de Identificao e Procuradoria de Estado - 1901;1829- 1 Pavilho Feminino - atual Ambulatrio de Sade Mental - 1903; 18411- Rotunda Feminina p/ Agitados - atual Pronto Socorro Psiquitrico, CEFOR e Auditrio - 1903; 19312- 3 Pavilho Feminino - atual Enfermaria de Agudos Masculino (incendiado) - 1903; 19713- 4 Pavilho Feminino - atual Pronto Socorro Infantil, UTI Peditrica, Tomografia, EnfermariaInfantil e SATA - 1903; 20114- Residncia do Diretor - atual Museu Osrio Csar - 1989; 20715- 04 Refeitrios - atual 02 refeitrios - entre 1918 1954 (*); 21116- Cozinha - atual cozinha - 1926; 21717- Salo de festas - atual refeitrio de funcionrios - entre 1918 - 1954 (*); 21718- Rouparia - atual SAME - entre 1918 - 1954 (*); 21719- Ampliao da rea do DSPI - atual coleta de lixo "residncial" e caixa-dagua - entre 1918-1954(*); 21820- Ampliao da rea do DSPI - atual clnica cirrgica, p.s. adulto, clnica ortopdica e clnicamdica - entre 1918-1954(*); 22221- Ampliao dos sanitrios externos (ptio dos pavilhes) - entre 1918-1954 22622- Pavilho de Menores (Meninos) - atual Diretoria de Atividades Complementares e Setor dePatrimnio - 1918 (**); 22623- 5 Pavilho Feminino desativado (antigo Ambulatrio de Sade Mental) - 1921; 22824- Oficinas da Seo de Ergometria - atual parte das oficinas da Manuteno Predial - 1927?; 23225- Garagem - atual Sub-frota - 1928; 23226- Pavilho de Observao Masculino - atual Diretoria de Departamento CHJ - 1938; 23327- Escola Pacheco e Silva - atual Laboratrio de Anantomia Patolgica - 1929; 23428- Laboratrio de Anatomia Patolgica - atual farmcia ambulatorial - 1948; 23529- Farmcia - atual G.T.R.H., Finanas, Central Telefnica e Setor de Informtica (Intragov) -1948; 23730- Seo de Pintura Ergoterpica - atual Seo de Pintura e Diretoria de Projetos - entre 1918 -1954; 23732- Sala de Remendos - provavelmente 1929; 24033- Pavilho de Tuberculosos - Oficinas de Manuteno Predial (rea a ser utilizada para ainstalao do CAISM) - 1933; 24434- 8 Pavilho Feminino - atual Ambulatrio de Clnicas - 1942; 24635/36 - Pavilho de Observao Feminino - desativado 1938 / Parque Infantil (residncia/ parque/refeitrio) - atual CCI parque infantil e creche - 1948; 24737- Saboaria - atual saboaria (desativado) - 1927; 24938- Depsito de material (seo de pedreiros) - atual desativado - entre 1918 - 1954; 249
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39- Incinerador de lixo - atual seo de pedreiros (desativado) - entre 1918 - 1954; 24940- Pergola do campo de futebol - atual vestirio - 1937 (****); 25041- Vestirio de Funcionrios - atual residncia (desativado) - 1937; 25042- Sapataria e Dormitrio de Funcionrios - atual Lar Misto - entre 1918 - 1954; 25045- Vila Mdica (07 Residncias) - atual residncias teraputicas - 1934; 25146- Chcara - atual Conjunto do Lar III - desativado (1895 - 1917) (1918 - 1954) e (1955 - 1993);
25248- Funilaria - atual Funilaria - entre 1955 - 1993; 25249- Ampliao da Padaria - entre 1955 - 1993; 25350- Ampliao da Cozinha (caldeiras) - entre 1955 - 1993; 25351- Conforto Mdico - entre 1955 - 1993; 25352- Radiologia - atual Centro de Detec. e Preveno ao Cncer de Mama e Colo Interino - entre1955 - 1993; 25453- Galpo de Obras - atual Seo de Compras - entre 1955 - 1993; 25754- Dentista - atual Diretoria Administrativa - entre 1955 - 1993; 25755- Almoxarifado central - atual Almoxarifado - 1957; 25956. Lavanderia do Pavilho de Tuberculosos - atual GTOE - entre 1918 - 1954; 25957. Lavanderia da 1 Colnia Feminina - atual desativado - 1965; 25958. Incinerador de Lixo - atual Seo de Agropecuria - entre 1918 - 1954; 259
59- Abrigo, Lanchonete e Sanitrios p/ Visitantes - atual Hospital Dia - 1955; 26060. Lanchonete - atual Ouvidoria - 1958? 26361/62/63- Escritrio do SIOC, Vassoraria e Seo de Costura - atual NOAT - entre 1955 - 1993;26364- Ampliao do Laboratrio de Anatomia - entre 1955 - 1993; 26465- Prdio anexo ao Laboratrio de Anatomia (apoio) - atual Sede da Frente de Trabalho - entre1955 - 1993; 26466- Laboratrio de Clnicas - atual Laboratrio da DSPI - entre 1955 - 1993; 26467- Oficina de Mat. eltrico e garagem (?) - atual Refrigerao - entre 1955 - 1993; 26568- Almoxarifado da Seo de Ergoterapia - atual Almoxarifado - entre 1955 - 1993; 26569- Setor de gua e Esgoto - atual Hidrulica - entre 1955 - 1993; 26670- Depsito de madeira anexo a Seo de Pintura - atualmente desativado - entre 1955 - 1993; 26671- Necrotrio - atual Necrotrio (IML) - 1928; 266
72- Reforma e Ampliao do Hosp. de Clnicas de Franco da Rocha (Apoio tcnico, G.O.) - 1986; 26773- Reforma e Ampliao do Hosp. de Clnicas de Franco da Rocha (Lavanderia, Farmcia, Lab.(II), Cozinha) - 1986; 26773- Reforma e Ampliao do Hosp. de Clnicas de Franco da Rocha (Lavanderia, Farmcia, Lab.(II), Cozinha) - 1986; 268Reforma e Ampliao do Hosp. de Clnicas de Franco da Rocha (Lavanderia, Farmcia, Lab. (II),Cozinha) - 1986; 270Laboratrio de Emergncia 27174- Reforma e Ampliao do Hosp. de Clnicas de Franco da Rocha (Clnica Mdica e Pediatria) -1986; 272Portanto a reforma realizada em 1986 apenas ampliou o uso j existente. Infelizmente por um problemaestrutural o servio funcionou apenas alguns anos e aps o aparecimento de inmeras rachaduras e problemas
com portas e janelas, o local foi abandonado, causando problemas de superlotao nos outros prdiosprximos. 27275- Reforma e Ampliao do Hosp. de Clnicas de Franco da Rocha (Raio X, B. de Sangue, P.S.Adulto) - 1986; 27376- Reforma e Ampliao do Hosp. de Clnicas de Franco da Rocha (Ortopedia, Recepo eSanitrios) - 1986; 27377- Unidade de Clnica Mdica - UCM. 27478- Unidade Assistencial de Permanncia Intermediria 4. 27479- 3 Colnia de Crnicos Masculina atualmente em reforma para que funcione no local aUnidade de Clnica Mdica da DSPI. 27580- Medicina Preventiva (II) e Administrao das Colnias Atual DTDS Ncleo Assistencial,Biblioteca e SAME - DPII. 27581- Unidade Assistencial de Permanncia Intermediria 3. 27582- Unidade Assistencial de Permanncia Intermediria 2 276
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83- 3 Colnia de Crnicos Masculino atual Unidade Assistencial de Permanncia Intermediria 1 27684, 85 e 86- Atual Clnica Mdica de Acamados, Centro de Apoio Intensivo ao Servidor (C.A.I.S.) eAntiga Cozinha da 1 Colnia 276
4 CAPTULO - A INTERCECO 278
5 CAPTULO O PROJETO 288
rea Remanescente 292
Destinao de reas 293
rea da Sade 294
A Universidade 295
O Asilo Central 296
Centro de Referncia 297
Vila Teraputica 299
6 CAPTULO REFLEXO 309
7 CAPTULO CONCLUSO 313
ANEXO 319
BIBLIOGRAFIA 322
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INTRODUO
Ilustrao 1 - Vista da administrao, foto tirada na poca de sua inaugurao (imagem retirada docatlogo do prprio arquiteto, fonte Biblioteca Central da POLI-USP).
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O objetivo dessa dissertao o desenvolvimento de perspectivas para a atualizao
do uso das terras do Complexo Hospitalar do Juquery, pensando no futuro da Instituio,
conjuntamente com a definio de diretrizes de projeto para a implantao de uma Vila
Teraputica com o intuito de dar continuidade na re-socializao da comunidade de pacientes-
moradores da Instituio. A iniciativa para esta pesquisa surgiu por conta da necessidade cada
vez mais emergencial de um eixo norteador para as atuais mudanas que esto ocorrendo
dentro da Instituio, afinal o Juquery vem, ao longo do tempo, sofrendo uma reviravolta em
sua estrutura de atendimento e gesto, deixando cada vez mais a especializao em psiquiatria
e se tornando mais afinado com as especialidades mdicas do Sistema nico de Sade (SUS).
importante frisar que ao nosso ver, essa modernizao importante, afinal o Juquery seguiu
por muito tempo adormecido enquanto fomentador de novas terapias na rea mdica,
tornando-se nas ltimas dcadas um grande depsito de pessoas sem o atendimento mdico
adequado, portanto a proposta de nossa dissertao, onde o espao deixa de ser fetiche do
passado e torna-se elemento fsico capaz de lanar bases possveis para essa transformao.
Para tanto iremos aprofundar essa discusso atravs de 07 captulos que apresentam a
seguinte estrutura: 1 captulo O TERRITRIOa evoluo urbana da Macro-metrpole e
o Juquery; 2 captulo A HISTRIAa implantao fsica do Juquery desde suas origens at
a instaurao da configurao atual; 3 captulo A ARQUITETURAo movimento ecltico
e sua influncia nas construes do asilo; 4 captulo A INTERCECOo encontro entre
as necessidades da cidade e as potencialidades da Instituio; 5 captulo O PROJETOas
diretrizes bsicas da interveno; 6 captulo REFLEXO com a nfase sobre os
resultados obtidos em cada captulo e por fim o 7 Captulo CONCLUSO. Cada um deles
deve abarcar todos conceitos principais que nos levaram elaborao desse trabalho,
seguindo a lgica de tratar o objeto atravs de vrias facetas especficas e posteriormente
reunindo-os, formando um mosaico final de consolidao das propostas de uso mais coerentespara a nova realidade da Instituio.
Aspectos histricos
Ainda na poca em que o Brasil vivia sob a gide da monarquia a psiquiatria surge
como prtica mdica em 1852 quando da inaugurao do Hospcio D. Pedro II no Rio de
Janeiro, sede do governo e que estava sofrendo as mudanas que as idias da Misso Francesahaviam disseminado no urbanismo brasileiro. Porm, para nossa dissertao retrocederemos
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at o ano de 1848, quando para o atendimento ao alienado em So Paulo foi promulgada a lei
que liberava provncia para desenvolver plantas e oramentos no intuito de construir asilos
para abrigar os alienados da poca. Alienados, at ento eram toda uma gama de pessoas
que no se adaptavam sociedade: toda a parcela das camadas sociais mais baixas, mulatos,
pessoas vindas das zonas rurais, negros, imigrantes que eram competncia da policia e
acabavam sendo tratados como criminosos comuns.
No ano de 1852 foi adaptado em um casaro no centro da cidade, mais precisamente
Rua So Joo o Hospcio Provisrio de Alienados de So Paulo, onde funcionou de forma
precria at o ano de 1864, quando o aumento da demanda fez que o Hospcio se muda-se
para um antigo seminrio na regio da Tabatinguera (Vrzea do Carmo).
Essa mudana foi premeditada para retirar do centro da cidade e transladar para uma
regio mais retirada estes alienados, pois So Paulo comeava a se tornar um plo importante
para o comrcio de bens alimentares (cana-de-acar, muares e caf).
No mbito social podemos considerar que desde a abolio da escravatura, em 1888, e
a subseqente proclamao da Repblica, em 1889, essas transformaes haviam aberto
caminho para a construo de uma nova sociedade brasileira. As classes dominantes nesse
perodo tinham como principal preocupao a noo de civilizar e evoluir o povo, e com
a introduo dos profissionais das reas mdicas, educacionais e das engenharias, a burguesia
brasileira possibilitou a unio entre a poltica e a cincia.
Todo o povo brasileiro deveria ser catalogado e organizado conforme suas condies
fsicas, produtivas e morais1. O saber mdico sobre a loucura ajudou a construir uma
ideologia nacional, afirmando um iderio republicano e do fortalecimento do estado, portanto
essa medicalizao da sociedade serviu como uma das formas de racionalizao e permitiu
a otimizao da medicina do espao social.
De acordo com essa viso o alienado seria alvo das lentes destes encarregados do
dever moral de sanar e erradicar as falhas do corpo social brasileiro. Nessa estratgia, o
1 A Repblica conferiu principalmente medicina o papel fundamental na configurao da cidade e nadisciplinarizao da vida urbana. Desde o sculo XIX o aparelho do Estado comporta um setor crescente desade pblica; em 1891 criada a Inspetoria de Higiene, substituda no ano seguinte pelo Servio Sanitrio,dirigido por Emilio Ribas, e seguidamente reformulado para ampliar suas atribuies e adequ-las s novasnecessidades (em 1893,1896, 1906, 1911, 1917 e 1925); em 1892, o Instituto Vacinognico e a Comisso deVigilncia Epidemiolgica para a Zona Urbana; em 1893, o Laboratrio Bacteriolgico e o Servio deDesinfeco; em 1894, So Paulo dispe de um detalhado Cdigo Sanitrio, e nos primeiros anos do sculo XX
estaro instalados o Instituto Butant (1901) e o Instituto Pasteur (1903), para mencionar apenas as principaisinstituies que o estado investiu de poder para formar uma verdadeira classe de profissionais no controle dasdoenas. Cf. MARQUES, Vera Regina Beltro. Eugenia da Disciplina, p. 5
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alienista - mdico responsvel pela sade mental da populao revelou-se importante para o
processo de organizao.
Foi no sculo XIX que o hospcio como uma instituio total tornou-se prtica
principal na assistncia aos alienados.
Em nenhum outro sculo o nmero de hospitais destinados a alienados foi togrande; em nenhum outro a teraputica da loucura foi to vinculada internao; emnenhum outro sculo o nmero de internaes atingiu propores to grandes daspopulaes. Mais ainda, em nenhum outro sculo a variedade de diagnsticos deloucura, para justificar a internao, foi to ampla 2.
Este fenmeno iniciou-se na Europa, precisamente na Frana, onde a necessidade de
desenvolver um entendimento sobre a loucura que afetava a sociedade emergente havia se
tornado urgente. Como veremos, tanto no Brasil quanto na Europa, o mdico ser chamadopara dar seu parecer tcnico especializado atravs de dois campos de atuao: as prticas
assistenciais e a higiene3. O hospcio sofreu desde meados do sculo XIX vrias
transformaes em seu enfoque nos tratamentos das patologias relacionadas mente, a
prpria concepo do asilo de alienados enquanto principal instrumento da cura se
transforma do ideal de controle e educao, tal como pretendiam Pinel e Esquirol, para se
tornar um meio de sujeio do louco a uma terapia violenta e segregaria.
Outro fator determinante na definio da conformao do espao fsico do hospcio
nesta poca foi a implantao de grandes reas de cultivo para a laborterapia ligada ao
trabalho na terra, afinal o conceito do bom selvagem de Rousseau4 permeou a viso
alienista do final do sculo XIX e incio do sculo XX e influenciou em grande parte a
adoo dos trabalhos na agricultura que foram inseridos tanto aqui no Juquery quanto em
Sainte Anne em Paris.
Do ponto de vista arquitetnico, o hospcio do sculo XIX pode ser descrito como:
[...] um programa arquitetnico que se consubstanciou a partir de requerimentosordenados pela ordem mdica e at foi contemplado com um receiturio arquitetnicosistematizado em manuais como os de Cloquet ou de Guadet. [...], os ltimos padresento vigentes na arquitetura hospitalar europia do final do sculo XIX: sistema
2PESSOTTI, Isaias. O Sculo dos Manicmios, p. 9.3Higiene entendida como conjunto de teorias e prticas que pretendem dar conta de sanear e regulamentar
o espao social, atacando desde o indivduo at o coletivo. Podemos afirmar ento que a psiquiatria o ramo damedicina que atua na interveno moralista na busca de uma normalizao moral. Transforma as questespolticas de organizao social em questes meramente tcnicas, afirmando-se como higiene social(ANTUNES, Eleonora Haddad. Raa de Gigantes: A Higiene mental e a Imigrao no Brasil, p.84.
4Em seu texto intitulado Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens,
Rousseau discursa como o homem quando deixa o mbito de sua selvageria entenda-se a vida no campo parase agregar em sociedade comea a desenvolver novas leis e normas que o levam a deformar seu carter bom,permitindo que suas fraquezas e manipulaes atinjam o cerne da sociedade urbana.
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pavilhonar, inspirado no princpio do isolamento, segundo um esforo classificatrioprprio do repertrio psiquitrico da poca 5.
Alm disso, pode-se dizer que:
O hospital psiquitrico surge com o tratamento moral e com o reconhecimento daespecificidade da doena mental e da necessidade de separ-la das outras problemticas,atravs da criao de um espao teraputico prprio. O espao asilar foi concebido comoum local ideal para a ao teraputica e planejado segundo uma serie de dispositivos defuncionamento que garantissem esta ao. No havia tratamento sem hospital. Dentreesses dispositivos, o isolamento social era uma das principais condies para a suaexistncia. Da os hospitais serem construdos em locais perifricos aos centros urbanosem formao 6.
Como veremos, o tratamento psiquitrico resultante desse perodo atender seu
objetivo atravs de trs pontos fundamentais: o acompanhamento moral, poder disciplinar e
prticas sanitrias, todos eles decorrentes das alteraes sociais ocorridos pela exploso
populacional nas cidades. Esse modelo por muito tempo foi considerado como nica tipologia
para a teraputica psiquitrica, pois desde sua institucionalizao, a psiquiatria acabou por
ampliar sua ao alm das questes da loucura e do confinamento. Sua influncia ao longo do
tempo alcanar outros planos, principalmente quanto prpria conceituao de normalidade
e os aspectos sociais da segregao da populao.
5SEGAWA, Hugo. Casas de Orates, p.77.6LANCMAN, Selma.Loucura e espao urbano: Franco da Rocha e o asylo de Juqueri, p. 33.
Ilustrao 2 - imagens retiradas do livro Raynier, Julien eLauzier Jean La Construction et lAmnagement delHopital Psychiatrique et des Asiles dAlins
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Veremos tambm que depois da poca urea, onde o conceito de cura estava
intimamente vinculado ao Asilo psiquitrico, os grandes hospcios transformaram-se ao longo
do sculo XX em elefantes brancos, ocasionando problemas maiores que as solues
buscadas em suas concepes originais.
Retornando o caso estritamente brasileiro, os intelectuais nacionais, principalmente
aqueles que estavam forjando a Repblica, muitos estreitamente ligados filosofia do
positivismo, apelavam como soluo a eugenia e higienizao da populao para as tenses
sociais causadas pela abolio da escravatura, imigrao europia7e a migrao interna entre
as cidades. Neste perodo So Paulo tornou-se o principal fomentador dos novos tratamentos
psiquitricos quando o alienista Dr. Francisco Franco da Rocha8(nascido em Amparo no ano
de 1864 e formado pela primeira turma de mdicos psiquiatras na Escola de Medicina do Rio
de Janeiro), assumiu a direo do ento asilo de alienados da vrzea do Tabatinguera. A partir
de seu contato com os autores da psiquiatria internacional9, decidiu transferir o hospcio
paulista, at aquele momento ainda encalacrado no j superlotado educandrio para outras
paragens mais convidativas e com capacidade para serem adaptadas para esse fim.
Nos primeiros anos da dcada de 90 do sculo XIX, o ento diretor do hospcio da
cidade consegue, atravs de sano do Presidente do Estado, o Dr. Jos de Cerqueira Csar,
autorizao para construir o novo hospital asilar, cuja proposta teraputica aceita privilegiaria
o afastamento do doente de seu meio original e proporcionaria um novo ambiente esse
totalmente higienizado, visando uma sade fsica e mental altamente capacitado para sua
recuperao dos valores morais perdidos. Veremos que o discurso higienista da poca indicar
a normalizao da prtica psiquitrica enquanto medicina. O Juquery, segundo Lygia Maria,
em sua dissertao10 afirma que a inaugurao do Asilo de Alienados do Juquery foi uma
feliz coincidncia entre o movimento de consolidao do saber alienista e o momento de
crescimento de So Paulo.
Segundo o prprio Dr. Franco da Rocha:
7Entre os anos de 1890 a 1929 entraram no Brasil um nmero de 3.523.591 estrangeiros, sendo eles: suamaioria italianos, portugueses, espanhis, alemes, russos e japoneses. Cf. PEREIRA, Lygia Maria de Frana.Os primeiros sessenta anos teraputicas psiquitrica no Estado de So Paulo.
8 Com o intuito de no causar confuses em relao ao nome do psiquiatra e o nome da cidade, iremossempre usar as seguintes expresses em se tratando dos dois assuntos: Dr. Franco da Rocha para tratar dohomem e Franco da Rochaquando se tratar da cidade que surgiu da experincia do Asilo do Juquery.
9 Podemos citar como principais mdicos que influenciaram o alienista paulista os seguintes psiquiatras:
Kraepelin, Morel, Magnan, Marie, Voisin (Annales Mdico-Psychologiques), Maudsley (psiquiatria inglesa dadegenerescncia) e Lombroso (escola penal).10Apud ANTUNES, Eleonora Haddad. Raa de Gigantes: A Higiene mental e a Imigrao no Brasil, p. 86.
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A liberdade, quando se trata de doidos, no pode deixar de ser mui relativa. Apreocupao de evitar o aspecto de priso, de dar ao asilo aparncia de habitaocomum, tem sido um pouquinho exagerada por alguns alienistas. O carter de priso ,entretanto, inevitvel; quando no estiver nos muros e janelas gradeadas, estar noregime, no regulamento um tanto severo, indispensvel para um grande nmero dedoentes. Esse regime, porm, no impedira o gozo de ampla liberdade aos que seachem em condies de usufru-la. Um bom asilo deve ter seces diversas, nas quaisa liberdade se gradue pelo estado mental dos pensionistas 11.
Quando, h trinta anos, planejei a reforma completa da assistncia aos alienados de SoPaulo, tive em mente um grande projeto constitudo de duas partes: a primeira seria aorganizao material do Hospcio, com suas colnias agrcolas anexas e a assistnciafamiliar econmica, barata moda de Gheel e da Esccia 12.
A dissertao seguir, atravs da cronologia indicada, na descrio e anlise da
produo arquitetnica que derivar das experincias realizadas na gesto do Dr. Franco da
Rocha e do Dr. Antnio Carlos Pacheco e Silva e suas conseqentes transformaes naimplantao do asilo. Quanto s dcadas posteriores, estas sero estudadas, apenas na medida
em que as transformaes ocorridas incidem de forma contundente na realidade atual da
Instituio. Para tanto realizaremos uma comparao abrangente do asilo francs que serviu
de referncia ao Juquery o asilo de Sainte-Anne e a nossa instituio, alm de verificar
como as teorias arquitetnicas do perodo incidiram sobre a concepo arquitetnica realizada
por Ramos de Azevedo.
Ilustrao 3 Fotos do Dr. Francisco Franco da Rocha e Dr. Pacheco e Silva (www.francodarocha.sp.gov.brewww.hcnet.usp.br).
Na poca do Dr. Pacheco e Silva o pensamento psiquitrico se modificou, a
transformao da compreenso da doena mental como problema social antecedente crise
do indivduo e no apenas quando ela se manifesta posteriormente se tornou a tnica do
tratamento psiquitrico. O que ocorreu por conta disso foi que o Juquery, ao longo desses
11
FRALETTI Paulo.Juquery: Passado, Presente, Futuro, p. 177.12YALIN, Mario; OLIVEIRA, Geraldo. Resumo da Histria da Assistncia a Psicopatas no Estado de SoPaulo, p. 28.
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anos no se preocupou em se alinhar essa tendncia, tornando-se j na poca da interveno
de Adhemar de Barros no depsito de pessoas que logo depois seria reconhecido.
No mbito das relaes sociais entre a instituio e a cidade emergente, podemos
indicar que ao longo do tempo as histrias de Franco da Rocha e do Juquery se confundem.
Neste municpio, o louco faz parte do cenrio urbano, muitos habitantes da cidade
permanecem mais tempo no hospital, como funcionrios, do que com seus familiares, e todo o
desenvolvimento econmico, poltico e social, principalmente at a dcada de 80, foi marcado
pela influncia do asilo 13.
Segundo o vis da urbanizao resultante, no ficaremos apenas na viso do territrio
imediato da cidade e da instituio, mas analisaremos mais amplamente, verificando como as
tendncias da globalizao na macro-metrpole de So Paulo interferem no objeto e quais
podero ser as contribuies de uma interveno com o objetivo de melhoria nas condies de
habitalidade na populao envolvida, fruto do crescimento explosivo das periferias
paulistanas formadas pelos bolses de misria, fossem amenizadas e por fim erradicadas na
regio. Verificaremos que atualmente a precariedade existe tanto na ausncia de uma infra-
estrutura mnima, quanto na maneira inconseqente de ocupar os espaos, onde a forma final
no abriga espaos de uso comum pblico e reas naturais.
Para nosso objetivo foi definida a formatao de um Plano Diretor14 realizado em
conjunto entre nosso grupo de pesquisa15e a Administrao do Complexo propondo um novo
Juquery que poder finalmente inserir novos servios de sade em sua gama de atividades,
alm de proporcionar a instalao de um espao de ensino (de nvel superior) ampliando
assim, a atuao na populao prxima e garantindo a valorizao das potencialidades scio-
econmicas na regio.
Passemos a descrever (de forma sucinta) os principais itens que norteiam a
realizao deste Plano Diretor e que serviro como base para a transformao do antigo
Asilo de Alienados do Juquery em nova referncia para a Sade regional.
Hospital Quarternrio, o Memorial do Tratamento Psiquitrico e Referncia, o
Centro de Cultura Infantil e a Universidade.
13LANCMAN, Selma.Loucura e espao urbano: Franco da Rocha e o asylo de Juqueri, p. 37.14O Plano Diretor de usos do Complexo Hospitalar do Juquery foi apresentado no segundo semestre de 2006
e introduziu um raciocnio novo para a transio da ocupao que atualmente meramente de servios de sade
para um novo panorama da implantao de mltiplo-uso, no nosso caso uma universidade (nota do autor).15 Grupo de estudos formado pelo Prof. Sylvio Barros Sawaya e sediado na FAU-USP para odesenvolvimento de um plano de interveno no Vale do rio Juqueri.
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O Hospital Quarternrio, dever receber e ampliar as atividades mdicas atuais,
aliando a elas projetos de pesquisa. Com capacidade revisada, o novo hospital dever seguir
a tnica dos hospitais de tutela estaduais e garantir o atendimento mais apropriado aos
anseios da populao do entorno. A nova ala psiquitrica, que consideramos como o novo
Juquery, estar constitudo pela re-interpretao do tratamento realizado no Complexo
Hospitalar atravs da vila teraputica.
O Memorial do Tratamento Psiquitrico e de Referncia, a ser instalado nos edifcios
histricos localizados na rea central junto Biblioteca Central, preservar a histria da
sade mental, o respeito ao meio ambiente e ao desenvolvimento educacional da base social
com participao da populao.
OCentro de Cultura Infantil ser instalado prximo do conjunto edificado central.
Nele, a criana e natureza podero se integrar proporcionando uma nova vivncia entre as
geraes vindouras e o stio histrico. Concomitante a esse espao a instalao de uma
pousada de 80 leitos abrigar a demanda dessas novas atividades.
As reas de vrzea tero toda a gama de utilizao de mbito social, como recreao,
laser e educao da populao do entorno. A gesto das reas manter ntegra a fazenda
Juquery de tal forma que as questes centrais de sade, meio ambiente e vida social possam
ser tratadas de maneira una, providenciando-se as transies necessrias entre as
atividades de forma a preservar e desenvolver os objetivos ltimos destas atividades.
A instalao de uma FATEC num momento inicial e a posterior implantao de uma
Universidade, que ser estabelecida nas cotas mais altas no relevo do terreno, dever exercer
uma fora catalisadora de todo o arranjo a ser feito, criando e re-propondo a importncia do
Juquery tanto localmente quanto regionalmente, constituindo, assim, nova referncia na
metrpole.
Dentro da dissertao daremos prioridade proposta de construo de uma Vila
Teraputica dentro das terras remanescentes do Juquery, visando a recuperao dopatrimnio construdo n 1 Colnia Masculina. Para tanto, foi realizada a visita em um
espao semelhante na regio (Aldeia da Esperana) para trazer tona alguns elementos
importantes para a implantao da mesma no nosso trabalho.
Por conta da quantidade de material levantado, a proposio nesse momento ter
apenas o carter de apontamentos e sugestes de implantao, onde a pretenso de permitir
novos padres de ocupao, bem como indicar medidas corretivas que confiram o mnimo
de condies dignas de vida nas ocupaes j estabelecidas, pelo menos para a populaopsiquitrica existente ainda na Instituio.
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1 CAPTULO- O TERRITRIO
Ilustrao 4 - Detalhe do Asilo de Alienados do Juquery, projetado por Ramos de Azevedo em 1898.(imagem retirada do catlogo do prprio arquiteto, fonte Biblioteca Central da POLI-USP).
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A evoluo urbana e o Juquery trata do processo de disperso urbana atual que,
desestabilizou o antigo conceito da ordem radio-concntrica de um plo de expanso
representado pela cidade-sede que distribui de forma progressiva a expanso das relaes
scio-econmicas. A nova configurao deste fenmeno, por sua vez, mobiliza as atuais
relaes urbanas para novos espaos mais distantes e aparentemente desarticulados em um
processo contnuo de expanso. A chave do sucesso deste fenmeno, que se intensificou aps
a Segunda Guerra Mundial, o constante progresso da mobilidade das relaes scio-
econmicas em seu espao, mobilidade no apenas fsica, representada pelos sistemas virios,
mas tambm a proporcionada pelos meios de comunicao que torna desnecessria a presena
fsica da empresa ou do indivduo em determinado local.
Para tal fim, definiremos o conceito de cidade-regioou rea metropolizadacomo fio
condutor estrutural da pesquisa. Deve-se compreender a metrpole expandida de So Paulo
como o quadriltero geogrfico formado pelas cidades de Santos/Campinas (eixo norte-sul)
e Sorocaba/So Jos dos Campos (eixo leste-oeste). Tal fenmeno, conforme conceituao
mais recente definido como cidade-mundo. Este conceito deriva do processo de
globalizao das relaes scio-econmicas representando a criao de uma centralizadora,
no apenas geogrfica, mas tambm virtual, onde as decises financeiras e a distribuio de
recursos de mo-de-obra por vrios setores so definidas16.
Sob essa nova realidade, o trabalhador de baixa renda teve sua mobilidade
condicionada aos pontos dispersos de servios. As indstrias cada vez mais modernas e,
portanto, automatizadas transformaram-se em trans-nacionais e procuram mo-de-obra mais
barata nos pases subdesenvolvidos. A grande questo sobre o proletariado urbano que ele se
encontra atrelado ao sistema de transporte fornecido pelo Estado e seu local de trabalho. Uma
vez desarticulado de um destes plos, o trabalhador se v apartado de sua condio de cidado
e o local onde habita se torna um obstculo para uma nova carreira j que a distncia opera de
forma a dificultar novas relaes empregatcias.
16Conforme os estudos realizados pela equipe do Laboratrio de Arquitetura e Preservao (LAP), chefiadopelo professor Dr. Nestor Goulart Reis, vrios so os elementos que derivam deste processo, como os
condomnios de alto e mdio padro que se localizam s margens de estradas vicinais, os bairros eminentementeindustriais e os loteamentos de classe baixa, normalmente localizado em pontos distantes ao antigo centrourbano. Cf. REIS FILHO, Nestor Goulart. So Paulo: Vila, Cidade, Metrpole.
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Ilustrao 5 Vista da implantao do Vale do Rio Juqueri e as cidades mais prximas que incidemdiretamente nesta dissertao (foto retirada de Luporini, Alexandre, Rakauskas, Fbio e Prestes Junior,Jurandir trabalho de final de curso realizado pelos alunos da ps graduao).
Uma reflexo sobre a Regio do Vale do Juqueri17
Como descrio geogrfica do Vale do rio Juqueri18 e da Macro-metrpole de So
Paulo podemos descrever o seguinte percurso: caminhando do sul para norte (de fato de SSE
para MMO), o Territrio metropolizado inicia-se pela plancie costeira que abriga a Baixada
Santista e sua rea metropolitana. Segue-se o degrau da Serra do Mar com a altura da ordem
de 800 metros, superado este obstculo chega-se ao planalto paulistano que desce suavemente
at o Vale do Tiet na cota 720. Reformado pela bacia desse rio tendo como afluentes
principais o Tamanduate e Pinheiros, este transformado em canal com suas represas
montante. O espigo da avenida Paulista separa o rio Pinheiros do Tamanduate, sendo
considerada a rea de maior altura na cidade de So Paulo.
Indo a norte do Tiet, mas mantendo o sentido paralelo (EEN e OOS) surge a Serra da
Cantareira que a oeste vai continuar nas elevaes do Jaragu e do Voturuna e a leste vai se
unir Serra da Mantiqueira, com cota da ordem de 1.000 metros. A leste contornando o
macio do Itapeti e Mogi das Cruzes encontra-se o Rio Paraba que demandando a mesma
direo vai irrigar a falha que se conformou o vale do mesmo nome, passando por Jacare e
chegando a So Jos dos Campos.
17Segundo In Rosa da Silva, deve-se distinguir graficamente o nome do rio e o nome do Asilo, portanto orio escreve-se Juquerie a Instituio como Juquery.Cf. SILVA, In Rosa da. Franco da Rocha nas terras deJuquery: um Hospcio, uma cidade.
18Segundo Clara Nori Sato; De acordo com a composio das bacias hidrogrficas do Estado de So Paulo,
os municpios de Franco da Rocha, Mairipor e Caieiras esto localizadas geograficamente na Bacia do AltoTiet, e fazem parte da sub-bacia Juqueri Cantareira (Lei Estadual n 7.663/91). Cf. SATO, Clara Nori. APaisagem e o projeto no Vale do Juqueri em Franco da Rocha.
MAIRIPOR
CAJAMAR
FRANCO DA ROCHA
CAIEIRAS
FRANCISCO MORATO
PARQUE JUQUERY
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Ultrapassando a Cantareira, orientado do mesmo sentido, o Vale do Juqueri liga-se a
leste a Bacia do Jaguari e a oeste vai encontrar o rio Tiet na altura da atual represa de
Santana do Parnaba. Trata-se de um intervalo no sentido horizontal que se desenvolve em
toda extenso do territrio. Dando continuidade acima, uma nova elevao com cotas
menores, a Serra dos Cristais. Encontra-se alm desta o Vale do Jundia ocupando o centro da
poro norte do territrio metropolizado.
A partir da comea a descida suave da depresso perifrica que vai chegar at as
barrancas do Paran e com sucessivas serranias. Os campos existentes a norte de Jundia, j
no Atibaia, vo dar o nome de Campinas que o vrtice norte da metrpole expandida. A
forma geral desse territrio a de uma sucesso de planos paralelos que atinge aps o nvel do
mar, uma altura maior e gradativamente vo se sucedendo em cotas menores em direo ao
interior19.
Do ponto de vista econmico a regio onde est localizado o Complexo Hospitalar do
Juquery tem como caracterstica, desenvolvida nas ltimas dcadas, alocar grande nmero de
trabalhadores com baixa qualificao frutos da migrao em massa ocorrida nas grandes
cidades da regio sudeste, e que so obrigados a locomover-se no precrio sistema ferro-
rodovirio em direo s regies de concentrao de trabalho cada vez mais escassas.
A precariedade do sistema de transportes regional ser analisada mais adiante, mas
pode-se adiantar que a tnica de expanso das malhas rodo-ferrovirias foi sempre atrelada ao
lucro das transaes comerciais entre a Capital e a regio de Jundia-Campinas, e que por uma
questo de trajeto versus geografia as cidades da regio do Vale se serviram destes sistemas.
Portanto, as vias existentes no esto l para servir a populao da regio, mas sim, ao
complexo sistema de trocas regional.
Ainda sobre a regio da bacia do rio Juqueri, podemos distinguir duas definies que
alteram substancialmente a compreenso do local e norteia a nossa pesquisa as noes de
mobilidadee de acessibilidade.No que concerne rea da bacia localizada no centro deste quadriltero, ela apresenta
boa mobilidade, j que se encontra bem localizada na malha territorial da macro-metrpole,
mas no podemos considerar de boa acessibilidade, pois ela se encontra atualmente apartada
dos principais sistemas de mobilidade: as estradas de rodagem que seguem em direo norte-
sul como a Anhanguera, Bandeirantes e Ferno Dias. Nesse sentido, o sucesso do ncleo
19SAWAYA, Sylvio de Barros. Universidade, Memria e Poltica no Vale do Juquery.
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urbanizado em funo do novo fenmeno, a urbanizao dispersa, cabe harmonia entre
mobilidade e acessibilidade.
A regio da bacia do Juqueri tem abundncia de reas verdes devido proteo
ambiental realizada pelo Parque Estadual do Juqueri e a reserva verde para plantio de
matria-prima da produo de papis (Melhoramentos, M.D. Papis e Grupo Abdala). No
caso especfico da reserva verde, representa um marco geogrfico indutor para novas
urbanizaes deste enclave, j que com a importao de matria-prima de outras regies, a
indstria de papel fica isenta de garantir rea ociosa de apoio20.
Historicamente, as cidades de Caieiras, Franco da Rocha e Mairipor, prximas
antiga fazenda sede do Asilo de Alienados do Juquery, formaram um dos primeiros vetores
de expanso da cidade de So Paulo, e, juntamente com outras cidades do entorno daCapital delimitaram o Cinturo Caipira responsvel pelo fornecimento de matria-prima
bsica para o crescimento da metrpole. Por esta regio passaram vrios caminhos de
tropeiros para a colonizao do serto de Minas Gerais e Mato Grosso, mas foi somente
aps o sistema ferrovirio ser implantado no local ( procura de novos caminhos para o
escoamento do caf) que a regio conseguiu algum desenvolvimento urbano e social.
Indicar estes dois momentos na conformao urbana da cidade de So Paulo (Cinturo das
Chcaras e Cinturo Caipira) e suas ramificaes na regio metropolitana servir como20Sobre esse tema, iremos aprofundar mais no captulo 05.
Ilustrao 6 - Imagem extrada do Google Earth onde podemos verificar a extenso das terrasocupadas para o reflorestamento da empresa Melhoramentos S.A.
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elemento condutor de parte de nossa dissertao no intuito de confirmar e conceituar o
processo de especializao do tratamento psiquitrico e as consecutivas implantaes que se
seguiram aps a criao do primeiro Asilo no tringulo histrico e a escolha, que nunca se
configurou de forma aleatria, do Asilo de Alienados do Juquery no ltimo cinturo urbano.
Para compreender a dinmica que atualmente determina as relaes scio-urbanas
dessas cidades, identificaremos as principais vias de acesso como as atuais estradas de
rodagem e a malha ferroviria centenria, pois as mesmas foram ao longo do tempo os
vetores de crescimento urbano da regio.
O sistema ferrovirio foi trazido pelos Ingleses na segunda metade do sculo XIX
com ntida ateno ao mercado de bens de produo, transportando de maneira eficiente o
caf e outros produtos que deveriam chegar ao Porto de Santos para serem exportados com
destino Europa e outros pases consumidores. Analisando o processo de instalao da
malha ferroviria, podemos afirmar que a construo da estrada inglesa (So Paulo
Railway), aps vencer a regio da Serra do Mar, seguiu a estratgia de privilegiar regies
cafeeiras, portanto mais lucrativas, do que seguir uma lgica de expanso mais condizente
com a topografia de mar de morros das cercanias da cidade de So Paulo em direo ao
interior.
Como comprovao do sistema de obteno de lucro pela priorizao e reas
produtoras sacrificando a lgica da topografia, podemos relacionar a tentativa infrutfera de
extrao de ouro nas terras do vale do rio Juqueri ocorrido em 1886 por Filoteo Beneducci,
que construiu um pequeno ramal ferrovirio chegando Pedreira onde atualmente encontra-
se a unidade 02 da Casa de Custdia. Aps a verificao que o ouro encontrado no era
suficiente para garantir o sucesso da empreitada, dedicou-se extrao de pedras,
embarcando-as pela Estrada de Ferro com destino a So Paulo. Vale salientar que o local
onde foi construdo o ramal ferrovirio serviu como leito da atual estrada de rodagem que
faz divisa entre as terras do Juquery e a cidade de Franco da Rocha.Tambm devemos considerar, como j foi identificada no transcorrer do texto, a
importncia das vias rodovirias da regio que so as seguintes: em direo a Minas Gerais
tem-se a Regis Bittencourt, na direo de Campinas e interior do estado a Anhanguera, a
Bandeirantes e a estrada Tancredo Neves conhecida como estrada velha. Todas
invariavelmente cortam o vale de forma transversal (sentido Norte-Sul). Tal fenmeno
propiciou algum desenvolvimento urbano e social nas reas que margeiam as estradas, tanto
a ferrovia como as virias, relegando o territrio restante marginalizao econmica.
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Uma reflexo sobre a atuao do Sistema de Sade na Regio
Analisando os dados que at agora formalizam a hiptese de instalao de um
importante plo agregador como o Asilo do Juquery em um local que at ento no havia
crescimento populacional relevante, mas que apresentava a latncia forte de expanso
urbana, podemos afirmar a vanguarda de poltica urbana que o Dr. Franco da Rocha,amparado por Ramos de Azevedo, desenvolveu quando escolhera a fundao de um novo
Asilo para o tratamento psiquitrico da populao paulista na vrzea do Rio Juqueri. Afinal,
a regio da Cantareira, que faz limite geogrfico entre a cidade de So Paulo e a regio do
Vale21, foi utilizada para a instalao de servios de sade para a populao da cidade
dcadas anterior. Podemos citar locais que se desenvolveram com a vocao de tratamentos
de sade: Guapira22(atual Jaan) com o Asilo de Invlidos e leprosrio (1904) e a regio
do Mandaqui
23
(1938) com um hospital para tuberculosos, ambos prximos da serra da
21 A transposio da Serra da Cantareira, em viagens areas de norte para sul, possibilita, talvez, asobservaes mais interessantes para a pesquisa geomorfolgica, em torno da regio de So Paulo. Esse primeirodegrau mais saliente e contnuo do Planalto, que a Cantareira, apresenta uma assimetria pronunciada: enquantoo seu reverso setentrional constitudo por um macio grantico, sujeito a um amplo rejuvenescimento regional,a sua face sul descai em frentes escarpadas, demonstrando sensvel rejuvenescimento local recente. A vertentenorte, drenada para a bacia do rio Juqueri, apresenta uma escultura grantica macia e suave, com formas dematuridade moderada. A frente sul do macio que d para o Tiet e a bacia de So Paulo, denota aspectos de umverdadeiro escarpamento, nos sops do qual, 300 metros abaixo, encaixados em uma espcie de depresso,iniciam-se os terrenos da bacia de So Paulo. (ABSABER, Aziz Nacib. Geomorfologia do Stio Urbano de SoPaulo, p. 23)
22
Na dissertao aparecero vrias citaes do mesmo lugar, hora como Gopova, pois a estao doTramway chamava-se assim, mas o bairro seguia com o nome de Guapira.23Cf. SIEFER, Elsa Walsh.Arquitetura em Sade Pblica: Parque Hospitalar do Mandaqui.
Ilustrao 7 - Sistema virio existentena Macro-metrpole de So Paulo eque passa pelo Vale do Rio Juqueri(desenho feito pelo autor que faz parte
do material utilizado pelo grupo depesquisa da FAU-USP)
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Cantareira. As encostas da Cantareira viriam se definir como vocao de subrbio recreativo
e hospitalar, funes que a rea ainda conserva, ao lado de outras vocaes surgidas depois.
A rea compreendida entre Perus e Franco da Rocha (ento estao Juqueri)
assumiu, no incio do sculo XX, as principais caractersticas funcionais que podemos
encontrar ainda hoje: extrativismo mineral, fabricao de papel e a cura psiquitrica. Pelo
carter extensivo das instalaes ligadas a estas atividades, a rea viria a se caracterizar
como pouco propcia expanso urbana residencial.
A acrpole de So Paulo e o l itoral sant ista
A formao da regio de So Paulo na poca da colonizao portuguesa foi bastante
diferenciada das outras capitanias, pois as intenes da Metrpole Colonizadora
vinculavam-se a extrao de toda a matria prima que pudesse dar lucro ao mercado externo
europeu, no se concretizou de forma imediata na regio.
A Vila de So Paulo foi fundada em 1554 por jesutas comandados por Padre
Anchieta com a inteno de catequizar as tribos indgenas da regio para expandir e garantir
a colonizao portuguesa na rea. Usando como base a Vila de So Vicente, os jesutas
chegaram ao planalto paulistano a boca do serto e se fixaram em uma colina prxima
vrzea do rio Tamanduate, afluente do rio Tiet. A situao geogrfica do stio escolhido
pelos padres era muito boa, pois permitia a construo de seu colgio e edifcios vizinhos
num plano alto, seco e bem protegido das tribos inimigas e animais selvagens. Segundo
Benedito Lima de Toledo muito da configurao das ruas iniciais do povoado foram
delimitados pela existncia de muros defensivos construdos pelos jesutas24. Em seu texto
tambm indica a importncia geogrfica da vila como importante convergncia de
caminhos de tropeiros ao longo dos quais surgiam pequenos stios e chcaras 25.
Para ilustrar a configurao geogrfica do stio primitivo de So Paulo podemos citar
duas descries que o viajante Saint Hilaire fez durante a visita provncia em 1851, ambas
retiradas da tese de doutoramento do gegrafo Absber uma descrevendo a conformao
geogrfica do caminho do mar at a vila e a outra sobre o prprio stio de So Paulo:
A cordilheira (sic) que, como j se disse em outro ponto desta narrativa, se prolongasempre prxima do oceano, por grande extenso do territrio brasileiro (Serra do Mar),divide a provncia de So Paulo em duas partes assaz desiguais o litoral (Beira-mar) e
24TOLEDO, Benedito Lima de. So Paulo, Trs cidades em um sculo, p. 13.25TOLEDO, Benedito Lima de. So Paulo, Trs cidades em um sculo, p. 13.
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o planalto (Serra a cima). Esta ltima expresso quase que bastaria para indicar que, aoeste da cordilheira martima, no e encontra o mesmo nvel que beira-mar. Depois detransposta a cordilheira, atinge-se o imenso planalto que forma to grande parte doBrasil e cuja a altura mdia segundo ESCHWEGE, de 761-72m (2.500 ps ingleses);por conseqncia, no h tanto para subir do lado do ocidente, quanto do lado oposto. mesmo evidente que, acima da cidade de Santos, a serra , apenas rampa muitoacidentada e muito escarpada do planalto, pois que, alcanando o seu ponto culminante,no se encontra, num espao de 7 a 8 lguas, isto , at So Paulo, mais do que umaplancie ondulada, cuja a rampa , apenas, sensvel. (Saint Hilaire, 1851; 1945, pp. 69-69)
A cidade de So Paulo situada, como j se disse, a 233310 de latitude sul, sobreuma eminncia que termina a plancie elevada que se percorre quando se vem dasmontanhas do Jaragu e que a mesma plancie s est ligada por um dos lados. Abaixose estendem vastos terrenos planos e pantanosos (vrzeas); muito irregular em seuscontornos, que tem forma um tanto alongada, e ocupa o delta (sic) formado pelosribeires Hinhangaba e Tamanduatahy; os quais, depois de reunidos desguam noTiet. Se, para ter uma idia justa da extensoe da posio da cidade de So Paulo, se
fizer um passeio em seu derredor, ver-se- que, do lado do norte, o horizonte fechado,pouco mais ou menos de oeste a leste, por uma cadeia de pequenas montanhas, em meiodas quais se destaca o pico do Jaragu, que d seu nome a cadeia (sic); mais elevado doque os morros vizinhos, esse pico apresenta, de um de seus lados, um intervalo sensvele, visto de longe, parece terminar por uma cpula arredondada, em cuja extremidade seerguesse uma pequena ponta. Do lado leste, o terreno, mais baixo que a cidade, estende-se, sem desigualdade, at a vila de Nossa Senhora da Penha, que se avista no horizonte.Em outros lugares notam-se no terreno movimentos mais ou menos sensveis e, para osul e o oeste, o mesmo se eleva acima da cidade (Saint HIlaire, 185; 1945, pp. 172-173) 26.
Estas duas inseres servem - principalmente a primeira delas - para confirmar a tese
de que as vilas de So Paulo no interior do planalto paulista e as vilas de So Vicente e
Santos formavam na verdade um nico territrio urbano, seguindo a moda portuguesa de
apropriao do espao, com suas limitaes impostas pelo tipo de cidade, separados pelo
paredo da Serra do Mar.
SO PAULO
SANTOS
26ABSABER, Aziz Nacib. Geomorfologia do Stio Urbano de So Paulo, p. 34.
Ilustrao 8 Imagem retirada dopster www.vistadivina.com, ondese pode ver as cidades de Santos, aSerra do Mar e a cidade de SoPaulo.
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A colonizao da baixada santista deu-se de forma semelhante s outras
implantaes ibricas nas terras americanas onde o regime de plantages27 gerou uma
organizao do espao fsico a servio da economia de mercado. O primeiro sistema de
produo agrcola utilizado na baixada o engenho de cana-de-acar tinha a pretenso
de produzir acar com vistas ao mercado internacional e no para suprir a demanda da vila,
afinal o produto no era de subsistncia, mas sim visava o lucro em sua venda (os produtos
gerados em So Paulo neste perodo eram as farinhas de mandioca, trigo e milho, a canjica,
o curau e a pamonha, esses sim com forte apelo no mercado local).
A decadncia da produo canavieira na regio foi extremamente rpida j que a
localizao de So Vicente era demasiadamente distante dos portos europeus em
comparao com as terras do nordeste tambm produtor. Alm da limitao da distncia,
sua topografia impedia grandes extenses de plantaes exigidas para o canavial pois o
grande paredo geogrfico da Serra do Mar, estava bastante prximo da costa onde a
incidncia de reas alagveis como brejo e manguezais delimitava ainda mais o pouco
espao adequado para a plantao.
Podemos verificar ento que a importncia logstica da vila de So Paulo permitiu
uma dicotomia nica com Santos e So Vicente formando um porto seco (So Paulo) e
porto martimo (Santos) considerando assim como uma nica cidade separada pela serra
do mar.
So Paulo, desde o sculo XVI, seguiu marginalizado do ponto de vista de Portugal
at o princpio do sculo XIX, no tendo papel significativo na extrao de Pau-Brasil na
primeira centria de 1500, nem na produo de cana-de-acar que predominou no nordeste
litorneo, nem na criao de gado que avanou para o interior brasileiro. Nos sculos XVI,
XVII e XVIII forneceu mo-de-obra para a descoberta e extrao de ouro, prata e pedras
preciosas em Minas Gerais nos sculos XVII e XVIII, teve um comrcio modesto e
localizado de muares na regio de Sorocaba e Jundia que forneciam transporte para as
expedies que desbravaram o interior da colnia procura de riquezas.
A Capitania viveu, por muitos anos das expedies realizadas para a escravizao de
indgenas e para a procura de minrios preciosos atravs da grande bacia de rios que
cortavam a regio. J em fins do sculo XVIII, na regio de It existiu grande produo de
cana-de-acar para exportao, mas que infelizmente o mercado internacional j contava
com abundncia deste produto por outras colnias europias como as Antilhas.
27PETRONE, Pasquale.Aldeamentos Paulistas, p. 27.
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Podemos admitir que a colonizao de So Paulo e cercanias at meados do sculo
XIX foi configurada como um processo adaptativo ao meio e ao mundo indgena, j que So
Paulo no se configurava como grande produtor de matrias primas exclusivas das
Amricas. So Paulo apenas se apresentava vivel enquanto povoamento por sua
localizao estratgica em relao ao domnio do interior da Amrica do Sul disputado com
a Espanha.
O crescimento de So Paulo nestes sculos foi balizado pela fundao de vrios
povoados ao seu redor como, por exemplo: em 1611 Mogi das Cruzes, 1625 fundaram
Santana de Parnaba, em 1645 Taubat, 1653 Jacare, 1655 Jundia, Guaratinguet e Itu em
1657, Sorocaba em 1661. Ao terminar o sculo XVII os paulistas haviam povoado a regio
do planalto28. A sangria no tecido do territrio foi outro condicionante para o povoamento
dessas vilas e seguindo as bandeiras paulistas, foi desbravado posteriormente todo o serto
de Gois, Minas Gerais e Sul do pas.
No incio do sculo XIX em So Paulo inicia-se o ciclo comercial do caf, atingindo
primeiramente o Vale do Paraba, onde acarretou em prosperidade e riqueza para a
esquecida provncia. Deve-se creditar ao caf as melhorias nas tcnicas construtivas com a
importao de novos materiais. Para que isso ocorresse o caf paulista proporcionou a
instalao e o crescimento de um sistema de transporte frreo capaz de vencer o acidentado
terreno da Serra do Mar, ligando assim com rapidez o porto seco com o porto molhado
So Paulo Santos.
O caf permitiu para So Paulo uma verdadeira transformao, passando de
miservel vila at chegar ao comeo do sculo XX como principal estado da unio, j no
perodo republicano. Seu sistema de produo induziu grandes massas de trabalhadores
braais para a lavoura, negros escravos (em um primeiro momento) e imigrantes europeus
que permitiram s tradicionais famlias paulistas a possibilidade de angariar fortuna com a
produo do gro. Alguns imigrantes j urbanizados que chegavam na cidade, via porto deSantos no encontravam espao social de atuao j que a formao paulista ainda se
encontrava em estagio agrrio e portanto, ficavam a margem da sociedade onde muitos
acabavam se tornando os alienados que iriam povoar o Asilo do Juquery.
Aps o incio da industrializao de So Paulo a classe operaria que se originaria
tambm estaria calcada na massa imigrante, pois aqueles com formao urbana e/ou aqueles
que no se adaptaram na lavoura cafeeira viriam formar as novas indstrias na cidade.
28REIS FILHO, Nestor Goulart. So Paulo: Vila, Cidade, Metrpole, p. 45.
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Engana-se quanto a possibilidade de ascenso social desta classe, j que visvel pelo
trabalho de Warren Dean29que aqueles que se enriqueceram aqui no Brasil j vinham de
classe social abastada na Europa e tinham alguma indicao ou especializao no trabalho
das indstrias.
O Cinturo das Chcaras
Baseando-se no estudo de geografia urbana detectada pela Tese de Doutoramento de
Juergen Richard Langenbuch30 discorreremos sobre a formao e crescimento da regio
metropolitana da Capital atravs da formao de dois anis perimetrais de urbanizao
que ocorreram no decorrer do crescimento da regio, desde o incio da ocupao do
povoado at o sculo XX e suas relaes de interdependncia com as vias de circulao,
principalmente a malha ferroviria instalada, que afinaram a configurao da Mobilidade e
Acessibilidade que determinam a base de criao da Metrpole Paulistana.
Neste estudo, Langenbuch tambm determina algumas caractersticas importantes
para se entender a formao de uma metrpole como So Paulo e como ela se inter-
relaciona com a regio escolhida para a dissertao:
expanso como crescimento horizontal, desdobramento em pequenos ncleosperifricos, aglomerando e absorvendo as cidades vizinhas;
estrutura funcional grande especializao de atividades em diversas reascom polarizao secundria exercidas pelos sub-centros;
limites externos imprecisos aglomerao de reas descontnuas e muitas norelacionadas entre si;
arredores urbanizados no h zona rural convencional mas o surgimento deuma estrutura urbana fortemente ligada metrpole (periferia) e neste contextopode-se inserir a atual situao da cidade de Franco da Rocha, sede do ComplexoHospitalar do Juquery, que desde os anos 70 transformou-se de ncleo detratamento predominantemente hospitalar para cidade dormitrio. O grandefluxo de migrantes recm chegados em So Paulo escolheu como sistema deacesso ao trabalho e moradia o trem de subrbio que faz a ligao destas
cidades com a metrpole.
Retomando o entendimento sobre o processo de crescimento urbano de forma radial,
se distinguindo tais fenmenos em perodos de tempo consecutivos, pois o processo de
formao claro na sua leitura espacial enquanto o Cinturo das Chcaras apresentava
carter residencial, de mediana produo agrcola e tambm, em um primeiro momento,
permitiu a instalao de servios que deveriam estar apartados do resto da cidade como, por
exemplo: cemitrios, hospitais, colgios e depsito de plvora, entre outros. J o Cinturo
29DEAN, Warren.A Industrializao de So Paulo (1880-1945).30LANGENBUCH, Richard.A Estruturao da Grande So Paulo: estudo de geografia urbana.
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Caipira, espao consecutivo ao das chcaras apresentava um carter de extrao de bens,
como lenha, madeira, pedras e olarias e tambm comportava reas exclusivas de recreao e
de culto religioso. Atravessando esses dois cintures, as estradas de muares permitiam a
ligao entre as partes urbanizadas e os portos seco/molhado, convergindo para o centro de
So Paulo.
Segundo Langenbuch, aps o controle do espao da acrpole paulistana pelo
povoado dos Jesutas, iniciou-se a expanso do urbano atravs das reas mais baixas ao
redor do Ptio do Colgio, mesclado com alguns resqucios de atividades rurais de pequeno
e mdio porte, o qual ficou conhecido como cinturo das Chcaras.
Em um segundo momento da expanso urbana, com toda a rea do primeiro cinturo
ocupada ou articulada com o sistema ferrovirio implantado, um outro cinturo se expandiu
alm das barreiras fsicas da urbanizao da capital, e se alojando em reas mais afastadas
do centro urbano de ento, determinando as relaes de poder e comrcio com os povoados
mais afastados que formam as bordas da metrpole paulistana. Em sua tese, Langenbuch
denomina esta nova expanso urbana de cinturo Caipira que segue o sistema ferrovirio,
desbravando e aglutinando outros povoamentos urbanos da regio.
Como j vimos, at o incio do sculo XIX a rea urbana da cidade de So Paulo
era composta pelo tringulo original formado em torno das igrejas Carmo, So Francisco e
So Bento, com seus respectivos largos na denominada Acrpole paulistana. Logo abaixo
deste planalto formado pelo delta dos rios Tamanduate e Anhangaba comeou um novo
tipo de assentamento: o cinturo de chcaras, com a funo residencial e de produo
agrcola bsica de frutas e verduras. A populao rural era maior que a urbana, j que no
Ilustrao 9 - Imagem extrada de ReisFilho, Nestor Goulart So Paulo Vila,Cidade, Metrpole (pg. 123.), onde sepode verificar a ampliao das divisas deSo Paulo, atravs dos novos bairros
expandidos
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plano rural que a produo de bens realizada com uma economia agrria de bens de
consumo.
Conforme a descrio da tese de doutorado, pode-se confirmar a pequena proporo
que as terras urbanizadas em So Paulo e o incio do processo de ampliao de seus limites todos voltados em direo dos caminhos que levavam ao interior e suas riquezas:
Em 1810, a parte compacta da cidade ainda se restringia extremidade do esporoque constitui o interflvio Tamanduate-Anhangaba, e que corresponde parte antigado atual centro paulistano. As atuais ruas Brigadeiro Tobias, So Joo, Sete de Abril,Consolao, Santo Amaro e Glria constituam eixos de urbanizao que prolongavamlinearmente a cidade em algumas direes, sem, contudo atingir grandes distncias.31
Estes novos assentamentos aparecem como locais de moradia para famlias com bom
poder aquisitivo como: Dr. Mello Franco, Brigadeiro Bauman, Marechal Arouche Toledo
Rendon, Brigadeiro Jordo, Marquesa de Santos32, entre outros. A formao deste cinturo
representou em sua implantao uma mudana em relao conformao urbana inicial, j
que em So Paulo definiu-se reas parecidas com as quintas usadas em Portugal:
propriedades de subrbio com dimenses suficientes para formar plantaes de frutas e
verduras, mas no capazes de adquirir grandes propores (latifndios) como em outras
Provncias. Como cita Langenbuch, estes assentamentos chamaram a ateno de vriosviajantes da poca como Saint Hilaire. Segue a descrio feita pelo viajante que comenta :
Se as habitaes ricas (fazendas) no so muito comuns neste distrito, como na maiorparte dos outros, conta-se ao menos um grande nmero de chcaras. Exceto nasproximidades do Rio de Janeiro, pouqussimas vi durante todo o curso de minhasviagens, mas nos arredores de So Paulo, esto elas disseminadas por todos os lados,contribuindo singularmente para o embelezamento da paisagem. Muitas delas tmgrandes cercados, onde se vm plantaes simtricas de cafeeiros e at as regularmente
dispostas de laranjeiras, jaboticabeiras e outras rvores frutferas
33
.
Estas rvores se destacavam principalmente pela caracterstica predominante de
produzirem frutas europias que se aclimataram no local como, por exemplo: laranjeiras,
jabuticabeiras, ameixeiras, pessegueiros, figueiras, limoeiros, cerejeiras, caramboleiras, etc.,
e que, segundo o texto de Langenbuch, tinham o carter de suprir a necessidade da prpria
31FELIZARDO E COSTA. Planta da Imperial Cidade de So Paulo, 1810. Apud LANGENBUCH, Richard.A Estruturao da Grande So Paulo: estudo de geografia urbana, p. 9.
32
LANGENBUCH, Richard.A Estruturao da Grande So Paulo: estudo de geografia urbana, p. 10.33SAINT-HILARE, Auguste de. Viagem Provncia de So Paulo, p. 202. Apud LANGENBUCH, Richard.A Estruturao da Grande So Paulo: estudo de geografia urbana, p. 10.
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propriedade alm da explorao no restrito mercado interno da Vila. So nestes bairros que
os novos postulados da higiene e modernidade sero introduzidos e testados para que
posteriormente tais inovaes promovam o primeiro desmonte do centro histrico da cidade.
Em ltima analise, a rea do Cinturo de Chcaras se conformou no como umazona rural em relao ao centro polarizador, mas sim como subrbio da cidade, onde
famlias com maior poder aquisitivo puderam ocupar e criar novos bairros mais abastados e
que posteriormente configuraram reas de forte apelo para as transaes sociais contguas
ao antigo centro de So Paulo.
Entre 1769 e 1900 este cinturo expandiu-se, tomando uma forma compacta em seu
territrio, circundando os antigos bairros da regio central de So Paulo e conformando os
atuais contornos dos bairros da Ponte Grande, Pari, Brs, Mooca, Cambuci, Vila Mariana,Jardim Paulista, Vila Amrica, Santa Ceclia, Barra Funda e Bom Retiro. A regio do Vale
do Tamaduate vai favorecer a utilizao de suas terras como local de implantao de
leprosrios e da segunda instalao do Asilo de Alienados de So Paulo (isso ser
comentado mais frente neste texto) por ser de difcil acesso e terrenos muito baixos e
alagadios pelo rio Tiet.
O papel dos antigos caminhos de tropeiros que partiam do centro urbano e geravam
eixos de crescimento da atual cidade foi importante para a interligao da vila com os outrospovoados fundados pelas sucessivas ondas de expanso promovidas pelas bandeiras
paulistas com o intuito de controlar o interior. Mas nesta dissertao, o intuito de discorrer
sobre o primeiro sistema de transporte/circulao est intimamente condicionado
mobilidade que permitiu So Paulo conquistar seu interior e expandir importantes centros
urbanos para a dicotomia entre os portos seco-molhado (So Paulo e Santos) na produo de
gneros alimentcios. Focalizar-se- as estradas de muares que seguiam em direo a face
norte e, portanto mais interiorizada, e no crescimento urbano das vilas que ajudaram naconformao do atual territrio da bacia do rio Juqueri.
Conforme Langenbuch as principais estradas que convergiam para So Paulo
provocavam confluncia da circulao no centro da cidade e que acabava por afetar os
bairros vizinhos. Os produtos de exportao vindos do interior e que iam para o porto de
Santos passavam por esse intrincado sistema, afetando toda a extenso da rea urbana
atingida. Outra caracterstica dessas vias era sua precariedade, o que causavam
freqentemente em interrupes, exigindo alojamento e alimentao para os viajantes. Os
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pousos34da regio como Feliz, Taipas, Vila do Jaragu, Perus, Jaguari Au (Juqueri)
surgiam na paisagem prxima a So Paulo e serviram como pontos catalisadores para a
urbanizao posterior do Cinturo Caipira (o pouso do Juqueri surge neste momento como
um destas localidades ligadas ao comrcio).
O Cinturo Caipira
Para analisar o desenvolvimento urbano no fenmeno do Cinturo Caipira,
aproveitaremos o nosso objeto de dissertao para traar um paralelo entre o povoado do
Juqueri e os outros povoados que tambm surgiram nesse perodo
Desde sua fundao, o pouso do Juqueri apresentou caractersticas muito
semelhantes de outros ncleos de povoamento ao redor da Vila de So Paulo tambm
formados neste perodo35. A implantao do povoado teve que se adaptar na topografia
acidentada da regio (mar de morros), alm de garantir a proteo do territrio e o pouso
para as rotas de tropeiros que seguiam para Jundia.
Ilustrao 10 Mapa da Capitania de So Paulo, e seu serto (...) delineado por Francisco Tosi Columbina.Mostra as estradas para transporte por muares do sculo XVIII Fonte. BNRJ (imagem retirada de Reis Filhos,Nestor Goulart Memria do Transporte Rodovirio. pg.18).
O povoado surgiu entre o fim do sculo XVI ou meados do sculo XVII em torno da
Capela de Nossa Senhora do Desterro, erguida por Antonio de Souza Del Mundo. Em 1696,
34 A quantidade dos pousos era surpreendentemente grande, mas em sua maioria as condies de suamanuteno predial eram precrias, com acomodaes pequenas e com o mnimo conforto, sendo que algumas
apresentavam apenas uma rea coberta para o descanso dos animais.35 Sobre essa questo, ver LANGENBUCH, Richard.A Estruturao da Grande So Paulo: estudo degeografia urbana.
No detalhe podemos perceber alocalizao do povoado do Juquery, oprprio rio Juqueri e a rea queposteriormente foi transformada nafazenda do Juquery
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o local foi elevado categoria de Vila de Nossa Senhora do Desterro de Juqueri, palavra
tupi que designa uma planta leguminosa, conhecida tambm como dormideira abundante
nas margens do rio. No ano de 1783 passou a ser parquia. A Vila de Juqueri adentrou o
sculo XVIII como fonte de produtos agrcolas para So Paulo, chegando a produzir
algodo e vinho para exportao. Ela no prosperou como outras localidades inseridas nas
regies das lavras de ouro e pedras preciosas, caracterizando-se como pouso de tropeiros
que faziam o abastecimento das Minas Gerais.
Em 1769, a Cmara paulistana determinou a abertura de uma estrada entre Juqueri e
So Paulo. Conhecida como o "Caminho de Juqueri", ela se transformou mais tarde na
Estrada Velha de Bragana. Antes Distrito da Capital (de 1874 a 1880) e de Nossa Senhora
da Conceio de Guarulhos (de 1881 a 1888), Juqueri passou a ser municpio por meio da
Lei Provincial n. 67, de 27 de maro de 1889. Um ano antes da emancipao, a So Paulo
Railway (Estrada de Ferro Santos-Jundia) construiu a Estao do Juqueri36.
preciso ressaltar que na formao do Cinturo das Chcaras e na sua relao scio
econmica com os povoados prximos, o transporte era realizado pelos antigos caminhos de
tropas de mulas que cruzavam a Capital. Fazendo um recorte histrico e levando em conta
as principais caractersticas das estradas de ento se pode indicar algumas referncias que
exemplificam a formao do territrio do vale.
Uma das primeiras referncias sobre a estrada de muares e o pouso do Juqueri foi o
relato do viajante DAlincourt, no qual se refere estrada da Freguesia do e ligao de
Jundia. Quando passou pelo vale, escreveu que Este caminho torna-se impraticvel no
tempo das guas, por ser conduzido por uma vargem inundada pelas cheias do Tiet 37.
Em 1804 houve outra implantao importante: a abertura de uma estrada pela
Cantareira que viria a ser a estrada de Bragana, cujas ramificaes atingiam Socorro e o
Sul de Minas, passando pela Freguesia de Juqueri (atual Mairipor).
Tambm segundo Langenbuch, a regio denominada como Cinturo Caipira
apresenta os seguintes limites: as reas desabitadas prximas a serra do Mar e o rebordo
planaltino, reas onde as caractersticas scio-econmicas so anlogas ao Cinturo das
Chcaras, mas se encontram mais distantes como Juquitiba e as reas de plantao de
produtos de exportao primeiro a cana e depois o caf. Podemos descrever a regio
36
Conforme texto introdutrio sobre a histria da cidade site da cidade de Mairipor -http://www.mairipora.sp.gov.br37SILVA, In Rosa da. Franco da Rocha nas terras de Juquery: um Hospcio, uma cidade, pg 27.
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atravs dos limites que se estendem desde Jundia, Santa Isabel e Mogi das Cruzes e, que
portanto, no configurou uma regio homognea em relao s relaes scio-econmicas.
Aps a consolidao da urbanizao na regio do cinturo das chcaras, a cidade de
So Paulo do perodo inicial do sculo XIX, atravs da criao e uso contnuo das estradas(desde a de muares em primeiro momento at a ferrovia), ligou as regies mais afastadas,
em sua maioria originada de acampamentos indgenas geridas por jesutas38 e acabou
formando uma relao de simbiose comercial entre os arredores e a capital. Conforme a
tese de Langenbuch a produo agrcola de So Paulo e arredores neste momento tinham
como finalidade os seguintes mercados:
Exportao dos bens de uso secundrio em relao ao comrcio internacional; Culturas de subsistncia (culturas de subsistncia);
Abastecimento da cidade de So Paulo;
Manuteno e abastecimento das tropas em animais e gneros alimentcios.
Tal relacionamento de interdependncia foi to acentuado que a regio dos arredores
urbanos definidos por Langenbuch, recebeu a nomeao de celeiro da Capital em 1838
que coincidentemente descreve a regio de Nazar Paulista, Bragana e Atibaia como
produtores de feijo, milho, arroz alm da produo de sunos. A escolha desta citao para
essa dissertao no foi ao acaso, j que a regio supracitada refere-se nascente da bacia
do rio Juqueri, importante ordenador da paisagem na regio estudada e um dos elementos
principais para a escolha do local para a implantao do Asilo de Alienados.
So Paulo, em 1900, comea a ocupar as vrzeas de seus rios (Tiet e Pinheiros) e
espaos prximos. As estaes de trem tornam-se novos pontos de urbanizao. Para
reforar o contexto de inter-relao entre os bairros e o centro, podemos citar as observaes
que o viajante alemo Hesse Warteg que quando passou pela cidade, no final do sculoXIX:
So Paulo no uma grande cidade (Grosstadt), mas um amontoado de pequenascidades construdas uma ao lado da outra e uma dentro da outra, uma cidade que estaem vias de se transformar em cidade grande, e a nica coisa grandiosa nela o seufuturo39.
38PESSOTTI, Isaias. O Sculo dos Manicmios.39Apud LANGENBUCH, Richard.A Estruturao da Grande So Paulo: estudo de geografia urbana, p. 86.
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Podemos evidenciar com tal comentrio a importncia do sistema ferrovirio para a
implantao dos novos bairros que formaram o cinturo de chcaras e que desenvolveram
entre si plos de influncia distintos e que reafirmam a tendncia de articulao atravs dos
meios de transporte. Como Artur Dias tambm comenta, a cidade vista do alto mostrava
blocos que davam idia de vrias cidades sucessivamente agrupadas dentro da linha
exterior instvel 40.
Para continuar nossa anlise, devemos ampliar um pouco a rea at agora estudada,
abarcando as cercanias de Jundia, pois para compreendermos a formao das cidades
entorno do Asilo devemos nos atentar ao ramal ferrovirio da So Paulo Railway, tambm
denominado Santos-Jundia, afinal neste trecho o Cinturo Caipira tm seu arranjo espacial
e seus eixos de desenvolvimento intrinsecamente ligados pela malha ferroviria que ocupatoda a rea da futura metrpole paulista.
Jundia, conforme o texto de Langenbuch, sempre figurou como um plo urbano
agregador importante antes do crescimento de Campinas como sede das relaes scio-
econmicas entre a Capital e o Interior. Fundada em 1655 como pouso de tropeiros logo
desenvolveu um expressivo comrcio de tropas de muares que conjuntamente com Sorocaba
(1654) abasteceu todo a campanha bandeirante que seguia para as minas de ouro nas Gerais
e no Mato-Grosso. Jundia apresentou ao longo do tempo um desenvolvimento semelhante
ao de outras freguesias da regio, mas sempre teve um carter limtrofe em relao
urbanizao na poca colonial, pois figurava como rea de acesso ao interior. A ascenso
definitiva como plo urbano independente de So Paulo foi a instalao da estrada de ferro
Inglesa que escolheu o ncleo urbano como fim da linha.
Logo aps o incio do funcionamento da rede da Santos-Jundia, os cafeicultores
paulistas se apropriaram de vastas reas prximas estao e fundaram as redes
complementares que seguiam para o interior com a incumbncia de realizar o transporte do
caf das regies produtoras. Apenas em meados do sculo XIX a regio de Campinas, que
antes fazia parte da freguesia de Jundia, se desmembrou e floresceu como novo plo
organizador do espao urbano.
Sistema Ferrovirio e a Bacia do Rio Juqueri como ordenadores doespao
40ARTUR DIAS. O Brasil Atual, pp. 345/346. LANGENBUCH, Richard. A Estruturao da Grande SoPaulo: estudo de geografia urbana, p. 86.
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No sculo XIX o trinmio de atividades que garantiram o desenvolvimento de So
Paulo foram o Caf, a mo-de-obra de Imigrantes e a construo e expanso da rede
ferroviria. Apenas aps a vinda das plantaes de caf do Vale do Paraba para as regies
Oeste e Noroeste que estas atividades encontram terreno frtil para se determinar como
fatores inconfundveis para o desenvolvimento da Metrpole.
O ltimo elemento para o crescimento de So Paulo foi a implantao do sistema de
ferrovias que cortavam a provncia em direo aos plos produtores de caf, levavam a
mo-de-obra imigrante do porto de Santos at as fazendas e agilizavam o transporte do
produto entre estes plos. Como Srgio Milliet cita Atrs do caf por vezes sua frente
penetram as ferrovias 41.
O desenvolvimento da malha ferroviria por So Paulo teve valor indiscutvel na
formao do atual estado e na transformao da Capital em Metrpole no incio do sculo
XX, mas faltava o carter tcnico e planejado para a composio desta malha o que j, em
1875, observava Joaquim Floriano de Godoy e trinta anos mais tarde por Adolpho Augusto
Pinto:
as linhas foram tramadas dia-a-dia, sem nenhuma preocupao de conjunto, semsistema ou coordenao de partes visando a um certo resultado geral 42.
A malha ferroviria da transio do sculo XIX para o XX que envolve a regio deSo Paulo formada pelos seguintes tramos: Santos-Jundia (cobrindo o eixo norte-sul),
Central do Brasil (sentido Rio de Janeiro) e Sorocabana (seguindo a poro oeste do
Estado). Quando analisamos mais atentamente a regio do cinturo das Chcaras, podemos
indicar que no mbito local, a ligao ferroviria de pequeno porte faz-se atravs das linhas
So Paulo - Santo Amaro e o Tramway da Cantareira.
O texto de Langenbuch constata este fato. Segundo ele a implantao da linha da
Companhia Inglesa na regio do Asilo do Juquery, inicia a extino do antigo caminho dastropas de muares que seguiam por Bragana e que manteve por muitos anos a vila de
Juqueri (atual Mairipor) e a posterior mudana das atividades comerciais da regio da
Cantareira-Juqueri para o ramal recm criado:
O exposto favor de ordem fisiogrfica no suficiente para explicar a comentadadicotomia de traados entre ferrovias e caminhos de tropa. Veja-se o caso da ligao
41MAZZOCO, Maria Ins Dias; SANTOS, Ceclia Rodrigues dos. De Santos a Jundia: nos trilhos do caf
com a So Paulo Railway, p. 26.42MAZZOCO, Maria Ins Dias; SANTOS, Ceclia Rodrigues dos.De Santos a Jundia: nos trilhos do cafcom a So Paulo Railway, p. 26.
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So Paulo-Jundia, ambas as estradas procuravam valorizar trechos de vales, noentanto no o fizeram com os mesmos vales. A excessiva sinuosidade da estrada detropas deve ter constitudo neste e em outros casos um fator a mais a justificar odistanciamento da ferrovia. Contudo, as primeiras estradas de ferro estabelecidas emzona cafeeira no hesitavam em perfazer enormes curvas em seu trajeto para atingiralguma fazenda de grande produo e, por conseguinte, propiciadora de grande frete.Destarte, vislumbra-se outro fator a explicar a dicotomia de traados no planaltopaulistano: o traado da estrada de tropa no era seguido, entre outras coisas, por nohaver nada ao longo dele que merecesse a ateno da ferrovia. Assim que duasimportantes cidades paulistas Itu e Bragana (hoje Bragana Paulista) atingidaspor estradas de tropa radiais a So Paulo, passaram a ser servidas apenas por ramaisferrovirios, entroncados na linha Santos-Jundia, respectivamente em Jundia e emCampo Limpo. evidente que assim se fez por no apresentarem a decadente Vilade Parnaba e a pequena Freguesia de Juqueri (sitas nas correspondentes estradas detropa) qualquer interesse para as companhias ferrovirias em questo 43.
Outro elemento que comprova esta aparente desorganizao e desapego tcnico a
favor do lucro imediato, foi a proliferao de pequenos ramais de bitola estreita que faziam
a ligao entre as estaes da Santos-Jundia e as sedes das fazendas produtoras de caf
(conhecidas na poca como Cata Caf44). Alm destes ramais exclusivos, a grande
quantidade de tipos de bitola que caracterizaram a posterior implantao de outras
companhias de estradas de ferro contriburam para a dificuldade de integrao das linhas,
multiplicando as baldeaes encarecendo assim todo o servio envolvido e a rpida
decadncia do sistema.
Aps a implantao da Companhia So Paulo Railway em 1867 e sua consolidaocomo nico acesso da produo do interior do Estado ao porto de Santos, surgem
posteriormente novas empresas de transporte ferrovirio com capital nacional advindo
principalmente da riqueza do caf.
Retomando a questo anterior, a ferrovia marcou o fim do transporte de muares
causando a extino de alguns povoados, a alterao dos fluxos de mercado e a diminuio
do tempo envolvido entre o ensacamento e a chegada ao porto de Santos. Com a criao de
novos eixos de urbanizao, a Vila do Juqueri (atual Mairipor) que perde a sua relativaimportncia enquanto pouso de viajantes, j que a linha ferroviria da Santos-Jundia passa
no entroncamento da vrzea do rio Juqueri com o ribeiro do Euzbio seguindo, portanto, o
caminho menos acidentado e favorecendo o desvinculando da antiga vila e a criao de um
novo povoamento. No caso especfico da Estao do Juquery (fundada em 1888), seu uso
era quase que totalmente vinculado ao abastecimento de bens produzidos na regio e que
seguiam em direo So Paulo.
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LANGENBUCH, Richard.A Estruturao da Grande So Paulo: estudo de geografia urbana.44MAZZOCO, Maria Ins Dias; SANTOS, Ceclia Rodrigues dos.De Santos a Jundia: nos trilhos do cafcom a So Paulo Railway, p. 29.
7/26/2019 Dissertacao Juquery
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Aproveitando-se de um ramal de carga construda pela iniciativa privada com o
intuito de escoar a produo de pedras de uma jazida45, a antiga estao de Franco d