Post on 01-Oct-2020
HISTÓRIA E LUDICIDADE: O ROLE PLAYING GAME E SUA
POTENCIALIDADE PARA O ENSINO INTERATIVO
Loyze Nayama Pereira Gomes1
Mestranda em História pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
loyze_nayama@hotmail.com
Resumo: Analiso como a relação jogo e cultura podem estar presentes no Role
Playing Game (jogo de interpretação de personagens), e atento sobre quando
transformadas em uma narrativa com o RPG, apresentam um potencial educativo e
histórico para além da noção de jogo como atividade apenas para o lazer. Avaliando
neste sentido, a imaginação é um elemento inato da humanidade, como também a
vontade expressar seus conhecimentos, o que pode ser revelado através das possíveis
aventuras criadas coletivamente com o jogo de papéis. Identificando assim a
necessidade de inovação no ensino de História, partindo do ponto que as tradicionais
metodologias de ensino não são mais suficientes para a melhoria da interatividade
escolar e a construção do conhecimento na contemporaneidade. Conceitos que
relacionam o RPG e a História em sua “operação”, pautado nas discussões sobre
representação historiadora e interpretação histórica como é destacado na filosofia da
História. O jogo de interpretação de personagens é mais uma possibilidade para se
trabalhar com formas lúdicas no ensino de História, no qual geralmente desperta de
maneira espontânea o interesse das discentes pelas aulas.
Palavras-chave: Ensino de História, Role Playing Game, Interatividade.
O intuito desse texto está em apresentar uma possibilidade de análise da
História a partir do Role Playing Game2, utilizando-o para o ensino, o que
contribuirá com a formação de estudantes críticas, participativas e que dominem os
conteúdos historiográficos transmitidos através das aventuras com a metodologia do
jogo. Nas quais, estas narrativas podem ser construídas em determinados padrões
1 Graduada em História pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Especialista em Educação
Étnico-Racial na Educação Infantil pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) e Mestranda em
História pelo Programa de Pós Graduação em História (PPGH) da Universidade Federal da Paraíba
(UFPB). 2 Do inglês para o português: jogo de interpretação de personagens. É um jogo coletivo, no qual
geralmente não prioriza a competição desenfreada, além de produzir uma narrativa coletiva, quando todos
e todas as integrantes da mesa (assim chamamos as sessões do jogo) podem interpretar a partir das ações
em que a mestra (quem narra o jogo) define. Surgiu em 1974 nos EUA, desenvolvido primeiramente por
Gary Gygax e Dave Arneson, já no Brasil tomou-se conhecimento nos anos de 1990. Extremamente
influenciado pelos jogos de guerras que são os jogos de tabuleiro atuais, e a literatura de John Ronald
Reuel Tolkien, o autor da trilogia “O Senhor dos Anéis” (1954).
2
societais, nos revelando a capacidade do RPG em transferir conhecimentos
históricos, e perceber como a História é representada.
Geralmente tendemos a refletir muito tempo sobre a pesquisa que almejamos
desenvolver, é um exercício constante neste sentido, que vai desde a primeira
referência, até chegarmos em momentos como são os de seleções de especializações,
mestrados ou doutorados. E o lugar social acaba interferindo em diversos aspectos
do processo, esse é um dos pontos que centrarei nesse texto. Entendo que, enquanto
historiadora, gamer3 e mestra4 RPG, encontro meu espaço enquanto pesquisadora
quando percebo a competência do Role Playing Game para o ensino de História.
É interessante encontrar as perspectivas históricas nos games, sejam
eletrônicos ou de tabuleiros, partindo do pressuposto que a sociedade (em especial, a
juventude) é estimulada o tempo inteiro pelas tecnologias e ludicidades, basta
conversar um pouco com suas alunas e alunos para ouvir os relatos de como uma
aula pode ser mais divertida e menos entediante para todas (os). Trabalho assim
nessa perspectiva, de dar voz as discentes, entendendo que a educação precisa mudar
para atender a realidade do tempo presente. Claro, a escola pode ter todas as
inovações a seu dispor, mas se tentarmos ensinar uma história tradicional, mesmo
com todos os instrumentos tecnológicos, o ensino crítico não será concluído. Por
isso, justifico os motivos de encontrar essas potencialidades com o RPG, porque a
metodologia do jogo em si já quebra com o ensino metódico, quando a mestra pode
explorar as subjetividades das personagens construídas com a turma, além de
determinar ações, cenários históricos, regras, em que os conteúdos possam ser
transmitidos com criticidade.
A representação da mestra neste sentido é essencial para que a interpretação
das personagens (pelas alunas e alunos) tenham os procedimentos propícios para
3 O termo "gamer" geralmente se refere a alguém que joga, seja o RPG de mesa, os MMORPGs (que são
os rpgs online) e também todos os vídeo games em sua variedade de modos e abordagens.
4 É chamada de mestra ou mestre a pessoa que narra o jogo. Ou seja, será quem construirá as narrativas
juntamente com as personagens que formam a mesa de RPG. Ressalto conjuntamente, que sempre estou
usando termos no feminino, por me encontrar em uma luta feminista cotidiana, principalmente em meio a
cultura pop e nerd que é intensificamente machista, como também para quebrar os padrões da escrita
tradicional.
3
construção do conhecimento histórico, e segundo Marcella Albaine em: “Ensino de
História e games: dimensões práticas em sala de aula” (2017), afirma: “Entender o
professor enquanto narrador é, então, essencialmente, entender como ele constrói
sentidos de tempo, elemento primordial no estudo e no ensino de História” (p.43). É
importante considerar que os games de maneira geral, não tem a intenção de se
comprometer com a “verdade” que a História pressupõe. Por isso, o Role Playing
Game tem destaque em minha perspectiva, porque a narrativa representada pelas
professoras (es) construída coletivamente com as alunas (os), para o ensino de
História, que prioriza contextos históricos, ambientações e imaginários (memórias).
Venho pensando muito nestas questões em minha dissertação de mestrado, pois
encontro conceitos em ambas as metodologias (RPG e História) que possibilita a
construção de narrativas historiográficas a partir do jogo. Como os conceitos de:
jogo, representação, interpretação, narrativa, cenário, acontecimento, cultura, regras,
arte e ficção.
Em específico, destacarei a obra de Paul Ricoeur: “A memória, a história, o
esquecimento’’ (2007), Hans Georg Gadamer em: ‘’A atualidade do belo: a arte
como jogo, símbolo e festa’’ (1985) e François Dosse no “Renascimento do
acontecimento: um desafio para o historiador: entre esfinge e fênix” (2013), as
formas em que esses autores dialogam sobre essas conceituações propiciam a visão
que tenho sobre ambas as metodologias. Nesta acepção, decidi trazer algumas
observações sobre a relação das metodologias a partir desses autores citados, e de
seus conceitos semelhantes quando envolvem as noções do RPG, e as práticas
narrativas. Então, já falando como uma apaixonada pelo Role Playing Game e pelo
mundo dos games (cultura pop em geral), como também pela História, e as
construções de suas narrativas, teórica e prática, noto a importância de estudar essa
relação.
O jogo em si e sua relação com a cultura, é perspicaz, porque é o mesmo que
falar do jogo de maneira visivelmente importante para definir aspectos da
significância entre atividades humanas e conceito de jogo. Está tão indissoluvelmente
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ligado a cultura, que Johan Huizinga (2001) notou e pesquisou em seu “Homo
Ludens: o jogo como elemento da cultura” para nos esclarecer que o jogo é muito
mais do que conseguimos definir, principalmente quando transcende nas ocupações
da humanidade. Assim, ele sustenta essa perspectiva em sua obra, quando relaciona o
conceito de jogo com diversas áreas de conhecimento humano, como a Linguagem, a
Poesia, a Arte (em suas diversas formas), as formas lúdicas na Filosofia, no Direito,
na guerra, e o próprio elemento lúdico da cultura Contemporânea.
Refletindo sobre minha pesquisa, a tese de Huizinga (2001) traz um sentido
essencial quando o jogo de papéis pode ser compreendido pela comunicação, pela
atuação, e a representação, como também propicia o estudo de culturas, e entre
outros. Esta visão me propõe pensar sobre os aspectos do jogo (RPG) para o ensino
de História, e como é construído por mim a partir do conhecimento de diversas (os)
intelectuais da teoria e metodologia da História, isto é o que traz a relação com os
conceitos nos quais me propus estudar. Almejo também, com o estudo da prática
com o Role Playing Game demonstrar como as aulas-aventuras no ensino de História
podem encontrar formas de aprendizado essenciais, abrindo assim espaço para
cultura de jogos adentrar o meio escolar respectivamente.
E quando envolve a construção do conhecimento histórico, por exemplo,
como Paul Ricoeur (2007) analisa sobre o que seria a memória em narrativa, a
construção da escrita da História, o conceito de narrativa (interpretação), mestra
(representação), regras, suas manifestações em personagens (alunas), ficções, e
acontecimentos:
Será tão necessário resistir, quando tratarmos mais adiante da explicação e
da representação, à tentação de dissolver o fato histórico na narração e esta
numa composição literária indistinguível da ficção, quando é preciso
recusar a confusão inicial entre fato histórico e acontecimento real
rememorado. O fato não é o acontecimento, ele próprio devolvido à vida de
uma consciência testemunha, mas o conteúdo de um enunciado que visa a
representá-lo (RICOEUR, p. 190, 2007)
5
Consigo considerar a partir disto, que a interpretação do passado (tempo e
narrativa), após uma possível representação (que pode estar ligada a uma memória
individual e coletiva, ou até mesmo a própria intenção de verdade em narrativas
historiográficas) é feita por concepções que a definem. A interpretação está para
todas as fases das produções de narrativas (interligadas), esse é um ponto em que
Paul Ricoeur (2007) se destaca. Sendo escritas por historiadores ou não, sendo
visuais, impressas, ou orais, é interessante para mim, pensar sobre a noção de
representação neste sentido, porque na minha leitura e prática (enquanto mestra) com
o Role Playing Game, a intenção de produzir narrativas históricas se faz presente, e
também estudar essas dimensões acaba ficando mais claro o encontro da dinâmica
nesse processo, e como? Uma mestra RPG (enquanto historiadora) quando faz uma
representação de determinado conteúdo ou sociedade a partir da metodologia do
RPG, está fazendo com que as personagens integrantes do jogo interpretem (que para
o ensino de história seriam as (os) alunas (os) nesse processo de interpretação) que é
um dos reais objetivos do ensino de História, não é mesmo? A interpretação neste
sentido proporciona um ensino crítico da História (claro, depende muito da forma de
quem está representando), além da transformação interativa que as próprias aulas
necessitam. E mesmo que a representação seja tradicional, com base eurocêntrica, as
personagens (tendo o direito a voz ativa na narrativa do jogo) podem desconstruí-la
na forma que a interpretam (em vice e versa), a mestra pode servir-se da sua
representativa história para desconstrução (conhecimento histórico) de alguma
interpretação que esteja fora das regras do jogo, como também acontece na escrita da
História.
As regras é outro conceito em que consigo trazer a semelhança entre as regras
da História (quem a escreve) como a do jogo (quem pratica o RPG), por exemplo,
quando Paul Ricoeur escreve no terceiro capítulo do livro: “A memória, a história, o
esquecimento’’ (2007), sobre a condição histórica em relação as regras (humanas):
“O historiador e o juiz” faz uma comparação sobre a imparcialidade que deveriam
manter na teoria (sabemos que na prática isso não acontece) que é apenas um desejo
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em determinados casos. Mas, o que noto de fato? “Como o historiador e o juiz
cumprem essa regra de imparcialidade inscrita em suas deontologias profissionais
respectivas?”(RICOEUR, p. 331). As regras para quem escreve a História, como
também para quem as julga mostram-se distintas, mesmo mantendo algumas
relações, isto é fato. E acontece semelhantemente em qualquer jogo, existe quem
imponha as regras e quem deve cumpri-las. No RPG, em específico, existe uma
relação interessante com a determinada cultura que seja escolhida para a narrativa,
este é o ponto que relaciono. Pretendo analisar mais profundamente na minha
pesquisa como essas regras humanas se encontram com as regras no conceito de
jogo, a partir de Huizinga (2001), e também na perspectiva de Gadamer (1985).
O filósofo Hans Georg Gadamer (1985), me fez refletir sobre as linguagens
para a História, e o conceito de arte em suas diversas formas. Em que o fenômeno é
atemporal, todo tempo tem suas condições e criações artísticas, trata-se de notá-las
como tal, e nos quais está ligada a fabricação, assim o diz quando cita o filósofo
grego Aristóteles. Com a ruminação que ainda muito precisamos aprender que não é
um modelo estético que define a arte. Para além desse conceito, Gadamer (1985)
analisa a relação com o conceito de jogo, citando Huizinga (2001):
Trata-se especialmente do conceito de jogo. A primeira evidência que
precisamos levar em conta é que o jogo é uma função elementar da vida do
homem, de tal sorte que a cultura humana, sem um elemento de jogo, é
impensável. Há muito tempo foi acentuado por pensadores como Huizinga,
Guardini e outros que o exercício religioso no culto inclui um elemento de
jogo. É louvável lembrar-se aqui o dado elementar do jogo humano em suas
estruturas, a fim de que o elemento lúdico da arte torna-se visível, não
apenas de modo negativo, como libertação de objetivos mas como impulso
livre (GADAMER,1985, p.38)
Assim, esse impulso livre de jogo e arte em minha leitura envolvem muito os
jogos contemporâneos (como o Role Playing Game), quando é possível notar as
intenções do elemento lúdico nas produções, que também são artes e formas de
comunicação5. E é esta comunicabilidade que pretendo analisar mais profundamente
5 “Este é um primeiro passo no caminho para a comunicação humana; quando algo é representado aqui ---
seja apenas o próprio movimento do jogo --- importa também para o espectador que ele “queira dizer”,
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em minha pesquisa, visto como é interessante para o ensino de História quando um
recurso interativo, ou seja, como o jogo de papéis, acalentar todos esses conceitos
significativos, como também é essencial para a existência da escrita historiográfica.
Outra discussão interessante é sobre o conceito de acontecimento, pontuado
pelo historiador François Dosse (2013) em sua obra, esta é uma concepção em que
me faz refletir sobre a importância do acontecimento para determinar momentos
históricos e como serão conhecidos a partir das representativas narrativas que são
construídas, e a forma crítica como o autor pensa a História é primordial para o
entendimento das permanências e mudanças (diante dos acontecimentos). E porque
esse conceito é importante para uma narrativa histórica com o Role Playing Game? A
metodologia do jogo sempre foca em cenários (quase sempre históricos, mesmo que
não tenha a intenção disso, especificarei melhor na dissertação) e eventualidades que
designarão a interpretação das personagens, ou seja, o conceito de acontecimento é
importante para as duas metodologias, tanto a histórica quanto a do jogo (como
também os outros conceitos que citei acima).
Outro livro importante para pensar a interdependência dos jogos com a
cultura é o “Os jogos e os homens” (2017) de Roger Caillois, quando afirma
veemente que contém jogos diretamente manifestados aos nossos costumes
cotidianos: “Elas contribuem, com efeito, para dar às diferentes culturas alguns de
seus usos e de suas instituições mais facilmente identificáveis” (p.86). Caillois
elabora uma obra essencial para entender como o jogo se mostra um fenômeno e que
expressam as ambições humanas a partir do conjunto de atividades desenvolvidas
com suas práticas.
A linguagem é uma complexa rede de comunicação que utilizamos desde os
primórdios de sociedades que conhecemos hoje ou não, existe uma inatividade
presente, acredito. E a obra de Pierre Normando “Semiótica dos jogos infantis”
intencione isso --- assim como eu coloco-me diante de mim mesmo, no jogo, como um espectador. A
função da representação do jogo é que no final esteja não um algo qualquer, mas aquele movimento do
jogo definido e determinado. O jogo, em última instância, é portanto a auto-representação do movimento
do jogo.” (GADAMER, 1985, p. 39)
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(2015) é interessante para afirmar esta questão, e também encontrar na linguagem o
que Huizinga (2001) já chamou de “essência do jogo”. O jogo, como prática viva da
linguagem: “Entre a jogada e a regra”, no capítulo dois do livro, Normando (2015)
especifica que tanto o jogo, a linguagem e os próprios signos (semiótica) que os
compõem servem para analisarmos como práxis culturais:
O objetivo é encontrar nos jogos tanto os signos sociais quanto os índices
pulsionais, ou seja, entendemos que o jogo não só reflete ou representa uma
determinada intenção social, ideológica político-cultural, mas é também
refração, resistência social, expressão individual e inconsciente. De modo
que analisamos o jogo não como uma homologia dentro da estrutura de
funcionamento do jogo. Mas como captação das muitas jogadas, como
vozes que se organizam na tessitura do jogo (NORMANDO, 2015, p.75)
O jogo é uma narrativa, assim como diversas outras práticas sociais, de
maneira como a narrativa da História também é. Segundo Roger Chartier em “A
força das representações: história e ficção” (2011), o relato histórico permite
ressaltar os parentescos narrativos ou retóricos entre ficção (onde entram os jogos) e
a história, e que o conhecimento a partir delas pode ser estudado sem comprometer a
escrita de uma historiadora ou de um historiador, por exemplo: “São essas operações
e regras que permitem assegurar a representação histórica do passado...” (p.116).
Estruturas narrativas e representações podem e devem ser analisadas, é o que requer
também o nosso ofício, neste sentido, Chartier traz uma importante reflexão sobre as
diversas relações que podem ser encontradas nas representações do passado
produzidas pela ficção narrativa e a construção do saber histórico em sua
“operação”.
Culturas que se convergem na contemporaneidade, assim escreve Henry
Jenkins na sua obra: “Cultura da convergência” (2009), as narrativas transmídias é
o conceito que permeia todo o livro, na consideração ainda das estruturas de
linguagens nas quais a conceituação se encontra: jogos, filmes, literaturas,
programas de TV e entre outros, se entrelaçam e são formas, atividades,
comunicações que podem ser vistas como instrumentos essenciais para escrevermos
História, entendendo que existem níveis de “verdade” que a História se compromete
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e a ficção não. Assim como ao darmos a nossa representação dela, respectivamente?
Entendo que sim, e ainda podemos desfrutar do elemento lúdico original, que seria o
envolvimento, divertimento, e comunicação humana, segundo Huizinga (2001).
E quando se trata do Role Playing Game (que envolve esses diversos
conceitos que venho pontuando neste texto), penso no sentido de teoria e prática,
defendendo a dinâmica do jogo para o ensino de História, depois de um bom tempo
de reflexões, entre minhas próprias experiências e também das leituras de
professoras e professores que trabalham com o jogo. O livro dos “Anais do I
simpósio de RPG e educação” (2004), organizado por Maria do Carmo Zanini, é um
exemplo, porque reuniu no ano de 2002 diversas educadoras e educadores para que
conhecessem a metodologia e ousassem utilizar dela em suas aulas. O evento
contribuiu para esse novo espaço, representou e ensinou como praticar, além de
centrar nas mesas de RPG fora das salas de aula também.
O mercado de consumo do final do século XX permitiu o acesso de uma
variedade de produtos de consumo imaginário, e segundo Sonia Rodrigues em seu
livro: “Role Playing Game e a Pedagogia da Imaginação no Brasil” (2004), o jogo
foi inventado pela indústria cultural geralmente para um público jovem e de classe
média (noto que geralmente masculino, assim como a maioria dos games, foram
espaços negados as mulheres por muito tempo), explica como o interesse que as (os)
jovens demonstram depois do terem o primeiro contato com o jogo, já que essas
produções fazem parte do meio midiático em que vivemos na contemporaneidade. Já
a mistura de RPG e ensino ganha espaço no nosso país desde 1997, e pela pioneira
tese de doutorado de Sonia (2004) sobre o jogo de papéis no Brasil, a obra é
interessante para quem procura diálogos entre criatividade, literatura, ficção e
interatividade, seja na escola, no trabalho, são manifestações pela busca incessante
do lúdico, elemento que julgo essencial para nossa saúde mental.
O psicólogo Matheus Vieira trabalha há muitos anos (desde 2006) com a
metodologia do Role Playing game para educação, e relata sobre suas diversas
experiências em seu livro: “RPG & EDUCAÇÃO: pensamentos soltos” (2012),
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trazendo temas como violência, novas abordagens educacionais, trabalho em equipe,
desenvolvimento de valores, interdisciplinaridade, todas essas características
especiais presentes no ato de jogar RPG, compreendido como “teatro da mente”, o
jogo vem alcançando espaços que antes (1974) eram apenas de preconceito, Matheus
(2012) já chamou de “Nível épico do RPG na educação”, o que ainda é meio utópico,
mas entendo sua perspectiva porque a partir de seu trabalho, atingiu grandes passos,
como o mesmo disserta:
Os primeiros passos já foram dados. Já foi feito um curso de extensão
universitária de introdução ao RPG como tecnologia educacional e
ofertamos praticamente esse mesmo curso introdutório na modalidade à
distância --- visto que a grande demanda para o curso foi de pessoas de
muito longe. Estendo a ideia (ou seria desafio?) aos educadores de outras
instituições de ensino a ao menos tentarem fazer o mesmo (VIEIRA, 2012,
p. 140)
Construindo possibilidades para as novas gerações de professoras e
professores conhecerem o jogo de papéis, para servir-se de sua metodologia. E no
meu caso, a centralização é para docentes do ensino de História. Enquanto
historiadora, me preocupo em como trazer à tona as discussões sobre transmídias que
podem ser manipulativas, e na representação de discursos que nada somam ao
conhecimento historiográfico. Assim, a dimensão que Jenkins (2009) explora, está na
convergência de diversos objetos que o RPG também se relaciona como: jogo,
cultura, cinema, literatura, imagens, e a arte de maneira reflexiva para nossa
coletividade na atualidade, que são objetos importantes para se compreender o meio
social da nossa sociedade contemporânea.
Entendo, consequentemente, que o campo da História cultural e o
compartilhamento de saberes em ambiente escolar, estão em lugares de prioridade
em meus estudos por oferecer vozes e confianças no processo de se expressar durante
as aulas, incluindo os imaginários individuais e coletivos, midiáticos e artísticos, para
priorização do senso critico das nossas alunas e alunos, buscando sempre a produção
do conhecimento histórico. Avante!
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, Fernando Grellet; VIEIRA, Matheus. RPG & Educação: pensamentos soltos.
Curitiba: Ithala, 2012.
CAILLOIS, Roger. Os jogos e os homens: a máscara e a vertigem. Tradução de José Garcez
Palha. Editora Vozes, 1ª edição, 2017.
COSTA, Marcella Albaine Farias da. Ensino de história e games: dimensões práticas em
sala de aula. 1ª. Ed. Curitiba: Appris, 2017.
DOSSE, François. Renascimento do acontecimento: um desafio para o historiador:
entre esfinge e fênix. Tradução: Constancia Morel, São Paulo. Editora: Unesp, 2013.
GADAMER, Hans-Georg. A atualidade do belo: a arte como jogo, símbolo e festa.
Tradução de Celeste Aida Galeão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1985.
GOMES-da-Silva, Pierre Normando. Semiótica dos jogos infantis. João Pessoa:
Editora UFPB, 2015.
HUIZINGA, Johan. Homo Ludens: O jogo como elemento da cultura. Tradução:
João Paulo Monteiro; Revisão: Mary Amazonas Leite de Barros; Produção: Ricardo
W. Neves. 5* edição. Editora Perspectiva S.A. São Paulo, 2001.
JENKINS, Henry. Cultura da convergência. Tradução de Susana Alexandria. 2ª Ed.
São Paulo: Aleph, 2009.
RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Tradução de Alain
François. Campinas, São Paulo: Unicamp, 2007.
ROCHA, João Cezar de Castro. Roger Chartier - A força das representações:
história e ficção. Chapecó, SC: Argos, 2011.
RODRIGUES, Sonia. Role playing game e a pedagogia da imaginação no Brasil.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.
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ZANINI, Maria do Carmo. Anais do primeiro simpósio RPG & educação. São Paulo:
Editora Devir, 2004.