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Dissertação – Artigo de Revisão Bibliográfica
Mestrado Integrado em Medicina - 2010/2011
Incontinência Urinária de Esforço na Mulher
Cristina Braço Forte
Orientador
Dr. António Urbano Soares
Co-Orientador
Dr. Arnaldo Lhamas
Porto, Junho 2011
Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto
ARTIGO DE REVISÃO
Incontinência Urinária de Esforço na Mulher
Female Stress Urinary Incontinence
Cristina Braço Forte 1
1 Aluna do 6º ano profissionalizante do Mestrado Integrado em Medicina
Endereço: Rua Bento Jesus Caraça nº 29, 2870-134 Montijo
cristinabracoforte@hotmail.com
Afiliação: Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto
ICBAS-UP)
Endereço: Largo Prof. Abel Salazar 2, 4099-003 Porto
Incontinência Urinária de Esforço na Mulher
I Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto
LISTA DE ABREVIATURAS
ICS - Sociedade Internacional de Incontinência
IU- Incontinência Urinária
IUE- Incontinência Urinária de Esforço
IUM - Incontinência Urinária Mista
IUU - Incontinência Urinária por Imperiosidade
PFMT – Treino dos músculos do aparelho pélvico
PVR – Volume de Resíduo Pós- Miccional
TOT – “Transobturator Tape”
TVT – “Tension Free Vaginal Tape”
Incontinência Urinária de Esforço na Mulher
II Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto
RESUMO
A incontinência urinária (IU) é um problema de Saúde Pública que afecta milhões
de pessoas em todo o mundo, e tende a aumentar à medida que as populações têm
uma maior esperança de vida. Esta patologia tem custos muito elevados em termos
sociais e de cuidados de saúde.
O presente trabalho teve como objectivo fazer uma revisão sistemática das
evidências actuais sobre incontinência urinária em geral e incontinência urinária de
esforço na mulher, em particular.
A incontinência urinária de esforço (IUE) feminina é uma patologia muito
frequente, com interferência significativa na qualidade de vida da mulher. O tratamento
desta patologia é hoje possível na maior parte das doentes. O primeiro passo para o
sucesso terapêutico é a correcta caracterização do tipo de incontinência urinária,
através do exame clínico (história e exame físico) da doente. Devem ser pesquisadas
e identificadas eventuais causas reversíveis ou agravantes e realizado o seu
tratamento específico.
O tratamento conservador, através da fisioterapia uroginecológica e da
reeducação vesical, assim como alterações no estilo de vida, são considerados como
as primeiras opções de tratamento para os casos de menor severidade. Nos casos
mais complexos e que exigem assistência especializada o tratamento da incontinência
urinária de esforço é essencialmente cirúrgico.
Ao longo dos anos, várias técnicas foram sendo propostas e aperfeiçoadas
com o intuito de diminuir as comorbilidades da técnica cirúrgica e aumentar a
qualidade de vida das mulheres que sofrem de incontinência urinária de esforço.
Palavras-chave: Incontinência Urinária; Incontinência Urinária de Esforço;
Mulher; Tratamento; Fisioterapia; Procedimentos Cirúrgicos.
Female Stress Urinary Incontinence
III Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto
ABSTRACT
Urinary incontinence (UI) is a public health problem affecting millions of
people around the world, and tends to increase as populations have a greater life
expectancy. This pathology endeavours enormous costs in terms of social care and
health.
This study is aimed to do a systematic review of current evidence on urinary
incontinence in general and stress urinary incontinence in particular.
The female stress urinary incontinence (SUI) is a very frequent pathology,
with significant interference in the quality of life. The treatment of this pathology is now
possible in most patients. However, the first step in therapeutic success is the proper
characterization of the type of incontinence, essentially by clinical examination (history
and physical examination) of the patient. Reversible causes or aggravating factors
should be investigated and identified, and the specific treatment performed.
The conservative treatments by urogynecologic physiotherapy and bladder
rehabilitation, as well as changes in lifestyle, are regarded as the first treatment options
for cases of less severity. In more complex cases, that require specialized care the
treatment for stress urinary incontinence is surgical.
Over the years several techniques have been proposed and improved in order
to reduce the comorbidities related to the surgical technique.
Keywords: Urinary incontinence; Stress Urinary Incontinence; Female;
Treatment; Physiotherapy; Surgical Procedures.
Incontinência Urinária de Esforço na Mulher
IV Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto
ÍNDICE
1. Métodos
2. Introdução
3. Tipos de Incontinência
4. Zonas de sustentação vaginal e efeito sobre a continência urinária
5. Diagnóstico da IUE
6. Tratamentos Disponíveis
6.1 – Tratamento Conservador
6.2 – Tratamento Farmacológico
6.3 – Tratamento Cirúrgico
7. Discussão
8. Referências Bibliográficas
9. Figuras
10. Agradecimentos
Incontinência Urinária de Esforço na Mulher
Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto 1
MÉTODOS
Foi realizada a pesquisa de artigos em sites de publicação científica das
bases MEDLINE-PubMed, Up ToDate, Elsevier Masson, Guidelines da European
Association of Urology e a consulta das revistas Journal of Urology; Progrès en
Urologie; Acta Urológica Portuguesa; Archivos Españoles de Urologia, Mundo Médico,
entre outras.
Os artigos foram seleccionados ou excluídos conforme o conteúdo do título
e/ou resumo. Foram excluídos estudos realizados em homens, em pacientes com
incontinência urinária mista, pacientes com incontinência urinária por imperiosidade e
artigos publicados em outras línguas que não o inglês, francês, espanhol ou
português.
A pesquisa incluiu também a procura de artigos nas referências bibliográficas
de alguns estudos analisados e ainda a leitura de vários capítulos do livro
“Multidisciplinary Management of Female Pelvic Floor Disorders”, “Understanding
Stress Urinary Incontinence” e “Urodynamics Made Easy”.
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INTRODUÇÃO
A Incontinência Urinária é definida como a “perda involuntária de urina
representando um problema social ou higiénico, devendo ser objectivamente
demonstrável” [1].
Epidemiologicamente falando é um problema de saúde pública. A incidência
da incontinência urinária na mulher aumenta com a idade, atingindo 25% após a
menopausa [2].
É uma das novas “epidemias” do século XXI agravada pelo contínuo
aumento da esperança média de vida, sendo mais frequente nas mulheres. Nos lares
a prevalência da incontinência urinária em mulheres é superior a 50% [3]. Apesar das
perdas involuntárias de urina interferirem de forma devastadora na qualidade de vida
das doentes (quer a nível psicológico como a nível social e sexual), a incontinência
urinária feminina é muitas vezes ocultada por longos períodos de tempo, (só cerca de
15% declaram a doença) e esquecida pelos que providenciam os cuidados de saúde,
acabando por ser “sub-diagnosticada” e “sub-tratada”. Estima-se que apenas uma em
cada quatro mulheres sintomáticas procura ajuda médica, já que é considerada de
forma errónea uma consequência natural da idade, sem tratamento eficaz sendo por
isso uma “epidemia silenciosa” [6].
As morbilidades associadas à incontinência urinária incluem o
prolongamento de internamentos, infecções do tracto urinário, complicações devido ao
uso prolongado de cateteres uretrais, perturbações de sono, quadros depressivos e as
dermatites de contacto, sendo também um importante motivo para a admissão de
idosos em lares [7,8].
Nos Estados Unidos os custos associados a esta patologia são de
aproximadamente 16,3 biliões de dólares anuais, gastos entre diagnóstico, cuidados
de rotina e em tratamento [9].
Os factores de risco mais importantes são a gravidez e os partos,
nomeadamente por via vaginal, não conferindo a episiotomia uma protecção
adequada. Ao contrário do que se acreditava, a menopausa “per se”, não demonstra
ser um factor de risco para a IU [10]. A Diabetes Mellitus é considerada como um factor
de risco na maioria dos estudos. Várias pesquisas têm sugerido que a terapia de
substituição hormonal oral com estrogénios e o índice de massa corporal são factores
de risco modificáveis na IU [10].
Tabaco, dieta, depressão, infecções do tracto urinário e exercício físico não são
considerados como factores de risco [10-13].
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TIPOS DE INCONTINÊNCIA URINÁRIA
A perda de urina pode ocorrer de forma transitória, geralmente associada a
infecções urinárias, diabetes descompensada, uso de determinados fármacos (como
os diuréticos, bloqueadores alfa adrenérgicos, inibidores da enzima de conversão da
angiotensina, benzodiazepinas ou outros neuroléticos), consumo de álcool ou cafeína,
distúrbios emocionais ou a obstipação. Este tipo de incontinência urinária melhora
após o tratamento da causa subjacente.
No entanto para a larga maioria das mulheres a IU manifesta-se como uma
doença crónica de início gradual mas com agravamento progressivo. Existem vários
tipos de incontinência urinária sendo as mais frequentes na mulher a incontinência
urinária de esforço (IUE), a incontinência por imperiosidade (IUU) e a incontinência
urinária mista (IUM).
Este trabalho tem como objectivo apenas uma abordagem mais detalhada
da incontinência urinária de esforço na mulher.
Segundo a Sociedade Internacional de Incontinência (ICS), a IUE é
classificada como um sintoma (queixa de perda involuntária de urina, em esforço ou
exercício, ou provocada pela tosse ou espirro); sinal (observação de perda involuntária
de urina através da uretra, síncrona com o esforço, ou pela tosse ou espirro);
incontinência de esforço urodinâmica (perda involuntária de urina durante um aumento
de pressão abdominal (esfroço ,tosse, espirro) na ausência de actividade contráctil
não inibida, durante a cistometria de enchimento). A ICS não especifica a IUE como
uma condição, mas sim com uma combinação clara de sintomas, sinais e/ou
observação urodinâmica [14,15].
Na IUE a mulher perde urina involuntariamente quando aumenta a pressão
intra-abdominal em actividades como tossir, rir, levantar objectos ou fazer esforço
físico. Há uma associação nítida entre os esforços e a perda de urina. O problema
nestes casos é que a pressão intra-vesical ultrapassa a pressão do esfíncter uretral,
originando a perda de urina. Para a sua fisiopatologia contribuem em graus variáveis
de importância a hipermobilidade do colo vesical (secundária a um suporte pélvico
fragilizado) e uma deficiência intrínseca do esfíncter urinário. A hipermobilidade do
colo vesical traduz-se pela sua descida na cavidade abdominal durante as manobras
de esforço, que têm como consequência um aumento da pressão intra-uretral. O
defeito do esfíncter urinário leva à incapacidade da manutenção do tónus uretral
durante as actividades que aumentam a pressão abdominal.
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O conhecimento da fisiopatologia da IUE é estruturante na decisão
terapêutica.
Inicialmente os componentes centrais da função miccional eram a bexiga e
uretra, cada um com os seus respectivos controlos neurológicos. A grande questão
era considerar qual a posição do colo vesical, supra-púbica ou intra-abdominal.
Estando o colo vesical abaixo do bordo inferior da sínfise púbica, a pressão intra-
abdominal transmite-se apenas à bexiga, e não à uretra proximal. Assim, a pressão
vesical ultrapassa a pressão uretral, levando à perda de urina [16].
Lancey e posteriormente, em 1990, Petros, com a teoria integral,
introduziram o conceito da existência de um mecanismo extrínseco, activado por
músculos pélvicos específicos, que através de estímulos inibitórios e facilitadores,
coordenam um sistema de forças que actua sobre a vagina e permite o encerramento
e abertura uretral [17,18].
Assim, a elasticidade e posição da vagina, bem como os ligamentos, fascias
e músculos tornaram-se o ponto central, para explicar o mecanismo global de
continência urinária.
A elasticidade vaginal por sua vez depende do componente conjuntivo e da
sua posição anatómica, que permitem um efeito adequado de forças musculares
direccionais, esquematicamente divididas em 3 níveis (Fig.1). Estas forças mantêm a
uretra fechada agindo contrariamente ao efeito da pressão hidrostática sobre os
receptores de estiramento neurológicos presentes no colo vesical, prevenindo o seu
estímulo prematuro, que pode gerar um reflexo facilitador para contracção do músculo
detrusor [17,19].
A perda da elasticidade vaginal, além de não permitir a adequada
compressão da uretra, para promover o seu encerramento durante os períodos de
aumento transitório da pressão intra-abdominal, também prejudica a transmissão
neurológica, que coordena o funcionamento vesico-esfincteriano, fazendo com que a
bexiga não se consiga manter estável durante o enchimento, o que gera a
instabilidade vesical [17,19].
CONTROLE NEUROLÓGICO MICCIONAL
Os neurónios motores da bexiga e da uretra estão localizados no segmento
sagrado da medula espinal (S2-S4) e são coordenados pelo centro pontino da micção
e pelos núcleos da base do cérebro. Já o controle voluntário da micção faz-se no
córtex da face lateral do lobo frontal.
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O centro pontino da micção está localizado nas regiões medial e dorso
lateral da ponte (centro de Barrington) e a sua lesão pode criar retenção urinária. A
estimulação deste centro aumenta a pressão vesical, diminui a pressão uretral e
diminui a actividade do pavimento pélvico. O relaxamento da uretra ocorre por inibição
dos neurónios motores sagrados do esfíncter uretral.
O músculo liso da bexiga, a região uretro/trigono, e a uretra proximal são
inervadas por fibras do plexo pélvico que está localizado profundamente na cavidade
pélvica e é composto por fibras dos nervos pélvicos (parassimpático) e dos nervos
hipogástricos (simpático). As fibras parassimpáticas originam-se na substância
cinzenta da parte sagrada da medula (S2-S4), e possuem vários gânglios próximos à
bexiga e fibras pós-ganglionares curtas. Já os nervos hipogástricos (inervação
simpática eferente) tem origem na região lateral da substancia cinzenta da medula
entre T10 e L2. O nervo pudendo, que inerva o esfíncter uretral externo, tem a sua
origem no núcleo de Onuf, no corno ventral do segmento da medula sagrada S2-S4.
Todo o controle somático (motor) dependente da vontade, e é exercido pelo nervo
pudendo.
As fibras aferentes (sensitivas) da bexiga e da uretra estão nas ramificações
do plexo pélvico e atingem a espinal medula via nervos pélvicos ou hipogástricos.
Dividem-se em dois grupos: I) Fibras nocioceptivas, responsáveis pela sensibilidade
dolorosa, que vão pelas raízes S2-S4 até à substância cinzenta póstero-lateral, e daí
pelos tratos espinotalâmicos laterais atingem o tálamo e o córtex. II) Fibras
proprioceptivas, relacionadas com a percepção da distensão vesical, que se originam-
se no detrusor e seguem pelo plexo hipogástrico até T10 - L2 na medula, e daí para a
ponte e para o córtex.
Na fase de enchimento vesical (Fig. 2), a continência é mantida pela
complacência vesical associada à total inibição dos impulsos eferentes
parassimpáticos (Oe; Od; Ou) e à activação dos eferentes (Cu) simpáticos e
somáticos. O córtex cerebral envia impulsos descendentes inibitórios para o centro
pontino e para o nervo pélvico (parassimpático) relaxando o detrusor, e envia os
impulsos excitatórios para o nervo hipogástrico (simpático) e para o nervo pudendo
aumentando a resistência uretral.
Os impulsos aferentes vesicais activam, também, os neurónios motores do
núcleo de Onuf, aumentando o tónus do esfíncter uretral e, por conseguinte, a
resistência da uretra.
Na micção voluntária há uma diminuição da actividade dos músculos do
pavimento pélvico e da pressão uretral, que precedem a contracção do detrusor.
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O fluxo de urina pela uretra facilita o esvaziamento, pois também estimula a
contracção do detrusor. Quando a micção chega ao fim, o pavimento pélvico contrai-
se e eleva o colo vesical, que se fecha e a pressão do detrusor cai.
ZONAS DE SUSTENTAÇÃO VAGINAL E EFEITO SOBRE A
CONTINÊNCIA URINÁRIA
As zonas de sustentação vaginal (Fig.1), são divididas em zona anterior, que é
composta pelo ligamento pubo-uretral (PUL). A força que se gera anteriormente
depende da integridade deste ligamento, que permite a compressão da uretra contra a
parede vaginal anterior durante o aumento transitório da pressão abdominal, sendo
também responsável pela manutenção da estabilidade da zona sensitiva do colo
vesical durante o enchimento, impedindo o estímulo aferente precoce.
A zona média é composta pela fáscia endopélvica do arco tendinoso (ATFP).
Um defeito desta região resulta na descida da parede vaginal anterior, tornando o
vector da força muscular inferior (para baixo) como o dominante, mantendo assim a
parede posterior da uretra aberta e com perda urinária.
Os principais componentes da zona posterior são o ligamento útero sagrado
(USL) e a fáscia rectovaginal (RVF). A sua integridade permite a adequada resposta
reflexa dos estímulos processados pelo córtex e transmitidos aos músculos do
aparelho pélvico. O relaxamento da musculatura do aparelho pélvico permite que a
força resultante posterior promova a abertura da uretra, e sua contracção comprime a
uretra contra a zona anterior, permitindo seu encerramento.
Assim, conclui-se que a perda de elasticidade vaginal, em qualquer zona,
activa os receptores aferentes e estimula o reflexo da micção, podendo o córtex
responder activando o circuito inibitório da micção. As distopias importantes e as
lesões neurológicas centrais ou periféricas, podem prejudicar esta resposta e facilitar a
perda urinária por hiperatividade vesical.
Para explicar o mecanismo de continência durante o esforço, nota-se que no
momento em que ocorre um aumento da pressão intra-abdominal, o mesmo é
transmitido à bexiga, sendo necessário um sistema opositor que torne a pressão de
encerramento uretral ainda maior que a pressão intra-abdominal. A força gerada com
o aumento transitório da pressão intra-abdominal, estimula uma contracção reflexa da
musculatura do pavimento pélvico, que comprime a uretra contra a camada de suporte
anterior (fáscia endopélvica e parede vaginal anterior).
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Qualquer quebra da continuidade da fáscia endopélvica ou do músculo
elevador do ânus, pode aumentar a complacência deste sistema e não permitir o seu
perfeito funcionamento.
Um exemplo prático ilustrativo deste mecanismo de continência é o efeito da
fisioterapia sobre a musculatura pélvica. Se houver lesão neural ou ruptura da fáscia
endopélvica, a melhoria da contractilidade e a aprendizagem da coordenação
muscular voluntária em resposta ao aumento da pressão intra-abdominal, são
suficientes para melhorar a perda urinária.
DIAGNÓSTICO DA IUE
O ICI recomenda que a avaliação inicial de qualquer mulher com queixas de
incontinência urinária deva incluir questionários adequados na consulta e testes
específicos usados para confirmar o diagnóstico e quantificar a perda de urina bem
como a severidade da doença. O objectivo do processo de avaliação clínica é o
reconhecimento e a caracterização dos vários sinais e sintomas de modo a proceder a
um tratamento adequado [20].
Na história clínica interessa caracterizar a natureza da incontinência (o inicio,
a duração, as circunstâncias em que a perda ocorre, o tipo e numero de protecções
utilizadas diariamente, entre outros). Também igualmente importante é a pesquisa de
outros sintomas urológicos como: frequência urinária diurna e nocturna, imperiosidade,
características do jacto urinário, hematúria, para além de sintomas relacionados com
outros órgãos ou sistemas, nomeadamente a dispareunia e prolapsos do aparelho
genital, diarreia, obstipação e incontinência fecal, assim como dores, entorpecimento
das extremidades inferiores e alterações do foro neurológico.
Nos antecedentes pessoais há que considerar cirurgias da incontinência
urinária e correcção de prolapsos genitais, história de traumatismos do períneo;
diabetes; cirurgias vaginais ou abdominais; tumores, radioterapia e medicação usada,
bem como medicação com efeitos colaterais urinários (diuréticos; sedativos;
psicotrópicos; entre outros).
Durante o exame físico deve ser feito um exame abdominal, pélvico, rectal e
neurológico. É importante a avaliação da bexiga (se possível cheia) em repouso e
durante o esforço, observando as perdas em várias posições. No exame neurológico
avalia-se a sensibilidade (S2-S4) a tonicidade do esfíncter anal e a integridade do arco
reflexo para se excluir causa neurológica.
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Testes laboratoriais como a urinocultura, urina tipo II e citologia urinária são
auxiliares no diagnóstico da IU de forma a excluir outras patologias com por exemplo
as infecções do tracto urinário; diabetes mellitus; malignidade, etc... Exames
bioquímicos da função renal devem também ser equacionadas.
Teste de Bonney, é usado na suspeita de IUE. Pede-se ao doente para tossir
repetidamente (com a bexiga cheia) sendo possível observar a perda de urina através
da uretra de forma objectiva de houver patologia.
O pad test, ou teste do absorvente, embora não muito recomendado pela
ICS, permite quantificar objectivamente as perdas de urina através de absorventes
(com peso previamente aferido) colocando estes junto ao meato uretral externo. Após
manobras de esforço o peso é novamente aferido e a diferença de pesos caracteriza a
perda de urina. Pode ser realizado em ambulatório (curta duração – 1 hora) ou em
domicílio (longa duração – 24 horas). O teste é considerado positivo quando o ganho
de peso do absorvente no teste de 1 hora é superior a 1g e maior ou igual a 4g no
teste de 24 horas. O teste de 24 horas apresenta resultados mais fiéis, embora esta
técnica seja insuficiente para descriminar IUE de IUU [21].
O Q tip-test é uma técnica que permite observar o movimento de descida da
uretra quando a paciente tosse ou realiza a manobra de valssalva. Consiste na
colocação de um “cotonete” na porção proximal da uretra. Se o ângulo com a
horizontal for superior a 45º, existe hipermobilidade uretral. É um teste sensível, mas
não especifico [21].
O volume de resíduo pós-miccional (PVR) pode ser mensurado via
ultrassonografia ou catéter, e trata-se de mais uma técnica para a avaliação das
pacientes com IU. Considera-se significativo quando o volume que fica na bexiga
após o esvaziamento voluntário excede os 30% do total da capacidade vesical [21,22].
Embora o diagnóstico seja fundamentalmente baseado na clínica, muitos
especialistas utilizam métodos auxiliares para a sua confirmação.
Nos casos mais duvidosos, ou sempre que haja essa facilidade, a avaliação
urodinâmica tem sido defendida como um exame obrigatório para apoiar o diagnóstico
clínico. É necessário ter em mente que esta técnica não serve para diagnosticar IUE,
uma vez que o diagnóstico desta patologia é clínico (sinal, sintoma). Os principais
objectivos do estudo urodinâmico são a avaliação das falências terapêuticas;
avaliação de casos complexos; procura de disfunção miccional associada; suspeita de
doença neurogénica e avaliação pré-operatória.O conhecimento do perfil uretral
(Perfilometria), a medida de pressão da perda de urina em esforço, a Cistometria e em
casos especiais a Vídeo-urodinâmica, são exames capazes de fornecer informações
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preciosas. Nos casos de recorrência pós-cirurgia anterior, para cura da incontinência,
eles são obrigatórios [22].
TRATAMENTOS DISPONÍVEIS
Tratamento conservador
Embora o tratamento da IUE seja eminentemente cirúrgico, cada vez mais se
defendem métodos conservadores alternativos e não invasivos, especialmente em
casos de IUE ligeira [23].
Alterações do estilo de vida para pacientes obesas ou moderadamente
obesas podem estar indicadas uma vez que ficou demonstrado em vários estudos que
estas medidas podem diminuir os sintomas de incontinência. A ingestão líquidos e de
cafeína em menores quantidades também poderá ser um esquema a adoptar embora
as evidências actuais dêem pouca ênfase a esta alteração de hábitos para a melhoria
de sintomas [24,25,26].
A fisioterapia uroginecológica, ou a reeducação vesical, é considerada a
primeira indicação de tratamento conservador para as patologias do aparelho pélvico
[27].
Existem múltiplas técnicas para a reeducação do períneo, que vão desde a
simples informação verbal, treino com fisioterapeuta até técnicas instrumentais.
A informação verbal dada pela paciente sobre a sua musculatura períneal
mostra-se insuficiente para quantificar de forma correcta a perda de tónus muscular,
mas no entanto alguns estudos demonstraram ser importante no que diz respeito à
qualidade de vida e seguimento destas pacientes [24-27].
A reeducação vesical recomenda que o doente deve urinar de 30 em 30
minutos, elevando semanalmente 15 minutos este período, até se conseguir um
intervalo de esvaziamento que fique entre as duas e meia e as três horas.
O treino dos músculos do pavimento pélvico (PFMT), técnica usada desde
1948 e descrita por Arnold Kegel [33], é um tratamento fisiátrico que consiste em obter
uma correcta contracção do elevador do ânus, primeiro sob controlo voluntário e
posteriormente sob uma forma estímulos reflexos. O PFMT inclui contracções longas
de intensidade baixa e curtas de intensidade elevada. É reconhecido como uma das
principais modalidades de tratamento de pacientes com IUE. O doente deve aprender,
com o apoio do fisioterapeuta, a reconhecer os músculos a contrair. Depois disso,
deve iniciar os exercícios e faze-los diariamente por períodos longos, no mínimo 12
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semanas, pelo menos 10 a 12 vezes por dia. Uma paciente orientada e motivada é
essencial na obtenção de bons resultados [34].
A combinação de PFMT com cones vaginais e “biofeedback”, podem ser
oferecidos como tratamento adicional para ajudar as doentes a contraírem os
músculos do diafragma pélvico, e para estas saberem quando estão a contrair os
músculos correctos e monitorizarem as suas contracções. Também se pode utilizar a
electro-estimulação em que os músculos são estimulados directamente por correntes
eléctricas, estando este método geralmente indicado nos casos em que as doentes
não conseguem contrair voluntariamente os músculos em causa [35].
Segundo as últimas normas de actuação publicadas, para o tratamento inicial
da IU tanto o “biofeedback” como a estimulação eléctrica associados ao PFMT na IUE,
têm baixo grau de recomendação [10].
Em resumo os pacientes que beneficiam com PFMT são: os de
sintomatologia recém iniciada; os de alta motivação para esta terapêutica; os de baixa
severidade. Por outro lado os casos de recidiva pós-cirurgica têm pouca ou nenhuma
taxa de sucesso.
Tratamento Farmacológico
O tratamento farmacológico da IUE visa obter um aumento da força de
encerramento intra-uretral através do aumento do tónus dos músculos liso e estriado
da uretra. Existem vários fármacos que podem conferir este efeito, mas o seu uso
clínico é limitado pela baixa eficácia e/ou efeitos colaterais que provocam. Actualmente
só dois fármacos foram considerados no tratamento da IUE [41].
A duloxetina é um inibidor selectivo da recaptação de serotonina e
norepinefrina, conhecida pelas suas propriedades antidepressivas e foi introduzida no
mercado em 2004, com uma série de publicações, revisões e opiniões de
especialistas. Em Maio de 2006, foi lançada para o tratamento da IUE em 42 países,
sendo o único fármaco aprovado para esta patologia [42]. O seu mecanismo de acção
deve-se às altas concentrações de norepinefrina e serotonina existentes no núcleo de
Onuf localizado na porção sagrada da medula e que é responsável pela inervação do
esfíncter uretral.
Segundo os recentes trabalhos de “Cochrane”, a duloxetina na dose diária
de 80 mg, mostrou 11% de vantagem em termos de efectividade na melhoria dos
sintomas de IUE quando comparada com placebo [43]. Trata-se de um medicamento
considerado eficaz para o aumento da qualidade de vida das mulheres que sofrem de
IUE sobretudo quando associado às técnicas de reeducação do períneo [44]. A
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dosagem proposta deste fármaco permite um controle de eventuais efeitos adversos,
como por exemplo as náuseas (principal factor que leva as pacientes (15%) a
interromperem o tratamento).
As mulheres a quem este fármaco é prescrito devem ser informadas e
aconselhadas devidamente sobre os seus efeitos. Outros efeitos secundários são a
insónia, xerostomia, tonturas, obstipação e sonolência. Está contra-indicada a
associação deste fármaco com IMAO´s e com a ciprofloxacina, bem como nos
pacientes com insuficiência renal ou hepática, hipertensão não controlada e nos
pacientes com características depressivas sem controlo psiquiátrico. Actualmente este
fármaco deixou de ser recomendado isoladamente para mulheres que procuram a
cura da IUE [42].
O aumento da incidência da IU nas mulheres no período pós-menopausa
sugere o envolvimento dos estrogénios ou da progesterona na génese deste
problema.
Existem diferentes estudos e publicações contraditórias sobre este tema e os
protocolos de tratamento são muito diferentes pelo que é difícil adoptar uma atitude
formal.
A morbilidade é uma das principais questões abordadas nos vários estudos e
faz referência sobretudo aos efeitos colaterais cardiovasculares, risco de cancro da
mama e do endométrio. Recentemente ficou definida a contra-indicação da terapia via
sistémica com estrogénios (com ou sem progesterona) no tratamento da IUE nas
mulheres pós-menopausa, uma vez que podem exarcebar os sintomas em mulheres
com IUE prévia.
O tratamento com estrogénios por via vaginal (acção tópica local) oferece
menores riscos cardiovasculares, e uma publicação recente mostra o benefício do uso
deste fármaco nas mulheres pós-menopausa com melhoras dos sintomas de IUE
(embora esta afirmação se baseie em poucos estudos) [47].
Tratamento Cirúrgico
As opções terapêuticas passam inevitavelmente pelas técnicas cirúrgicas
quando a IUE é confirmada pela urodinâmica (quer seja por ausência de coaptação da
uretra ou por hipermobilidade do colo).
Existem variáveis relativamente às pacientes que são submetidas a técnicas
cirurgicas, que podem alterar os resultados (ex: idade, actividade física, estado geral,
obesidade, partos, cirurgia prévia por IU, raça, severidade e duração dos sintomas,
forças oclusivas uretrais, factores cirurgicos, doença psíquica). A verdadeira incidência
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de complicações cirúrgicas não está bem definida pela falha de standardização de
dados e falta de casos reportados.
Pelo exposto anteriormente, a cirurgia tem um papel preponderante, já que
existe pouca efectividade com o tratamento farmacológico, e o tratamento conservador
é orientado predominantemente para os casos de menor severidade.
Numa óptica de insuficiência do esfíncter intrínseco, e ausência de
hipermobilidade, a coaptação da uretra é o cerne do problema. A sua efectividade
pode ser obtida pela colocação de material na submucosa uretral por via transuretral
com ou sem visão endoscópica.
Com o desenvolvimento de substâncias biocompatíveis, ressurgiu o
interesse pela técnica de injecção periuretral. Pesquisas posteriores levaram à
utilização de colagéneo heterólogo, gordura autóloga, partículas de silicone, entre
outros [50-52].
Este material irá determinar uma tumefacção nas paredes internas da uretra,
gerando aumento do comprimento das mesmas, e portanto maior resistência à saída
de urina. O material de implante para além de ter de ser biocompatível e não
cancerígeno, deverá ser estável e não migrar.
É importante salientar que a qualidade dos tecidos influencia o tratamento, e
existem determinadas desvantagens nesta técnica que devem ser consideradas como:
a alergia ao material, infecções urinárias; retenção urinária; preço muito elevado dos
materiais e um elevado custo/beneficio, uma vez que serão necessárias múltiplas
injecções para obter resultados satisfatórios [50-52].
Historicamente podemos dizer que de uma fase de estabilização da uretra, a
partir do colo vesical, passamos para uma de limitação da mobilidade da mesma a
nível do 1/3 médio. Assim a técnica “gold standard” de Burch (colposuspensão) foi
substituída em 1995 (Ulmsten) pelos TVT ( “Tension Free Vaginal Tape”), que consiste
na colocação de forma minimamente invasiva de uma banda (“Sling”) em polipropileno
[53]. Esta técnica possui a vantagem de internamentos mais curtos e poder ser
efectuada com anestesia local, no entanto também pode levar a um certo número de
complicações (perfuração vesical 2-23%). A incidência desta complicação preconiza a
realização de uma cistoscopia per-operatória de forma a evitar este incidente.
Posteriormente, em 2001 Delorme descreve a técnica de TOT (banda transobturadora)
out-in, mais tarde modificada por Leval et al (com melhor protecção para a bexiga)
denominada técnica in –out. Estas descrevem vias de acesso que visam diminuir o
risco anatómico de lesões intra-operatórias e mostram resultados satisfatórios a este
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nível nos recentes estudos publicados. Estão associadas a um índice de morbilidade
mais baixo e a um menor risco de perfuração vesical do que as TVT.
A cirurgia com banda pode ser usada em todas as formas de IUE. Existem
números trabalhos publicados sobre os diferentes tipos de bandas utilizadas no
tratamento da IUE, e todos mostram a pouca diferença nos resultados clínicos obtidos,
que na maioria são satisfatórios [54-57].
As complicações destas técnicas podem ser imediatas (retenção urinária,
cistites e perfuração vesical ou dos vasos sanguíneos), ou tardias (disfunções
miccionais, hiperactividade do detrusor “de novo”, infecções urinárias de repetição, e
erosão no caso de bandas sintéticas).
Com os dados actuais, as duas técnicas podem ser indicadas de acordo com
a preferência e experiência do cirurgião; no entanto as pacientes devem ser avisadas
das potenciais diferenças na evolução de cada uma.
Recentemente foram lançadas os “Mini-Arc”, que consistem em bandas que
são implantadas por via vaginal, e que ficam ancoradas na membrana obturadora,
sem necessidade de fixação. Tem como vantagem uma intervenção menos dolorosa,
com menos riscos anatómicos, sem necessidade de anestesia geral, podendo ser
realizadas em ambulatório [59].
No entanto por enquanto ainda não é possível afirmar que este novo
procedimento tenha uma morbilidade inferior às técnicas tradicionais pois existem
poucos estudos a longo prazo quando comparados com as TVT ou TOT.
A colposuspensão retropúbica caiu em desuso em relação às cirurgias por
bandas, por ter maior morbilidade e causar um maior tempo cirúrgico e de
recuperação no pós-operatório (tem por isso um custo mais elevado).
A eficácia, contudo é bastante semelhante as técnicas mais recentes, o que
significa que a colposuspensão retropúbica ainda pode ser indicada, na ausência da
disponibilidade das bandas sintéticas, ou quando existem contra-indicações para a
colocação das últimas.
Em relação a colposuspensão laparoscópica, a literatura defende que é uma
técnica menos utilizada no tratamento da IUE na mulher, e que apenas se justifica em
casos onde a paciente será submetida concomitantemente a outro procedimento por
laparoscopia [63].
Na falência total de todas a técnicas, a continência só pode ser obtida por
clampagem da uretra, que se obtém através da colocação de uma manga em torno do
colo vesical, e que ao encher determina compressão da uretra. Este mecanismo é
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designado por esfíncter artificial, e tem uma taxa de efectividade de 96,4%, em
doentes várias vezes operados e/ou com IU severa [65].
As complicações são significativas sendo as mais graves a erosão da uretra
e as infecções da prótese (5 a 10%), existindo também o risco de perfuração.
O seguimento a longo prazo é crucial nestas doentes (de seis em seis meses
durante dois anos após a cirurgia, posteriormente uma vez por ano, e sempre que
surgirem sintomas de alteração). Haverá também a necessidade de realizar uma
avaliação da continência, do eventual aparecimento de infecções urinárias, presença
de hematúria e/ou disúria, do estado cutâneo peri-operatório, bem como uma revisão
dos elementos que constituem o esfíncter.
Uma IUE de importância mínima ou intermitente, mesmo associada a uma
insuficiência esfincteriana, não justifica a implantação de um esfíncter artificial, neste
caso o médico deverá procurar soluções menos invasivas [64].
DISCUSSÃO
A incontinência urinária de esforço, típica da mulher, e da mulher multípera,
tem hoje uma abordagem terapêutica, confiante, quer seja ela conservadora ou
cirúrgica e que exige apenas um diagnóstico correcto para a sua resolução, evitando
assim o arrastar de uma situação que tem custos pessoais e sociais muito pesados.
Uma vez diagnosticada a presença de IUE, um tratamento inicial não invasivo e
conservador deve ser iniciado. O maior problema reside no facto que estes
procedimentos conservadores demoram até ao paciente obter benefício e requerem
disciplina, que normalmente vão diminuindo ao longo do tempo.
Nos últimos estudos publicados, ficou demonstrado que a alteração do estilo
de vida em pacientes obesas ou moderadamente obesas, podem diminuir os sintomas
de incontinência. Também a diminuição da ingestão excessiva de líquidos e de cafeína
são considerados factores de risco modificáveis.
Há fortes indícios de que a fisioterapia melhora significativamente a IUE, no
entanto não a cura definitivamente. Para ser eficaz a doente deverá estar motivada e o
tratamento deve ser realizado com orientação e acompanhamento adequados.
Segundo as últimas guidelines da IU não há ainda um consenso sobre como o
tratamento conservador deve ser aplicado (quantas repetições por dia, com qual
intervalo entre as sessões, e com que intensidade deve ser feita) o que torna difícil a
comparação entre os diferentes estudos. Apesar do baixo índice de cura, a fisioterapia
e reeducação do aparelho pélvico estão associados a uma melhoria importante da
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IUE, não apresentando efeitos colaterais e por isso devendo ser oferecidos a todas as
pacientes. A falha ao longo prazo é atribuída principalmente à baixa aderência e ao
abandono das técnicas aprendidas.
O uso de eletroestimulação, “biofeedback” ou cones vaginais são métodos
importantes no treino de pacientes com pouca consciência corporal relativa à
musculatura do pavimento pélvico.
Até agora infelizmente, os tratamentos farmacológicos disponíveis mostram-
se pouco eficazes na IUE. Determinadas pacientes podem apresentar alguma
melhoria dos sintomas da IUE com uso de duloxetina, mas grande parte abandonará o
tratamento devido aos efeitos colaterais e à insatisfação com o tratamento.
As evidências para o uso ou não de estrogénios são limitadas. Não há
nenhuma evidência actual que justifique o uso de estrogénios orais, mas as mulheres
pós-menopausa podem ser aconselhadas a usar estrogénios tópicos na tentativa de
diminuir os sintomas de IUE.
Pacientes em que a terapêutica inicial falhou ou apresentam IUE severa,
necessitam de um seguimento por um especialista e posterior encaminhamento para a
cirurgia.
A urodinâmica e a cistometria de enchimento são usadas na avaliação de
casos complexos antes da cirurgia, usada com objectivo pré- operatório.
Existem várias técnicas de abordagem cirúrgica no tratamento da IUE, cada
vez mais se procura o aumento da eficácia e diminuição das complicações.
Actualmente não existem dados na literatura que indiquem o uso de injecções
periuretrais como tratamento de primeira linha na IUE. No entanto, certos autores
consideram este método possa ser utilizado em razão do custo/benefício, em
pacientes muito idosas e debilitadas, em pacientes já operadas e nas que não possam
receber tratamento cirúrgico. Em casos de cirurgia prévia e de rigidez da uretra, estas
injecções tornam-se uma contra-indicação. É necessário não esquecer que a curta
duração de eficácia das mesmas leva a sucessivas repetições do tratamento para que
se consiga obter um resultado satisfatório.
A colocação de uma banda é neste momento a técnica de referência
cirúrgica no tratamento da IUE feminina e veio substituir em grande escala a técnica
de colposuspensão. A banda pode ser colocada via retropúbica ou transobturadora, e
nas duas a taxa de sucesso parece ser a mesma, embora a taxa de morbilidade seja
maior no caso de acesso retropúbico, sendo que a via transobturadora apresenta
menor risco de perfuração vesical. A escolha do material e técnicas a serem usadas
dependerá de cada caso clínico e deverá ser optimizada ao doente em causa para a
obtenção do melhor resultado cirúrgico e diminuição de complicações associadas.
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Com o objectivo de diminuir a morbilidade mantendo a eficácia, surgiram
recentemente as fitas de incisão única vaginal “MiniArc single incision sling”, uma
prótese sintética suburetral de dimensões reduzidas e extremidades em âncora que
oferece fixação imediata. Mostra ser uma técnica segura e praticamente indolor, no
entanto esta técnica continua a ser estudada e comparada com as anteriores no que
diz respeito à sua eficácia no tratamento da IUE.
A indicação para a implantação de um esfíncter artificial urinário assenta
sobre determinados factores: severidade da incontinência urinária; insuficiência
esfincteriana com manobras de suporte uretral negativo; várias recidivas pós-
cirúrgicas, e na ausência de contra-indicação.
Assim, é necessário o conhecimento profundo da complexidade da
avaliação e tratamento da doente com IU, torna-se fundamental ter em mente os
dados objectivos e subjectivos que acompanham esta patologia. Na maior parte das
vezes encoberta pela vítima e pouco valorizada pelo médico. Devem ser aumentados
e continuados os estudos de prevalência e de incidência da IU e dos seus diferentes
tipos. A população mundial está a aumentar com a inversão da pirâmide etária. É
urgente investigar novas armas terapêuticas e aperfeiçoar metodologias
conservadoras e cirúrgicas que permitam controlar e reduzir os custos.
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FIGURAS
LEGENDA: ATFP – Fáscia Pélvica do arco
tendinoso; EAS – Esfíncter anal externo;S –
Ísqueon; LMA – Músculo longitudinal do ânus;
LP- Músculo elevador do ânus; PB – Corpo do
Períneo; PS- Púbis; PCM- Porção anterior do
músculo pubococcígeo; PRM – Músculo
puborectal; PUL – Ligamento Pubouretral; RVF
– Fascia recto-vaginal; S – Sacro; USL-
Ligamento uterosagrado.
Figura 1: Mostra a relação anatómica entre os músculos, os ligamentos, fáscia e os
órgãos pélvicos. As setas correspondem aos vectores das forças musculares. A imagem
mostra também as três zonas de sustentação vaginal. Imagem adaptada do livro “The Female
Pelvic Floor” de PETROS.
LEGENDA: “O” – Abertura; “C”-
Encerramento; “Oa”- estímulo de abertura
aferente; “Oe”- estímulo de abertura
eferente; “Od”- estímulo de abertura
eferente do músculo detrusor; “Ou”-
estímulo de abertura eferente da uretra;
“Cu”- estímulo de encerramento eferente
da uretra; “N”- zona sensitiva do colo
vesical.
Figura 2: Esquema representativo do controle neurológico miccional. Função dos nervos
como sensores do enchimento vesical máximo “1”; e como coordenadores da acção muscular
durante o enchimento ou esvaziamento vesical “2”. Imagem adaptada do livro “The Female
Pelvic Floor”de PETROS.
ZONA ANTERIOR
ZONA
MÉDIA
ZONA POSTERIOR
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AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Dr. António Urbano Soares e ao Dr. Arnaldo Lhamas por terem
aceite a orientação cientifica deste trabalho, e pela disponibilidade e simpatia com que
sempre procuraram esclarecer as minhas dúvidas.