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JOGOS NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NUMA PERSPECTIVA
EPISTEMOLÓGICA: UM ESTUDO COM PROFESSORES EM FORMAÇÃO
DO CURSO DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA DA UFAC
RESUMO
Neste artigo apresentamos um estudo experimental realizado com trinta e dois alunos do quinto período matriculados, na disciplina Oficina de Matemática, no Curso de Licenciatura em Matemática da UFAC. A pesquisa teve por objetivo confeccionar materiais didáticos para laboratório de ensino podendo posteriormente ser utilizado nos momentos de regência do Estágio Supervisionado, além de desenvolver nos futuros professores habilidades acerca de novas metodologias de ensino que favoreçam o processo ensino aprendizagem. Aliado a isso são construídos jogos referentes aos conteúdos trabalhados no Ensino Básico, que são testados e melhorados em sala de aula, para posterior apresentação no colégio de aplicação da Ifes. Para tanto, dialogaremos com Bachelard, Piaget, Ribeiro, D’Ambrósio e outros, que tratam das bases
epistemológicas da Educação em Ciências e Matemática. Percebemos que trabalhar com jogos matemáticos no ensino superior propicia ao professor em formação inicial, mais uma ferramenta para ser utilizada nas regências de estágio supervisionado. Assim foi perceptível durante a pesquisa que os jogos além de motivarem os professores em formação inicial são mais um recurso capaz de contribuir com a aprendizagem dos mesmos frente aos conceitos matemáticos propiciados e descobertos por cada jogo. Além de propiciar a criação de situações de resoluções de problemas utilizando jogos para chegarmos a novos conceitos matemáticos.
Palavras-chave: Bases Epistemológicas. Professor em Formação. Jogos Matemáticos. Oficina de Matemática.
INTRODUÇÃO
Atualmente o mundo globalizado exige níveis de competência cada vez maiores
aos profissionais das diversas áreas de atuação. Mesmo as pessoas que ainda não estão
inseridas no mercado de trabalho, vêem-se, constantemente, confrontadas a desafios
impostos por esse mundo automatizado e tecnológico. Nesse contexto são grandes as
necessidades geradas, bem como as competências e habilidades exigidas, tanto na
dimensão do exercício profissional como na construção da cidadania.
Hoje a escola passa por transformações rápidas e não podemos deixar de
acompanhar esse processo. Estamos vivendo num mundo tecnológico, onde a inclusão
digital é necessária e onde existe uma constante busca de novos conhecimentos e novos
desafios são impostos.
D’ Ambrósio (1991, p.1) dizia que “[...] há algo errado com a matemática que
estamos ensinando. O conteúdo que tentamos passar adiante através dos sistemas
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Simone Maria Chalub Bandeira Bezerra
escolares é obsoleto, desinteressante e inútil”. As palavras deste autor evidenciam a
necessidade de uma reflexão acerca de novas estratégias pedagógicas que contribuam
para a facilitação do processo de ensino-aprendizagem dessa disciplina, ao mesmo
tempo em que estimule nos alunos o pensamento independente, o que lhes permitirá a
utilização de recursos e instrumentos úteis no seu cotidiano.
Para tanto nos perguntamos qual o modelo de currículo é o mais eficaz para o
professor em formação? Que metodologias podem ser utilizadas para que os discentes
tenham um aprendizado? Isso é uma preocupação no nosso ponto de vista que deve
partir da instituição formadora que prepara o professor para o mercado de trabalho.
Porém o que temos visto nas andanças durante o Estágio Supervisionado é um
ensino baseado na pedagogia tradicional, ainda predominante na maioria de nossas
escolas contribuído para tornar o estudo em matemática enfadonho, rotineiro e
desmotivador levando os alunos a se desinteressarem pelo ensino escolar e a escola
obter um alto índice de reprovação nessa disciplina. Baseado nesse contexto é que se
percebe a necessidade com certa urgência de uma reflexão acerca de novas estratégias
pedagógicas que contribuam para a facilitação do processo de ensino-aprendizagem
dessa disciplina. Partindo desse pressuposto os jogos vêm se configurando como
caminhos altamente significativos para as aulas de Matemática, destacando-se sua
relevância devido à sua potencialidade para o desenvolvimento do pensar matemático,
da criatividade e da autonomia do educando. Acredita-se que os jogos e as oficinas
pedagógicas quando bem fundamentados por uma intenção didático-pedagógica,
passam a auxiliar na sistematização do conhecimento proporcionando aos futuros
professores a percepção de sua capacidade de elaborar a construção do conhecimento,
situações-problema, desafios e jogos matemáticos.
Daí decorre a necessidade de se investigar a seguinte questão: Em que medida a
utilização de jogos matemáticos constitui-se ferramentas eficazes que potencializam o
aprendizado do professor em formação nas séries finais do Ensino Fundamental? Para
isso questão que norteou a nossa pesquisa era: Que fundamentos epistemológicos
podem ser utilizados para uma didática centrada em jogos matemáticos?
A pesquisa foi realizada na Universidade Federal do Acre – UFAC, no campus
universitário de Rio Branco. Os sujeitos investigados foram os trinta e dois estudantes
do mencionado Curso que fizeram a disciplina no primeiro semestre letivo de 2011.
FONTES EPISTEMOLÓGICAS DO JOGO E DO DESENVOLVIMENTO
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O jogo é definido em alguns dicionários como “atividade lúdica com um fim em
si mesmo, mesmo podendo ocasionalmente se realizar por motivo exterior”. Origina-se
do latim “iocus” que significa diversão, brincadeira. Negrine (1994) relata em sua obra
Aprendizagem & Desenvolvimento Infantil que a partir do século XIX e XX o estudo
científico do jogo ganha novas dimensões, surgindo várias teorias sobre o assunto. Já o
psicólogo Claparède (1911), em suas teorias afirma que o desenvolvimento psicológico
não se realiza sozinho, logo o desenvolvimento do indivíduo é o resultado das
determinações da natureza e do meio ambiente. Então a criança recorre instintivamente
a dois instrumentos: o jogo e a imitação.
A partir daí muitos estudiosos começaram a analisar os jogos sob vários
aspectos. De acordo com o mapa conceitual elaborado por nós são perceptíveis às
diferenciações quanto à classificação dos jogos propostas por Wallon, Vygotsky, Piaget
e Lara, conforme Figura 01, que se encontra no final desse artigo.
JOGOS NA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
As diversas realidades em que estão inseridos os sujeitos são por si,
possibilidades de reflexão sobre as diversas maneiras de se construir conhecimento, a
reflexão sobre as estruturas sociais micro e macro em que se inserem historicamente,
como afirma Ghedin (2010, p.130) “todo ser humano, pelo caráter geral de sua cultura e
por ser portador da cultura humana de uma determinada sociedade é um sujeito
reflexivo” faz parte do processo de construção do conhecimento.
No âmbito da Educação em Ciências e na Educação em Matemática vários
autores como Piaget, Vigotsky, Grando, Bicudo, Macedo, Lara dentre outros
conjecturam sobre o aprendizado por meio de jogos, sendo esses de grande importância
no desenvolvimento da criança e/ou adolescente.
No jogo a situação imaginária é resultante das operações com os objetos. De
acordo com Leontiev (1991, p. 127), “não é a imaginação que determina a ação, mas
são as condições da ação que tornam necessária a imaginação e dão origem a ela”.
Resumindo, é a estrutura da atividade de jogo que permite o surgimento de uma
situação lúdica imaginária. O mesmo se refere a discrepância existente entre a
necessidade de ação da criança e a impossibilidade de executar as operações exigidas
por tal ação, leva à criação de uma atividade onde desejo possa ser realizado, sendo que,
segundo o autor, esta atividade se caracteriza como lúdica, isto é, em um jogo.
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De acordo com Lara (2004), o trabalho com jogos matemáticos, em sala de aula,
traz diversos benefícios: O professor consegue detectar os alunos que estão com dificuldades reais; O aluno demonstra para seus colegas e professores se o assunto foi bem assimilado; Existe uma competição entre os jogadores e os adversários; Durante o desenrolar de um jogo, observa-se que o aluno se torna mais crítico, alerta e confiante, expressando o que pensa, elaborando perguntas e tirando conclusões, sem necessidade da aprovação do professor; Não existe o medo de errar, pois o erro é considerado um degrau necessário para se chegar a uma resposta correta; O aluno se empolga com o clima de uma aula diferente, o que faz com que aprenda sem perceber.
Percebe-se que esses benefícios e cuidados apontados por Lara nos remete a
reflexão da importância de um bom planejamento por parte do professor de suas aulas e
dos objetivos que o mesmo pretende alcançar com essa nova forma de trabalhar os
assuntos matemáticos utilizando os jogos, além de se conseguir detectar o nível do
aprendizado do aluno referente ao conteúdo tratado no jogo essa forma de trabalhar nos
propicia o surgimento de novos conceitos matemáticos se bem explorada pelo professor.
JOGOS DIDÁTICOS: CURRÍCULO E PCN’S
Pensando em uma prática pedagógica que considere importante a aplicabilidade
de conhecimento adquirido, faz-se necessário que tanto a instituição de ensino quanto os
professores tenham clareza sobre a concepção de ensinar, para poder intervir, de forma
a contribuir para a construção do novo conhecimento. Podemos aqui nos reportar a
Bachelard (1996), que defende que precisamos errar em ciência, pois o conhecimento
científico só se constrói pela retificação desses erros. O erro passa a assumir uma função
positiva na gênese do saber e a própria questão da verdade se modifica. Portanto cabe a
nós educadores matemáticos repensarmos sobre a necessidade dos estudantes errarem
no processo de ensino-aprendizagem. Dessa forma o erro passa então a ter um sentido
positivo que favorece a aquisição do saber.
Morin (2003) denota que não podemos esquecer-nos da importância da errância
como uma visão diferente da verdade. Enfatiza que o maior erro é subestimar o próprio
erro. Segundo ele a idéia de se possuir uma verdade torna o homem insensível aos erros,
palavras do autor “A idéia de verdade é a maior fonte de erro imaginável; o erro
fundamental reside na apropriação monopolista da verdade”. (MORIN, 2003, p. 27).
De acordo com essa concepção, não se pode denotar ao conceito de erro
significado sinônimo de fracasso, mas admiti-lo como elemento integrante da evolução
e desenvolvimento do espírito científico. Percebe-se dessa forma que o professor deve
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encarar o aluno que erra não como fracassado, mas sim em desenvolvimento cognitivo,
em construção/reconstrução do conhecimento, pois o aprendizado não se acaba, não se
atribui a ele um resultado final. E ao aproveitar o erro do aluno, podemos estar
permitindo a este a oportunidade de corrigir este erro e consolidar seu aprendizado.
Portanto cabe a nós educadores matemáticos repensarmos sobre a necessidade dos
estudantes errarem no processo de ensino-aprendizagem. Dessa forma o erro passa
então a ter um sentido positivo que favorece a aquisição do saber.
Popper (1979, p. 65), argumenta da seguinte forma: Acredito, e muita gente
acredita, como eu, que todo o ensino de nível universitário (e se possível de nível
inferior) deveria consistir em educar e estimular o aluno a utilizar o pensamento crítico.
As palavras de Morin (2003), de Bachelard (1996) e Popper (1979) nos remete a
reflexão de qual seria o melhor perfil para o futuro professor de matemática.
Segundo o Projeto Político Pedagógico do Curso de Matemática (2003, p.03- 04)
esse profissional deve atender a demanda que o atual contexto exige, deve estar
habilitado para o exercício do Magistério na educação básica, na área de Matemática.
Assim: [...] O Licenciado em Matemática deve ser livre, competente e
compromissado. Livre, no sentido que esse profissional tenha consciência de suas escolhas quanto ao tema que trabalhará com seus alunos e quanto a forma pela qual irá trabalhar num contexto educativo do ensino de Matemática. Competente, como condição que permite a liberdade. Assim, a formação de nossos alunos não deve ser reduzida apenas ao domínio do conteúdo matemático, mas também a compreensão das idéias básicas que o fundamentam, ou seja, aos domínios dos modos de pensar próprios da criação e do desenvolvimento da Matemática. Compromisso deve ser entendido como inconformismo com relação ao quadro geral de fracasso do ensino da Matemática. Deve ser entendido como compromisso de reflexão-ação e de transformação, portanto político.
O futuro professor de Matemática deve está absorvido com a relação teórica e
prática, com os processos formativos dos seus alunos e com o quotidiano escolar.
Fundamentalmente, que estejam envolvidos com questões e uso da ciência e tecnologia
e com os desafios e problemas do mundo contemporâneo.
Entre os recursos didáticos citados nos Parâmetros Curriculares Nacionais -
PCN’s, terceiro e quarto ciclos, destacam-se os jogos cujas vantagens são perceptíveis
desde que o professor tenha objetivos claros do que pretende atingir com a atividade
proposta. Mesmo que o jogo propicie simulação de problemas, entendemos que essas
situações vivenciadas durante a partida levam o jogador a planejar as próximas jogadas
para haver de fato um melhor aproveitamento. É claro que acreditamos que isso só
ocorrerá de fato se for mediado pelo professor.
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Os jogos constituem uma forma interessante de propor problemas, pois permitem que estes sejam apresentados de modo atrativo e favorecem a criatividade na elaboração de estratégias de resolução e busca de soluções. Propiciam a simulação de situações-problema que exigem soluções vivas e imediatas, o que estimula o planejamento das ações; possibilitam a construção de uma atitude positiva perante os erros [...] (PCN, 1998, p. 46).
Entendemos, portanto que a aprendizagem deve acontecer de forma interessante
e prazerosa e um recurso que possibilita isso são os jogos. Além de nos dar a
possibilidade de verificação se os discentes fixaram determinados conceitos
matemáticos, nos permite também no momento da ação a correção quase que imediata
desses conceitos. Guzmán (1986) expressa muito bem o sentido que essa atividade tem
na Educação Matemática quando afirma “O interessante dos jogos na educação não é
apenas divertir, mas sim extrair dessa atividade matérias suficientes para gerar um
conhecimento, interessar e fazer com que os estudantes pensem com certa motivação”.
UMA EXPERIÊNCIA COM JOGOS NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
O presente trabalho se desenvolveu na Universidade Federal do Acre - UFAC,
no município de Rio Branco, no âmbito da disciplina Oficina de Matemática, com 32
(trinta e dois) alunos do quinto período de 2011 matriculados na mesma com o objetivo
de confeccionar materiais didáticos para laboratório de ensino podendo posteriormente
ser utilizado nos momentos de regência do Estágio Supervisionado. Além de incentivar
o futuro professor a produção de novos saberes, propondo reflexões sobre os aspectos
teóricos e práticos da utilização de jogos.
Em conversa com a turma selecionamos conteúdos referentes às séries finais do
Ensino Fundamental, tais como: Expressões numéricas; equações do 1 grau; frações
equivalentes; porcentagem; potenciação e sistemas de equações do 1 grau.
A disciplina iniciada em 16 (dezesseis) de março do corrente ano foi trabalhada
com o intuito de mostrar ao futuro professor a importância de se trabalhar com novas
metodologias em sala de aula. Para tanto as aulas foram estruturadas da seguinte forma.
Discussão dos textos “O Desafio de Ensinar Matemática” de Toledo, Marília e Toledo,
Mauro (1997); “jogos na educação matemática” e “Vivenciando e avaliando atividades
com Jogos” de Ribeiro (2008) e de Smole, Diniz e Milani (2007), “Os jogos nas Aulas
de Matemática”.
Partimos do pressuposto que o futuro professor teria que ter uma compreensão
de como se configura essa metodologia de jogos no contexto educativo e seu potencial
pedagógico até a construção do conhecimento matemático utilizando a metodologia de
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jogos nas aulas de matemática. Após o entendimento da proposta do trabalho a que nos
propusemos fazer dividimos a turma em grupos totalizando 09 (nove) grupos onde
inicialmente a professora propôs alguns jogos diferenciados para cada grupo. Os
mesmos passaram a estudá-lo em conjunto com a mesma antes da confecção do próprio
jogo. Após de debatido e tirada todas as dúvidas com a professora o grupo partiu para a
confecção do jogo. Posteriormente à confecção, os grupos passaram a jogar entre si para
se aprofundarem no conteúdo matemático envolvido no seu jogo, para a correção de
possíveis conceitos ali explorados. Em seguida, passaram a fazer uma exposição oral do
seu jogo específico e qual o conteúdo matemático envolvido e o objetivo que se
propunham alcançar. Para fins didáticos e de apresentação, cada proposta de jogo
continha: pequena Introdução; objetivos; pré-requisitos que o aluno deveria possuir para
jogar; número de jogadores aconselhável; material utilizado para confecção; regras.
Num segundo momento fizeram um relatório descrevendo todos os passos desde
a construção do conhecimento matemático apresentado no jogo construído, as
dificuldades encontradas pelos mesmos na confecção do jogo e nos estudos em grupos
realizados pelas equipes, enfocando os pontos positivos e negativos com o trabalho
realizado pelo grupo e com o que perceberam dos demais grupos.
As aulas nesse momento das apresentações foram gravadas com o intuito de
corrigirmos falhas de conceitos que poderiam passar despercebidas nesse primeiro
momento. É importante dizer que nesse processo a professora da disciplina e todos os
outros grupos faziam registros dos pontos positivos e negativos percebidos pelos
mesmos frente às apresentações dos colegas para possíveis correções e discussões após
as explanações, conforme figura 02 no final do artigo.
De acordo com Ghedin et al. (2010, p.135): [...] Refletir sobre os conteúdos trabalhados, as maneiras como se trabalha, a postura frente aos educandos, frente ao sistema social, político, econômico, cultural é fundamental para se chegar à produção de um saber fundado na experiência. Deste modo, o conhecimento que o educador “transmite” aos
educandos não é somente aquele produzido por especialistas deste ou daquele campo específico de conhecimento, mas ele próprio se torna um especialista do fazer.
Pensando nesses aspectos, nós formadores começamos a refletir sobre nossa
própria prática em sala de aula com os professores em formação e rever nossa postura
enquanto professor formador. Enquanto formadores temos que estar em constante
reflexão a respeito de nossas práticas pedagógicas e daí procurarmos socializar nossas
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idéias para compartilharmos essa prática com outros colegas. Prática e teoria são
elementos inseparáveis.
Daí a importância do registro porque este nos obriga a estudar e ir à busca de
fundamentação teórica. Porém não é tarefa fácil refletir e registrar nossa própria prática,
desse modo, tem-se consciência da importância desse exercício no processo de
apropriação do pensamento e do ensino aprendizagem.
Smole, Diniz e Milani (2007, p.18) enfatizam que: [...] os registros sobre matemática ajudam a aprendizagem dos alunos de muitas formas, encorajando a reflexão, clareando as idéias e agindo como um catalisador para as discussões em grupo. Os registros ajudam o aluno a aprender o que está estudando. Do mesmo modo, quem observa e lê as produções dos alunos tem informações importantes a respeito de suas aprendizagens, o que significa que nos registros produzidos temos outro importante instrumento de avaliação.
Em outras palavras após jogarem os alunos podem escrever sobre o jogo
manifestando suas opiniões, suas dúvidas o que aprenderam e suas impressões sobre a
ação vivenciada. Percebe-se que o registro do aluno relacionado às observações dos
mesmos sobre o que aprenderam com o jogo é um instrumento eficaz para detectarmos
o seu aprendizado sobre o tema especificado no jogo. Além de ser um instrumento
eficaz, pois analisar os registros dos discentes como instrumento de avaliação é quase
sempre mais eficaz do que uma prova pontual, pois permite intervenções imediatas na
realidade observada, não necessitando esperarmos uma prova bimestral para
verificarmos o aprendizado. Veja uma amostra dos jogos sendo apresentados durante a
aula de Oficina de Matemática conforme figura 03.
APLICAÇÕES DOS JOGOS MATEMÁTICOS NO COLÉGIO DE APLICAÇÃO
– CAP/UFAC
Além do trabalho com a teoria e a prática de forma simultânea e integrada,
criou-se, na disciplina Oficina de Matemática, um espaço destinado à elaboração de
material didático para laboratório de ensino. Nessa disciplina, os alunos têm a
oportunidade de criar jogos de vários níveis, testarem em sala de aula e corrigir falhas
apresentadas pelo jogo, finalizando com a confecção do mesmo, após de testado em sala
de aula.
De acordo com Ribeiro, (2008, p. 24): Em contraposição a um modelo de escola que privilegia atividades repetitivas e rotineiras sem qualquer estímulo à criação e à investigação, um trabalho com jogos matemáticos pode representar a mudança para uma nova configuração escolar, voltada ao desenvolvimento de sujeitos críticos,
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reflexivos, inventivos, entusiastas, num exercício permanente de promoção de autonomia.
O aluno e o professor trabalham de forma conjunta debatendo a teoria existente
por de trás de cada jogo proposto e após várias jogadas o aluno vai tendo um olhar
diferenciado de como explorar o conteúdo matemático através da metodologia de jogo.
Estando prontos e seguros dos conteúdos a abordar em sala de aula através da
metodologia de jogos, professora da disciplina “Oficina de Matemática” e professores
em formação inicial saem da Ufac e vão ao colégio de Aplicação aplicar os jogos
confeccionados. Os trabalhos foram apresentados no Colégio de Aplicação da Ifes no
dia “Nacional da Matemática - 06 de maio de 2011”, conforme figura 04.
Acreditamos que os jogos, além de úteis para o desenvolvimento do raciocínio
lógico, a criatividade e a capacidade de manejar situações reais, podem, ainda, servir de
elemento facilitador no despertar do aluno para a importância da matemática para a sua
vida social, cultural e política.
Nesse sentido, Borin (1996. p.09) diz que: Outro motivo para a introdução de jogos nas aulas de matemática é a possibilidade de diminuir bloqueios apresentados por muitos de nossos alunos que temem a Matemática e sentem-se incapacitados para aprendê-la. Dentro da situação de jogo, onde é impossível uma atitude passiva e a motivação é grande, notamos que, ao mesmo tempo em que estes alunos falam Matemática, apresentam também um melhor desempenho e atitudes mais positivas frente a seus processos de aprendizagem.
Nesse norte, Malba Tahan (1968) afirma que “para que os jogos produzam os
efeitos desejados é preciso que sejam de certa forma, dirigidos pelos educadores”. Com
efeito, se partirmos do princípio de que as crianças pensam de maneira diferente dos
adultos e de que nosso objetivo não é ensiná-las a jogar e, sim, acompanhar a forma
como jogam, talvez possa auxiliá-las a construir regras e a pensar de modo que
entendam o raciocínio instalado por trás de cada jogo. É evidente que, nesse processo de
observação atenta, o professor interferirá, sempre que possível, para abordar questões
interessantes, sem, no entanto, perturbar a dinâmica dos grupos.
Outro ponto que merece destaque que percebemos nessa caminhada foi que a
medida que os professores em formação iam criando maturidade em ensinar os
conteúdos matemáticos através da metodologia de jogos, os mesmos na medida do
possível aplicavam também o aprendizado adquirido na disciplina Oficina de
Matemática, durante sua regência em Estágio Supervisionado nas escolas campo de
estágio e procuravam nas suas aulas introduzir uma nova forma de ensinar os conteúdos
matemáticos utilizando jogos.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na busca de respostas para o problema investigativo, percebemos que ensinar
matemática hoje, depende muito mais da capacidade do professor de encontrar um
caminho em meio à experiência que seus alunos trazem para a sala do que da execução
de um plano extremamente minucioso e elaborado. Verificamos que o ensino é bom, na
medida em que o aluno é incentivado a pensar e raciocinar ao invés de imitar ou
reproduzir resultados. O fracasso na aprendizagem da Matemática se deve, em grande
parte, ao fato de as atividades escolares serem desvinculadas das situações de vida dos
alunos. Observa-se que a linguagem utilizada na escola não é a do aluno e isso acarreta
que a Matemática passe a não fazer sentido para ele, uma vez que o mesmo não tem
oportunidade de construir seus próprios conhecimentos.
O que fazermos diante da situação? Ficarmos de braços cruzados? É claro que
não, cabe a nós educadores ficarmos atentos ao desenvolvimento individual e do grupo
que estamos trabalhando no momento, pois as pessoas percorrem caminhos parecidos,
mas em velocidades diferentes, de acordo com o meio em que vivem e principalmente
dos estímulos que recebem dos adultos que os cercam. A partir do desenvolvimento das
atividades na disciplina de Oficina de Matemática, observamos alguns avanços
referentes à Educação Matemática através da metodologia de ensinar por meio de jogos,
permitindo a tarefa de mudar o ensino formativo para criativo e transformador fato esse
relatado por professores em formação.
A respeito do que aprendemos especificamente da nossa dimensão teórico-
epistemológica, daquilo que veio à tona a partir das nossas experiências como
pesquisadoras que teve como objeto de estudo os jogos matemáticos, tivemos a
oportunidade de constatar que essa prática, além de ter contribuído para a nossa
maturidade como professora, também ajudou-nos a compreender a sala de aula como
um espaço de construção da cidadania, pois vivemos na era da informação e a escola já
não comporta somente a transmissão dos saberes acumulados ao longo da história, mas
necessita de mais um ambiente propício à incorporação dos vários saberes, atitudes,
valores esses que garantam a inserção do indivíduo nessa sociedade.
Concernente à nossa dimensão ontológica ganhou-se maturidade e ampliou-se o
sentimento de pertencimento do se sentir e do ser professor, principalmente a partir das
incertezas, das dificuldades e dos medos que experienciamos durante o percurso que
fizemos, quando nos víamos como uma das pessoas responsáveis pela condução de uma
experiência alternativa na formação daqueles professores em formação. Portanto,
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repensar o papel do professor nesse contexto é essencial, pois os mesmos não podem
mais se limitar a somente assumir papéis de reprodutores dos conhecimentos, mas de
incorporarem a postura de profissionais do ensino e também de pesquisadores em
educação. Assim, esse novo formato de ensinar conteúdos matemáticos através de jogos
se bem aplicados todos ganham. Ganha o professor por ter a possibilidade de propor
novas formas dos seus alunos aprenderem e ganha o aluno (professor em formação),
pois passa a ser mais autônomo, desenvolvendo outras habilidades que lhe serão úteis
por toda a sua vida.
Almejamos que a proposta ora aqui apresentada de um ensino-aprendizagem
utilizando jogos matemáticos, estimule os pesquisadores da área de educação, em
especial aqueles preocupados com o ensino da matemática a realizar suas observações e
críticas, ajudando a corroborar ou refutar nossas conjecturas.
REFERÊNCIAS
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GHEDIN, Evandro; PIMENTA, Selma Garrido; (Orgs.). Professor Reflexivo no
Brasil: gênese e crítica de um conceito. São Paulo: Cortez, 2010.
GUZMÁN, M. de. Aventuras Matemáticas. Barcelona: Labor, 1986.
LARA, Isabel Cristina Machado de. Jogando com a Matemática de 5ª a 8ª série. São Paulo: Rêspel, 2003.
LEONTIEV, A. et al. Psicologia e Pedagogia: bases psicológicas da aprendizagem e do desenvolvimento. São Paulo: Centauro, 2005.
MORIN, Edgar. CIURANA, Emilio. MOTTA, Raúl. Educar na era planetária: o pensamento complexo como método da aprendizagem no erro e na incerteza humana. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2003.
NEGRINE, Airton. Aprendizagem e desenvolvimento infantil. Porto Alegre: PRODILO, 1994.
PARÂMETROS Curriculares Nacionais: Matemática/Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.166p.
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POPPER, Karl. A ciência normal e seus perigos. Em LAKATOS, Imre; MUSGRAVE, Alan (Orgs.). A crítica e o desenvolvimento do conhecimento. São Paulo: Cultrix; EDUSP, 1979. p. 63-71.
PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE MATEMÁTICA (em execução desde
2004). Aprovado no Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFAC em 09-12-2003.
RIBEIRO, Flávia Dias. Jogos e Modelagem na Educação Matemática. Curitiba: IBPEX, 2008.
SMOLE, Kátia Cristina Stocco; DINIZ, Maria Ignez de Souza Vieira; MILANI, Estela. Jogos de Matemática de 6 a 9 ano. Porto Alegre: Artmed, 2007.
TAHAN, M. O homem que calculava. Rio de Janeiro: Record, 1968.
FIGURAS
Desenvolvimento das atividades
Figura 2: Oficina de Matemática Fonte: Bezerra, 2011.
Figura 4: Oficina de Matemática Fonte: Bezerra, 2011.
Figura3: Aulas ministradas Fonte: Simone, 2011.
Figura 1: Figura 01: Classificação dos Jogos de acordo com Wallon, Piaget, Vygotsky e Lara Fonte: Adaptação de Negrine (1994) e Lara (2003).
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