Post on 11-Nov-2018
DEPARTAMENTO DE CINCIAS DA VIDA
FACULDADE DE CINCIAS E TECNOLOGIA
UNIVERSIDADE DE COIMBRA
Novas estratgias teraputicas para a
leishmaniose : Efeitos do p -cimeno e 2-
nitro-p -cimeno em Leishmania
Infantum
Mariana Vagos Ribeiro
2011
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DEPARTAMENTO DE CINCIAS DA VIDA
FACULDADE DE CINCIAS E TECNOLOGIA
UNIVERSIDADE DE COIMBRA
Novas estratgias teraputicas para a
leishmaniose : Efeitos do p -cimeno e 2-
nitro-p -cimeno em Leishmania
Infantum
Mariana Vagos Ribeiro
2011
Dissertao apresentada Universidade de Coimbra para cumprimento dos requisitos necessrios obteno do grau de Mestre em Biologia Celular e Molecular, realizada sob a orientao cientfica da Professora Doutora Maria do Cu Rodrigues de Sousa (Universidade de Coimbra) e do Professor Doutor Jos Barata Custdio (Universidade de Coimbra)
- 3 -
NDICE
- 4 -
NDICE
AGRADECIMENTOS Pag. 8
NDICE DE FIGURAS E TABELAS.... Pag. 10
ABREVIATURAS Pag. 13
I.- RESUMO..... Pag. 16
II - INTRODUO.................................................................................. Pag. 20
1.- Leishmania e a leishmaniose......
1.1- Classificao taxonmica de L. infantum....
1.2- Morfologia e ciclo biolgico.......
1.3- Fisiopatologia da leishmaniose....
1.3.1- Leishmaniose visceral....
1.3.2- Leishmaniose cutnea...
1.3.3 - Leishmaniose muco-cutnea
1.4- Epidemiologia..
1.5- Teraputica......
Pag. 20
Pag. 20
Pag. 21
Pag. 23
Pag. 24
Pag. 25
Pag. 26
Pag. 26
Pag. 28
2- Os leos essenciais e actividade biolgica Pag. 30
3.- Estrutura e funes da mitocndria......
3.1- Fisiologia, ultra estrutura e funes metablicas das mitocndrias
3.2- O sistema de transporte de electres e a fosforilao oxidativo....
3.3- Envolvimento da mitocndria nos mecanismos de morte celular...
3.3.1- Importncia da mitocndria nos processos apoptticos...
3.4 - Aco da mitocndria na homeostase do Ca2+ celular...
3.5- Permeabilidade transitria mitocondrial......
Pag. 31
Pag. 31
Pag. 33
Pag. 36
Pag. 37
Pag. 40
Pag. 43
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III- OBJECTIVOS
Pag. 47
IV - MATERIAL E MTODOS..
Pag. 49
1- Susceptibilidade de Leishmania infantum ao 2-nitro-p-cimeno
e p-cimeno..
1.1- Origem das estirpes e manuteno das culturas..
1.2- Determinao do crescimento..
1.3- Estudos de viabilidade celular..
1.4- Estudos morfolgicos.....
2- Avaliao dos efeitos do 2-nitro-p-cimeno e do p-cimeno na
bioenergtica mitocondrial....
2.1- Isolamento de mitocndrias de fgado de rato...
2.2- Determinao da concentrao de protena..
2.3- Determinao do consumo de oxignio..
2.4- Determinao do potencial de membrana das mitocndrias...
3- Avaliao dos efeitos do 2-nitro-p-cimeno e do p-cimeno na
permeabilidade transitria mitocondrial....
4- Avaliao de efeitos do 2-nitro-p-cimeno e do p-cimeno na
integridade das mitocndrias...
5- Estudo estatstico
Pag. 49
Pag. 49
Pag. 49
Pag. 50
Pag. 52
Pag. 53
Pag. 53
Pag. 54
Pag. 54
Pag. 56
Pag. 57
Pag. 58
Pag. 58
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V RESULTADOS....
Pag. 60
1- Actividade anti-Leishmania do 2-nitro-p-cimeno e do p-
cimeno...................................................................................................
1.1- Estudo do crescimento de promastigotas de L. infantum.
1.2- Efeitos na viabilidade de promastigotas de L. infantum...
1.3- Efeitos na morfologia de promastigotas de L. infantum...
2- Efeitos na bioenergtica mitocondrial...
2.1- Efeitos do p-cimeno no consumo de oxignio e potencial de
membrana mitocondrial.
2.2- Efeitos do 2-nitro-p-cimeno no consumo de oxignio e potencial
de membrana mitocondrial....
3- Efeitos do p-cimeno e do 2-nitro-p-cimeno na permeabilidade
transitria mitocondrial..
Pag. 60
Pag. 60
Pag. 61
Pag. 62
Pag. 64
Pag. 64
Pag. 70
Pag. 77
VI - DISCUSSO E CONCLUSES..
Pag. 81
VII - BIBLIOGRAFIA .
Pag. 86
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AGRADECIMENTOS
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AGRADECIMENTOS Professora Doutora Maria do Cu Sousa por tudo que me ensinou e
transmitiu, pelo apoio, pacincia, disponibilidade, incentivo e constante
acompanhamento ao longo deste trabalho.
Ao Professor Doutor Jos Custdio por me fazer ver mais alm a rea da
bioenergtica, pelo apoio, incentivo e disponibilidade pronta com que me
acompanhou ao longo de todo este trabalho.
Doutora Marisa Machado por me ter integrado na dinmica de
laboratrio, por toda a ajuda, disponibilidade, apoio e boa disposio com que
sempre me brindou. `
Ao Joo Vtor e Mariana Ponte Ribeiro pela ajuda e companheirismo
preciosos.
A toda a equipa dos laboratrios de Bioqumica e Microbiologia da
Faculdade de Farmcia pelo companheirismo, ajuda e momentos de boa
disposio.
A todos os meus amigos por estarem sempre ao meu lado quando
preciso.
Aos meus pais e irmo pela pacincia e motivao inesgotveis, por
continuarem a acreditar em mim mesmo quando eu tinha dvidas, sem vocs
seria muito mais difcil.
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NDICES DE FIGURAS E TABELAS
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NDICE DE FIGURAS E TABELAS
Figura 1 - Forma promastigota (A) e amastigota (B) (adaptado de Pace D et al
2011) de Leishmania infantumPag. 21
Figura 2 - Ciclo de biolgico de Leishmania sp. (adaptado de Marques et al
2007)Pag. 22
Figura 3 - Manifestao clnica de Leishmaniose Cutnea (adaptado de
Malekpour M et al 2010)Pag. 25
Figura 4 - Manifestao clnica de Leishmaniose muco-cutnea (adaptado de
www.who.int/leishmaniasis/mucocutaneous_leishmaniasis).....................Pag. 26
Figura 5 - Distribuio geogrfica mundial dos casos de leishmaniose, bem
como dos casos de co-infeco com VIH 1990 a 1998Pag. 27
Figura 6 - Mecanismos de aco dos frmacos anti-Leishmania.(adaptado de
Croft and Coombs, 2003)........................................................Pag. 28
Figura 7 - Estrutura qumica do p-cimeno e do seu derivado sinttico 2-nitro-p-
cimeno..Pag. 30
Figura 8 - Estrutura da mitocndria: modelo clssico e estrutura com locais de
contacto nas membranas mitocondriais..Pag. 32
Figura 9 - Representao esquemtica do sistema de transporte de electres
(complexos I, II, III, IV) e do sistema fosforilativo (complexo V).....Pag. 35
Figura 10 - Relao entre a mitocndria e a morte celular, evidenciando a
importncia da quantidade de ATP nos processos apoptticos e
necrticos.Pag. 39
Figura 11 - Representao esquemtica dos complexos respiratrios;
FoF1Sintetase; e dos componentes do poro de permeablidade transitria na
membrana mitocondrial interna (MMI) e membrana mitocondrial externa
(MME)...Pag. 44
Figura 12 - Cmara de Neubauer para contagem de clulas.Pag. 50
Figura 13 - Reduo do brometo 3-(4,5-dimetiltiazol-2-il)-2,5-
difeniltetrazlio (MTT) pelas desidrogenases mitocondriais..PAG. 50
Figura 14 Esquema de uma preparao em gota pendente usando a
lmina de Koch..PAG. 52
Figura 15 Representao esquemtica de um registo tpico obtido a partir de
experincias com elctrodo de TPP+..Pag. 57
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed?term=%22Malekpour%20M%22%5BAuthor%5Dhttp://www.who.int/leishmaniasis/mucocutaneous_leishmaniasis).....................Pag
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Figura 16- Curva de crescimento de promastigostas de Leishmania
infantumPag. 60
Figura 17- Efeitos do p-cimeno e do 2-nitro-p-cimeno na viabilidade celular de
promastigotas de L. infantumPag. 61
Figura 18. Observao das formas promastigotas de L. infantum a fresco por
microscopia de contraste de fases..Pag. 62
Figura 19 - Observao por microscopia ptica de promastigotas de L.
infantum incubadas durante 24 horas na presena e ausncia dos compostos
em estudo, aps colorao de Giemsa..Pag. 63
Figura 20 - Efeito do p-cimeno (PCy) nos estados 2, 3 e 4 da respirao de
mitocndrias de fgado induzido por glutamato/malatoPag. 64
Figura 21 - Efeito do p-cimeno (PCy) no ICR (A) e no quociente ADP/O (B).
Pag.66
Figura 22 - Efeitos do p-cimeno (PCy) no intumescimento mitocondrial..Pag. 67
Figura 23 - Efeito do p-cimeno (PCy) e do ATP (A) no estado 2 e no estado 4
da respirao, na presena de oligomicina (St4-olig) (B).Pag.68
Figura 24 - Efeito das vrias concentraes de 2-nitro-p-cimeno (NPCy) nos
estados 2, 3 e 4 da respirao de mitocndrias de fgado de ratoPag. 71
Figura 25. Efeito do 2-nitro-p-cimeno (NPCy) no ndice de controlo respiratrio
(IRC) (A) e no quociente ADP/O (B)Pag. 73
Figura 26 - Efeitos do 2-nitro-p-cimeno (NPCy) no intumescimento
mitocondrial..Pag. 74
Figura 27- Efeito do p-cimeno (NPCy) e do ATP (A) no estado 2 e no estado 4
da respirao, na presena de oligomicina (St4-olig) (B)Pag. 75
Figura 28- Efeitos do 2-nitro-p-cimeno (NPCy) no potencial de membrana ()
e na fosforilao oxidativa de mitocndrias de fgado de ratoPag. 76
Figura 29 - Efeitos do p-cimeno (PCy) nos fluxos de Ca2+ de mitocndrias
isoladasPag.78
Figura 30 - Efeitos do 2-nitro-p-cimeno (NPCy) nos fluxos de Ca2+ de
mitocndrias isoladas.Pag. 79
NDICE DE TABELAS
Tabela 1-Efeitos of p-Cymeno (pCy) em parmetros da fosforilao oxidativa
de mitocndrias de fgado de ratoPag. 69
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ABREVIATURAS
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ABREVIATURAS
Abs Absorvncia
ADP Adenosina 5- difosfato
ADP/O Razo entre as nanomoles de ADP fosforiladas e os
nanotomos de oxignio consumidos
AMP
ANT
Adenosina 5-monofosfato
Transportador de nucletidos de adenina
ATP Adenosina 5-trifosfato
BSA Albumina bovina srica
CoQ
CyA
Cyt.c
DMSO
DNA
p
pH
EDTA
EGTA
FCCP
F1
Fo
HEPES
ICR
MON-1
MPT
MTT
NAD+
NADH
NADP+
NADPH
Coenzima Q
Ciclosporina A
Citocromo c
Dimetilsulfxido
cido desoxirribonucleico
Potencial elctrico transmembranar
Fora protomotriz
Gradiente de pH
cido etilenodiaminotetractico
cido etilenoglicoltetractico
carbonildiciano-p-trifluoro-metoxifenil-hidrazona
Subunidade cataltica da ATP sintase
Subunidade da ATP sintase inibida por oligomicina
cido N-2-hidroxietil-piperazina-N-2-etanossulfnico
ndice de controlo respiratrio (definido como o quociente entre
os estados 3 e 4 da respirao
Monpellier-1
Permeabilidade transitria mitocondrial
3-(4,5-dimetiltiazol-2-il)-2,5-difeniltetrazlio
Dinucletido de nicotinamida adenina (oxidado
Dinucletido de nicotinamida adenina ( reduzido)
Dinucletido de fosfato de nicotinamida adenina (oxidado)
Dinucletido de fosfato de nicotinamida adenina (reduzido)
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nAtg
NPCy
OMS
PCy
Pi
RNA
ROS
RPMI
SBF
SD
SDS
TPP+
UCPs
UQ
UV
Nano tomos grama
2-nitro-p-cimeno
Organizao Mundial de Sade
p-cimeno
Fosfato inorgnico
cido ribonucleico
Espcies reactivas de oxignio
Meio de cultura Roswell Park Memorial Institute
Soro Fetal Bovino
Desvio padro
Dodecilsulfato de sdio
Catio tetrafenilfosfnio
Protenas dissociadoras (do ingls, uncoupling proteins)
Ubiquinona ou coenzima Q
Ultravioleta
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RESUMO
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I - Resumo
A leishmaniose uma doena infecciosa parasitria que afecta cerca de
12 milhes de pessoas em todo o Mundo, bem como animais domsticos e
selvagens, ocorrendo, predominantemente, em regies tropicais e sub-
tropicais. O agente etiolgico um parasita intracelular obrigatrio do gnero
Leishmania e o hospedeiro infectado pode desenvolver leses cutneas, muco-
cutneas ou viscerais, dependendo da espcie infectante, bem como da
resposta imunitria do hospedeiro. O zimodemo de Leishmania infantum mais
frequente na zona mediterrnica o MON-1, sendo responsvel pela grande
maioria dos casos diagnosticados de leishmaniose visceral e por alguns casos
de leishmaniose cutnea. Em Portugal, as leishmanioses humana e canina tm
uma prevalncia significativa, estando as zonas de Trs-os-Montes e Alto
Douro, Bacia hidrogrfica do Mondego, Regio metropolitana de Lisboa e
Algarve identificadas como zonas endmicas.
Segundo a OMS a leishmaniose visceral tem vindo a surgir com uma
complicao associada a doenas que comprometem o sistema imunitrio,
como o VIH. Dos primeiros 1700 casos reportados de co-infeco at 1998, em
33 pases, 85% foram registados em Espanha, Itlia, Frana e Portugal, sendo
esta uma problemtica emergente e prioritria na procura de novas
teraputicas
Actualmente, a quimioterapia constitui a principal teraputica no controlo
da leishmaniose, no sendo, no entanto, suficientemente eficaz. Os frmacos
mais utilizados no tratamento das leishmanioses so os compostos antimoniais
pentavalentes, o alopurinol e a anfotericina B, mas estes, para alm de serem
caros, tm mostrado elevada toxicidade, resistncia dos parasitas aos
medicamentos e, na maioria dos casos, tm um sucesso limitado. , portanto,
necessrio desenvolver terapias alternativas e caracterizar novos alvos
teraputicos para obter tratamentos mais eficientes, especficos e menos
txicos.
Na procura de alternativas teraputicas, os leos essenciais e/ou os seus
componentes, tm vindo a ganhar visibilidade devido sua aco anti-
bacteriana, antiparasitria, antifngica e antiviral, representando um grupo de
molculas que podem ser altamente eficazes na leishmaniose. Estudos in vitro
- 17 -
demonstram que o monoterpeno p-cimeno tem uma aco antimicrobiana
contra Staphylococcus aureus e Escherichia coli.
Com o objectivo de estudar a actividade anti-Leishmania do p-cimeno e
do seu derivado sinttico 2-nitro-p-cimeno, foram realizados ensaios de
viabilidade celular e de morfologia de promastigotas de L. infantum. O p-cimeno
no induziu perda de viabilidade celular nem alteraes morfolgicas. No
entanto, o 2-nitro-p-cimeno teve efeitos significativos na reduo da viabilidade
celular, com um IC50 de 145 g/ml. Estes resultados sugerem que a introduo
do grupo nitro na estrutura qumica do p-cimeno foi determinante na actividade
anti-Leishmania.
O modo de aco dos monoterpenos est relacionado com vrios alvos
na clula e embora os mecanismos especficos de actividade e os efeitos
citotxicos permaneam por caracterizar, estudos recentes sugerem que estes
compostos devero actuar promovendo perturbaes na permeabilidade de
membranas, ou at mesmo afectar a integridade membranar dos
microrganismos, interferindo com todas as suas funes.
A mitocndria tem uma importncia fundamental nos processos de
sobrevivncia e morte celular, dado que essencial para a produo de ATP,
atravs do processo de fosforilao oxidativa, sendo tambm o principal
organelo responsvel pela formao intracelular de espcies reactivas de
oxignio e mecanismo de regulao celular. Assim, as alteraes na estrutura
e funes mitocondriais induzidas pelo p-cimeno e pelo 2-nitro-p-cimeno foram
tambm avaliadas atravs de ensaios sobre a bioenergtica de mitocndrias de
rato, bem como na permeabilidade transitria mitocondrial. Os resultados
sugerem efeitos significativos de ambos os compostos na bioenergtica
mitocondrial, com maior actividade do 2-nitro-p-cimeno, induzidos por
mecanismos diferentes. Nas mitocndrias incubadas com o p-cimeno, a
estimulao induzida no estado 4 da respirao significativamente diminuda
na presena de oligomicina, indicativo de que as perturbaes na capacidade
fosforilativa e aumento do estado 4 da respirao se devem fuga de protes
ao nvel da fraco Fo da ATP sintase. A estimulao do estado 4 da
respirao induzido pelo 2-nitro-p-cimeno no foi significativamente alterada
por oligomicina, no ocorrendo tambm alteraes no intumescimento,
sugerindo que aumento do estado 4, a diminuio do estado 3 da respirao e
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consequente diminuio do ndice de controlo respiratrio, bem como
diminuio do potencial de membrana se devem permeabilizao da
membrana interna mitocondrial a protes. Embora atravs de mecanismos
diferentes, ambos os compostos induzem perturbaes na permeabilidade
membranar, com consequente diminuio do potencial membranar e
diminuio da sntese de ATP. Todavia, ambos os compostos apresentam
diferentes efeitos na capacidade de regulao do Ca2+ pela mitocndria,
verificando-se alteraes apenas na presena de 2-nitro-p-cimeno.
Em concluso, os resultados sugerem que a presena do grupo nitro
fundamental na activao de mecanismos que interferem com a viabilidade
celular, homeostase do Ca2+ e bioenergtica mitocondrial. O grupo nitro,
conferindo um carcter anfiptico ao composto, permitir ao 2-nitro-p-cimeno
maior facilidade em partilhar e atravessar as membranas celulares podendo
afectar os vrios organelos intracelulares, incluindo o complexo mitocondrial.
Esta caracterstica poder explicar as diferenas observadas entre os dois
compostos e ser responsvel pela induo dos mecanismos de morte celular.
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INTRODUO
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II - INTRODUO
1 - Leishmania e a leishmaniose
A leishmaniose uma doena infecciosa parasitria que afecta cerca de
12 milhes de pessoas em 88 pases de todo o Mundo, bem como animais
domsticos e selvagens. Apesar de hoje ser considerada uma das principais
doenas parasitrias tropicais (Organizao Mundial de Sade, 2009), a
leishmaniose foi durante muito tempo uma doena negligenciada, com muitos
casos por diagnosticar. Com uma elevada taxa de mortalidade e de prevalncia
em zonas tropicais e sub-tropicais, esta doena causada por um parasita,
intracelular obrigatrio, do gnero Leishmania (Santos et al., 2008) e o
hospedeiro infectado pode desenvolver leses cutneas, muco-cutneas ou
viscerais. O desenvolvimento da doena depende do vector de transmisso,
vrias espcies de flebtomos, da espcie infectante e da resposta imunitria
do hospedeiro (Barral et al. 1991; Grimaldi et al. 1991; Liew and ODonnel
1993). Existem cerca de 350 milhes de pessoas expostas ao risco de infeco
por Leishmania, sobretudo em pases em vias de desenvolvimento, e os casos
de co-infeco com o vrus da imunodeficincia humana tm sido cada vez
mais evidentes e preocupantes.
Actualmente, a quimioterapia constitui a principal ferramenta no controlo
das leishmanioses, no entanto este tipo de teraputica , geralmente, muito
prolongado, caro e com elevados nveis de toxicidade.
1.1 - Classificao taxonmica de L. infantum
Em 1903, Leishman e Donovani descreveram, em separado, uma
protozorio agora designado de L. donovani em tecido de bao de pacientes
com uma doena crnica agora descrita como leishmaniose visceral
(Herdwaldt, 1999). Na bacia mediterrnica, L. infantum, espcie pertencente ao
mesmo gnero est descrita como sendo responsvel por 90% dos casos de
leishmaniose visceral.
A.espcie Leishmania infantum pertence ao reino Protista, sub-reino
Protozoa, filo Sarcomastigophora, sub-filo, Mastigophora, classe
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Zoomastigophorea, ordem Kinetoplastidae, sub-ordem Trypanossomatina,
famlia Tripanossomatidae e ao gnero Leishmania.
Actualmente, a identificao e caracterizao dos sub-gneros e sub-
espcies dos isolamentos de Leishmania feita por tipagem isoenzimtica
(Marques et al., 2007) Neste contexto surge a designao de zimodemo,
unidades taxonmicas que agrupam estirpes com perfis enzimticos
semelhantes. O zimodemo de Leishmania infantum mais frequente na zona
mediterrnica o MON-1, sendo responsvel pela grande maioria dos casos
diagnosticados de leishmaniose visceral e por alguns casos de leishmaniose
cutnea (Cardoso et al., 2002)
1.2 - Morfologia e ciclo biolgico
Durante o seu ciclo biolgico, todas as espcies de Leishmania alternam
entre duas formas celulares morfologicamente bem distintas. A forma
promastigota encontra-se no tracto digestivo do vector de transmisso e
caracteriza-se por ser uma clula mvel, alongada e fusiforme, de tamanho
varivel, entre 10 e 20 m de comprimento, com um flagelo na regio anterior.
A forma amastigota oval ou redonda, intracelular, sem flagelo e sem
mobilidade diferenciando-se e multiplicando-se no sistema mononuclear
fagocitrio do hospedeiro vertebrado (Dedet et al., 1999)
Figura 1 - Forma promastigota (A) e amastigota (B) (adaptado de Pace D et al 2011)
de Leishmania infantum.
B A
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Os vectores de transmisso da leishmaniose so pequenos insectos
pertencentes ordem Dptera, famlia Psychodidae e gnero Phlebotomus no
Velho Mundo e Lutzomia no Novo Mundo. Com uma distribuio disseminada
por climas temperados e tropicais, estes insectos de reduzidas dimenses
alimentam-se de sangue e so mais activos durante a noite, aproveitando o dia
para descansar em casas, adegas, caves e grutas (Hirotomo et al., 2010). Ao
contrrio dos mosquitos, os flebtomos voam de forma silenciosa em direco
ao alvo e somente as fmeas se alimentam de sangue necessrio para a
produo de ovos.
Figura 2 - Ciclo de biolgico de Leishmania sp. (adaptado de Marques et al 2007)
O ciclo de vida de Leishmania sp inicia-se com a picada da fmea do
flebtomo ao hospedeiro vertebrado infectado, ingerindo os parasitas na forma
amastigota. Uma vez no interior do vector, as amastigotas migram para o
intestino onde se diferenciam em formas promastigotas infectantes e se
multiplicam (Bates, 2006). Na prxima refeio sangunea, as fmeas
infectadas inoculam no hospedeiro vertebrado as formas promastigotas do
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parasita. Sendo detectadas comp agentes invasores, as formas promastigotas
so rapidamente fagocitadas por macrfagos. J dentro dos macrfagos as
promastigotas diferenciam-se em amastigotas e proliferam, provocando a
ruptura do macrfago infectado e a libertao das amastigotas no organismo
do hospedeiro que vo ser fagocitados por outros macrfagos (Chang, 2005).
Os macrfagos infectados podem ento migrar para os tecidos
subcutneos ou atingir o fgado, bao, medula e gnglios linfticos, conduzindo
ao desenvolvimento de leishmaniose cutnea ou visceral, respectivamente.
Assim, o desenvolvimento da doena depende da eficincia do parasita no que
diz respeito sua diferenciao na forma amastigota, tal como, da espcie
infectante e da resposta imunitria do hospedeiro (Barral et al., 1991; Grimaldi
et al., 1991; Liew and ODonnel 1993).
Pensa-se que o Homem tenha comeado por ser um hospedeiro devido a
uma exposio acidental ao ciclo biolgico do parasita. Inicialmente a
leishmaniose visceral seria uma zoonose de animais selvagens que
funcionavam como reservatrios, permitindo a manuteno a longo prazo dos
parasitas na Natureza (Ashford, 1996). Com a quebra dos limites das zonas
endmicas devido a presses antropognicas, o Homem e o co domstico
tero ficado expostos ao ciclo de transmisso de Leishmania, passando o co
domstico a ser um reservatrio destes parasitas. A proximidade com o
Homem em zonas endmicas dos flebtomos permite a transmisso da doena
e o fecho do ciclo biolgico do parasita.
1.3 - Fisiopatologia da leishmaniose
No Homem, as espcies de Leishmania causam uma variedade de
doenas clnicas dependendo da capacidade do parasita proliferar em tecidos
profundos ou superficiais. As vrias manifestaes clnicas da leishmaniose
tm sido usadas pela OMS para classificar as leishmanioses em trs formas
clnicas distintas de acordo com a sintomatologia e sistemas fisiolgicos
afectados: leishmaniose cutnea, muco-cutnea e visceral.
Alm da exposio ao ciclo biolgico do parasita na presena do vector,
existem alguns outros factores que podem aumentar o risco de infeco e
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agravar o prognstico, como a pobreza, a desnutrio e actualmente a co-
infeco com outras doenas, nomeadamente com o vrus da imunodeficincia
humana (VIH) (Desjeux, 2001). A leishmaniose , ainda, uma doena
associada pobreza em particular em pases em desenvolvimento e portanto a
disseminao real da doena permanece camuflada em grande parte porque
os mais afectados vivem em reas isoladas, mas tambm devido ao estigma
social que conduz a que os pacientes se resguardem, devido s cicatrizes e
deformaes fsicas que a doena pode causar.
1.3.1 - Leishmaniose visceral
A leishmaniose visceral a forma mais grave da doena, sendo a que
apresenta maior taxa de mortalidade caso no seja devidamente tratada. A
forma visceral tem as consequncias mais severas e pode ser causada apenas
por trs das cerca de 20 espcie de Leishmania conhecidas: L. donovani na
ndia e na frica Oriental; L. infantum na Europa e na bacia do mediterrneo; L.
chagasi na Amrica Central e do Sul. O parasita atinge as clulas do sistema
mononuclear fagocitrio, especialmente do fgado, bao, medula e dos gnglios
linfticos. A infeco pode permanecer assintomtica ou desenvolver-se de
forma aguda, sub-aguda e crnica conduzindo ao aparecimento de febre,
hepatomegalia e esplenomegalia, perda acentuada de peso, cansao e anemia
(Hirotomo, 2010). Em indivduos no tratados, a morte ocorre maioritariamente
devida a infeces secundrias devido ao comprometimento do sistema
imunitrio e da desnutrio.
Segundo a OMS a leishmaniose visceral tem vindo a surgir com uma
complicao associada a doenas que comprometem o sistema imunitrio,
como o VIH. Dos primeiros 1700 casos reportados de co-infeco at 1998, em
33 pases, 85% foram registados em Espanha, Itlia, Frana e Portugal, sendo
esta uma problemtica emergente e prioritria na procura de novas
teraputicas (Marques et al., 2007).
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1.3.2 - Leishmaniose cutnea
Leishmaniose cutnea pode ter vrios graus de severidade podendo no
manifestar-se durante um perodo varivel de tempo aps a infeco.
Geralmente as leses caracterizam-se pelo aparecimento de lceras simples
ou difusas na pele, deixando cicatrizes e, podendo mesmo, causar
desfigurao e mutilao do paciente A leishmaniose cutnea localizada
manifesta-se maioritariamente como um ndulo localizado que ulcera e
cicatriza de forma natural, mas acaba por deixar marcas e alteraes na
pigmentao da pele (Fig. 3). No caso da leishmaniose cutnea difusa, a leso
inicial no ulcera mas as formas infectantes migram para vrios pontos da
superfcie cutnea, acabando por se disseminar e ulcerar mais tarde,
apresentando um tempo de incubao que vai de alguns dias a vrios anos
Esta forma da doena pode regredir espontaneamente ou evoluir requerendo,
ento, de tratamento (Grimaldi et al., 1991).
Na bacia do mediterrneo 20% dos casos de leishmaniose cutnea esto
descritos como sendo causados pela espcie Leishmania infantum MON-1,
pelo que se coloca a questo da influncia da estirpe na manifestao clnica
exibida pelo paciente. As leses cutneas causadas por L. infantum podem ser
localizadas ou difusas e a sua evoluo crnica.
Figura - 3. Manifestao clnica de Leishmaniose Cutnea (adaptado de Malekpour M
et al 2010).
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed?term=%22Malekpour%20M%22%5BAuthor%5D
- 26 -
1.3.3 - Leishmaniose muco-cutnea
As leses muco-cutneas resultam, geralmente, da disseminao dos
amastigotas desde a pele at mucosa naso-orofarngea. Na maioria dos
casos, as manifestaes muco-cutneas tornam-se evidentes alguns anos
aps o desaparecimento das leses cutneas, mas podem tambm aparecer
enquanto estas ainda no esto curadas, devido a uma metastizao
secundria pelo organismo. Pressupe-se, ento, que o tratamento adequado
das leses cutneas diminui o risco de aparecimento de leses muco-
cutneas. Geralmente, esta variante da doena torna-se evidente devido aos
sintomas nasais crnicos, que passam pela destruio da mucosa naso-
orofarngea devido a uma sobre-estimulao do sistema imunitrio (Fig. 4).
Figura 4 - Manifestao clnica de Leishmaniose muco-cutnea (adapatado de
www.who.int/leishmaniasis/mucocutaneous_leishmaniasis)
1.4 - Epidemiologia
A leishmaniose uma zoonose disseminada por todo o Mundo com uma
maior incidncia em zonas tropicais, sub-tropicais e temperadas em que as
diferentes combinaes de parasitas, reservatrios e vectores co-existam (Fig.
5).
De acordo com a OMS, existem cerca de 350 milhes de pessoas em 88
pases em risco de infeco, com uma incidncia anual de 12 milhes de casos
(Chang, 2005). Hoje em dia considerada umas das maiores doenas
- 27 -
tropicais, apesar de durante muitos anos ter sido negligenciada e muitos casos
no terem sido reportados e tratados. O aumento da incidncia de casos de
leishmaniose poder estar relacionado com o aumento dos factores de risco,
principalmente nos pases em vias de desenvolvimento.
A co-infeco de leishmaniose visceral com o VIH tem vindo a aumentar,
provavelmente devia alteraes no ciclo de transmisso da leishmaniose. A
partilha de seringas por indivduos toxicodependentes pode ser um importante
factor neste aumento dos casos de co-infeco. Este cenrio poder vir a
agravar-se rapidamente na sia e na frica, cujos dados de prevalncia e
deteco da co-infeco ainda no so conhecidos (Alvar et al., 2008)
No Sul da Europa, Leishmania infantum o agente etiolgico da
leishmaniose visceral, sendo o co o principal reservatrio do ciclo domstico
(Moreno e Alvar, 2002). Em Portugal, as leishmanioses humana e canina tm
uma prevalncia significativa, estando as zonas de Trs-os-Montes e Alto
Douro, Bacia hidrogrfica do Mondego, Regio metropolitana de Lisboa e
Algarve identificadas como zonas endmicas.
Figura 5 - Distribuio geogrfica mundial dos casos de leishmaniose, bem como dos
casos de co-infeco com VIH 1990 a 1998 (adaptado de WHO/NTD/IDM HIV/AIDS,
Tuberculosis and Malaria (HTM) World Health Organization, 2010)
Leishmaniose Co-infeco com VIH
- 28 -
1.5 - Teraputica
Actualmente, a quimioterapia constitui a principal ferramenta no controlo
das leishmanioses, no entanto este tipo de teraputica , geralmente, muito
prolongado, caro e com elevados nveis de resistncia e toxicidade.
As drogas mais utilizadas contra a leishmaniose so os compostos
antimoniais pentavalentes, o alopurinol, a anfotericina B, ou uma combinao
de antimoniato de meglumina e alopurinol (Croft e Coombs, 2003).
Compostos Mecanismos de aco
Antimoniais pentavalentes (Glucantime e Pentostam)
Tm estruturas moleculares pouco caracterizadas e a sua aco interfere directamente com a bioenergtica mitocondrial das formas amastigotas de Leishmania sp. Estes produtos ligam-se a diferentes protenas do parasita inibindo-as, especialmente a enzimas envolvidas na gliclise e no metabolismo dos cidos gordos
Pentamidina
Derivado aromtico da diamidina, txico para vrios protozorios atravs da sua ligao ao DNA cinetoplastidial e comportando, portanto, tambm efeitos secundrios mais graves.
Anfotericina B Agente antifungico com uma aco eficiente, este composto liga-se membrana plasmtica aumentando a sua permeabilidade
Paramomicina
Em bactrias inibe a sntese proteica atravs da sua ligao subunidade 30s dos ribossomas, causando erros de leitura e finalizao precoce da traduo do mRNA. Em leishmania a paramomicina tambm afecta a mitocndria
Miltefosina Possivelmente inibe ou modela a transduo de sinal e a homeostase do clcio
Imiquimod Estimula a produo de xido ntrico em macrfagos
Figura 6 Mecanismos de aco dos frmacos anti-Leishmania.(adaptado de Croft
and Coombs, 2003)
Os compostos antimoniais pentavalentes tm estruturas moleculares
pouco caracterizadas e actuam directamente na bioenergtica mitocondrial das
formas amastigotas de Leishmania. Estes compostos ligam-se a diferentes
protenas do parasita inibindo-as, especialmente a enzimas envolvidas na
gliclise e no metabolismo dos cidos gordos. Nos casos de leishmaniose
visceral em que o tratamento com os compostos antimoniais no suficiente
- 29 -
pode usar-se a pentamidina, derivado aromtico da diamidina, com alternativa.
A anfotericina B um agente antifungico com uma aco eficiente. Este
composto liga-se membrana plasmtica aumentando a sua permeabilidade
(Chan-Bacab M and Pea-Rodrguez L., 2001). Embora estudos recentes
tenham permitido desenvolver uma nova formulao de anfotericina B
incorporada em lipossomas que permite uma aco melhorada deste frmaco,
os feitos secundrios so ainda bastantes e os custos de produo desta nova
formulao so muito elevados. , portanto, necessrio desenvolver terapias
alternativas e caracterizar novos alvos teraputicos para obter tratamentos
mais eficientes, especficos e menos txicos.
Na procura de novos compostos leishmanicidas, os produtos derivados de
plantas tm ganho algum relevo e recentemente foi evidenciada a aco anti-
Leishmania de leos essenciais e de alguns dos seus constituintes (Rosa et al.,
2003; Monzote et al., 2007; Oliveira et al., 2009; Machado et al., 2010).
- 30 -
2 - Os leos essenciais e actividade biolgica
Vrias actividades biolgicas com potencial teraputico tm sido
atribudas aos leos essenciais e aos seus componentes, destacam-se a
actividade anti-espasmdica, anti-inflamatria, anti-convulsivante, anti-oxidante
(Sakurada, et al., 2009) e actividades biocidas como a antiviral, antibacteriana,
antifngica e antiparasitria (Edris, 2007; Bakkali, et al., 2008; Gutierrez, et al.,
2008 ; Hemaiswarya, et al., 2008).
A actividade antimicrobiana de leos essenciais, ricos em compostos
fenlicos, foi observada em fraces contendo timol e carvacrol (Lambert et al.,
2001) e estudos in vitro demonstram que o monoterpeno p-cimeno tem uma
aco antimicrobiana contra Staphylococcus aureus e Escherichia coli (Cristani
et al., 2007; Mimran Shapira, 2007). Foram tambm observados efeitos
sinrgicos entre os monoterpenos carvacrol e timol com o seu precursor p-
cimeno (Vardar-Unlu et al., 2003). Alm disso, diversos estudos tm
demonstrado que p-cimeno e seus derivados monoterpenos apresentam
actividade antioxidante e anti-cancergena, estando aprovados nos Estados
Unidos e na Europa para preservar e dar sabor aos alimentos (Burt, 2004).
Figura 7 - Estrutura qumica do p-cimeno e do seu derivado sinttico 2-nitro-p-cimeno.
O modo de aco dos monoterpenos est relacionado com vrios alvos na
clula, embora os mecanismos especficos de actividade e os efeitos
citotxicos permaneam por caracterizar. A actividade antimicrobiana est,
geralmente, associada presena de pequenas molculas oxigenadas,
capazes de estabelecer pontes de hidrognio, exemplos do timol, do carvacrol,
do eugenol, do linalol, do geraniol, do neral ou do geranial. Estes compostos
p-cimeno 2-nitro-p-cimeno
- 31 -
actuam por modificao da membrana dos microrganismos, muitas das vezes
com perda da integridade membranar que dever afectar todas as suas
funes.
3 - Estrutura e funes da mitocndria
3.1 - Fisiologia, ultra estrutura e funes metablicas das mitocndrias
As mitocndrias so organitos intracelulares com cerca de 2 m e
existentes nas clulas eucariticas. O seu nmero por clula encontra-se
relacionado com as necessidades energticas das clulas. Os rgos
metabolicamente activos, como o fgado, o crebro e os msculos cardaco e
esqueltico contm um maior nmero de mitocndrias, e apresentam maior
susceptibilidade ao efeito de frmacos que actuam nas mitocndrias e a
determinadas patologias, designadas como patologias mitocondriais (Szewczyk
e Wojtczak, 2002). De acordo com a imagem clssica, a estrutura da
mitocndria (Fig. 8 (A)) a membrana mitocondrial externa, que constitui uma
barreira de permeabilidade para as molculas existentes no citossol maiores
que 1500Da e separa o espao intermembranar do citossol; 2) o espao
intermembranar, cuja composio inica semelhante do citossol e contem
um distinto grupo de protenas incluindo o citocromo c; 3) a membrana
mitocondrial interna paralela membrana externa, apenas permevel ao
oxignio, dixido de carbono e gua, ou de pequenas pores desta membrana
invaginam para o interior da matriz como cristas, designadas por cristas
mitocondriais, onde est localizado o sistema de electres, o sistema
fosforilativo e os transportadores membranares; 4) a matriz mitocondrial que
contm as enzimas metablicas, o DNA e RNA mitocondrial. Este genoma tem
unicamente genes que codificam para algumas protenas envolvidas na
fosforilao oxidativa (Lesnefsky et al., 2001).
No entanto, e segundo outros estudos, a estrutura mitocondrial no
assim to simples, (Mannella, 2000) tendo sido demonstrado que as cristas no
so simples invaginaes da membrana mitocondrial interna, mas sim
estruturas independentes e que podem ou no estar ligadas membrana
mitocondrial interna (Fig.8-B). De salientar que as mitocndrias no tm uma
- 32 -
forma nica mas podem ter diferentes formas de acordo com o tecido onde se
localizam. Apesar das membranas mitocondriais interna e externa serem
estruturas bem definidas, cada uma delas possuindo diferentes conjuntos de
enzimas e desempenhando diferentes funes, foram identificados locais de
contacto ntimo entre as duas membranas quer a nvel morfolgico quer a nvel
funcional (Mannella, 2001).
Figura 8 Estrutura da mitocndria: modelo clssico e estrutura com locais de
contacto nas membranas mitocondriais.
(A)- Modelo clssico da mitocndria, a mitocndria constituda pela membrana
externa; pela membrana interna que forma invaginaes para o espao
intermembranar, originando as cristas e pela matriz mitocondrial.
(B)- Mitocndria visualizada por tomografia electrnica em que as cristas so
estruturas internas que podem ou no estar ligadas membrana mitocondrial interna
(Adaptado de Lesnefsky et al., 2001;Mannella, 2001)
A maior parte do ATP (aproximadamente 95%) que a clula necessita
produzida pelas mitocndrias, sendo conhecidas como as centrais energticas
da clula. A mitocndria est envolvida em vrios processos e vias
metablicas, nomeadamente: 1) a converso do piruvato a acetil-CoA,
processo este catalisado pelo complexo da desidrogenase do piruvato; 2) o
ciclo do cido ctrico; 3) fosforilao oxidativa que resulta do funcionamento
conjunto da cadeia respiratria acoplada sntese de ATP; 4) a oxidao
(degradao dos cidos gordos); 5) parte do ciclo da ureia; 6) o fornecimento
de intermedirios metablicos ao resto da clula; 7) o armazenamento de
Membrana mitocondrial externa
Membrana mitocondrial
interna
Cristas
Matriz Matriz
Membrana mitocondrial
externa
Membrana mitocondrial
interna
Cristas
A B
- 33 -
clcio, de forma a manter a concentrao de clcio citoplasmtico a um nvel
baixo e constante; 8) a sntese de DNA, RNA e protenas; 9) a reparao do
DNA; 10) a formao de espcies reactivas de oxignio e 11) nalguns casos a
termognese (Pedersen, 1999). A funo mais importante das mitocndrias
consiste na degradao de substratos energticos (cidos gordos, piruvato,
aminocidos), provenientes do citoplasma. Obtendo-se como produtos finais,
CO2, H2O e a sntese de ATP. As reaces do ciclo do cido ctrico levam
oxidao dos compostos de carbono, com formao de CO2 e tambm
fornecem equivalentes redutores, temporariamente ligados a coenzimas. A
maioria destes processos ocorrem a nvel da matriz mitocondrial na cadeia
respiratria que se encontra na membrana mitocondrial interna que se d a
reoxidao das coenzimas reduzidas. A cadeia respiratria utiliza compostos
redutores (NADH e ubiquinol), dadores de electres, para reduzir o O2 a H20. A
esta reaco est associado o transporte de protes (H+) da matriz mitocondrial
para o espao intermembranar, processo que origina a formao do gradiente
electroqumico de H+ atravs da membrana mitocondrial interna, o qual
aproveitado pela mitocndria para sintetizar ATP a partir de ADP e Pi, via
sintase do ATP.
3.2 - O sistema de transporte de electres e a fosforilao oxidativa
Nas clulas animais o processo de fosforilao oxidativa requer
numerosas protenas, verificando-se que mais de 60 protenas esto
associadas ao sistema de transporte de electres, 16 com o complexo da
sintase de ATP e 2 protenas constituem os transportadores do ADP/ATP e do
H+/Pi. A cadeia respiratria mitocondrial constituda por quatro complexos
enzimticos transmembranares o complexo I (NADH-desidrogenase), complexo
II (succinato desidrogenase), complexo III (citocromo redutase) e o complexo IV
(citocromo oxidase). Os dinucletidos de nicotinamida adenina (NADH) e o
succinato conduzem os electres para os complexos I e II da cadeia
respiratria, respectivamente, resultando na libertao de protes para o
interior da matriz e na transferncia de electres para o transportador mais
prximo na cadeia respiratria, a Coenzima Q (CoQ), que transfere os
- 34 -
electres entre estes dois complexos e o complexo III. Posteriormente, os
electres so transferidos para o citocromo c e finalmente para o complexo IV
onde ocorre mais entrada de protes. no complexo IV que o O2, fornecido na
respirao pelo sistema circulatrio, funciona como receptor de electres e se
liga aos protes existentes na matriz levando formao de H2O (Fig 9).
Assim, o transporte de electres atravs dos complexos respiratrios tem como
finalidade a transferncia de energia dos substratos energticos existentes na
matriz mitocondrial para uma forma de energia (gradiente electroqumico de H+)
que poder ser utilizada para fosforilar o ADP. As mitocndrias produzem ATP
atravs da associao entre o gradiente de protes, gerado pela respirao, e
a fosforilao oxidativa do ADP pelo complexo V (FoF1ATPase ou ATPsintase).
O complexo V constitudo por duas subunidades: a subunidade FO,
correspondente a um segmento hidrofbico que atravessa a membrana
mitocondrial interna e que funciona como canal a protes do complexo, e a
subunidade F1 que corresponde cabea esfrica do complexo virada para o
lado da matriz e possui uma funo cataltica na sntese de ATP (Fig. 9).
Situada entre estas duas subunidades existe uma protena que confere
sensibilidade oligomicina (OSCP oligomycin sensibility conferring proten),
fazendo com que a ATP sintetase seja inibida por este composto Pelo facto de
a membrana mitocondrial interna ser impermevel a protes, ocorre a sua
acumulao no espao intermembranar gerando a formao do gradiente
electroqumico de H+. Quando o ADP e o Pi, componentes necessrios
sntese de ATP, esto disponveis na matriz mitocondrial, eles ligam-se
fraco cataltica do complexo V, permitindo a abertura da fraco FO e a
consequente entrada de protes para o interior da matriz. A energia libertada
no influxo de protes atravs da fraco FO usada na fosforilao do ADP
para sintetizar ATP pela fraco F1.
- 35 -
Figura 9 Representao esquemtica do sistema de transporte de electres
(complexos I, II, III, IV) e do sistema fosforilativo (complexo V), com os respectivos
substractos e inibidores. (Monteiro P et al 2003).
A associao entre a oxidao de substratos pela cadeia respiratria e a
fosforilao designa-se por teoria quimiosmtica e foi proposta por Peter
Mitchell em 1961. Na cadeia respiratria, o fluxo de electres gera energia
redox suficientemente elevada para ser utilizada para ejectar protes do
compartimento mitocondrial interno, para o espao intermembranar. O
gradiente electroqumico de protes assim gerado, tambm designado por
fora protomotriz (p), constitui a fora motriz capaz de fazer o retorno dos
protes atravs do complexo ATPsintase. Este gradiente composto de um
componente elctrico, o potencial transmembranar () e de um gradiente
(pH). Como resultado, as mitocndrias so
de cerca de
180 mV (negativo no interior) e cujo meio interno mantm um valor de pH de
cerca de 8. Em consequncia disto, as mitocndrias conseguem no s
acumular compostos de carcter catinico, que sejam capazes de atravessar
as membranas, como tambm internalizar cidos fracos na sua forma aninica.
(Szewczyk e Wojtczak, 2002).
- 36 -
3.3 - Envolvimento da mitocndria nos mecanismos de morte celular
Existem diferentes estudos que demonstram que a mitocndria controla a
vida e a morte celular. A permeabilizao da membrana mitocondrial precede o
processo de morte celular por apoptose ou necrose, que dependente do tipo
de clula ou do estmulo indutor do tipo de morte da clula, e esta
permeabilizao constitui um dos principais factores indicador de morte celular.
De facto, existe um nmero elevado de factores pr-apoptticos que actuam a
nvel da membrana mitocondrial induzindo a permeabilizao da membrana e
que, por sua vez, activam os compostos anti-apoptticos da famlia Bcl-2 a
interagir com protenas da membrana mitocondrial evitando a sua
permeabilizao. Outro facto que refora o envolvimento da mitocndria na
morte celular a existncia de intervenes farmacolgicas especficas, isto ,
atravs de compostos que actuam a nvel das protenas mitocondriais que
evitam ou retardam a morte celular. (Loeffler e Kroemer, 2000)
A necrose ou morte acidental pode ser desencadeada por um profundo
dano celular ou por stresse. Ocorre ento, um rpido colapso da homeostase
interna sendo acompanhada de lise da membrana citoplasmtica e das
membranas internas com libertao de restos celulares para o espao
extracelular, promovendo um processo inflamatrio. caracterizada
morfologicamente pela formao de protuberncias na membrana plasmtica
seguida pela eventual ruptura de algumas delas e a consequente libertao de
componentes citoslicos (Monteiro P et al 2003).
A apoptose um tipo de morte celular programada e trata-se de um
processo fisiolgico essencial, necessrio ao desenvolvimento normal e
manuteno da homeostase dos tecidos (Fumarola C et al 2004 ). No entanto,
a apoptose est tambm envolvida em diversos processos patolgicos dos
quais se destacam as doenas neurodegenerativas, doenas imunolgicas e
processos cancergenos. Assim, aps um sinal apopttico as clulas sofrem
uma srie de alteraes que culminam na sua morte, sem que ocorra a
libertao dos seus contedos celulares (Monteiro P et al 2003). Este tipo de
morte celular funcionar como uma espcie de triagem da populao celular
eliminando as clulas danificadas, mutadas, envelhecidas ou potencialmente
perigosas, tendo tambm um papel importante na regulao de programas de
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed?term=%22Fumarola%20C%22%5BAuthor%5D
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crescimento e diferenciao celular e tecidular. A apoptose caracterizada por
uma diminuio do volume da clula acompanhada da formao de
protuberncias na membrana plasmtica, estas acabam por se desprender da
membrana originando fragmentos membranares que so fagocitados pelas
clulas vizinhas.
Outra das grandes diferenas entre a necrose e a apoptose reside a nvel
da bioenergtica. Verificando-se que em clulas necrticas os nveis de ATP
baixam drasticamente e esta perda das reservas energticas ser a principal
causa deste tipo de morte celular (Malhi H et al 2006). Contrariamente, as
clulas em apoptose mantm, parcialmente, as suas reservas de ATP,
necessrias para o controlo dos mecanismos de apoptose, sendo um processo
totalmente dependente de energia. Deste modo, a mitocndria um elemento
fundamental nos processos de morte celular por apoptose e/ou necrose e
poder determinar o tipo de morte celular.
3.3.1 - Importncia da mitocndria nos processos apoptticos
Estudos realizados com vrios sistemas mitocondriais demonstram um
papel importante da mitocndria nos mecanismos de induo da apoptose
(Lemasters et al., 1999). Actualmente, aceite que em muitas clulas
apoptticas a libertao de protenas do espao intermembranar constitui um
dos primeiros eventos da apoptose. A mitocndria perante um estmulo
apopttico (danos no DNA, isqumia, radiaes ultravioletas e mecanismos
vrios de stress oxidativo) desviada do seu papel original, que o da
manuteno da vida celular, para um papel oposto, o de facilitar a morte celular
(Fig 9). Existem vrios factores responsveis por esta alterao,
nomeadamente, o clcio, a ceramida, o xido ntrico, as caspases (protenas
cistenicas que actuam em resduos de aspartato), as ROS e membros da
famlia Bcl-2). O efeito final de muitos destes factores a libertao de duas
protenas do espao intermembranar, o citocromo c e o factor indutor de
apoptose (AIF). Estas duas protenas participam em eventos ps-mitocondriais
necessrios para completar o programa de morte celular. A forma como estes
factores foram a mitocndria a participar no programa de morte celular ainda
- 38 -
no inteiramente claro, contudo a hiptese mais provvel envolve a PTM.
Numerosos dados experimentais sugerem que vrios dos factores que induzem
a PTM so membros da famlia das protenas Bcl-2. A protena Bcl-2 um
oncogene que tem um efeito inibitrio da PTM, enquanto outro membro da
famlia, a Bax, pode formar complexos com a Bcl-2 anulando desta forma o
efeito inibitrio exercido por Bcl-2 na PTM e, quando atinge determinadas
concentraes, estimula a MPT (Danial et al 2004). A PTM seguida da perda
do (pelo menos temporariamente), intumescimento da mitocndria e,
finalmente, ruptura da membrana mitocondrial externa com libertao do
citocromo c e do AIF.
O citocromo c a protena cuja libertao parece ser mais crtica para a
iniciao dos processos de apoptose (Desagher S et al 2000). No entanto, o
mecanismo pelo qual ocorre a sua libertao da mitocndria no se encontra
ainda perfeitamente esclarecido, podendo ocorrer de um modo controlado
atravs de poros na membrana externa ou por ruptura fsica desta membrana.
O citocromo c na presena de ATP ou dATP, forma um complexo com o apaf-1
e a procaspase 9. A formao deste complexo designado por apoptossoma
cliva a procaspase 9 com libertao da caspase 9 activa que cliva e activa a
procaspase 3. Por sua vez, a caspase 3 activa induz a clivagem proteoltica de
uma srie de protenas alvo no citosol, ncleo e membrana plasmtica
responsveis pela morfologia caracerstica da apoptose (Parone et al 2002).
Vrios estudos tm demonstrado que a mitocndria est tambm envolvida na
induo da apoptose por mecanismos independentes das caspases. Durante
este processo, ocorre libertao de protenas designadas por factor indutor da
apoptose (AIF) e endonuclease G do espao intermembranar mitocondrial para
o citossol, desencadeando este tipo de morte celular sem activar a cascata
apopttica. Durante a apoptose, o AIF desloca-se da membrana mitocondrial
externa para o citossol e, posteriormente, para o ncleo onde induz
condensao da cromatina e fragmentao do DNA (Daugas et al., 2000).
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Figura.10 Relao entre a mitocndria e a morte celular, evidenciando a importncia
da quantidade de ATP nos processos apoptticos e necrticos. Na morte celular por
necrose, ocorre depleo de ATP e h ruptura da membrana plasmtica. A outra via
de morte celular por apoptose, sendo os nveis de ATP da clula mantidos
parcialmente. A apoptose caracterizada por uma diminuio do volume da clula
acompanhada da formao de protuberncias da membrana plasmtica (Monteiro P et
al 2003)
Adicionalmente, o AIF induz a exposio da fosfatidilserina na monocamada
externa (geralmente localizada na monocamada interna), facto que possibilita o
reconhecimento e posterior remoo das clulas apoptticas por clulas
vizinhas. De modo idntico, a endonuclease G, cuja funo est implicada na
replicao do DNA mitocondrial, induz a fragmentao do DNA nuclear aps
ser libertado do espao intermembranar durante a apoptose.
- 40 -
No decurso morte celular por necrose, as clulas, as mitocndrias e
outros organitos aumentam de volume, como consequncia da perda da
integridade fsica das membranas plasmtica e mitocondrial, no sendo, no
entanto, observadas quaisquer modificaes nucleares no decorrer deste
processo. (Desagher e Martinou, 2000). A mitocndria responsvel pela
maior parte (cerca de 80-90%) da sntese de ATP atravs da fosforilao
oxidativa, que usa a energia resultante da respirao mitocondrial. Assim,
factores que alterem a associao do sistema fosforilativo com o sistema de
transporte de electres constituem mecanismos responsveis pela diminuio
da eficincia fosforilativa das mitocndrias e, consequentemente, por um
abaixamento dos nveis de ATP necessrios viabilidade celular. As alteraes
estruturais induzem um aumento da permeabilidade mitocondrial a solutos de
baixa massa molecular. Este processo conhecido por PTM acompanhado por
um intumescimento da mitocondrial e a mitocndria perde a sua capacidade
para manter estveis o e o gradiente de protes (isto ocorre uma
dissociao total ou parcial da fosforilao oxidativa). Ao ocorrer uma
permeabilizao membranar passiva constante, ocorre a hidrlise contnua do
ATP pela ATPsintase, promovendo o esgotamento das reservas energticas
celulares e conduzindo morte celular por necrose (Fig 10). Adicionalmente,
h perturbao contnua dos equilbrios inicos, especialmente do Ca2+, que
exacerbar os danos devido activao de enzimas degradativas como as
fosfolipases, proteases e nucleases. A activao da PTM facilitada na
presena de oxidantes e espcies reactivas de oxignio (ROS) e azoto (RNS)
(Zoratti et al 2005). Por sua vez, a acumulao de ROS e RNS facilita a
induo da PTM (Pedersen, 1999).
3.4 - Aco da mitocndria na homeostase do Ca2+ celular
A mitocndria desempenha uma aco vital na regulao do Ca2+
citoslico, possuindo vrias protenas envolvidas na acumulao e libertao
de Ca2+ pelo que, a mitocndria actua como um reservatrio de Ca2+.
Adicionalmente, a mitocndria fornece a maior parte do ATP usado pelas Ca2+-
ATPases do retculo endoplasmtico e da membrana plasmtica. (Saris e
Carafoli 2005). Por outro lado, a adio de Ca2+ a uma suspenso de
- 41 -
mitocndrias energizadas resulta na estimulao da cadeia respiratria, efluxo
de protes da matriz e influxo de Ca2+ para dentro da mitocndria. As
mitocndrias so capazes de acumular clcio para a matriz atravs do
gradiente electroqumico sem que ocorra hidrlise do ATP ou ocorra
cotransporte com qualquer outro io ou seja o influxo de Ca2+ um processo
puramente electrognico movido pela componente elctrica, o da fora
protomotriz (H+) A protena responsvel pela acumulao de clcio o
uniporter de clcio, no entanto, em mitocndrias isoladas a sua constante de
afinidade baixa, o que sugere que este no ser o mecanismo de influxo de
Ca2+ quando as mitocndrias so expostas a rpidos e intensos pulsos de
clcio intracelular. Uma via alternativa de influxo de Ca2+ o designado por
RAM (do ingls rapid mode uptake), atravs do qual ocorrer a rpida captao
de Ca2+. Apesar de a captao de Ca2+ pelas mitocndrias ser apontada
essencialmente como um dispositivo de segurana em situaes de
sobrecarga intracelular transitria de Ca2+ os fluxos mitocondriais de Ca2+
fazem parte da sinalizao celular do Ca2+ (Orrenius et al., 2003). Uma vez
dentro da mitocndria, o Ca2+ tm vrios efeitos nomeadamente, a estimulao
de desidrogenases na matriz mitocondrial sensveis ao Ca2+, que por sua vez
so locais de produo de NADH para a cadeia respiratria e como tal para a
estimulao do metabolismo energtico mitocondrial (Orrenius et al., 2003).
Todavia, as mitocndrias no conseguem captar quantidades ilimitadas
de Ca2+ tendo por isso de o libertar a uma velocidade comparvel do influxo.
O efluxo de Ca2+ da mitocndria para o citosol pode ocorrer atravs de
diferentes mecanismos. Assim, pode ocorrer atravs de um mecanismo de
antiporte com Na+ ou H+, isto , de um transporte dependente de Na+ ou de
outro independente de Na+, que troca Ca2+ por Na+ ou por H+, respectivamente
por reverso do uniporta de influxo de Ca2+, por alteraes na fase lipdica da
membrana, atravs de vias de libertao mediadas por canais ou pela
combinao de dois ou mais destes mecanismos. Adicionalmente, a libertao
de Ca2+ da mitocndria pode tambm ocorrer por oxidao de nucletidos de
nicotinamida adenina da matriz a ADP-ribose nicotinamida ou por oxidao de
grupos -SH de protenas membranares que se encontram associados com a
regulao da dinmica de Ca2+ da mitocndria. Outro mecanismo independente
de sdio e fundamental no efluxo de Ca2+, a formao de um poro de
- 42 -
permeabilidade transitria o (PMPT), em cujo estado de baixa condutncia
responsvel pela descarga de Ca2+ para valores de concentrao abaixo dos
limites (Bernardi P et al 1998) no entanto em estados mais avanados d
origem a um megacanal designada de MPT que constitui igualmente um
mecanismo importante para a libertao de clcio da mitocndria como se
descrever mais adiante.
Em concluso, apesar de a mitocndria poder no ter um papel
determinante na homeostase de clcio celular em condies de repouso, ela
determinante na forma e na durao de um pico concentracional de clcio aps
estimulao celular. Adicionalmente o posicionamento da mitocndria junto do
retculo endoplasmtico pode ser condicionante da sua capacidade
tamponizante. Alm do mais a acumulao elevada de Ca2+ deletria para a
funo mitocondrial e celular tendo sido proposto que o Ca2+ citoslico
desempenha um papel importante na estimulao de sinais apoptticos,
atravs da regulao de enzimas especficas que, uma vez activadas,
conduzem morte celular, como por exemplo as endonucleases.
Paralelamente, a excitao-contraco no msculo esqueltico e cardaco
dependem dos nveis de Ca2+ citoslico.
O potencial de membrana () gerado atravs da ejeco de protes pelos
complexos enzimticos do sistema de transporte de electres. O constitui a
fora motriz para a fosforilao do ADP pela F1Fo ATPase. Adicionalmente a
captao de Ca2+ atravs do uniporta de Ca2+ dependente do , e a
dissipao deste potencial anula a captao de Ca2+ mitocondrial. A
composio molecular exacta do uniporta no conhecida e pensa-se que
pode existir uma configurao alternativa para o poro e que ser o responsvel
pela rpida captao de Ca2+ (RAM) atravs da qual a mitocndria pode
rapidamente acumular quantidades limitadas de Ca2+ O efluxo de Ca2+ ocorre
atravs do antiporta Ca2+/Na+ que troca 2 ies de Na+ por cada Ca2+. Em algum
tipo de clulas podem tambm existir um transportador de Ca2+ e de H+. A PTM
um mega canal e constitudo por vrias protenas mitocondriais que podem
ser induzidas pela acumulao de Ca2+, pelo stress oxidativo. Uma vez
induzido o poro de PTM permite a passagem de todas as molculas superiores
a 1500Da. Contudo, ocorrem aberturas rpidas e reversveis da PTM e estas
podem ter um papel primordial no controlo do Ca2+ mitocondrial. O influxo de
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Ca2+ associado sua libertao mediada pelos sistemas de troca constitui um
ciclo de Ca2+ dissipador de energia mitocondrial. (Jacobson et al 2004).
3.5 - Permeabilidade transitria mitocondrial
A PTM consiste na abertura de uma via de permeabilidade inicialmente
reversvel e que permite a difuso de solutos at 1500Da da matriz mitocondrial
para o espao extramitocondrial e vice-versa. Trata-se de um processo
complexo do qual j se conhecem vrios indutores moduladores e inibidores,
alguns dos quais sero mencionados de seguida. A PTM causada pela
formao e abertura de poros proteicos na membrana interna mitocondrial os
designados poros transitrios de permeabilidade mitocondrial. Apesar de ainda
ser um assunto muito discutido na literatura, existe algum consenso sobre o
que poder iniciar a condio de permeabilidade transitria mitocondrial.
sabido que a entrada macia de clcio para o interior da mitocndria, associada
a um incremento da gerao de espcies reactivas de oxignio no interior
daquele organelo pode levar formao dos PTM, rompendo a barreira de
impermeabilidade caracterstica e necessria da membrana interna
mitocondrial (Zoratti M et al., 2005). Algum consenso existe tambm sobre as
possveis consequncias para a mitocndria uma vez que a abertura de poros
de PTM provoca a despolarizao mitocondrial, dissociao da fosforilao
oxidativa, libertao de solutos intramitocondriais perdendo este organelo a
capacidade de produo de energia e a capacidade de tomada de clcio. A
PTM est tambm associada induo de um aumento de volume
mitocondrial, causando um rompimento da membrana externa e podendo
mesmo levar libertao de factores indutores da apoptose, como o citocromo
c, ou, em ltima anlise, a necrose da clula. Os poros de PTM so complexos
multiproteicos que se formam nas zonas de unio entre a membrana externa e
interna da mitocndria, apesar da identidade molecular deste complexo
multiproteico no se encontrar ainda completamente definida, alguns dos seus
componentes centrais foram j identificados (Fig 11) e incluem protenas
citoplasmticas como a hexocinase (HK) e a creatina cinase (CK) que se
encontra localizada no espao intermembranar, protenas da membrana
externa o canal aninico dependente de voltagem (VDAC) e o receptor das
- 44 -
benzodiazepinas (BPR), protenas da membrana interna o transportador dos
nucletidos da adenina (ANT) e protenas da matriz mitocondrial a ciclofilina D.
Figura 11 - Representao esquemtica dos complexos respiratrios; FoF1Sintetase;
e dos componentes do poro de permeablidade transitria na membrana mitocondrial
interna (MMI) e membrana mitocondrial externa (MME).
Em condies fisiolgicas o poro permanece fechado at que o Ca2+
aumente substancialmente. A PTM especificamente inibida por ciclosporina A
(CyA) que se liga CphD impedindo a sua ligao s restantes protenas
constituintes do poro e, como tal, a sua formao. A CphD uma peptidilprolilo
cis-trans isomerase da matriz mitocondrial que em situaes de sobrecarga de
Ca2+ e de stresse oxidativo, se liga s protenas constituintes do poro induzindo
a sua activao e abertura conferindo-lhe sensibilidade inibio pela CyA. A
induo da PTM modulada por diferentes factores, sendo favorecida em
condies de elevada acumulao de Ca2+ na mitocndria, por aumento do
quociente NAD+/NADH, por prooxidantes, por pH elevado, por peroxidao
lipdica e pelo o stresse oxidativo devido s ROS e/ou depleo mitocondrial
de GSH ( Colell et al 2004). A PTM induzida por Ca2+ pode ser estimulada por
uma grande variedade de compostos com diferentes caractersticas qumicas,
incluindo o Pi, agentes oxidantes, reagentes ditilicos, protonforos e ligandos
do ANT, quando acompanhada por concentraes matriciais elevadas de Ca2+
e stresse oxidativo. Nestas condies, ocorre oxidao de grupos -SH de
protenas membranares mitocondriais, NAD(P)H, GSH matricial e depleo de
nucletidos de adenina (Halestrap et al., 2002). Ichas e Mazat em 1998,
propuseram que existe uma alternncia entre um estado de baixa condutncia
MME
MMI
PBR
ANT
VDAC
HK
CK
CycD
Complexos Respiratrios
FoF1 ATP
Sintase
MATRIZ
CITOSOL
Espao intermembranar
PTM
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do poro de PTM que resulta de aberturas transitrias do poro e um estado de
alta condutncia que resulta de aberturas de longa durao e que conduzem
ao estado completamente aberto do poro. A alternncia entre os dois estados
controlada pela ligao do Ca2+ ao poro conduzindo ao intumescimento e
consequente disfuno mitocondrial, o que ocorre perante situaes de
sobrecarga de Ca2+. Adicionalmente, muitas so as evidncias que sugerem a
existncia de dois modos de abertura do poro de MPT: um modo regulado e
outro desregulado (Lemasters, 2002). As aberturas transitrias do poro de MPT
resultam na dissipao temporria do gradiente de protes e na despolarizao
mitocondrial (Bernardi P e tal 1998) e so dependentes do pH e permitem a
difuso de pequenas molculas como o Ca2+ e H+. O estado de alta
condutncia, que permite a difuso no selectiva de grandes molculas, tem
aberturas estveis, conduzindo dissipao do e ruptura da estrutura
mitocondrial. A importncia fisiolgica da PTM continua por esclarecer, todavia,
em condies patolgicas, um ou vrios dos factores reguladores da PTM
podem contribuir para alterar a susceptibilidade sua induo. Assim, a PTM
constitui um elemento chave no controlo da viabilidade da clula
independentemente do fentipo da morte celular verificando-se que agentes
que previnem ou induzem a PTM regulam a vida ou morte da clula (Zoratti M
et al., 2005).
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III - OBJECTIVOS
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III - OBJECTIVOS
Os produtos derivados de plantas tm ganho algum relevo e,
recentemente, foi evidenciada a aco anti-Leishmania de leos essenciais e
de alguns dos seus constituintes.
Dado o papel central da mitocndria nas funes celulares e a sua
relevncia num vasto nmero de doenas, estes organelos tm sido
considerados como um dos principais alvos teraputicos. A mitocndria tem
uma importncia fundamental nos processos de sobrevivncia e morte celular,
dado que essencial para a produo de ATP, atravs do processo de
fosforilao oxidativa, sendo tambm o principal organelo responsvel pela
formao intracelular de espcies reactivas de oxignio. Alm disso, a
mitocndria tambm muito importante no controlo das vias de sinalizao que
conduzem morte celular por apoptose e necrose. Assim, as alteraes na
estrutura e funes mitocondriais podem funcionar como alvos primrios na
avaliao da toxicidade e morte celular induzidas pelos compostos em
avaliao.
Assim, o objectivo deste trabalho foi estudar a actividade anti-Leishmania
do p-cimeno, um constituinte de leos essenciais, e do seu derivado sinttico 2-
nitro-p-cimeno, para esclarecer possveis mecanismos de aco e toxicidade
usando a mitocndria como modelo celular.
Assim com este objectivo geral foram realizados estudos com os
seguintes objectivos especficos:
Avaliar os efeitos do p-cimeno, constituinte dos leos essenciais, e do
seu derivado sinttico, 2-nitro-p-cimeno na viabilidade celular de promastigotas
de L. infantum;
Avaliar os efeitos do p-cimeno e do 2-nitro-p-cimeno na morfologia e
mobilidade dos promastigotas de L. infantum;
Avaliar os efeitos do p-cimeno e do 2-nitro-p-cimeno na bioenergtica e
permeabilidade transitria mitocondrial.
Avaliar a relao funo/estrutura qumica do p-cimeno e do 2-nitro-p-
cimeno.
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IV - MATERIAIS E MTODOS
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IV - MATERIAIS E MTODOS
1 - Susceptibilidade de Leishmania infantum ao 2-nitro-p-cimeno e p-
cimeno
1.1 - Origem das estirpes e manuteno das culturas
As culturas de promastigotas de Leishmania infantum Nicolle (zimodemo
MON-1) foram mantidas em ambiente estril, a 26C em meio de cultura
Roswell Park Memorial Institute (RPMI) 1640 tamponado com cido 4-(2-
hidroxietil) piperazina-1-etanosulfnico (HEPES) suplementado com 10% de
SFB inactivado a 56C e penicilina G (250 g/ml) e sulfato de estreptomicina
(250 g/ml).
1.2 - Determinao do crescimento
Com o objectivo de definir os tempos de incubao para a realizao dos
estudos de actividade anti-Leishmania, foi feito o estudo do crescimento
populacional das promastigotas de L. infantum.
Em microrganismos unicelulares o crescimento populacional envolve um
aumento do nmero de clulas ou biomassa como consequncia do
crescimento e da diviso celular. Os estudos de crescimento so
representativos das condies de todas as clulas de uma populao e no de
variaes individuais. O crescimento populacional , portanto, avaliado
seguindo a variao do nmero de clulas ao longo do tempo como
consequncia do crescimento ou da diviso celular. No presente trabalho, o
crescimento de L. infantum foi avaliado por contagem de clulas totais em
cmara de Neubaeur (Fig. 12), ao longo do tempo de incubao.
As promastigotes de L. infantum (106 clulas/ml) foram incubadas a 26C,
em meio de cultura RPMI 1640 tamponado com HEPES suplementado com
10% de SFB inactivado a 56C e penicilina G (250 g/ml) e sulfato de
estreptomicina (250 g/ml). Em intervalos de 24 horas retiram-se da estufa
duplicados e alquotas de cada tubo foram fixadas com uma soluo de
formaldedo 10% em PBS. A contagem do nmero de clulas totais foi
- 50 -
realizada em cmara de Neubauer ao microscpio ptico. A partir da curva de
crescimento foi calculada a taxa de crescimento e o tempo de gerao ou
duplicao.
Figura 12 - Cmara de Neubauer para contagem de clulas.
1.3 - Estudos de viabilidade celular
A viabilidade celular foi avaliada pelo teste do 3-(4,5-dimetiltiazol-2-il)-2,5-
difeniltetrazlio (MTT) (Denizot et al, 1986). O catio do MTT um sal
hidrossolvel de cor amarela que as desidrogenases mitocondriais reduzem a
uma formazana insolvel de cor azul que absorve a 530 nm. O ensaio baseia-
se no facto de que s as clulas viveis reduzem o MTT, podendo quantificar a
extenso dessa reduo por espectofotometria a 530 nm (Fig.13)..
Fig.13 - Reduo do brometo 3-(4,5-dimetiltiazol-2-il)-2,5-difeniltetrazlio
(MTT) pelas desidrogenases mitocondriais.
- 51 -
O 2-nitro-p-cimeno, p-cimeno foram diludos em dimetilsulfxido (DMSO)
a 100 mg/ml e, posteriormente, em meio de cultura RPMI 1640 tamponado com
HEPES suplementado com 10% de SFB inactivado a 56C de modo a obter
uma gama de concentraes de 25 a 400 g/ml. A concentrao mxima de
DMSO nos ensaios no excedeu os 0,4%, concentrao que no interfere de
forma significativa no crescimento celular.
As promastigotes de L. infantum (106/ml) em fase de crescimento
logartmica foram incubadas em tubos de 1,5ml a 26C durante 24h, em meio
de cultura RPMI 1640 tamponado com HEPES suplementado com 10% de SFB
inactivado a 56C, na presena de vrias concentraes p-cimeno e 2-nitro-p-
cimeno. Em paralelo e nas mesmas condies, foram realizados ensaios de
controlo na presena do solvente (DMSO), mas sem a adio dos compostos.
Aps as 24 horas, os tubos foram centrifugados a uma velocidade de
2500 rpm/5 minutos, de modo a permitir a sedimentao das promastigotes. De
seguida, o sobrenadante foi aspirado, as clulas foram lavadas com tampo
PBS (pH 7,2) e incubadas a 37C durante duas horas com 450 l de PBS e 50
l de uma soluo de MTT (5 mg/ml). Depois da incubao, as clulas foram
novamente sedimentadas, o meio foi eliminado por aspirao e os cristais
redissolvidos em 500 l de DMSO. De cada amostra foram retirados 300 l
para uma placa de leitura tipo ELISA e a absorvncia das amostras foi lida a
530 nm num leitor de placas (Synergy HT, Bio-TEK). Os resultados obtidos
foram expressos em percentagem de absorvncia relativamente ao controlo.
As experincias foram sempre realizadas em triplicado, tendo-se
determinado a mdia e erro padro dos resultados obtidos.
As concentraes que induzem a perda de viabilidade a 50% (IC50) foram
obtidas por interpolao de regresses dose-resposta extrapoladas pelo
GraphPad Prism 5.
- 52 -
1.4 - Estudos morfolgicos
Os efeitos do p-cimeno e do 2-nitro-p-cimeno na morfologia das
promastigotes de L. infantum foram estudados em preparaes a fresco por
microscopia ptica de contraste de fases (Eclipse E400, Nikon) acoplado com
cmara digital (165 DN100, Nikon) e por microscopia ptica de fase normal,
aps colorao de Giemsa.
Os estudos a fresco permitiram avaliar a forma, o tamanho e a mobilidade
celular utilizando a tcnica da gota pendente, na qual, as clulas no fixadas
ficam suspensas numa lmina escavada (lmina de Koch) (Fig 14).
Figura.14 Esquema de uma preparao em gota pendente usando a lmina
de Koch.
A observao dos esfregaos corados permitiram estudar as alteraes
na morfologia e nas estruturas das promastigotas de L. infantum.
Para os estudos morfolgicos, as promastigotas em fase logartmica
foram incubadas durante 24h, em meio de cultura RPMI 1640 tamponado com
HEPES suplementado com 10% de SFB inactivado, adicionadas de solues
do p-cimeno e do 2-nitro-p-cimeno nas concentraes correspondentes ao IC50.
Tal como nos estudos de viabilidade, os controlos foram realizados ao mesmo
tempo e nas mesmas condies, substituindo as solues dos compostos por
DMSO, na concentrao correspondente presente nas solues dos
compostos. Aps o perodo de incubao, as clulas foram sedimentadas, o
meio rejeitado e substitudo por meio de cultura fresco. Retirou-se uma alquota
- 53 -
para observao microscpica directa em lmina de Koch e outra alquota foi
usada para execuo de um esfregao e posterior colorao por Giemsa. Aps
a execuo do esfregao, as clulas foram fixadas em metanol puro e coradas
com uma soluo aquosa de Giemsa (1/10, V/V) durante 10 minutos, em
seguida as lminas foram lavadas e deixadas a secar ao ar.
2 - Avaliao dos efeitos do 2-nitro-p-cimeno e do p-cimeno na
bioenergtica mitocondrial
2.1 - Isolamento de mitocndrias de fgado de rato
As fraces mitocondriais foram isoladas a partir de fgado de ratos
Wistar, de acordo com o mtodo descrito por Gazotti e colaboradores (1979)
com algumas modificaes. Os animais, mantidos em jejum, foram sujeitos a
deslocamento cervical e posteriormente decapitados de forma a sangrarem
rapidamente. O abdmen dos animais foi aberto com recurso a uma tesoura e
o fgado foi rapidamente removido e colocado em meio de homegeneizao
contendo 250 mM de sacarose, 10 mM de Hepes, 1 mM de EGTA, pH 7,4 e
albumina srica bovina (BSA) deslipidificada (0,1%) (Fernandes et al., 2008).
Com o auxlio de uma tesoura, o fgado foi rapidamente triturado e o
sobrenadante rejeitado de forma a remover o sangue. Em seguida o tecido foi
ressuspenso em cerca de 60 ml de meio de homogeneizao e transferido para
um homogeneizador de vidro tipo Potter-Elvejhen. Com o recurso a um pisto
de teflon ligado a um berbequim, a suspenso foi homogeneizada por 6 cursos
do pisto a 250 rpm. A suspenso foi transferida para dois tubos de centrfuga
equilibrados que foram centrifugados a 4C durante 10 minutos a uma
velocidade de 2500 rpm. O sobrenadante foi ento transferido para novos
tubos e centrifugado a 10000 rpm durante 10 minutos a 4C, obtendo-se assim,
um sedimento composto pela fraco mitocondrial. O sobrenadante foi
eliminado por aspirao e o sedimento ressuspenso em 1 ml de meio de
lavagem constitudo por 250 mM sacarose, e 10 mM de Hepes com pH de 7,2
(Fernandes et al., 2008). A suspenso mitocondrial foi transferida para novos
tubos de centrfuga e diluda em 45 ml de meio de lavagem seguida de duas
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centrifugaes sequenciais de 10000 rpm durante 10 minutos a 4C. A fraco
mitocondrial purificada foi ressuspensa em 2 ml de meio de lavagem e mantida
num eppendorff a 4C ao longo dos ensaios experimentais.
2.2 - Determinao da concentrao de protena
A concentrao de protena da fraco mitocondrial foi determinada pelo
mtodo colorimtrico do biureto (Gornall et al., 1949). A reaco do biureto
permite a determinao quantitativa de protenas por formao de um quelato
de cobre com ligaes peptdicas da protena a pH alcalino apresentando uma
colorao violeta e absorvncia a 550 nm. A reduo do Cu(II) a Cu(I)
acompanhada por uma mudana de cor, consoante o contedo proteico da
amostra. A concentrao de protena foi ento quantificada atravs de uma
curva de calibrao construda a partir de padres de BSA. Assim, cerca de 50
l da suspenso mitocondrial foram colocados num tubo de ensaio contendo
0,95 ml de uma soluo de NaCl e 25 l de SDS a 20%. Em simultneo foram
tambm preparados os padres de BSA com um volume final de 2 ml acertado
com NaCl e SDS a 20%. Aps a preparao de todos os tubos foram
adicionados a cada um deles 1,5 ml de reagente de biureto, estes foram
incubados a 37C durante 20 minutos e a absorvncia lida a 550 nm.
2.3 - Determinao do consumo de oxignio
O consumo de oxignio mitocondrial associado fosforilao de ADP foi
avaliado temperatura de 30C, recorrendo a um elctrodo de oxignio tipo
Clark (YSI Model 5331, Yellow Spring Instruments) ligado a um registador e o
elctrodo foi calibrado de acordo com Rickwood e colaboradores (1987). Os
ensaios foram realizados numa cmara de reaco e a suspenso
mitocondrial, composta por 1 mg de protena diluda em 1 ml de meio de
respirao contendo 130 mM de sacarose, 50 mM de KCl, 2,5 mM de MgCl2,
0,1 mM de EGTA, 5 mM de KH2PO4 e 10 mM de Hepes com pH 7,4, foi
mantida sob agitao ao longo dos ensaios.
- 55 -
Os ensaios foram iniciados com a adio de 5 mM glutamato/ 2,5 malato,
substrato respiratrio que induz um pequeno aumento no consumo do oxignio
pelas mitocndrias (estado 2 da respirao), aps cerca de 1 minuto foram
adicionadas 150 nmoles de ADP suspenso, o que originou, nas situaes
controlo, um aumento acentuado no consumo de oxignio (estado 3 da
respirao). Aps o consumo de todo o ADP adicionado, o consumo de
oxignio pelas mitocndrias retornou para valores prximos do inicial (estado 4
da respirao). Em seguida foram adicionados mais 150 nmol de ADP
imediatamente seguida da adio de oligomicina 1 M (estado 4 oligomicina)
que bloqueia a fraco F0 da ATP sintase e nos permitiu avaliar a fuga de
electres atravs desta. Para finalizar os ensaios, adicionou-se FCCP (ionforo
de protes) 1 M suspenso (estado 4 FCCP). Na presena deste
dissociador da fosforilao oxidativa, a permeabilidade da membrana
mitocondrial aos protes mxima e, consequentemente, os consumos de
oxignio so fortemente estimulados, pelo que, variaes na velocidade de
consumo de oxignio registadas aps a adio do FCCP so indicadoras de
que poder existir perturbaes no sistema de transporte de electres.
Para avaliao dos efeitos dos compostos no consumo de oxignio, as
suspenses mitocondriais foram previamente incubadas com as diferentes
concentraes dos vrios compostos durante 3 minutos antes do incio da
energizao com o substrato respiratrio.
A velocidade do consumo de oxignio foi calculada para cada estado da
respirao, tendo por base a calibrao do elctrodo que foi feita de modo a
que a concentrao de oxignio de 240 nmoles/ml de meio de respirao, a
30C, correspondesse a 300 mm de papel de registador. Os resultados obtidos
a partir destes ensaios permitiram-nos determinar, o ndice de controlo
respiratrio (ICR) que avalia a integridade das mitocndrias e calculado pelo
quociente entre a velocidade de consumo de oxignio na presena de ADP
(estado 3) e a velocidade de consumo de oxignio aps o consumo do ADP
adicionado (estado 4). A eficincia fosforilativa calculada pelo quociente entre
o ADP adicionado e a quantidade e oxignio consumido para o fosforilar.
- 56 -
2.4 - Determinao do potencial de membrana das mitocndrias
O potencial de membrana mitocondrial () foi determinado
indirectamente com um elctrodo de tetrafenilfosfnio (TPP+) selectivo ao
catio lipoflico TPP+ e como elctrodo de referncia foi usado o elctrodo de
calomelanos (Ag/AgCl2) (modelo MI 402; microelctrodos, Inc., Bedford, NH).
Os elctrodos foram ligados a um aparelho de pH (Crison micro pH 2001) e o
sinal correspondente diferena de potencial gerada entre os elctrodos foi
debitado num registador Kipp & Zonen, aps ter passado por um circuito de
compensao de voltagem basal.
O potencial de membrana calculado assumindo que a distribuio do
TPP+ entre a mitocndria e o meio respeita a equao de Nernst, como o
descrito por Kamo e colaboradores (1979), de acordo com a seguinte equao:
(mV) = 59 log (v/V) 59 log (10 E/59 1),
em que v, V e E representam, respectivamente, o volume mitocondrial, o
volume do meio de incubao e a deflexo do potencial de elctrodo desde a
linha basal. Como volume da matriz mitocondrial foi tomado o valor de 1,1
l/mg de protena (Massini et al., 1984).
A determinao do potencial foi efectuada numa cmara de reaco
aberta, termostatizada a 30C, em 1 ml de meio de reaco contendo 130 mM
sacarose, 50 mM KCl, 2,5 mM MgCl2, 0,1 mM EGTA, 5 mM KH2PO4, 5 mM
HEPES a pH 7,4 (Fernandes et al., 2008) suplementado com 3 M TPP+ e 5
mM glutamato/2,5 mM malato. As reaces foram iniciadas por adio das
mitocndrias isoladas de fgado (1 mg protena) permitindo o desenvolvimento
do potencial mximo de polarizao (Fig.15 Polarizao) sendo a
despolarizao induzida por adio de 150 nmoles de ADP. Aps a fosforilao
de todo o ADP adicionado ocorre a repolarizao da membrana mitocondrial
interna e o restabelecimento do potencial membranar (Fig.15-Repolarizao).
- 57 -
Figura 15 - Representao esquemtica de um registo tpico obtido a partir de
experincias com elctrodo de TPP+
3 - Avaliao dos efeitos do 2-nitro-p-cimeno e do p-cimeno na
permeabilidade transitria mitocondrial
A sonda Clcio Green 5-N uma sonda flourescente especfica para o
clcio, de tal forma que a intensidade de fluorescncia ser proporcional
quantidade de clcio presente ou libertado para o meio por induo da PTM.
As reaces decorreram em cuvetes de espectrofluorimetria, a 30C e sob
agitao contnua. A suspenso mitocondrial (0,25 mg/ml) foi adicionada a 2 ml
de meio de reaco composto por 200 mM de sacarose, 1 mM de KH2PO4, 10
M de EGTA, 10 mM de Tris-Mops, a pH 7,4 o qual foi suplementado com
rotenona (2 M) oligomicina (0,5 mg/ml) e Calcium-Green (100 M)
A observao e registo dos movimentos de clcio foi feita tendo por base
a emiso de flourescncia da sonda quando ligada ao clcio. A monitorizao
foi realizada pela emisso de fluorescncia usando um de excitao de 506
nm (fenda 4 m) e um de emisso de 531 nm (fenda 10 nm) utilizando um
espectrofluormetro Perkin Elmer LS-50 B. Esta avaliao da fluorescncia foi
feita durante um minuto na ausncia de clcio e substratos respiratrios
Polarizao Repolarizao
Despolarizao
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(obteno de uma linha basal), aps o qual foi adicionado o clcio. Decorrido
mais um minuto, as mitocndrias foram energizadas com succinato (5 mM)
seguido de cerca de 10 minutos de monitorizao contnua. Os compostos em
estudo e a CyA foram adicionados suspenso de membranas e incubados
durante 3 minutos antes da adio do clcio.
4 - Avaliao de efeitos do 2-nitro-p-cimeno e do p-cimeno na integridade
das mitocndrias
Para esclarecer os efeitos do 2-nitro-p-cimeno e do p-cimeno na
integridade da membrana mitocondrial, foram avaliadas as variaes dos
volumes osmticos por monitorizao espectrofotomtrica da absorvncia
aparente da suspenso a 540 nm, num espectrofotmetro Perkin-Elmer,
lambda 6 UV/VIS (Custdio et al., 1998). As experincias decorreram em 2 ml
de meio de respirao contendo sacarose 130 mM, KCl 50 mM, MgCl2 5 mM,
EGTA 0,1 mM, KH2PO4 5 mM e HEPES 5 mM, pH 7,4, suplementado com
rotenona 2 M. A suspenso mitocondrial (1 mg) foi adicionada ao meio de
respirao na presena de substratos respiratrios, temperatura de 30 C e
sob agitao magntica constante, tendo sido feita a leitura contnua da
absorvncia a 540 nm durante 30 minutos. Para esclarecer os efeitos dos
compostos, a suspenso de mitocndrias foi incubada durante 3 minutos na
ausncia (controlo) e na presena de diferentes concentraes de 2-nitro-p-
cimeno e do p-cimeno, antes de iniciar a leitura da absorvncia a 540 nm.
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