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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE ECONOMIA
YURI ZARIF TEIXEIRA DE SOUZA
O Banco Mundial: trajetória histórico-institucional do
imediato Pós-Segunda Guerra Mundial ao limiar do terceiro
milênio
NATAL, RN
2014
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YURI ZARIF TEIXEIRA DE SOUZA
O Banco Mundial: trajetória histórico-institucional do
imediato Pós-Segunda Guerra Mundial ao limiar do terceiro
milênio
Monografia apresentada à Coordenação de
Monografias do Departamento de Economia
da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, para obtenção do título de Bacharel em
Ciências Econômicas.
Orientador: Prof. Dr. Marconi Gomes da Silva
NATAL/RN
2014
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YURI ZARIF TEIXEIRA DE SOUZA
O Banco Mundial: trajetória histórico-institucional do
imediato Pós-Segunda Guerra Mundial ao limiar do terceiro
milênio
Monografia apresentada à Coordenação de
Monografias do Departamento de Economia
da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, para obtenção do título de Bacharel em
Ciências Econômicas.
Aprovada em: __/__/____
_________________________________________
Prof. Dr: Marconi Gomes da Silva
Orientador/DEPEC-UFRN
_________________________________________
Prof. Antônio Alberto Cortez
Examinador/DEPEC-UFRN
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por iluminar meu caminho e por me dar forças diariamente
para enfrentar novos desafios.
À minha família por me guiar e me orientar em todos os momentos, em
especial à minha mãe, Terezinha Moreira, que me mostrou a importância do
conhecimento.
Aos amigos que me ajudaram nos momentos difíceis e me proporcionaram
momentos de tranquilidade e paz.
À minha namorada, Sarah Caroline, por todo amor e paciência. Sou grato
pelos seus conselhos que foram de suma importância para a concretização deste
trabalho.
Aos docentes do curso de Ciências Econômicas que contribuíram
significativamente para minha formação, em particular ao professor Marconi Gomes,
que aceitou me orientar neste trabalho e contribuiu fortemente com seus
conhecimentos acerca do tema.
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RESUMO
O Banco Mundial foi criado em 1944 na conferência de Bretton Woods. Ficou estabelecido na ocasião que a instituição seria responsável pelo auxílio à reconstrução das nações europeias envolvidas na Segunda Guerra Mundial e seria responsável também pelo auxílio às nações periféricas na busca pelo desenvolvimento. Estes foram os objetivos iniciais atribuídos ao Banco Mundial. Entretanto, tais propósitos foram alterados desde a sua criação até o limiar do novo milênio. Este trabalho tem como objetivo ilustrar as modificações operacionais ocorridas no Banco Mundial associadas às distintas configurações econômicas internacionais no decorrer da sua existência. Para a construção deste trabalho foi feita uma pesquisa bibliográfica sobre o Banco Mundial e sua postura perante a Teoria do Desenvolvimento Econômico (TDE) e, posteriormente, ao ideário liberal. Os resultados apontam que o Banco Mundial perdeu seu caráter desenvolvimentista a partir da crise da TDE, em meados da década de 1970. Na década de 1980, o Banco Mundial passou a trabalhar como agente regulador em defesa das práticas neoliberais. No limiar do novo milênio, o Banco Mundial adotou um novo olhar direcionado à redução da pobreza extrema, portanto em sintonia com o ideário do desenvolvimento local e focado em grupos sociais vulneráveis, portanto distante da concepção inicial do desenvolvimento como possibilidade de promoção de mudanças econômicas estruturais, bem como mudanças sociais abrangentes. Palavras-chave: Banco Mundial. Relações internacionais. Desenvolvimento Econômico.
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ABSTRACT
The World Bank was created in 1944 at the Bretton Woods conference. It was established at the time that the institution would be responsible for reconstruction aid of European nations involved in the Second World War and was also responsible for helping the peripheral nations in the quest for development. These were the initial goals attributed to the World Bank. However, these aims have changed since its inception until the threshold of the new millennium. This work aims to illustrate the operational changes that occurred at the World Bank associated with different international economic settings in the course of its existence. For the construction of this work was done a literature search on the World Bank and its attitude towards the Theory of Economic Development (TDE) and subsequently to the liberal ideals. The results indicate that the Bank lost its developmental character from the TDE crisis in the mid -1970s. During the 1980s, the World Bank began working as a dispatcher in defense of neoliberal practices. On the threshold of the new millennium , the World Bank adopted a new look aimed at reducing extreme poverty , so in tune with the ideas of local and focused on development , so far from the initial design development vulnerable social groups such as the possibility of promoting economic changes structural as well as comprehensive social change . Key words: World Bank. International Relations. Economic Development.
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LISTA DE SIGLAS
WBG – World Bank Group
BIRD – Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento
FMI – Fundo Monetário Internacional
TDE – Teoria Do Desenvolvimento Econômico
AID – Associação Internacional de Desenvolvimento
SFI – Sociedade Financeira Internacional
CIRDI – Centro Internacional para a Resolução dos Investimentos
AMGI – Agência Multilateral de Garantia dos Investimentos
IFC – Internacional Finance Corporation
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10
2 A TRAJETÓRIA DO SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL: A
REESTRUTURAÇÃO DO PÓS GUERRA ................................................................ 13
2.1 O ACORDO DE BRETTON WOODS .................................................................. 13
2.2 O ACORDO DE BRETTON WOODS E SUAS PROPOSTAS ............................. 14
2.3 A TRAJETÓRIA DO MUNDO NO PÓS GUERRA: O PLANO MARSHALL......... 16
3 O BANCO MUNDIAL NO CONTEXTO DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS ..... 19
3.1 A PROPOSTA DESENVOLVIMENTISTA DO BANCO MUNDIAL ...................... 19
3.2 O BANCO MUNDIAL E A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO ... 21
3.3 O BANCO MUNDIAL E AS PROPOSTAS NEOCLÁSSICAS ............................. 23
3.4 O BANCO MUNDIAL NO AUGE DA CRISE DA DÍVIDA LATINO-AMERICANA 25
3.5 O BANCO MUNDIAL: PLANOS DE ESTABILIAÇÃO E O CONSENSO DE
WASHINGTON .......................................................................................................... 28
4 O BANCO MUNDIAL NO LIMIAR DO TERCEIRO MILÊNIO ................................ 31
4.1 A INFLUÊNCIA NORTE AMERICANA NA FORMAÇÃO OPERACIONAL DO
BANCO MUNDIAL ................................................................................................... 31
4.2 O DESENHO OPERACIONAL DO BANCO MUNDIAL ....................................... 33
4.3 PROJETOS INICIAIS DO BANCO MUNDIAL ..................................................... 34
4.4 O BANCO MUNDIAL: ATUAÇÃO DA DÉCADA DE 1960 AOS DIAS ATUAIS ... 35
4.5 A CRISE DE IDENTIDADE DO BANCO MUNDIAL ............................................ 38
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 42
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 45
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1. INTRODUÇÃO
Em julho de 1944, representantes de várias nações se reuniram na cidade de
Bretton Woods para discutir os rumos da economia mundial no Pós Guerra. A
conferência de Bretton Woods ocorreu em um momento decisivo, em que se fez
necessário a criação de novas regras para reger o sistema econômico internacional.
A conferência foi marcada pela apresentação de duas propostas, uma de
origem inglesa e outra de origem norte americana. Ambas possuíam interesse em
reorganizar a economia e destacar seus proponentes no novo cenário internacional
que surgira com o final da guerra.
A proposta inglesa sugeriu a criação de um fundo de compensação
internacional, que teria uma moeda escritural, denominada bancor. Já a proposta
americana sugeriu a criação de duas instituições financeiras multilaterais: o Fundo
Monetário Internacional (FMI) e o Banco Internacional para Reconstrução e
Desenvolvimento (BIRD). Ao final da conferência de Bretton Woods ficou decidido
que entraria em vigor a proposta americana. O FMI ficou responsável pela
reestruturação do sistema financeiro internacional, enquanto o papel do BIRD ficou
com a função de auxiliar a reconstrução das nações europeias envolvidas no conflito
e, posteriormente, auxiliar as nações periféricas a alcançarem o desenvolvimento.
O termo Banco Mundial engloba o BIRD e a associação internacional de
desenvolvimento (AID). A AID foi criada na década de 1960 com o objetivo de
fornecer empréstimos aos países mais pobres. (Toussaint e Millet, 2006)
Para promover o desenvolvimento das nações periféricas, o Banco Mundial
se atrelou aos ideais da Teoria do Desenvolvimento Econômico (TDE). A TDE
defendia a ideia de que a industrialização era a ferramenta propícia para alcançar o
desenvolvimento, considerando que os países desenvolvidos seguiriam esse
caminho. Com base nesse enfoque, o Banco Mundial forneceu empréstimos às
nações periféricas, para que elas criassem um ambiente favorável para o
crescimento e o desenvolvimento industrial.
A Teoria do Desenvolvimento Econômico estava acoplada ao consenso
keynesiano. Quando o mesmo passou a perder força, em meados da década de
1970, a TDE também passou a ser afetada. Nesse contexto, a teoria neoclássica
ganhou força e retomou a ideia de liberdade na economia.
A teoria neoclássica pregou a ideia de que o mercado era capaz de conduzir-
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se sem a intervenção estatal. Associou também o fraco desempenho econômico
internacional às políticas desenvolvimentistas promovidas pelo Estado.
No decorrer da década de 1970, as nações periféricas contraíram muitos
empréstimos junto às instituições financeiras internacionais. Já no final desta
década, as finanças dos países não estavam em condições de liquidar tais
empréstimos. No início da década de 1980, teve início a chamada crise da dívida
latino americana. Este período foi marcado pela péssima situação econômica em
que estes países se encontraram e pelo forte ajustamento externo para manter as
contas em dia.
A solução neoclássica para resolver este problema se justificou na
desregulamentação, privatização e liberalização dos mercados nacionais. Neste
contexto, o Banco Mundial e o FMI foram utilizados como ferramentas por parte das
nações credoras para promover o ajustamento fiscal e a aplicação do instrumental
neoclássico nas economias periféricas. O Banco Mundial passou então a promover
tais reformas e deixou de lado o ideal desenvolvimentista.
No final da década de 1989, surgiu o Plano Brady. O plano conseguiu
resolver em parte a crise da dívida e abriu novas negociações entre devedores e
credores. Já em meados da década de 1990, o Banco Mundial retoma a estratégia
desenvolvimentista com um novo olhar direcionado a erradicação da pobreza
extrema.
Ao investigar as ações do Banco Mundial no período compreendido entre sua
fundação aos dias atuais, surgem muitas indagações acerca da sua atuação e do
cumprimento das atividades que lhe foram designadas. Surge-se então a seguinte
pergunta de pesquisa: o Banco Mundial ainda é uma instituição desenvolvimentista?
As mudanças operacionais foram realmente necessárias?
O objetivo geral desta monografia é analisar o contexto em que o Banco
Mundial está inserido, bem como sua atuação operacional diante das modificações
nas configurações econômicas vigentes no período compreendido desde sua
criação aos dias atuais.
Os objetivos específicos do trabalho são: 1) Ilustrar as propostas que foram
apresentadas no acordo de Bretton Woods; 2) Analisar as ações do Banco Mundial
diante das configurações econômicas internacionais; 3) Avaliar o comportamento do
Banco Mundial como banco de desenvolvimento, bem como sua postura nos dias
atuais.
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A metodologia utilizada para a construção deste trabalho englobou
fundamentalmente a pesquisa bibliográfica, composta pela análise de textos,
monografias, artigos científicos, livros e relatórios anuais da instituição, disponíveis
no website: www.openknowledge.worldbank.org/community-list.
A revisão de literatura ancorou-se na obra do professor Luiz Carlos Bresser
Pereira, intitulada, em particular no artigo intitulado “A teoria do desenvolvimento
econômico e a crise de identidade do Banco Mundial”, publicado em 1995.
Esta monografia é composta de três capítulos, além desta introdução e das
considerações finais. O segundo capítulo ilustra as mudanças no cenário econômico
no Pós Segunda Guerra e engloba o acordo de Bretton Woods, bem como as
propostas apresentadas e o Plano Marshall. O terceiro capítulo faz uma ligação
entre a atuação do Banco Mundial durante a adoção da TDE e, posteriormente, do
ideal neoclássico. Faz menção também sobre a crise da dívida dos países latino
americanos. O quarto e último capítulo expõe uma comparação entre as operações
do Banco Mundial no início de suas atividades aos dias atuais, além de uma
avaliação acerca da mudança de sua conduta nesses anos.
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2. A TRAJETÓRIA DO SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL: A
REESTRUTURAÇÃO DO PÓS GUERRA
O período Pós-Segunda Guerra Mundial foi uma fase complicada, pois
pairavam muitas dúvidas em torno do rumo da hegemonia mundial, além de outras
incertezas relacionadas à economia e às finanças internacionais. Em meio a essa
turbulência no cenário global, surgiram propostas com o intuito de alavancar a
economia mundial e reestruturar o sistema financeiro. Em 1944, representantes e
delegados de diversos países se reuniram para participar da conferência de Bretton
Woods, onde foram discutidas as propostas para reestruturar a economia mundial,
bem como a resolução de outros problemas de ordem econômica. Durante a
reunião, surgiram propostas para solucionar questões que amedrontavam o cenário
financeiro internacional. Dentre as propostas, duas chamaram atenção. A primeira
foi a de Keynes, que representava os interesses da coroa britânica e a segunda foi a
de Harry Dexter White, que representava os interesses norte-americanos. No
decorrer das discussões, ficou decidido que a proposta a ser seguida seria a
americana.
Basicamente, a proposta americana pretendia criar três instituições, que
seriam responsáveis por interceder e regular o sistema financeiro sob a perspectiva
norte-americana. Essas três instituições eram: Banco Mundial, Fundo Monetário
Internacional e, no ano de 1947, o GATT, que se transformou na Organização
Mundial Do Comércio. O objetivo deste capítulo é relatar os acontecimentos do Pós-
Segunda Guerra e, em seguida, mostrar o funcionamento da instituição Grupo
Banco Mundial, que será abordada com mais ênfase nos capítulos posteriores.
2.1 O ACORDO DE BRETTON WOODS
O acordo de Bretton Woods foi instituído em julho de 1944. Tal acordo
pretendia explicitar a necessidade de modificar as estruturas que regiam a economia
mundial, mas particularmente o sistema financeiro internacional. No encontro foram
debatidos dois projetos, um de origem americana e outro de origem inglesa. O Plano
de origem inglesa apresentado por John M. Keynes previa uma Câmara de
Compensações Internacionais, que emitiria uma moeda meramente escritural,
denominada bancor, à qual as moedas nacionais seriam referidas. O objetivo de
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Keynes era facilitar o crédito aos países que apresentassem déficits, ao passo que
os superavitários compensariam o crédito (SOARES, 2011). Tal proposta foi
apresentada como a melhor solução para os problemas da economia mundial, pois
se mostrava funcional e se adequava à realidade do Pós-Guerra. Devido ao
posicionamento superior dos Estados Unidos, que levava em conta sua atuação
credora e bem sucedida no Pós-Guerra, suas ações e decisões tinham peso mais
elevado que as demais. Devido a sua grandiosidade, a nação americana instituía
imparcialmente um tom imperativo, deixando bem claro seu interesse em reger a
nova economia internacional.
2.2 O ACORDO DE BRETTON WOODS E SUAS PROPOSTAS
Há uma contradição clara em torno do acordo de Bretton Woods no que
concerne à análise das propostas. É questionável a não aceitação da proposta
keynesiana no acordo, considerada incompleta perante a visão norte-americana.
Para muitos, a proposta apresentada por Keynes era a mais viável. A justificativa era
que as suas propostas eram fundamentadas apenas para solucionar os problemas
de ordem econômica, deixando de lado o jogo de interesses. É evidente que tal
proposta traria vantagens para a coroa britânica, que na época passava por uma
situação delicada. Mesmo assim, tais interesses não eram tão evidentes como os
dos Estados Unidos. Partindo-se desta abordagem, é notável a existência de algum
interesse por parte dos Estados Unidos, que até então, trilhava seu caminho para
firmar a hegemonia mundial.
Mas, se as regras do sistema foram tão contrárias à visão de Keynes, por que
a literatura especializada considera que o período que se seguiu a Bretton Woods foi
a “idade de ouro” do keynesianismo? Esse aparente paradoxo pode ser explicado
quando se distingue três diferentes sistemas de Bretton Woods, a saber: 1) o
sistema “utópico” proposto por Keynes; 2) as regras aprovadas no acordo e 3) a
maneira pela qual o sistema foi administrado na prática pelos EUA
(SERRANO,2004).
Os planos tinham alguma semelhança, mas se diferenciavam em alguns
pontos cruciais, principalmente no que concerne à administração dos mesmos.
Enquanto a proposta keynesiana defendia que o tratado fosse gerido de forma
multilateral, a proposta americana defendia claramente seu interesse em manter e
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gerir tal acordo. A proposta defendida por Harry White atendeu bem às expectativas
internacionais a curto e médio prazo. Pode-se afirmar que o objetivo maior foi
alcançado, em se tratando da busca pelo padrão financeiro.
Bretton Woods e o plano Marshall se tornaram a concretização da força
hegemônica norte americana. Graças ao sucesso de ambos, foi possível manter e
estender os interesses dos Estados Unidos em âmbito internacional. Sem considerar
ainda a força bélica, que possibilitou a extensão de seu poder dos lugares mais
importantes aos mais inóspitos do planeta. Durante este período a manutenção do
seu poder estava assegurada, pelo menos em parte. A maioria dos países tinha
vínculo comercial com os Estados Unidos, que fazia transações de grande porte e
realizava grandes acordos. Tais negócios eram compostos por diversas parcerias,
que englobavam recursos para a produção, distribuição, inovação dentre outros
relacionados.
No decorrer da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos comercializavam
produtos primários e industrializados, além de financiar os países aliados,
incentivando e contribuindo para o fim da ameaça alemã. Como parte das
negociações, os Estados Unidos decidiram reforçar o apoio à Rússia. Tal apoio se
estendeu desde o envio de armas a empréstimos e comercialização de produtos em
larga escala, tudo para conter a ameaça nazista. Após o final da guerra, a Rússia se
apoderou das muitas vantagens, como o capital em larga escala disponibilizado pelo
governo americano, armas e equipamentos enviados para fins militares, novas
táticas de combates, conhecimentos estratégicos, dentre outros recursos que
possibilitaram sua expansão e que foram sabiamente utilizados em seu favor. Tais
vantagens favoreceram o seu desenvolvimento e a expansão de seus interesses
para além de suas fronteiras. Eis que surge a então URSS (União Das Repúblicas
Socialistas soviéticas). Sob o comando Russo, a URSS foi somando e agregando
vários países ao seu bloco. O ideal socialista foi abraçado e utilizado como bandeira
em oposição ao capitalismo. A partir deste período, surgiu uma ameaça à altura do
poderio capitalista americano.
O ponto de partida da URSS foi o território russo. Devido suas proporções
continentais, a Rússia fazia fronteira com diversos países. Estes foram sendo
anexados ao bloco e posteriormente novos territórios foram aderindo à proposta
socialista. A quantidade de países que aderiram ao novo modelo surpreendeu aos
Estados Unidos, que se viram obrigados a tomar algumas atitudes sob pena de
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ameaça a manutenção de sua hegemonia.
A proposta de Harry White que incorporava os interesses dos Estados Unidos
foi usualmente aplicada em prol dos países capitalistas. O interesse norte americano
agora passa a ser o mesmo dos soviéticos: incorporar e manter mais países em seu
bloco. Iniciou-se então um largo processo de distribuição de capital, sob a forma de
empréstimos e investimentos destinados a conter a ameaça socialista.
Os defensores da proposta keynesiana temiam que o plano de White, embora
cumprisse seu objetivo, favorecesse a perpetuação dos interesses americanos.
Porém, com os novos fatos, o plano passou a ser operado com um caráter não
nocivo ao atual sistema, se mostrando colaborativo e de certa forma
desenvolvimentista, considerando que o grande aporte de capital que foi emprestado
e investido contribuiu de forma decisiva para manter os países que já faziam parte
do sistema vigente e conter a então ameaça socialista.
2.3 A TRAJETÓRIA DO MUNDO NO PÓS GUERRA: O PLANO MARSHALL
Ao final da Segunda Guerra Mundial, muitas economias estavam destroçadas
e necessitavam de apoio para se reerguer. Havia grande interesse dos norte
americanos para a concretização de tal apoio, visto que os Estados Unidos se
tornaram o maior credor dos países envolvidos no conflito. Sendo assim, foi prevista
uma nova crise moldada nos padrões de 1929, considerando que a demanda
agregada internacional era insuficiente para acompanhar os novos moldes
industriais alcançados até então. A partir do momento em que a economia
internacional passava por um grande colapso estrutural, os Estados Unidos seguiam
alimentando esse momento. Eram também o principal fornecedor de commodities,
armas e produtos industrializados. Antes da eclosão da Segunda Guerra Mundial, a
nação norte-americana já tinha a Europa como principal demandante dos seus
produtos. (SILVANA, 2011)
A capacidade dos países em honrar suas dívidas foi se extinguindo, o que
ameaçou a nação americana. Foi proposto o denominado Plano Marshall, que tinha
como principal função fornecer empréstimos para que os países pudessem honrar
suas dívidas e acelerar sua reconstrução. Embora o risco de calote fosse elevado,
tal plano foi sem dúvida uma boa opção. O Plano Marshall foi uma proposta
conveniente para solucionar os problemas da conjuntura econômica de então.
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Criado em 1947 pelo secretário de Estado George Marshall, o plano que levou seu
nome resultou numa série de empréstimos que foram repassados aos países
europeus para honrar suas dívidas e reconstruir sua infraestrutura. O montante foi
emprestado a taxa de juros bem abaixo do mercado. O plano funcionou, visto que
posteriormente a economia global alcançou crescimento elevado. Tal período ficou
conhecido como os anos dourados do capitalismo, marcado pelo crescimento do PIB
mundial em aproximadamente 4,9% (MARGLIN 1986), além do aumento de outras
variáveis de extrema importância que são essenciais para a maturação do
desenvolvimento.
Essa injeção de capital aconteceu com dois propósitos: o primeiro foi o de
auxiliar à reconstrução dos países participantes da Segunda Guerra Mundial e a
segunda foi a contenção da ameaça comunista. Este último foi de suma importância
para a manutenção do sistema capitalista, pois envolveu países de todos os
continentes e contribuiu para o crescimento dos mesmos.
Ao aceitar o empréstimo, as nações estreitavam os laços com os norte-
americanos, de forma que essa relação fosse além de um simples negócio. O capital
americano carregava consigo a tarefa de conduzir o plano econômico internacional a
um novo patamar. Na maioria das vezes, esse capital era destinado à compra de
máquinas pesadas, equipamentos, fertilizantes, investimentos em universidades e
empresas de origem norte americanas. Funcionava como uma rede, da qual os
Estados Unidos eram o principal credor e fornecedor, enquanto os demais países
foram os demandantes de seus produtos.
A proposta americana aprovada em Bretton Woods condizia segundo seus
interesses em estabelecer os novos moldes do sistema financeiro internacional.
Porém, embora os Estados Unidos tivessem participação bem superior aos demais
países nas instituições FMI e Banco Mundial, suas decisões não eram unânimes.
Em contrapartida, o Plano Marshall surgiu como uma ferramenta que caracteriza
bem o poder de sua hegemonia. No decorrer da operacionalização do plano, a
barganha do governo do Estados Unidos com as nações internacionais cresceu
significativamente, colaborando ainda mais para sua ascensão.
De maneira geral, o Plano Marshall pode ser caracterizado apenas como um
plano de ajuda de ordem econômica. Embora seja conhecido o real interesse por
trás do plano, oficialmente ele não passa de uma cooperação financeira. Em
discurso, o seu fundador, o secretário de Estado norte americano George Marshall,
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buscou explicitar apenas a “boa vontade” dos Estados Unidos em ajudar:
Nossa política não é dirigida contra algum país ou doutrina, mas contra fome, pobreza, desespero e caos. Seu propósito deve ser o renascimento de uma economia de trabalho no mundo, de forma a permitir a emergência de condições político-sociais em que 37 instituições livres possam existir. Tal assistência, estou convencido, não deve estar em uma base errada enquanto várias crises se desenvolvem. Toda assistência que este Governo puder render no futuro deveria prover uma cura, ao invés de mero paliativo. Todo o governo que estiver disposto a ajudar na tarefa de recuperação encontrará total cooperação, tenho certeza, por parte do governo dos Estados Unidos (MARSHALL, apud Silvana 2011).
É sabido também que o capital proveniente do Plano Marshall foi oferecido a
alguns países do bloco soviético, porém não foi aceito pela maioria. A URSS
também possuía um plano de ajuda econômica restrito a seus membros e concedido
aos países que viriam a fazer parte do bloco.
A proposta soviética não era tão simples operacionalmente como o Plano
Marshall, mas era de certa forma cobiçada por alguns países. Os Estados Unidos
tinham uma grande vantagem frente à URSS que era o Dólar. Como sua moeda
nativa era a dominante no mercado internacional, ele poderia expandir sua base
monetária conforme seus interesses. Seu déficit na balança de pagamentos
contribuía positivamente para que essa ferramenta fosse utilizada sempre que
necessário, tomando precauções é claro com a saúde de suas finanças.
O Plano Marshall foi responsável pelo fortalecimento da proposta do livre
mercado na Europa. Tal proposta criou um novo cenário doméstico, que inicialmente
ficou marcado pela liberalização da economia e atuação do laissez-faire. O plano
também contribuiu para a redução da inflação e deu início ao processo de
integração europeia. O plano pregava a ideia de cooperação entre os países, o que
contribuiu significativamente para que ocorresse uma maior interação entre as
nações europeias e o mercado internacional. Este foi o ponto inicial para o
fortalecimento das negociações, que anos depois se concretizaram no tratado de
Maastricht e posteriormente deram origem a um novo bloco econômico: a União
Europeia.
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3. O BANCO MUNDIAL NO CONTEXTO DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
3.1 A Proposta Desenvolvimentista do Banco Mundial
O percurso desenvolvido pelo Banco Mundial desde a sua fundação aos dias
atuais foi marcado por algumas divergências ideológicas e estruturais, que
desencadearam uma série de questões acerca da sua atuação e eficácia
operacional.
Após sua fundação, a instituição contava com o apoio do capital internacional
das nações para a promoção do crescimento dos países periféricos e para a
reconstrução das nações europeias assoladas pela Segunda Guerra Mundial. O
capital destinado ao continente europeu foi direcionado para a restauração
econômica e renovação da infraestrutura, que sofreu severos danos durante o
conflito. O objetivo maior era dar condições para que a Europa retomasse sua
competitividade e sua posição no comércio internacional. O capital disponibilizado
para os países periféricos consistia no financiamento de projetos estruturais, que
possibilitassem a criação de um ambiente propício para o desenvolvimento da
atividade industrial, inicialmente apoiada pela Teoria do Desenvolvimento
Econômico. (Bresser-Pereira, 1995)
O Banco Mundial apoiou as indústrias periféricas porque acreditava que as
demais nações deveriam seguir a mesma trajetória dos países desenvolvidos. Tal
apoio estava embasado na chamada Teoria do Desenvolvimento Econômico, que
surgiu no embalo do sucesso do consenso keynesiano. A essência da TDE estava
intrínseca na defesa da industrialização como pilar do desenvolvimento. A
industrialização além de gerar muitos empregos, incentiva a produção e amplia o
horizonte na busca pela inovação, além de proporcionar muitas vantagens a longo
prazo para o desenvolvimento das nações.
Inicialmente, a instituição abraçou a Teoria do Desenvolvimento Econômico e
passou a aplicá-la em suas ações. A estratégia do Banco Mundial para promover o
desenvolvimento das economias periféricas consistia no apoio ao desenvolvimento
industrial. Para isso acontecer, foi necessário criar um cenário em que o Estado, as
indústrias e as empresas cumprissem papéis específicos. Neste caso, o Estado
seria responsável por fomentar as obras estruturais que proporcionariam as
condições necessárias para atrair as empresas e assim iniciar o processo de
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desenvolvimento local.
O processo de substituição de importações também foi defendido pela
instituição. Foi necessário criar uma valorização das potencialidades nacionais para
que o ambiente industrial pudesse florescer. Durante certo tempo a prática das
substituições de importações funcionou. As empresas nacionais ganharam espaço
no cenário econômico e conseguiram dar continuidade ao crescimento. Porém,
alguns anos depois, o processo de substituição de importações passou a ser
confundido com o protecionismo, caracterizado pelo interesse do Estado em
minimizar a concorrência no mercado, o que não agradou à indústria internacional.
O protecionismo passou a ser visto de duas maneiras distintas. A interpretação a
seu favor justificou como necessárias as ações tomadas para tornar indústrias mais
competitivas. Já o ponto de vista contrário considerava as práticas protecionistas
como uma ameaça ao livre mercado, por não gerar concorrência, tornando os
produtos importados não competitivos perante os nacionais, dentre outros fatores.
(Bresser-Pereira, 1995)
A visão dominante no Banco Mundial era que o Estado deveria participar
ativamente no processo de desenvolvimento e não ser um mero coadjuvante. Para a
liberação dos recursos, o Banco Mundial contava com a aprovação de projetos, que
deveriam mencionar tecnicamente os dados e as propostas para a realização de
determinada obra estrutural. Os projetos eram realizados com base nas
necessidades do Estado e eram submetidos a instituição, que os analisava
previamente e diagnosticava sua viabilidade. A dinâmica industrial necessitava não
apenas de recursos técnicos, mas de rotas de escoamento, redes de energia,
insumos a custos menores, etc. A iniciativa privada poderia perfeitamente exercer
essa função, contudo, tal proposta poderia esbarrar nos interesses do Estado, que
era o responsável pelo desenvolvimento.
A história da instituição foi marcada por algumas divergências em torno do
desenvolvimento. É interessante ressaltar que a proposta de implantar e criar um
ambiente favorável para o crescimento industrial nas nações periféricas funcionou,
porém o que se questiona é a busca pelo desenvolvimento, que de certa forma foi
iniciada, mas não chegou a ser concluída. (Bresser-Pereira, 1995). Só o capital não
foi suficiente para alcançar o objetivo. Os direcionamentos do capital foram similares
para a maioria dos países, Entretanto a realidade de uma nação para outra era bem
distinta, o que complicou bastante à promoção do desenvolvimento.
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Desde a criação da instituição, as atividades do Banco Mundial foram
marcadas por divergências técnicas e administrativas. Ao sustentar a participação
do Estado no processo de desenvolvimento, a instituição deveria levar em conta
todos os agentes que participam e são responsáveis por tal processo. Porém, alguns
atores como as empresas estatais não tiveram seu reconhecimento durante o
primeiro ano de operação do Banco. Os estudiosos Mason e Asher afirmaram que “a
direção do Banco opunha-se a financiar empresas estatais” (sic!) (Mason e Asher,
1973, apud Bresser, 1995). Muitos países queriam a participação de suas empresas
nacionais na realização das obras estruturais, a fim de promover o crescimento das
mesmas. Tal receio do Banco causou algum transtorno entre ambas as partes. Ao
considerar a abordagem da TDE, o Banco se restringiu às atividades direcionadas
ao Estado, desconsiderando as demais. Alguns anos depois essa questão sofreu
uma inversão, devido à abordagem neoliberal. É importante ilustrar que esse não foi
um caso de divergência isolado. Em outras situações a instituição se comportou de
forma diferente da sua proposta inicial.
3.2 O BANCO MUNDIAL E A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
O Banco Mundial se baseou em várias teorias ao longo da sua trajetória.
Essas teorias foram fundamentais para que a instituição pudesse cumprir seus
objetivos da forma mais eficaz possível. Ao longo da sua trajetória, surgiram
diversas críticas em torno das teorias, gerando algumas dúvidas em determinados
momentos. De fato, essas mudanças teóricas podem melhor ser compreendidas
quando relacionadas aos diferentes interesses da instituição.
Como visto anteriormente, a Teoria do Desenvolvimento Econômico teve
papel essencial no início das atividades do Banco. Em suma, a TDE pode ser
definida como um conjunto de propostas de cunho teórico que, a longo prazo,
“poderia promover a decolagem para o crescimento sustentado” (Rostow, 1960 apud
Bresser 1995).
Os teóricos da TDE defendiam a ideia de que o desenvolvimento seria
alcançado através da industrialização, devido a toda dinâmica em que está inserida,
sendo capaz de promover o aumento no emprego, incentivo na busca de novas
tecnologias, etc. O Banco Mundial simpatizava com essa ideia. Ao incentivar o
crescimento industrial, o Estado e as empresas adjacentes seguiriam no mesmo
22
rumo. Sendo assim, um investimento unilateral direcionado traria benefícios a todos
os entes envolvidos no processo. Tal fato justifica o interesse do Banco Mundial em
direcionar o capital a ser financiado para o Estado e não para as empresas privadas
em um primeiro momento.
O papel do Estado na Teoria do Desenvolvimento Econômico não poderia ser
deslocado. O Estado deveria ser o protagonista na caminhada rumo ao
desenvolvimento, orquestrando regularmente os recursos disponíveis e orientando
os demais participantes do processo desenvolvimentista. A importância da
participação do Estado não pode ser comparada aos demais, pois na busca pelo
desenvolvimento, todos os agentes possuem igual consideração. O aumento da
responsabilidade do Estado na promoção do desenvolvimento ocorreu junto ao
embalo das propostas keynesianas. (Bresser-Pereira, 1995)
Alguns anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, o mundo presenciou
uma nova mudança no cenário econômico internacional, conhecido como os anos
dourados do capitalismo. Essa época foi marcada pelo crescimento elevado do PIB
global, resultado da aceitação das propostas keynesianas, as quais defendiam a
atuação mais forte do Estado na economia. O trecho abaixo relata claramente o
dever a ser cumprido pelo Estado nessa nova configuração internacional:
Além dos instrumentos de política monetária e fiscal, o estado também passou a regular/administrar o capitalismo, ou seja, promoveu uma verdadeira reforma no capitalismo. Em outros termos, através de suas ações, passou a planejar e coordenar o processo de industrialização e ou modernização das economias capitalistas. Além disso, assumiu a expansão e manutenção do nível da demanda agregada até atingir o nível de atividade próximo ao pleno emprego. Assim o estado toma para si a responsabilidade de garantir o crescimento econômico e incorporar a classe trabalhadora nesse processo, daí gerando seu compromisso com a seguridade social e o pleno-emprego. (sic!) (Graciano, 1999, p.51)
A proposta keynesiana justificava fortemente que a economia necessitava da
influência do Estado para sua manutenção. De certa forma a Teoria do
Desenvolvimento Econômico estava atrelada a esse ideal, reivindicando a posição
do Estado na promoção do desenvolvimento. Nesse contexto, o Banco Mundial agiu
essencialmente conforme a TDE. A instituição aderiu à teoria até meados da década
de 70, quando o consenso keynesiano começou a entrar em colapso e arrastou
consigo todos os ideais referidos à intervenção do Estado na economia. A partir de
23
então, o Banco mudou sua estratégia, como veremos adiante.
Assim como as empresas, as instituições passaram a se adequar às
transformações que ocorreram no cenário internacional. Com o Banco Mundial não
poderia ser diferente. Diante da crise da Teoria do Desenvolvimento Econômico, a
instituição precisou mudar sua estratégia de atuação. Apesar da instituição ser
plenamente capaz de modificar seu projeto estrutural, ela estava vinculada as
configurações econômicas internacionais vigentes. O FMI logo teria de seguir as
regras do jogo.
O fracasso da TDE na década de 1970 contribuiu para que as ideias
neoclássicas ganhassem força e assim conseguissem contestar a participação do
Estado na economia. Os neoclássicos alegavam que a economia era capaz de se
manter por si só, sem interferências externas. Esse choque teórico veio aumentando
gradualmente e chegou a ser altamente questionado conforme a teoria keynesiana
se enfraquecia. Embora os neoclássicos não concordassem com tal teoria, eles
tinham de concordar que no período do Pós Guerra tal teoria foi um sucesso e
contribuiu significativamente para a existência de uma nova realidade econômica.
3.3 O BANCO MUNDIAL E AS PROPOSTAS NEOCLÁSSICAS
Como dito anteriormente, a teoria neoclássica ganhou força após a queda do
keynesianismo. No âmbito geral, a teoria neoclássica contribuiu mais fortemente
com a crítica sobre o ativismo econômico do Estado. O instrumental neoclássico era
composto por ferramentas neoliberais que pregavam essencialmente a liberdade
econômica sem nenhuma intervenção. Dentre as ferramentas básicas estavam a
privatização, a liberalização comercial, dentre outros.
Embarcando nessa nova teoria, o Banco Mundial mudou alguns aspectos
relevantes da sua estrutura e abandonou seus laços com a Teoria do
Desenvolvimento Econômico. Tal fato está bem ilustrado no fragmento abaixo, que
faz menção as novas propostas do banco:
O novo papel do Banco estava bastante claro: enquanto o fundo iria continuar a cuidar dos problemas de curto prazo do balanço de pagamentos e da estabilização, o Banco iria pressionar pelas reformas estruturais, isto é, a liberalização comercial, a privatização
e a desregulamentação. (Bresser-Pereira, 1995, p. 9)
24
A crítica neoclássica acusava a intervenção do Estado pelo fracasso
econômico no final da década de 1970. Uma suposta explicação para a queda da
Teoria do Desenvolvimento Econômico está ilustrada na frustação da gestão estatal.
Para que o desenvolvimento fosse alcançado, alguns fatores essenciais foram
esquecidos ou simplesmente não receberam atenção necessária. Com isso,
empresas foram se dissipando, a inflação continuou a crescer e a renda passou a se
concentrar cada vez mais. A nova teoria argumenta que o mercado tem condições
de se preservar e funcionar de maneira autônoma, sem necessidade de intervenção.
O sucesso da teoria foi ilustrado através de alguns casos de sucesso, como
os Países que compõem o grupo denominado Tigres Asiáticos. Tal bloco foi
inicialmente composto por Cingapura, Hong Kong, Coréia Do Sul e Taiwan que
receberam reconhecimento entre a década de 1970. Embora os Tigres Asiáticos não
tenham adotado plenamente o ideal neoclássico, foi um exemplo comumente
utilizado por seus seguidores e adeptos (Cerqueira, 2014). A economia dos Tigres
Asiáticos decolou a partir de uma combinação atraente envolvendo o mercado e o
Estado. Cada país possuía particularidades em seu ambiente econômico, mas eles
se tornaram conhecidos devido a algumas estratégias desenvolvimentistas. Estes
países adotaram o sistema de industrialização voltada para exportações.
Basicamente, o Estado fornecia a estrutura necessária para a instalação das
indústrias multinacionais que produziam e distribuíam suas mercadorias para o
comércio exterior. O Estado criou um ambiente propício para o desenvolvimento da
atividade industrial. Além da boa estrutura, as multinacionais receberam alguns
benefícios, que iam desde subsídios fiscais à concessão de enormes áreas. Embora
as empresas possuíssem liberdade para atuar, tais exemplos não podem ser
considerados puramente neoliberais. O Estado não intervinha diretamente na
economia mas participava do seu planejamento e manutenção.
A TDE confiava no sistema de substituição de importações. Quando o modelo
chega à exaustão, a crítica neoclássica sugere a solução inversa: A privatização e a
desregulamentação. O principal argumento neoclássico afirmava que as economias
estavam sem competitividade, logo era necessário abrir espaço para o surgimento
de um novo ambiente econômico, adequado às novas necessidades comerciais.
Acreditava que assim, haveria um estimulo maior para o surgimento de novas
empresas e instalação de outras de grande porte, contribuindo assim para o
desenvolvimento nacional.
25
O Banco Mundial utilizou o exemplo dos Tigres Asiáticos pois era necessário
mostrar que a utilização da abordagem neoliberal seria capaz de criar um novo
ambiente econômico, que alcançaria o desenvolvimento de maneira distinta,
preconizada pela Teoria do Desenvolvimento Econômico. Era necessário resgatar a
confiança dos agentes econômicos e para que isso se concretizasse, nada melhor
que a visualização de bons exemplos.
Acompanhando a nova tendência, a então diretoria executiva optou por
mudanças em suas atividades, que passaram a englobar a desregulamentação e a
privatização em seus projetos. Os economistas do Banco avaliaram e fizeram
sugestões com frequência às nações periféricas, fortalecendo assim a liberdade
econômica.
A liberalização proposta pelo Banco Mundial através da orientação neoliberal
abrangeu os países periféricos de forma generalizada. Não houve planos
específicos que atendessem de forma particular aos interesses de cada Estado.
Sabe-se que cada nação possui dimensões e realidades bem distintas, logo não
seria possível resolver os problemas com apenas uma receita. Esta é mais uma
hipótese que ilustra as dificuldades do banco em cumprir o seu papel
desenvolvimentista, marcado pelo revés em busca de suprir as particularidades e
resolver as questões que permeiam a busca pelo desenvolvimento.
3.4 O BANCO MUNDIAL NO AUGE DA CRISE DA DÍVIDA LATINO-AMERICANA
O período que envolve as décadas de 1970 e 1980 marcou profundamente a
história do Banco Mundial. A queda da Teoria do Desenvolvimento Econômico, o
ressurgimento da teoria Neoclássica e a crise da dívida são alguns fatos importantes
que estampam as interações da instituição com os Estados nacionais. (Bresser-
Pereira, 1995)
A crise da dívida nos países latino-americanos eclodiu no início da década de
1980. Esta crise foi marcada pelo abrupto enfraquecimento das economias
nacionais, culminando num clima de tensão por parte dos países credores. Havia
dúvidas em torno da capacidade dos países devedores em honrar suas dívidas, logo
surgiram inúmeras receitas e pseudo soluções para tentar evitar eventuais
transtornos, mas não foi bem assim que aconteceu. A década de 1980 foi muito
sofrida para os países latino americanos, que passaram a cumprir metas fiscais
26
pesadas e de certa forma passaram a ser vigiados.
A teoria Neoliberal, que passou a ganhar força neste período, criticou
duramente a intervenção estatal na economia e propôs de imediato uma
reestruturação econômica que se estendia a todos os setores. Para os neoclássicos,
a crise viria a acontecer em pouco tempo, pois a partir do momento que o Estado
interfere na economia, há um estreitamento entre o livre comércio, o que dificulta o
processo desde a produção à circulação de mercadorias. No auge da crise
keynesiana, a gestão do Estado na economia perde credibilidade. Neste cenário a
crise fiscal ganha força e contribui ainda mais para o enfraquecimento do Estado.
A crise fiscal pode ser deduzida a partir da elevada dívida pública nacional.
No auge da TDE e no decorrer da década de 1970, os Estados latino americanos
contraíram inúmeros empréstimos com as instituições credoras e outras nações.
Devido a essa justificativa, os Estados não tinham barganha suficiente para
conseguir mais crédito a um nível suficiente para tentar solucionar esse problema.
Além da alta dívida, compuseram o quadro negativo: escassez de crédito no
mercado, poupança doméstica reduzida, além de outros problemas estruturais.
(Bresser-Pereira, 1991)
Esta não é a única explicação sobre a crise da dívida. Existem diversas
explicações que giram em torno de erros e insistências que custaram caro aos
cofres nacionais. A persistência com o sistema de substituição de importações em
um cenário econômico bem diferente das décadas passadas foi também uma
explicação para o insucesso do Estado. Outra visão é acerca da estatização da
dívida, manifestada na ação estatal em busca do desenvolvimento. Como o Estado
era o mentor do progresso, logo seria responsável pelo pagamento das dívidas.
(Bresser-Pereira, 1993).
A tabela número 1 mostra a complexa situação vivida na América Latina. A
explosão da inflação, baixo crescimento do PIB e os outros indicadores são reflexo
da persistência em um modelo que não condiz com a conjuntura econômica, diante
das modificações nas configurações da economia internacional, promulgadas pelo
mainstream Neoliberal.
27
Tabela 1
América Latina: alguns indicadores econômicos
Discriminação 1980 1981 1982 1982 1984 1985
Taxa de
crescimento do
PIB (em %)
5,3
0,4
-1,5
-2,5
3,2
28
Taxa de inflação
(em %)
56,1
57,6
84,8
131,1
185,2
328,3
Exportação de
bens (em %)
89,1
95,9
87,4
87,5
97,5
91,9
Importação de
bens (em US$
bilhões)
90,5
97,6
78,3
56,0
58,8
57,6
Superávit
comercial (em
bilhões)
-1,4
-1,7
9,1
31,5
38,7
34,3
Dívida externa
bruta (em US$
bilhões)
222,5
277,7
318,4
344,0
360,4
360,0
Juros/exportações
de bens e
serviços (em %)
19,9
27,6
40,5
35,9
35,7
36
Fonte: CEPAL, Balanço preliminar, apud Maria Silvia, 1987
Diante desta nova proposta, a instituição perde o foco central. O acordo
firmado em Bretton Woods, que concretizou a criação de uma instituição a favor do
desenvolvimento perdeu o sentido. Na década de 1980 o Banco passou a ser
responsável pela administração da crise latino americana e perdeu de fato seu
objetivo inicial. A instituição que trabalhou em prol dos países em desenvolvimento
agora passa a vigiá-los, sob jurisdição das nações credoras. A atuação do Banco
Mundial se restringiu a regular os países devedores, com base na manutenção da
balança de pagamentos e do reestabelecimento do equilíbrio fiscal. A instituição
28
acatou as novas reformas neoliberais e impulsionou a liberalização comercial, a
desregulamentação e a privatização nestes países. O Banco Mundial deixou claro
que em caso de descumprimento das propostas, a penalização seria a dispensa de
novos empréstimos, além do aumento da pressão externa para a quitação ou
cumprimento dos pagamentos referentes à dívida. (Bresser-Pereira, 1995)
Como o capital inicial negociado foi barganhado a ínfimas taxas de juros, as
nações pagariam não muito além ao equivalente inicialmente requerido. No caso dos
novos empréstimos, a taxa de juros era maior devido à redução da quantidade de
crédito disponível e com o intuito de não promover eventuais calotes e/ou
descumprimentos contratuais.
3.5 O BANCO MUNDIAL: PLANOS DE ESTABILIAÇÃO E O CONSENSO DE
WASHINGTON
No momento em que a crise passou a ganhar força, as instituições e as
nações credoras passaram a adotar algumas medidas para solucioná-la. Em um
primeiro momento, acreditava-se que a crise era oriunda de problemas de liquidez.
Sendo assim, foram disponibilizados empréstimos a serem pagos em um curto
prazo. Mesmo com este auxílio adicional, o problema ainda persistiu e a dívida ficou
ainda maior.
Em meados de 1985 James Baker, secretário do Tesouro norte americano
criou uma medida emergencial que levou seu nome. O Plano Baker era composto
por novos empréstimos a serem pagos em um curto espaço de tempo, acrescidos
de novos condicionantes. Acreditava-se que esse capital seria suficiente para
estabilizar os problemas financeiros e reestabelecer as condições econômicas dos
países. Alguns anos após a implementação, foi verificado que algumas questões
foram equacionadas, porém o plano não foi capaz de solucionar o problema e a
crise ainda continuava. (Bresser-Pereira, 1989)
Ao fim da década de 1980, o novo secretário do tesouro norte americano,
Nicholas Brady, elaborou um plano econômico que viria a dissipar a crise. O Plano
Brady consistiu na oferta de novos empréstimos que atualizaram a antiga dívida. A
ideia chave do plano era estabelecer uma relação negocial entre devedor e credor.
Conforme as parcelas da dívida eram pagas, os países devedores recebiam uma
bonificação das nações credoras. Essa bonificação englobava vantagens como
29
redução da taxa de juros, desconto no saldo da dívida, dentre outros benefícios, que
favoreceram a solução do problema.
O sucesso do plano Brady está associado à negociação da dívida no
mercado financeiro. Este processo é denominado de securitização, que está
associado à transformação dos empréstimos fornecidos pelas instituições
multilaterais e países credores em títulos negociáveis no mercado financeiro. Em
suma, a dívida foi convertida em papéis e passou a ser distribuída entre os demais
agentes econômicos. Os interessados em negociar estes papéis deveriam respeitar
as condicionalidades impostas pelas instituições multilaterais e seguir os termos
negociados.
Meses após o anúncio do Plano Brady, economistas de renomadas
universidades, aliados às instituições multilaterais, dos bancos internacionais e do
governo norte americano elaboraram uma cartilha chamada “Consenso De
Washington”. Este documento era composto de dez regras direcionadas aos países
endividados e funcionaria como uma receita neoliberal em busca do
desenvolvimento. O consenso de Washington foi criado oficialmente na década de
1990, mas ele foi pensando e instaurado parcialmente na década anterior. As
soluções neoclássicas propostas para dissolver o então fracasso da Teoria do
Desenvolvimento Econômico podem ser consideradas como os princípios que
antecederam a criação da proposta.
As dez regras do Consenso de Washington são: manutenção da disciplina
fiscal, objetivando suprir o déficit das contas públicas; redução dos gastos públicos,
para reduzir o enorme déficit operacional; reforma tributária, com o intuito de
aumentar a arrecadação do Estado através da elevação da carga tributária; juros de
mercado, praticados conforme a necessidade do mercado; câmbio de mercado,
deixando a taxa de câmbio flutuar favoravelmente em conformidade com a dinâmica
comercial; abertura comercial, de modo a tornar o ambiente econômico mais
atrativo e liberal, incentivando a entrada de novas empresas internacionais;
investimento estrangeiro direto, sem burocracias por parte do Estado; privatização
das estatais, com o objetivo de minimizar a gestão econômica estatal;
desregulamentação econômica, cedendo mais liberdade ao novo ambiente
econômico e, por fim, o direito à propriedade intelectual, que deveria ser
reconhecido, valorizado e protegido por lei.
O Banco Mundial e o FMI colaboraram com as propostas e passaram a
30
trabalhar com base na nova visão ideológica. Levando em conta os objetivos iniciais
propostos para o Banco Mundial, sua função novamente se confunde, como citado
anteriormente. A instituição passa agora a administrar a crise da dívida dos países
da América Latina, estabelecendo questões reguladoras e fiscalizando o esforço dos
países em solucionar o problema econômico. A instituição passa a operar com um
caráter comercial, esquecendo o seu real propósito.
O Plano Brady juntamente com o Consenso de Washington conseguiu
resolver boa parte dos problemas da crise da dívida na América Latina. Embora a
dívida externa ainda tenha persistido nos anos seguintes, seu volume tornou-se
negociável.
A década de 1990 foi marcada pela efetiva prática neoliberal. Muitas
empresas estatais foram privatizadas totalmente e algumas abriram parte de seu
capital na bolsa de valores como forma de se capitalizar e se evadir da
administração estatal. A privatização contemplou todos os setores da economia. A
visão neoliberal extremista pretendia privatizar praticamente todos os espaços da
economia, cabendo ao Estado apenas a manutenção de algumas entidades e
setores. O neoliberalismo predominante não chegou a ser tão radical. A
preocupação inicial girava em torno da atuação do laissez-faire e de sua aceitação
pelos países periféricos, levando em conta que boa parte deles foram marcados pela
forte presença da gestão estatal na economia.
31
4. O BANCO MUNDIAL NO LIMIAR DO TERCEIRO MILÊNIO
Como visto no capítulo anterior, o Banco Mundial passou por grandes
modificações no decorrer de suas atividades para se adaptar às constantes
transformações que ocorreram na economia mundial. A participação da instituição
tem se mostrado funcional para o gerenciamento de novas políticas em torno da
economia global.
No início do terceiro milênio, a economia internacional presenciou uma das
maiores crises da história do capitalismo. A crise de 2008, popularmente conhecida
como “bolha imobiliária”, atingiu o sistema financeiro internacional de forma
abrangente. Diante deste novo desafio, grandes bancos internacionais decretaram
falência, bem como empresas multinacionais e demais agentes econômicos. A
manutenção da crise também foi marcada por um fato interessante: o ativo
envolvimento do Estado na economia. O governo dos Estados Unidos adquiriu
bancos que estavam decretando falência, auxiliou grandes empresas e buscou
novos parceiros numa larga tentativa de estancar o problema.
A crise foi só uma das muitas questões que marcaram esse novo período.
Para compreender melhor a atuação do Banco Mundial nos dias atuais, se torna
necessária a ilustração dos fatos que marcaram as novas configurações no sistema
capitalista. É interessante também entender como se compõe o corpo técnico da
instituição, além de constatar e avaliar a mudança comportamental da mesma, bem
como o seu comprometimento com o desenvolvimento das nações periféricas.
4.1 A INFLUÊNCIA NORTE AMERICANA NA FORMAÇÃO OPERACIONAL DO
BANCO MUNDIAL
O Banco Mundial possui um forte vínculo com as nações credoras. Dentre
estes países, vale destacar a participação norte americana, que é a nação que
detém a maior influência na instituição. O poder dos Estados Unidos no Banco
Mundial pode ser observado na composição orçamentária dos fundos.
Conforme o gráfico 1, é notável o poder norte americano nas decisões
internacionais. Conforme sua maior participação na composição dos fundos da
instituição, maior seu poder de voto sobre as demais nações. Quaisquer que sejam
as propostas discutidas, os Estados Unidos têm poder de veto e são capazes de
32
utilizá-lo sabiamente conforme seus interesses. Este controle institucional possui
uma enorme capacidade de manipulação. Mesmo com a participação dos outros
países, as decisões relativas à aplicação de recursos, bem como possíveis vetos a
eventuais decisões que fujam do interesse maior, fazem parte do conjunto de ações
que o Estado norte americano pode executar.
Gráfico 1:
Fonte: IMF Annual Reports (vários anos) e IMF (2011b, 2012a, 2012b), Apud Coelho (2012, p. 640).
Observando-se o ano de 1947, constata-se que, no contexto inicial em que o
banco foi fundado, foi notável a maior participação dos Estados Unidos, justificada
pela elaboração e defesa da proposta para a criação das instituições multilaterais no
33
acordo de Bretton Woods. Com maior participação nas instituições, os Estados
Unidos dão continuidade à manutenção de sua hegemonia. A segunda maior
participação no Banco Mundial foi do Reino Unido, justificada pela forte parceria com
os Estados Unidos e pelo interesse em se recuperar economicamente, tendo em
vista que a Segunda Guerra Mundial trouxera muitos prejuízos e acúmulos de
dívidas cada vez maiores. Embora a Inglaterra tenha elaborado um bom plano para
organizar as finanças mundiais, o mesmo não foi aceito e eles tiveram de aceitar a
proposta norte americana.
O gráfico 1 também evidencia a contínua queda da participação dos Estados
Unidos na instituição, a partir da década de 1960. Este fato pode ser justificado a
partir da entrada de novos países na instituição, bem como no aumento do capital
injetado pelos próprios. Sendo assim, não foi necessário manter uma participação
tão elevada para ter o poder de veto. No início da década de 1990, a participação
norte americana aumentou um pouco e se manteve relativamente constante até os
dias atuais. Entretanto, deve ser ressaltado que já no final da década de 1980, o
Banco já estava em sintonia com as propostas neoliberais, atuando com um caráter
predominante “comercial”. (Bresser-Pereira, 1995)
O fato dos Estados Unidos terem reduzido significativamente sua participação
na instituição não significa que houve um “esquecimento” operacional”, e sim uma
mudança de estratégia. Não é do interesse norte americano aplicar recursos em
larga escala em uma instituição que não representa em totalidade seus interesses.
Com o passar dos anos, o cenário econômico internacional passou por
diversas transformações. Para manter a hegemonia estabelecida no Pós Guerra, os
Estados Unidos passaram a acompanhar todos os acontecimentos ao redor do
globo. A permanência dessa “liderança” requer ações muitas vezes imediatas para
equalizar determinadas questões. O mesmo equivale para as instituições em seu
controle, que devem estar preparadas para atuar conforme o desenrolar das
questões envolvidas no cenário.
A tomada de decisão da instituição está vinculada, em primeira instancia, aos
interesses das nações credoras, em particular dos Estados Unidos. O Banco
Mundial foi uma peça chave para a manutenção da hegemonia norte-americana, por
isso, há uma estratégia em torno de cada decisão da instituição, que busca sempre
uma sintonia entre os interesses dos credores e suas atividades
desenvolvimentistas.
34
4.2 O DESENHO OPERACIONAL DO BANCO MUNDIAL
Para compreender a formação operacional do Banco Mundial no limiar do
novo milênio, é interessante observar o funcionamento da instituição, bem como seu
comportamento ante as novas configurações econômicas internacionais.
O Grupo Banco Mundial é composto pelo Banco Internacional para
Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), da Agência Internacional de
Desenvolvimento (AID), Sociedade Financeira Internacional (SFI), Centro
Internacional para a Resolução dos Investimentos (CIRDI) e Agência Multilateral de
Garantia dos Investimentos (AMGI). O Banco Mundial é a instituição “chefe” do
grupo e engloba o BIRD e a AID. Os demais são diferentes órgãos que auxiliam nos
processos referentes aos empréstimos e atividades correlacionadas. (Toussaint e
Millet, 2006)
Os recursos da instituição são captados no mercado financeiro através da
venda de títulos. Os países desenvolvidos são responsáveis por manter as reservas
a taxas rentáveis, para que as operações possam ser realizadas. Em resumo, o
Banco Mundial capta os recursos a uma pequena margem de juros e empresta aos
países a uma taxa também pequena num prazo estipulado entre 10 a 20 anos,
dependendo da quantia solicitada. O tomador do empréstimo deve utilizar o
montante restritamente para efetivar os projetos de desenvolvimento local.
(Toussaint e Millet, 2006)
A instituição é composta por 184 países membros. Cada país seleciona um
representante para direcionar seus interesses no banco. O conselho administrativo é
formado por 24 países. Seu principal objetivo é guiar as ações da instituição. O
poder de voto institucional é equivalente aos recursos direcionados pelos países,
conforme discutido no acordo de Bretton Woods. (Toussaint e Millet, 2006)
4.3 PROJETOS INICIAIS DO BANCO MUNDIAL
O objetivo inicial do BIRD era auxiliar a reconstrução dos países no pós
guerra e incentivar os países periféricos a alcançar o desenvolvimento através da
industrialização. No primeiro caso, a concessão dos recursos da instituição e o
capital do plano Marshall foram capazes de reconstruir os países devastados em
pouco tempo. No que tange ao segundo caso, o objetivo de iniciar o processo de
35
industrialização foi efetivado com relativo sucesso, porém sua grande meta de
alcançar um possível desenvolvimento não chegou nem perto de ser alcançada.
(Bresser-Pereira, 1995)
O Banco Mundial pretendeu promover o desenvolvimento através do
fortalecimento da infraestrutura local. O crédito disponibilizado pela instituição foi
destinado a obras específicas de cunho estrutural. Existia uma visão que insistia que
o caminho a ser trilhado pelos países periféricos deveria ser espelhado nos países
desenvolvidos. Essa não era uma regra geral, porém acreditava-se que o processo
de industrialização era a melhor alternativa de alcançar o desenvolvimento. O meio
industrial seria em tese capaz de promover o crescimento e o desenvolvimento de
uma economia, desde que fosse devidamente orientado e de acordo com a
capacidade da nação. O Banco Mundial apostou nessa visão e viabilizou muitos
projetos estruturais. Muitos deles deram certo, mas o real objetivo de promoção do
desenvolvimento não foi alcançado.
Inicialmente, a instituição priorizou recursos para transportes e energia, como
linhas de transmissão, centrais elétricas, fortalecimento de matriz energética, dentre
outros. Já em torno dos transportes, expansão de malha ferroviária, modernização
de rodovias, dentre outros. Os recursos também estavam disponíveis para a
construção e adequação da infraestrutura industrial. (BAUMANN, et al. 2004)
Inicialmente, as atividades do Banco Mundial eram restritas ao Estado.
Porém, era necessário envolver o setor privado nesse contexto, de modo que
houvesse uma maior participação dos agentes econômicos envolvidos no processo
de desenvolvimento. Para solucionar essa questão, foi fundada no ano de 1956 a
Internacional Finance Corporation (IFC). Esta instituição foi criada pelo Banco
Mundial para fornecer empréstimos e capital de risco ao setor privado. A IFC iniciou
suas atividades com um empréstimo à Siemens, uma empresa alemã. Este capital
foi destinado à filial brasileira para expandir a produção de equipamentos elétricos,
fundamentais para o crescimento industrial. Como o Banco Mundial não podia
emprestar dinheiro ao setor privado, a IFC preencheu essa lacuna, o que possibilitou
a união entre o Estado e o setor privado na busca de um ideal mútuo.
(INTERNATIONAL FINANCE CORPORATION. IFC History. Disponível em:
<http://ifcext.ifc.org/ifcext/masterinternet.nsf/AttachmentsByTitle/ifctFS.htm/$FILE/ifct
FS.htm> Acesso em: 20 abr. 2014)
36
4.4 O BANCO MUNDIAL: ATUAÇÃO DA DÉCADA DE 1960 AOS DIAS ATUAIS
A partir da década de 1960, a agricultura e a educação passaram a ser
priorizadas pelo Banco Mundial. O foco para o setor agrícola foi direcionado à
compra de máquinas pesadas, produção de fertilizantes e crédito para expansão da
produção e do escoamento. Já para os projetos educacionais, houve um
direcionamento voltado para a criação e reestruturação de escolas no meio urbano e
principalmente no meio rural, com a proposta de minimizar a evasão escolar infanto-
juvenil.
Na década de 1980 as transformações no cenário econômico internacional
se tornaram perceptíveis. Devido ao advento das propostas neoclássicas, as novas
configurações internacionais exigiram que o banco mudasse seu modus operandi.
Foi neste período que a instituição sentiu significativamente o desvio da sua
proposta inicial. Ao invés de promover grandes ferramentas para alcançar o
desenvolvimento, a instituição passou a atuar com um caráter comercial. Essa
modificação estrutural abalou a ideologia que cercava o banco, fortalecendo o
interesse “bancário” ao invés do desenvolvimentista. (Pereira-Bresser, 1995).
Em meados da década 1990, a instituição sinalizou para a adoção de um
novo projeto: a redução da pobreza extrema. O Banco Mundial sempre considerou a
pobreza extrema como um encalço na busca pelo desenvolvimento. Em seus
relatórios anuais, a instituição demonstrou interesse em trabalhar para a redução da
pobreza, porém o projeto não teve atenção elevada como nos dias atuais. Com o
passar do tempo, a necessidade de combater a pobreza foi ganhando força dentro
da instituição.
Pouco a pouco o combate à pobreza passou a ser tratado com um olhar
diferenciado pelos analistas do Banco Mundial. Essa nova visão desenvolvimentista
busca eliminar as desigualdades extremas que assolam o sistema econômico
internacional. Segundo a atual visão do Banco Mundial, o problema da pobreza
extrema deve ser equacionado, para que as pessoas possam ter uma renda
adequada às suas necessidades básicas.
A reconstrução continua a ser uma parte importante do nosso trabalho. No entanto, no atual Banco Mundial, a redução da pobreza através de uma globalização inclusiva e sustentável continua a ser o objetivo principal do nosso trabalho. (WORLD BANK GROUP, 2014.
37
Tradução própria).
O Banco Mundial passou a financiar projetos de saneamento básico,
distribuição de água, expansão da rede elétrica, desenvolvimento sustentável,
dentre outros. A tese é que a execução desses projetos reflete diretamente no
aumento da qualidade de vida e consequentemente traz novas oportunidades para a
população carente. A inserção destas pessoas no mundo globalizado é de vital
importância para o desenvolvimento econômico e social. De acordo com a
instituição, atualmente existem cerca de um bilhão de pessoas desamparadas, que
estão abaixo da linha de pobreza. A meta atual do Banco Mundial é erradicar a
pobreza extrema1 até o ano de 2030, além de promover a prosperidade
compartilhada2. (WORLD BANK GROUP, 2013, P.4)
O gráfico 2 ilustra bem o atual plano de ação do Banco Mundial. Como dito
anteriormente, embora a instituição esteja voltada para um novo projeto, ela ainda
está em sintonia com outras plataformas em busca do desenvolvimento contínuo.
Gráfico 2
Fonte: WORLD BANK GROUP, annual report, 2013
1 Reduzir o percentual de pessoas que vivem com menos de U$ 1,25 por dia para no máximo 3% e
2030. (World Bank. Annual Report, 2013) 2 Promover o bem-estar e o aumento da renda dos 40% da população que estão na faixa inferior de
todos os países em desenvolvimento. (World Bank. Annual Report, 2013, p.4).
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Os empréstimos voltados para o desenvolvimento rural e governança do setor
público demonstram o interesse do Banco Mundial em resgatar algumas
características dos planos anteriores. O Banco Mundial demonstrou interesse na
agricultura a partir da década de 1960. (BAUMANN, et al. 2004). Já os recursos
destinados à gestão de recursos ambientais e naturais, proteção social,
desenvolvimento social e desenvolvimento humano estão acoplados à nova ótica
desenvolvimentista estabelecida pelo Banco Mundial, que consiste no combate à
pobreza extrema.
4.5 A CRISE DE IDENTIDADE DO BANCO MUNDIAL
Devido às mudanças contínuas que aconteceram no cenário econômico
internacional, as instituições financeiras multilaterais (Banco Mundial e FMI) se viram
obrigadas a mudar em parte suas propostas. O Banco Mundial se tornou mais
maleável a essas transformações, buscando acompanhar o contexto econômico
atual e mantendo seu lugar no palco das relações internacionais. A modernização e
a inovação foram as ferramentas essenciais que impulsionaram as instituições. Mas
a questão principal gira em torno do propósito inicial da instituição: ele continua
sendo cumprido? O fato é que o Banco Mundial foi forçado a promover modificações
para continuar. Embora o FMI não tenha sofrido mudanças na mesma proporção,
também se viu obrigado a acompanhar tais modificações.
Ao longo das suas atividades, a atuação operacional do Banco Mundial foi
agrupada em três blocos: inicialmente, seus projetos foram destinados a obras de
infraestrutura e desenvolvimento de nações periféricas com base na TDE. Após a
crise da TDE, a instituição precisou atuar como um banco de caráter “comercial”
atendendo as necessidades impostas pelo mainstream neoliberal, diante das novas
dificuldades que o sistema capitalista enfrentou. Já em meados da década de 1990,
o Banco Mundial fortaleceu o interesse de combater à pobreza extrema, financiando
projetos nas áreas de agricultura, saneamento, distribuição de água e vários outros.
Essa é a lógica atual abordada pelo banco: o desenvolvimento local.
De acordo com os relatórios anuais, os investimentos para o desenvolvimento
local têm surtido efeito no combate à pobreza extrema. Os relatórios mostram que
houve uma melhora na qualidade de vida das pessoas. A visão atual do Banco
Mundial acredita que a erradicação da pobreza extrema cria oportunidades para a
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população local, além de promover um aumento significativo na renda da população.
(WORLD BANK GROUP, 2013)
Quando as dívidas externas passaram a ser negociadas, a instituição mudou
de foco gradualmente e passou a apoiar um novo ideal desenvolvimentista que está
acoplado à redução da pobreza extrema. O combate à pobreza é de suma
importância para alcançar o desenvolvimento. Porém, o que se discute é a mudança
de foco do Banco Mundial para alcançar este fim. A instituição sempre esteve
atrelada ao cenário econômico internacional vigente, o que a forçou a “dançar
conforme a música” sempre que necessário. De certa forma, o Banco Mundial não
tem autonomia para tomar decisões de grande porte. Enquanto a instituição
trabalhar com o capital das nações, suas atividades estarão sujeitas a aprovações
do conselho interno e modificações operacionais. No decorrer de suas atividades, o
banco foi perdendo seu caráter desenvolvimentista e de certa forma “esqueceu” seu
propósito inicial. Segundo Bresser-Pereira (1995, p.34),
Mais do que um banco de desenvolvimento propriamente dito, o Banco está se transformando em um banco comercial público e em uma instituição prestadora de serviços direcionados ao desenvolvimento econômico. Como tal, modestamente, uma utilização limitada do poder de impor condicionalidades e uma forte cooperação com governos competentes e cooperativos deverão ser a regra.
Nesse contexto surgem muitas dúvidas em torno da eficácia da instituição
bem como sua capacidade de atender seu real propósito. Caso a instituição deseje
cumprir seu objetivo inicial, deverá trilhar o caminho em busca da sua autonomia,
porém não é assim tão simples. Buscar soluções autônomas nesse contexto
delicado significa abrir mão de uma parcela significativa de recursos, o que sem
dúvida ocasionaria um grande abalo financeiro à instituição.
Os países credores vão exigir que a instituição esteja em sintonia com a
realidade econômica internacional. É o mínimo que se pode exigir de uma instituição
deste porte. Ao mesmo tempo em que o Banco Mundial modifica seu plano de ação
ele busca uma essência que possa unir o atual propósito ao processo
desenvolvimentista. Embora a instituição tenha apoiado vários setores como a
agricultura e indústria e tenha desempenhado papel fundamental para o crescimento
destes, o tão aclamado desenvolvimento ainda não foi alcançado. (Pereira-Bresser,
40
1995)
Mas será que nos dias atuais a instituição tem trilhado o caminho certo? Os
financiamentos do Banco Mundial estão voltados para projetos particulares, que
priorizam obras específicas, bem diferente da década de 1950, em que a instituição
promovia a expansão da infraestrutura para que o desenvolvimento pudesse
florescer. O fragmento a seguir explicita essa questão e instaura uma questão que
reflete o dilema que o Banco vem passando desde a crise da teoria do
desenvolvimento.
Será razoável que o Banco Mundial possa apoiar projetos de iniciativa privada de acesso à água e à eletricidade em pequena escala, em vez de promover a construção de redes públicas? Deve o Banco Mundial financiar os sistemas privados de saúde e educação? (Tavernier, 2001).
Por outro lado, as ações que a instituição tem executado são fundamentais
para sua permanência. Para se manter no cenário econômico internacional, o Banco
Mundial precisou aceitar e se adaptar às novas configurações à medida que novos
desafios surgiram. Embora a instituição tenha autonomia para ditar suas metas
operacionais, elas estão sob aprovação de um conselho, que é composto por
representantes das maiores nações credoras.
O papel desempenhado pelo Banco Mundial é de grande utilidade para as
nações periféricas pois segundo trabalhos recentes os resultados são positivos e
reveladores da queda no número de pessoas que vivem em situação de pobreza
extrema. (WORLD BANK GROUP, 2013)
Mesmo com bons resultados, a nova visão desenvolvimentista do Banco
Mundial ainda continua limitada. Apesar dos esforços em reduzir a pobreza extrema,
o desenvolvimento ainda continua tímido nas nações periféricas. Não seria mais
viável ao Banco Mundial auxiliar tais nações na busca pelo desenvolvimento e deixar
as outras questões para os Estados resolverem? Essa não é a lógica defendida pelo
Banco Mundial atualmente. Ao financiar os projetos localmente, o Banco Mundial
acaba restringindo o desenvolvimento ao determinado local. Como visto
anteriormente, o Banco Mundial resgatou algumas propostas de suas gestões
anteriores e aplica atualmente. Entretanto, essas propostas não receberam a
atenção necessária, diferente da gestão que atuou no auge da TDE. Um bom
exemplo é o investimento para o desenvolvimento da infraestrutura industrial, que foi
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o principal foco de atuação do Banco Mundial no início das suas atividades.
Atualmente a instituição disponibiliza uma parte do seu capital para esta atividade
entretanto, os investimentos não são tão significativos quanto no início da atuação
da instituição.
Certamente, o Banco Mundial terá uma difícil jornada pela frente. O novo
milênio somente começou e já trouxe consigo uma das maiores crises da história do
capitalismo. Nestes novos tempos, a instituição deverá encontrar uma resposta que
solucione seus dilemas e a guie para um caminho propriamente desenvolvimentista.
As nações periféricas precisam deste apoio para continuar a jornada em busca do
aclamado desenvolvimento.
42
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A trajetória do Banco Mundial foi marcada por erros e acertos. As novas
configurações internacionais forçaram a instituição a modificar sua
operacionalização conforme as necessidades do sistema capitalista. Este trabalho
teve por finalidade evidenciar os fatos e as configurações que alteraram o trajeto
desenvolvimentista do Banco Mundial.
Inicialmente o Banco Mundial, denominado BIRD, deu passos tímidos para
cumprir seus objetivos propostos. O primeiro objetivo a ser cumprido foi o auxílio aos
países europeus que foram devastados no decorrer da Segunda Guerra Mundial.
Este objetivo foi cumprido, mas o BIRD não atuou só. O governo dos Estados
Unidos elaborou o Plano Marshall que, dentre outras finalidades, conseguiu cumprir
o papel a ser desempenhado pelo BIRD. O segundo objetivo, caracterizado por
promover o desenvolvimento com base na industrialização foi iniciado, mas ficou
longe de ser concluído.
Em 1960, o BIRD se uniu a associação internacional de desenvolvimento
(AID). Nasce então o Banco Mundial. De início, a proposta do Banco Mundial era
expandir o crédito às nações periféricas para que as mesmas pudessem dar o ponta
pé inicial na busca pelo desenvolvimento. As nações foram contraindo empréstimos.
As ações iniciais da instituição foram guiadas pela Teoria do Desenvolvimento
Econômico (TDE). Tal teoria foi embasada na hipótese de que o desenvolvimento só
ocorreria a partir do apoio do Estado à indústria nascente. Sendo assim, era dever
do Estado criar um ambiente propício para o crescimento industrial. Seguindo esta
ideologia, o Banco Mundial passou a disponibilizar seu capital para operações de
crédito que contemplassem a criação e desenvolvimento de obras com caráter
infraestruturais.
Em meados da década de 1970, o consenso keynesiano passou a perder
força. Dentre as causas atribuídas estão o fraco crescimento da economia
internacional, além do aumento do endividamento das nações periféricas e outras
questões de ordem econômica. O modelo econômico que propôs a gestão da
economia através do Estado deu indícios de fraqueza e não deu respostas para
solucionar o crescente problema.
A queda da TDE e do consenso keynesiano abriram espaço para o
fortalecimento da crítica neoclássica, que passou a ganhar força já no final da
43
década de 1970. Esta abordagem veio a modificar ações econômicas de forma
circunstancial. Em se tratando do Banco Mundial, as mudanças foram drásticas. O
então banco de desenvolvimento passou a atuar com caráter regulatório,
fiscalizando as nações endividadas para que elas cumprissem com rigor o novo
regime fiscal estabelecido pelas nações credoras.
Na década de 1990, o Plano Brady conseguiu dar o primeiro passo para a
resolução do problema da crise da dívida. Eis então que o Banco Mundial
supostamente retoma sua proposta desenvolvimentista com um novo olhar sobre o
desenvolvimento.
Com base nas informações evidenciadas no trabalho, foi possível constatar
que o Banco Mundial seguiu as tendências econômicas internacionais e cumpriu
com o que lhe foi ordenado. As mudanças de conduta foram essenciais para que a
instituição se mantivesse no palco das relações internacionais. Não se sabe ao certo
as penalidades que a instituição poderia sofrer caso não aceitasse a adoção de tais
práticas, porém, é imaginável que a instituição pudesse ser substituída por outra que
estivesse disposta a atuar conforme os interesses dos credores.
Mesmo que a instituição quisesse manter seu caráter inicial ela enfrentaria
diversos problemas. A autonomia do Banco Mundial seria a resposta certa para
esses questionamentos, porém, ao considerar que a maior parte dos seus fundos
provém da participação das nações credoras, pode-se supor que este rompimento
ocasionaria numa perda significativa de recursos e resultaria na saída do Banco
Mundial do palco das relações internacionais.
O Banco Mundial sempre desempenhou um papel fundamental para a
manutenção do sistema capitalista, embora confuso e algumas vezes contraditório.
Atualmente, a instituição vem realizando um trabalho focado na redução da pobreza
extrema. Seu projeto é erradicar a pobreza extrema até o ano de 2030. Embora o
atual programa esteja dando certo, surgem novas críticas em torno da sua eficácia.
Talvez fosse mais coerente que o Banco Mundial criasse um ambiente propício para
que as nações pudessem se desenvolver de maneira apropriada e particular, sem
receitas genéricas. No modelo atual, a instituição financia projetos que tenham a
temática desenvolvimentista, porém, ainda não há o acompanhamento necessário
para que o desenvolvimento ocorra de forma espontânea.
Assim, constatou-se então que o Banco Mundial é uma instituição maleável
às transformações no sistema capitalista internacional. Este trabalho ilustrou que o
44
Banco Mundial teve posturas diferentes diante da queda da TDE e diante da
ascensão do mainstream neoclássico. Em seguida adotou um novo comportamento
quando suas atividades comerciais se esgotam. Não se pode prever ao certo qual
será o comportamento da instituição diante das novas mudanças nas configurações
internacionais, mas ao analisar a conduta do Banco Mundial diante das mudanças
mencionadas no trabalho, aufere-se que a instituição não medirá esforços para se
manter no cenário econômico internacional.
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REFERÊNCIAS
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para o Desenvolvimento. 2008.
BAUMANN, Renato, et al. Economia Internacional – Teoria e Experiência
Brasileira. Rio de Janeiro: Editora Campos, 2004
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do Estado. Novos Estudos CEBRAP 37, Novembro 1993: 37 - 57.
COELHO, Jaime Cesar. et al. As Transformações no Sistema Financeiro
Internacional. In: Capitulo 16 (211-249). Brasília: Ipea, 2012.
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SERRANO, Franklin. Relações de Poder e a Política Macroeconômica
Americana, de Bretton Woods ao Padrão Dólar Flexível. 2004.
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Norte Americana em relação a Europa (1944-1952). Nov.11
THE WORLD BANK. History. Disponível em:
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TOUSSAINT, E. & MILLET, D. 50 Perguntas e Respostas sobre a Dívida, FMI e
Banco Mundial. 2006.
WORLD BANK. Annual Report. 2013.