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ESPAÇO DE EXPERIÊNCIA E HORIZONTE DE EXPECTATIVA:
Antirrepublicanismo no jornal O BRAZIL (1895-1896) e concepção de tempo em
Koselleck
Sarah Alves1
Jaqueline Pereira de Morais2
RESUMO:
O presente trabalho, pretende apresentar um preciso diálogo acerca das categorias de
tempo de Koselleck, no fito de conduzir uma reflexão sobre o jornal O BRAZIL3, qual exerceu
papel fundamental nos protestos contra o novo regime de governo, intitulado como República
e, contracenado pelo desejo de retorno da monarquia. Sobre análise do periódico, é possível
perceber quanto o cenário pautado no desejo, pelos anseios e sonhos dos antirrepublicanos
idealizavam um horizonte de expectativas, cujo fim, o retorno do antigo regime para estes seria
um país melhor; ideal este que era calcado por um espaço de experiências, vivenciado pelo
regime monárquico. Assim, será dado atenção para uma discussão acerca da dissolução do
topos da história magistra, bem como, a chegada da modernidade estabelecida pela ideia de
progresso e a nova concepção de tempo histórico, caracterizado pelas categorias “Espaço de
experiência” e “horizonte de expectativa”. Para tal, será tomado como importantes para o
desenvolver do trabalho, autores como Reinhart Koselleck (2006), Krzystof Pomian (1990),
José d’Assunção Barros (2003), Ferreira Júnior, Costa entre outros.
PALAVRAS-CHAVE: Historia Magistra Vitae; “Espaço de experiência”; “Horizonte de
expectativas”; Regime monárquico; República.
ABSTRACT:
1 Mestranda do programa de pós-graduação em História da Universidade Federal de Goiás-UFG. 2 Aluna especial do programa de pós-graduação em História da Universidade Federal de Goiás-UFG. 33 Jornal Monarquista que tinha o ideal de retorno do Império, publicado nos anos de 1895 e 1896.
The present study aims to present a precise dialog about the categories of Koselleck, in
order to lead a discussion on the Brazil, which had a fundamental role in the protests against
the new regime of government, entitled How Czech and contracenado by a desire to return to
monarchy. On examination of the journal, it is possible to realize how much the scenario based
on desire, by desires and dreams of antirrepublicanos idealized a horizon of expectations, whose
end, the return of the old regime for these would be a better country; ideal that was depressed
by a space of experience, experienced by the monarchic regime. Thus, it will be given attention
to a discussion about the dissolution of the tops of history magistra, as well as, the arrival of
modernity established by the idea of progress and the new conception of historical time,
characterized by the categories "Area of expertise" and "horizon of expectation". To this end,
it will be taken as important for developing the work, authors like Reinhart Koselleck (2006),
krzystof pomian (1990), José de Assunção Barros (2003), Ferreira Júnior, among others.
KEYWORDS: History Magistra Vitae; “Area of experience”: “Horizon of expectations”;
Monarchic Regime; Republic.
Introdução:
Durante o nosso cotidiano, é possível que nos remetemos a pensar e dizer, que o tempo
é a chave para a superação de determinados acontecimentos em nossas vidas. Pode-se afirmar
que de uma forma, ou de outra, já nos deparamos com expressões do gênero: “tudo é questão
de tempo”; “o tempo cura tudo” ou “só o tempo vai dizer”. O sentido que toma tais expressões,
precede-se que a pessoa acredita que o tempo possa proporcionar mudanças em relação ao fato
que ocorreu e, que estas aconteçam de formas positivas. Ora, estas estão devidamente ligadas
ao senso comum, mas que no entanto nos direcionam para uma reflexão de caráter teórico e
filosófico. Visto que filósofos como Santo Agostinho4, Aristóteles5, ou até mesmo historiadores
4 Vide: AGOSTINHO, Santo. Livro XI: O homem e o tempo. In:__. Confissões. Tradução: J. Oliveira Santos e A.
Ambrósio de Pina, S. J. (Coleção Os Pensadores) 3ª ed. São Paulo: Abril Cultural, 1984. p. 207-231. Disponível
em:<http:// www.fafich.ufmg.br/dowlnloads/CONFISSÕES_Livro _XI_O_Homem_e_o_Tempo.pdf> 5ARISTÓTELES. El tempo. In: Física. Livro IV (10-14). Versão em espanhol. Disponível em:
<https://drive.google.com/file/d/0BxAbmxL88uaJV2LTVVVWnFSTTQ/edit>
como Krzystof Pomian já se dedicaram a desvendar o tempo. Para pegarmos uma definição de
tempo, apresentamos que para Krzystof Pomian6,
O objeto que designa a palavra tempo, uma coordenação de mudanças reais ou
representadas, realizada por uma instância coordenadora que emite signos ou sinais
pra esse fim. Não existe o tempo, tempo no singular. Existem múltiplos tempos. Uma
classe de natureza de várias instâncias.
Portanto, se partimos dessa definição de tempo em Pomian7, poderíamos estar
dialogando com as expressões mencionadas acima, posto que, esse tempo que emerge da
mudança, e constitui-se em mudanças, poder-se-á emitir respostas, sinais, há uma expressão
“só o tempo vai dizer”.
Uma célebre passagem, de uma, das letras musicais do cantor Cazuza pode ser
apresentada aqui; Cazuza ao compor a música O tempo não para, cuja gravação ocorreu no ano
de 1988, diz assim: “O tempo não para/ Eu vejo o futuro repetir o passado/ Eu vejo um museu
de grandes novidades/ O tempo não para.” O contexto qual data a gravação dessa música,
corresponde ao novo sistema de governo, a república, que se firmava 24 anos após a instauração
de um regime militar no Brasil. Em uma análise da estrofe destacada, atém-se para o que talvez
fosse a mensagem, qual o cantor quisesse transmitir. Ao dizer “eu vejo o futuro repetir o
passado”, o cantor faz referência de que o passado, que em outrora foi o seu presente (contexto
do golpe militar), e apresenta-se nesse futuro presentificado (1988), acenando que os fatos se
repetem, ou pelo medo de tornar a repetir. “Eu vejo um museu de grandes novidades”; o que
acontece não é literalmente novo, entende-se como uma crítica, uma mera, modificação do
velho.
Como se pode observar, as expressões que fazem referência ao tempo e ao passado,
estão presentes no cotidiano das pessoas, que usam destes numa espécie de orientação no
contexto em qual estão inseridos. Todavia, cabe aqui questionar, que tempo é este ao qual
buscamos apresentar neste trabalho; estamos a falar do tempo em si, ou de uma ideia de tempo?
Vejamos.
O TEMPO HISTÓRICO RELACIONADO AS CATEGORIAS ESPAÇO DE
EXPERIÊNCIA E HORIZONTES DE ESPECTATIVAS
6 POMIAN, K. El orden del tempo. Universidad, 1990.Madrid: Júcar, p.10-20. 7 POMIAN, K. El orden del tempo. Universidad,1990. Madrid: Júcar
Em resposta à pergunta mencionada acima, o presente trabalho fundamentar-se-á na
obra Futuro Passado: contribuição a semântica dos tempos históricos, do autor Reinhart
Koselleck no intento de trabalharmos tempo histórico, a partir das categorias, entendidas como
“espaço de experiência” e “horizonte de expectativas”. Para tomarmos emprestado uma
afirmação de Koselleck8,
O tempo aqui não é tomado como algo natural e evidente, mas como
construção cultural que em cada época, determina um modo específico de
relacionamento entre o já conhecido e experimentado como passado e as
possibilidades que se lançam ao futuro como horizonte de expectativas.
Ante a definição da concepção de tempo histórico em Koselleck9, destinará uma atenta
discussão da história magistra vitae. De acordo com Koselleck10, até meados do século XVIII,
as pessoas caracterizavam a história como uma forma de escola, do qual seus ensinamentos
permitiam que se aprendia alguma coisa para a vida, sem que cometesse grandes erros. Tal
modelo designava a história ao topos de história magistra vitae. Esta se dava, em decorrência
dos acontecimentos do passado, entendidos como exemplos, experiências a serem evitadas, ou
seguidas.
Conforme o autor, a expressão história magistra vitae, surge no século IV com Cícero
ao cunhar os modelos helenísticos de história. Ela oferecia um caráter de imortalidade para a
história, estabelecendo um sentido de instrução para a vida. Para este:
a história é a testemunha dos tempos, a luz da verdade, a vida da memória, a
mensageira da velhice, por cuja voz nada é recomendado senão a imortalidade do
orador. A tarefa principal que Cícero atribui aqui à historiografia é especialmente
dirigida a prática, sobre a qual o orador exerce sua influência. Ele se serve da história
como coleção de exemplos— plena exemplorum est historia [a história é cheia de
exemplos] a fim que seja possível instruir por meio dela.11
Tais medidas, deve- se ao fato, que as transformações ocorriam a passo lento,
permitindo assim que os exemplos do passado continuassem a ser proveitosos. Considerada
como uma coleção de exemplos que constituía-se sobre uma estrutura configurando passado,
8KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. 9 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. 10 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. 11 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. ( p.43.)
presente e futuro como uma continuidade. Nesse contexto, os eventos se repetiam, o que
permitia a possibilidade de aprender com estas ações.12
Entretanto, esse modelo que se tinha da história, começa a ser questionado sob o
advento de um tempo novo. E para caracterizar esse momento, Koselleck13 faz referência a
Tocqueville, utilizando uma frase que diz: “Desde que o passado deixou de lançar luz sobre o
futuro, o espírito humano erra nas trevas.” A demonstração de Tocqueville, diz respeito a
alteração que ocorria com a mesma, a certeza que se tinha antes, quando a relação entre o
passado e o futuro era desenhada pela experiência do passado, e não iria adiante disso, consentia
uma direção ao espírito.14 “A radicalidade do futuro, vivido no presente como aceleração,
separou as dimensões do tempo, anulando a utilidade da experiência passada. O passado deixou
de iluminar o futuro, [...] e o velho topos se dissolveu frente a um ‘tempo novo’”.15
Assim temos, uma mudança no vocabulário, qual promove uma alteração no sentido
do velho topos. E tal transmutação ocorre no espaço alemão, a “historie” que denota o relato,
a narrativa de algum acontecimento, e assinalando especificamente as ciências histórias, foi
modificada pelo termo “Geschichte”, que passou a carregar o acontecimento em si, ou uma
série de ações cometidas ou sofridas. Não obstante, aos atributos direcionados a esta, no período
em que se segue os acontecimentos da revolução francesa, o sentido íntegro da Geschicthe alude
a um coletivo singular.16 Conforme o autor,
O advento da idéia do coletivo singular, manifestação que reúne em si, ao
mesmo tempo caráter histórico e linguístico, deu-se em uma circunstância temporal
que pode ser entendida como a grande época das singularizações, das simplificações
que se voltavam social e politicamente contra a sociedade estamental: das liberdades
fez-se a Liberdade, das justiças fez-se a Justiça, dos progressos o Progresso, das
muitas revoluções “La Révolution”. No que se refere a França, pode-se acrescentar
que o lugar central que o pensamento ocidental atribuiu à Grande Revolução, em sua
singularidade, transferiu-se para a história, no âmbito da língua alemã.
Com a emersão de um tempo novo, agora na modernidade, afirma Koselleck que “o
progresso foi a primeira categoria na qual se deixa manifestar uma certa determinação do
12AZEVEDO, João de. DUARTE, Dias. Tempo e crise na teoria da modernidade de Reinhart Koselleck. In:
História da historiografia, 2012. P. 70-90. 13 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. (p. 47) 14 HARTOG, François. Tempo, História e a escrita da História: a ordem do tempo. Tradução: Francisco Murari
Pires. In: Revista de História, 2003. 15 AZEVEDO, João de. DUARTE, Dias. Tempo e crise na teoria da modernidade de Reinhart Koselleck. In:
História da historiografia, 2012. (p. 74). 16 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. (p. 47)
tempo, transcendente a natureza e imanente a história”.17 Conforme Koselleck, ao transpor a
para o progresso a história, levou o topos a perder o sentido.
Nos fatores que tange a dissolução da história magistra, instaura-se uma nova
concepção acerca da história e do tempo nesse horizonte de debate. Com os eventos não mais
se repetindo e, o passado não se constituindo como exemplo, o que de certo modo modificou a
olhar e a interpretação dos historiadores para o passado, conforme Koselleck, alterou- se
também o tempo da história.
Koselleck18, como um importante historiador também da história dos conceitos, não
deixa de mencionar a importância que estes exercem no trabalho do historiador, que quando
realiza a interpretação dos fatos, já se encontra diretamente ligados a eles. Para o autor, os
conceitos tradicionais da linguagem das fontes permite um trabalho heurístico, que confere
acessibilidade a realidade passada.
Nota-se então, que anterior ao século XVIII há a sucessão de governantes e dinastias,
que a partir da revolução francesa o tipo de governo e de mentalidade vai mudando, pois o que
passa a determinar é a categoria de progresso no sentido de que não se tem mais que olhar a
experiências do passado para não errar, pois agora o futuro e que importa. A partir desse novo
tempo Koselleck coloca que continuamos vivendo a ideia do presente contínuo, pois o passado
nem sempre é bom, ele tem que ser superado e não vivido novamente, é essa ideia de devir
histórico.
Após a revolução francesa a história passa a ser o sujeito, ela passa ser a história em
si, num sentido de coletivo singular nos quais vários fatos vão se concentrar num único
conhecimento que é a própria história num sentido de novo tempo. Assim como muda o
conceito de história, o objeto da história se transforma, surgindo assim o conceito de explicação
histórica, os fatos passam a ter um elo de ligamento no qual se utilizam de métodos. A história
nesse sentido caminha para algo que traz o progresso e o esclarecimento no qual os positivistas
entenderam como superação do metafísico para o científico. A filosofia da história passa a se
preocupar com os fatos isolados, busca a singularidade dos processos históricos no qual se pode
determinar um tempo histórico.
17 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.55). 18 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006.
Nessa ideia de progresso, a história singular perde a capacidade de ensinar, deixa de ser
o exemplo e passa a ser julgado em prol do progresso, tomamos como exemplo o tempo que se
destitui do tempo natural e passa a ser contado mecanicamente nesse sentido de progresso
tecnológico. Nesse sentido a função da história não deixa de olhar as experiências do passado,
o que ela faz agora e um questionamento. A função da história passa a ser daquela que tem o
papel de trazer uma explicação, uma lógica para os acontecimentos do passado, mostrando que
há uma constante ruptura que traz o progresso que leva a novas experiências que transmite
horizontes de expectativas que se identificam como futuro. Então é um passado superado em
favor do futuro.
Essa nova história busca a verdade, mas é uma verdade que pode ser errada por conta
de uma subjetividade ou um interesse. Ela busca novas fontes, segue métodos. E a partir desse
novo conceito de história, se tem a ideia de especialização de história, no qual o historiador
passa a buscar um lugar a partir dos métodos e de seu referencial. Surge o historicismo e a
história metódica, passa-se a ter a junção entre o relato dos fatos e do acontecimento, inter-
relação entre os espaços, institucionalização da história que recebe seu sentido fragmentado e
determinação de uma lógica de processos históricos.
Para tal, é tomado pelo autor duas categorias históricas, para denominar o que se busca
entender aqui por tempo histórico; são nomeadas como “espaço de experiência” e “horizonte
de expectativa”19; mais precisamente, entrelaçam as temporalidades passado, presente e futuro.
De acordo com Koselleck20, estas categorias são capazes de desvendar o tempo histórico, na
medida em que enriquecidas com seu conteúdo, conduzem as ações substanciais no movimento
social e político.21 Em exercício de tentar exemplificar, Koselleck22 diz:
A experiência da execução de Carlos I abriu, mais de um século depois, o
horizonte de expectativas de Turgot, quando ele insistiu com Luís XVI que realizasse
as reformas que o haveriam de preservar de um destino semelhante. O alerta de Turgot
ao seu rei não encontrou eco. Mas entre a revolução Inglesa passada e a Revolução
Francesa futura foi possível descobrir e experimentar uma relação temporal que ia
19 É importante salientar que essas categorias determinadas por ele, não passam de categorias formais: elas não
permitem deduzir aquilo de que se teve experiência e aquilo que se espera. A abordagem formal, que tenta
decodificar a história com essas expressões polarizadas, só pode pretender delinear e estabelecer as condições das
histórias possíveis, não as histórias mesmas. Trata-se de categorias do conhecimento capazes de fundamentar uma
possibilidade de história (2006, p.306). 20 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. 21 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. 22 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. (p.308-309).
além da mera cronologia. A história concreta amadurece em meio a determinadas
experiências e determinadas expectativas.
Para citarmos José d’Assunção Barros23, podemos dizer que a experiência, transpõe-
se para o presente por meio das lembranças preservadas na memória, das permanências,
vestígios, e através das fontes históricas, que são para os historiadores de um condicionante
indispensável. Trata-se, nas palavras de Koselleck,24 do:
[...] passado atual, aquele no qual acontecimentos foram incorporados e podem ser
lembrados. Na experiência se fundem tanto a elaboração racional quanto as formas
inconscientes de comportamento, que não estão mais, ou que não precisam mais estar
presentes no conhecimento. Além disso, a experiência de cada um, transmitida por
gerações e instituições, sempre está contida e é preservada uma experiência alheia.
Nesse sentido, também a história é desde sempre concebida como conhecimento de
experiências alheias.
Assim como a experiência, a expectativa se realiza no hoje, numa espécie de futuro
presentificado, tratando-se um não experimentado, não acontecido, são sempre uma esperança,
indicando sempre um presságio. “Esperança e medo, desejo e vontade, a inquietude, mas
também a análise racional, a visão receptiva ou a curiosidade fazem parte da expectativa e a
constituem.”25 Neste âmbito, passado e presente, apesar de terem uma profunda relação, estes
não se coincidem, ao passo que experiência são as ações passadas e horizonte, uma espécie de
antecipação da mesma.
Em síntese, “[...] é a tensão entre experiência e expectativa que, de uma forma sempre
diferente, suscita novas soluções, fazendo surgir o tempo histórico.”26 Essas categorias formais
para koselleck remete a algo concreto, pois por si só elas não dizem nada, só existe na
dependência de algo. Para o autor espaço de experiência e horizonte de expectativa como formal
não é histórica e sim meta histórica27, e ela só é forma quando existe as experiências de
acontecimentos de várias épocas e coisas.
Para entendemos melhor essas duas categorias que se remetem ao tempo histórico,
podemos observar que o que nós somos depende do que fomos tanto como indivíduos como
23BARROS, José de Assunção. Rupturas entre o presente e o passado: Leituras sobre as concepções de tempo de
Koselleck e Hannah Arendth. In: Revista Páginas de Filosofia, 2010, (p. 65-88). 24KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p. 309). 25KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.310). 26KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.313). 27 Meta histórica aqui está com o sentido de ir além da história, podendo assim utilizar de outras ciências para
manter suas explicações.
também como coletivo. Nesse aspecto podemos observar que as experiências rompem com o
buraco do presente, pois tudo o que fazemos no presente é decorrente de algo que planejamos
antes, com isso observa-se que somos seres de projetos. Sendo dessa forma pode-se dizer que
a capacidade de juntar e reestabelecer e conectar o respectivo e o retroativo demonstra que não
há ação histórica sem acumulo de experiência que nos leva a expectativa. Dessa forma essas
duas categorias fazem parte do que chamamos de processo histórico.28
Se o processo histórico é caracterizado por essa tensão de respectiva ou retrospectiva e
prospectiva, então essa ciência histórica que se instaurou reflexiva com o advento da
modernidade tem que levar essa situação elaborando categorias. Nesse aspecto não há então
experiência sem expectativa nem expectativa sem experiência. A indissocialibidade entre
retrospectiva e prospectiva, como coloca Agostinho: a perspectiva pode abranger o negativo, o
meio, o receio e o temor, mas também pode abranger a experiência e o passado vivido, o futuro
e o passado presentificado. Exposto isso observa-se que são duas categorias adequadas para
ocupar o tempo histórico e para também tentar descobrir este tempo, pois está presente no
processo histórico e no conhecimento deste processo.
A experiência e expectativa embora indissociáveis são diferentes: a ideia de horizonte é
que não alcança, quando alcança não é mais horizonte. A experiência é algo acumulado, ou seja
a cada momento que passa ela é maior. Pode mudar a forma como analisar mais nunca mudar
o que aconteceu. As expectativas pode mudar a qualquer momento, antes mesmo que aquele
futuro se chegue, porque não remete a algo realizado. Pode-se observar então, que a expectativa
pode se frustrar, pode se realizar, mas antes de ocorrer ela pode ser mudada29.
Nessa perspectiva das categorias formais de espaço de experiência e horizontes de
expectativa trazemos o Jornal O Brasil, que se demonstra um ótimo exemplo para explicitar tais
categorias denominadas por koselleck. Esse periódico vem abordar sobre um grupo da elite
carioca que no seu espaço de experiência vivenciou o tempo do Segundo Reinado, a transição
para República e estavam vivendo o presente republicano com o horizonte de expectativa
ligados ao anseio de retorno do Império.
28KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução: Wilma
Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.306) 29 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução:
Wilma Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.314)
Para usarmos o jornal como exemplo, iremos falar primeiramente sobre ele e em seguida
colocar sua posição para assim explicitar como ele adentra nessas categorias formais a partir do
explicitado por koselleck.
Nos anos iniciais do regime republicano não foi incomum observar várias ações
políticas comandadas por monarquistas desejosos pelo retorno do Império. O regime de
governo anterior, ainda estava na memória das pessoas no ano de 1895 e 1896 principalmente
porque a República não seguiu o modelo que eles pensavam ser o ideal. Aqui nota-se o espaço
de experiência desse grupo carioca. Por essa razão, buscaremos a partir do jornal O Brazil,
refletir sobre esse desejo de retorno por parte de um segmento intelectual da sociedade carioca
como a categoria meta histórica de espaço de experiência, e quais eram os horizontes de
expectativas que estas pessoas possuíam e como buscavam que essas expectativas deixasse de
existir, deixando de ser um horizonte.
Os colaboradores do periódico O Brazil buscaram mecanismos, a partir da memória vinculada
ao jornal, ou seja de suas experiências, para que se construíssem formas de legitimar o retorno do
Império. O debate historiográfico sobre a passagem do Império para a República coloca em evidência
um cenário político tenso no qual se instaura o governo republicano, mostrando, assim, que os ideais
monarquistas já não estavam fortes. O Jornal O Brazil apresenta-se em meio a essa conjuntura de tensões
e fragilidade da monarquia no Brasil. Por isso, buscaremos entender como essa fragilidade trazia
expectativa de mudanças.
No período de sua circulação (1895-1896), foram publicados 57 números o ideal
colocado pelos colaboradores: de legitimar o retorno do Império, tanto no Rio de Janeiro que
era cidade de sua publicação quanto em todo Brasil. Ao pesquisar sobre o periódico O Brazil
notamos que ele foi o primeiro jornal a se declarar contra o estado republicano após o início da
repressão à imprensa monarquista. Segundo seus escritores e proprietários, O Brazil era uma
folha propagandista dos princípios monarquistas e da liberdade do povo brasileiro, que reunia
pessoas que estavam insatisfeitas com o novo regime, essa represália se dava a partir do que
vivenciaram no império e a partir daí buscavam o retorno do regime monárquico a partir de
suas expectativas para um futuro próximo.
O jornal transmite a ideia de que a monarquia, mesmo com a República estabelecida
como novo regime, não se apagou da consciência nacional. Pois, para os ditos monarquistas, a
monarquia era uma instituição que foi por dezenas de anos a condição da felicidade e da
prosperidade, como já está indicado pelo proprietário M. S. Ramos no Expediente e no editorial
cujo título é “O BRAZIL” - ambos publicados em seu primeiro número.
Explicitado na primeira edição do jornal, eles procuravam implantar no seio da cidade,
por meio de suas publicações, o antigo regime, Argumentando que a república era um regime
tirano. A proposta apresentada pelo jornal era de escrever contra a república, considerada como
“anárquica” e “deplorável”. Ao mesmo tempo, escreviam para exaltar os feitos do Império.
Nesse aspectos as expectativas era para a volta do que era antes, ou seja eles queria que
tivesse o retorno de um regime governamental que um dia foi, visto que o antes era melhor.
Eles queriam a volta da monarquia não como uma repetição, mas como uma forma que foi
melhor, porém com as mudanças necessária para se ter uma nação melhor. Essa era a
expectativa. Os redatores do jornal diziam acreditar na superioridade e excelência da
constituição monárquica, pois, para esse grupo, a partir de suas experiências esse regime era
verdadeiro e legítimo. Vejamos um trecho de um artigo publicado no periódico:
[...]A República na decadência em que se acha, tem forçosamente que cair, é
a única e mais provável e certa consolidação, é ministrasse-lhe o ultimo vomitório de
tática política, quanto antes.
Mas onde essa tática?
Quem há de aplicar-lhe esse remédio?
Uma verdade: ninguém infelizmente ninguém! ...
O único recurso, o mais prático, o mais natural, é restaurar a monarquia. E a
culpa disso tem alguns supostos republicanos, que acompanharam, garbosos, o ato
verdadeiramente carnavalesco do celebérrimo 15 de novembro de 1889, ajudando a
edificar o fantástico templo, que hoje dizem ser o da liberdade, sobre um abismo que
desconheciam ou ignoravam [...]30
O periódico foi criado com intuitos diferentes dos outros jornais monarquistas em
decorrência de aceitar opiniões e ideias diferentes daquelas que professavam. Por ser um jornal
pequeno, diziam que “não podiam surgir como violento e bombástico e nem adaptado num
estilo vermelho e vulcânico, pois é o primeiro jornal que, depois dos acontecimentos de 15 de
novembro de 1889, apareceu com o subtítulo de órgão monarquista” (O BRAZIL, 1895, p. 1).
Acreditavam ser necessário manter a paz e manter sempre a reflexão. Nesse sentido, diziam
que: “Seremos inofensivos a princípio, como dizem, mas também às vezes é pequenina a massa
de gelo que se desprende do cume dos altos montes, e que, se transformando em formidável
avalanche tola, até o fundo dos vales, derruba e destrói na sua passagem tudo que encontra”
(OS PERIÓDICOS, nº2, p.1, 1895).
30 JUNIOR, Garcia. Pela Monárquia. Jornal O Brazil, 15 de abr. 1896. p. 2
Diante do exposto, percebe-se que os colaboradores, queriam se instaurar de forma
pacífica, porém, queriam ter alguma representatividade na sociedade, de modo que a população
leitora pudesse reconhecer que eles disseminavam apenas ideais bons para o Brasil. Aqui
podemos observar o horizonte de expectativas explicitado por koselleck. Nessa questão se
fossem reconhecidos como legítimos, seus ideais além de serem fortes, poderiam se tornar
ameaçadores a posteriori, o que não era possível naquele momento, devidamente por conta de
sofrerem com atitudes repressivas do estado republicano contra a Imprensa.
Explicitado de que se tratava esse jornal intitulado pelos próprios proprietários como
órgão monarquista, vamos abordar algumas referências aos espaços de experiências
vivenciados pelos colaboradores. No trecho apresentado a seguir nota-se a apologia ao regime
monárquico através da memória e experiências vividas pelos colaboradores do periódico em
detrimento da República. A construção do discurso de apologia se dá no antagonismo entre
Monarquia marcadamente um regime estável e a República que por sua vez representava a
instabilidade e a insegurança, ficando evidenciado o ressentimento destes para com o regime
republicano instaurado.
Hoje a observação, a experiência, a confrontação crítica, patenteia de maneira irrecusável o seguinte: a monarquia era a paz, a tolerância, a concórdia; a república é o ódio, o fanatismo a guerra civil; a monarquia era a liberdade dos costumes, a liberdade amplíssima; a república o despotismo cruel, e a revivência dos martírios inquisitoriais; a monarquia era a segurança dos cidadãos, o acatamento de seus direitos e prerrogativas; a república é o perigo constante, a ameaça iminente; a monarquia era a dignidade e a consideração do exterior; a república é o desconserto perante o mundo, o menor preço, por parte do estrangeiro, da soberania territorial; a monarquia era o crédito, a regular administração financeira a (...) nas contribuições, as facilidades no meio de existência; a república é o descalabro, a desorganização dos
serviços, a agravação dos impostos, a carestia, a barrocada; a monarquia era a noção
de nacionalidade homogênea, e coesiva; a república e a dispersão do ideal coletivo,
avassalados pelos interesses particulares, a desagregação, o perecimento da pátria
grande e comum31.
Garcia Junior outro articulista que colaborava com o jornal escreveu contra a república
no jornal O Brazil, na publicação de 15 de Abril de 1896, dizendo que:
Nascemos uns, reaparecemos outros porque assim o exigia urgentemente e nosso direito de brasileiros e o nosso dever de patriotas, visto que nossa pátria se acha ameaçada de um tremendo flagelo, catástrofe que será inevitável continuando ela com o governo atual. A sua desmoralização é completa e notória. O cinismo
31 CELSO. Afonso. Depoís de 15 de Novembro. Jornal O Brazil, 15 de nov. 1895. p. 1.
desses especuladores, desses argentários, desses mercadores degenerados da sua própria Pátria tocou a meta.32
Nesse trecho do editorial “Pela Monarquia”, o autor transmitiu a insatisfação com o
governo. Para tal, buscou formas de desmoralizar o regime republicano através de seus
escritos. Para ele, enquanto república, o Brasil apenas se degradava. A questão da memória e
da experiência está presente quando ele cita que “nascemos uns, reaparecemos outros”, ou seja,
Junior em questão nasce no período monárquico e já na república se vê envolto em um regime
que levará, a partir de seus horizontes de expectativas não boas, inevitavelmente sua nação a
catástrofe. Suas argumentações evidenciam a construção da memória monárquica e exaltação
desta em face ao regime republicano instaurado. Nesse aspecto entra outras expectativas ligadas
ao governo que deveria permanecer. Vejamos:
Parece que o próprio pensamento se perde em turbilhões indefiníveis de
iniciadas premissas e várias conclusões, o recordar, com saudade, o que fomos, e o coração oprimido por uma mágoa profunda não pode exprimir o que sente, quando lembramos de que fomos um povo heróico, cheios de glórias e de soberania, um povo
que parecia caminhar para um futuro grandioso e próspero, em que a felicidade o bem
estar de par com o respeito e a sinceridade se expressavam francamente em todos os
corações, nada havia a recear, todos congregavam num só todo em um único
pensamento – o de cada um bem servir a sua pátria33.
Nesse trecho fica claro que o espaço de experiência do colaborador em questão está
presente nos discursos do jornal apresentando o Império de forma saudosista, a expectativa
demonstrada aqui se refere a volta de um antigo regime de governo. Porém, sabe-se que a
mudança de regime se deu a partir do “desprestígio que recaía sobre a monarquia, em virtudes
das críticas que os próprios monarquistas lhe dirigiam” (COSTA, 1987, p. 322).
Enfatiza-se, então, que a construção positiva da monarquia, mais uma vez, apresenta-
se como uma maneira de fazer a população idealizar uma expectativa e, sobretudo, a partir de
seus desejos de lutar para o retorno do Império, é a ideia de que o antes era melhor, e o agora
pode melhorar.
Segundo Koselleck (2006) “todas as histórias foram constituídas pelas experiências
vividas e pelas expectativas das pessoas que atuam ou sofrem”34, nesse aspecto nota-se que o
Jornal O Brazil tal qual fora apresentado está inserido dentro dessa lógica, pois como afirma o
32 JUNIOR, Garcia. Pela Monárquia. Jornal O Brazil, 15 de abr. 1896. p. 2 33 EDITORES. A Coroa Impérial. Jornal O Brazil, 31 de dez. 1895. p. 2 34 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução:
Wilma Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.306.)
autor: “a expectativa abarca mais a esperança”35, nessa perspectiva o jornal tinha a esperança
do governo voltar a ser imperial, mas vai para além disso, pois eles acreditavam que isso poderia
realmente ocorrer. O autor no mesmo trecho ainda diz que “a experiência é mais profunda do
que a recordação”36. Nesse âmbito o jornal O Brazil não só traz à tona suas memórias como as
usam para assim legitimar a República como o pior para a nação e o Império como a solução
para os problemas do pais.
Koselleck coloca o horizonte como “aquela linha por trás da qual se abre o futuro”37
pois sem as expectativas desse futuro muitas vezes o presente não faz sentido. Sem a esperança
de que o regime imperial pudesse voltar como forma de governo, não fazia sentido a existência
do jornal opositor ao regime. O autor também explicita que “apesar de seus prognósticos serem
possíveis, eles se depara com um limite absoluto, que ela não pode ser experimentada. Aqui
podemos dizer que se caso o Brasil voltasse ao regime anterior como eles estavam querendo, o
horizontes de expectativa deixaria de existir, podendo assim criar-se outras esperanças.
O autor afirma que “O que se espera para o futuro está claramente limitada de uma
forma diferente do que foi experimentado no passado”38. Os colaboradores do jornal queriam o
retorno do império, isso é fato, porém eles queriam o que tinha de positivo, mesmo porque
exploravam as questões ruins dá republica para poder desqualificá-la, como está explicito a
seguir:
Eis a República. A pátria periga; e nós já chegamos um pouco atrasados,
ao campo de ação. Fizemos mal em esperar tanto; esperamos por demais pela aurora
da felicidade nacional, que os republicanos prolavam bestialmente. Vêem, pois esses
perversos contendores que fomos legais, sinceros porque ainda os esperamos por
espaço de seis anos. Agora – ao campo, á luta pela pátria. Agora que têm já gozado,
satisfeito as suas ambições argentárias o perpetrado legalmente toda a sorte de
abominações em nome da pátria e da lei, têm também o dever de nos ouvir. E hão de deixar que estigmatizemos a república com os seus
próprios feitos porque essa marca demonstrará aos nossos filhos o crime que ela
carrega e relembra-lhes a vaidade tola de uns loucos que queriam realizar o que
haviam sonhado(...)39
35 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução:
Wilma Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.318). 36 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução:
Wilma Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.308). 37KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução:
Wilma Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.311). 38 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução:
Wilma Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.311). 39 JUNIOR, Garcia. Pela Monárquia. Jornal O Brazil, 15 de abr. 1896. p. 2
As questões que não satisfaziam o que era tido como um governo ideal, isso podia
ficar no passado, pois o que se esperava do futuro era apenas um país melhor.
Segundo koselleck “ das experiências se pode esperar hoje que elas se repitam e sejam
confirmadas no futuro” 311. O periódico O Brazil queria tomar como exemplo o que vivera no
passado para legitimar um possível futuro, mas como afirma koselleck uma expectativa não
pode ser experimentada de tal forma, visto que essa pode não se realizar. É o caso dos anseios
do jornal que não se realizou, mas mostrou para a posteriore que a República não foi aceita por
todos os cidadãos brasileiros, e que muitos tinha o desejo de retorno desse regime.
Apesar de espaço de experiência e horizonte de expectativas serem duas categorias
formais, nota-se que elas constitui uma diferença temporal no hoje, na medida em que
entrelaçam passado e futuro de maneira desigual. O que se vivenciou não pode voltar a ser
como antes, pode acontecer de formas aproximadas, porem nunca igual. O retorno do império
poderia até ocorrer, mas não seria com antes, mesmo porque não estava vivo o antigo Imperador
no ano de 1896.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma, percebemos no livro Futuro Passado, com a modernidade entra a questão de
que para o futuro se espera algo melhor. Segundo koselleck “só se pode conceber a modernidade
como um tempo novo a partir do momento que as expectativas aumenta progressivamente”40.
A partir do periódico observa-se que o anseio pelo retorno somente aumentava a expectativa de
que um dia o país seria melhor. Esse retorno ao antigo regime não ocorreu, mas a expectativas
ligadas as experiências vividas nos tempos de primeira República continuou até a última
publicação que tivemos acesso, como podemos ver a seguir:
“Se todos os brasileiros soubesse conhecer os seus direitos e o sustentassem
com essa energia de caráter coeso e justiceiro, nunca teríamos chegado ao lastimável
estado em que nós achamos entregues. Nota-se porém que a energia não deve passar
ao despotismo, bem como a obediência de um vassalo ao seu rei não deve (...) dar-se
para servilismo.41”
Diante dos esboços apresentados, percebemos as mudanças ocorridas em torno das
formas de se pensar o tempo histórico e, de quais formas a história foi se enquadrando nele,
40KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução:
Wilma Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006 (p.314). 41 JUNIOR, Garcia. Pela Monárquia. Jornal O Brazil, 15 de abr. 1896. p. 3
sobretudo pelas formas como passou a olhar o passado, fator este que exerceu papel crucial
para uma nova reinterpretação da história, ocasionando na destituição do topos da história
magistra vitae. Esta que embora, não fora extinguida no todo, contudo foi questionada pelos
que se serviam dela como exemplos, como máxima, como a mestra da vida.
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