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FACULDADE CATHEDRAL
iBras – INSTITUTO BRASIL DE PÓS-GRADUAÇÃO, CAPACITAÇÃO E ASSESSORIA
CRISTIANE BARROS DOS SANTOS
O USO DE PROBIÓTICOS NAS DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS
MACEIÓ-AL
2019
FACULDADE CATHEDRAL
iBras – INSTITUTO BRASIL DE PÓS-GRADUAÇÃO, CAPACITAÇÃO E ASSESSORIA
CRISTIANE BARROS DOS SANTOS
O USO DE PROBIÓTICOS NAS DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS
Artigo apresentado como requisito parcial para a
conclusão do Curso de Pós-graduação em
FARMACOLOGIA CLÍNICA E FARMÁCIA CLÍNICA
COM ÊNFASE EM PRESCRIÇÃO
FARMACÊUTICA da Faculdade Cathedral/I-Bras.
Orientador: Me. Fernando Gassmann Figueiredo.
MACEIÓ-AL
2019
O USO DE PROBIÓTICOS NAS DOENÇAS INFLAMATÓRIAS
INTESTINAIS
CRISTIANE BARROS DOS SANTOS1
FERNANDO FIGUEIREDO2
Resumo: As Doenças Inflamatórias Intestinais (DII) são um grupo de doenças crônicas, de etiologia desconhecida, que possuem duas formas principais de apresentação: a Doença de Crohn (DC) e a Colite Ulcerativa (UC). As causas da doença de Crohn e da Colite Ulcerativa ainda são indeterminadas, as doenças apresentam aspectos epidemiológicos, genéticos, imunológicos, clínicos e terapêuticos comuns. Estudos epidemiológicos relatam que a incidência das doenças inflamatórias intestinais, tem afetado mais pessoas jovens na faixa etária entre 10 e 40 anos e uma possível associação a um grupo de étnicos específicos. Nos últimos anos, com o avanço tecnológico, o diagnóstico tem sido facilitado.A microbiota intestinal humana tem papel importante na saúde. Através de uma revisão bibliográfica no presente estudo, foi diagnosticado que em alguns momentos este equilíbrio não é alcançado e por esta razão a suplementação da dieta com probióticos se faz necessária, para assegurar uma microbiota favorável. Atualmente, com a introdução dos probióticos como terapêutica, a utilização desses micro-organismos benéficos à saúde tem-se mostrado bastante eficaz no prolongamento do tempo de remissão das DII, permitindo uma melhora significativa na qualidade de vida dos doentes. O trabalho exposto descreve alguns conceitos e os benefícios que estas substâncias conferem à saúde humana, em especial na recuperação da microbiota intestinal. Palavras-Chave: Doenças inflamatórias intestinais, probióticos, microbiota intestinal. Abstract: Inflammatory Bowel Diseases (IBD) are a group of chronic diseases of unknown etiology that have two main forms of presentation: Crohn's Disease (CD) and Ulcerative Colitis (UC). The causes of Crohn's disease and Ulcerative Colitis are still indeterminate,the deseases presents common epidemiological, genetic, immunological, clinical and therapeutic aspects. Epidemiological studies report that the incidence of inflammatory bowel diseases has affected more young people in the age group between 10 and 40 years and a possible association with a specific ethnic group. In the last years, with the technological advance, the diagnosis has been facilitated. The human intestinal microbiota plays an important role in health. Through a bibliographic review in the present study, it was diagnosed that in some moments this balance is not reached and for this reason the dietary supplementation with probiotics is necessary, to ensure a favorable microbiota. Currently, with the introduction of probiotics as a therapy, the use of these beneficial microorganisms has been shown to be quite effective in prolonging the remission time of IBD, allowing a significant improvement in patients' quality of life. The work described describes some concepts and the benefits that these substances confer on human health, especially in the recovery of intestinal microbiota. Keywords: Inflammatory bowel diseases, probiotic, intestinal microbiota.
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1 INTRODUÇÃO
O aumento da incidência das principais doenças inflamatórias intestinais,
Doença de Crohn e Colite Ulcerativa, tem sido cada dia mais relevante, representam
um grande problema de saúde pública, onde sua evolução crônica e redicivante
alteram o estilo de vida de seus portadores. A causa dessas doenças ainda é
desconhecida, compreende-se um conjunto de condições inflamatórias distintas que
afetam o trato gastrintestinal, no qual o tratamento utilizado é inespecífico e ineficaz
porque não evita as crises recidivas nem a cura da doença. Alguns pesquisadores
relatam em seus estudos a importância de se propor novos meios terapêuticos
envolvendo DIIs (CAMBUI; NATALI; 2015).
Apesar da etiologia desconhecida, a presença de fatores genéticos e
ambientais, como a modificação das bactérias luminais e ou aumento da
permeabilidade intestinal, desempenham um importante papel na má regulação da
imunidade intestinal, o que resulta na lesão gastrointestinal (BERNSTEIN et al. 2009).
A Doença de Crohn (CD), pode atingir qualquer parte do trato gastrointestinal,
mas comum na região do íleo terminal e do colo. Apresenta-se manifestações clínicas
variadas como diarréias, febre, dores fortes abdominais, perda de peso e o surgimento
de complicações sistêmicas. Já na Colite Ulcerativa (UC), ocorrre uma inflamação
idiopática que envolve a mucosa do cólon e do reto, com prevalência de 40 a 50% dos
pacientes limitada ao retossigmóide, sendo possível sua extensão em todo o cólon.
Os principais sintomas são: diarréia sanguinolenta, tenesmo, eliminação de muco e
cólicas abdominais intensas (CAMBUI; NATALI; 2015 ; BIONDO-SIMÕES et al. 2003).
Atualmente, os probióticos podem desempenhar um papel importante nas
doenças inflamatórias intestinais. Eles são um grupo de microrganismos que possuem
a habilidade de conferirem benefício à saúde do hospedeiro, quando administrados
em quantidades adequadas. No momento os mais utilizados são dos gêneros
Lactobacillus, Enterococcus e Bifidobacterium (TEIXEIRA; 2014).
Através de estudos recentes que implicam uma ruptura no equilíbrio do
microbioma gastrointestinal e na imunidade intestinal, como potencial gatilho para a
doença inflamatória intestinal (DII), o interesse em usar probióticos tem aumentado,
6
como adjuvante à terapia padrão anti-inflamatória e imunossupressora (HUNGIN et
al. 2013).
2 OBJETIVOS
2.1 OBJETIVO GERAL
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Analisar, através de uma revisão bibliográfica, os benefícios do uso de
probióticos nas doenças inflamatórias intestinais.
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Descrever as principais doenças inflamatórias intestinais: Doença de Crohn e
Colite Ulcerativa.
Demonstrar os benefícios dos probióticos, junto à terapia medicamentosa
utilizada no tratamento das doenças inflamatórias intestinais.
Verificar se a utilização de probióticos pode ser capaz de reduzir o uso de
drogas anti-inflamatórias no tratamento das doenças inflamatórias intestinais.
3 METODOLOGIA
Neste estudo, foi realizado uma revisão bibliográfica baseado na literatura a fim
de analisar artigos sobre as doenças inflamatórias intestinais e o uso de probióticos
como forma de tratamento,indexada nos bancos de dados PUBMED (United
8
StatesNational Library of Medicine National Institutesof Health), SciELO (Scientific
Eletronic Library Online) e Google acadêmico, utilizando os descritores: Probióticos,
Doenças inflamatórias intestinais, Colite Ulcerativa, Doença de Crohn;
4. REVISÃO DE LITERATURA
4.1 DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS
9
Embora o tubo digestivo inteiro seja amplamente colonizado por bactérias,
existe entre seus diversos segmentos uma grande variedade na concentração
destas.No adulto, o número de bactérias da microbiota intestinal é 10 vezes maior que
o número de células que formam os nossos órgãos e tecidos, isto é, 1014 bactérias
para 1013células humanas. A localização de predominância da microbiota também
varia. A Escherichia coli, por exemplo, predomina no íleo distal e, no cólon, predomina
a microbiota anaeróbia, com 17 espécies do gênero Bacteroides e Bifidobacterium
sendo encontradas com mais freqüência (SANTOS, 2012).
Apenas uma única camada de células epiteliais separa todo este extenso
volume de bactérias do maior aparato imunológico do nosso corpo, formado por uma
grande massa de tecido linfático genericamente descrita como GALT (gut associated
lymphoid tissue), a qual inclui as placas de Peyer, folículos linfóides isolados e
linfonodos mesentéricos.Sendo assim, nota-se que a coexistência entre estes dois
ambientes de natureza tão distintas, seja capaz de preservar na maioria das pessoas
um equilíbrio no qual este extenso sistema imunológico possa tolerar a presença do
grande volume de bactérias comensais, representando um importante elemento na
fisiologia intestinal (PINHO, 2008).
A doença inflamatória intestinal idiopática (DII), representada pela doença de
Crohn e pela retocolite ulcerativa, é um conjunto de condições inflamatórias crônicas,
resultantes de ativação persistente e inadequada do sistema imune mucoso. Esse
desequilíbrio imunológico manifesta-se através de uma elevação local de diversas
citocinas, como TNFalfa, interferon-gama, IL-12, IL-13 e IL-171(TORRES et al. 2011).
. De acordo com as alterações histopatológicas, existem diferenças significativas
entre a colite ulcerativa e a doença de Crohn. A UC é uma reação inflamatória difusa,
que se caracteriza pela presença de abscessos nas criptas intestinais e infiltrado de
neutrófilos, plasmócitos e eosinófilos na lâmina própria, que acomete as regiões
mucosa e submucosa do colón e reto. Por outro lado, a CD é uma inflamação crônica
transmural, em todo o segmento intestinal, que se caracteriza por apresentar regiões
afetadas entremeadas por zonas saudáveis. Acomete, com maior incidência a região
do íleo terminal e o cólon (OLIVEIRA; EMERICK; SOARES; 2010).
O aumento das citocinas inflamatórias também está associado com as
manifestações clínicas extraintestinais conhecidas como MEI, tais como artralgia,
10
trombose venosa profunda, conjuntivite, glaucoma, colelitíase, esteatose hepática,
colangite esclerosante e nefrolitíase sendo a de maior incidência as reumatológicas,
com prevalência de 71,4% mais freqüentes em pacientes portadores de RCUI
(TORRES et al. 2011).
Estudos epidemiológicos relatam que a incidência das doenças inflamatórias
intestinais, tem afetado mais pessoas jovens na faixa etária entre 10 e 40 anos e uma
possível associação a um grupo de étnicos específicos. São mais comuns no norte da
Europa e nos Estados Unidos, onde são diagnosticados cerca de 5.000 a 10.000
novos casos por ano. Possui um aumento significante em países da America Latina e
na America do Sul a incidência ainda é baixa, porém alguns casos têm sido relatados
em forte crescimento na região Sudeste do Brasil (OLIVEIRA; EMERICK; SOARES;
2010).
A DII é uma doença crônica intermitente. Durante as recidivas a severidade dos
sintomas varia de leve a severa, e durante as remissões muitos deles podem
desaparecer ou diminuir. Em geral, os sintomas dependem do segmento do trato
intestinal envolvido. Os sintomas gerais associados com a UC e CD em alguns casos
são febre,perda de apetite,perda de peso, fadiga, suores noturnos, retardo de
crescimento e amenorréia primária (BERNSTEIN et al. 2009).
Após avaliação clínica detalhada sobre os casos suspeitos das DII, é
necessária a realização de exames para o completo diagnóstico. Entre os quais
incluem-se os exames radiológicos, sorológicos e os endoscópicos. A colonoscopia
com exame do íleo terminal continua sendo a principal ferramenta para o diagnóstico
das DII, devendo ser considerada para todos os pacientes com suspeita clínica,
exceto nos casos de doença muito grave com risco de megacólon tóxico. Destaca-se
o método endoscópico não apenas para fins diagnósticos, como também para
acompanhamento terapêutico, com o objetivo de identificar a gravidade da doença e
a extensão do acometimento, interferir no ajuste da dosagem ou até mesmo o
encaminhamento em caso cirúrgico (CURY,MOSS, 2011).
As terapias farmacológicas disponíveis para o tratamento das doenças
inflamatórias intestinais, doença de Crohn (CD) e colite ulcerativa (UC) promovem
redução do processo inflamatório, mas não a cura da doença. Entre as mais
conhecidas estão a sulfassalazina, o ácido 5-aminosalicílico (5-ASA), os
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corticosteróides e os agentes imunossupressores e imunorreguladores (azatioprina,
mercaptopurina, methotrexate e ciclosporina). Uma nova opção terapêutica aprovada
pelos órgãos competentes são os anticorpos monoclomais, como o Infliximab, em que,
segundo estudo foi capaz de apresentar melhora clínica em 81% dos pacientes que
já estavam sob tratamento convencional e reduzir a remissão das DIIs em cerca de
30% dos mesmos (BIONDO-SIMÕES et al. 2003).
A escolha da terapia também deve ser baseada na freqüência de
recidiva da doença, na extensão, gravidade, e na presença de manifestações extra-
intestinais, que indicam sérias complicações das DII. Os pacientes com DII
apresentam menor quantidade de bactérias colônicas benéficas (lactobacilii e
bifidobacteria) e maior de bactérias nocivas (E coli) ou potencialmente danosas
(bacteróides), o aumento da carga microbiana está positivamente relacionado com o
aumento da gravidade da doença (CAMPOS et. al. 2014; FLORA, DICHI, 2006).
Atualmente terapias alternativas têm sido necessárias na restauração do
equilíbrio da microbiota intestinal, como o uso de probióticos. Atuam por diversos
mecanismos como: acidificando o lúmen intestinal, secretando substâncias que
inibem o crescimento de microrganismos patógenos, ou unindo-se competitivamente
a receptores intestinais (sítios de fixação Pept1 expressos nas inflamações crônicas
do cólon em grande quantidade) de forma a manter a microbiota intestinal estável e
evitando a ação das bactérias patógenas, participam também da modulação da
resposta imune específica na mucosa intestinal (FERREIRA et. al.2010).
4.1 DOENÇA DE CROHN
A doença de Crohn foi descrita pela primeira vez em 1612, onde Gullielmus
Fabricius Hildenus verificou na autópsia de um rapaz com “dor sub-hepática” em que
o ceco estava contraído e invaginado no íleo, de tal forma que ocorria obstrução do
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conteúdo intestinal evitando sua passagem para o cólon. Ao extrair o ceco, este se
apresentava ulcerado e fibroso (SANTOS, 2012).
Logo então, Crohn e seus colaboradores publicaram um estudo clínico no qual
descrevia sintomas de dores abdominais, diarréia, febre, emagrecimento e anemia,
presença de obstruções e fístulas. A doença foi denominada como ileíte regional, pois
a partir deste ponto, já não era descrita somente com manifestações no íleo, e sim,
com processo inflamatório em outras regiões do intestino. Posteriormente, em 1967,
Crohn revisou diversos trabalhos publicados nesta época e conciliou sua experiência
com as doenças inflamatórias granulomatosas do intestino delgado e grosso. A partir
desta época, esta patologia passou a ser conhecida como doença de Crohn (SILVA,
2007).
Apesar da etiologia desconhecida, o fator imunológico é muito estudado como
elemento participante da lesão inflamatória,mas também aqui não se sabe como
começa e porque se perpetua. Dado muito importante, e de interesse para o
tratamento, foi a constatação da presença de grande quantidade de liberação de fator
de necrose tumoral-alfa (TNF-α) na mucosa inflamada do paciente com DC e não na
do de RCUI. Essa citocina tem grande potencial inflamatório e é produzida
predominantemente pelos macrófagos (BARBIERI, 2000).
A doença de Crohn pode envolver qualquer parte do trato gastrointestinal, ou
seja da orofaringe até a região perianal. A inflamação ocorre de forma difusa,
apresenta-se áreas de intestino saudável entre áreas inflamadas (figura 1), o processo
inflamatório é, na maioria das vezes, transmural, estendendo-se da camada mucosa,
passando pela submucosa, muscular e frequentemente estendendo-se através da
serosa, resultando em intervalos entre as inflamações podendo ocorrer a formação de
fístula. Os achados histológicos incluem pequenas ulcerações superficiais cercada de
placa Peyer (úlcera aftoide) e inflamação crônica focal estendendo para a submucosa
podendo formar granulomas. A localização mais frequente é na região ileocecal,
seguida da região íleo terminal, difusa pelo intestino delgado, ou doença colônica
isolada (BELÉM, ODA, 2014).
Figura 1: Doença de Crohn
13
Fonte: Jair de Andrade, 2018.
A inflamação da mucosa com fibrose, a obstrução linfática e o edema, quando
localizados no delgado, podem levar à má absorção por redução de área absortiva
(má absorção epitelial) ou por dificuldade no transporte (má absorção pós-epitelial).
De acordo com a localização e extensão da lesão a má absorção poderá ser seletiva
ou múltipla. Dessa forma, se o segmento comprometido for delgado superior, haverá
má absorção de ferro, dissacarídeos, proteína, folato e gorduras; se a lesão for
identificada no íleo, ocorrerá má absorção de sais biliares e vitamina B12
(BARBIERI,2000).
O diagnóstico da doença de Crohn resulta da análise de dados clínicos (de
anamnese, exame físico e proctológico completo), endoscópicos, radiológicos,
laboratoriais e histológicos. As manifestações clínicas são mais frequentemente de
natureza inflamatória, obstrutiva e/ou fistulizante, as quais têm maior ou menor valor
prognóstico. Sintomas de diarréia crônica, dor abdominal, perda ponderal e
sangramento retal direcionam a anamnese. Os sinais clínicos incluem desnutrição,
palidez cutâneo-mucosa, dor, massa abdominal, distensão ou fistulização (HABR-
GAMA et. al.,2008).
O tratamento consagrado da CD é inicialmente clínico. Instituem-se medidas
gerais como estas: dieta leve, individualizada, rica em fibras e sintomáticos para cólica
e diarréia. Os antiinflamatórios mais utilizados na fase aguda são os corticosteróides,
podendo levar à remissãoda crise e, com menos eficiência, a sulfassalazina. A
azatioprina tem efeito na faseaguda da CD somente em alguns casos, mas pode
prevenir a recidiva da doença. Antibióticos de largo espectro podem ser utilizados, se
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houver suspeita de super crescimento bacteriano ou abscesso e nas complicações
perineais (BIONDO-SIMÕES et al. 2003).
4.3 COLITE ULCERATIVA
A primeira descrição de DII data do séc. IV AC. no seu célebre livro Corpus
Hippocraticum peri Syriggon, Hipócrates descreveu um tipo de diarréia crônica, que
se associava a evacuações sanguinolentas e ulcerações no cólon, parecendo
descrever retocolite ulcerosa. Foi apenas em 1859, que após uma autópsia realizada
a uma mulher que faleceu após meses de diarréia e febre, Samuel Wilks, no Hospital
Guy de Londres, descreveu a retocolite ulcerosa. Ficou documentado que, na
autópsia, esta mulher apresentava ulceração transmural inflamatória do cólon e íleo
terminal, tendo sido originalmente nomeada como “colite ulcerosa” (TEIXEIRA, 2014).
A retocolite ulcerativa inespecífica é uma doença inflamatória que acomete de
modo contínuo a mucosa do reto e do cólon e se traduz clinicamente com um quadro
de diarréia sanguinolenta. Em decorrência do comprometimento da mucosa cólica e
retal surge diarréia com muco e sangue e, às vezes, pus. A alteração da motilidade, a
redução do calibre e do comprimento do cólon pelo processo inflamatório agrava a
diarréia e desencadeiam cólicas e tenesmo. Pelas úlceras há perda de proteínas e
pela perda de área colônica útil há redução de absorção de água e sódio. (BARBIERI,
2000).
O processo inflamatório fica limitado principalmente à mucosa, marcado por
abscessos nas criptas com grau variável de ulceração, edema e hemorragia ao longo
de toda a extensão do órgão, as fístulas, dificilmente encontradas. Os achados
histológicos são caracterizados por inflamação aguda e crônica da mucosa devido à
presença de leucócitos polimorfonucleares e células mononucleares, abscessos nas
criptas, distorção das glândulas mucosas, depleção das células caliciformes e não há
formação de granulomas. Estudo sugere que os anticorpos IgG1 contra uma proteína
estrutural de colonócitos foram produzidos seletivamente em pacientes com RCU,
mas não nos com CD, e essas imunoglobulinas podem estar subjacentes a
patogênese da doença (BELÉM, ODA, 2014).
15
A resposta imune em pacientes com Colite Ulcerativa é realizada por linfócitos
T CD4+ com fenótipo Th2, caracterizado pela produção de TGF-β e IL-528 as quais
promovem o aumento da produção de IL-4, IL-5 e IL-6 que favorecem a imunidade
humoral, estimulando a proliferação e diferenciação de linfócitos B e a consequente
produção de anticorpos (FERRAZ, 2015).
Para o alívio dos sintomas, prevenção de recidivas,indução da remissão em
pacientes com a doença em atividade, a cicatrização de fístulas envolve uma
abordagem farmacológica complexa devido ao desconhecimento da natureza dos
agentes responsáveis pelo processo inflamatório. O tratamento convencional envolve
o uso de ácido 5-aminossalicílico (sulfassalazina), corticosteróides, antibióticos e
imunossupressores capazes de resolver episódios agudos, mas não evitam recidivas
(CAMBUI; NATALI; 2015).
Apesar de menores avanços na terapia da RU em relação a DC, têm-se tentado
melhorias com o uso de salicilatos e imunorreguladores. As tentativas terapêuticas
não convencionais incluem nicotina, probióticos, dietas e heparina. Novas tentativas,
a partir de estudos em animais, incluem inibição do fator nuclear B e do fator de
necrose tumoral alfa (TNF-α) (BIONDO-SIMÕES et al,2003).
4.4 O USO DE PROBIÓTICOS NAS DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS
Os probióticos possuem um efeito benéfico nas inflamações intestinais. Como
principais mecanismos relacionados temos: a inibição do crescimento de patógenos
microbianos, crescente aumento das junções epiteliais e modificação da
permeabilidade intestinal, modulação da resposta imune do epitélio intestinal e das
células imunes da mucosa, secreção de produtos antimicrobianos e decomposição de
antígenos luminais patogênicos (FERREIRA et. al. 2010).
Nas últimas décadas, diversos estudos têm sido conduzidos com o objetivo de
avaliar os efeitos do uso de micro-organismos probióticos, usando diferentes fórmulas
e com propósitos de prevenção ou tratamento de doenças. De um modo geral, os
probióticos aumentam a produção de citocinas intestinais anti-inflamatórias (IL-10,
TGF-B) e aumentam a produção de pró-inflamatórias (TNF-α, IL-8). Vários probióticos
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foram testados no tratamento das DII, sendo os mais frequentemente usados VSL#3,
E. coli de Nissle 1917 (EcN), S. boulardiie várias espécies de Lactilobacillus, apesar
de existirem outras formulações (TEIXEIRA, 2014).
A cepa probiótica de E. coli de Nissle pode ser o equivalente à mesalazina para
manter a remissão da colite ulcerativa. A mistura de probióticos VSL#3 tem
demonstrado ser eficaz induzindo e mantendo a remissão em crianças e adultos com
colite ulcerativa leve a moderada. (GUARNER et. al. 2011).
De acordo com o estudo de Tursi e colaboradores, a suplementação de VSL#3,
uma mistura próbiotica de alta potência, é capaz de induzir melhora sintomática da
UC recidivante leve a moderada de pacientes que estão em tratamento com 5-
ASA(ácido 5-aminosalicílico) e / ou imunossupressores. Este estudo duplo-cego,
controlado por placebo, descobriu que o VSL # 3 também é capaz de melhorar o
quadro clínico, reduzir os sintomas e melhorar a aparência endoscópica da mucosa
do cólon. Evitando ou retardando a administração de esteróides,
imunossupressores e produtos biológicos (TURSI et. al. 2010).
Segundo Varavallo e colaboradores na doença inflamatória crônica do intestino
e outras situações gastroenterológicas – parece bastante promissor o uso de
probióticos, especialmente de Saccharomyces boulardiie do Lactobacillus casei na
doença de Crohn, na colite ulcerosa e na inflamação crônica da bolsa ileal. Alguns
gêneros de bactérias intestinais, como o Lactobacillus e o Bifidobacterium estão
diretamente relacionados com o estímulo da resposta imune por aumento da produção
de anticorpos, ativação de macrófagos, proliferação de células T e produção de
interferon, entre outros. Entretanto, o verdadeiro mecanismo pelos quais essas
bactérias estimulam o sistema imune ainda permanece com muitos pontos a serem
esclarecidos (VARAVALLO et. al. 2008).
A IL-10 é secretada por muitas células, incluindo as células T helper (Th),
monócitos/macrófagos,células dendríticas, células B e queratinócitos. Essa citocina
suprime a inflamação mediada pelas célulasT por vários mecanismos imunológicos
no trato gastrointestinal. A administração diária do leite fermentado com bactérias
ácido láctico é benéfica no tratamento e na prevenção da doença inflamatória
intestinal e este efeito pode ser modulado pela estabilização imunológica da mucosa
por essas bactérias. Além disso, elas reduzem a capacidade de colonização por
17
bactérias patogênicas em decorrência da produção de ácido e diminuição do pH no
trato gastrointestinal (BIONDO-SIMÕES et al. 2003).
A levedura S. boulardii tem sido testada em relação à eficácia clínica em
diversos tipos de doenças agudas, incluindo diarréia associada ao uso de antibióticos,
infecção por Clostridium difficile, diarréia do viajante e doença de Crohn.
Saccharomyces boulardii (Sb) tem sido usado para melhorar a permeabilidade
intestinal em pacientes com CD e pode representar uma importante ferramenta na
manutenção do tratamento (SANTOS, 2012).
Em pesquisa realizada, foi avaliado o possível papel do Saccharomyces
boulardii, uma levedura não patogênica com efeitos benéficos no intestino humano,
no tratamento de manutenção da doença de Crohn. Trinta e dois pacientes com
doença de Crohn em remissão clínica foram tratados aleatoriamente por seis meses
com mesalamina 1g três vezes ao dia ou mesalamina 1g duas vezes ao dia mais uma
preparação de Saccharomyces boulardii 1g por dia. Recaídas clínicas foram
observadas em 37,5% dos pacientes que receberam mesalamina isolada e em 6,25%
dos pacientes no grupo tratado com mesalamina mais o agente probiótico. (FLORA,
DICHI, 2006).
Em dois trabalhos relacionados a UC, o tratamento com probiótico foi avaliado
em conjunto com medicamentos, sendo o estudo de D’incà et al., um ensaio clínico
com seres humanos, utilizou a cepa L. casei DG e ácido 5-aminosalicílico (5-ASA) por
via oral e retal em doses de 8x108 UFC e o estudo de Garrido-mesa et al., um ensaio
com animais, analisou tanto Saccharomyces boulardii em combinação o fármaco
doxiciclina quanto apenas a levedura, por via oral em uma dose de 5 x 108 UFC. Nos
dois estudos os grupos probióticos apresentaram redução da inflamação intestinal, foi
capaz de manipular a microbiota do cólon e de diminuir a recaída, sendo que a S.
boulardii, apesar da ação conjunta ter maior potencial, isoladamente mostrou-se
capaz de recuperar a histologia intestinal (SANTOS, 2017).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Está bem estabelecido que as contagens de bactérias intestinais patogênicas
são maiores em pacientes com DII do que em indivíduos saudáveis e este aumento
da carga microbiana, está positivamente relacionado com o aumento da gravidade da
doença. Estudos indicam que a manipulação da microbiota através dos probióticos,
pode ser uma estratégia terapêutica importante para proteger ou tratar a inflamação
intestinal.
Os probióticos são importantes na manutenção de períodos prolongados de
remissão da doença e a não ocorrência de resistência por se tratar da utilização de
micro-organismos naturalmente encontrados na microbiota comensal. Podem ser
utilizados como adjuvantes na terapia convencional com o objetivo de melhorar
aqueles já em uso,a fim de alcançar melhores resultados de CD e UC em pacientes
afetados, tendo em vista que as alternativas terapêuticas clássicas nem sempre
alcançam os objetivos esperados.
Sabemos que atualmente, vários são os benefícios dos probióticos na saúde
humana, incluindo nas doenças inflamatórias intestinais, o grande desafio é que a
microbiota gastrointestinal pode ser alterada por vários fatores interdependentes que
podem afetar esse ambiente, no qual a correta concentração e combinação das
espécies ali presentes é mantida, prejudicando o equilíbrio que se busca.
Existe várias espécies de bactérias probióticas em uso atualmente, inclusive
comercial, que proporcionam a melhoria e o bem estar do hospedeiro. O uso de
probióticos no tratamento das doenças inflamatórias intestinais é bastante promissor,
na última década, foi crescente o trabalho com biotecnologia de bactérias probióticas,
a técnica de manipulação de genes vem tomando lugar dos trabalhos de isolamento,
embora estes devam sempre continuar, devido a variabilidade genética existente no
ambiente.
REFERÊNCIAS
BARBIERI. Doenças inflamatórias intestinais. Disponível em: <http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-s173/port.pdf>. Acesso em: 21 de Dezembro de 2018.
BELÉM, ODA. Doenças inflamatórias intestinais: considerações fisiológicas e alternativas terapêuticas. Disponível em:
19
<http://revistas.unipar.br/index.php/saude/article/view/5267/3040>. Acesso em: 19 de Dezembro de 2018.
BERNSTEIN et al. Doença inflamatória intestinal: uma perspectiva global. Disponível em: <http://www.worldgastroenterology.org/UserFiles/file/guidelines/inflammatory-bowel-disease-portuguese-2009.pdf>. Acesso em: 16 de dezembro de 2018.
BIONDO-SIMÕES et al; Opções terapêuticas para as doenças inflamatórias intestinais: revisão.Disponível em:<https://www.sbcp.org.br/pdfs/23_3/05.pdf> . Acesso em: 03 de Dezembro de 2018.
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