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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
O USO DO BRINCAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL COMO FERRAMENTA PARA AS
DISCUSSÕES DE GÊNERO
Heliany Pereira dos Santos1 Altina Abadia da Silva2
Resumo: O espaço da escola proporciona as crianças a interação umas com as outras, independente da
classe social, religião, etnia e gênero, portanto são nessas relações que ampliam seus conhecimentos e
expressam emoções relacionadas ao mundo ao seu redor. Na educação infantil, o brincar representa
uma forma de mediação dessas construções e significações que são produzidas cotidianamente. Desta
forma pretendemos analisar a importância das brincadeiras lúdicas na Educação Infantil como
ferramentas facilitadoras das discussões de gênero. Especificamente: 1) Analisar sobre a categoria
gênero e suas interfaces com a Educação Infantil; 2) Verificar a utilização das brincadeiras na Educação
Infantil como facilitadoras das discussões acerca das questões de gênero. Como metodologia optamos
pelo trabalho de campo do tipo descritivo e analítico, com a observação de alguns momentos lúdicos
vivenciados por crianças de 03 à 06 anos de uma escola de Educação Infantil do município de
Catalão/GO. Percebemos a partir das análises, o lúdico e as brincadeiras estão presentes na Educação
Infantil, porém são orientadas pelos/as professores/as e que tanto os meninos quanto as meninas não
tem liberdade de escolherem do que brincar, vimos também que em várias das brincadeiras
vivenciadas, poderiam ser estimulada a participação de meninos e meninas e portanto, serem utilizadas
para pensar sobre as discussões de gênero o que não aconteceu no ambiente pesquisado.
Palavras-chave: Brincar; Gênero; Educação Infantil
1. Introdução
O objetivo dessa pesquisa é debater a respeito do uso de ferramentas lúdica para crianças de 3 a
6 anos de idade como tentativa de incentivar a construção de sua própria identidade. Defendemos aqui,
que as discussões de gênero na educação infantil, pode ocorrer a partir do uso das ferramentas lúdicas
desde que as crianças chegam na escola e iniciam o processo de socialização umas com as outras.
Nesse período da escolarização nota-se que muitas crianças, influenciadas por pais, familiares e
alguns/as professores/as, os/as pequenos acabam assumindo determinados preconceitos diante de
situações rotineiras que acontecem na sala de aula e no ambiente da escola. Fato reforçado quando o/a
1 Professora da Regional Catalão/UFG/Ibiotec/ Curso de Educação Física – Grupo Diálogus e-mail:
helianyps@yahoo.com.br
2 Professora da Regional Catalão/UFG Curso de Pedagogia – Grupo Nepie e-mail: tina@wgo.com.br
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próprio/a professor/a indaga que meninas só devem brincar com bonecas, devem ser delicadas,
amorosas e os meninos devem brincar com carrinhos, bolas, ser agressivos, brincar de policia e ladrão,
etc.
É na educação infantil que se inicia a formação, onde se forma os conceitos que levarão para
toda a vida. É também nesta fase que o papel do/a professor/a é reforçado, pois influencia os alunos/as
fazendo com que progridam na forma de pensar, falar, agir e tomar decisões importantes perante a
sociedade. Nesse sentido é relevante debater sobre gênero, rompendo barreiras do que se diz sobre
meninas e meninos, pois cada um tem sua importância.
Pensar a educação infantil como alicerce e essencial na formação do ser é compreender que é
direito da criança (meninos e meninas) conviver na sociedade de forma igualitária, principalmente pela
oportunidade de estarem em contato umas com as outras. Sendo assim todas as crianças não importa a
classe social, religião, etnia, sexo e gênero vão se interagir e participar de todas as construções sociais
que o ambiente educacional lhes proporcionam.
E finalmente nos propomos analisar a importância das brincadeiras lúdicas na Educação Infantil
como ferramentas facilitadoras das discussões de gênero e especificamente: 1) Analisar sobre a
categoria gênero e suas interfaces com a Educação Infantil; 2) Verificar a utilização das brincadeiras na
Educação Infantil como facilitadoras das discussões acerca das questões de gênero. uso de ferramentas
lúdicas do brincar, no ensino e discussão sobre gênero na educação infantil.
Para tanto, esta pesquisa caracteriza-se por um trabalho de campo do tipo descritivo e analítico,
com a observação não participante de alguns momentos lúdicos vivenciados por 46 crianças de 03 à 06
anos de uma escola de Educação Infantil do município de Catalão/GO. Para fundamentar as
considerações estabelecidas a partir das observações utilizamos referenciais que centram-se em livros,
dissertações, artigos e teses, leis, sites da internet que discutam sobre o tema. Para facilitar a
investigação utilizamos termos como “a importância do brincar” e “o brincar na educação infantil”.
Os/as principais autores utilizados centram-se nos trabalhos de Bujes (1998), que destaca as
brincadeiras como características de cada cultura; Vygotsky (1992, 1998), que relata a importância das
brincadeiras e do brinquedo no desenvolvimento e aprendizagem da criança; Finco (2004, 2010), que
discute sobre a desigualdade de gênero presente em nossa sociedade afetando o desempenho e o
desenvolvimento cognitivo de meninas e meninos e, por último Altmann (2003), que relata sobre o
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gênero e a construção social, dentre outro/as autores/as que no decorrer do texto foram sendo
incorporados e cujos nomes aparecerão na referência bibliográfica.
2. As relações de gênero e a convivência entre meninos e meninas na educação infantil
Entendemos Gênero como uma construção social que uma cultura estabelece ou elege na
relação entre homens e mulheres, para Scott (1995, p. 89), é o meio que compõe as relações sociais que
são fundadas sobre as diferenças entre os sexos, e que portanto, “fornece um meio de decodificar o
significado e de compreender as complexas conexões entre várias formas de interação humana”.
Ao procurar entender como acontece à educação de meninos e meninas descobrimos que
àqueles/as que desobedecem as regras impostas socialmente e tidas como naturais são discriminados e
isolados em algum momento da vida. Dessa forma ao tentarmos desvendar os papeis assumidos pelos
homens e as mulheres na sociedade, percebemos que os/as mesmos/as deixam marcas inconfundíveis
no corpo, no comportamento e nas memórias da infância.
Destacamos que a compreensão de gênero a partir de uma categoria conceitual construída
socialmente não desconsidera as diferenças biológicas que existem entre homens e mulheres, mas a
amplia.
Se ser menino ou menina fosse possível apenas a partir de uma construção biológica seria
perceptível que as crianças desenvolvessem uma identidade de gênero masculina ou feminina dentro
das normalidades buscando a sua masculinidade ou feminilidade durante toda a sua infância para a
definição de sua identidade. As aparências expressas e marcadas de meninos e meninas não são meras
coincidências, pois a convivência social e histórica nos grupos definirá a sua característica. Portanto
não é possível fazer com que se compreendam as diferenças entre meninos e meninas somente com
explicações fundamentadas na biologia.
A proposta de discutir sobre as relações de gênero na educação infantil se reveste em um desafio
complexo, pois as brincadeiras de meninos e meninas se incluem em um contexto dentro das relações
baseadas na convivência familiar e escolar que muitas vezes são tratadas de forma unilateral pendendo
para as atividades corporais direcionadas aos meninos, mesmo quando nos referimos a crianças de 3 a 6
anos de idade.
Portanto a ideia de gênero está fundada nas desigualdades sociais estabelecidas entre os sexos,
apontando para o caráter subentendido do que seja do feminino e do masculino. Assim, gênero é uma
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categoria relacional porque leva em conta as atribuições de um e do outro sexo. Além disso, se
relaciona com outras qualidades, pois não são vistos a partir da cultura. Isso ocorre em diversos espaços
sociais, incluindo a escola e as aulas de educação física, sejam elas ministradas para turmas do mesmo
sexo ou não.
Nesse aspecto o brincar aparece como possibilidade de perpetuar os significados de gênero
postos e justificados a partir da diferença biológica. Essa parece ser a principal polêmica nessa questão
e vem configurando-se em uma série de dúvidas e gerando discussões na sociedade, sobretudo quando
envolve a distinção entre brincadeiras de meninas e de meninos. No que se refere à diversidade da
construção de gênero, Louro (1996) lembra que:
Entendendo gênero fundamentalmente como uma construção social – e, portanto, histórica-,
teríamos de supor que esse conceito é plural, ou seja, haveria conceitos de feminino e de
masculino, social e historicamente diversos. A ideia de pluralidade implicaria admitir não apenas
que sociedades diferentes teriam diferentes concepções de homem e mulher, como também que
no interior de uma sociedade tais concepções seriam diversificadas, conforme a classe, a religião,
a raça, a idade, etc.; além disso, implicaria admitir que os conceitos de masculino e feminino se
transformam ao longo do tempo. (LOURO, 1996, p. 10).
Assim, meninos e meninas são classificados/as a partir das diferentes concepções de homens e
mulheres presentes em uma sociedade dando diversidade em tudo aquilo que as definem como
masculino e feminino. Portanto, meninos e meninas não mantêm nítidas as divisões de gênero, estando
por vezes separados e noutras juntos, nas aulas de educação física e nas brincadeiras que se
estabelecem na educação infantil. (ALTMANN, 2003)
Sendo assim os significados de gênero vão sendo expressos nos corpos de meninos e meninas
de acordo com as expectativas colocadas diariamente nas crianças, na forma como se organizam as
filas, na maneira de se vestir, como se sentar e como se comportar perante a sociedade. Essas
impressões são também estabelecidas nos brinquedos oferecidos às crianças que também estão
carregados de expectativas simbólicas e intenções. As expectativas relacionam-se à diferença de
comportamento que se deseja formar para o menino e para a menina, demonstrando em alguns
momentos, inocência pelas diferenças biológicas, que acabam por proporcionar distintas vivências
corporais determinando os corpos infantis e proporcionando as manifestações e expectativas veiculadas
a partir de suas experiências. (FINCO, 2010)
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Para Foucault (1977) o conjunto de probabilidade de regras impostas as crianças faz com que
aquelas que desobedecem as fronteiras de gênero sejam investigadas de forma individual, tornando-as
um “caso”. Cria-se, portanto, um sistema comparativo estabelecendo informações que compõe e
garante as normas. Com isso, cada criança que transgride a regra é tratada como um problema que é
construído tanto do ponto de vista de quantidade, do poder e do saber. Segundo o ator, “O caso é o
indivíduo tal como pode ser descrito, mensurado, medido, comparado a outros e isso em sua própria
individualidade; e é também o indivíduo que tem que ser treinado ou retreinado, tem que ser
classificado, normalizado, excluído, etc.” (FOUCAULT, 1977, p. 68).
Louro (1996, p. 77), amplia ainda mais o conceito de gênero referindo-o “ao modo como as
diferenças sexuais são compreendidas numa dada sociedade, num determinado grupo, em determinado
contexto”. Isso quer dizer que as diferenças entre homens e mulheres são representadas em cada cultura
através do modo de falar, pensar ou agir sobre o assunto.
Essas diferenças são reproduzidas nas crianças pouco a pouco por diversos mecanismos que as
cercam, nas suas interações com os adultos e com outras crianças, na televisão, no cinema, na música e
em outros meios ao determinarem o que cabe aos meninos ou às meninas algo que parece se iniciar
bem cedo e ocorre na maioria pelo sentimento. Nesse aspecto, percebe-se que as convivências
influenciam diretamente as crianças ao pensarem sobre si, e sobre as outras crianças, contribuindo para
compor sua própria identidade de gênero.
Questões como essas, devem adentrar o espaço da educação infantil, pois ao nos referirmos a
categoria de gênero, estamos pensando na dimensão sócio-histórica e cultural da relação mulher e
homem, nas declarações e ralações de poder estabelecidas entre ambos e nesse aspecto entendemos que
o sujeito infantil é carregado dessa simbologia e organiza-se por diversos discursos e diferentes
instituições como a família, a escola, a igreja e os meios de comunicação, que vão apontando e
moldando as formas de como vão se relacionar com o mundo onde estão inseridos.
Segundo Stoller (1993, p. 28), a identidade de gênero está relacionada “à mescla de
masculinidade e feminilidade em um indivíduo, significando que tanto a masculinidade como a
feminilidade é encontrada em todas as pessoas, mas em formas e graus diferentes”. O autor apresenta
uma teoria psicanalítica clássica, enfatizando a ideia de que a masculinidade ou a feminilidade não
segue a ordem natural apresentada por determinismos biológicos, mas são características conquistadas
culturalmente.
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Voltando as brincadeiras na educação infantil, percebemos que geralmente essas atividades
proporcionam grandes desafios que articulam os movimentos corporais. Como nos fez lembrar os
estudos de Scraton, citada por Louro (1996), quando afirma que as meninas vão desenvolvendo uma
espécie de timidez corporal, porque como responsáveis pela reprodução precisam aprender a proteger
seus corpos. Parece-nos que ainda há, na infância uma grande possibilidade de as meninas explorarem
seus corpos, mas numa única direção: a de ser mãe e reprodutora.
Chama-nos a atenção nesse estudo, o fato da diversidade e a socialização que se materializa
entre as crianças no brincar, mas ao mesmo tempo, a manutenção daquilo que é naturalizado sobre esse
brincar, pois uma simples brincadeira na areia, onde se brincam juntos (meninos e meninas) se
constroem castelos de princesas, casinhas como num reino encantado com bruxas e feiticeiras, observa-
se os papéis representativos distintos dos meninos (o príncipe encantado, forte e viril) e as meninas
(donzelas, sonhadoras, sensuais e frágeis). Ainda se percebem uma forte influência nesse modelo
reproduzido através de programas infantis na televisão, que ressalta os heróis e super-heróis masculinos
e apresentam a mulher nessa função de esperar o príncipe encantado e/ou herói para resolver todos os
problemas.
Dessa forma, é mister perceber que as brincadeiras na educação infantil podem desencadear
aprendizados para a compreensão do que é socialmente estabelecido como verdade absoluta, e suscitar
mudanças significativas quanto à promoção da igualdade de gênero levando-nos (professores e escola)
a agir intencionalmente na tentativa de eliminar hierarquias que são impostas na sociedade em relação
aos papéis do masculino e feminino e assim, humanizando-nos.
2. O uso de ferramentas lúdicas no brincar na educação infantil – o caso da escola campo
Percebemos ao longo da vida que as primeiras experiências nos deixam marcas profundas e se
forem positivas tendem a reforçar ainda mais atitudes de autoconfiança, cooperação, solidariedade,
responsabilidade, enfim tudo aquilo que vão sendo conquistados e constituídos na vida adulta. Nesse
contexto a Educação Infantil aparece como o início desse processo, pois as aprendizagens vividas nesse
contexto educacional torna-se algo mágico, único e essencial nesse momento em que as transformações
são muito rápidas e perceptíveis.
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Na Educação Infantil, é notório o desenvolvimento de cada criança, a capacidade de aprender,
sua receptividade, seu carinho e pureza dispendidos a todos que os rodeiam. O cotidiano escolar
sugerido nesse espaço é baseado em uma rotina preestabelecida que visa a importância dos valores
morais, onde se aprende a partilhar, a ajudar e também a conhecer seus direitos e deveres.
Dessa forma a Educação Infantil contribui com a formação do indivíduo e consequentemente
forma um cidadão ativo, reflexivo e participante da sociedade, sem contudo esquecer de tratar a criança
como criança e não um ser adulto em miniatura, como se acreditava a tempos atrás.
Considerando que a Educação Infantil lida com criança da mais tenra idade e quando passamos
a olhar para a criança com essa característica, percebemos que o que mais lhe prende a atenção são as
brincadeiras, portanto defendemos as brincadeiras nessa fase de escolarização como fundamentais para
o processo de formação do ser humano.
Mas ao fazê-lo, reconhecemos e reafirmamos que as brincadeiras se constituem em um aspecto
universal no mundo infantil, porém destacamos que cada uma delas possuem características específicas
e que muitas vezes dependem de vários fatores para se efetivarem na escola. Fatores como o ambiente
físico no qual a criança brinca, a comunidade a que pertence, a cultura em que está inserida e também o
aspecto individual de cada criança, pois, compreendemos que as brincadeiras e nesse aspecto também
os brinquedos, são constituídos culturalmente e portanto são perpassados pelas características
específicas de uma determinada sociedade.
Naturalmente consideramos que toda criança brinca, portanto brincar é considerada uma ação
“natural” dos pequenos, isto é, algo espontâneo, que gera prazer. Nessa perspectiva, também “os
brinquedos – e [...] as brincadeiras – são característicos de cada cultura e de cada momento histórico,
ainda que alguns guardem um caráter de notável sobrevivência” (BUJES, 1998, p. 207). Assim,
identificamos que as crianças brincam de acordo com o seu contexto social, cultural e histórico, seja
qual for sua origem, sua cultura, sua religião ou seu gênero.
Tendo na brincadeira um dos principais pressupostos educativos, o Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998) a elege como um de seus princípios norteadores, e
a define como um direito da criança para desenvolver seu pensamento e sua capacidade de expressão,
além de situar cada indivíduo em sua cultura. Assim sendo, o ambiente escolar, propicia a criança a
procura da satisfação de seus desejos em que a brincadeira possa levá-la a um mundo imaginário, no
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qual os desejos podem ser realizados e concretizados por meio da aprendizagem prazerosa e lúdica.
Nesse contexto,
Brincar é uma das atividades fundamentais para o desenvolvimento da identidade e da
autonomia. O fato da criança desde muito cedo poder se comunicar por meio de gestos, sons e
mais tarde representar determinado papel na brincadeira faz com que ela desenvolva sua
imaginação. Nas brincadeiras, as crianças podem desenvolver algumas capacidades
importantes, tais como a atenção, a imitação, a memória, a imaginação. Amadurecem também
algumas capacidades de socialização, por meio da interação, da utilização e da experimentação
de regras e papéis sociais (BRASIL, 1998, p. 22).
Portanto as brincadeiras são importantes ferramentas no processo de ensino e aprendizagem
infantil e tornam-se fundamentais para o desenvolvimento das crianças no meio social, pois é nas
brincadeiras que as crianças aprendem a se comunicar umas com as outras por meio de gestos e
imitações e é também nelas que desenvolvem a imaginação. Nesse sentido, Dodds (2011) afirma que o
desafio que se apresenta nas escolas de educação infantil é encontrar maneiras para as crianças
experimentarem e, se for necessário, aprenderem a brincar, oferecendo a liberdade consciente para se
desenvolverem e com isso constituírem-se enquanto sujeito pensante.
Desta forma, devemos proporcionar as crianças um espaço onde elas possam experimentar o
mundo e internalizar uma compreensão particular sobre as pessoas, os sentimentos, as identidades de
gênero e os diversos conhecimentos. Considerando a construção das relações de gênero nas
brincadeiras infantis, Felipe (2008) afirma que:
[…] os brinquedos e [as] brincadeiras que proporcionamos, as atividades que empreendemos no
nosso fazer pedagógico, os espaços disponibilizados a meninos e meninas, as falas de ambos, os
gestos, os comentários que fazemos, os olhares de repreensão ou não que lançamos a cada um
deles/cada uma delas diante de seus comportamentos estão repletos de representações a respeito
daquilo que entendemos ser o mais adequado para meninos e meninas, homens e mulheres.
Portanto, discutir de que forma se constroem as relações de gênero e como vão se constituindo
ao longo da vida as identidades sexuais torna-se crucial nessa formação (FELIPE, 2008, p. 06).
Com essa afirmação, percebemos que as intencionalidades expressas nas brincadeiras, se bem
elaboradas, auxiliam no desenvolvimento das crianças e sugerem uma ampliação dos conhecimentos
relativos ao que seja estabelecido socialmente enquanto específico do menino e da menina. Portanto a
partir dessa ferramenta podemos propor ações que possibilitem a transformação e a mudança do
pensamento ideológico naturalizado nas crianças no decorrer dos anos, despertando em cada uma o
desejo por diversas atividades como desenhar, pintar, pular corda, brincar de bonecas, representar e
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criar inúmeras situações de prazer que indubitavelmente podem envolver ambos os sexos e que foram
observadas nessa pesquisa na escola campo, porém cada atividade proposta direcionava-se a um grupo
específico, para meninos ou para meninas, poucas vezes observamos os dois grupos envolvidos
simultaneamente na atividade, que também apresentava-se mais como uma tarefa do que propriamente
um momento educativo prazeroso.
Para Vygotsky (1998, 27) o brinquedo constitui-se como um suporte da brincadeira com uma
“[…] enorme influência no desenvolvimento de uma criança”. Para o autor, o brincar promove o
desenvolvimento integral do ser humano nos aspectos físico, social, cultural, afetivo, emocional e
cognitivo e defendemos aqui, também a sua utilização como possibilidade de propiciar a aquisição de
conhecimentos relativos a questão de gênero.
Mas o que percebemos, através das observações é o brincar sem intenção na educação infantil, e
portanto sem nenhum objetivo e intencionalidade educativa voltada para a formação. Atividades
corporais também foram observadas como pega-pega, carrinho, super-heróis e de futebol para os
meninos e casinha, boneca, rodas para as meninas. Reforçando ainda mais a separação entre meninos e
meninas nas brincadeiras propostas. Portanto, defendemos o uso da brincadeira como parte de uma
aprendizagem intencional que aliada ao prazer que provoca, possa também informar e formar
conscientemente os pequenos sobre várias temáticas, inclusive sobre os papéis sociais entre homens e
mulheres.
Vygotsky (1998) acentua a importância do ato de brincar na constituição do pensamento
infantil, pois segundo o autor, é brincando e/ou jogando, que a criança revela seu estado cognitivo,
visual, auditivo, tátil, motor, seu modo de aprender e entra em uma relação cognitiva com o mundo de
eventos, pessoas, coisas e símbolos muitas vezes, distintos do seu. Assim, as crianças desenvolvem sua
capacidade de raciocinar, de julgar, de argumentar, de como chegar a um consenso, reconhecendo o
quanto isto é importante para a realização da atividade em si.
Assim sendo, o brincar é uma forma de mediação das construções e significações que a criança
produz de sua realidade. As brincadeiras infantis são atividades que se organizam de maneira individual
para cada criança e satisfazem seus desejos e necessidades intrínsecas, ajudando-as a construir seus
significados e desenvolver a sua linguagem e também as motivando a continuar na ação. (FINCO,
2010)
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Portanto é nesse sentido, a partir da brincadeira que as crianças têm a possibilidade de serem
ativas e explorar as matérias, o ambiente e também de se comunicarem com as pessoas, de se
interagirem umas com as outras e de distinguirem as diferenças, de raça, de idade, de sexo, de classe
social e de gênero. Dessa maneira, as crianças adquirem conhecimento de mundo e desenvolvem seus
aspectos físicos, psíquicos e sociais e o brincar torna-se uma forma de interação e construção da criança
com a realidade. No entanto, se faz necessário que os pais, educadores e sociedade em geral se
conscientizem sobre a importância da brincadeira e da ludicidade na infância, pois fazem parte de uma
aprendizagem prazerosa, significativa e instigadora não somente uma atividade sem intenção e/ou
função no meio escolar.
3. Considerações Finais
Ao finalizar a pesquisa sobre a importância das brincadeiras lúdicas na Educação Infantil como
ferramentas facilitadoras das discussões de gênero, percebemos que a construção do gênero é um dado
social que acompanha também os/as pequenos/as desde suas casas ao se posicionarem em atitudes que
transmitem o que consideram adequado para o menino e o que é adequado para a menina (como do que
e com quem brincar).
Percebemos que a brincadeira é o instrumento para a construção coletiva do conhecimento e
pode ser nelas e por elas que as crianças se desenvolvem e constroem seus conhecimentos, expressando
emoções e entendendo o mundo ao seu redor de forma mais significativa.
Sendo assim, a escola aparece como um espaço de construção e ressignificação dessas atitudes
naturalizadas e abordar nas brincadeiras infantis temas que são vistos socialmente como polêmicos é
fundamental nesse processo, pois é a partir dessa fase de escolarização que iniciam um processo de
autonomia estimulando a percepção do seu papel perante a sociedade.
Portanto, a brincadeira aparece nesse contexto como uma ferramenta de garantia de uma
aprendizagem significativa prazerosa que promove o despertar para a aquisição de novos valores
sociais e para a contestação de um modelo de sociedade ultrapassado e tradicional baseado nas
diferenças e na descriminação daqueles que não se encaixam no modelo naturalizado vigente.
Diante dessas considerações, apontamos para a necessidade de propor na Educação Infantil
brincadeiras lúdicas que estimulem o contato entre meninas e meninos, enfatizando a participação de
ambos, possibilitando a interação com o/a outro/a e consequentemente com o mundo fora da escola.
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Sugerimos brincadeiras como pique-pega em duplas, trios e até variações de jogos esportivos como o
“bobinho”, “pega pega com bola”, “nunca três”, “trenzinho”, “brincadeiras de rodas”, “com bonecas”
dentre outras, de forma provocativa no sentido de uma intervenção reflexiva e profissional do/a
professor/a esclarecendo e informando sobre os papéis sociais impostos para o menino e para a menina
e presentes sobre maneira no que se pode ou não brincar.
Percebemos a partir das análises das observações que o lúdico e as brincadeiras estão presentes
na Educação Infantil na escola investigada, porém são propostas e conduzidas pelos/as professores/as e
que tanto os meninos quanto as meninas não tem liberdade de escolherem do que brincar, vimos
também que em várias das brincadeiras vivenciadas, poderiam ser estimulada a participação de
meninos e meninas juntos/as e portanto, serem utilizadas para pensar sobre as discussões de gênero o
que não aconteceu no ambiente pesquisado.
Finalizando, ressaltamos o papel formativo da brincadeira na Educação Infantil, pois é na
infância a fase do início das escolhas individuais, da exploração e descoberta dos desejos é nessa fase
também a ideia da liberdade para usufruir dos direitos de serem criança, sem a intervenção e/ou
imposição dos adultos, mas conquistar um conhecimento que seja significativo para se conhecer e
reconhecer como criança e portanto, bases alicerçadas na diversidade e na diferença, sem discriminação
e/ou dominação.
4. Referências
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pagu (21) 2003: pp. 281-315
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Curricular para a Educação Infantil. Brasília: MEC, 1998. (vol.1-3. Conhecimento de mundo).
BUJES, Maria Isabel E. O pedagógico na educação infantil: uma releitura. Porto Alegre: Penso, 1998
DODDS, Sylvia. Nós queremos brincar: crianças dos primeiros anos brincando na sala de aula. In:
Brincar: aprendizagem para a vida. Tradução: Fabiana Kanan; Revisão técnica: Maria Carmen Silveira
Barbosa - Porto Alegre: Penso, 2011.
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FELIPE, Jane. Proposta Pedagógica. In: BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação à
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The use of playing in children education as a tool for gender discussions
Astract: The school space gives children interaction with each other, regardless of social class,
religion, ethnicity and gender, so it is in these relationships that they expand their knowledge and
express emotions related to the world around them. In children's education, play represents a form of
mediation of these constructions and meanings that are produced daily. In this way we intend to
analyze the importance of playful games in Early Childhood Education as a facilitating tool for gender
discussions. Specifically: 1) Analyze about the gender category and its interfaces with Early Childhood
Education; 2) To verify the use of the games in Early Childhood Education as facilitators of the
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discussions about gender issues. As a methodology, we opted for a descriptive and analytical fieldwork,
with the observation of some playful moments experienced by children from 03 to 06 years of a School
of Early Childhood Education in the municipality of Catalão / GO. We perceive from the analyzes, play
and play are present in the Infant Education, but are guided by the teachers and both boys and girls are
not free to choose to play, we have also seen that in several of the games Lived, the participation of
boys and girls could be stimulated and therefore, be used to think about the gender discussions that did
not happen in the researched environment. Keywords: Play; Gender, Early Childhood Education.