Post on 21-Jan-2019
C M Y KCMYK
EEddiittoorr:: José Carlos Vieirajosecarlos.df@dabr.com.br
cultura.df@dabr.com.br3214-1178 • 3214-1179
CORREIO BRAZILIENSEBrasília, terça-feira, 12 de agosto de 2014
Direção8844%% são homens brancos1133%% são mulheres brancas22%% são homens negros
Atores e atrizes8800%% do elenco dos filmes
de maior bilheteriasão de cor branca
4444%% são homens brancos1144%% são homens negros3366%% são mulheres brancas44%% são mulheres negras
No cinema
INVISIBILIDADEnegra
www.correiobraziliense.com.brCCoonnffiirraa iinnffooggrrááffiiccoo ssoobbrree aa rreepprreesseennttaaççããoo nneeggrraa nnaass aarrtteess.. Leia mais na página 3»
A ausência de artistas afrodescendentes permeiatoda a cultura brasileira, do cinema àmúsica» ADRIANA IZEL
»MAÍRA DE DEUS BRITO
D urante muito tempo, oBrasil ostentou a crençade ser um paraíso racialque teria escapado do
racismo. Essa ideia surgiu, prin-cipalmente, por conta da com-paração com outras nações emque o preconceito e a discrimi-nação racial eram mais expostas.Essa ausência de questionamen-to sobre o assunto dificultou oenfrentamento do racismo nopaís (que sempre existiu).
Nos últimos meses, a Copa doMundo foi responsável por des-pertar esse debate. A chamadadiversidade brasileira foi contes-tada pela falta de negros nas ar-quibancadas dos estádios. Den-tro do campo, a pouquíssimapresença de crianças negras,que entravam ao lado dos joga-dores, confrontou o evento queteve como um dos temas “Copasem racismo”.
A ausência de afrodescen-dentes no Mundial também évista em outros ambientes comoem cargos de chefia de empresaspúblicas e privadas, setores daeducação e da saúde, e ainda noambiente artístico. Na sétima ar-te, a situação foi comprovadapor meio da pesquisa A cara docinema nacional, desenvolvidano Grupo de Estudos Multidisci-plinar da Ação Afirmativa (Ge-maa), da Universidade Estadualdo Rio de Janeiro (UERJ).
O estudo analisou os filmesnacionais de maior bilheteria en-tre os anos de 2002 e 2012 e mos-trou que apenas 14% dos atoressão negros e 4% das atrizes tam-bém. Os números ficam aindamais alarmantes quando investi-gada a participação em roteiro edireção: 4% dos roteiristas e 2%dos diretores são homens negros.Nesses ambientes, não existe ne-nhuma mulher negra.
“O cinema é um microcosmoda sociedade brasileira, atraves-sada por desigualdades e meca-nismos discriminatórios estrutu-rais. No Brasil, os espaços de sta-tus e prestígio são reservados aosbrancos. A baixa presença de rea-lizadores e roteiristas negros éum sintoma disso. As mulheresnegras são o maior exemplo des-se processo: exaltadas como íco-nes de beleza e sensualidade nocarnaval, elas estão excluídas damoda, da publicidade, da televi-são e do cinema”, explica MarciaRangel, ao lado deVerônica Toste,as autoras da avaliação.
Além da poucapresença nasproduções, a pesquisaindica que os 31% dos negros re-presentados nos filmes estãosempre caracterizados a partirde estereótipos associados à po-breza e à criminalidade. “Osmeios propagam um ideal debeleza inspirado nos padrõeseuropeus. O racismo estético émuito presente, assim como aidealização da branquitude. Ofato de o cinema ser dirigido,produzido e roteirizado, predo-minantemente por homensbrancos, faz também com que oelenco dos filmes reflita a visãode mundo desse grupo e que osprotagonistas escolhidos sejamparecidos com eles”, defende adupla de estudiosas. Pior, a so-ciedade cobra esse padrão.
Presençamínima na literaturaA literatura parece espelhar o cine-
ma. Entre os autores, há a predominân-cia dos brancos, principalmente, os ho-mens. Os personagens também são ma-joritariamente centrados no padrão es-tético branco.“Vejo um padrão de histó-rias e de personagens que não aborda aexperiência do negro contada por elemesmo”, comenta a autora de Um defei-to de cor, Ana Maria Gonçalves.
No livro Literatura brasileira con-temporânea: Um território contestado,a pesquisadora da Universidade de
Brasília (UnB) e coordenadora doGrupo de Estudos de Literatura Brasi-leira Contemporânea, Regina Dalcas-tagnè, comprova os poucos afrode-scendentes na narrativa brasileira.
Dos 258 romances pesquisados,79,8% dos personagens são brancos;56,6% são de classe média; 81% são he-terossexuais; 71,1% dos protagonistassão homens; e 56,3% dos adolescentesnegros retratados nos romances atuaissão dependentes químicos contra 7,5%de adolescentes brancos na mesma
situação. Quando a porcentagem anali-sa os autores, o quadro não se altera:72,7% são homens; 93,9% são brancos;e 8,8% possuem ensino superior.
Já a música brasileira, para MarciaRangel e Verônica Toste, é um terrenoperigoso. As pesquisadoras acreditamque é um espaço com uma aparênciamais democrática, porém, perpassadapor mecanismos de apropriação da in-dústria cultural. “Basta recordar quemuitos dos compositores negros dadécada de 1920 tiveram seus sambas
levados para o rádio por intérpretesbrancos e não chegaram nem mesmo agravar as próprias músicas”, analisam.
Marcia eVerônica também apontamo apoderamento do axé e do funk porartistas não-negros. “O axé baiano senacionalizou por meio de uma cantorabranca, Daniela Mercury, assim como ofunk chegou aos espaços mais elitiza-dos na voz da Anitta, que tem passadoaté mesmo por transformações físicaspara melhor se adequar a um padrãoestético branco”.