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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Produções Didático-Pedagógicas
Versão Online ISBN 978-85-8015-079-7Cadernos PDE
II
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DO PARANÁ
CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS POR MEIO DE CONTOS DE EDGAR ALLAN POE
CURITIBA, NOVEMBRO DE 2014.
TÂNIA MARIA ACCO
CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS POR MEIO DE CONTOS DE EDGAR ALLAN POE
Produção Didático-Pedagógica desenvolvida pelo Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE 2014 – como requisito para intervenção pedagógica no Colégio Estadual do Paraná – Curitiba, Paraná – sob orientação da Prof. Ms. Soraya Sugayama, UFPR.
CURITIBA, NOVEMBRO DE 2014.
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE
Título: Contação de histórias por meio de contos de Edgar Allan Poe. Autor(a): Tânia Maria Acco. Disciplina / Área Língua Portuguesa.
Escola de Implementação do Projeto e sua localização
Colégio Estadual do Paraná – Ensino Fundamental, Médio e Profissional – Avenida João Gualberto, 250, Alto da Glória.
Município da Escola Curitiba – Paraná.
Núcleo Regional de Educação Curitiba – Paraná.
Professor(a) Orientador(a) Profª Ms. Soraya Sugayama.
Instituição de Ensino Superior Universidade Federal do Paraná.
Relação Interdisciplinar Possível diálogo com AS disciplinas de Arte, História, Geografia, Sociologia, Filosofia, entre outras, e possível parceria com o Curso Técnico de Arte Dramática, ofertado pelo Colégio Estadual do Paraná.
Resumo Este projeto de intervenção pedagógica tem por objetivo propor a arte da contação de histórias, através de contos do escritor norte-americano Edgar Allan Poe (século XIX), como forma de "seduzir" os estudantes à leitura das obras clássicas da literatura universal, tão necessária para o conhecimento do ser humano e de sua trajetória histórica. Sabemos que a leitura das obras clássicas é uma grande aliada para o estabelecimento de relações possíveis entre pessoas, tempos, culturas, realidades, vivências; é por meio dela, principalmente, que se consegue o
entendimento que permite às pessoas uma posição no mundo para além do lugar-comum, para além do senso comum, oportunizando-lhes um olhar sensível com relação à realidade que as cerca, e uma possível intervenção nesta. Por outro lado, sabemos que os estudantes, em número cada vez mais expressivo, refutam a prática da leitura das obras clássicas recomendadas por seus professores, principalmente de Língua Portuguesa e Literatura. O fato é que parece que os estudantes perderam o interesse pela leitura no seu formato pragmático, ou seja, a leitura de obras da Literatura com a finalidade única de cumprimento de uma etapa do currículo, por meio da organização de fichas de leitura ou da escritura de resumos ou resenhas. Esse formato mostra-se, hoje, de grande ineficácia, pois os adolescentes e jovens já não demonstram o menor interesse em “tolerar” práticas, para eles, extremamente enfadonhas e sem perspectivas, uma vez que se encontram imersos em um universo visual / virtual modificado e intensificado pelo “www”, de hipermídia, isto é, num universo digital, cheio de atrativos que se manifestam em imagens e movimentos, com grande força de sedução. Dessa forma, o presente estudo, com a proposta da contação de histórias, tem como finalidade instigar os estudantes à leitura dos textos clássicos, proporcionando-lhes momentos de análise, reflexão e comparação entre pensamentos, ideias, costumes, linguagem de épocas distintas, assim, percebendo a literatura como uma forma de melhor compreensão da realidade por meio de outra possibilidade de interação social, que não apenas a da era digital com seus
telecomandos. Para isso, a metodologia escolhida foi uma sequência de ações que se desenvolverá, principalmente, em forma de rodas de conversa, em que os contos escolhidos para o trabalho de leitura e análise serão “dissecados” no e pelo grupo, ganhando sempre atenção especial a figura do narrador, e finalizando com a leitura dramatizada das histórias estudadas, até culminar com a “contação dramatizada”, pela turma inteira, da história contida no texto “O gato preto”.
Palavras-chave Contraponto à era digital; literatura; contos de Edgar Allan Poe.
Formato do Material Didático Unidade Didática.
Público Alunos do Ensino Médio
CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS POR MEIO DE CONTOS DE EDGAR ALLAN POE APRESENTAÇÃO
Esta Produção didático-Pedagógica foi desenvolvida para a aplicação de
Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola, parte integrante do Programa de
Desenvolvimento Educacional – PDE 2014 -, e está em consonância com as Diretrizes
Curriculares da Educação Básica em Língua Portuguesa. A questão que nos propomos
a analisar é em que medida a arte da contação de histórias pode se constituir em uma
potencial aliada para as inúmeras possibilidades de práticas da escrita e da leitura /
literatura na sala de aula.
Discutimos muito, no âmbito escolar, os motivos que levam estudantes, em
número cada vez mais expressivo, a refutarem a prática da leitura das obras clássicas
recomendadas por seus professores, principalmente de Língua Portuguesa e Literatura,
que insistem em propô-las por reconhecê-las como retrato de um tempo vivido, cuja
recriação, por meio da leitura, é imprescindível para o estabelecimento de relações que
levem à compreensão do momento histórico presente, ou seja, é pelo conhecimento do
passado histórico, retratado, também, e de forma muito expressiva, nos clássicos da
Literatura, que se consegue uma melhor compreensão do pensamento humano hoje,
que se tem a grande oportunidade do autoconhecimento e de mais possibilidades de
entendimento das situações presentes no dia-a-dia e, consequentemente, da
complexidade do mundo.
Como explicação para essa resistência, falamos em desinteresse pela leitura,
em falta de aptidão literária ou ausência de um suposto dom literário em nossos
adolescentes e jovens, em escassez de pré-requisitos das séries escolares anteriores,
em ausência de estímulo à leitura na família, no mundo globalizado etc.
É evidente que não existe uma razão única para tal fato, no entanto, parece-nos
que o grande avanço tecnológico das últimas décadas trouxe consigo um dinamismo,
uma rapidez de olhares e movimentos que contribuiu para que nossos estudantes
perdessem o interesse pela leitura no seu formato pragmático, ou seja, a leitura de
obras da Literatura com a finalidade única de cumprimento de uma etapa do currículo,
por meio da organização de fichas de leitura ou da escritura de resumos ou resenhas
mostra-se, hoje, de grande ineficácia, pois os adolescentes e jovens já não demonstram
o menor interesse em “tolerar” práticas, para eles, extremamente enfadonhas e sem
perspectivas, uma vez que se encontram imersos em um universo visual / virtual
modificado e intensificado pelo “www”, de hipermídia, isto é, num universo digital, cheio
de atrativos que se manifestam em imagens e movimentos, com grande força de
sedução.
Diante disso, percebe-se a urgente necessidade de se resgatar a prática da
leitura dos clássicos num formato que se configure como um contraponto interessante
à, como nomeia a Profa. Dra. Lúcia Santaella (PUC/SP), “cultura da velocidade e das
redes”, e que atraia adolescentes e jovens tanto quanto os atrai o dinamismo provocado
pela “explosão da comunicação móvel”, oportunizando-lhes, dessa forma, um outro
olhar sobre a realidade, que não o do universo acelerado do mundo digital. Que esse
“outro olhar” se constitua em “porta” para a contemplação, a reflexão, e até mesmo para
a dicção, comunicação oral, “num outro tempo-espaço”, que não o das telas iphones,
ipads, desktop, etc, no intuito tanto de preservarmos a importante e necessária função
humanizadora e crítica da leitura quanto de respeitarmos (mas não entendermos como
único possível) o contexto em que estão inseridos os estudantes na atualidade.
Acreditamos que, assim, torna-se possível garantir ao indivíduo o acesso ao
conhecimento de si próprio, do outro (seu próximo) e do mundo, levando-o a
desenvolver a capacidade de lançar um olhar afetuoso, mas, ao mesmo tempo, crítico,
sobre a realidade circundante, e de modificá-la para melhor.
Dessa forma, a finalidade desta proposta é a de promover a arte da contação
de histórias como possível grande estimuladora para a prática da escrita e da leitura /
literatura na sala de aula. O grande anseio, portanto, é instigar os estudantes à leitura
dos textos clássicos, proporcionando-lhes momentos de análise, reflexão e comparação
entre pensamentos, ideias, costumes, linguagem de épocas distintas, num instigador
processo criativo, percebendo a literatura como uma forma de melhor compreensão da
realidade por meio de outra possibilidade de interação social, que não apenas a da era
digital com seus telecomandos.
Salienta-se que sua implementação possibilitará o diálogo com outras áreas do
conhecimento, como Arte, História, Geografia, Sociologia, Filosofia, entre outras, e
permitirá a parceria com o Curso Técnico de Arte Dramática, ofertado pelo Colégio
Estadual do Paraná.
O diálogo com a disciplina de Arte e com o Curso Técnico de Arte Dramática se
efetivará pela própria dinâmica do trabalho, que desencadeará todo um processo de
sensibilização humana, artística e corporal, bem como, em relação especial ao primeiro
conto – “O retrato Ovalado” - a reflexão acerca da comunhão entre o artista e sua
obra de arte (“criador e criatura”).
História e Geografia participarão desse “diálogo” porque, nas atividades de
análise e reflexão dos textos estará presente, em todo o percurso, a realidade física e
cultural da época retratada (século XIX), abrindo-se, dessa forma, um caminho para o
estabelecimento de comparações entre diversos elementos de períodos distintos
(“aquele tempo” e o “agora”), como: meios de transporte em acordo com os aspectos
geográficos das regiões retratadas, relações pessoais e sociais a partir de um repertório
de pensamentos e crenças do período, aspectos políticos e de hierarquização da
sociedade da época, entre outros.
A Sociologia e a Filosofia “conversarão” durante todo o processo, no sentido de
proporcionarem elementos de reflexão a respeito das relações de poder na sociedade
humana (em especial, no conto “A máscara da morte rubra” ), bem como sobre os
anseios, ilusões, obsessões do ser humano em seu infinito apego à vida e em seu
imenso esforço em atribuir-lhe um sentido, muitas vezes, para além da própria
compreensão humana (como no caso, em especial, dos contos “O retrato ovalado ”,
“Berenice” e “O coração delator” ).
Para tanto, o formato do material idealizado seguirá a proposta de Unidade
Didática 1, e será aplicado em uma turma do 1º ano do Ensino Médio do Colégio
Estadual do Paraná, utilizando-se os contos “O retrato ovalado ”, “Berenice ”, “A
máscara da morte rubra” , “O coração delator ”, de Edgar Allan Poe, escritor norte-
americano do século XIX, para leitura, discussão, análise oral e escrita e leituras
dramatizadas como forma de “ensaio” para a contação de histórias. O texto “O gato
1 É a elaboração que desenvolve um tema, aprofundando-o de forma teórica e metodológica. Compreende um ou mais
conteúdos da disciplina / área em foco, desenvolvidos sob uma perspectiva metodológica. Pode ser destinada aos professores ou aos alunos, mas é indispensável que a discussão proposta inclua o espaço da ação docente. (ver material produzido e organizado pela Equipe da Coordenação de Articulação Acadêmica – SEED/PR – apresentado aos professores por ocasião do II Seminário Integrador – PDE - Turma 2014, a fim de fornecer aos mesmos subsídios teóricos e metodológicos para a elaboração da Produção Didático-Pedagógica).
preto” , do mesmo autor, que, depois de todo o processo de discussão e análise oral
dos elementos que o compõem, será trabalhado ludicamente pela turma toda, em forma
de contação da história para outras turmas do colégio, em várias sessões, no espaço
Salão Nobre.
A escolha de textos desse autor deu-se pela razão de classificarem-se no
gênero “mistério / suspense / fantasia”, muito ao gosto dos adolescentes, e a escolha
da série para o desenvolvimento do projeto explica-se por entender-se que é o início do
Ensino Médio o período em que não é mais possível “adiar” o estudo dos clássicos,
cuja leitura é de suma importância para o “desvendamento” do mundo, em toda a sua
complexidade, e contribui tanto para a consolidação da formação crítica, ética e
intelectual dos estudantes quanto para sua preparação para as séries subsequentes,
que “exigem” leitores em potencial para as inúmeras situações que se colocam diante
deles, dentre elas, a trajetória rumo à vida profissional.
MATERIAL DIDÁTICO E ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS
De certo modo, acho que sempre escrevemos sobre algo que não conhecemos,
escrevemos para dar ao mundo não escrito uma oportunidade de expressar-se
através de nós. Mas, no momento em que minha atenção vagueia da ordem
estabelecida das linhas escritas para a complexidade mutável que nenhuma
frase consegue apreender totalmente, chego quase a entender que além das
palavras há algo que as palavras poderiam significar. (CALVINO, 1998, p. 147).
Apreender um pouco do sentido deste mundo, mesmo que esse sentido nos
escape para além das palavras e frases, e sempre acrescente novas carências de
sentido (que novas palavras e frases tentarão apreender), e ir, incansavelmente, nesse
movimento, não é mera pretensão, é uma necessidade de quem se sente parte
integrante de um cosmos cheio de possibilidades e de mistérios, e a intenção
permanente de desvendá-los é o supremo ato de conhecer-se.
É com esse movimento em busca da compreensão da realidade e da vida por
meio do que é dito e escrito e recriado que este trabalho, modestamente, busca
contribuir; é esse pensamento que tentamos reproduzir neste material didático e nos
respectivos encaminhamentos metodológicos.
Por isso, para o alcance dos objetivos deste projeto de intervenção pedagógica,
propomos a sequência de ações detalhadas abaixo. Salienta-se que a conclusão de
cada momento ou etapa deve ocorrer pela observância do professor quanto à
compreensão satisfatória dos conteúdos, pelos estudantes, e não pela cronometragem
do tempo.
Assim também, a avaliação dos alunos deverá ser realizada de forma
concomitante à realização das atividades propostas, através da observação do seu
envolvimento em todo o processo e da compreensão dos conteúdos trabalhados.
1ª atividade
Então, digo: somos seres que contam e ouvem histórias (...) Podemos avançar um pouco mais e dizer: o ser humano é não apenas um ser que conta histórias e ouve histórias, mas sobretudo é um ser que faz história. Fazer história é a suprema audácia dos humanos. (SANT’ANNA, 2011).
É inegável a importância das narrativas orais e escritas na trajetória humana; é
por meio delas que o ser se imortaliza, percebendo toda a essência da vida no seu
percurso histórico. Essa percepção acerca do mundo e dos indivíduos que o habitam é
fundamental para que se possa “encarar” a existência com mais sabedoria,
compreendendo não só os próprios sentimentos, sensações e reações diante das
inúmeras situações que se colocam diariamente na vida, como também demonstrando
entendimento quanto aos sentimentos de outrem, tornando-se capaz, nesse movimento
de contar, ouvir e de “fazer história”, de desenvolver atitudes éticas e de compaixão na
convivência com o próximo.
Dessa forma, as primeiras aulas de implementação desta proposta serão
expositivas-dialogadas sobre o Gênero Narrativo, por meio de “roda de conversa”.
Assim, propomos algumas questões para subsidiar a discussão junto aos
alunos. Para assegurar a observação participativa do professor, a fim de que as
subjetividades não se percam e de se preservar a memória dessas “rodas de conversa”,
utilizaremos um gravador para o registro da participação oral dos estudantes.
PENSANDO A HISTÓRIA E AS HISTÓRIAS
Desde o princípio dos tempos, o ser humano conta e ouve histórias.
Qual é o papel que esse ato de “contar” exerceu e e xerce na
formação da história humana? (imortalização do ser, percepção da
essência humana, conhecimento de identidades e cult uras,
desenvolvimento de atitudes de compreensão e compai xão na
convivência com o próximo, autoconhecimento,..).
O mundo seria o mesmo se histórias não fossem conta das? Tente
fazer uma análise do mundo sem o ato de contar hist órias.
Professor(a): a idéia é “seduzir” os estudantes para o mundo fantástico das histórias, mostrar, através da análise, não só do que está explícito, mas também do que se encontra nas entrelinhas, a respeito de personagens, narrador, espaço, tempo, condução da trama, o quanto elas oferecem para a compreensão do ser humano e do mundo. Tudo isso de forma espontânea, dialógica, em que a experiência de leitura dos alunos também seja levada em conta, e se constitua em ponto de partida para o aprofundamento da discussão.
O nosso cotidiano está permeado de histórias ouvida s, contadas,
repassadas... Quando algum(a) amigo(a) lhe conta um a história,
quais são os detalhes que você procura saber para q ue ela faça
sentido para você? (elementos de uma narrativa: nar rador,
personagens, tempo, espaço, enredo)
E se seu(sua) amigo(a) não souber, ou não quiser co ntar nada a
respeito de alguns elementos, como você preenche es sa lacuna
para que a história “se complete” na sua cabeça?
Na sua experiência de leitor(a), com que tipos de n arrador você se
deparou? De qual(ais) você tem melhor lembrança? Po r quê?
(explorar narração em 1ª e 3ª pessoa; onisciência d o narrador;
tempo utilizado pelo narrador: cronológico, psicoló gico; técnica
narrativa, importância dada ao ‘espaço’ pelo narrad or,..).
O mundo das histórias, contadas na forma oral ou es crita, está
repleto de personagens. Pensando nesse termo - “per sonagens” - o
que, na essência, elas representam?
Ainda na sua caminhada de leitor (a), com que perso nagens você se
deparou? Qual (is) o (a) fascinaram mais? Por quê? (explorar
personagens planas-previsíveis e redondas–imprevisí veis,
enigmáticas).
Com que tipo de histórias você mais se identifica – curtas, longas;
de suspense, amor, aventura, fantásticas,..? O que elas provocam
em você para ter sua preferência? (explorar conceit o de conto,
crônica, romance, novela...).
Se você fosse ouvir uma história, como ela deveria ser contada para
prender sua atenção? (dar um início a noções de ora tória e
dramatização).
2ª atividade
Formar uma roda de leitura, em que todos os alunos da turma participarão da
leitura, em voz alta, do conto “O retrato ovalado” , de Edgar Allan Poe. A seguir, nova
leitura do texto deverá ser realizada pelo(a) professor(a).
3ª atividade
Levando-se em consideração que, como afirma Benjamin Abdala Junior (1995),
“a análise literária da narrativa envolve o conhecimento de seus elementos estruturais,
ou seja, o domínio de determinadas categorias (conceitos) da narrativa”, e que “o
domínio desses conceitos básicos possibilita ao aluno uma análise mais rigorosa, com
observações críticas mais bem fundamentadas”, mas, também, que o intuito não é
seguir receitas para análise literária, como costumam figurar nos livros didáticos, uma
vez que
Esses livros esquemáticos têm a ambição, muitas vezes, de resolver todos os casos, e acabam por levar a análises “simplistas”. É muito frequente o aluno apegar-se a essas receitas e acreditar que as utilizando estará fazendo uma análise literária. Ele não entende, nesses casos, que a análise torna necessária a argumentação, na qual ele deve procurar objetivar (pela coerência de seus argumentos e rigor na descrição textual) um ponto de vista particular. A análise literária deve, pois, levar o aluno a objetivar suas ideias. E isso não será possível se ele “aplicar” mecanicamente receitas, modelos de análise. (ABDALA JUNIOR, 1995)
reafirmamos a importância de que esta e outras narrativas incluídas para análise neste
material pedagógico sejam extenuamente exploradas, “dissecadas”, todavia, sem que
se apliquem, para isso, “mecanicamente receitas, modelos de análise”.
Por isso, na seqüência, a proposta é desenvolver uma “conversa” sobre o conto
lido - “O retrato ovalado” - que deverá ser instigada pelo(a) professor(a), para a
compreensão do texto e de seu momento de produção (contexto histórico, informações
sobre o autor) e para a exploração de seus elementos constituintes, em que ganhará
atenção especial o elemento “narrador”.
4ª atividade
Enquanto espero que o mundo não-escrito se torne mais claro, sempre há uma
página escrita aberta diante de mim, onde posso voltar a mergulhar: faço-o sem
demora e com a maior satisfação, porque ali, pelo menos, mesmo que só
compreenda uma pequena parte do todo, posso alimentar a ilusão de que
mantenho tudo sob controle. (CALVINO, 1998, p. 141).
É inegável a importância da análise escrita do universo já explorado oralmente
em um texto. É nesse momento que o que foi “dito” pode ser mais largamente
compreendido e ganha maior clareza e expressividade, ampliando, dessa forma, a
“cumplicidade” do narrador e sua história com o leitor.
Professor(a): é de extrema importância que a análise das narrativas siga a forma de “exploração” dos elementos que formam o entrelaçamento da história, e que o meio utilizado para essa “exploração” seja a conversa em roda, natural, espontânea, em que os educandos troquem suas impressões, ideias e conclusões sobre a trama com os demais componentes da roda, sendo, nessa “prosa”, “conduzidos” por você á percepção do “todo” por meio da instigação à análise das “partes” (ambiente, narrador, ritmo narrativo, personagens, tipo de vocabulário utilizado pelo narrador, e tudo o mais que o texto suscite).
Portanto, a seguir, serão propostas questões escritas a respeito do que foi
explorado oralmente no conto “O retrato ovalado”, que serão realizadas individualmente
e cujas respostas serão retomadas, na forma oral, como conclusão da atividade.
EXPLORANDO O CONTO “O RETRATO OVALADO”
Em que tempo parece ocorrer a história? Como chegar am a essa
conclusão, já que esse dado não está explícito no c onto?
Que informações temos sobre o espaço em que ocorrem os fatos
narrados?
Que informações existem, explicitamente, no conto, a respeito do
narrador?
Como vocês perceberam, na história, há muitas coisa s que “não
são ditas” sobre o narrador. Procurem criar, em sua imaginação e,
em seguida, descrever, a pessoa que habita esse nar rador. Como é
ele fisicamente? Como é sua vida, sua rotina? O que faz
profissionalmente para viver? Quais são seus traços de
temperamento e de caráter? Quais / Quem são suas pa ixões?
“Devido talvez ao delírio que me produzia a alta fe bre, senti crescer
dentro de mim um grande amor por aqueles quadros qu e, como
prodigioso e estranho museu, tinha diante dos olhos .” Vocês
Lembrete: a presença de dicionários na sala de aula deve ser permanente!
consideram que essa passagem do texto já carrega em si um
elemento importante para o desenrolar da história? Expliquem.
Em que momento a história narrada passa do ponto de vista de 1ª
para 3ª pessoa? Quem vocês pensam ser o “novo narra dor”? Por
quê?
“Ele, apaixonado, estudioso, amava, mais do que sua esposa, a sua
Arte...” Por que, nesse fragmento, assim como no de correr do que é
relatado na sequência, a palavra “Arte” está escrit a com letra
maiúscula? Que características do personagem pintor ela reforça,
as quais são esmiuçadas na sequência da narração?
Como é descrita, na narrativa, a jovem esposa do ar tista?
Pela leitura que vocês fizeram do conto, qual é a p assagem que
contém o ponto de mais alta tensão (o clímax) da hi stória?
“ ‘É a vida, é a própria vida que aprisionei na tel a!’ Levando em
consideração esse fragmento, bem como uma das passa gens que o
antecede: “E não queria ver que as cores que gravav a na tela, ele as
ia tirando das faces daquela que estava sentada à s ua frente.”,
façam um comentário sobre o desfecho da história.
Pela sua experiência de leitura, há alguma relação entre a história
do conto “O retrato ovalado”, de Edgar Alan Poe, e alguma outra
obra, de outro autor(a), que vocês leram, ou de que ouviram falar?
Qual(ais)? Em que sentido se dá a possível relação?
Após a leitura e a análise oral e escrita do conto “O retrato
Ovalado”, é possível conjeturar que ele se constitu i em uma
metáfora para situações presenciadas ou vivenciadas na realidade?
5ª atividade
A LIBERDADE, SEGUNDO O SENSO COMUM, É UM DIREITO INALIENÁVEL de todo ser humano. Mas a luta para que ela seja valor imprescindível nas relações sociais, políticas e econômicas é um exercício que se perpetua na contemporaneidade. (...) Contar uma história, para mim, é sempre um exercício em liberdade... Estar diante do outro e falar para o outro do outro que habita em si é o grande gesto político, artístico e ético que um contador de histórias pode fazer num mundo de descasos e banalizações. (...) A liberdade, antes de tudo, é um jogo de seduções. (DINIZ, 2011)
Assim, como “um exercício em liberdade”, na sequência, propor aos alunos
a “arte da contação de histórias” como forma de deixar-se envolver e “seduzir” por
histórias escritas no século XIX e também levar essa “sedução” a muitos outros
estudantes do colégio, disseminando esse prazer e encarando-o, principalmente, como
um ato de troca, como um ato político e social que visa à aproximação e ao
fortalecimento da relação com o outro.
Professor(a): neste momento, deverão ser trabalhadas com os educandos, coletivamente, as principais técnicas de oratória e dramatização, como o uso adequado da voz, a respiração, a entonação e a projeção da voz, o contato visual com a platéia, a expressão corporal (o corpo também “fala”), em que o mesmo conto lido e discutido anteriormente (O retrato ovalado) servirá como objeto de contação de história por você, a título de exemplificação, e como primeiro ensaio para os alunos.
6ª atividade
Análise e interpretação representam os dois momentos fundamentais do estudo do texto, isto é, os que se poderiam chamar respectivamente o “momento da parte” e o “momento do todo”, completando o círculo hermenêutico, ou interpretativo, que consiste em entender o todo pela parte e a parte pelo todo, a síntese pela análise e a análise pela síntese. (CANDIDO, Antonio. O estudo analítico do poema. São Paulo, FFLCH/Universidade de São Paulo, s.d. p. 20.) (ABDALA JUNIOR, 1995.)
Dessa forma, nesta atividade, dividir a turma em 3 grupos de,
aproximadamente, 10 alunos cada. Entregar a cada grupo um conto de Edgar Allan
Poe, a saber: “Berenice ”, “A máscara da morte rubra ” e “O coração delator . O
trabalho a ser realizado pelos três conjuntos de alunos compreenderá três partes.
A primeira constituir-se-á na compreensão oral do texto, por meio de leitura e
discussão, em que serão “desvendados” os elementos constituintes da narrativa, dando
enfoque especial à construção do enredo e à figura do narrador.
Na segunda parte, cada grupo de alunos subdividir-se-á em dois grupos, para
os quais serão entregues questões escritas referentes ao conto lido e discutido no
“grande grupo”. Após a realização da atividade escrita, os alunos voltarão ao “grande
Professor(a): o importante, aqui, é que os estudantes leiam e discutam o texto em liberdade, procurando extrair dele o máximo de compreensão de todos os elementos e situações, bem como perceber o que não está escrito explicitamente, mas insinuado pelo narrador e pela técnica narrativa.
grupo”, onde discutirão as questões e suas respectivas respostas, que, na sequência,
deverão ser apresentadas à turma, na forma oral.
Para tanto, propomos as questões escritas abaixo.
DESVENDANDO OS CONTOS “BERENICE”, “A MÁSCARA DA MOR TE
RUBRA” E “O CORAÇÃO DELATOR”
Grupo 1
Conto “Berenice”
Questões escritas para o grupo 1.1
Analisando-se a descrição do espaço principal em qu e se passa a
história (biblioteca da mansão), podemos afirmar qu e ele está
intimamente ligado à personalidade do personagem pr incipal e
narrador da trama, Egeu. Comentem essa relação.
É possível afirmar que, no 3º parágrafo, existe a i nsinuação de
algo transcendental? Expliquem, utilizando, para is so,
fragmento(s) desse parágrafo, com o(s) devido(s) co mentário(s).
“...é maravilhoso como total inversão se operou na natureza de
meus pensamentos mais comuns.” (final do 4º parágra fo). O que
Egeu quer dizer com “total inversão”? Isso teria al guma relação
com o espaço (biblioteca) em que o personagem-narra dor passou
sua infância “de má saúde”, tendo se encontrado lá, ainda, no
“apogeu da maturidade”?
Como Egeu nos apresenta Berenice?
“E depois – depois tudo é mistério e horror, uma hi stória que não
deveria ser contada. Uma doença, uma fatal doença s oprou como
o simum sobre seu corpo.” De que doenças passou a s ofrer
Berenice? Como o narrador descreve as transformaçõe s que se
operaram em sua prima a partir disso?
Ao mesmo tempo em que fala da doença que atingiu a prima, o
narrador-personagem também se confessa ainda mais d oente que
antes. Em que consiste a monomania de que alega sof rer?
Como vocês interpretam o pedido de casamento de Ege u a
Berenice, uma vez que ele chega a afirmar, em deter minado
momento da narrativa, que “Nunca, jamais a amara du rante os
dias mais brilhantes de sua incomparável beleza.”?
Questões escritas para o grupo 1.2
A monomania do narrador encontra, em Berenice, um n ovo objeto
de atenção obsessiva. Qual? Como, intimamente, comp orta-se
Egeu diante da descoberta dessa nova obsessão?
Relate, com suas palavras, como a história evoluiu desde o
surgimento dessa nova obsessão do narrador-personag em
(provocada, segundo ele, pela monomania) até o seu desfecho.
Como vocês percebem o tempo da narrativa? Ele tende mais para
o cronológico ou para o psicológico? Justifiquem.
É possível afirmar que o fato de a história ser nar rada em 1ª
pessoa , ou seja, pelo próprio narrador-personagem Egeu, sem o
pronunciamento direto das outras personagens citada s (criados,
Berenice) torna-a duvidosa? Justifiquem com informa ções e / ou
passagens do próprio enredo que considerarem releva ntes.
Existe um momento na narrativa em que o narrador-pe rsonagem
“conversa” com o leitor. Transcrevam a passagem do texto em
que isso acontece. Qual seria a intenção escondida por trás desse
recurso?
Conversas com o leitor;
narrativas parciais (em 1ª
pessoa) não foram técnicas
usadas no século XIX
exclusivamente pelo norte-
americano Edgar Alan Poe.
Vocês conhecem ou já
ouviram falar de algum autor
brasileiro daquele período
que utilizou esses mesmos
recursos, dentre outros, na
produção de suas obras?
Conversas com o leitor; narrativas parciais (em 1ª pessoa) não
foram técnicas usadas no século XIX exclusivamente pelo norte-
americano Edgar Alan Poe. Vocês conhecem ou já ouvi ram falar
de algum autor brasileiro daquele período que utili zou esses
mesmos recursos, dentre outros, na produção de suas obras?
Grupo 2
Conto “A máscara da morte rubra”
Questões escritas para o grupo 2.1
Professor(a): nesta questão, procurar estimular a curiosidade para a leitura das obras de Machado de Assis, em especial, “Dom Casmurro”, pela semelhança entre os narradores.
Uma das formas de compreensão desse conto é por mei o da
alegoria. Procurem, através de pesquisas, compreend er em que
consiste essa figura de linguagem e expliquem o que descobriram
aos seus colegas de classe.
Compreendido o significado de alegoria, podemos afi rmar que “A
máscara da morte rubra” é um conto alegórico sobre a temática da
vida e da morte? Expliquem sua resposta com element os do próprio
conto, levando em consideração, principalmente, a c aracterização
da personagem do príncipe Próspero, suas decisões e atitudes; o
comportamento das demais pessoas durante o baile; a presença, à
meia-noite, “de um novo mascarado”,...
Vamos pensar: para completar um dia, o sol nasce no leste e morre
no oeste, ou seja, nasce no oriente e se põe no oci dente. O que
essa informação tem a ver com a decoração dos salõe s em que o
baile se realizou? O que podem significar as suas c ores e a ordem
em que elas aparecem?
Questões escritas para o grupo 2.2
E o relógio de ébano? Que simbologia ele pode assum ir no conto?
Por quê? Como as pessoas reagem ao ouvi-lo bater a hora cheia, e
como passam a reagir quando ele para de tocar?
Vocês acreditam que essa reação de que tratamos na questão
anterior é comum, também, em pessoas “reais”, ou se ja, isso faz
parte da própria condição humana? Justifiquem.
O Príncipe Próspero, com seu perfil (pensamentos, a titudes,...)
pode, simbolicamente, representar algum “tipo” pres ente na
realidade contemporânea? Expliquem.
Grupo 3
Conto “O coração delator”
Questões escritas para o grupo 3.1
A história desse conto é narrada em 1ª pessoa, por um narrador
que não diz seu nome, e que, já de início, trava um a “conversa”
bastante intrigante com o leitor, na tentativa de p rovar-lhe algo.
O que ele pretende provar? Para isso, quais os prin cipais
recursos argumentativos utilizados por ele?
Analisando-se o comportamento do narrador-personage m no
decorrer da trama, até o seu desfecho, ele consegue convencer-
nos do que procura nos mostrar com palavras? Justif iquem.
O que, para vocês, representam os olhos de uma pess oa?
O narrador-personagem afirma que amava o velho e qu e nunca
fora insultado ou enganado por ele, porém, decidira matá-lo
porque “Um de seus olhos parecia o de um abutre”. Q ue relação
pode haver entre essa comparação e a sensação que o narrador
alega que os olhos do ancião provocavam nele? Justi fique sua
resposta com algum fragmento da narrativa.
Questões escritas para o grupo 3.2
Vamos pensar na relação caça - caçador? Pelas leis naturais, a
pessoa do narrador seria a caça e o abutre, o caçad or, não é?
Podemos dizer que essa relação, no conto, aparece d e forma
invertida? Expliquem.
Ainda em acordo com a descrição feita pelo narrador de um dos
olhos do velho, a expressão “uma pupila azul clara um tanto
embaciada”, sugere que ele, o ancião, tem catarata, uma doença
muito comum em pessoas mais idosas. Todavia, se for mos
atentar para o significado figurativo da expressão, podemos
perceber que ela pode referir-se à incapacidade que esses olhos
têm de refletirem algo. O que eles podem não conseg uir refletir,
e que, na mente doentia do narrador, provoca sua fú ria, a ponto
de desejar livrar-se “para sempre da sua presença”?
“Dei com três homens que se apresentaram gentilment e como
oficiais de polícia.” Com a chegada dos policiais, é dada, pelo
narrador, ênfase na atuação deles ou a atenção do l eitor
continua sendo atraída para o próprio narrador–pers onagem?
A insanidade, a loucura do narrador-personagem – as sassino
meticuloso, impiedoso e brutal - chegou a tamanha g ravidade a
ponto de ele confundir as batidas de seu próprio co ração
inseguro e amedrontado com o do homem assassinado
querendo denunciá-lo. Como se dá o desfecho da hist ória a
partir dessa “confusão” de sua mente descontrolada?
Na terceira parte, como forma de “ensaio” para o “grand finale” (contação da
história “O gato preto ”, pela turma toda, para várias turmas do colégio), cada conjunto
de alunos preparará uma leitura dramatizada do conto lido e discutido no seu grupo,
procurando, para isso, observar as orientações sobre técnicas de oratória e
dramatização trabalhadas anteriormente.
7ª atividade
A ideia de fazer viver no palco o texto narrativo sem adaptações teatrais fez ressurgir na cena contemporânea a presença do ator-narrador, O Ator Rapsodo. O título aqui alude à própria gênese do ator, a figura dos poetas rapsodos, contadores de histórias da Grécia antiga, detentores da poesia oral que estiveram em cena em vários momentos históricos do teatro. Neste teatro “narrativo” o Ator Rapsodo preserva a voz autoral, sendo o responsável direto pela comunicação. Ele quebra a quarta parede e se projeta do espaço dramático; se distanciando da obra e encontrando o público e, desse espaço de cumplicidade, ele pode narrar, comentar, descrever e até viver os personagens da obra que está encenando. (...) O trânsito livre entre o narrado e o vivido cria um jogo franco com o público, sem ilusões, resultando numa teatralidade viva e instigante na qual o espectador é convocado como leitor, embarcando num exercício criativo de imaginação onde ele completa as imagens e os sentidos do texto. (BRANT, 2011, p. 67).
Assim, como primeiro passo
para que a turma faça “viver no palco o
texto narrativo”, formar nova roda de
leitura, momento em que deverá ser
apresentado aos alunos o conto “O gato
preto ”, também de Edgar Allan Poe,
cuja leitura, em voz alta, deverá ser
iniciada pelo(a) professor(a) e
prosseguir pelos educandos, seguida da
“conversa” sobre a história, com o
objetivo de exploração oral de todos os
elementos quecontribuem para o sentido do texto. Novamente, a atenção deverá estar
focada, principalmente, na figura do narrador e na forma como ele conduz o enredo.
8ª atividade
Professor(a):o objetivo dessa leitura e “conversa” sobre o texto é “dissecá-lo”, entrar em profunda comunhão com a história narrada, como se todos fizessem parte indissociável dela, e, ao transmiti-la a outrem, façam, também, com que o espectador se “perceba sem perceber” dentro dela.
Com um misto de alegria e gravidade os velhos narradores não perdem nunca a relação com seus ouvintes, não para agradá-los, mas para partilhar com eles as qualidades sagradas do texto. Os grandes narradores nunca perdem o contato com a grandeza do mito que estão fazendo viver: “Tem um ouvido voltado para o seu interior e outro para fora.” Assim Brook sintetiza a maior lição dos velhos narradores: estar em dois mundos ao mesmo tempo. O narrador artístico sabe transitar por esses dois mundos e sabe também que ele é responsável por criar um terceiro mundo, imaginário. O espaço de construção conjunta da história, espaço de comunhão com os indivíduos da platéia onde de fato toda ação do conto acontece. A terceira margem da cena. (BRANT, 2011).
A atenção do(s) contador (es) de histórias deve estar permanentemente voltada
ao objetivo de partilhar a história com os futuros espectadores, de criar uma relação de
tal profundidade entre narrador (es) / história / espectadores que estes se tornem tão
íntimos da trama a ponto de sentirem-se pertencentes a ela. A ideia, portanto, é a de
levar os espectadores a “instalarem-se” na história e deixarem-se envolver
completamente por ela, a ponto de, naquele momento, não perceberem a existência de
uma outra realidade, senão aquela da qual ora fazem parte.
Para isso, não basta apenas a escolha de elementos visuais e físicos que
comporão a cena, é necessária, primordialmente, a total cumplicidade com o texto
objeto da narração, é necessário, como afirma José Mauro Brant (2011), o
“compromisso quase sagrado com o texto e com a sua transmissão”.
Para que, finalmente, efetive-se o ato cúmplice da contação de histórias,
optamos em transmitir a narrativa com fluidez e “sem ilusões”, ou seja, levando até o
público a história na íntegra, sem adaptações, com toda a originalidade dos elementos
que a compõem, seja quanto aos personagens, com seu linguajar, atitudes / reações,
pensamentos, ideias, seja quanto ao tempo e espaço retratados.
Dessa forma, esta atividade consiste em combinar, em conjunto (professor(a) /
alunos), uma estratégia de contação da referida história, na íntegra, sem adaptação de
vocabulário (ou seja, a história original), em que serão tratados detalhes como: ritmo e
tom da contação, figurino e maquiagem a serem utilizados, possíveis sons de
instrumentos musicais a serem incorporados na apresentação, tipos de movimentação
no espaço (Salão Nobre do colégio), divisão do texto (partes por aluno ou por grupos de
alunos – coro), “marcação de palco” e outros aspectos que, no momento, surgirão.
Assim, o que almejamos é que, ao “distanciar-se da obra e encontrar o público”,
a turma, com a mesma intensidade, diminua a distância entre o narrado e o vivido, e
seja capaz de levar as pessoas expectadoras à sensação de pertencimento ao que está
sendo recriado, “descobrindo”, ao mesmo tempo, sua própria essência.
9ª atividade
A memória (e não só a memorização) age como cocriadora do texto que é incorporado pelo narrador. Assim o conto vira carne, sangue, gesto, olhar, escuta, suor, respiração; ou seja, corpo; e especialmente, voz, sua principal emanação. (BRANT, 2011, p. 67, grifo do autor)
Compreendido o conto e traçado um “esboço” da contação da história, será
hora de ensaiar. Primeiramente, com o texto em mãos, puxando pela memória todo o
desenrolar da trama, com seus detalhes, sutilezas, suspenses, “armadilhas”, até a
“familiarização” completa com o mesmo, chegando à sua memorização. Depois, já com
as partes assimiladas pela memorização, sem a presença do texto escrito, a história
será exaustivamente ensaiada, até chegar à naturalidade e fluidez da narração oral.
10ª atividade
Professor: importante, nesse “combinado” sobre a contação da história, é dar voz aos alunos, que devem sentir-se, efetivamente, agentes da preparação do evento. Este deve ser um momento de interação e cumplicidade.
Oriundo de uma sociedade em que a oralidade tem papel secundário, o contador de histórias urbano elege seu acervo a partir das muitas possibilidades que sua história de leituras oferece, textos autorais, poesias, crônicas e também as histórias da tradição oral que reencontramos nos livros. Afinal ler é sempre escutar uma voz. Ao escolher um texto para contar o narrador vira dono desta voz. Ele tem o dom de saber escutar e sentir os movimentos subjacentes ao texto. As leis da cena ajudam no processo artístico, administrando essas reverberações e as transformando em algo expressivo. (...) Essa conquista se deve à sua capacidade de ver e ouvir a sua audiência e se entregar para um jogo onde o público não é mero espectador e sim interlocutor, tudo isso sem perder o fio da história. Sua autoridade cênica é absoluta e vem do seu compromisso quase sagrado com o texto e com a sua transmissão. (BRANT, 2011).
Será no palco, finalmente, que a voz do texto, “roubada” pelo narrador / contador da história, encontrará seu público; não um público inerte e inexpressivo, mas sim um partícipe da trama, que, acompanhando a movimentação que transborda do conto para a vida, sentir-se-á, também, vivo e “enredado” pela magia de sua transmissão.
SUGESTÃO DE CRONOGRAMA PARA O DESENVOLVIMENTO DAS A TIVIDADES
1ª atividade 2 aulas
2ª e 3ª atividades 2 aulas
4ª atividade 2 aulas
5ª atividade 1 aula
6ª atividade 4 aulas
7ª atividade 2 aulas
8ª atividade 2 aulas
9ª atividade 13 aulas
10ª atividade 4 aulas
Assim, como conclusão desta proposta, a contação da história do conto “O gato preto”, de Ed gar Allan Poe, será apresentada no espaço Salão Nobre d o Colégio Estadual do Paraná, em, pelo menos, quatro sessões, para as quais serão convidadas, como espectadoras, turmas de alunos de 1ºs e 2ºs anos do Ensino Médio .
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABDALA JUNIOR, B. Introdução à análise da narrativa : livro do professor. Coleção margens do texto. São Paulo: Scipione, 1995. BRANT. J.M. A terceira margem da cena. In: PRIETO, B. (Org). Contadores de histórias: um exercício para muitas vozes. 1. ed. Rio de Janeiro: s. ed., 2011. Disponível em http://www.historias.interativas.nom.br/lilith/aula/leitura/contadoresdehistorias.pdf. Acessado em 24/03/2014. CALVINO, ÍTALO. A palavra escrita e a não escrita. In: MORAES FERREIRA, MARIETA DE e AMADO, JANAÍNA. (Org). Usos & abusos da História oral. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1998. DINIZ. J. Vozes, corpos e textos nos vãos da cidade. In: PRIETO, B. (Org). Contadores de histórias: um exercício para muitas vozes. 1. ed. Rio de Janeiro: s. ed., 2011. Disponível em http://www.historias.interativas.nom.br/lilith/aula/leitura/contadoresdehistorias.pdf. Acessado em 24/03/2014. SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DO PARANÁ. PDE. Programa de Desenvolvimento Educacional. Documento – síntese – II Seminário Integrador – Turma 2014. POE, E. A. Histórias extraordinárias. 10 reimp. Trad. José Paulo Paes. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. SANTAELLA, L. Hipermídia e transmídia, as linguagens do nosso tem po. 2012. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=vzlhvVHLE1s. Acesso em: 27/03/2014, às 9h01min e às 13h54min. SANT’ANNA, A. R. de. Contação de estória: vida e realidade. In: PRIETO, B. (Org). Contadores de histórias: um exercício para muitas vozes. 1. ed. Rio de Janeiro: s. ed., 2011. Disponível em http://www.historias.interativas.nom.br/lilith/aula/leitura/contadoresdehistorias.pdf. Acessado em 24/03/2014. .