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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE SÃO JOSÉ CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
RESPONSABILIDADE CIVIL DOS ESTACIONAMENTOS PELOS DANOS OCORRIDOS NOS SHOPPING CENTERS
IZABELITA RUBIK DE MATOS
São José – 2007
2
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE SÃO JOSÉ CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
RESPONSABILIDADE CIVIL DOS ESTACIONAMENTOS PELOS DANOS OCORRIDOS NOS SHOPPING CENTERS
IZABELITA RUBIK DE MATOS
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Msc. Flaviano Vetter Tauscheck
São José – 2007
3
AGRADECIMENTO
À Deus, por possibilitar e acompanhar a
realização de meus objetivos e por tudo que
já me proporcionou.
À minha família, especialmente, aos meus
pais, Maria Aparecida Rubik de Matos e
Onildo José de Matos, e meu irmão Diego
Rubik de Matos por todo incentivo e apoio na
minha vida.
Às minhas amigas que tive o prazer de
conhecer no decorrer da faculdade e a
minha amiga especial de todas as horas
Taciane Cardozo da Silva.
E a todos aqueles, que, de alguma forma,
contribuíram para a realização e conclusão
dessa pesquisa.
4
DEDICATÓRIA
À minha mãe, Maria Aparecida Rubik de
Matos, e ao meu pai Onildo José de Matos,
pelo incessante estímulo e esforço pela
minha formação moral e intelectual. Fica
aqui o meu eterno muito obrigada!
5
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
São José, 12/06/2007
Izabelita Rubik de Matos Graduando
6
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduando [a] Izabelita Rubik de Matos, sob o
título Responsabilidade Civil dos Estacionamentos de Shopping Centers, foi
submetida em 12/06/2007 à banca examinadora composta pelos seguintes
professores: Flaviano Vetter Tauscheck (Orientador), Carlos Gonçalves da Luz, e
Sérgio Ramos é aprovada com a nota
São José, 12/06/2007
Msc. Flaviano Vetter Tauscheck Orientador e Presidente da Banca
Elisabete Wayne Nogueira Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica
7
RESUMO
O crescimento progressivo dos casos de furto de veículos, ou danos neles ocorridos, em estacionamentos, nos quais não se consegue descobrir quem foi o causador direto do prejuízo, leva à reflexão sobre se o estabelecimento comercial, que oferece área de parqueamento aos seus clientes, deve arcar com o ônus dessa sua atividade, e reparar o prejuízo. O Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078, de 11 setembro de 1990, foi criado em razão de expressa previsão constitucional, trazendo importantes inovações para o ordenamento jurídico brasileiro. O objetivo primordial é a proteção dos consumidores nas relações de consumo. Umas das principais inovações foi a criação de um microssistema de responsabilidade civil próprio para os casos tutelados pelo Código de Defesa do Consumidor, sendo que esta modalidade de responsabilidade civil é objetiva, imputando ao estabelecimento comercial o dever de indenizar os danos ocorridos nos veículos estacionados nos parqueamentos do estabelecimentos de shopping centers. Será abordado os conceitos e teorias relativos ao direito do consumidor. Em seguida, são apresentadas os principais questionamentos acerca da responsabilidade civil em geral. E para finalizar será abordado sobre a responsabilidade dos estabelecimentos comerciais pelo furto de veículos, e dano neles ocorridos, em seus estacionamentos, independente da idéia de culpa, seja pelo inegável interesse econômico na prestação desse serviço, seja pela potencial lesividade inerente a esse serviço, que são motivos suficientes para impor a obrigação de suportar os ônus resultantes dos eventos danosos inerentes ao processo produtivo ou distributivo do estabelecimento comercial.
8
SUMÁRIO RESUMO.................................................................................................................7 INTRODUÇÃO.........................................................................................................9
1. CONSIDERAÇÕES SOBRE O DIREITO DO CONSUMIDOR....................................11
HISTÓRICO................................................................................................................11
O DIREITO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NO BRASIL........................................13
RELAÇÃO DE CONSUMO.........................................................................................16
Sujeitos da Relação de Consumo.........................................................................18
1.3.1.1Conceito de Consumidor.....................................................................................18
1.3.1.2Conceito de Fornecedor.......................................................................................22
Objeto da Relação de Consumo............................................................................24
Produto....................................................................................................................24
Serviço.....................................................................................................................26
2. RESPONSABILIDADE CIVIL......................................................................................29
CONCEITO..................................................................................................................29
RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA..................................................................31
RESPONSABILIDADE CIIL OBJETIVA.......................................................................33
PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL..................................................36
RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL.....................38
DAS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE.......................................................40
3. RESPONSABILIDADE DOS ESTACIONAMENTOS DE SHOPPING
CENTERS..........................................................................................................................45
3.1CARACTERIZAÇÃO DO CONTRATO “DE ESTACIONAMENTO EM SHOPPING
CENTERS”.........................................................................................................................45
3.1.1 Contrato Acessório.................................................................................................45
3.1.2 Contrato de Adesão................................................................................................46
3.1.3 Contrato de Depósito nos Estacionamentos.......................................................48
3.2 RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.............................................................................51
3.3 INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.............................................................................53
3.4 RESPONSABILIDADE OBJETIVA DOS ESTACIONAMENTOS DE
SHOPPINGS......................................................................................................................57
CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................60 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................64
9
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objeto, a “responsabilidade
civil dos estacionamentos pelos danos ocorridos nos shopping centers”,
verificando se o estabelecimento comercial pode ser responsabilizado pelo furto
de veículos, e os danos ocorridos, em seus estacionamentos, em que
circunstâncias, e sob quais fundamentos. Para isso, serão apresentadas as
teorias existentes sobre o tema, e discutidas as propostas doutrinárias e
jurisprudenciais de fundamentação da responsabilidade civil, comprovando-se,
por fim a responsabilidade objetiva dos estabelecimentos comerciais nesses
casos.
O tema é atual e relevante, visto que, os empreendimentos
denominados shopping centers são relativamente novos no País, não tendo
normas regulamentadoras devidamente sedimentadas, porém merecedoras de
pesquisa.
Para o objetivo proposto, utilizar-se-á o método indutivo,
desenvolvendo-se a análise a partir de pesquisa bibliográfica e documental no
campo do Direito Civil. Estruturou-se o trabalho em três capítulos. O primeiro trata
de algumas considerações sobre o Código de Defesa do Consumidor, fazendo
um breve histórico sobre seu surgimento e desenvolvimento durante os anos,
discorrendo ainda, sobre a caracterização da relação de consumo, por meio dos
dispositivos que estabelecem os sujeitos e objetos dessa relação.
No segundo capítulo versa sobre responsabilidade civil,
conceituando a responsabilidade subjetiva e a responsabilidade objetiva,
apresentando também os pressupostos da responsabilidade civil, abordando a
responsabilidade contratual e extracontratual, bem como as excludentes da
responsabilidade civil, verificando, portanto, as situações e classificações que
ensejam a responsabilidade civil.
No terceiro capítulo, examina-se mais detidamente a
questão da responsabilidade civil dos estabelecimentos denominados shopping
10
centres,, demonstrado sua caracterização na relação de consumo, ou seja, trata-
se de contrato de adesão, contrato acessório e contrato de depósito, além disso,
aborda-se a responsabilidade solidária dos que guardam o veículo, a inversão do
ônus da prova em face da fragilidade do consumidor e a efetiva obrigação do
estacionamento de indenizar ao proprietário do veículo que ali se encontrava.
Importante frisar que o presente trabalho não está voltado a
somente estabelecer se há ou não responsabilidade civil dos estabelecimentos
comerciais nos casos indicados. Procurou-se estruturar o estudo de forma a
apresentar os fundamentos, ou seja, o porquê da responsabilização, para
contornar uma dificuldade encontrada nas leituras empreendidas, que é o conflito
entre fundamentos a que os operadores jurídicos dão margem, alicerçando suas
decisões ora na culpa, ora no risco, isso quando não simultaneamente nas duas.
11
I CONSIDERAÇÕES SOBRE O DIREITO DO CONSUMIDOR
1.1 HISTÓRICO
O Direito do Consumidor é uma matéria relativamente
recente. Teve seu surgimento com o ramo do Direito, sobretudo, na metade do
século passado (século XX). Porém, indiretamente encontram-se próximo deste
segmento do Direito presente, de forma esparsa, em normas das mais diversas,
em várias jurisprudências e, acima de tudo, nos costumes dos mais variados
países.
Até meados do século XVIII, consumidor e fornecedor
deparavam-se em condições de eqüidade. A produção era artesanal, envolvia
apenas membros da família e poucos operários na confecção dos produtos. O
consumidor geralmente adquiria as mercadorias diretamente do produtor, o que
contribuía sensivelmente para a diminuição dos vícios ou defeitos. Deste modo, o
consumidor tinha ciência do produto que estava colocando no mercado, e o
fornecedor sabia da procedência do produto que estava comprando1.
A Revolução Industrial no final do século XVIII marcou o
início da massificação, em outras palavras, trata-se da fabricação de produtos e
oferta de serviço em massa, de maneira uniforme, com objetivo fundamental de
reduzir o custo da produção, atingindo uma parcela maior de consumidores e,
certamente, aumentando o número de consumidores, para que os fornecedores
possam auferir maiores lucros na atividade essencialmente produtiva2.
Esta evolução trouxe vários progressos para a humanidade,
o mercado nacional e internacional cresceu de um modo impressionante e com tal
1 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor. São Paulo: LTr, 2002. p.25.
2 TEIXEIRA, Silvio de Figueiredo. Revista dos tribunais. n. 43. São Paulo. Revista dos Tribunais,
2003. p. 69.
12
evolução nasceram grandes multinacionais ou mesmo empresas nacionais de
grande porte, com sua produção em grande escala3.
Diante desta situação, o consumidor passa a ser parte
vulnerável da relação de consumo, frente a grandeza das empresas, o que não
significa dizer que é economicamente mais fraco, porém, nesta relação o
consumidor esta em desvantagem, pois o fornecedor ocupa posição
estrategicamente dominante. Desencadeando assim, um processo de proteção ao
consumidor-população monopolizado pelo Estado4.
Sobre o assunto, Filomeno, mencionando o Professor Miguel
Reale, ensina que:
O Estado deve sempre ter em vista o interesse geral dos súditos,
deve ser sempre uma síntese dos interesses tanto dos indivíduos
com dos grupos particulares [...] se considerarmos, por exemplo,
os vários grupos organizados para a produção e circulação das
riquezas, necessário é reconhecer que o Estado não se confundir,
nem pode se confundir, com nenhum deles, em particular,
porquanto cabe ao governo decidir segundo o bem comum o qual,
nessa hipótese, se identifica com o interesse geral dos
consumidores [...] a autoridade do Estado deve manifestar-se no
sentido da generalidade daqueles interesses, representando a
totalidade do povo5.
A proteção aos direitos dos consumidores necessitava da
tutela do Estado e passou a ser abordada como questão política. A esse respeito,
destaca-se as palavras do Presidente Jonh Kennedy, em 15 de março de 1962,
quando fez a Declaração dos Direitos Internacionais do Consumidor:6
Os bens e serviços colocados no mercado devem ser sadios e
seguros para o uso; promovidos e apresentados de maneira que
permita ao consumidor fazer uma escolha satisfatória; que a voz
do consumidor seja ouvida no processo de tomada de decisão
governamental que determina o tipo, a qualidade e o preço de
3 ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. 3ª ed. ver. atual. e ampl. São
Paulo: Saraiva, 2002. p.3. 4 LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor. São Paulo: LTr, 2002. p.26.
5 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direito do consumidor. 2ª ed., São Paulo: Atlas,
1991, p. 17/38. 6 DE LUCCA, Newton. Direito do consumidor. São Paulo: Quartier Latin, 2003. p 47.
13
bens e serviços colocados no mercado; tenha o consumidor o
direito de ser informado sobre as condições de bens e serviços e
ainda o direito a preço justo.7
A proteção legal do consumidor é uma das matérias mais
relevantes e atuais do Direito, visto que se encontra em constante desafio do
nosso século em face do acelerado desenvolvimento industrial, tecnológico e até
mesmo cultural que vem ocorrendo em todo país, necessitando de tutela
específica, o direito do consumidor.
1.2 O DIREITO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NO BRASIL
O Direito de Defesa do Consumidor no Brasil teve um início
módico e lento por intermédio de leis esparsas, como a Lei da Economia Popular,
n° 1.251, de 26 de dezembro de 1951, dispondo sobre os crimes contra a
economia popular, a Lei Delegada n° 4, de 26 de setembro de 1962, a Lei n°
4.728, de 14 de julho de 1965, chegando ao auge da sua evolução legislativa na
Constituição de 1988, em seu art. 5°, inciso XXXII e art. 1708, no qual inseriu os
direitos do consumidor aos direitos fundamentais da cidadania:
Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do
consumidor 9.
Art. 170 A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos a
7 DE LUCCA, Newton. Direito do consumidor. São Paulo: Quartier Latin, 2003. p 47.
8 LEITE, Roberto.Basilone Introdução ao direito do consumidor. Editora LTr, São Paulo, 2002.
p. 36/39. 9 BRASIL, Constituição Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 31 ed., São
Paulo: Editora Saraiva, 2003.
14
existência digna, conforme ditames da justiça social, observados
os seguintes princípios:
[...]
V – defesa do consumidor;10
Cumpre destacar que o art. 48 dos Atos das Disposições
Constitucionais Transitórias [ADCT] determinava que dentro de cento e vinte dias
da promulgação da Constituição Brasileira, o Congresso Nacional ordenaria que
se agrupassem normas específicas relacionadas ao consumidor para a criação de
um código que viesse a respaldá-lo11.
Atos das Disposições Constitucionais Transitórias
Art. 48. O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da
promulgação da Constituição, elaborará o código de defesa do
consumidor. 12
Em 11 de setembro de 1990, fora aprovado pelo Congresso
Nacional o Código de Defesa do Consumidor vindo a ser promulgado através da
Lei 8.078, entrando em vigor seis meses após sua publicação no Diário Oficial da
União, no dia 11 de março de 199113.
Grinover, afirma que “toda e qualquer legislação de proteção
ao consumidor, tem, portanto a mesma ratio, vale dizer, reequilibrar a relação de
consumo, seja reforçando, quando possível, a posição do consumidor, seja
proibindo ou limitando certas práticas de mercado”14. A compilação do direito
consumerista, através da Lei 8.078/90, surgiu basicamente para proteger o
consumidor, que até então se encontrava um tanto exposto às regras e oscilações
do mercado e dos fornecedores, pois o Código Civil de 1916 já não conseguia
10
BRASIL, Constituição Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 31 ed., São
Paulo: Editora Saraiva, 2003. 11
LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor. Editora LTr, São Paulo, 2002. p. 41. 12
BRASIL, Constituição Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 31 ed., São Paulo: Editora Saraiva, 2003. 13
FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direito do consumidor. 2. ed., São Paulo: Atlas, 1991, p. 21. 14
GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 6ªed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000. p.7.
15
ajustar as atuais situações originadas das relações de consumo, que eram
basicamente de massa.
A relação consumerista é parte indissociável do diário do ser
humano. A afirmação de que todos são consumidores é verdadeira, pois desde o
nascimento e em todos os períodos de nossa vivência somos consumidores. Não
há de se negar, que as relações de consumo evoluíram de maneira considerável
nos últimos tempos, passando de uma simples troca de mercadorias, até as
modernas compras pela internet, deixando de serem pessoais, passando a
consumos impessoais e diretos, surgindo daí os grandes estabelecimentos, entre
eles os shopping centers*15.
No entanto, o consumidor tende a ser a parte mais frágil da
relação de consumo, mesmo que seja mais rico que o fornecedor, haja vista a
posição dominante por parte deste na relação. Há ocultamento de detalhes
técnicos ou de vícios e defeitos no produto, informações estas importantes que
não são divulgadas pelo fornecedor, podendo gerar grandes transtornos ao
consumidor que pouco poderá fazer para obrigar o fabricante a solucionar o
problema, se não existir uma legislação para ampará-lo16.
Para se interpretar o Código de Defesa do Consumidor é
necessário ter em mente que as relações jurídicas são atreladas ao sistema de
produção em massa, isto faz com que se privilegie o difuso e coletivo, bem como,
que se leve em conta como as relações jurídicas são fixadas por uma das partes
15
ALMEIDA, João Batista de. Manual de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2003. p.1. * Um centro comercial (também comumente referido pelo termo em inglês shopping center) é uma estrutura que contém estabelecimentos comerciais como lojas, lanchonetes, restaurantes, salas de cinema, playground, parques de diversões e estacionamento, caracterizado pelo seu fechamento em relação à cidade. É um espaço planejado sob uma administração única, composto de lojas destinadas à exploração comercial e à prestação de serviços, sujeitas a normas contratuais padronizadas, para manter o equilíbrio da oferta e da funcionalidade, assegurando a convivência integrada e pagando um valor em conformidade com o faturamento. O centro comercial na maior parte das vezes cobra por muitos serviços, como o estacionamento.Shopping Center. http://pt.wikipedia.org/wiki/Shopping_center Acesso em 16/05/2007. 16
LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor. São Paulo: LTr, 2002. p.26 e 27.
16
previamente, neste caso o fornecedor, vinculando assim de uma única vez
milhares de consumidores17.
Nunes afirma que “o Código de Defesa do Consumidor
compõe um sistema autônomo dentro do quadro constitucional. Dir-se-á um
subsistema próprio inserido no sistema constitucional brasileiro”.18 A lei 8.078/90 é
uma norma de ordem pública e de amplo interesse social, a qual se submete as
regras e princípios inseridos na Carta Magna, sendo que as demais normas
somente incidirão sobre as relações de consumo nos casos em que houver
lacuna na legislação consumerista.
1.3 RELAÇÃO DE CONSUMO
As relações de consumo surgiram primeiramente das
relações comerciais realizadas entre fornecedor e consumidor, ambos definidos
pelo Código de Defesa do Consumidor nos artigos 2° e 3° da Lei 8.078/90.
O Código de Defesa do Consumidor incide em toda e
qualquer relação em que possa ser assinalada como de consumo, bastando para
isso regular às hipóteses de relação que podem ser definidas como tal19.
Nery Júnior leciona o seguinte a respeito da relação de
consumo: “relação de consumo, assim entendida a relação jurídica existente entre
fornecedor e consumidor tendo como objeto a aquisição de produtos ou utilização
de serviços pelo consumidor”20.
Dito de outra forma, para Lisboa, é “[...] o vínculo entre duas
partes estabelecido por lei ou pela vontade humana, que importa na transmissão
17
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 69. 18
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 69. 19
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 71. 20
DE LUCCA, Newton. Direito do consumidor. São Paulo: Quartier Latin, 2003. p103.
17
de algum bem, a título provisório (transitório) ou definitivo (permanente), para a
satisfação de interesses”21.
Partindo do princípio de que a relação de consumo nasce
basicamente da relação jurídica entre consumidores e fornecedores, onde ambos
estão vinculados a um objeto sobre o qual incidem direitos e obrigações
decorrentes dessa relação, tendo como objetivo a oferta de produtos e serviços,
pode-se chegar a definição da relação de consumo.
Sobre o assunto, Cláudio Bonatto e Paulo Moraes ensinam
que:
Relação jurídica de consumo é o vínculo que se estabelece entre
um consumidor, destinatário final. E entre a ele equiparados, e um
fornecedor profissional, decorrente de um ato de consumo ou
como reflexo de um acidente de consumo, a qual sofre a
incidência da norma jurídica específica, como o objeto de
harmonização as interações naturais desiguais da sociedade
moderna de massa22.
Desta feita, não pode ser considerado consumidor quem
simplesmente adquire um produto ou serviço como destinatário final, e sim
quando existe uma relação de consumo, ou seja, quando o Consumidor se
contrapõe ao Fornecedor.
Pode-se dizer, então, que a relação de consumo envolve
duas partes bem definidas, sendo elas fornecedor e consumidor, que tem com
finalidade precípua a de contentamento/necessidade privada do consumidor e a
não participação do consumidor sobre a prestação do serviço ou da produção de
bens de consumo que lhe são destinados23.
21
LISBOA, Roberto Senise. Relação de consumo e Proteção jurídica do consumidor no direito brasileiro. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p.1. 22
BONATTO, Cláudio e Paulo Valério Dal Passo. Questões controvertidas no Código de Defesa do Consumidor: princípios, conceitos, contratos. 2ª ed. rev. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 63. 23
EFING, Antônio Carlos. Fundamentos do direto das relações de consumo. 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2004. p. 35.
18
1.3.1 Sujeitos da Relação de Consumo
Relação de Consumo compreende dois sujeitos
fundamentais para sua composição, o consumidor e o fornecedor, cada um deles
com suas próprias características que serão analisadas a seguir à luz do Código
de Defesa do Consumidor.24
1.3.1.1 Conceito de Consumidor
O Código de Defesa do Consumidor, no caput do seu art. 2º,
conceitua consumidor como sendo a “pessoa física ou jurídica que adquire
produto ou serviço, para uso próprio ou de sua família, na condição de
consumidor final” 25.
Desta forma entende-se que o consumidor é todo o sujeito
que usufrui um produto ou serviço, com o escopo de consumi-lo, desgastá-lo ou
utilizá-lo, não tendo o intuito de revenda. Portanto, de acordo com Lisboa
consumidor é “[...] o sujeito de direito que encerra a cadeia econômica de
consumo, retirando de circulação um produto ou um serviço obtido junto a um
fornecedor”26.
Ainda conceituando consumidor, podemos destacar a
interpretação da doutrina especializada no que diz respeito ao Consumidor:
Consumidor é a pessoa física ou jurídica, que adquire produto, na
qualidade de destinatário final. O destinatário final do produto
24
LEITE, Roberto Basilone. Introdução ao direito do consumidor. São Paulo: LTr, 2002. p.43. 25
LEITE, Basilone Roberto. Introdução ao direito do consumidor. Editora LTR, São Paulo, 2002. p. 49. 26
LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2001. p.139.
19
adquirido constitui a grande massa, sobre a qual incidem as
normas de proteção e defesa constantes no presente Código27.
Por outro lado, Nunes conceitua consumidor da seguinte
forma:
Consumidor é a pessoa física, a pessoa natural e também a
pessoa jurídica. Quanto a esta última, como a norma não faz
distinção, trata-se de toda e qualquer pessoa jurídica que seja
uma microempresa, quer seja multinacional, pessoa jurídica civil
ou comercial, associação ou fundação etc.
[...] não se trata de apenas adquirir, mas também de utilizar o
produto ou serviço, ainda quando quem o utiliza não tenha
adquirido. Isto é, a norma define como consumidor tanto quem
efetivamente adquire (obtém) o produto ou serviço como aquele
que, não tendo adquirido, utiliza-o ou o consome28.
Pode-se expor então que consumidor não é somente quem
adquire o produto no mercado de consumo ou contrata o serviço, como também
aquele que utiliza o produto ou usufrui do serviço.
Contudo, a dúvida que perdura é até onde vai o conceito de
destinatário final, haja vista que a polêmica maior está na delimitação de quem
pode ou não ser considerado “destinatário final”29.
Nunes define destinatário final como quem “adquire produto
ou serviço para uso próprio sem finalidade de produção de outros produtos ou
serviços”, ou que sejam adquiridos produtos ou serviços com a finalidade de
produção, desde que estes sejam apresentados no mercado de consumo
necessariamente30.
Para Almeida, a expressão destinatário final, ocorre quando
é:
27
CRETELLA JUNIOR, José, René Ariel Dotti. Comentários ao código de defesa do consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 7 e 8. 28
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 72 e 73. 29
DE LUCCA, Newton. Direito do consumidor. São Paulo: Quartier Latin, 2003. p120 e 121. 30
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p.83.
20
[...] para uso próprio, privado, individual, familiar ou doméstico, e
até para terceiros, desde que o repasse não se dê por revenda.
Não se incluíram na definição legal, portanto, o intermediário e
aquele que compra com o objetivo de revender após a
montagem, beneficiamento ou industrialização. A operação de
consumo deve encerrar-se no consumidor, que utiliza ou permite
que seja utilizado o bem ou serviço adquirido sem revenda.
Ocorrida esta, consumidor será o adquirente da faze seguinte, já
que o consumo não teve, até então, destinação final.31
Destinatário final é aquele cidadão que adquire o produto
para consumo próprio, sendo ele o último a usufruir o produto. Pode-se dizer
então que “destinatário final” é aquele que encerra o processo econômico, ou
seja, ele usufrui do produto ou serviço para realização pessoal, para uso privado.
Portanto, não se considera consumidor aquele que adquire bens para revender32.
Ante o exposto, a dúvida que persisti é a de até aonde vai o
conceito de destinatário final, pois existem duas correntes que ponderaram sobre
o assunto, sendo elas a finalista e a maximalista.
Os finalistas defendem que o consumidor final é aquele
indivíduo vulnerável da relação de consumo que esta fora de uma atividade
profissional, que adquire o bem ou serviço para uso exclusivo de sua família33.
Em contraponto, a corrente maximalista defende que as leis
consumeristas não são apenas para atender a um único tipo de consumidor, deve
ser aplicado de forma ampla, abrangendo toda uma sociedade de consumo34.
Além disso, é imprescindível abordar os conceitos de
consumidor por equiparação dos artigos 17 e 29 do Código de Defesa do
31
ALMEIDA, João Batista de. Manual de direito do consumidor. São Paulo:Saraiva, 2003. 38. 32
LEITE, Basilone Roberto. Introdução ao direito do consumidor. Editora LTR, São Paulo, 2002. p. 51. 33
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 195, p. 100. 34
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 195, p. 100.
21
Consumidor. “Art. 17 - Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores
todas as vítimas do evento”35.
Este artigo atenta sobre da responsabilidade civil objetiva,
pelo fato de o produto ou o serviço causar dano às vítimas do acidente de
consumo, mesmo que não tenham sido consumidoras diretas, mas que foram
atingidas pelo evento (defeito) que causou o dano. Por este motivo, o Código de
Defesa do Consumidor assegura a equiparação a terceiros, mesmo que
estranhos à relação de consumo, mas aos que sofrem um dano decorrente desta
relação36.
Sobre a proteção contida no artigo 17 do Código de Defesa
do Consumidor, Denari discorre dobre o assunto:
Como se decalca, [...] o Código se preocupa com “terceiros”, nas
relações de consumo: [...] nesta passagem, para disciplinamento
da responsabilidade perante terceiros, protegendo os
determinados bystanders, vale dizer, aquelas pessoas estranhas à
relação de consumo, mas que sofreram prejuízo em razão dos
defeitos intrínsecos ou extrínsecos do produto ou serviço37.
Devido a magnitude, até mesmo as catastróficas, que se
pode tomar um acidente de consumo, a lei consumerista se preocupou em
garantir equiparação à classe do consumidor para todos aqueles que direta ou
indiretamente estivessem envolvidos no acidente de consumo amparando-os
legalmente para a defesa dos seus direitos38.
Por sua vez, o Art. 29 estabelece: “Para os fins deste Capítulo
e do Seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis
ou não, expostas às práticas nele previstas.39”
35
BRASIL. Código de defesa do consumidor. São Paulo: Rideel, 2003. 36
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 84. 37
DENARI, Zelmo et alli. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8 ed. Ver. Atul. Ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 175 e 176. 38
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 84. 39
BRASIL. Código de defesa do consumidor. São Paulo: Rideel, 2003.
22
O Código de Defesa do Consumidor ao definir consumidor,
procura de toda maneira evitar que os consumidores, efetivos ou em potencial,
saiam lesados na relação de consumo, conferindo a tutela mais ampla em
benefício de todos40.
O conceito de equiparação dado por este artigo é bem
amplo, visto que o consumidor não precisa nem adquirir o produto, basta apenas
estar exposta a tal prática, é o que ensina Nunes:
O que a lei diz é que, uma vez existindo qualquer prática
comercial, toda a coletividade de pessoas já exposta a ela, ainda
que em nenhum momento se possa identificar um único
consumidor real que pretenda insurgir-se contra tal prática41.
A lei consumerista busca de várias formas evitar que os
consumidores saiam prejudicados da relação de consumo, fornecendo, por tanto,
proteção às pessoas que participaram da relação de consumo e que de algum
modo foram lesadas, caso do art. 17 do Código de Defesa do Consumidor, onde
equipara os consumidor as vítimas do acidente, e ainda, o art. 29 do Código de
Defesa do Consumidor, equipara os consumidores a toda a sociedade exposta às
práticas comerciais reguladas pelo Código do Consumidor.42
1.3.1.2 Conceito de Fornecedor
Após conceituar Consumidor, cumpre caracterizar outro pólo
da Relação de Consumo, o Fornecedor. O Código de Defesa do Consumidor, em
seu art. 3°, conceitua fornecedor como sendo:
Art. 3º Toda a pessoa física ou jurídica, pública ou privada,
nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados,
40
LISBOA. Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p165. 41
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 85. 42
SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho. Código de defesa do consumidor anotado e legislação complementar. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
23
que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação,
construção, transformação, importação, exportação, distribuição
ou comercialização de produtos ou prestações de serviços43.
A definição de fornecedor é ampla, visto que abrange todos
os participantes do ciclo de produção/distribuição. Bastando assim que pratique
atividades tipicamente profissionais, tais como produção, comercialização, ou
prestação de serviços e com certa habitualidade.44
Fornecedores são todas as pessoas que tem capacidade,
física ou jurídica, não há nenhuma exclusão quanto ao tipo de personalidade
jurídica. Fornecedor pode tanto ser a pessoa jurídica pública ou privada, com
sede ou não no País, com ou sem fins lucrativos, autarquias, órgãos da
Administração, entre outros.45
O que demarca a incidência do Código de Defesa do
Consumidor no âmbito da caracterização do Fornecedor é a expressão “atividade”
contida no art. 3º. De Lucca elucida que há atividade quando “[...] há uma
sucessão repetida de atos, praticados de maneira organizada, de molde a
caracterizar-se numa constante oferta de bens ou de serviços á coletividade”46.
O termo “atividade” assim ensina Nunes é:
O uso do termo “atividade” está ligado a seu sentido tradicional.
Têm-se, então, atividade típica e atividade eventual. Assim, o
comerciante estabelecido regularmente exerce a atividade típica
descrita em seu estatuto. Mas é possível que o mesmo
comerciante exerça uma atividade atípica, quando, por exemplo,
age, de fato, em situação diversa da prevista, o que pode dar-se
de maneira rotineira ou eventual. E a pessoa física vai exercer
atividade típica ou eventual quando praticar atos de comércio ou
indústria47.
43
BRASIL. Código de defesa do consumidor. São Paulo: Rideel, 2003. 44
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 4 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 326. 45
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 86 46
DE LUCCA, Newton. Direito do consumidor. São Paulo: Quartier Latin, 2003. p. 135. 47
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 86.
24
Importante salientar que a “atividade” desenvolvida
designará que em um dos pólos da relação jurídica estará o fornecedor, devendo
no outro pólo existir o consumidor, configurando desta forma a relação de
consumo, portanto é essencial verificar a natureza da atividade exercida, para
posteriormente não se deparar diante de um relação jurídica regulada pela
legislação civil.48
A definição de fornecedor foi legalmente exaurida, haja vista
abranger quase todas as suas formas de execução. Assim, fornecedor passa
também a ser aquele quem vende a mercadoria, ou seja, o comerciante, não
restringindo tal conceito somente aqueles que produzem ou fabricam determinado
produto49.
1.3.2 Objetos da Relação de Consumo
O Código de Defesa do Consumidor faz uma divisão entre
dois tipos de objeto da relação de consumo, quais sejam: produto e serviço.
1.3.2.1 Produto
A acepção legal de Produto está no § 1º do art. 3º do Código
de Defesa do Consumidor onde dispõe que:
[...]
48
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p.
87. 49
ALMEIDA, João Batista de. Manual de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 40/41.
25
§ 1º Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou
imaterial50.
Filomeno, explanando sobre o artigo supra, entende que a
palavra “produto” poderia ser suprida pela palavra “bem” em face de seu maior
alcance diante do ponto de vista jurídico, quanto ao ponto de vista da economia
política51.
De outro lado, para alguns autores a definição de “produto”
foi adequada, visto que designou a totalidade de bens existentes, além de estar
interligado com o mercado econômico52.
O emprego do vocabulário “móveis e imóveis” nos remete ao
mesmo sistema utilizado pelo Código Civil. Porém, no que se refere à feição da
materialidade (material ou imaterial), importante caracterizar perfeitamente o que
vem a ser um produto imaterial. Para Bonatto e Moraes, “[...] são os que não
podem ser apreendidos, pesados, ou seja, não são palpáveis, embora possam
ser avaliados economicamente”53.
Uma inovação muito importante trazida pela lei consumerista
foi a conceituação dos produtos “duráveis e não duráveis” que a um certo tempo
já era conhecida no mercado. Seus conceitos aparecem mais precisamente no
art. 26, incisos I e II do Código de defesa do Consumidor. Nunes os conceitua da
seguinte forma:
Produto durável é aquele que, como o próprio nome diz, não se
extingue com o uso. Ele dura, leva tempo para se desgastar. Pode
– e deve – ser utilizado muitas vezes. Contudo, é preciso chamar
a atenção para o aspecto de “durabilidade” do bem durável.
Nenhum produto é eterno. Todos tendem a um fim material.
50
BRASIL, Código de defesa do consumidor. São Paulo: Rideel, 2003. 51
FIOMENO, José Geraldo Brito et alli. Código de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8 ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 47. 52
DONATO, Maria Antonieta Zanardo. Proteção ao consumidor: conceito e extensão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. p. 115 e NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 90. 53
BONATTO, Cláudio; MORAES, Paulo Valério Dal Pai. Questões controvertidas no código de defesa do consumidor. 4 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 95.
26
O produto “não durável”, por sua vez, é aquele que se acaba com
o uso. Como o próprio nome também diz, não tem qualquer
durabilidade. Usando-se-o, ele se extingue ou, pelo menos, vai-se
extinguindo. Estão nessa condição os alimentos, os remédios, os
cosméticos etc.54
O Código de Defesa do Consumidor diferenciou os produtos
duráveis dos não duráveis para efeitos de contagem de prazo para reivindicação
pelo vício do produto. Desta maneira, os produtos não duráveis são os
alimentares e de vestuário, já os eletrodomésticos, veículos automotores são
duráveis55.
1.3.2.2 Serviço
O conceito de serviço está definido no Código de Defesa do
Consumidor, no parágrafo 2º do artigo 3º, da seguinte forma:
[...]
§ 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de
consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza
bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes
das relações de caráter trabalhista.56.
A definição de “remuneração” na legislação brasileira é o
elemento chave no conceito de serviço, visto que o serviço gratuito (não
remunerado) em nenhum momento incidirá na norma de proteção das relações de
consumo57.
Desta mesma forma, Cretella esclarece que serviço pode ser
gratuito ou oneroso, apenas interessando o último para ser aplicado o Código do
54
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 91. 55
DENARI, Zelmo et alli. Código de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8 ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.226. 56
BRASIL, Código de defesa do consumidor. São Paulo: Rideel, 2003. 57
EFING, Antônio Carlos. Fundamentos do direto das relações de consumo. 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2004. p. 69.
27
Consumidor, por este motivo é que existe a necessidade de a atividade
introduzida no mercado de trabalho ser atribuído o símbolo característico, ou seja,
a onerosidade58.
Outro ponto que deve ter ênfase no conceito legal de serviço
é a inserção da atividade bancária como serviço sujeito ao Código de Defesa do
Consumidor. Apesar das medidas de cautela tomadas pelo legislador em enunciar
essa atividade, houve uma tentativa judicial com o escopo de conseguir uma
decisão no sentido de que as instituições financeiras não prestam serviços
caracterizados como de consumo59.
O Ministro do Supremo Tribunal Federal Nelson Jobim
proferiu seu voto na Ação Direta de Inconstitucionalidade no sentido de:
Conferir interpretação conforme a norma constitucional ao artigo
3º, § 2º do Código de Defesa do Consumidor a fim de excluir do
seu alcance as principais operações bancárias. Depois de um
pedido de vista de quase quatro anos de duração, o Ministro
Nelson Jobim defendeu a aplicação do Código de Defesa do
Consumidor apenas aos ''serviços bancários'', como custódia de
valores, fornecimento de informações a correntistas e atendimento
ao público, deixando de lado incidência do Código de Defesa do
Consumidor sobre ''operações bancárias típicas'' como os
depósitos, hipoteca, poupança e cheque especial60.
Ainda no que se referem aos serviços, eles também podem
ser públicos, é o que dispõe o art. 22 do Código de Defesa do Consumidor.
Porém, salienta-se que não estão incluídos no conceito, os tributos em geral, ou
seja, apenas quando há contraprestação direta, por intervenção de tarifas, para o
seu fornecimento, tais como: água, telefonia, energia elétrica, entre outros.61.
58
CRETALLA JÚNIOR, José.Comentários ao código de defesa do consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 15. 59
DE LUCCA, Newton. Direito do consumidor. São Paulo: Quartier Latin, 2003. p. 227. 60
OLIVEIRA, Celso Marcelo. Direito do consumidor dos serviços bancários: Uma Análise do Julgamento na Adin 2591 Supremo Tribunal Federal. Publicada em 01 abr. 2006 http://kplus.cosmo.com.br/materia.asp?co=178&rv=Direito. Acesso em 27 fev. 2007. 61
NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 98.
28
O que se constata com esta lei característica para regular as
relações de consumo é que o direito do consumidor vem a suportar um controle
mais efetivo por parte do Estado, adverso do direito civil que em regra, há
autonomia de vontade das partes62.
62
FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direito do consumidor. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 56.
29
2. RESPONSABILIDADE CIVIL
2.1 CONCEITO
Imprescindível realçar que na esfera jurídica, o termo
responsabilidade envolve outros ramos do direito, não sendo apenas
característico do Direito Civil, pois aborda também a esfera penal, administrativa e
tributária. No presente trabalho apenas interessa analisar a responsabilidade na
esfera civil63.
Sobre o conceito de responsabilidade, Leite ensina que:
Responsabilidade é a situação transitória assumida pelo devedor
ao transgredir uma norma legal, por força da qual o credor pode
exigir dele o cumprimento de certa obrigação. A responsabilidade
está ligada sempre à idéia de culpabilidade, seja com
descumprimento de um contrato, seja de um delito ou de um dano
contra alguém64.
Responsabilidade civil requer prejuízo à terceiro ou
particular, de modo que a vítima poderá pedir reparação do dano, traduzida a
recomposição do estado anterior.
Stoco em sua doutrina aponta que a origem do termo
responsabilidade vem do latim respondere, ou seja, a necessidade que se tem de
responsabilizar alguma pessoa pelos atos que praticou, a palavra spondeo, da
mesma forma originada do latim, delibera como sendo a conexão do devedor nos
contratos verbais no Direito Romano65.
63
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2000. p.130. 64
LEITE, Basilone Roberto. Introdução ao Direito do consumidor: os direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor de defesa do consumidor. Editora LTR, São Paulo, 2002. p. 137. 65
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais 2001. p. 89.
30
Segundo leciona Rodrigues, responsabilidade civil é a
”obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra
por fato próprio, ou fato de pessoas ou coisas que dela dependam66”.
Entende-se, também, como responsabilidade civil a lição
passada por Diniz:
A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem
uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causado a
terceiros, em razão de atos por ela mesma participado, por
pessoas por quem ela responde, ou alguma coisa a ela
pertencente ou de simples imposição legal67.
De acordo com Pereira, a responsabilidade civil versa sobre
quem tem o dever de reparar o dano em relação ao sujeito passivo da relação
jurídica que se configura. “Reparação e sujeito passivo compõe o binômio da
responsabilidade civil, que se enuncia como o princípio que subordina a
reparação à sua incidência na pessoa do causador do dano”68.
A teoria da responsabilidade civil, em contradição ao ordenamento
jurídico de todos os povos civilizados e sem o qual a vida social é
quase inconcebível, é que impõe a quem causa dano a outrem o
dever de reparar69.
Os conceitos mencionados abrangem a responsabilidade
civil como sendo uma obrigação de reparar o dano causado a terceiro, devendo o
dano estar diretamente ligado com o fato, restabelecendo a coisa ao estado
anterior70.
A responsabilidade civil visa, estabelecer ao agente
causador do dano a obrigação de reparar os prejuízos que a vítima teve,
exatamente pelo comportamento imprudente que veio a causar os danos.
66
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. Atual. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 6 67
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 36. 68
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade civil. 12 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p11. 69
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p.
12. 70
VENOSA, Silvio de Salvo. Direto civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 505.
31
2.2 RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA
A responsabilidade civil subjetiva esta condicionada a culpa,
conforme preconiza o art. 186 do Código Civil estabelecendo que a “prova de ter
o agente causador do dano cometido à ação ou omissão danosa voluntariamente,
com negligência ou com imprudência” 71, como se obtém:
Art. 186 Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligencia
ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica
obrigado a reparar o dano72.
Para que seja reconhecida a obrigação de indenizar a
vítima, não basta que a avaria ocorra apenas de um comportamento do agente,
pois é necessário a existência de culpa na sua conduta73.
Noronha define a responsabilidade subjetiva desta maneira:
A responsabilidade subjetiva, ou culposa, também chamada de
responsabilidade civil por atos ilícitos, ou aquiliana, é obrigação de
reparar danos causados por ações ou omissões intencionais
(dolosas), imperitas, negligentes, ou imprudentes (culposa), que
violem direitos alheios. É o que constitui o regime-regra da
responsabilidade civil, como está claro no art. 927, caput do
Código Civil74.
O Código Civil no Art. 927 sobre a responsabilidade civil
preceitua que, “aquele que por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a
repará-lo”75. Deste modo, restabelecendo o equilíbrio rompido, cabendo ao lesado
a prova de dolo ou culpa do agente.
71
LEITE, Basilone Roberto. Introdução ao direito do consumidor: os direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor de defesa do consumidor. Editora LTR, São Paulo, 2002. p. 141. 72
BRASIL. Código civil. São Paulo: Saraiva, 2003. 73
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito Civil: responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2000. p.26. 74
NORONHA, Fernando. Apostila de direito das obrigações. Obra inédita. Escola Superior da Magistratua Ctarinenese, 2002. p. 295. 75
BRASIL. Código civil. São Paulo: Saraiva, 2003.
32
Assim, a teoria da responsabilidade subjetiva tem como
embasamento principal para que possa configurar o dever de reparação, o
comportamento do agente que não visa causar prejuízo a vitima, mas sua
conduta causa danos76.
Sobre a teoria da culpa, Venosa citando José de Aguiar Dias
leciona que:
A culpa é falta de diligência na observância da norma de conduta,
isto é, o desprezo, por parte do agente, do esforço necessário
para observá-la, com resultado não objetivado, mas previsível,
desde que o agente se detivesse na consideração das
conseqüências eventuais de sua atividade77.
A responsabilidade civil tem como escopo a reparação do
dano causado a vítima, seja ele patrimonial ou moral, visando restabelecer a
coisa ao estado anterior da ocorrência do dano.
A responsabilidade civil aquiliana baseia-se no
comportamento do agente, verificando se a sua conduta teve influência ao causar
danos à vítima. É preciso que o causador do dano tenha uma conduta danosa ao
agir com culpa, vindo a cometer um ilícito, nascendo com isso obrigações, pois
causou danos a uma pessoa, implicando assim na reparação do dano que
causou78.
Ante o exposto, entende-se que a responsabilidade civil
subjetiva tem como finalidade a compensação do dano causado pela prática de
ato ilícito. Gerando assim um comprometimento do agente para ressarcir o
prejuízo causado, sendo que “a menor desatenção, a mais insignificante falta,
ocorrendo resultado nocivo, determina a indenização” portanto, é essencial para
gerar o dever de indenizar o fator culpa.79.
76
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 11. 77
VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 3 ed. – São Paulo: Atlas, 2003. p. 23. 78
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade civil. 12 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 32. 79
RIZZARDO, Arnaldo. A reparação nos acidentes de trânsito: Lei 9.503, de 23.09.1997. São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 2001. p. 24.
33
2.3 RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA
Na responsabilidade civil objetiva a culpa não é essencial
para caracterizar o dano, sendo que “a responsabilidade objetiva, ou
responsabilidade sem culpa, somente pode ser aplicada quando existe lei
expressa que autorize”80.
A teoria objetiva fundamenta-se na causalidade extrínseca,
desprezando a intenção do agente, pois aquele que obtém
vantagens pelos riscos criados, deve responder pelas
conseqüências da atividade exercida, cuja periculosidade é a ela
inerente ou fixada por lei81.
A responsabilidade civil objetiva vem calcada na obrigação
de o agente reparar os danos que causou a vítima, sem entrar no mérito de quem
causou o dano agiu com culpa. A respeito do tema, Pereira ensina que:
A doutrina objetiva, ao invés de exigir que a responsabilidade civil
seja resultante dos elementos tradicionais (culpa, dano, vínculo de
causalidade entre uma e outra) assenta na equação binária cujos
pólos são o dano e a autoria do evento danoso. Sem cogitar da
imputabilidade ao investigar a antijuridicidade do fato danoso, o
que importa para assegurar o ressarcimento é a verificação se
ocorreu o evento e se dele emanou prejuízo. Em tal ocorrendo, o
autor do fato causador é o responsável82.
Rodrigues instrui sobre a responsabilidade civil objetiva
fundamentada na teoria do risco como sendo:
[...] aquele que, através de sua atividade, cria um risco de dano
para terceiros, deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua
atividade e seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-
se a situação e, se for verificada, objetivamente, a relação de
causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano
80
VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 3 ed. – São Paulo: Atlas, 2003. p.15. 81
LISBOA, Roberto Senise. Manual elementar de direito civil. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 227. 82
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade civil. 12 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 269.
34
experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por
aquele83
.
Para configuração da responsabilidade civil objetiva basta
que haja ligação entre a ação/omissão do agente e o nexo de causalidade, não
prescindindo da prova de culpa, para caracterizar a obrigação da reparação ao
dano causado.
A teoria objetiva vem instituída no princípio da equidade,
onde se procura priorizar que aquele que tirar proveito com certa circunstância
tem a obrigação de reparar os prejuízos dela advindos de sua conduta. Versando
assim no comprometimento de “indenizar o dano produzido por atividade exercida
no interesse do agente e sob seu controle, sem que haja qualquer indagação
sobre o comportamento do lesante” 84.
O item culpa na responsabilidade objetiva, não é necessário
para obrigar o agente a reparar o dano causado a vitima. Pois a
responsabilização é contentada com a relação dano e nexo de causalidade85.
Para obter o ressarcimento a vítima precisa demonstrar o
nexo de causalidade entre o dano e a ação que o causou. Conforme leciona Diniz
”[...] a atividade que gerou o dano é licita, mas causou perigo a outrem, de modo
que aquele que exerce, por ter a obrigação de velar para que dela não resulte
prejuízo, terá o dever ressarcitório, pelo simples implemento do nexo causal86.
Art. 927 [...]
Parágrafo único: haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
83
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 16. 84
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 56. 85
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.
p.269. 86
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 53.
35
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem87.
Neste artigo pode-se observar uma importante regra, onde
determina que, independente de ter havido culpa do agente há o dever de
indenizar os danos causados, pois assumiu o risco da sua atividade88.
A Jurisprudência assim entende, senão vejamos:
Ação indenizatória - empresa de segurança -
responsabilidade civil objetiva - teoria do risco da atividade -
exegese do art. 927 do código civil de 1916 e do art. 14 do
código de defesa do consumidor. Os casos que tratam de
reparação civil por empresa de segurança devem ser
analisados sob o prisma da responsabilidade objetiva,
fundada, na teoria do risco da atividade, contida no preceito
do art. 927 do Código Civil de 1916 (vigente à época dos
fatos) e do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que
independe da análise do elemento volitivo culpa para se
caracterizar, sendo suficiente o dano, a atuação da
prestadora de serviço e o nexo de causalidade entre
ambos89.
A obrigação de indenizar é imposta por lei a certas pessoas,
independente de ter pra ticado ilícito, ponderando que certas atividades criam um
risco especial para outrem. Não há só o dever de indenizar o dano causado pelo
ato ilícito cometido, como também a obrigação de reparar o prejuízo,
independente de ter agido com culpa, tanto nos casos descritos em lei, por sua
natureza, atividade desenvolvida pelo agente, riscos para direito de outrem90.
87
BRASIL. Código civil. São Paulo: Saraiva, 2003. 88
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade civil. 12 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p 563. 89
SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 2005.012670-1, rel. Des. Volnei Carlin, j em. 28/07/2005. Disponível em: <http://www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 28/04/2007. 90
CASTRO, Guilherme Couto de. A responsabilidade objetiva no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 31
36
2.4 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Os pressupostos essenciais para o surgimento da
responsabilidade civil são: ação ou omissão do agente; dano experimentado pela
vítima e a relação de causalidade91.
A ação ou omissão do agente é um dos elementos da
responsabilidade civil, que pode ser caracterizada como aquela que o fato
gerador é um ato lícito ou ilícito, que causa dano a outrem, gerando deste modo o
dever de ressarcir a vítima nos danos que causou92.
Como requisito essencial da responsabilidade civil, estabeleceu o
legislador que o prejuízo causado deve advir da conduta humana,
violadora de um dever contratual, legal ou social93.
Ainda sobre a conduta omissiva ou comissiva do agente Alonso ensina que:
Deve-se perquirir se a ação ou omissão é ou não intencional. Se
há a vontade consciente de produzir um efeito danoso a outrem,
reputa-se que ocorreu a culpa lato senso ou intencional, chamada
pelo direito penal de dolo; se no entanto, a vontade do agente não
era praticar o ato danoso, mas por negligência ou imprudência
veio a causa-lo a alguém, diz que houve culpa stricto sensu ou
não intencional, pois, embora o ato praticado tenha sido querido
pelo agente, o resultado danoso não era o objetivo dele94.
Neste sentido, a culpa esta relacionada a um erro de
conduta do agente causando danos a outrem sem a intenção de prejudicar. Sobre
o elemento culpa, Diniz ensina que:
A culpa, em sentido amplo, com violação de um dever jurídico,
imputável a alguém, em decorrência de fato intencional ou de
91
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 14. 92
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 39. 93
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2000. p.30. 94
ALONSO, Paulo Sergio Gomes. Pressupostos da responsabilidade civil objetiva. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 25.
37
omissão de diligência ou cautela, compreende: o dolo, que é a
violação intencional do dever jurídico, e a culpa em sentido estrito,
caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem
qualquer deliberação de violar um dever. Portanto, não se reclame
que o ato danoso tenha sido realmente, querido pelo agente, pois
ele não deixará de ser responsável pelo fato de não ter
apercebido do seu ato nem medido as suas conseqüências95.
Se não houver dano não há que se falar em reparação sob a
ótica da responsabilidade civil, pois o ilícito só gera repercussão no mundo
jurídico se causar prejuízos a alguém, portanto, onde não há danos não há
indenização.
Sendo assim o dano provocado à vítima é um dos requisitos
fundamentais para caracterizar a culpa do agente, senão vejamos “a
responsabilidade civil somente se caracteriza, obrigando o infrator à reparação,
no caso de seu comportamento injurídico infligir a outrem um prejuízo”96.
A relação de causalidade entre o dano experimentado pela
vítima e a ação do agente é pressuposto essencial para surgir a obrigação de
reparar do dano, pois a vítima pode ter agido com negligencia, neste caso não
haverá ressarcimento, uma vez que a conduta do agente não foi imprudente97.
Sobre o nexo de causalidade Venosa ensina que:
Entre o dano e a conduta do agente, deve existir um nexo causal.
A relação de causalidade, dentro de todas as suas teorias,
procura elucidar a questão. Em outras palavras, deve indenizar
quem concorreu para o evento danoso98.
Faz-se necessário comprovar a relação de causalidade entre
a ação praticada pelo agente e o dano que foi causado à vítima, pois neste caso
surge obrigação de o reclamante comprovar a existência do dano.
95
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 42. 96
PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade civil. 12 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 38. 97
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 18. 98
VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 3 ed. – São Paulo: Atlas, 2003. p. 508.
38
O nexo de causalidade, pode-se dizer que é o elemento da
responsabilidade civil difícil de caracterizar, pois é necessário configurar que o
dano causado ocorreu por culpa do agente, é necessário estar certo que sem o
ato o dano não teria ocorrido99.
O vínculo entre o prejuízo e a ação designa-se “nexo causal”, de
modo que o fato lesivo deverá ser oriundo da ação, diretamente
ou com sua conseqüência previsível. Bastará que se verifique que
o dano não ocorreria se o fato não tivesse acontecido100.
Na responsabilidade civil subjetiva o ilícito é o fato gerador
da obrigação de reparar o dano, devendo ressarcir os danos se for comprovado
dolo ou culpa na conduta do agente.
2.5 RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL
No geral a responsabilidade civil, fundamenta-se em
princípios semelhantes, pois, requerem que a obrigação decorra de um
inadimplemento, seja ele contratual ou decorrente de uma violação de conduta101.
Diniz sobre o assunto ensina que:
Quando ocorre o inadimplemento do contrato, não é a obrigação
contratual que movimenta a responsabilidade, uma vez que surge
uma nova obrigação que se substitui à preexistência no todo ou
em parte: a obrigação de reparar o prejuízo conseqüente à
inexecução da obrigação assumida102.
99
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 75. 100
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 100. 101
VENOSA, Silvio de Salvo Direto civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2005 p.507. 102
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 119.
39
O artigo 389 do Código Civil faz referência a
responsabilidade civil contratual, onde dispõe que:
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por
perdas e danos, mais juros e correção monetária segundo índices
oficiais regularmente estabelecidos, e honorários do advogado. 103
Como menciona o artigo acima descrito, aos devedores que
não cumprirem com suas obrigações e causarem prejuízos aos credores, é
imposta a responsabilidade de reparar os danos que o credor veio a experimentar
com o descumprimento da obrigação, a indenização devida em muitos casos, é,
por igual, um substituto da prestação contratada104.
Fazendo referência sobre a prova na responsabilidade civil
contratual, o ônus da prova da infração cometida cabe ao devedor inadimplente
quando o credor provar que a pretensão foi descumprida, devendo demonstrar a
inexistência da culpa de sua parte105.
Outro ponto a ser analisado é a responsabilidade
extracontratual, também conhecida como aquiliana, que é aquela que decorre do
ato ilícito extracontratual, onde não há qualquer conexão anterior entre as partes,
“por não estarem ligadas por uma relação obrigacional ou contratual”106, referindo-
se ao art. 186 do Código Civilista.
Ainda sobre o assunto, Diniz leciona que:
A responsabilidade extracontratual, delitual ou aquiliana
decorre de violação legal, ou seja, de lesão a um direito
subjetivo ou da prática de um ato ilícito, sem que haja
nenhum vinculo contratual entre lesado e lesante107.
103
BRASIL. Código civil. São Paulo: Saraiva, 2003. 104
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 8. 105
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. p.10. 106
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 120. 107
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 459.
40
Como pôde ser observada, esta responsabilidade não
decorre do inadimplemento contratual, porém decorre do descumprimento da
norma jurídica, que rege a conduta dos cidadãos108.
A responsabilidade extracontratual está configurada na lesão
a um direito ou falta de cumprimento da lei, e que por este motivo, entre o
causador do dano e a vitima, não existe nenhuma relação contratual prevista,
fazendo referência ao assunto pode ser dado como exemplo, o motorista que
causa danos ao pedestre, por acidente ocorrido em via urbana. Deverá o
motorista que causou o dano, indenizar a vítima109.
Neste contexto, a quem cabe o ônus de provar o dano
ocorrido é a vítima, tendo a necessidade de demonstrar que o dano causado pelo
agente foi com imprudência, negligencia ou imperícia, correndo o risco de, se não
demonstrado a efetiva culpa, ver impossibilitado o direito de receber a
indenização que achar devida110.
2.6 DAS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE
As excludentes de responsabilidade na maioria das vezes
têm por conseqüência o enfraquecimento do nexo de causalidade, vindo a intervir
na obrigação de indenizar o dano sofrido pela vítima. Existem 04 (quatro)
possibilidades de excludentes: culpa da vítima; fato de terceiro; caso fortuito ou de
força maior e cláusula de não indenizar111.
108
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2000. p.275. 109
VENOSA, Silvio de Salvo. Direto civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2005. p.506. 110
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 459. 111
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 164.
41
Na culpa da vítima o dano pode vir a ser causado tanto por
culpa exclusiva ou culpa concorrente da vítima.
Neste caso, o agente causador do dano não contribuiu em
nada para que o dano ocorresse, ele foi mera ferramenta do acidente, excluindo
por completo o nexo de causalidade entre o dano e o acidente112.
Embora se faça presente ação ou omissão do agente, o fator
desencadeante do dano consiste em conduta culposa da própria
vítima. Acrescenta-se também, que a ação ou omissão do agente
não configura qualquer violação de dever de cuidado, embora
tenha servido, objetivamente, para o evento danoso113.
Há também a culpa concorrente da vítima e do causador
dano, nestes casos o dano teve sua causa tanto pelo comportamento culposo da
vítima como do agente, todavia o nexo de causalidade não se rompe, apenas é
atenuado o valor da indenização do agente114.
Tem-se por mais aceita a tese de que, verificado que autor e
vítima são culpados, a divisão da indenização não precisa ser,
necessariamente, reduzida pela metade. Deve, outrossim, ser
aferido o grau de culpabilidade de cada uma das partes e, em
função disso, estabelecer-se o justo valor indenizatório115.
Sobre o fato de terceiro, além da vítima e do causador do
dano existe uma terceira pessoa que concorreu para os prejuízos causados, o
fato de existir essa terceira pessoa não exonera o causador direto da obrigação
de indenizar a vítima, sendo garantido o direito regressivo116.
Rodrigues sobre a responsabilidade por fato de terceiro
ensina que: “Quando o fato de terceiro é a fonte exclusiva do prejuízo,
112
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 103. 113
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2000. p.81. 114
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 166. 115
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2000. p.82. 116
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 104.
42
desaparece, qualquer relação de causalidade entre o comportamento do
indigitado responsável e a vítima”117.
Para que seja excluída a responsabilidade por fato de
terceiro, é necessário demonstrar através de provas que o dano causado não
ocorreu por sua culpa e sim resultou do ato de terceiro, ficando deste modo o
agente desobrigado da responsabilidade.
No caso fortuito ou de força maior o dano não era possível
impedir, pois o episódio é alheio a vontade do agente, estas excludentes têm
presente dois requisitos que as caracterizam, o objetivo que reveste a fatalidade
do evento danoso, e o subjetivo que não tem presente a culpa na ocorrência do
dano118.
Caso fortuito, é quando o dano acontecer de uma causa
desconhecida, imprevisível, como a quebra de alguma peça da máquina que vem
a causar danos ao funcionário de uma empresa119.
Força maior, a origem que dá causa ao evento é conhecida,
porém, diz respeito a um fato inevitável, por se tratar de fato superior às forças do
agente, como normalmente são os fatos da natureza. Por isso que se diz que
nada pode ser feito, mesmo que esteja previsto120.
Por estes motivos o caso fortuito e força maior são
consideradas excludentes, pois afetam o nexo de causalidade, rompendo-o entre
o ato do agente e o dano sofrido pela vítima.
A cláusula de não indenizar está restrita a excludente da
responsabilidade contratual e incide na estipulação, fixada no contrato, onde
apenas uma das partes declara, com a anuência da outra parte, que não será
117
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 170. 118
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 105. 119
CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 85 120
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 105.
43
responsável pelos prejuízos decorrentes do não cumprimento da obrigação
contraída121.
Sobre o assunto Dias ensina que, "a cláusula ou convenção
de irresponsabilidade consiste na estipulação prévia por declaração unilateral, ou
não, pela qual à parte que viria a obrigar-se civilmente perante outra afasta, de
acordo com esta, a aplicação da lei comum ao seu caso"122. Desta forma propõe
anular, transtornar ou diminuir os resultados normais de um fato da
responsabilidade do favorecido da estipulação.
Existe uma ampla discussão sobre a validade ou não da
cláusula de não indenizar, para uns deve ser nula por ser contrária ao interesse
social. Já há outros que amparam em favor do princípio de autonomia da
vontade123.
Outro ponto que merece atenção à luz do Código de Defesa
do Consumidor, é o art. 51, I da Lei 8.078/90, pois não admite seu ajuste nas
relações de consumo, visto que é incerto por contrariar os princípios instituídos, e
que expressamente considera nula de pleno direito124.
Art. 51 São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas
contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do
fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e
serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas
relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa
jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações
justificáveis125.
Geralmente são colocadas frases como esta, "Não nos
responsabilizamos por objetos deixados no interior do veículo", nos
121
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. 20 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 179. 122
AGUIAR DIAS, José de. Da responsabilidade civil. 11 ed. São Paulo, 2006. p. 325. 123
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2000. p.86. 124
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 108. 125
BRASIL. Código de defesa do consumidor. São Paulo: Rideel, 2003.
44
estacionamentos de estabelecimentos comerciais, pois procuram, com isto, se
eximir da responsabilidade de indenizar, caso haja algum problema.
Assim entende a jurisprudência do Tribunal de Santa
Catarina a respeito do assunto:
"Prevendo a cláusula décima quarta do pacto de prestação de
serviços educacionais que "a contratada não se responsabiliza por
danos, furtos, roubos e quaisquer casos fortuitos, ocorridos em
suas dependências, de veículos ou objetos de propriedade do
contratante" (fl. 53 v), irrecusável é a sua ineficácia, porque o
caput do art. 51, do CDC, dispõe: "São nulas de pleno direito,
entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de
produtos e serviços que'; enquanto o seu inciso I é categórico:
"Impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do
fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos ou
serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos (...)'126.
A cláusula de responsabilidade deixa claro que não poderá
se eximir da responsabilidade de indenizar o agente da conduta que veio a causar
danos, porém, ela será ser eficaz quando houver vantagem para ambos. Esta
cláusula exclui a responsabilidade civil, não por desaparecer o nexo de
causalidade, mas em razão da convenção entre as partes.
126
SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 2006.004934-7, rel. Des. Volnei Carlin, j em. 12/04/2006. Disponível em: <http://www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 02/05/2007.
45
3. RESPONSABILIDADE DOS ESTACIONAMENTOS DE SHOPPING
CENTERS
3.1 DA CARACTERIZAÇÃO DO CONTRATO “DE ESTACIONAMENTO EM SHOPPING CENTERS”
Contrato é a união de duas ou mais pessoas, para declarar a
vontade, limitação, das partes consensualmente, onde se define a relação jurídica
existente entre elas127.
Examina-se mais detidamente a questão da caracterização
do contrato na relação de consumo, ou seja, trata-se de contrato de adesão,
contrato acessório e contrato de depósito, nos estacionamentos de shopping
center.
3.1.1 Contrato Acessório
Contrato acessório é aquele que sua existência esta
dependente a um contrato principal, ou seja, o contrato acessório segue o
contrato principal, ou seja, é dependente juridicamente128.
O contrato acessório, subsidiário ou secundário, possui duração
limitada àquela preconizada pelo contrato principal, do qual
depende. Ex: fiança civil em relação a locação129.
Geralmente o contrato acessório não tem autonomia, este
tipo de contrato é usado normalmente para servir de garantia de uma obrigação
127
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime
das relações contratuais. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p 51. 128
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5 ed. – São Paulo: Atlas, 2005. p. 448. 129
LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil. Vol 3. contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. 3 ed. ver. atual. Ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 186.
46
assumida no contrato principal. Podendo também servir de preparativo para o
principal, porém, depende de um acontecimento sólido130.
O contrato acessório é que permanece no mundo jurídico
em função do principal, assim extinguindo-se o principal, o acessório também se
extingui.
No caso dos shopping centers, o contrato de
estacionamento é acessório ao contrato de consumo, ou seja, compra e venda ou
prestação de serviços.
3.1.2 Contrato de Adesão
O contrato de adesão é aquele que as cláusulas já estão
predispostas por uma das partes, ou seja, uma das partes impõe os termos do
pacto, e a outra somente concorda com as condições e termos do contrato pré-
estabelecido131.
O Código Civil em seus artigos 423 e 424 apresentou sua
posição resguardando os direitos do aderente, não só sobre as “cláusulas
ambíguas ou contraditórias”, como também a de proibir a “renúncia antecipada do
aderente a direito resultante da natureza do negócio”132.
O Código Civil dispõe sobre o contrato de adesão da
seguinte forma, “Art. 423 - Quando houver no contrato de adesão cláusulas
ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao
aderente”. A cláusula deve ser clara, de fácil entendimento, pois se estiver
duvidoso, obscuro que sairá com vantagens será o aderente.
130
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5 ed. – São Paulo: Atlas, 2005. p. 448. 131
LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil. Vol 3. contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. 3 ed. ver. atual. Ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 74. 132
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil: direito das obrigações: parte especial, vol 6, tomo I: contratos. 6 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 30.
47
No art. 424 do Código Civil expressa a regra de
interpretação consagrada pela doutrina e jurisprudência, vejamos, “Art. 424 - Nos
contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada
do aderente a direito resultante da natureza do negócio.” Visa garantir os direitos
do aderente, pois o aderente não pode ser restringido de seus direitos.
Sobre este ponto o Código de Defesa do Consumidor em
seu artigo 54 caput, § 3º e § 4º estabeleceu que:
Art. 54 - Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido
aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas
unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que
o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente o seu
conteúdo.
§ 3° Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos
claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar
sua compreensão pelo consumidor.
§ 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do
consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua
imediata e fácil compreensão133.
Estes tipo de contrato com cláusulas pré-estabelecidas
surgiram como forma de racionalização nas empresas, incumbindo ao legislador a
tarefa de limitar a imposição deste tipo de cláusula que vai contra o aderente134.
Ponderando que o contrato de adesão é elaborado apenas
pelo proponente, não podendo ser debatido livremente pelas partes, pois é
submetido a uma das partes com os temos já estabelecidos, caso haja dúvida no
sentido de alguma das cláusulas, a interpretação deverá ser em benefício do
aderente, que como regra é a parte mais fraca135.
Vale ressaltar, que não resta ao usuário senão acatar os
termos da relação na forma imposta pelos shopping centers. Significa que a figura 133
BRASIL. Código de defesa do consumidor. São Paulo: Rideel, 2003. 134
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5 ed. – São Paulo: Atlas, 2005. p. 414. 135
LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil. Vol 3. contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. 3 ed. ver. atual. Ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 74.
48
contratual no plano fático assemelha-se muito a um contrato de adesão, não
devendo o cliente que a quem não foi oportunizado discutir as cláusulas do ajuste
contratual suportar os prejuízos decorrentes de uma situação impositiva. Neste
caso os freqüentadores de shopping center, que ao entrarem no estacionamento
do empreendimento aderem às condições impostas pela administradora do
estacionamento.
3.1.3 Contrato de Depósito nos Estacionamentos
Conforme artigo 627 do Código Civil, depósito acontece
quando um bem móvel é entregue pelo contratante (depositante) ao contratado
(depositário), a fim de guardá-lo até que quando for exigido, vejamos136:
Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto
móvel, para guardar, até que o depositante o reclame137.
Marques, sobre contrato de depósito ensina que:
[...] a figura do contrato de depósito tácito entre visitante do
shopping center ou supermercado, que guarda seu automóvel na
garagem ou estacionamento daquele centro de compras, e o
administrador do complexo ou proprietário do supermercado, que
oferece essa comodidade como facilities para o consumidor em
potencial138.
A disponibilização de estacionamento para os consumidores
é considerado um método de captação de clientes para o estabelecimento, visto
que a disponibilidade de vagas que é feita, vem a ser um atrativo para os
mesmos.139
136
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 299. 137
BRASIL. Código civil. São Paulo: Saraiva, 2003. 138
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p 466. 139
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5 ed. – São Paulo: Atlas, 2005. p. 422.
49
Admite-se à luz do direito do consumidor, que haja contrato de
consumo suis genere, visto que o estabelecimento oferece um
serviço, fruto da comodidade e do interesse da captação da
clientela. Como se não bastasse, mesmo que assim não se
entenda, subsiste a responsabilidade civil decorrente do dever de
guarda do veículo140.
Assim, se o bem é furtado ou danificado, ao guardador é
imputada a obrigação de reparar o dano, oriunda da inexecução de seu dever
preexistente, contratualmente assumido, de guarda, por culpa in vigilando ou in
eligendo*.
Segundo pacífica jurisprudência, inclusive com a edição da
Súmula n. 130 do egrégio Superior Tribunal de Justiça, o
supermercado responde pelo furto ocorrido em estacionamento
anexo às suas dependências. Existe, em tais casos, contrato
implícito de depósito, que torna a empresa responsável pela
guarda e segurança do veículo141.
O uso do temo contratual, seja depósito ou guarda, para
analisar sobre quem recai a responsabilidade por danos causados ao veículo
ainda não é pacífica, porém, basta ao consumidor provar que esteve com seu
veículo estacionado no estabelecimento comercial, para ter seus direitos
ressarcidos142.
Dias, ainda sobre contrato de depósito, ensina que “é um
dever de segurança sobre a coisa depositada, obrigação de resultado que tem por
efeito a presunção de culpa contra ele, se não a restitui ao termo do depósito”143.
140
SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 98.005320-0, de Joinville. Relator: Des. Anselmo Cerello. Disponível em: <http://www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 18/03/2007. * culpa in vigilando - Culpa em vigiar a execução de quem outrem ficou encarregado. * culpa in eligendo - Culpa na escolha. http://www.direitonet.com.br/dicionario_latim/x/31/55/315/ Acessado em 16/05/2007. 141
SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Ap. Civ n. 97.008491-9, rel. Des. Carlos Prudêncio, j. 07.10.97. Disponível em: <http://www.tj.sc.gov.br>. Acesso em: 20/10/2005. 142
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p 467. 143
DIAS, José de Aguar. Da responsabilidade civil. 10 ed.. Rio de Janeiro. Forense. 1997. v.1 p. 329.
50
Sobre o ato de estacionar o veículo nos estacionamentos de
shopping centers, sendo ele cedido de caráter oneroso ou gratuito, caracteriza um
contrato de depósito. Neste sentido a jurisprudência entende que:
Indenizatória. Furto de motocicleta do estacionamento de
shopping center. 1. A hipótese comporta a redução do módulo
probatório em favor dos autores, para quem a prova inequívoca ou
exata dos fatos fica muito dificultada. 2. Prova suficiente no
sentido de que o motociclista havia deixado a Yamaha/YBR 125E
estacionada em local destinado pela ré a tal fim, em área afeta ao
prédio do shopping. Inexistência de qualquer controle de entrada
e saída de motocicletas. Furto igualmente evidenciado a partir do
aludido estacionamento. 3. Responsabilidade objetiva da ré, a
quem competia a vigilância do local, independentemente da
existência de relação jurídica de depósito. 4. Correto o
entendimento de que o prejuízo experimentado (afora os lucros
cessantes, suficientemente provados) equivale ao valor de
mercado da moto furtada, independentemente do valor financiado
para pagá-la. Recurso desprovido144.
Colhe-se ainda da Jurisprudência:
Furto em estacionamento de shopping center. Responsabilidade.
Prova do fato. Dever de guarda. Sumula 130 do stj. Responde a
empresa pelo furto de veiculo ocorrido em seu estabelecimento.
Dever de vigilancia que nao e elidido pela gratuidade do servico
pois prestado como forma de atrair a clientela. O estabelecimento
comercial assume a obrigacao de guarda dos veiculos deixados
em seu parque de estacionamento. Hipotese que configura
contrato de deposito. A ocorrencia policial quando corroborada
pelo restante da prova, principalmente testemunhal, demonstra o
fato constitutivo de direito do autor. Aplicacao da sumula 130 do
stj. Apelo improvido145.
Destaca-se, por conseguinte, a sumula 130 do Superior
Tribunal de Justiça que assim revela:
144
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Recurso Cível Nº 71000744581, rel. Dês. Maria José Schmitt Santanna, j. em 21/09/2005. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 20/03/2007. 145
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível Nº 599350105, Rio Grande do Sul, rel. Dês. Marco Aurélio dos Santos Caminha, j. em 25/11/1999. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 07/05/2007.
51
Sumula 130. A empresa responde, perante o cliente, pela
reparação de dano ou furto de veículos ocorrido e, seu
estacionamento146.
A doutrina e os Tribunais entendem que os
estabelecimentos que disponibilizam o estacionamento aos seus clientes são
responsáveis pela guarda dos veículos ali estacionados, equiparando-se, a um
contrato de depósito tácito. Nota-se, que a disponibilização do serviço de
estacionamento caracteriza uma das atrações dos estabelecimentos que
oferecem aos clientes, fornecendo maior comodidade147.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
Sobre a responsabilidade solidária, há que se analisar o fato
de os estacionamentos possuírem uma administradora por empresas
terceirizadas. Nestes casos conforme expressa o Código de Defesa do
Consumidor no art. 7º em seu parágrafo único, a responsabilidade pela guarda do
bem é solidária, senão vejamos:
Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros
decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o
Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de
regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas
competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do
direito, analogia, costumes e eqüidade.
Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos
responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos
nas normas de consumo.
Do mesmo modo, o código civil trata da responsabilidade
solidária, existindo um entendimento entre ambas, como pode ser visto:
146
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em <www.stj.gov.br>. Acesso em: 20/10/2005. 147
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 6 ed. – São Paulo: Atlas, 2006. p. 246.
52
Art. 264. Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre
mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito,
ou obrigação, à divida toda148.
E ainda,
Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do
direito a outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se
a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão
solidariamente pela reparação149.
Deste modo, fica a critério do consumidor indicar quem vai
processar, podendo também escolher um ou todos os responsáveis no mesmo
processo. “Como a solidariedade obriga a todos responderem simultaneamente,
todos responderão pelo total dos danos causados”150.
Cabe ainda abordar o art. 25, parágrafo 1º do Código de
Defesa do Consumidor, que vem a confirmar a questão acima mencionada.
Art. 25 É vedada a estipulação contratual de cláusulas que
impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista
nesta e nas Seções anteriores.
§ 1º Havendo mais de um responsável pela causação do dano,
todos responderão solidariamente pela reparação prevista neste e
nas Seções anteriores151.
Sobre o assunto colhe-se da jurisprudência:
Responsabilidade civil. Furto de automóvel em estacionamento de
comunidade durante festa realizada na localidade. Contratação de
empresa de segurança para vigiar os veículos. Responsabilidade
solidária. Alegação, pela demandada, de ausência de prova da
ocorrência do evento danoso em suas dependências.
Circunstâncias que conduzem à conclusão de veracidade da
148
BRASIL. Código civil. São Paulo: Saraiva, 2003. 149
BRASIL. Código civil. São Paulo: Saraiva, 2003. 150
NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p.138. 151
BRASIL. Código de defesa do consumidor. São Paulo: Rideel, 2003.
53
versão do autor. Dever de indenizar das rés. Sentença
confirmada. Recurso improvido.152.
*
Ação de reparação de danos. Furto de um aparelho de cd player
em estacionamento de shopping center explorado por empresa
terceirizada. Presente verossimilhança no alegado pelo autor.
Incidência da súmula 130 do stj. Responsabilidade solidária por
vício na prestação do serviço, na forma dos arts. 7º, § único e 14
da lei nº 8.078/90. Recuso parcialmente provido. (Recurso Cível
Nº 71000912311, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas
Recursais, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em
06/04/2006)153
Para Efing a responsabilidade que o Código de Defesa do
Consumidor adota é a responsabilidade solidária, quando preceitua que os
fornecedores que participam da cadeia de fornecimento do produto ou serviço
instrumento do evento podem responder pela totalidade da reparação dos danos
suportados pelo consumidor154.
Sendo assim o consumidor que foi prejudicado tem o poder
da escolha do pólo passivo da relação, podendo optar por ambos os
responsáveis, a fim de garantir a chance de um reembolso dos danos causados.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
Com o desenvolvimento da sociedade, iniciada com a
revolução industrial, bem como pelo progresso tecnológico, a produção passou a
ser em série, uma verdadeira sociedade de massa. Com isso surgiu a Lei
152
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Recurso Cível Nº 71000906925, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ricardo Torre Hermann, Julgado em 10/08/2006. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 08/05/2007. 153
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Recurso Cível Nº 71000912311, Primeira Turma
Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ricardo Torre Hermann, Julgado em 06/04/2006. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 08/05/2007. 154
EFING, Antônio Carlos. Fundamentos do direto das relações de consumo. 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2004. p. 145.
54
8.078/1990 para defender os consumidores que eram a parte mais frágil da
relação de consumo155.
O Código de Defesa do Consumidor em seu art. 6º, inciso
VIII, enunciou que são direitos do consumidor:
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do
ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz,
for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as
regras ordinárias de experiências156
.
Deste modo, o Código de Defesa do Consumido, determina,
como direitos básicos do consumidor, o direito à facilitação da defesa, sendo que,
possibilitou a inversão do ônus da prova como meio viável de chegar a tal
facilitação.
Nestes casos o direito é taxado como uma facilidade à
defesa dos direitos do consumidor em face da hiposuficiência e fragilidade, bem
como da grande dificuldade invencível de realizar a prova de suas alegações
contra o fornecedor157.
Deste modo, o legislador, regula que se os fatos descritos
pela vítima, no caso o consumidor, parecerem verdadeiros, o juiz terá a faculdade
de determinar a inversão do ônus da prova, já que para o consumidor é mais
difícil a comprovação dos danos alegados158.
Na responsabilidade dos estacionamentos de shopping
centers, é mais difícil a comprovação por parte do consumidor, que o mesmo
realmente entrou no estacionamento do empreendimento com seu veículo, ou que
seu veículo não estava danificado até então. Neste ponto, os shoppings deteriam
155
CALDEIRA, Mirella D’Angelo. Inversão do ônus da prova. Revista de Direito do Consumidor. N.38 abril-junho. Ed. revista dos tribunais. 2001. p. 166. 156
BRASIL. Código de defesa do consumidor. São Paulo: Rideel, 2003. 157
ALMEIDA, João Batista de. Manual de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 77/78. 158
LEITE, Basilone Roberto. Introdução ao direito do consumidor: os direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor de defesa do consumidor. Editora LTR, São Paulo, 2002. p. 108.
55
os meios de prova do alegado, pois, se fosse necessário, teriam acesso aos
vídeos do circuito interno de vigilância eletrônica159.
A inversão do ônus da prova prevista pelo Código de Defesa
do Consumidor, é decidida a critério do juiz, quando este verifica a
verossimilhança das alegações ou a hipossuficiência do consumidor160.
Verossimilhança significa “ser semelhante, que não repugna
a verdade, tem aparência de verdade, portanto significa dizer que tem a
possibilidade de ser verdadeiro”161.
Tanto a doutrina como a jurisprudência, não chegaram a um
acordo sobre o conceito de hipossuficiência, porém a maioria defende que se
trata de hipossuficiência técnica sobre o assunto, deste modo o fornecedor sobre
o produto tem maior conhecimento podendo ele provar com mais facilidade o
dano alegado162.
Ainda sobre a importância deste instituto de inversão da
prova:
A vulnerabilidade do consumidor muitas vezes torna impossível a este a prova do fato constitutivo do seu direito, o que lhe é exigido nos termos do art. 333 do CPC. Para situações que tais e também nos casos de verossimilhança das alegações do consumidor, a critério do juiz, é possível inverter o ônus da prova, ou seja, exigir que o fornecedor prove o fato extintivo, modificativo ou impeditivo do direito do consumidor, mesmo sem que este tenha provado o fato constitutivo
163.
Sobre o tema, vale destacar as palavras de Georges
Humbert ao referir-se a prova:
159
LEITE, Basilone Roberto. Introdução ao direito do consumidor: os direitos do consumidor e a aplicação do código de defesa do consumidor de defesa do consumidor. Editora LTR, São Paulo, 2002. p. 108/109. 160
CALDEIRA, Mirella D’Angelo. Inversão do ônus da prova. Revista de Direito do Consumidor. N.38 abril-junho. Ed. revista dos tribunais. 2001. p. 172. 161
SILVA, Adalberto Prado e. Dicionário Brasileiro Melhoramentos. Edições Melhoramentos. Vol.III. p. 1283. 162
ALVAREZ, Anselmo Prieto. As repercussões extraprocessuais e processuais (competência e inversão do ônus da prova) da facilitação da defesa do consumidor como garantia básica do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. N.57 janeiro-março. Ed. revista dos tribunais. 2006. p. 175. 163
ROLLO, Arthur; ROLLO, Alberto. O CDC contra o interesse difuso. DireitoNet, São Paulo, 26 abr. 2004. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/15/47/1547/>. Acesso em: 08/05/2007.
56
Denomina-se prova, todo elemento que contribui para a formação da
convicção do juiz a respeito da existência de determinado fato. É tudo
aquilo que for levado aos autos com o fim de convencer o juiz que o fato
ocorreu. Portanto, a colheita de provas é fundamental, pois será o
material com base em que o julgador formará o seu juízo de valor acerca
dos fatos da causa164
.
Portanto, cabe ao shopping comprovar que o veículo ali não
foi furtado ou danificado, utilizando-se dos meios tecnológicos e de vigilância,
bem como de provas testemunhais e até periciais, a fim de reforçar a tese de que
o não houve o dano relatado pelo consumidor165.
Colhe-se da jurisprudência:
Ação de indenização por danos morais inversão do ônus da prova
aplicação do artigo 6º, VIII, do Codecon hipossuficiência técnica e
verossimilhança das alegações existentes possibilidade decisão
mantida. Verificada a hipossuficiência técnica do consumidor
frente ao fornecedor, configurando hipótese em que ao último
seria consideravelmente mais fácil a produção da prova, justifica-
se a inversão do onus probandi, nos termos do artigo 6º, VIII, do
Código de Defesa do Consumidor166.
*
Reparação de danos materiais. Veículo que restou danificado no
momento em que se encontrava em estacionamento de shopping
center. Prova do dano. Inversão do ônus da prova.
Responsabilidade configurada. Aplicação da Súmula 130 do STJ.
Recurso desprovido. Unânime167.
O ônus da prova incumbe a quem alega, competindo ao
consumidor demonstrar os requisitos necessários para que o Magistrado conceda
164
HUMBERT, George Louis Hage. Inversão do ônus da prova no CDC. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4939>. Acesso em 20/03/2007. 165
ALMEIDA, João Batista de. Manual de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 78. 166 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumentos Nº 2005.017313-3, Relator: Jorge Schaefer Martins, Julgado em 30/03/2006. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 09/05/2007. 167
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Recurso Cível Nº 71000649632, rel. Dês. João Pedro Cavalli Junior, j. em 14/04/2005. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 20/10/2005.
57
o instituto da inversão do ônus da prova, cabendo revelar os danos efetivamente
ocorridos e o nexo de causalidade entre o fornecedor.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DOS ESTACIONAMENTOS DE
SHOPPINGS CENTER
Conforme explanado acima, na responsabilidade objetiva
não é necessária a comprovação de culpa do agente. Deste modo, o Código de
Defesa do Consumidor, indica que os estacionamentos de shopping centers, que
mantêm áreas amplas e confortáveis para seus clientes estacionarem, com o fim
de captar a clientela, respondem objetivamente pelos danos causados nos
veículos dos consumidores.
Stoco elucida que “é cediço que uma das maiores atrações
que os shoppings e supermercados oferecem é justamente a facilidade e
comodidade para estacionar. Buscam assim atrair clientes por este meio”168.
O dever de guarda decorre independente do depósito clássico no
caso. É corolário natural da boa-fé objetiva, do dever de garantia,
decorrente da concepção ética que se exige dos contratantes no
Direito Privado contemporâneo: o estacionamento é oferecido de
forma convidativa para o cliente impondo-lhe, via de
conseqüência, a responsabilidade pela integridade dos veículos
estacionados169.
Por ter características de contrato de depósito, visto que o
consumidor deposita o bem no estacionamento do estabelecimento comercial, o
shopping center, tem o dever de guardá-lo, de zelar como se seu fosse, conforme
preconiza o art. 627 do Código Civil.
Neste sentido a jurisprudência também entende que:
168
STOCO, Rui. Tratado da responsabilidade civil. 5 ed. São Paulo: RT, 2001.p.562. 169
FARIAS, Cristiano Chaves de. Responsabilidade civil dos shopping centers por danos causados em seus estacionamentos. Revista de Direito Privado. N.21 janeiro-março. Ed. revista dos tribunais. 2005. p. 71/72.
58
Indenização. Responsabilidade civil. Furto de veículo em
estacionamento de shopping center. Ainda que o serviço de
estacionamento seja gratuito, não havendo controle de entrada e
saída de veículos, com entrega de chaves, ou outro meio, e
mesmo que o automotor seja manobrado pelo próprio usuário, é
indescartável o dever do shopping center de indenizar o furto do
automóvel verificado no local, pois é presumido o dever de guarda
e vigilância, remunerado de maneira indireta, no próprio custo das
mercadorias. Não há negar que o estacionamento constitui-se em
serviço de inegável interesse econômico para o empreendimento
comercial atrair clientela170.
*
Responsabilidade civil. Estabelecimento comercial. Furto de
veículo de cliente em estacionamento. Responsabilidade da
empresa pelo prejuízo sofrido. Ausência de contraprestação
pecuniária que não exonera o empresário do dever de vigilância.
Serviço que, por constituir fator de grande importância na disputa
da clientela, influi na perspectiva de lucro. Indenização devida.
Recurso desprovido. Na disputa da clientela pelo estabelecimento
comercial, um bom estacionamento constitui fator de muita
importância, e quem tira proveito das dependências de que dispõe
há de responder pelos riscos de quem deixa o veículo lá. Trata-se
de responsabilidade objetiva, somente elidida por eventual
intercessão de outro fluxo causal autônomo (caso fortuito). (RT
671/89) (Apelação cível n. 99.000517-8, comarca da Capital, Des.
Rel. Sérgio Paladino, Segunda Câmara Civil do TJSC, julgado em
4 de março de 1999). RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE
DE CONSUMO. FATO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE
OBJETIVA. Responde o comerciante, independentemente de
culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por
defeitos relativos à prestação de serviços, entendendo-se como
tal, em face da abrangência do conceito legal, toda a atividade por
ele realizada no propósito de tornar o seu negócio viável e
atraente, aí incluídos o estacionamento, as instalações
confortáveis e outras facilidades colocadas à disposição da sua
clientela171. [grifo meu]
170
SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação cível Nº 1999.022934-3, Relator: Jorge Schaefer Martins, Julgado em 31/10/2002. Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 10/05/2007 171
RIO DE JANEIRO, Tribunal de Justiça. Ap. Civ. 533/95, rel. Des. Sérgio Cavalieri Filho. Disponível em <http://www.tj.rj.gov.br>. Acesso em: 10/05/2007.
59
Cumpre enfatizar que mesmo que gratuito o estacionamento
de shopinng center em nada altera a responsabilidade objetiva do
empreendimento, em vista do eventual valor a ser cobrado pelo parqueamento
estar embutido no valor das mercadorias a serem adquiridas172.
E ainda, por se tratar de um empreendimento que tem como
objetivo proporcionar aos seus clientes um maior conforto e comodidade, o
shopping center utiliza o estacionamento como uma forma de tornar essa
comodidade mais real, há toda evidência, que o oferecimento de tais
comodidades e segurança nos estacionamentos, é um dos grandes atrativos
desse estabelecimento, sendo deste modo, um atrativo ao consumidor para que
se sinta mais seguro ao realizar suas compras173.
Perante tudo o que foi elucidado, baseado em
jurisprudências e nas doutrinas dominantes, fica claro que os shopping centers
respondem objetivamente pelos danos causados em seus parqueamentos, pois
têm o dever de guardar o bem ofertado e zelar para a sua segurança, pouco
importando que o estacionamento que tenha entrada de veículos acessível com
ou sem controle de entrada, sendo indiferente a existência de avisos indicativos
da disposição de não assumir a responsabilidade por furo ocorrido enquanto o
veículo estava estacionado no parquamento.
172
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.229. 173
PINTO, Roberto Wilson Renault. Shopping Centers: questões jurídicas. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 233..
60
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de não haver um posicionamento definido, tanto da
doutrina como da jurisprudência, com relação ao tema abordado, em
especialmente no que se refere ao fundamento da obrigação dos
estabelecimentos comerciais de reparar os prejuízos experimentados pelas
vítimas, que têm seus veículos furtados ou danificados em estacionamentos de
shopping center, algumas considerações podem ser extraídas.
Os estabelecimentos comerciais têm interesse econômico
em disponibilizar área para estacionamento dos veículos de seus clientes, pois a
comodidade ofertada representa atrativo para a clientela, proporcionando
maiores lucros.
Ainda que o estabelecimento não cobre pelo
estacionamento, de forma indireta há remuneração, seja pela compra de
mercadorias, seja pelo potencial aumento de lucro vindo da expectativa de maior
fluxo de clientes atraídos pela comodidade, seja por essa importância já se
encontrar embutida no valor das mercadorias e dos demais serviços prestados.
A existência de placas de advertência, avisos, cartazes, ou
anotações nos tíquetes, em que consta a informação de que o estabelecimento
comercial não se responsabiliza pelos danos ocorridos no interior do
estacionamento, não tem a força de excluir a responsabilidade do
empreendimento, pois, representando a verdadeira cláusula de não indenizar, só
tem validade quando amplamente discutida e aceita pelas partes, o que, na
prática, não ocorre.
A Jurisprudência e a doutrina vêm se manifestando
favoravelmente ao cliente, no sentido de impor ao estabelecimento comercial a
obrigação de reparar o prejuízo sofrido pelo cliente em virtude de ter seu veículo
furtado ou danificado em estacionamento daquele, já existindo, inclusive, súmula
do Superior Tribunal de Justiça neste sentido. Divergem, no entanto, quanto ao
61
fundamento da obrigação de reparar o prejuízo, dividindo-se em teorias subjetivas
e teorias objetivas.
As teorias subjetivas, fundadas na idéia da culpa, vão
centrar-se na noção de guarda, de forma que o estabelecimento comercial de
onde o veículo é furtado será responsável quando ficar caracterizada a assunção
da guarda do mesmo.
Uma das formas de transferir-se a guarda, é através do
contrato de depósito. Como o escrito não é da substância desse contrato, pode
ser provado através dos tíquetes, recibos, ou outros documentos emitidos pelo
estacionamento. Mas, por ser contrato real, exige a entrega efetiva da coisa, no
caso o veículo, a entrega das chaves vai caracterizar a transferência da guarda.
Como não há lei impondo o dever de guarda, vigilância ou
custódia nos casos em estudo, capaz de determinar a responsabilidade
extracontratual do estabelecimento comercial, a jurisprudência procurou justificar
a existência deste dever através das circunstâncias em que o empresário
voluntariamente se investiu. Assim, atribui esses deveres aos estabelecimentos
comerciais tanto por terem interesse econômico no oferecimento e manutenção
do estacionamento, como por vincular aos usuários do estacionamento uma
impressão razoável de segurança, seja por serem cercados, ou pela existência de
vigias, ou por outros fatores que criem essa impressão de segurança. Assim,
violados esses deveres, configura-se a responsabilidade extracontratual dos
estabelecimentos comerciais, lutando em prol das vítimas uma presunção de
culpa daqueles.
A tendência da responsabilidade civil, atualmente, é de que
seja, se não abandonada, pelo menos suavizada a noção de culpa, o que
proporcionará às vítimas maiores possibilidades de verem reparados os prejuízos
sofridos. No próprio campo da responsabilidade subjetiva já está se desfigurando
o conceito de culpa, como demonstram as presunções absolutas de culpa, que
não representam outra coisa senão o reconhecimento da teoria objetiva com o
rótulo de subjetiva. O próprio conceito de culpa na guarda está ligado a
concepção objetivista, pois, para a sua configuração, basta o fato de perder a
62
guarda da coisa, a que se estava obrigado, não se investigando sobre a
existência ou não de imputabilidade moral.
A responsabilidade civil dos estabelecimentos comerciais,
sob o enfoque da teoria objetiva do risco do empreendimento, reside no fato de
que, se o empresário colhe os benefícios de sua atividade econômica, tanto por
ser indispensável a existência do estacionamento para que o estabelecimento
comercial possa se manter no mercado, como pelo lucro auferido direta ou
indiretamente, surge daí o seu dever de suportar os ônus decorrentes do risco
criado aos consumidores, de forma que, se algum veículo é furtado ou danificado,
deve o empresário arcar com o prejuízo.
A teoria do risco de empresa, no entanto, deve ser
interpretada muito além da perspectiva do lucro. O simples exercício de uma
atividade empresarial potencialmente lesiva deve ser motivo suficiente para impor
a obrigação de suportar os ônus resultantes dos eventos danosos inerentes ao
processo produtivo ou distributivo. Como o oferecimento de estacionamento está
ligado à atividade empresarial, havendo o furto de veículos, ou dano neles
ocorridos, no estacionamento, o empresário deve responder pelo prejuízo,
independente de qualquer indagação de culpa.
A aceitação da teoria objetiva do risco implica no
reconhecimento da obrigação de indenizar em um maior número de casos,
independente se o estacionamento é gratuito ou pago, se há vigias ou não, se há
controle de entrada de saída com emissão de tíquetes ou não.
Não obstante a jurisprudência esta reconhecendo, em
alguns julgados, a responsabilidade dos estabelecimentos comerciais nesses
casos, mesmo sem haver lei fixando-a, a matéria ganhou novos contornos com o
Código de Defesa do Consumidor, que determinou a responsabilidade
independente de culpa dos prestadores de serviço, em que se enquadram os
estabelecimentos comerciais que oferecem área de parqueamento a seus
clientes, pelos defeitos ocorridos.
63
Frente a essa nova realidade, os empresários devem
assumir uma postura diferente, buscando alternativas para, além de socializar os
riscos de sua atividade, como a contratação de seguro, também prevenir os
sinistros em estacionamentos sob sua responsabilidade, garantindo a tão
pretendida segurança destes serviços.
64
REFERÊNCIAS
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