Post on 23-Jul-2016
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ROBÔS AUXILIAM MÉDICOS NO TRATAMENTO DE PACIENTES 14
ESPECIALIDADES VETERINÁRIAS GANHAM ESPAÇO 37
O CAMINHO PARA O DESENVOLVIMENTO
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Beto Richa Governador do Estado do Paraná
Flávio José ArnsVice-Governador
João Carlos Gomes Secretário de Estado da Ciência,
Tecnologia e Ensino Superior
Diretoria da Fundação Araucária de Apoio ao Desenvolvimento Científico
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EquipeEdição e reportagem:
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Marivone Ramos, Paula Meleche Rosângela Oliveira
Revisão: Debora Capella
FotografiaIsabelle Neri Vicentini, Banco de Imagens
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Distribuição Gratuita
Tiragem2.000 exemplares
ImpressãoGráfica Ipiranga
Revista semestral da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
(Seti) e da Fundação Araucária.
Direitos ReservadosÉ proibida a reprodução total ou parcial de
textos e fotos sem prévia autorização.
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2 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
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ASTRONOMIA
DIRETOR DO OBSERVATÓRIO ASTRONÔMICO
DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA (UEPG) FALA SOBRE OS AVANÇOS
E OS DESAFIOS DA ÁREA NO PARANÁ
INICIAÇÃO CIENTÍFICA
BOLSAS INCENTIVAM OS ALUNOS À
PESQUISA E AUXILIAM NA EVOLUÇÃO SOCIAL
INOVAÇÃO
SUPORTE PARA O DESENVOLVIMENTO
ECONÔMICO E SOCIAL DE UM PAÍS
MÁQUINAS “INTELIGENTES”
ROBÔS QUE FAZEM A DIFERENÇA NA
SOCIEDADE JÁ SÃO MAIS COMUNS DO
QUE SE IMAGINA
FLORESTA DAS ARAUCÁRIAS
APESAR DAS DIFICULDADES
NA PRESERVAÇÃO, PESQUISAS SÃO
DESENVOLVIDAS PARA PROTEGER A ÁRVORE
NA REGIÃO SUL
SUSTENTABILIDADE
PROJETOS DESENVOLVIDOS NA CONSTRUÇÃO CIVIL BUSCAM REDUÇÃO DE IMPACTOS AMBIENTAIS
ÍNDICE
PESQUISA
FAPS POTENCIALIZAM A CIÊNCIA E O
DESENVOLVIMENTO DO PAÍS POR MEIO DO INVESTIMENTO
EM PESSOAS E IDEIAS
QUALIDADE DE VIDA
PESQUISAS BUSCAM MELHORAR A
QUALIDADE DOS ALIMENTOS QUE CHEGAM À MESA DOS BRASILEIROS
BEM ATENDIDOS
ESPECIALIDADES VETERINÁRIAS
OPORTUNIZAM MELHORES CUIDADOS
AOS ANIMAIS E TRANQUILIZAM OS
PROPRIETÁRIOS
ARTIGO
A INTERNACIONALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO
SUPERIOR NO BRASIL
3PARANÁ FAZ CIÊNCIA
UM ANO DE DIVULGAÇÃO
CIENTÍFICArevista Paraná Faz Ciência está
completando um ano de existên-
cia, e para marcar essa iniciativa
importante para a divulgação
científica do estado do Paraná,
em sua terceira edição, traz um assunto
que norteia o despertar do interesse de
uma pessoa em se tornar um futuro pes-
quisador: trata-se dos Programas de Ini-
ciação Científica (englobando Bolsas para
Iniciação Científica Júnior (PIBIC-Jr); Bolsas
para Extensão Universitária (PIBEX); o Pro-
grama Institucional de Apoio à Inclusão
Social - Pesquisa e Extensão Universitária
e Bolsas de Iniciação Científica e Inicia-
ção em Desenvolvimento Tecnológico
e Inovação (PIBIC&PIBIT), nos quais os
estudantes são estimulados a conhecer a
ciência, podendo gerar amplos e signifi-
cativos benefícios para a sociedade.
O Brasil, de modo geral, e o Paraná
de modo específico, construíram uma
grande e competente estrutura de pes-
quisa científica e tecnológica e formam
anualmente um número considerável
de pesquisadores. Como resultado, é re-
conhecida a importância da publicação
brasileira nos veículos internacionais de
ESPAÇO DO LEITOR
disseminação científica. Os avanços al-
cançados nas últimas décadas no setor
são inegáveis, resultado de esforços con-
juntos do governo, das instituições cientí-
ficas e tecnológicas e das empresas.
A inovação, tema de Capa desta edi-
ção, mostra à sociedade a necessidade
de mudanças nos modelos atribuídos à
geração do conhecimento, processo im-
prescindível para o desenvolvimento e o
enriquecimento do estado. os debates
recentes acerca do desenvolvimento do
Brasil, tornou-se consenso a importância
da integração entre Ciência, Tecnologia
e Inovação. É realidade concreta que as
nações que investiram na valorização de
processos inovadores são os potenciais
líderes mundiais. A inovação é considera-
da por muitos como a terceira revolução
industrial.
Também podem ser verificadas nes-
ta edição reportagens relacionadas aos
avanços da robótica, da medicina vete-
rinária, da tecnologia de alimentos, da
sustentabilidade e de projetos voltados
à preservação das araucárias. Como for-
ma de valorização dos pesquisadores
paranaenses, a entrevista é referente às
novidades no campo da astronomia,
com o renomado professor e diretor do
Observatório Astronômico da Universi-
dade Estadual de Ponta Grossa (UEPG),
Marcelo Emilio.
A Revista conta, ainda, com uma ma-
téria dedicada exclusivamente ao papel
das Fundações de Amparo à Pesquisa
(FAPs), com relação ao desenvolvimento
científico e tecnológico do país. Foi utili-
zada, como exemplo, a FAP do Paraná –
Fundação Araucária, que, com incentivo
e financiamento de projetos de pesquisa
e disponibilização de bolsas, contribuiu
para que as notas dos programas de
Pós-Graduação stricto sensu do estado
aumentassem a cada avaliação trienal
realizada pela Capes.
Os programas da região Sul tiveram
o melhor desempenho na última ava-
liação e, dos estados do Sul, o Paraná se
destacou, pois 27% das notas aumenta-
ram. Essas informações e muitas outras
referentes aos programas e projetos de-
senvolvidos por pesquisadores, discen-
tes e docentes paranaenses podem ser
encontradas na revista Paraná Faz Ciência.
Boa leitura!
Esse espaço é direcionado a você, leitor, para que possa contribuir com sugestões e críticas. Para isso, temos os seguintes canais: www.paranafazciencia.com.br prfazciencia@fundacaoaraucaria.org.br
4 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
ENTREVISTA
O mundo da Astronomia é objeto de estudo do professor Marcelo Emilio, da UEPG
DE OLHO NO UNIVERSO
om ampla experiência em As-
tronomia, o professor e diretor
do Observatório Astronômico da
Universidade Estadual de Ponta
Grossa (UEPG), Marcelo Emílio, é
pesquisador afiliado R5 da Universi-
dade do Havaí e doutor em Astronomia
pela Universidade de São Paulo (USP).
Realizou o pós-doutorado no Instituto
de Astronomia da Universidade do Havaí
(2012). Com experiência na área de Física
Solar, é um dos responsáveis por uma
pesquisa que mede o diâmetro do Sol.
O professor também atua em cursos de
formação continuada em Astronomia no
Paraná (FOCAR), que visa à capacitação
de professores. Marcelo Emilio conversou
com a reportagem da revista Paraná Faz
Ciência e contou detalhes sobre sua ex-
periência na área.
Foto
: Isa
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Ner
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5PARANÁ FAZ CIÊNCIA
O país está avançando no processo de internacionalização para a troca de experiências no meio científico. Qual a importância dos projetos de intercâmbio com universidades es-trangeiras para o desenvolvimento da ciência aqui no Brasil?
Grandes projetos científicos são um es-
forço internacional hoje. Cito, por exem-
plo, o Projeto Genoma, o Grande Colisor
de Hádrons do CERN (Conseil Européen
pour la Recherche Nucléaire), a estação
espacial internacional (ISS) e o observa-
tório europeu do Sul (ESO). A ciência se
tornou muito cara para um único país
financiá-la. Manter e capacitar recursos
humanos é uma empreitada longa e
difícil. Projetos de intercâmbio são ne-
cessários para fazer boa ciência tanto no
Brasil quanto em qualquer outro país no
mundo. No grupo em que participo, há
pesquisadores americanos, japoneses,
russos e franceses. Dos projetos que citei,
o Brasil está se integrando ao ESO (http://
www.eso.org). A astronomia brasileira
possui boa integração internacional. Já
há experiência brasileira em projetos
internacionais de construção de teles-
cópios, como o GEMINI (http://www.ge-
mini.edu) e o SOAR (http://www.soarte-
lescope.org).
O Brasil também participará da cons-
trução de dois dos maiores telescópios
do mundo: o European Extremely Lar-
ge (E-ELT) Telescope (http://www.eso.
org/public/teles-instr/e-elt/) e o Giant
Magellan Telescope (GMT) (http://www.
gmto.org/). Como a participação do Bra-
sil no ESO é nacional, a UEPG também
terá acesso aos telescópios, possibilitan-
do continuar a desenvolver astronomia
de primeiro mundo aqui. Esse é um dos
motivos para abrirmos um curso de gra-
duação em Astronomia na UEPG. A maior
parte do financiamento para um bom
curso de graduação já está sendo feita
pelo governo federal. Atualmente, estou
buscando recursos para a participação
brasileira de um telescópio chamado
PLANETS, que será construído no Havaí
(EUA).
O senhor tem ampla experiência em pesquisas na área de Astrono-mia. Como está o Brasil em relação a outros países nessa área científica? Temos condições de avançar?
O Brasil tem boas pesquisas devido
à sua inserção internacional. Além dos
projetos de telescópios que já citei, ti-
vemos participação no satélite CoRoT.
Atualmente, estamos negociando nossa
participação em um satélite que busca-
rá planetas ao redor de outras estrelas,
chamado PLATO. O que ainda não há
no Brasil é um fluxo contínuo de editais
científicos para satélites científicos pro-
movido pela Agência Espacial Brasileira
(AEB). Essa ação fomentaria e manteria
a indústria aeroespacial e desenvolveria
tecnologia para o país.
Como foi sua experiência nos EUA com a pesquisa sobre o cálculo do diâmetro solar? Qual o próximo pas-so dessa pesquisa?
Aprendi e continuo aprendendo bas-
tante com minhas experiências em pro-
jetos internacionais. Temos atualmente
um projeto aprovado pela agência in-
ternacional americana (NASA), projeto
O que ainda não há no Brasil é um fluxo contínuo de editais científicos para satélites científicos promovido pela Agência Espacial Brasileira (AEB). Essa ação fomentaria e manteria a indústria aeroespacial e desenvolveria tecnologia para o país.
Foto: Isabelle Neri
6 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
esse de que sou coinvestigador principal
(CO-I). Trabalhei com um satélite da NASA
em meu doutorado, chamado Solar and
Heliospheric Observatory (SOHO). Atual-
mente, lançaram outro satélite, chama-
do Solar Dynamics Observatory (SDO)
e eu faço parte do time que construiu
e mantém o instrumento Helioseismi-
cand Magnetic Imager (HMI) (http://hmi.
stanford.edu/hmi_files/HMI_team.pdf).
Contribuí com parte de um software que
analisa as imagens do satélite em solo. A
cada seis meses, o SDO faz uma manobra
para obter medidas do achatamento do
Sol para nosso grupo. O desvio da sime-
tria esférica do Sol causa mudança na ge-
ometria do campo gravitacional. Isso está
relacionado a um dos testes clássicos da
teoria da relatividade geral proposta por
Albert Einstein. Em 2012, publicamos os
primeiros resultados com as medidas de
achatamento do Sol do HMI na revista
Science. Além disso, faço parte de um
grupo internacional sediado na França
que analisa dados de um tipo de estrela
quente em emissão do satélite COnvenc-
tionROtation et Transits plánetaires - Co-
RoT (http://corot-be.obspm.fr).
A expectativa de retorno financei-ro das pesquisas em curto prazo pre-judica os investimentos em ciência?
A ciência não deve ser vista unicamen-
te como geradora de riqueza. A maior
parte de pesquisas científicas não ge-
rará riqueza. Isso não só no Brasil, mas
em qualquer lugar no mundo. Tanto o
governo como empresários no Brasil
não investem suficiente em pesquisa
científica. A título de comparação, em-
presas brasileiras investem em ciência e
desenvolvimento 0,55% do PIB (Produto
Interno Bruto), enquanto na Coreia do Sul
são investidos 2,68%, e na China, 1,22%.
Quando me falam em inovação, o exem-
plo que primeiramente vem à minha me-
mória é à invenção da lâmpada por Tho-
mas Edison e a distribuição da corrente
alternada por Nikola Tesla. A iniciativa
desses homens revolucionou
nosso modo de vida e produ-
ção. Cidades puderam ser facil-
mente iluminadas e inúmeros
processos industriais puderam
ser desenvolvidos. Nada disso
seria possível sem os trabalhos
em ciência básica desenvolvi-
dos por Michael Faraday e Ja-
mes Clerk Maxwell na teoria do
eletromagnetismo clássico. A
aplicação em ciência básica é
absolutamente necessária para
o desenvolvimento tecnológi-
co, porém a geração desse co-
nhecimento não prevê retorno
financeiro. O investimento em
ciência básica é feito para gerar
conhecimento, e não riquezas
diretas.
O Observatório Astronô-mico da UEPG participou de atividades que regis-tram grandes descobertas. A mais recente foi a identi-ficação dos anéis do asteroide Chari-klo. Quais as ações desenvolvidas no Observatório?
No observatório da UEPG, é realizado o
tripé do eixo fundamental da Universida-
de: pesquisa, ensino e extensão. Há dis-
ciplinas de Astronomia na graduação e
Pós-Graduação na UEPG. Temos hoje ex-
-alunos da UEPG fazendo doutorado em
Astronomia no exterior. Tivemos tam-
bém ex-alunos passando em primeiro
lugar em testes nacionais para admissão
no curso de Pós-Graduação da Universi-
dade de São Paulo (USP), que tem a nota
máxima segundo a Capes. Estamos pro-
pondo um novo curso de bacharelado
em Astronomia na UEPG. O projeto está
em trâmite.
Atualmente, na extensão, desenvolve-
mos cursos de formação continuada em
Astronomia no estado do Paraná (FO-
CAR). Já foram realizadas nove edições
do FOCAR. Um projeto chamado Céu do
Paraná também percorre o estado com
planetários móveis.
Na pesquisa científica, temos contri-
buições importantes em revistas como
Nature e Science sobre a forma do Sol e
participação em medidas de tamanho
de objetos transnetunianos e pela con-
tribuição na descoberta do primeiro anel
encontrado em torno de um asteroide.
A ciência se tornou muito cara para um único país financiá-la. Manter e capacitar recursos humanos é uma empreitada longa e difícil.
Foto: Isabelle Neri
7PARANÁ FAZ CIÊNCIA
CAPA
Há muitas definições para inovação. No entanto, é praticamente um consenso que ela é o imperativo
para o desenvolvimento de qualquer nação
onsiderada uma das condi-
ções primordiais para o de-
senvolvimento de um país, a
inovação tem um significado
muito mais amplo do que se
imagina: só podemos chamar de inova-
ção quando o conhecimento elaborado
ou desenvolvido, por meio de pesquisas,
é aplicado e gera benefício para a socie-
dade. Sendo assim, a inovação pode (e
deve) se transformar em geração de ri-
queza para o país; no entanto, o que gera
essa riqueza é a aplicação do conheci-
mento, e não somente a pesquisa.
Assim, muitos especialistas e pesqui-
sadores da área defendem o incentivo e
Tudo que melhora a condição
de vida da sociedade é inovação.
Cristina Quintella
PARANÁ FAZ CIÊNCIA8
1º ESTADOS UNIDOS (2,2 MILHÕES)
2º JAPÃO (1,6 MILHÃO)
3º CHINA (875 MIL)
4º COREIA DO SUL (738 MIL)
5º ALEMANHA (549 MIL)
6º FRANÇA (490 MIL)
7º REINO UNIDO (459 MIL)
PATENTESVÁLIDAS
NO MUNDO 2012
De acordo com a Organização Mundial de Propriedade Intelectual (WIPO), o número de pedidos de patentes cresceu 9,2% em 2012 — um recorde nos últimos 18 anos. Dos 20 países pesquisados, 16 registraram crescimento. Os maiores foram: China (24%), Nova Zelândia (14,3%), México (9%), Estados Unidos (7,8%) e Rússia (6,8%). No Brasil, também houve aumento (5,1%). A Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/1996) diz que, a partir da data de depósito no INPI, a patente de invenção tem prazo de validade de 20 anos, e a de modelo de utilidade, 15 anos.
Fonte: Relatório anual da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (WIPO), vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado em 2014.
19º BRASIL (41 MIL)
investimentos para a inovação.
A doutora em Ciências Molecu-
lares pela Universidade de Sussex
(UK), professora e coordenadora de
Inovação da Universidade Federal
da Bahia (UFBA), Cristina Quintella,
diz que, quando se fala em inova-
ção tecnológica, deve-se pensar em
transferência de tecnologia. “Tudo
que melhora a condição de vida da
sociedade é inovação”, completa.
Segundo Cristina, qualquer inova-
ção deve impactar o Produto Interno
Bruto (PIB) e o Índice de Desenvolvi-
mento Humano (IDH), dois grandes indi-
cadores do desenvolvimento de uma na-
ção. Porém, a apropriação de tecnologia
ainda é baixa no Brasil (veja o infográfico).
“Em outros países, o pesquisador se apro-
pria da patente e publica, mas aqui ainda
não temos procedimentos e rotina nessa
direção”, comenta.
As transferências de tecnologias e
os registros de patentes — passos im-
portantes para a inovação — são fato-
res igualmente apontados pelo diretor
executivo da Agência de Inovação da
Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Emerson Camargo. “Apesar de a UFPR
contar com bons índices de depósitos
de patentes (são 327 hoje) e contratos de
transferência de tecnologia (44), os nú-
meros ainda são muito baixos, se compa-
rados aos de outros países”, comenta.
O professor acredita que no Brasil falta
um contato maior entre universidade e
empresa, por isso, é mais difícil a trans-
ferência do conhecimento gerado na
universidade para a sociedade. “É ne-
cessária uma mudança desse paradig-
ma. Acredito que a inovação precisa
ser feita conjuntamente, entre indústria
e academia”, afirma.
No Paraná, um dos incentivos para
aproximar o pesquisador e a academia,
do meio empresarial é a feira Inovatec,
realizada em Curitiba, com o apoio
da Secretaria da Ciência, Tecnologia e
Ensino Superior. Durante o evento rea-
lizado em setembro de 2014, o coorde-
nador de Serviços Tecnológicos da Secre-
taria de Desenvolvimento Tecnológico e
Inovação (Setec) do Ministério da Ciência,
Tecnologia e Inovação (MCTI), Jorge Ma-
rio Campagnolo, destacou a necessidade
de aproximar ainda mais a academia do
mundo dos negócios e apontou alguns
avanços no Brasil na área de inovação. “A
Inova Empresa — criada em 2011 com o
objetivo de fomentar projetos de apoio
à inovação no país — e a Empresa Bra-
sileira de Pesquisa e Inovação Industrial
(Embrapii) — cuja missão é apoiar ins-
tituições de pesquisa tecnológica em
selecionadas áreas de competência —
executam projetos de desenvolvimento
de pesquisa tecnológica para inovação,
em cooperação com empresas do setor
industrial”, afirmou.
Acredito que a inovação precisa ser feita conjuntamente,
entre indústria e academia.
Emerson Camargo
Jorge Mario Campagnolo: incentivo à ciência e à tecnologia.
Foto: Agência FIEP
9PARANÁ FAZ CIÊNCIA
avançar mais, visando transformar esse
potencial científico em riqueza”, afirma.
Na opinião de Audy, o país evoluiu
muito em termos científicos nos últimos
anos, está hoje entre os 15 países do
mundo que mais produzem conheci-
mento, fruto de políticas muito efetivas
de agências públicas, como a Capes e
o CNPq. “Nosso grande desafio é gerar
desenvolvimento econômico e social,
agregando valor aos produtos e serviços
que nossas empresas, públicas e priva-
das, produzem, gerando mais emprego e
renda para nossa gente”, afirma.
AVANÇOS“ECOSSISTEMAS DE INOVAÇÃO”
O Paraná passou a contar com uma
lei específica, em 2012, para nortear as
ações voltadas para a inovação no estado
(Lei nº 17.314, de 24 de setembro de 2012),
que define que 2% do orçamento esta-
dual sejam destinados à inovação.
A regulamentação aconteceu no co-
meço de 2013. Um de seus principais
objetivos é fortalecer as parcerias públi-
co-privadas de transferência de conheci-
mento e tecnologia entre universidades
e empresas.
Um grande diferencial da lei paranaen-
se com relação às demais aplicadas nos
outros estados brasileiros foi o destaque
dado para a sustentabilidade nos mode-
los de aplicação das políticas de incenti-
vo e de produção tecnológica. A Lei esta-
belece medidas de incentivo à inovação
e regulamenta as parcerias entre univer-
sidades e centros de pesquisa públicos e
a iniciativa privada no âmbito do estado.
A Lei também estabelece os disposi-
tivos legais para a incubação de empre-
sas no espaço público e a possibilidade
de compartilhamento de infraestrutura,
equipamentos e recursos humanos, pú-
blicos e privados, além de criar regras
claras para a participação do pesquisa-
dor público nos processos de inovação
tecnológica desenvolvidos no setor pro-
dutivo.
Em 2015, serão investidos cerca de
R$ 11 milhões para projetos de empresas
inovadoras ou outros empreendimen-
tos privados que tenham por finalidade
criar um ambiente favorável à inovação.
A primeira lei brasileira que trata do rela-
cionamento universidades (e instituições
de pesquisa) e empresas para estimular o
incremento à transferência de tecnologia
completa 10 anos em dezembro de 2014
(Lei nº 10.973).
Apesar de o Brasil produzir conheci-
mento, a inovação como aplicação do
conhecimento — o verdadeiro sentido
da inovação — ainda é incipiente. O pró-
-reitor de Pesquisa, Inovação e Desen-
volvimento da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS),
vice-presidente da Associação Nacional
de Entidades Promotoras de Empreendi-
mentos Inovadores (Anprotec), membro
do Conselho Nacional de Desenvolvi-
mento Científico e Tecnológico (CNPq) e
presidente da Associação Internacional
de Parques Tecnológicos e Áreas de Ino-
vação (IASP América Latina), Jorge Audy,
salienta que é preciso criar no Brasil
“ecossistemas de inovação”, ou seja, não
deixar tudo a cargo apenas das universi-
dades e criar ambientes onde as
pessoas “respirem inovação”. “Isso
permitiria criar uma cultura em-
preendedora que levaria nossos
empresários e pesquisadores a
transformar a pesquisa de ponta
que produzimos em desenvolvi-
mento para o nosso país”, ressalta.
Essa opinião é compartilhada
pelo coordenador-geral do Nú-
cleo de Inovações Tecnológicas
(NIT) da Universidade Estadual
do Oeste do Paraná (Unioeste),
Camilo Morejon, especialmente
no que se refere às universidades.
“Pouco ou quase nada tem sido
feito na criação de ambientes de
inovação. O maior volume do co-
nhecimento se encontra represa-
do nas universidades”, explica.
Segundo Audy, outro dificulta-
dor para o desenvolvimento des-
ses “ecossistemas de inovação” é
o fator cultural, além da falta de
informação. Para o professor, é
necessário mudar essa cultura. “O
que nos falta é mais ousadia para
Nosso grande desafio é gerar
desenvolvimento econômico e social, agregando valor aos
produtos e serviços que nossas empresas, públicas
e privadas, produzem, gerando mais emprego
e renda para nossa gente.
Jorge Audy
Foto: divulgação
PARANÁ FAZ CIÊNCIA10
A taxa geral de inovação da indústria
ficou em 35,6% em 2011, em relação a
2008, quando era 38,1%.
A falta de mão de obra qualificada
aparece como um dos principais obs-
táculos à inovação. Cerca de 70% das
empresas industriais atribuem a falta de
inovação a esse motivo.
Custos elevados e burocracia foram
apontados por 81,7% das empresas
como razões da dificuldade de investi-
mentos em inovação.
As indústrias despenderam 0,71% de
sua receita líquida de vendas para a ino-
vação em 2011. Em 2008, foi despendido
0,62%.
A aquisição de máquinas e equipa-
mentos ainda é a atividade considerada
mais relevante para 75,9% das empresas.
Assim, o financiamento para a compra de
máquinas e equipamentos é de 27,4%, e
para inovação, apenas 0,8%.
Fonte: Pesquisa de Inovação
(PINTEC), do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE).
INOVAR NÃO É APENAS TER UMA IDEIA
INOVAÇÃO EM XEQUE
NÚMERO DE MESTRES E DOUTORES NO BRASIL
Inovar é muito mais do que fazer ci-
ência e desenvolver tecnologia. Inovar é
aplicar uma ideia nova para gerar negó-
cios lucrativos e sustentáveis, por meio
de processos e produtos que benefi-
ciem a sociedade.
“Inovar é transformar um conheci-
mento novo em negócios sustentáveis
de alto impacto”, afirma o gerente exe-
cutivo do Centro Internacional de Ino-
vação do Senai Paraná (SENAI C2i), Filipe
Cassapo. A definição é bastante contun-
dente, e ao mesmo tempo clara, visto
que se baseia em dois conceitos centrais:
geração de conhecimento e negócios
de alto impacto.
Mestres(81.124)
Doutores(117.348)
No Brasil, a atividade científica e
tecnológica começa com o surgimen-
to das primeiras universidades, entre
1920 e 1930. Posteriormente, o siste-
ma é reforçado com a criação do Con-
selho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq) e da
Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (Capes),
ambos em 1951; em 1962, surgem as
fundações de amparo à pesquisa; em
1967, a Financiadora de Estudos e Pro-
jetos (Finep); e em 1985, surge o Minis-
tério de Ciência e Tecnologia (MCT),
cujo nome foi alterado em 2011 para
Ministério de Ciência, Tecnologia e
Inovação (MCTI).
Filipe Cassapo
Foto: Agência FIEPOu seja: para inovar, é preciso gerar
ou transferir conhecimento novo so-
bre determinado assunto, para que a
pesquisa desenvolvida a partir disso
se torne necessariamente um negó-
cio lucrativo, que cause um resultado
positivo na sociedade. “Inovar não é
modernização, não consiste em fa-
zer mais do mesmo, de forma mais
eficiente”, ressalta. Assim, de forma
simples, é possível afirmar que fazer
ciência permite transformar dinheiro
em conhecimento. “Já a inovação con-
siste na operação recíproca: converter
o conhecimento gerado em riqueza”,
observa Cassapo.
Fonte: Dados
da Plataforma Lattes,
do CNPq, em 31 out. 2014.
11PARANÁ FAZ CIÊNCIA
As agências (ou núcleos) de inovação
tecnológica têm como objetivo proteger
o conhecimento gerado nas universida-
des e fazer a transferência de tecnologia
resultante das pesquisas científicas. “Mas
a competência das agências é mais
ampla; não é só proteger e transfe-
rir o conhecimento, mas também
avaliar a viabilidade econômica de
sua aplicação no mercado”, explica
o diretor da Agência de Inovação e
Propriedade Intelectual da UEPG,
João Irineu de Resende Miranda. Ele
acredita, no entanto, que hoje não
existe dificuldade de aproximação
entre academia e empresas.
O professor defende que seja
invertido o processo: as empresas
hoje esperam algo inovador da aca-
demia e, muitas vezes, não finan-
ciam os projetos porque aquilo não
atende às suas necessidades imedia-
tas. “Pode acontecer de termos uma
boa pesquisa, mas que não tem
aplicabilidade na indústria. Então é
melhor ouvir o que a indústria ne-
cessita e pesquisar em cima disso”,
defende. A Agipi tem hoje 46 patentes
depositadas (há três anos havia somente
um pedido para isso) e quatro contratos
de licenciamento de tecnologia.
Miranda também defende que as uni-
versidades sejam classificadas pelo nú-
mero de acordos de cooperação cientí-
fica, e não pela quantidade de patentes
depositadas. A UEPG, por exemplo, conta
com bolsistas que ajudam a universidade
a concluir Acordos de Cooperação com
empresas, os quais resultam em paten-
tes.
O doutor em Química e diretor da
Agência de Inovação (Novatec), da Uni-
versidade Estadual do Centro-Oeste
(Unicentro), Paulo Rogério Rodrigues,
também acredita que o mercado não
acompanha as inovações. Para ele, al-
gumas mudanças devem ser operadas
para que a inovação dê saltos, como
leis federais que isentem as universida-
des das taxas de patentes, por exemplo,
mais pressão por parte dos governos
estaduais para que os órgãos federais
modifiquem algumas formas de ava-
liação (hoje a nota da Capes é obtida
por meio da produção acadêmica e
tecnológica). “Mas poderiam avaliar pri-
meiramente as patentes, depois os arti-
gos. Estamos jogando nossa tecnologia
fora”, comenta.
Ao mesmo tempo que a fração orgâni-
ca do lixo, quando descartada de forma
inadequada, gera problemas ambientais,
essa fração orgânica, quando separada
na fonte, se constitui num dos principais
materiais com grande potencial de apro-
veitamento. A explicação é do coordena-
dor do Núcleo de Inovações Tecnológi-
cas da Universidade Estadual do Oeste
do Paraná (Unioeste), Camilo Morejon.
Para tentar auxiliar nessa questão, uma
usina para industrialização de resíduos
orgânicos domésticos e transformação
em fertilizante e biogás foi desenvolvida
pela Unioeste e já está sendo utilizada na
cidade de Paudalho, localizada próximo
a Recife (PE). De acordo com Morejon,
por meio de um contrato de transferên-
cia de tecnologia, nos moldes da Lei de
Inovação, está em fase de implementa-
ção uma usina para a industrialização de
resíduos orgânicos nesta cidade.
Outro resultado positivo do NIT da
Unioeste é a transferência de tecnologia
inerente a um sistema de tratamento de
efluentes de frigoríficos de peixes. Nesse
caso, a empresa Inomaq, de Toledo (PR),
fabricou e comercializou o produto. Um
frigorífico da cidade se interessou pela
tecnologia e, no momento, já se encon-
tra em operação. Morejon conta que a
Unioeste possui um total de 13 transfe-
rências de tecnologias firmadas nos mol-
des da Lei de Inovação.
AGÊNCIAS DE INOVAÇÃO
AMENIZANDO O PROBLEMA DO LIXO
A competência das agências é mais
ampla; não é só proteger e transferir
o conhecimento, mas também avaliar a
viabilidade econômica de sua aplicação
no mercado.João Irineu de
Resende Miranda
12 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
Neste ano, durante a Inovatec Regional
realizada em Guarapuava (PR), uma trans-
ferência de tecnologia está se concreti-
zando. Desta vez, quem teve seu trabalho
reconhecido foi a Novatec, da Unicentro.
Ainda em fase de ajustes, a tecnolo-
gia inerente à dissertação de Mestrado
em Engenharia Química da Unioeste de
Toledo, Andy Saavedra, tem o objetivo de
identificar poluentes e suas concentrações,
em tempo real, por meio de um software
embarcado em um sistema eletrônico. Esse
software, denominado de “nariz digital”,
tem sensores, microchips e um sistema
de comunicação por rádio-frequência
que permite o monitoramento por meio
de um computador localizado a 500 me-
tros do ponto de medição. Segundo Saa-
vedra, o projeto já despertou o interesse
de empresas, e pode beneficiar, ainda, ór-
gãos de fiscalização ambiental. A tecno-
logia já conta com interessados. “Poderá
auxiliar na qualificação e na quantificação
dos poluentes gasosos das indústrias, e
elas poderão otimizar seus sistemas de
controle. Órgãos como o Instituto Am-
biental do Paraná (IAP) também poderão
utilizá-lo para os mesmos fins. Afinal, no
Brasil, e em particular na região oeste do
Paraná, existem várias atividades indus-
triais que emitem poluentes gasosos”, ex-
plica. No atual cenário, as demandas por
tecnologias para o monitoramento de
poluentes é cada vez maior. A tecnologia
desenvolvida na Unioeste, após a prote-
ção intelectual, deverá atender essas de-
mandas. “Nas universidades brasileiras,
em particular na Unioeste, não existem
espaços apropriados para atuar com pes-
quisas na área de inovação nem recursos
financeiros”, critica Saavedra (na foto, à
esquerda).
O MEIO AMBIENTE AGRADECE
CONTRATOS FIRMADOS
Fotos: Isabelle Neri
Foto
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Durante o evento, uma palestra minis-
trada por Guido Ganassali, diretor de Ne-
gócios, Tecnologia e Inovação da empresa
Ciser Parafusos e Porcas, de Joinville (SC),
foi o ponto inicial para essa transferência
de tecnologia.
Até o momento, quatro projetos estão
engatilhados para parcerias de futuras
transferências de tecnologia entre a Uni-
centro e a Ciser. Um deles prevê a proteção
da corrosão de parafusos e porcas, substi-
tuindo as tradicionais zincagem e croma-
ção. “Estamos repassando para a empresa
os custos diretos e indiretos dos projetos,
para execução de um Plano de Trabalho
e, também, para viabilizar o contrato de
transferência de tecnologia por ambas as
partes. Nesse plano, haverá inicialmente
investimentos em bolsistas e reagentes”,
conta Paulo Rogério Rodrigues. O Grupo
de Pesquisa em Eletroquímica da Unicen-
tro-GPEL será o parceiro efetivo nas pes-
quisas a serem desenvolvidas, visando ao
uso em escala piloto industrial.
O projeto está sob sigilo, mas já foi tes-
tado em escala laboratorial — o próximo
passo é a escola semi-industrial — e já tem
carta-patente. “Em breve, informaremos os
resultados que poderão levar aos primei-
ros royalties em inovação tecnológica na
Unicentro”, comemora. Paulo ressalta que
esses contratos foram frutos de uma gran-
de e bem-sucedida parceria.
13PARANÁ FAZ CIÊNCIA
ROBÓTICA
14 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
Ele vem deslizando pelos corredores
do Hospital Universitário de Maringá
(HUM) e chamando a atenção de todos:
funcionários, médicos, pacientes e acom-
panhantes. É o R1T1, robô de telepresen-
ça, desenvolvido pela Project Company,
que acaba de retornar ao hospital todo
“turbinado”. Projetado por Antonio Hen-
rique Dianin, coordenador da Project
Company, o robô ganhou bateria com
Desenvolvimento de robôs “inteligentes” reforça vanguarda das universidades do
Paraná na área e transforma a vida das pessoas
“Amei! Queria um desses lá em
casa para brincar”, disse Jucileide
Alves Rodrigues, mãe de Vitória, de
11 meses, que estava internada e se di-
vertia com as figuras que surgiam na tela
do robô. Carlos Marescalchi acompanha-
va a filha Giovana, de 1 ano, com pneu-
monia. Ele também ficou impressionado.
“Já tinha visto na televisão. Acho que gos-
tei mais do que ela.”
O robô é capaz de desviar de obstá-
culos e manter uma distância ideal de
conversação com os humanos graças
a sensores sonares, de infravermelho e
câmeras. De acordo com seu idealiza-
dor, ele consegue enxergar em 3D, por
isso não colide com objetos e pessoas.
“O desvio dele é muito natural. Ele tem
sensores de identificação e sabe qual é
a área do outro numa intercomunicação
pessoal. Estou muito feliz por ter ficado
tão natural”, comenta Dianin.
duração de 24 horas
(no início, eram apenas
duas horas), câmera com
2.5 K de resolução, tela
touch com dez pontos de
contatos simultâneos e tinta
antibactericida que não absorve
água.
Dianin está muito satisfeito com as
inovações, principalmente porque o
R1T1 é o primeiro robô de telepresença
desenvolvido na América Latina. Os fun-
cionários do hospital também têm co-
memorado a presença do novo “colega”,
pois o utilizam para possibilitar o contato
de pacientes internados com seus paren-
tes distantes. Sem contar a alegria na ala
de pediatria do hospital, onde as crianças
ficam fascinadas pelo robô. A imagem
delas aparece na tela do aparelho e ga-
nha acessórios divertidos, como cartola,
nariz de palhaço, máscara de rena e uma
infinidade de desenhos, tudo controlado
por controle remoto. “É como brincar de videogame”, simplifica Dianin.
Queria um desses lá em
casa para brincar.Jucileide Alves Rodrigues
15PARANÁ FAZ CIÊNCIA
Geovana Andrade dos Santos tem 17
anos e é aluna do Ensino Médio no Colé-
gio Estadual Vandyr de Almeida, em Cor-
nélio Procópio. Até o segundo semestre
de 2013, ela estava decidida a cursar Me-
dicina Veterinária. Estava. Porque desde
que conheceu o projeto Ninho de Par-
dais, da Universidade Federal Tecnológi-
ca do Paraná (UTFPR), mu-
dou seus planos: agora vai
cursar Engenharia Elétrica.
Esse é justamente um
dos objetivos do projeto
financiado pela Agência
Brasileira de Inovação (Fi-
nep): atrair alunos do Ensi-
no Médio para as áreas de
engenharia por meio da
robótica. E tem dado certo.
Vanderlei Ferreira, 22 anos,
começou no Ninho de Pardais em 2010,
está no 5º semestre de Engenharia Elétri-
ca e ainda não bateu asas. “Eu pretendia
fazer Física, mas encontrei aqui o que eu
esperava”, diz Vanderlei, que já deu uma
grande contribuição ao projeto, desen-
volvendo um sensor de toque adaptável
a qualquer outro kit de robótica.
O projeto tornou-se realidade em 2008,
graças ao empenho do professor Marcos
Banheti Rabello Vallim, coordenador do
curso de Engenharia Elétrica na UTFPR
de Cornélio Procópio. “O objetivo do edi-
tal era atrair alunos do Ensino Médio para
os cursos de engenharia e o nosso pro-
jeto está entre os 42 aprovados no Brasil
todo”, conta.
Aprovado o edital, foi construído um
bloco de quase 300 m² especialmente
para o Ninho de Pardais, com laboratórios
e um ambiente ideal para pesquisa. Hoje,
os alunos participam de competições in-
ternacionais, como a RoboCup, realizada
em 2013 na Holanda, da qual participa-
ram 38 países. Nessa ocasião, o projeto
ganhou dois prêmios: o primeiro lugar
na modalidade “Special Award Enter-
tainment Value”, em que o robô partici-
pa de uma coreografia e a apresentação
reúne tecnologia, arte e criatividade; e o
primeiro lugar numa apresentação em
equipe com Hungria e Austrália.
Do projeto saem os tutores que cui-
dam das oficinas de robótica nas escolas
de Ensino Médio. Ao todo são cinco colé-
gios que receberam kits
robótica, um notebook,
e desenvolvem as ativi-
dades no contraturno
escolar. Os estudantes
interessados participam
de um treinamento no
Ninho de Pardais e, de-
pois, são selecionados
de acordo com desem-
penho, interesse e res-
ponsabilidade. Outras
características necessá-
rias são proatividade e
habilidade para traba-
lhar em grupo.
Alex Soares Duarte,
22 anos, aluno de Engenharia Elétrica,
é tutor no núcleo do Colégio Estadual
Zulmira Marchesi da Silva. No primeiro
semestre de 2014, ele atuou no projeto
como voluntário.
Já no meio do ano, conseguiu uma
bolsa de iniciação científica que o ajuda
tanto na vida pessoal longe da família
quanto na compra de componentes ele-
trônicos. Segundo Alex, os núcleos se re-
únem cerca de três a quatro horas, uma
vez por semana, e trabalham conceitos
de matemática, equações e criatividade,
tudo aplicado à robótica.
Além de atuar como tutor, ele também
inventa robôs. Um deles joga jokempô e
outro se parece com um guindaste: ele
pode pegar uma bolinha no solo, por
exemplo, e transportá-la para outro lugar.
MUDANDO ORUMO DOS JOVENS
Projeto Ninho de Pardais: mudando os rumos da vida dos jovens.
Foto: UTFPR/Cornélio Procópio
16 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
O R1T1 foi lançado em 2013, logo de-
pois do registro da patente. Para introdu-
zi-lo no ambiente hospitalar, foi preciso
obedecer a uma série de exigências da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa), por causa do risco de infecção.
Por exemplo, ele é todo arredondado
para que não haja acúmulo de água ou
sujeira. O Hospital Universitário de Ma-
ringá foi o primeiro do país a receber tal
tecnologia.
Atualmente, a Project Company tem
seis robôs prontos para venda a um cus-
to de R$ 48 mil anuais, que incluem to-
das as atualizações e a manutenção. “É
possível acessar os mais variados dados
do paciente no robô e acoplar uma série
de aparelhos: ultrassom, estetoscópio”,
comenta.
A robótica é uma realidade no merca-
do industrial há mais de três décadas. Os
robôs industriais são amplamente utiliza-
dos na manufatura de automóveis, por
exemplo. Dentre as aplicações correntes
da robótica na indústria, destacam-se
a soldagem, a pintura, a montagem e o
transporte dos produtos em processo.
O robô R1T1 é utilizado na área médi-
ca, mas segundo o professor Dianin, ele
também pode ser muito bem aprovei-
tado em outros setores, como educação
e marketing, por exemplo. E os especia-
listas garantem que logo teremos robôs
dentro de casa. “Em um futuro próximo
nós teremos robôs trabalhando em cada
setor da economia, dentro de cada casa,
eles se tornarão tão naturais quanto nos-
sos celulares. Eles serão amigos, avatares,
vigias, limparão nossas piscinas e calhas”,
acredita Dianin.
Mesmo com as perspectivas positivas,
tudo isso ainda depende de muita pes-
quisa científica. O professor Vallim, por
sua vez, avalia que embora já existam
muitos trabalhos bem estabelecidos na
área de robótica, as soluções em termos
de produto ainda não são acessíveis. “O
custo é elevado e a confiabilidade deixa
a desejar. O Brasil tem centros de excelên-
cia na pesquisa acadêmica em robótica
industrial, porém, tal como acontece em
outras áreas, o conhecimento científico
produzido não tem gerado patentes e
produtos disponíveis no mercado, na
mesma proporção”, avalia Vallin.
O professor Dianin também acredita
que o Brasil está “engatinhando” no as-
sunto, principalmente se compará-lo a
outros países que desenvolvem pesqui-
sas na área, como o Japão e os Estados
Unidos. “Nós sentimos na pele essa difi-
culdade, mesmo que 80% do desenvol-
vimento do R1T1 seja nacional, hoje con-
tamos com mais parcerias internacionais
do que nacionais”, conta Dianin. Países
como Holanda, Canadá e Alemanha já
utilizam amplamente os robôs para os
cuidados com os idosos, por exemplo.
“Em um futuro não muito distante, a ex-
pectativa é que robôs desse tipo sejam
disponíveis como um eletrodoméstico,
tal como hoje compramos uma máqui-
na de lavar inteligente”, diz o professor
Vallin.
MERCADO
“É possível colocar todos os dados do paciente no robô
e acoplar qualquer aparelho: ultrassom,
estetoscópio.”
Antônio Henrique Dianin
R1T1 é utilizado na área médica, mas pode ser aproveitado
em outros setores.
O papel da universidade é desenvolver conhecimento
sobre o processo de produção, inclusive
dos materiais.Marcos Banheti Rabello Vallim
Foto: Isabelle Neri
Foto: Isabelle Neri
17PARANÁ FAZ CIÊNCIA
O R1T1 começou a “trabalhar” efetivamente no
Hospital Universitário de Maringá em maio de 2014,
em atividades de controle de infecção. “Ele circulou
pelos corredores, apresentou músicas, vídeos”, lem-
bra a coordenadora de pesquisa do Núcleo de Pes-
quisa Clínica do HUM, Sandra Regina Bin Silva. “Fo-
ram atividades mais lúdicas e as pessoas viram com
outros olhos. Tivemos bons resultados”, assegura.
A ideia agora, segundo Sandra, é continuar reali-
zando trabalhos também direcionados à área aca-
dêmica. Já foi testado, por exemplo, o acompanha-
mento de um atendimento ambulatorial. Na sala de
consulta, ficam o preceptor, um ou dois alunos, além
do robô e da turma, que podem acompanhar a dis-
cussão do lado de fora.
Segundo Sandra, o R1T1 poderá ajudar também
as crianças que permanecem muito tempo interna-
das e, por isso, têm que ficar longe das salas de aula.
“Mesmo tendo o acompanhamento de professores e
pedagogo no ambiente hospitalar, seria interessante
ter esse contato com a escola”, observa Sandra.
O laboratório de protótipos do Ninho
de Pardais recebeu uma impressora 3D
de última geração, a partir da qual os
pesquisadores pretendem fazer mol-
des e desenvolver kits com preços mais
acessíveis para os colégios. A primeira
experiência já foi feita com uma figura
tridimensional bastante detalhada em
resina polimérica (único material que a
impressora reconhece, mas muito caro).
A partir da matriz, fizeram um molde em
Salvar a vida de recém-nascidos. As-
sim pode ser definido o principal obje-
tivo do projeto Care On, desenvolvido
pelo estudante de Engenharia de Con-
trole e Automação (Mecatrônica) da
Pontifícia Universidade Católica do Para-
ná (PUCPR), Matheus von Biveniczko To-
mio. Trata-se
de um par de
pulseiras que
emitem um
sinal sonoro
quando os
pais se afas-
tam do filho
mais de 10
metros. O projeto foi concebido para
evitar que crianças sejam esquecidas no
interior de um veículo, ou para localizar
aquelas que sofrerem sequestros.
DIMINUINDO DISTÂNCIAS
BENEFICIANDO PESSOAS
silicone e o preencheram com plástico. “É
um encapsulamento de R$ 100 para um
produto de R$ 1. Então, com essa rota
tecnológica, o custo de uma peça pode
ser reduzido, por exemplo, de R$ 100
para R$ 1, quando produzida em esca-
la”, compara o professor Marcos Vallim.
“Estamos dominando essa tecnologia
para baixar custos. Não somos indústria.
O papel da universidade é desenvolver
conhecimento sobre o processo de pro-
A bateria do equipamento dura até dez
dias e é recarregada por indução eletro-
magnética. O projeto já foi patenteado
pela PUCPR e a meta agora é miniaturizar
a placa de transmissores para baratear
o custo e disponibilizar o dispositivo no
mercado. Existe a possibilidade ainda
que o equipamento funcione via aplicati-
vo de celular. “Dessa forma, será possível
calibrar a distância. Outra possibilidade é
a utilização de sensores diferentes que de-
tectam quando a pulseira é tirada, o que
alerta em caso de sequestros”, explicou.
Outro projeto desenvolvido por Ma-
theus é o exoesqueleto, uma órtese in-
teligente que devolve ou auxilia o movi-
mento dos membros de pacientes que
perderam a mobilidade, seja por alguma
doença ou um acidente. Também batiza-
do de NSA2, o equipamento foi projeta-
do a pedido do Instituto Sabrina Belon,
uma organização humanitária sem fins
lucrativos que atua no desenvolvimento
de projetos de alta tecnologia para medi-
cina, acessibilidade e reabilitação. A pre-
sidente do instituto, Michele de Souza,
explica que o exoesqueleto consiste em
um eletrodo que fica em contato com a
superfície da pele e capta a mensagem
do cérebro, fazendo com que o mem-
bro realize o movimento. Segundo ela, o
NSA2 deverá ser implantando em breve
em um paciente com sequelas de polio-
mielite.
Matheus von Biveniczko Tomio
dução, inclusive dos materiais.” Conforme
Vallim, com os dispositivos produzidos
no Ninho de Pardais, é possível montar
um mesmo robô com 33% a menos de
peças que os kits disponíveis no merca-
do. “Agora temos que transformá-los em
produtos.”
Foto
: Isa
belle
Ner
i
Projeto Care On: pulseiras emitem sinal sonoro.
Foto: Isabelle Neri
MATERIAIS DE ÚLTIMA GERAÇÃO
18 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
ENGENHARIA FLORESTAL
SALVANDO AS ARAUCÁRIAS
Diversas pesquisas vêm sendo desenvolvidas para tentar diminuir os danos causados à floresta
de araucária na região Sul do país
Diversas pesquisas e iniciativas vêm
sendo desenvolvidas para tentar mitigar
os danos causados à floresta de araucária
na região Sul do país, após longos perío-
dos de devastação.
Considerado o ‘missionário da arau-
cária’, o professor do Programa de Pós-
-Graduação em Produção Vegetal do Se-
tor de Ciências Agrárias da Universidade
Federal do Paraná (UFPR), Flávio Zanet-
te, dedica-se há 29 anos ao estudo e ao
desenvolvimento de novas tecnologias
para proteger e divulgar a espécie. Entre
seus trabalhos, está o popularmente cha-
mado de “pinheiro de proveta” e o cruza-
mento artificial. Atualmente, Zanette está
investindo na enxertia de araucária,
uma técnica de melhoramento ge-
nético, para a produção de pinhões
- fruto da araucária -, o que ele de-
fende que pode ser uma saída para
estimular o plantio econômico da
espécie e contribuir com sua pre-
servação. “Não conseguimos salvar
a araucária pelo coração, então
resolvemos salvar pelo bolso”, co-
menta.
De acordo com dados do Institu-
to Brasileiro de Geografia e Estatísti-
ca (IBGE), em 2012, a extração de pi-
nhão gerou quase R$ 14,5 milhões
nos três estados do Sul, um aumen-
Flávio Zanette: produção de pinhão pode ser alternativa para salvar as araucárias.
Foto: Isabelle Neri
19PARANÁ FAZ CIÊNCIA
to de cerca de 32% em relação ao ano an-
terior. Zanette destaca que, na natureza,
é possível encontrar árvores produzindo
mais de 100 quilos de pinhões por ano.
“É possível clonar pela enxertia. Quando
adultas, essas araucárias poderão produ-
zir 70 quilos de pinhões em média por
ano”, afirma. Um pomar pode render, se-
gundo Zanette, de R$ 15 mil a R$ 20 mil
por hectare/ano, a custo zero, a partir de
As previsões, infelizmente, não são oti-
mistas para a araucária. A espécie, cuja
floresta chegou a abranger uma área de
200 mil quilômetros quadrados – equiva-
lente ao tamanho do estado do Paraná
– possui hoje menos de 3% de sua co-
bertura original, e somente 0,22%, o que
equivale a cerca de 41 hectares, está sob
proteção em unidades de conservação.
No entanto, diversos especialistas apon-
tam uma série de sugestões que podem,
não reverter, mas melhorar esse qua-
dro.
Registros históricos apontam que a
rápida devastação da floresta de arau-
cária teve início a partir do século XIX,
quando o Sul do Brasil começou a ser
ocupado por imigrantes europeus que
vieram para o país atraídos pela pro-
messa de uma vida melhor. A madeira
era utilizada para a construção de ha-
bitações, móveis e artigos domésticos.
Houve, igualmente, o desmate de tre-
chos para a prática da policultura de
alimentos, seguido de exportações para
diversos mercados.
Sem mecanismos oficiais para barrar
a exploração, as medidas de proteção
da floresta chegaram tarde. Em 1992, o
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (IBA-
MA) incluiu a araucária na lista oficial de
espécies da flora brasileira ameaçadas de
extinção. E somente em 2001 o Conselho
Nacional do Meio Ambiente (CONAMA)
Ana Paula Dalla Corte: estudo para analisar parte da Floresta Ombrófila
Mista no Paraná auxilia no entendimento da situação da planta no estado.
Foto: Isabelle Neri
proibiu a extração e a comercialização da
espécie.
Um trabalho coordenado pela pro-
fessora do departamento de Ciências
Florestais do Setor de Ciências Agrárias
da UFPR, Ana Paula Dalla Corte, apon-
tou que, da cobertura florestal nativa
em parte da Floresta Ombrófila Mista no
Paraná, 26,36% estão em estágio médio
e avançado de desenvolvimento, e ape-
nas 10,27% estão em estágio inicial, ou
seja, na situação de uma floresta mais
jovem. O trabalho foi realizado em 51
municípios na região de maior ocor-
rência da espécie a partir da utilização
de imagens de satélite e levantamen-
tos de campo, com mais de 100 pon-
tos de controle para o enquadramento
da vegetação segundo o seu desen-
volvimento. “Esse estudo teve como
objetivo realizar um levantamento das
florestas de araucária, ou seja, produzir
um retrato da situação da cobertura
florestal em parte do estado”, explica a
pesquisadora.
15 anos do plantio, mantendo-se produ-
tiva ao longo de 150 anos. “É um retorno
que vai para os netos e bisnetos do pro-
dutor”, diz o pesquisador.
Entre as vantagens da araucária
enxertada, está o início de produ-
ção em período inferior a dez anos
na propagação natural por meio de
sementes, a produção começa entre 12
e 15 anos. Além disso, será possível se-
lecionar materiais genéticos de matrizes
de alta qualidade produtiva e variedades
mais atrativas ao consumidor.
A Embrapa Florestas mantém, há 35
anos, material genético em um banco
ativo de germoplasma. A pesquisadora
e doutora na área de Recursos Genéticos
Florestais da Embrapa Florestas, Valderes
Aparecida de Sousa, explica que o banco
reúne coletas feitas em regiões de maior
ocorrência da araucária no Paraná, em
Santa Catarina, no Rio Grande do Sul e
em Minas Gerais, e tem como objetivo
conservar geneticamente o gene que
pode ser usado para melhoramento e
promover uma conservação indireta.
“Os bancos são tentativas de salvar
os genes importantes para o futuro da
espécie”, diz Valderes. No entanto, ela
entende que a solução para o não de-
saparecimento da araucária vem de um
conjunto de ações. Entre elas, o incen-
tivo ao plantio com a proposta de uma
conservação mais participativa, com o
envolvimento dos proprietários de áreas.
“A conservação para o uso será bem mais
efetivo”, pondera.
20 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
Outras ameaças surgem para colocar a
araucária ainda mais em risco. As mudan-
ças climáticas, por exemplo. Um trabalho
de pesquisa da mestranda do Programa
de Pós-Graduação em Engenharia Flo-
restal da UFPR, Lara Clímaco de Melo, vi-
sou explorar as relações entre o clima e a
floresta, buscando, em linhas gerais, co-
nhecer como a Floresta Ombrófila Mista
– como é denominada a floresta de arau-
cária no Brasil – responderia a possíveis
mudanças no clima. Cenários climáticos
foram projetados com base no IPCC por
meio da geoestatística para 2100 (0,3°C;
2,4°C; 4,8°C e 6°C) e cruzados com os da-
dos de cobertura original (ocorrência) de
10 espécies, dentre elas, elas a araucária.
“Olhando de forma isolada a araucária,
observamos que, em um cenário otimis-
ta – aumento de 0,3°C na temperatura
– a espécie perderia 11% de sua área de
ocorrência. Já em um cenário extremo
– aumento de 6°C –, ela estaria critica-
mente em perigo de extinção, perdendo
81% da sua área natural de ocorrência”,
explica Lara. Para a pesquisadora, esses
resultados demonstraram a urgência da
necessidade em se investir em pesquisas,
ações e políticas que promovam o ma-
nejo florestal e na conservação desses
fragmentos.
Já o professor do curso de Engenharia
Florestal da UFPR, especialista em pes-
quisa em araucária e autor de três livros
sobre o tema, Carlos Roberto Sanquetta,
afirma que, por ser uma espécie de de-
senvolvimento lento, houve muito pou-
co estímulo dos órgãos públicos para
o plantio e a proliferação da floresta de
araucária. “Os governos pensam em cur-
to prazo”, observa.
Em seu mais recente trabalho “Pesquisa
com Araucária e suas Transições – Pesqui-
sas Ecológicas de Longa Duração”, lan-
çado neste ano, Sanquetta reúne uma
série de observações sobre a floresta de
araucária ao longo de 20 anos de pes-
quisas. Entre elas está a potencialidade
desse ecossistema em fixar e acumular
biomassa e carbono. “Estima-se que as
florestas em geral, quando conservadas
ou manejadas sustentavelmente, são
capazes de absorver cerca de 16% do
carbono atmosférico, acumulando-o em
seus diversos componentes, enquanto o
desmatamento e a degradação desses
ecossistemas, juntamente com a agricul-
tura, são responsáveis pela emissão de
31% dos gases do efeito estufa”, defende
o pesquisador.
O pesquisador da área de Agrometeo-
rologia da Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (EMBRAPA), unidade Flo-
restas, Marcos Silveira Wrege, afirma que
a araucária é uma espécie primitiva con-
siderada um ‘fóssil vivo’, que dificilmente
terá condições de se manter diante das
mudanças climáticas e de pluviosidade.
Segundo ele, até o final deste século exis-
te uma projeção para um aumento da
temperatura na região Sul do Brasil entre
4 e 5 graus. “A araucária é uma espécie
de clima frio e que necessita de um regi-
me de chuva regular para se desenvolver.
Além disso, ela tem um ciclo reprodutivo
de quatro anos, e qualquer interferência
nesse período, compromete sua manu-
tenção”, observa.
Em outros países onde também existe
a presença de floresta de araucária, como
no Paraguai, os pesquisadores já estão
observando a mortalidade da espécie
em função das mudanças climáticas. Isso
se deve não só à elevação da tempera-
tura em si, mas também porque esse
aumento facilita a proliferação de pragas
e doenças. De acordo com Wrege, no
Brasil, em virtude da fragmentação das
florestas, esse fenômeno ainda não foi
observado, “mas também será preciso
ficar alerta”, pondera.
MUDANÇAS CLIMÁTICAS
Carlos Sanquetta e Lara Melo: mudanças climáticas contribuem para a diminuição
da ocorrência das araucárias.
Foto: Isabelle Neri
21PARANÁ FAZ CIÊNCIA
CONSCIÊNCIACONSTRUTIVA
SUSTENTABILIDADE
Casa da Tecverde: habitação sustentável para a população de baixa renda.
Foto: Isabelle Neri
Foto: Isabelle Neri
Foto: Isabelle Neri
PARANÁ FAZ CIÊNCIA22
Foto: Gilberto Abelha/UEL
Foto: Isabelle Neri
romover a cultura da
habitação sustentá-
vel na população
de baixa renda.
Essa é a intenção
do projeto ZEMCH
Network, que concentra
esforços para implementar
inovações tecnológicas e geren-
ciais nas construções. Construí-
das em apenas três horas, as casas
do ZEMCH são feitas de um sistema
de painéis de madeira que se encai-
xam para formar paredes pré-moldadas.
Inicialmente, serão construídos cinco
modelos, que terão o uso monitorado.
Pretende-se melhorar a produtividade,
reduzir a geração de resíduos, diminuir
os gastos dos usuários com moradia e
agregar mais valor ao produto.
Em um momento em que a questão
ambiental norteia qualquer atividade, o
setor da construção civil vem buscan-
do alternativas para se adequar às
metas globais de desenvolvimento
sustentável. Entre todas as indús-
trias, a da construção civil é no-
tadamente a que mais ocasiona
impactos ambientais. Estima-se
que entre 14% e 50% dos recur-
sos naturais extraídos no planeta
sejam consumidos pelo setor cons-
trutivo, de acordo com dados da tese
do professor Vanderley John, da Escola
Politécnica da Universidade de São Pau-
lo (USP). Porém, mesmo em atividades
altamente impactantes, a aplicação de
práticas sustentáveis é possível e neces-
sária. Para isso, vários projetos buscam
menor impacto ambiental, racionaliza-
ção de matéria e energia e diminuição
do volume de resíduos sólidos gerados.
O ZEMCH Network é um deles. Trata-se
de uma rede internacional de pesqui-
sa científica, e um dos projetos está
sendo desenvolvido por um grupo
da Universidade Estadual de Lon-
drina (UEL).
As casas elaboradas para o pro-
jeto devem atender a requisitos de
eficiência energética e tecnologias que
favoreçam a sustentabilidade e a cus-
tomização em massa. Por isso, optou-se
pela utilização da tecnologia wood frame
pré-fabricada, desenvolvida pela empresa
Tecverde Engenharia, de Curitiba. Os pai-
néis de madeira que formam as paredes
são revestidos internamente por placas
de gesso e, externamente, por placas ci-
mentícias. Para auxiliar no desempenho
térmico, as paredes são preenchidas por
lã de PET ou de vidro. “Um dos fatores
que nos levaram a adotar essa tecnologia
é a velocidade de produção, com um
mínimo de geração de resíduos de
construção”, explica Ercília Hitomi
Hirota, coordenadora do Grupo de
Pesquisa em Gestão de Projetos
Integrados da UEL.
Outro ponto relevante do proje-
to é a customização em massa, uma
estratégia de desenvolvimento de
produtos que busca atender ao máxi-
mo os requisitos dos clientes.
A tecnologia desenvolvida pela Tecver-
de já recebeu homologação, requisito
que permite o financiamento das habi-
tações, e poderá ser viabilizada por meio
do programa Minha Casa, Minha Vida, do
governo federal.
O setor da construção civil vem buscando alternativas para se adequar às metas globais de redução de impactos ambientais e, primordialmente, trazer
alternativas benéficas para toda a sociedade
23PARANÁ FAZ CIÊNCIA
Práticas ambientalmente sustentáveis
visam aumentar o ciclo de vida dos ma-
teriais utilizados na construção civil. Um
dos materiais que apresentam ótimo
resultado é o subproduto da queima
de bagaço da cana-de-açúcar, aplicado
para substituir parcialmente a areia e o
cimento em argamassas, concretos e
pavers (blocos para pavimentação).
A utilização de concreto nas constru-
ções cresce anualmente e, consequen-
temente, eleva o consumo de cimento
Portland (veja quadro “Emissões de
CO2”) e agregados naturais na confec-
ção de concretos. Buscando reduzir o
custo do produto e diminuir a degra-
dação ambiental, várias pesquisas vêm
sendo desenvolvidas para substituir
componentes do concreto por mate-
riais alternativos.
No processo de beneficia-
mento da cana-de-açúcar, o
maior subproduto gerado é
o bagaço da cana-de-açú-
car, utilizado em larga es-
cala como combustível em
caldeiras para geração de
energia (vapor) que resulta
em uma cinza pesada e leve.
Com as pesquisas, chegou-
-se à conclusão de que a
cinza pesada pode substi-
tuir 20% da areia comum na
construção civil sem alterar
suas características. Já a cinza leve apre-
sentou ótimo resultado de pozolanici-
dade (característica de cimento) e pode
ser utilizada na substituição parcial do
cimento em até 7,5%. “Um ótimo ganho
econômico e ambiental, pois substitui o
cimento, um produto caro
cuja produção é muito po-
luidora”, afirma Carlos Hum-
berto Martins, coordenador
do curso de Engenharia Civil
da Universidade Estadual de
Maringá (UEM) e coordena-
dor do projeto de uso de
resíduos para a produção de
argamassa.
Na proposta, a cinza pesada será
reaproveitada por meio da substi-
tuição parcial da areia na confecção
dos pavers. Isso contribuiria para a
diminuição da extração desse mate-
rial de forma irregular de rios. A cinza
leve será substituída parcialmente no
cimento Portland para evitar a dispo-
sição final incorreta do resíduo (veja
quadro “Cinzas maléficas e benéfi-
cas”).
O pesquisador destaca que a in-
corporação tanto de cinza leve como
pesada em pavers será benéfica para
as indústrias e para o meio ambien-
te. “Serão reduzidos o consumo de
cimento e a poluição atmosférica
gerada pela produção. Também será
reduzida a extração de areia dos rios,
e as usinas realizarão a des-
tinação correta por meio
da reciclagem desses resí-
duos”, salienta Martins.
De acordo com a Com-
panhia Nacional de Abas-
tecimento (Conab), na
safra de 2013/2014, foram
geradas 650 mil toneladas
de cinza leve. Porém, essa
cinza gerada na usina pos-
sui aproximadamente 100%
de umidade. Dessa forma, a
geração de cinza leve seca
é de aproximadamente 325
mil toneladas que poderiam ser utiliza-
das como cimento, ou, aproximadamen-
te, 6.5 milhões de sacos de cimento. “Se
pensarmos hoje, que a média de 1 saco
de 50 kg de cimento custa R$ 30, pode-
ríamos obter uma economia de apro-
ximadamente R$ 195 milhões. Esse é o
aspecto econômico do reaproveitamen-
to dessa cinza como cimento”, ressalta o
engenheiro.
BAGAÇO SUSTENTÁVEL
Foto
: Isa
belle
Ner
i
Foto
: Isa
belle
Ner
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[o subproduto da queima de bagaço de cana-de-açúcar] é um ótimo ganho
econômico e ambiental, pois
substitui o cimento, um produto caro cuja produção é muito poluidora.
Carlos Humberto Martins
24 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
O concreto autoadensável (CAA) pro-
porciona a diminuição de falhas de con-
cretagem decorrentes da segregação
resultante do excesso de vibração no
concreto convencional. Outra vantagem
é a redução da mão de obra para serviços
de concretagem, já que não é necessário
adensar e os serviços de espalhamento
e nivelamento são facilitados. Essas pro-
priedades são conferidas ao CAA devido
à composição dos materiais que o cons-
tituem.
A cinza do bagaço de cana-de-açúcar,
resíduo gerado pelo setor da agroindús-
tria, também pode ser fonte de matéria-
-prima para a composição do CAA, que
apresenta grande fluidez e alta trabalha-
bilidade, ou seja, é muito plástico. “Para
se ter ideia, somente no Paraná, na safra
2013/2014, teríamos a possibilidade de
produzir 300 mil toneladas do produto se
todo o bagaço fosse queimado para co-
geração de energia”, explica Romel Dias
Vanderlei, chefe do Departamento de En-
genharia Civil da UEM e coordenador do
projeto de desenvolvimento de concreto
com cinza do bagaço da cana-de-açúcar.
Vanderlei destaca que uma das contri-
buições que justificam o desenvolvimen-
to do CAA se refere à durabilidade do
elemento estrutural. Além disso, o CAA
permite a concretagem de peças com
pequenas seções ou densamente arma-
das sem que haja vazios.
Existe uma tendência de constru-ção de edificações sustentáveis, principalmente nos grandes cen-tros urbanos. A eficiência energé-tica faz parte desse cenário, tanto vinculada aos procedimentos das certificações ambientais quanto por meio do programa brasileiro de etiquetagem de edificações
do Inmetro, que apresenta pro-cedimentos para classificação do nível de eficiência energéti-ca. A habitação desenvolvida no ZEMCH terá nível A de eficiência energética, ou seja, demandará menos energia elétrica ao longo de sua vida útil.
EFICIÊNCIA ENERGÉTICA
O cimento Portland é o principal ligante hidráulico
utilizado no concreto. A fabricação de uma
tonelada de clínquer* de cimento Portland lança uma tonelada de gás carbônico
(CO2) na atmosfera. Assim, a produção anual mundial de cimento chega a 1,5 bilhão de toneladas, responsável
por quase 7% das emissões globais de CO2 (MEHTA;
MONTEIRO, 2008). Segundo dados do Sindicato Nacional
da Indústria do Cimento (SNIC), em 2012 estima-se
que o Brasil tenha produzido 68,787 milhões de toneladas
de cimento (SNIC,2013). *clínquer é o material a partir
do qual é fabricado o cimento.
Segundo dados do Sindicato Nacional da Indústria do
Cimento (SNIC), em 2012 o Brasil produziu 68,787 milhões
de toneladas de cimento. Segundo as pesquisas, é possível substituir até 5% de cimento por cinza leve, ou seja, seriam necessárias
aproximadamente 3,4 milhões de toneladas de cinza, e atualmente são
geradas aproximadamente 325 mil toneladas.
EMISSÕES DE CO2
CIMENTODESNECESSÁRIO
EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA
Romel Dias Vanderlei: grandes avanços com o concreto autoadensável.
Foto
: Isa
belle
Ner
i
Somente no Paraná, na
safra 2013/2014, teríamos a
possibilidade de produzir
270 mil toneladas do
produto se todo o bagaço
fosse queimado para
cogeração de energia.Romel Dias Vanderlei
25PARANÁ FAZ CIÊNCIA
Estima-se que entre 14% e 50% dos recursos
naturais extraídos no planeta sejam consumidos
pelo setor construtivo.
Na safra 2013/2014, foram processadas 652 milhões de
toneladas de cana-de-açúcar no país, gerando aproximadamente
3,9 milhões de toneladas de cinza pesada e 650 mil toneladas de cinza leve.
Fonte: Companhia Nacional
de Abastecimento (Conab).
CINZAS MALÉFICAS
E BENÉFICAS
RECURSOS AMEAÇADOS
07
CANA-DE-AÇÚCAR
BAGAÇO
COMBUSTÍVEL EM CALDEIRAS
DE GERAÇÃODE ENERGIA
CINZA PESADA
SUBSTITUI AREIA COMUM
06CINZA LEVE
SUBSTITUICIMENTO
05
04
03
02
01Fo
to: Is
abelle Neri
26 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
INICIAÇÃO CIENTÍFICA
Bolsas de iniciação científica estimulam os estudantes a pesquisar desde muito cedo e podem resultar em amplos e significativos benefícios para a sociedade
Levar os resultados de pesquisas cien-
tíficas para a grande massa é o objeto de
estudo da consultora externa do Conse-
lho Nacional de Desenvolvimento Cien-
tífico e Tecnológico (CNPq) e professora/
coordenadora do Laboratório de Pesqui-
sa e Ensino de Leitura e Redação da Uni-
versidade Federal de Santa Maria (UFSM),
Désirée Motta Roth. Por meio da Linguís-
tica Aplicada, ela estuda como o discurso
científico do contexto acadêmico é retex-
tualizado na mídia. Ou seja, como os tex-
tos chegam aos livros didáticos, a revistas
e até a editais. “O discurso passa por pro-
cessos tendo em vista outros interlocuto-
res. Cada instância tem sua função”, diz.
Segundo a pesquisadora, o que ocorre
é uma percepção errônea por parte de
quem produz sobre quem é seu leitor. “As
pessoas acabam não entendendo o que
leem.” Désirée informa que uma pesqui-
sa do Ministério da Ciência e Tecnologia
apontou que entre 2006 e 2010 houve
um aumento do número de entrevista-
dos com interesse em aprender mais por
meio de jornais e revistas (de 41% para
65%). “As pessoas dizem que se interes-
sam, mas não compreendem o que está
escrito.” Em 2006, essa mesma pesquisa
revelou que 85% dos 2.004 entrevistados
de diferentes classes sociais e em todo o
país afirmaram não compreender textos
sobre ciência.
O estudo foi coordenado por Ildeu Mo-
reira, diretor do Departamento de Popu-
larização e Difusão da Ciência e Tecnolo-
gia do Ministério da Ciência e Tecnologia,
e demonstrou, em 2006, que somente
15% das pessoas abordadas foram capa-
zes de citar uma instituição científica im-
portante no Brasil ou o nome de um cien-
tista famoso. Na opinião de Désirée, são
necessários cada vez mais estudos sobre
quais estratégias discursivas utilizar, sobre
a organização da informação no texto, e
que temáticas estão a serviço da socieda-
de. “Se não, a ciência fica enclausurada”,
avisa. “O pensamento científico, seja na
matemática, física, química ou arte, deve-
ria ser estudado intensivamente na esco-
la para que qualquer sujeito fosse capaz
de se relacionar com a ciência”, opina.
A professora comenta que as áreas
de informática, biologia e ecologia, por
exemplo, são mais exploradas nos jornais,
o que não ocorre com o letramento e o
ensino de leitura e produção de textos,
práticas fundamentais para a educação,
segundo sua avaliação. Consequente-
mente, os financiamentos tendem mais
para outras áreas. Ressalta, ainda, que a
mídia só faz ciência de um sujeito e não
traz a voz da sociedade. “Só quem fala é
o cientista.”
O processo de fazer com que as infor-
mações relacionadas à ciência cheguem
até a população pode ser realizado a par-
tir do programa de iniciação científica im-
plantado nas universidades. Camila Bour-
guignon de Lima, que cursa Licenciatura
em Artes Visuais na Universidade Esta-
dual de Ponta Grossa (UEPG), utiliza esse
programa para dar sequência ao estudo
da presença da mulher na arte contem-
porânea (séculos XX e XXI). “Elas ainda
não são reconhecidas em seu potencial
artístico em museus, galerias”, relata. Se-
gundo Camila, as exposições de artes
em galerias e museus são predominante-
mente de artistas homens, “porque visam
a mais público e lucro”. Como a arte é
NOVOSOLHARES
Camila Bourguignon de Lima, estudante de Licenciatura em Artes Visuais na UEPG: bolsas auxiliam em sua pesquisa sobre a
presença da mulher na arte contemporânea.
Foto: Isabelle Neri
27PARANÁ FAZ CIÊNCIA
A crescente oferta de bolsas reflete na
procura por cursos de Pós-Graduação,
como ocorreu na Universidade Estadual
do Centro-Oeste (Unicentro). O primei-
ro curso de Pós-graduação stricto sensu da universidade é de 2006. Hoje são 17,
resultado dos projetos e das bolsas de
iniciação científica na graduação que, a
cada dia, têm estimulado mais estudan-
tes a seguirem os caminhos da pesquisa.
A conclusão é do pró-reitor de Pesquisa e
Pós-Graduação Marcos Ventura Faria. “Na
verdade, a base da criação da Pós-Gradu-
ação na Unicentro foi a iniciação científi-
ca. Se analisarmos os gráficos do cresci-
mento de projetos de iniciação científica
e da ampliação dos cursos na pós, vere-
mos que são coincidentes”, revela. Faria
está na Unicentro há 12 anos e pôde
acompanhar esse incremento na área de
pesquisa. “Os alunos enxergam outras pos-
sibilidades além da graduação. Toda a visão
do graduando mudou”, observa.
Ventura orienta vários projetos que fa-
zem parte do Programa de Melhoramen-
to Genético de Milhos Especiais.
A pesquisa está dividida em milho
forrageiro (alimentação animal) e milho
doce (consumo industrializado). O prin-
cipal objetivo é desenvolver novos hí-
bridos adaptados às condições regionais
que sejam competitivos no mercado. O
aluno do curso de Agronomia da Unicen-
tro Carlos Augusto da Silva comenta que
o projeto é essencial para auxiliar na for-
mação do curso. “O projeto abre as por-
tas do mercado de trabalho, princi-
palmente para quem quer continuar
os estudos cursando mestrado ou
doutorado. Agrega conhecimento
para quem quer focar em milhos
especiais e entender os nichos de
mercado”, diz ele.
“O diretor de pesquisa da Pró-Rei-
toria de Pesquisa e Pós-Graduação
da Universidade Estadual Norte do
Paraná (UENP), Fernando Moreno da
Silva, conta que, dos cinco mil alu-
nos da UENP, pelo menos 200 estão
inseridos em programas de financia-
mento. Ele explica que a iniciação
científica basicamente tem duas
funções. “Converter conhecimento
Marcos Ventura e seus alunos Carlos Augusto da Silva, Reginaldo Calixto e
Emanuel Gava (da esquerda para a direita): Ventura orienta vários projetos que fazem
parte do Programa de Melhoramento Genético de Milhos Especiais.
Foto: Isabelle Neri
ESTÍMULO À PÓS-GRADUAÇÃO
expressão da sociedade num determina-
do tempo, ela considera essa discussão
bastante importante. Camila estudou 30
quadros de artistas mulheres de vários
países do Ocidente e observou que elas
ainda não são vistas como criadoras de
arte, mas “apenas como um objeto a ser
contemplado”, sem convites para partici-
pação em exposições de artes.
A estudante identificou que algumas
artistas têm em sua temática o cotidia-
no feminino, outras, padrões de beleza
como uma forma de crítica às exigências
estéticas ao corpo feminino. O fato de
ser pesquisadora dessa área abriu à es-
tudante as portas da Faculdade de Belas
Artes, em Lisboa (Portugal) onde pôde
intensificar seus estudos. Ela conta que
também pôde comprar diversos livros e
participar de eventos relacionados à sua
área de estudo. Camila é orientada pela
professora Lenir Mainardes, doutora em
Serviço Social e representante do Comitê
de Iniciação Científica na UEPG.
em utilidade pública e criar a cultura de
pesquisa na universidade desde seus pri-
meiros anos”, salienta. Um dos projetos
orientados por ele é o da aluna do curso
de Letras Samantha Isabela Pinto, cujo tí-
tulo é “Estilo dos Jornais Paranaenses”. Na
pesquisa, Samantha analisou o perfil de
alguns leitores de dois dos maiores jor-
nais do estado (Gazeta do Povo e Folha de
Londrina). A aluna pesquisou 14 edições
de cada jornal, de uma determinada se-
mana, e chegou à conclusão de que os
leitores da Folha são mais tradicionais,
preferem ler sobre temas mais regionais;
e os da Gazeta preferem temas macro, de
economia ou internacionais.
Na opinião do pró-reitor de Pesquisa e
Pós-Graduação da Universidade Estadu-
al do Paraná (Unespar), Frank Mezzomo,
também coordenador do Programa de
Pós-Graduação interdisciplinar Socieda-
de e Desenvolvimento do campus de
Campo Mourão, a iniciação científica
torna a vivência do aluno mais intensa
dentro da universidade e mais assídua.
“A formação é para o estudante e para o
professor, que potencializa sua pesquisa”,
observa. Em sua visão, a comunidade
Professor Fernando Moreno (ao centro) com alunos de iniciação científica.
Foto: Tiago Ângelo
28 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
Comer uma fruta ou hortaliça sem
resíduos de agrotóxicos é o que deseja
o mercado consumidor na atualidade.
E é um dos objetivos das pesquisas da
professora doutora em Fitopatologia
Maristella Dalla Pria, da UEPG, que há vá-
rios anos se dedica a pesquisar alternati-
vas naturais aos fungicidas em conjunto
com pesquisadores da UFPR. “Existem
várias substâncias, extratos vegetais que
não são considerados agrotóxicos e po-
dem ser utilizados no controle de fitopa-
tógenos”, afirma.
Segundo a pesquisadora, os
experimentos são conduzidos
no campo, em laboratório e na
Casa de Vegetação do cam-pus da UEPG e UFPR. Os mais
recentes foram realizados nas
culturas de soja, feijão, milho
e frutíferas, com alguns resul-
tados promissores. Há uma
ampla gama de substâncias
que ainda podem ser testadas,
as quais, além de terem sua
eficiência comprovada, não
podem deixar resíduos nos alimentos
e no ambiente. Essas substâncias são
escolhidas com base na literatura e na
curiosidade dos próprios pesquisadores.
Maristella trabalha com dois alunos de
iniciação científica júnior, três alunos de
iniciação científica, três de mestrado e
quatro de doutorado. “O importante da
iniciação científica é que mantemos o
contato do aluno da graduação com a
pesquisa e podemos encaminhá-lo para
a Pós-Graduação. Na iniciação científica,
já conseguimos visualizar alunos que
têm aptidão para a pesquisa”.
Um de seus alunos, do curso de Agro-
nomia da UEPG, Alex Gatto, pesquisa o
uso de óleos essenciais no controle de
doenças do milho. Segundo Alex, o Pro-
jeto de Iniciação Científica possibilitou a
compreensão de todas as fases neces-
sárias antes de uma nova tecnologia ser
implementada no mercado. “As empre-
sas buscam quem já tem experiência. É
um diferencial na contratação”, disse o
estudante.Alex Gatto e Maristella Dalla Pria: contato do aluno da graduação com a pesquisa.
Foto: Isabelle Neri
CONTROLE BIOLÓGICO EM ESTUDO
ganha com um egresso mais bem pre-
parado tanto na área acadêmica quanto
no mercado de trabalho, porque não se
pode mais pensar hoje em uma “ciência
encastelada”. Ele ressalta que as pesqui-
sas não devem ser feitas individualmen-
te, mas de forma ampla e conjunta. “Pode
ocorrer de o pesquisador estar investi-
gando algo que possa contribuir para o
projeto de outro pesquisador e que pode
ser relacionado ao mesmo assunto e vi-
ce-versa”, reforça.
Investigar o perfil do jovem universitá-
rio — com relação à religião e à política
— é o objetivo de uma das pesquisas
desenvolvidas na Unespar. Por ser uma
universidade nova, ainda não existe o
mapeamento dos perfis dos alunos da
instituição. Outro projeto realizado na
Unespar que conta com a participação
de alunos da iniciação científica é o es-
tudo das representações da mulher pre-
sentes no jornal Folha do Norte do Paraná
— veiculado de 1962 a 1979, na região
norte do Paraná (sediado em Maringá).
Esse trabalho foi dividido em três fases:
digitalização dos jornais, tabulação dos
dados e avaliação do material coletado.
Além de ajudar a preservar documentos
históricos, o objetivo também é estudar
como o jornal se reportava às mulheres
naquela época, já que era organizado
pela Igreja Católica, e como esse trata-
mento influenciava a opinião das pesso-
as.
Os exemplos de Désirée e Camila mostram, na prática, o crescimento da iniciação cientí�ca em todo o país: em torno de 40% na última década. No Paraná, esse índice sobe para
quase 70%, segundo o CNPq.
Em 2004, eram 34.977 bolsistas em todo o país. Neste ano, são 50.125. Nos últimos quatro anos, foram �nanciadas pela Fundação Araucária, em parceria com o CNPq,
mais de 11.000 bolsas de iniciação cientí�ca, um investimento acima de R$ 52 milhões.
BRASIL
200434.977bolsas
201450.125bolsas
PARANÁ
2010 a 2014
11.000bolsas
52 milhões em investimentos
29PARANÁ FAZ CIÊNCIA
FAPs
As FAPs são responsáveis pelo desenvolvimento do país à medida que estimulam a ciência e a
tecnologia por meio de apoio a pesquisas
INVESTIMENTO EM PESSOAS E IDEIAS
crescimento de países
emergentes como o Brasil
tem proporcionado à
população o acesso a
uma melhor qualidade de
vida. Mas essa evolução depen-
de de mecanismos capazes de suportar
o avanço de diversos segmentos produ-
tivos no país. Nesse campo, destacam-
-se as políticas de desenvolvimento de
ciência, tecnologia e inovação, as quais
têm encontrado respaldo nas Fundações
de Amparo à Pesquisa (FAPs). O Brasil
conta com 26 fundações estaduais
em funcionamento, cuja finalidade é
dar apoio a projetos de pesquisa, en-
sino, extensão e de desenvolvimento
institucional, científico e tecnológico
para instituições de ensino superior
e institutos de pesquisa. “As FAPs são
grandes instrumentos para potenciali-
zar a ciência e a tecnologia no Brasil. O
número e o alcance das nossas funda-
ções são fatores inéditos em qualquer
país em desenvolvimento semelhante
ao nosso”, avalia o presidente da Coorde-
nação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (Capes), Jorge Guimarães.
Os impactos da ciência, da tecnologia
e da inovação são percebidos em diver-
sos setores e atividades, como promoção
da saúde, redução nos preços de equi-
pamentos e produtos, oferta de novas
tecnologias, conservação dos recursos
naturais, orientação ao desenvolvimento
de políticas públicas e aumento da com-
petitividade pela incorporação de novas
tecnologias. O presidente do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científi-
co e Tecnológico (CNPq), Glaucius Oliva,
destaca que, por meio das agências de
fomento, pesquisadores e docentes pas-
sam a ter mais oportunidades de forma-
ção e capacitação, além de “perspectivas
de intercâmbio com instituições e pes-
quisadores estrangeiros, possibilitando
um incremento das atividades de educa-
ção e pesquisa no país”.
O presidente do Conselho Nacional
das Fundações Estaduais de Amparo
à Pesquisa (Confap), Sérgio Gargioni,
também destaca as parcerias interna-
cionais. Dentre elas, a parceria com o
Fundo Newton, do Reino Unido, com
o Conselho Britânico e a norte-ameri-
cana Fundação Bill & Melinda Gates.
“Já estamos em estudos adiantados
para parcerias com instituições do
Canadá e da Comunidade Europeia,
as quais possibilitarão ainda mais o
apoio a pesquisas para o Brasil e para
parceiros”, conta.
Já estamos em estudos adiantados para parcerias
com instituições do Canadá e da Comunidade Europeia, as quais possibilitarão ainda
mais o apoio a pesquisas para o Brasil e para parceiros.
Sérgio Gargioni
30 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
O Paraná está entre os estados de refe-
rência quando o assunto é apoio à ciên-
cia e à tecnologia. A Fundação Araucária
— única FAP no país de personalidade
jurídica de direito privado sem fins lucra-
tivos —, vinculada à Secretaria de Estado
de Ciência e Tecnologia, deu um salto
em qualidade e atendimento nos últimos
quatro anos desde que passou a focar
sua gestão em pessoas e ideias, ou seja,
disponibilizando boa parte de seus recur-
sos para bolsas e projetos.
O presidente da Fundação Araucária,
Paulo Brofman, explica que a gestão da
entidade foi feita “a quatro mãos”, já
que as linhas de atuação da fundação
foram definidas a partir das deman-
das da comunidade universitária.
Somente de 2011 a 2014, a entida-
de financiou mais de 14 mil bolsas,
o que representa 50% da demanda;
além de apoiar outros 4 mil projetos.
“O Paraná conta hoje com 290 pro-
gramas de Pós-Graduação e mais
de 15 mil alunos. Isso faz com que
a demanda para bolsas e financia-
mentos seja muito grande”, comenta
Brofman. Para tentar ampliar o aten-
dimento, a fundação vem mantendo
parcerias, principalmente com as agên-
cias de fomento do governo federal, o
que possibilitou dobrar a quantidade de
financiamentos. Essas parcerias são pos-
síveis em função da credibilidade que a
Fundação Araucária conquistou. “Hoje
nós somos uma FAP de referência em
acordos assinados. E quando existe um
saldo de recursos de entidades como
a Capes, essas verbas são direcionadas
para nós, que temos condições de exe-
cutar rapidamente”, analisa.
Outro ponto positivo na gestão da
fundação foi o investimento na reestru-
turação administrativa, com novos pro-
gramas de informática, visando garantir
mais agilidade e facilitar os processos de
todos os envolvidos. O apoio da Funda-
ção Araucária aos programas de Pós-Gra-
duação stricto sensu foi um dos motivos
que ajudaram a colocar o Paraná em des-
taque novamente na classificação dos
programas de Pós-Graduação realizada
pela Capes.
O Paraná também manteve a lideran-
ça em relação à melhora na qualificação,
com 27% dos programas, enquanto a
média nacional foi de 23%. “Isso é méri-
to das universidades, dos institutos de
pesquisas e dos docentes e discentes
envolvidos”, disse Paulo Brofman.
Para o presidente da Fundação Arau-
cária, apesar de todos os avanços, ainda
existem desafios a serem alcançados.
Um deles é transformar a fundação em
política de estado. Outro é possibilitar
o recebimento por duodécimos, assim
como diminuir a burocracia da libera-
ção dos recursos. “Dependendo do
projeto, que os recursos possam ser
destinados diretamente para o pes-
quisador, pessoa física, e não somente
para as instituições”, explica.
PARANÁ
Hoje nós somos uma FAP de referência em
acordos assinados. E quando existe um saldo de recursos de
entidades como a Capes, essas verbas são direcionadas para nós,
que temos condições de executar rapidamente.
Paulo Brofman
31PARANÁ FAZ CIÊNCIA
extensão têm atendido comunidades
muitas vezes isoladas pela distância, e
são grandes possibilidades de transfor-
mação social”, ressalta.
Para Bruno Cesar Elias, graduado em
Medicina Veterinária pela Universidade
Federal do Paraná (UFPR) e integrante do
programa de Pós-Graduação de Ciência
Animal da Universidade Estadual de Lon-
drina (UEL), ter apoio para custear os es-
tudos é fundamental para uma vida aca-
dêmica. “Eu tenho a bolsa de mestrado e
acredito que esse auxílio é de vital impor-
tância, pois oferece ao aluno estabilidade
econômica e, consequentemente, vida
acadêmica plena”, afirma.
A Fundação Araucária elegeu quatro
eixos temáticos de atuação: verticaliza-
ção do ensino superior e formação de
pesquisadores, produção científica e tec-
nológica, disseminação científica e tec-
nológica, e o quarto eixo, que representa
outras ações financiadas. Além dos pro-
gramas tradicionais que vem desenvol-
vendo ao longo de 14 anos de atividades,
a fundação criou três novas bolsas: bolsa
técnico (que estimula a presença de pes-
quisadores responsáveis em laboratórios),
bolsa sênior (que destina bolsas a profes-
sores prestes a se aposentar para conti-
nuarem na orientação de mestrandos e
doutorandos) e bolsa pós-doc empresas
(com bolsas para pesquisadores desen-
volverem projetos dentro de empresas).
O coordenador de pesquisa e desen-
volvimento da Imunova — empresa
curitibana que atua com novas tecnolo-
gias para a indústria veterinária —, Celso
Fávaro Júnior, conta hoje com dois pós-
-doutorandos trabalhando no desenvol-
vimento de novos produtos na empresa.
Ele afirma que, se não fosse por meio
FUNDAÇÃO ARAUCÁRIA
da bolsa da fundação, não teria
condições de manter esses pro-
fissionais. “Além de podermos
contar com a excelência da pes-
quisa, também existe uma inte-
gração empresa-universidade
que é fundamental”, avalia.
A pós-doutoranda da empre-
sa Imunova, Clarissa Cavarsan, enxerga
essa bolsa como algo agregador para
sua carreira. “É uma oportunidade muito
interessante, porque passamos a ter um
foco diferente da academia e podemos
verificar a real aplicabilidade da pesquisa”.
Outra preocupação da fundação é
ampliar o envolvimento da comunidade
acadêmica com a sociedade. E isso tem
sido possível por meio do Programa Ins-
titucional de Bolsas de Extensão (PIBEX),
que incentiva a participação
de alunos de graduação no
desenvolvimento de ativida-
des de extensão universitária.
A pró-reitora de Extensão e
Cultura da Universidade Esta-
dual do Centro Oeste (Unicen-
tro), Marquiana
de Freitas Vi-
las Boas Go-
mes, diz que
atualmente
a instituição
conta com 24
alunos bolsis-
tas que desenvolvem
atividades nas áreas
de atendimento à
saúde, meio am-
biente, educação,
cultura, tecnologia,
trabalho e direitos so-
ciais. “Esses projetos de
32 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
TECNOLOGIA DE ALIMENTOS
Métodos e tecnologias atendem à demanda do consumidor por praticidade no preparo e saúde na mesa
rato típico na mesa dos
brasileiros, o feijão deve
ter o consumo incenti-
vado por suas qualidades
nutricionais, que incluem pro-
teínas, fibras, ácido fólico e mine-
rais, como o ferro e o potássio. Porém,
o tempo necessário para o preparo
doméstico tem diminuído o consumo
e, consequentemente, a demanda por
produção. Dados do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE) mos-
tram que, na última década, houve uma
redução de 26,4% no consumo do grão
pela população brasileira, quando se
comparam os anos de 2003 e 2009.
A informação reflete a influência que
o modo de vida exerce sobre a forma
como nos alimentamos. Com a correria
do dia a dia, ganham espaço na casa
do consumidor produtos que oferecem
praticidade no preparo e que, além de
nutrir, também ofereçam benefícios à
saúde. Seguindo a tendência, a indús-
tria alimentícia procura atender a essa
demanda e está cada vez mais interes-
sada em métodos e tecnologias que ra-
cionalizem a produção, evitando perdas
e melhorando a competitividade.
Dessa forma, oferecer um produto
previamente processado, com cozi-
mento mais rápido, mantendo todas as
suas características nutricionais, é um
33PARANÁ FAZ CIÊNCIA
dos focos do estudo sobre feijão realiza-
do no Programa de Pós-Graduação em
Engenharia Agrícola da Universidade
Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste)
em parceria com a Embrapa. O projeto
pretende reduzir o tempo de preparo
por meio da técnica de maceração, prá-
tica de deixar o feijão de molho antes
de cozinhar. “Assim, o feijão fica pronto
em apenas sete minutos, bem menos
que os 30 minutos necessários para cozi-
nhar o grão comum”, ressalta Silvia Renata
Machado Coelho, coordenadora e profes-
sora do Programa de Pós-Graduação em
Engenharia Agrícola da Unioeste (campus
Cascavel).
Silvia Renata Coelho (terceira, da esquerda para a direita): reduzir o tempo de preparo por meio
da técnica de maceração, prática de deixar o feijão de molho
antes de cozinhar, é o objetivo de uma de suas pesquisas.
Foto: Isabelle Neri
A elaboração de novos alimentos ou a alteração de produ-
tos já existentes envolve o conhecimento de como combi-
nar recursos para atender às demandas do consumidor. Uma
proposta para atingir a busca de uma alimentação focada na
qualidade de vida é a produção de derivados cárneos com a
adição de okara —resíduo obtido do preparo de leite de soja
e de outros produtos, como fibra da casca de aveia.
A intenção é aproveitar ingredientes residuais com caracte-
rísticas funcionais e agregar valor comercial a produtos com
baixo valor comercial. “Foram testados empanados de frango
(nuggets) e salsicha de frango, ambos com ótima aceitação”,
CARNE FUNCIONAL
Mayka Pedrão: pesquisas visam aproveitar ingredientes residuais com características funcionais e agregar valor
comercial a produtos com baixo valor comercial.
Foto: Isabelle Neri
do feijão submetido à maceração. Estão
sendo analisadas também a presença
de substâncias que levam ao envelheci-
mento do grão, e sua correlação com o
armazenamento. A qualidade culinária,
nutricional e de mercado é influenciada
pelo tempo e pelo modo como é arma-
zenado pós-colheita.
Além do benefício para a população
em geral — com um produto de mais
fácil cozimento e com maior qualida-
de —, os produtores também saem
ganhando. Quando comercializado, é
ideal que o feijão tenha no máximo seis
meses de armazenamento, mas o grão
acaba sendo vendido mesmo quando
ultrapassa esse tempo. Dessa forma, di-
minui o valor de mercado, mas também
a qualidade do produto que chega ao
consumidor. “Os produtores sinalizam
muito interesse em pesquisas na área
que venham solucionar essa questão”,
afirma Silvia
O efeito é obtido quando se co-
loca o grão de molho em solução
salina. Na pesquisa, observou-se
que a utilização de bicarbonato
de sódio contribui para reduzir o
tempo de cozimento. “Estão sen-
do testadas diversas variedades de
feijão para analisar qual apresenta
o melhor resultado”, salienta Silvia.
No resultado, os grãos ainda apre-
sentam uma coloração escurecida,
por isso, ainda é preciso otimizar o pro-
cesso para melhorar a aparência.
Foram testados feijões cozidos com e
sem a utilização da água do molho, e o
melhor resultado foi obtido quando se
descarta a água
em que o grão
ficou imerso. A
maceração dos
grãos em água
de 12 a 16 horas
demonstrou que
o amido tornou-
-se mais digerível
e fatores antinu-
tricionais, como
fitatos e taninos,
tiveram remoção
mais efetiva, sem
alterar o valor nutritivo.
Outro estudo investiga a influência do
armazenamento nos teores nutricionais
“O feijão fica pronto em apenas sete
minutos, bem menos que os 30 minutos
necessários para cozinhar o grão comum.”
Silvia Renata Machado Coelho
34 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
Medianeira e também professora de
Tecnologia de Carnes.
No caso de carnes suínas, há um es-
forço em reduzir carnes PSE (pálida, flá-
cida e exsudativa) e DFD (escura, firme e
seca). Esses produtos, salienta Cristiane,
precisam de cuidados ao serem utiliza-
dos na elaboração de produtos cárne-
os. A qualidade pode ficar comprome-
tida, não em relação à sanidade, mas
quanto às propriedades tecnológicas.
“Presuntos, por exemplo, podem ficar
com cor alterada, com partes mais cla-
ras e outras mais escuras”, explica.
Para minimizar esse problema, estão
sendo realizados vários estudos envol-
vendo melhoramento genético, ma-
nejo adequado e atendimento à legis-
lação de abate humanitário, que prevê
o respeito aos animais (eles devem ser
abatidos sem sofrimento). “Com isso, o
consumidor ganha uma carne macia,
saborosa e dentro dos padrões de se-
gurança alimentar exigidos pela legisla-
ção”, afirma a professora.
MELHORAMENTO GENÉTICO
Ingrediente importante nas principais
refeições dos brasileiros, a carne é tema
de estudo de muitos pesquisadores.
Atualmente, outra questão de destaque
é o melhoramento genético por meio
de cruzamento de raças puras. A inten-
ção é aumentar a produtividade, o ren-
Foto: UTFPR/Medianeira
conta Mayka Pedrão, pesquisadora co-
laboradora do projeto desenvolvido na
Universidade Federal Tecnológica do
Paraná (UTFPR), em conjunto com a
professora Neusa Fátima Seibel e co-
ordenado pelo professor Fábio Au-
gusto Garcia Coró, ambos da UTFPR.
Estima-se grande viabilidade na
execução do projeto, pois, além de
agregar valor, é uma alternativa para
funcionalidade com enriquecimen-
to com fibras em produtos cárneos.
“O desenvolvimento desse tipo de
produto é uma tendência diante dos
dimento e a qualidade da carne, princi-
palmente no que diz respeito à maciez
e ao sabor.
O Brasil está entre os maiores produ-
tores e exportadores do mundo e as
pesquisas contribuem para o atendi-
mento do mercado externo e do con-
sumidor mais exigente.
O estudo da utilização
da genômica é um dos
que contribuem para a
melhoria da qualidade
da carne. “A intenção é
avaliar interações entre
diferentes genes que
influenciam as caracte-
rísticas do tecido con-
juntivo, o conteúdo de
gordura, a composição
das fibras musculares
e a maturação da car-
ne”, destaca Cristiane
Canan, tecnóloga em
alimentos, professora
da área na UTFPR de
anseios dos consumidores em relação
à melhor alimentação associada à qua-
lidade de vida”, destaca Mayka.
O benefício se estende à comunida-
de científica e às indústrias de alimen-
tos, que estão cientes da importância
da utilização integral de todos os
subprodutos. Além das perdas nu-
tricionais, há também prejuízos fi-
nanceiros. A pesquisadora ressalta
que um aproveitamento adequado
pode minimizar essas perdas, além
de originar novos produtos com
diferenciação de mercado em rela-
ção à sua funcionalidade.
“O desenvolvimento desse tipo de produto [adição
de okara] é uma tendência diante dos anseios dos
consumidores em relação à melhor alimentação associada
à qualidade de vida.”Mayka Pedrão
35PARANÁ FAZ CIÊNCIA
A farinha de trigo é o ingrediente
responsável por conferir aparência,
aroma, sabor e textura a pães e bis-
coitos. O que pouca gente sabe é que
existem diversas variedades de trigo
e, para chegar a elas, são realizadas
pesquisas que procuram melhorar a
qualidade do produto. Desde 1976,
o Instituto Agronômico do Paraná
(Iapar) estuda o assunto. Já foram
desenvolvidas 33 variedades de tri-
go com diversas características. “São
realizados inúmeros cruzamentos e
muitos testes de campo e depois no
laboratório para selecionar as melho-
res variedades”, explica Maria Brígida
dos Santos Scholz, pesquisadora do
Iapar. Essas variedades são classifica-
das nas categorias melhorador, pão,
doméstico e básico.
Os testes seguem protocolos espe-
ciais para se estudar a qualidade da
farinha sem a influência dos demais
ingredientes. Os diversos tipos de
trigo também são testados antes da
colheita para que seja conhecida a
resistência à germinação. “Quando o
trigo germina ainda no campo, per-
de toda a sua qualidade tecnológica
e traz inúmeros prejuízos ao produ-
tor”, ressalta a pesquisadora.
MAIS SAÚDE
TRIGO DE QUALIDADE
Em busca de uma vida mais saudá-
vel, há uma tendência cada vez maior
do consumo dos chamados alimentos
funcionais. Nessa classe, destacam-se
os que contêm probióticos, alimentos
que apresentam microrganismos vivos,
não patogênicos e que, quando consu-
midos diariamente e em concentração
adequada, conferem efeitos benéficos
à saúde.
Os probióticos são bactérias que me-
lhoram o sistema imunológico e a flora
intestinal, e são adicionados a alimentos
lácteos, como iogurtes e leites fermen-
tados. No organismo, as bactérias mais
conhecidas que exercem essas funções
são Bifidobacterium e Lactobacillus. Es-
tudos mais recentes mostram que, além
desses benefícios, tem sido verificada a
capacidade de os probióticos promo-
verem a descontaminação por micro-
toxinas (toxinas produzidas por algas,
hidrocarbonetos policíclicos, que são
compostos tóxicos resultantes da quei-
ma de gordura etc.).
“Os probióticos se ligam a compostos
tóxicos e, portanto, podem reduzir e/
ou eliminar a toxicidade deles”, revela
Deisy Alessandra Drunkler, professora
do Programa de Pós-Graduação em
Tecnologia de Alimentos da UTFPR de
Medianeira. Além dos alimentos lácteos
tradicionais, a adição dos probióticos
tem sido testada também em produtos
como chocolates, sucos de frutas e fór-
mulas infantis.
De acordo com as pesquisas realiza-
das na UTFPR, a viabilidade dos probió-
ticos pode ser aumentada por meio da
microencapsulação e, também, com o
emprego de prebióticos — compostos
não digeridos pelo trato digestório, mas
utilizados pelos probióticos. O emprego
conjunto de pro e prebióticos resulta na
obtenção de um alimento simbiótico.
Dessa forma, o emprego de probióticos
em produtos alimentícios pode ser po-
tencializado por esses efeitos que têm
sido pesquisados nos últimos anos, im-
pulsionando ainda mais esse mercado.
Foto: UTFPR/Medianeira
Maria Brígida Scholz: estudos sobre variedades de trigo
buscam a melhoria do grão.Foto: Isabelle Neri
36 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
BEM CUIDADOSOs animais de estimação estão cada vez mais presentes na
rotina das famílias. Paralelamente, a Medicina Veterinária vem se desenvolvendo e se especializando em diversas áreas
MEDICINA VETERINÁRIA
37PARANÁ FAZ CIÊNCIA
Também serão estudados hormônios
relacionados à obesidade como a insuli-
na, leptina e adiponectina. Esses hormô-
nios possuem importância na proteção
ou no desenvolvimento das complica-
ções da obesidade. “O tecido adiposo
produz substâncias pró-inflamatórias,
como as citocinas, que estimulam infla-
mação crônica leve inespecífica”, informa
o veterinário. O objetivo é concluir os es-
tudos até junho de 2015.
Cães e gatos saíram dos
quintais e foram morar
em apartamentos. Perde-
ram liberdade, tornaram-
-se mais sedentários, obe-
sos e, consequentemente,
mais suscetíveis a doenças. A maior pro-
ximidade com os donos, entretanto, fez
com que essas doenças fossem mais
rapidamente percebidas e, assim, logo
diagnosticadas.
A Medicina Veterinária tem que se
adaptar às mudanças. Assim, vem se
dividindo cada vez mais em especiali-
dades para tratar pequenos e grandes
animais, como nas áreas de neurologia,
dermatologia, odontologia, ortopedia,
oncologia, diagnóstico por imagem,
endocrinologia, oftalmologia e homeo-
patia, o que possibilita tratamentos mais
eficazes.
O Conselho Federal de Medicina Ve-
terinária (CFMV) reconhece atualmente
apenas algumas especialidades: aneste-
siologia, cirurgia, patologia, homeopatia,
medicina veterinária intensiva e acupun-
tura. As outras são consideradas ainda
“áreas de atuação”.
Mesmo com tantas especialidades,
dificilmente alguém leva seu cão ao ve-
terinário porque ele está gordo. Mas, na
verdade, é preciso estar atento a isso, pois
os especialistas alertam que a obesidade
pode estar ligada a várias doenças, como
diabete, bronquite, dermatite, hiperten-
são, tumores, artrite e até problemas car-
díacos. Além disso, cães obesos podem
viver até 20% menos.
Uma pesquisa realizada entre a Univer-
sidade Norte do Paraná, de Bandeirantes
(UENP), a Universidade Estadual de Lon-
drina (UEL) e a Universidade Estadual
Paulista (Unesp) está estudando 60 cães
obesos e 60 cães com peso normal para
detectar os malefícios que o problema
traz para o animal. Segundo o coorde-
nador da pesquisa, professor da UENP,
Mauro José Lahm Cardoso, com base no
resultado, pretende-se conscientizar a
população sobre como cuidar melhor de
Mauro Cardoso com sua aluna Laissa Iglesias: 60 cães foram submetidos a vários exames para pesquisa sobre obesidade.
Foto: Isabelle Neri
seu animal de estimação e alertar os ve-
terinários clínicos para diagnósticos mais
precisos.
A primeira etapa da pesquisa do pro-
fessor começou em janeiro deste ano e
consiste na aplicação de um questioná-
rio virtual pela rede social Facebook (fa-
cebook/obesidadecanina) e outro físico
com os donos dos cães, que levantará
dados sobre como são tratados os ani-
mais, além de apontar o perfil socioeco-
nômico das famílias.
A segunda parte será identificar altera-
ções no sangue, medir biomarcadores da
obesidade, incluindo exames de coleste-
rol, glicemia e triglicérides, além de medir
a pressão arterial para checar as compli-
cações causadas pela obesidade. O coor-
denador da pesquisa explica que os cães
do estudo terão a gordura corporal esti-
mada por meio de cálculos matemáticos,
semelhante ao Índice de Massa Corpórea
(IMC) usado em humanos.
O terceiro ciclo da investigação será a
campanha de conscientização para man-
ter animais mais saudáveis em casa. Se-
gundo Cardoso, cerca de 35% a 50% dos
cães estão acima do peso e é necessário
identificar as causas. Porém, já se sabe
que os principais fatores são a superali-
mentação, o sedentarismo, os fatores ge-
néticos e a castração.
38 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
A pesquisa do professor Cardoso é
apenas uma das várias investigações que
vêm sendo desenvolvidas nas universida-
des com o intuito de melhorar a vida dos
animais. Essas pesquisas também refor-
çam a importância das especialidades na
área, já que os casos acometem determi-
nadas partes do corpo dos animais.
Os problemas tratados pela neurolo-
gia, por exemplo, são os mais diversos,
desde hérnia de disco ou doença do
disco invertebral, fraturas de coluna, epi-
lepsia, encefalites, meningites, neopla-
sias cerebrais e até o Mal de Alzheimer.
Conforme explica a médica veterinária
Mônica Vicky Bahr Arias, docente das dis-
ciplinas de Técnica Cirúrgica e Clínica Ci-
rúrgica de Pequenos Animais na UEL, no
caso da doença do disco invertebral tipo
1 (hérnia de disco), o animal sente muita
dor e pode ficar paraplégico ou tetra-
plégico se não tratado adequadamente.
“Nós fazemos o diagnóstico e optamos
pela cirurgia ou pelo método conserva-
tivo, dependendo da gravidade do caso”,
explica.
Raças pequenas como teckel, lhasa
apso e shitsu, diz a professora, têm um
tipo de nanismo, por isso são chamadas
de raças condrodistróficas (possuem
membros encurtados e, frequentemente,
apresentam o canal vertebral mais estrei-
to). “Nesses animais, o disco intervertebral
sofre um tipo de degeneração diferente
do que ocorre nas outras raças”, observa.
Animais condrodistróficos, já aos 4 anos,
podem apresentar a doença do tipo 1;
enquanto outras raças não apresentam
essa doença com frequência, porém po-
dem apresentar a doença do tipo 2, me-
nos grave, mas cujo tratamento ainda é
controverso.
Segundo Mônica, a do-
ença do disco intervertebral
tipo 1 causa sinais agudos
e necessita de cirurgia de
emergência; já a hérnia ou
doença do disco tipo 2 é crô-
nica e atinge as raças maio-
res. “Estamos encontrando
essa hérnia tipo 2 em animais
trazidos para atendimento
devido a outros problemas
clínicos e que não apresen-
tam dor ou dificuldade de
locomoção”, explica.
A equipe começou a fazer esse estudo
porque notou outros animais com alte-
rações neurológicas nos quais era diag-
nosticada por exame a hérnia tipo 2, sem
melhora após a cirurgia. “Acreditamos
que outras doenças medulares, talvez
degenerativas, sejam as responsáveis pe-
los sinais neurológicos, sendo assim, nem
sempre é necessária uma intervenção
cirúrgica”, diz a veterinária. “Estamos pes-
quisando o porquê dessa alteração para
não indicarmos uma cirurgia desnecessa-
riamente.”
Alunas do curso de Medicina Veterinária da UENP com o professor Mauro Cardoso.
Foto: Isabelle Neri
NEUROLOGIA NÃO É RECONHECIDA
ESPECIALIDADES SALVAM CADA VEZ MAIS ANIMAIS
A professora Mônica é vice-presidente da Associação Brasileira de Neu-
rologia Veterinária (ABNV). Ela acredita que ainda serão necessários alguns
anos para que a especialidade seja oficialmente reconhecida, devido às exi-
gências do CFMV, aliadas à necessidade de realização de provas para avalia-
ção de títulos e dos conhecimentos da área.
Foto: Daniel Procópio/UEL
Mônica Arias: doenças do disco intervertebral são exemplos de problemas estudados pela Neurologia Veterinária.
39PARANÁ FAZ CIÊNCIA
É comum, por questões culturais, a
ideia de que o genoma humano é todo
exclusivo da espécie humana. “Na rea-
lidade, nosso genoma não é tão nosso
assim. A maioria dos genes humanos é
compartilhada pelos mamíferos e, em
boa parte, por outros vertebrados”. A
afirmação é do veterinário geneticista
Enio Moura, professor de Genética e de
Biologia Molecular da Pontifícia Universi-
dade Católica do Paraná (PUCPR). Sendo
assim, a maioria das doenças genéticas
“humanas” ocorre em outros mamíferos
também, inclusive com o mesmo padrão
de herança.
O estudo das doenças genéticas e dos
defeitos congênitos de animais contribui
para o esclarecimento de aspectos da
etiologia e da patogenia e para o desen-
volvimento de tratamentos, reduzindo o
sofrimento tanto dos animais quanto dos
humanos. Moura ressalta que todos os
casos que estuda de doenças genéticas
e defeitos congênitos são espontâneos,
nenhum induzido por tecnologia gené-
tica ou cruzamentos intencionais.
Conforme o pesquisador, a partir dos
estudos genéticos, muitos animais que
antes eram sacrificados porque se des-
conhecia a doença puderam ter uma
sobrevida de qualidade com tratamentos
adequados. Exemplo disso foram seus
próprios cães, que tinham displasia ec-
todérmica hipoidrótica ligada ao X, uma
genodermatose que acomete principal-
mente machos por ser causada por uma
mutação recessiva de um gene localiza-
do no cromossomo X. “A aparência dos
animais é característica, havendo alope-
cia (falta de pelos) em áreas específicas
do corpo desde o nascimento, além de
oligodontia (poucos dentes) e dentes co-
noides (dentes malformados e com for-
ma cônica)”, descreve. Segundo ele, com
alguns cuidados simples, os cães afeta-
dos têm boa qualidade de vida.
Erros de diagnóstico já levaram mui-
tos clínicos a optarem pela eutanásia. “É
uma situação comum diante da suspeita
de uma doença genética, uma vez que
é bastante difundida a ideia de que se
a causa é genética, nada pode ser fei-
to”, diz o geneticista. Embora possa ser
verdadeiro para determinadas doenças,
para outras, não é. Dependendo do caso,
pode haver soluções cirúrgicas ou proce-
dimentos que proporcionam boa quali-
dade de vida ao paciente.
Outra pesquisa desenvolvida no De-
partamento de Clínicas Veterinárias da
UEL é sobre a doença espondilomielopa-
tia cervical caudal, que causa dificuldade
de locomoção e necessita de tratamento
cirúrgico. Há mais de 25 tipos de cirurgias
descritas, mas nenhuma com mais de
80% de efetividade. Na medicina huma-
na, existe uma doença semelhante e o
tratamento envolve uma prótese.
O mesmo começou a ser feito nos
Estados Unidos há poucos anos para o
tratamento dos cães, mas a prótese de-
senvolvida lá apresentou algumas com-
plicações. “Estamos tentando melhorar
essa prótese numa parceria com um pro-
fessor do Departamento de Design da
UEL e com outro professor da Universi-
dade de São Paulo – Ribeirão Preto (USP),
que está orientando o desenvolvimento
do material na parte biomecânica”, co-
menta Mônica.
Ênio Moura: doenças genéticas “humanas” também
ocorrem nos animais.
Foto: Isabelle Neri
Crânio de cão que teve “Sequência de Pierre Robin”.
Foto: Isabelle Neri
BICHOCOM DOENÇA
DE GENTE
40 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
DE OLHO NELES
RARIDADESALZHEIMER CANINO
Os problemas de visão também afe-
tam os pequenos animais. E quando eles
começam a ter dificuldade para enxergar,
somente o olhar atento dos donos detec-
ta essa alteração.
A oftalmologista veterinária Miriam Si-
liani Batista de Souza, da UEL, vem pes-
quisando há alguns anos a glândula da
terceira pálpebra (glândula encontrada
em muitos animais), que produz parte
da lágrima e, muitas vezes é retirada por
meio cirúrgico indevidamente. “Alguns
animais podem desenvolver olho seco. E
hoje tentamos preservar essa glândula.”
Geralmente, os casos são de hiperplasia
(aumento de tamanho) ou protusão
(movimentação ou deslocamento
para a frente) da glândula.
A professora fez mestrado em Ce-
ratoplastia (transplante de córnea).
“Juntamos os casos para que os alu-
nos pudessem estudar um caso úni-
co”, informa. Já no doutorado, reali-
zado na Escola Paulista de Medicina,
da USP, estudou ceratoplastia com
aplicação de membrana amniótica e
abriu um novo projeto de extensão.
Alguns trabalhos já foram levados
para congressos e publicados.
Pode parecer estranho, mas sintomas
semelhantes aos da Doença de Alzhei-
mer, que acomete humanos, podem
estar afetando cães. Investigar isso é um
dos objetivos do doutorando em Ciência
Animal da UEL, Rogério Anderson Mar-
casso. Em sua pesquisa, cães idosos que
morreram por diversas doenças estão
sendo estudados no Departamento de
Medicina Veterinária em conjunto com
o Departamento de Clínicas Veterinárias.
Marcasso está pesquisando a disfunção
cognitiva em cães que vieram a óbito.
Essa disfunção é uma doença neuroló-
gica degenerativa que se assemelha à
Doença de Alzheimer em humanos, cuja
patogenia não é completamente com-
preendida. Animais acometidos apresen-
tam sinais como alterações do ciclo do
sono, se perdem dentro de casa e dei-
xam de reconhecer os donos.
Da mesma forma que na Doença de
Alzheimer, o diagnóstico definitivo só é
O professor Enio Moura cita dois casos
interessantes por envolverem anormali-
dades registradas pela primeira vez em
animais, embora sejam conhecidas há
muito tempo no ser humano. Um deles é
o caso de associação VACTERL (ou VATER)
em uma gata. VACTERL é um acrônimo
(em inglês) para se referir a defeitos verte-
brais, atresia de ânus (ânus sem abertura
ou inexistente), defeitos cardíacos, fístula
traqueoesofágica (comunicação entre
a traqueia e o esôfago), anormalidades
renais e defeitos nos membros torácicos.
O outro caso é o de sequência de
Pierre Robin, afetando um cão da raça
dachshund. Trata-se de uma condição
em que a anormalidade primária é a mi-
crognatia (malformação caracterizada por
uma mandíbula muito pequena), que, por
sua vez, provoca uma sequência de outras
anormalidades do desenvolvimento.
possível por meio do exame histopato-
lógico, e o estudo nos cães que natural-
mente desenvolvem a doença auxilia no
entendimento da patogenia. O douto-
rando destaca que os sinais clínicos pre-
sentes na disfunção cognitiva se asseme-
lham aos de outras doenças que afetam
o cérebro, como doenças infecciosas,
neoplásicas e metabólicas. Foram encon-
tradas várias dessas outras doenças além
da disfunção cognitiva nos cérebros dos
44 cães estudados até o momento.
Diagnóstico do Alzheimer canino é obtido com
exame histopatológico.
Foto: Daniel Procópio/UEL
Miriam Souza, professora da UEL: transplante de córnea é uma das cirurgias realizadas pela Oftalmologia Veterinária.
Foto: Daniel Procópio/UEL
41PARANÁ FAZ CIÊNCIA
A INTERNACIONALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES
DE ENSINO SUPERIOR NO BRASIL
a sociedade do conheci-
mento em que vivemos,
as universidades desem-
penham papel central
na formação de quadros
para a consolidação dos países e o desen-
volvimento da pesquisa que sustenta a
sociedade. Embora o cenário universitário
seja bastante heterogêneo, com institui-
ções de ensino superior (IES) de tama-
nhos e vocações diferentes, um interesse
comum se destaca: a internacionalização
da educação superior.
Ainda que reconhecida como im-
portantíssima dimensão da educação
superior, o verdadeiro significado da in-
ternacionalização ainda não é suficiente
e adequadamente compreendido. Uma
definição que julgo descrever bem o con-
ceito é a da canadense Jane Knight, que
define internacionalização como “proces-
so de integração da dimensão internacio-
nal, intercultural ou global nos propósitos,
funções e realização de educação supe-
rior”. Essa definição mostra a distância
que a maioria das instituições de ensino
superior brasileiras ainda tem em relação
a uma efetiva internacionalização.
Além disso, como indicou José Marques
dos Santos, Reitor da Universidade do Por-
to, em evento realizado na Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
(Unesp) em 2012, deve-se compreender
que “a internacionalização não é um fim
só por si, mas um instrumento hoje indis-
pensável para cumprir os objetivos estra-
tégicos que emanam da missão de cada
universidade”.
As universidades de maior prestígio no
mundo atuam de forma estratégica para
integrar a internacionalização transversal-
mente em suas estruturas e dinâmicas de
funcionamento. Para tanto, contam com
unidades e equipes profissionais que atu-
am em diferentes setores e respondem
pelas diversas atividades de internaciona-
lização desenvolvidas por essas institui-
ções, focadas em objetivos bem definidos,
como parcerias interinstitucionais, proje-
tos conjuntos de pesquisa, captação de
estudantes internacionais, programas de
estudos de curta duração no exterior etc.
A situação no Brasil é bem diferente.
Em 2011, quando o governo federal lan-
çou o Programa Ciência sem Fronteiras
(CsF), com o objetivo de enviar 100 mil
estudantes ao exterior, a falta de estrutura
adequada para tratar da mobilidade de
estudantes — uma das principais ativida-
des do processo de internacionalização
das IES —, expôs uma grande lacuna ain-
da existente no país. Poucas instituições
contam com um escritório internacional
estabelecido, com dotação orçamentária
e recursos humanos bem capacitados
para desenvolver suas atividades. Muitas
instituições tiveram que rapidamente se
adequar e criar escritórios de relações in-
ternacionais, tanto para operar as ativida-
des associadas ao Programa CsF quanto
para acolher as inúmeras delegações de
IES estrangeiras que passaram a vir cada
vez mais ao Brasil, em busca de parcerias
e de alunos.
Desse modo, pode-se dizer que esse
programa, ao mesmo tempo que foi um
É importante reconhecer que tanto as grandes IES
brasileiras, nas quais a pesquisa atua como motor
de desenvolvimento e o processo de
internacionalização já é mais desenvolvido, como
as IES menores e mais voltadas para a formação
de pessoas podem e devem se beneficiar das
oportunidades trazidas pela internacionalização. Para
cada tipo e tamanho de IES, existem oportunidades a
serem exploradas.
ARTIGO
42 PARANÁ FAZ CIÊNCIA
grande catalisador, também ressaltou o
problema da falta de estrutura e, sobre-
tudo, a enorme importância do tema da
internacionalização da educação superior
no atual cenário internacional.
Mas, se as IES já estão se adaptando
para tratar da questão da mobilidade de
estudantes, muitas outras atividades in-
ternacionais ainda precisam ser mais ade-
quadamente abordadas.
A principal delas é como efetivamente
implementar a transversalidade da inter-
nacionalização na estrutura e no funcio-
namento das IES. Como transformar um
escritório, que muitas vezes funciona com
apenas um profissional, em agente e mo-
tor de transformação das instituições.
Isso depende fundamentalmente da
vontade política e do compromisso dos
dirigentes da instituição. Esse é o primei-
ro e mais importante passo no caminho
do sucesso. A conscientização de todo o
ambiente acadêmico para a importância
e as vantagens associadas à internacio-
nalização da educação superior também
tem um papel central, pois apenas com
o compromisso de todos os envolvidos
é possível construir um efetivo projeto de
internacionalização.
A questão da mobilidade também me-
rece ser aprofundada. O Programa CsF,
com a oferta de bolsas de mobilidade
no exterior para estudantes e docentes,
certamente contribuiu para a internacio-
nalização de parte das instituições. A visi-
bilidade internacional obtida deve poder
ser aproveitada para se construir parce-
rias que contribuam para o processo de
internacionalização de cada instituição,
levando em conta seus objetivos e suas
vocações.
É importante reconhecer que tanto as
grandes IES brasileiras, nas quais a pesqui-
sa atua como motor de desenvolvimento
e o processo de internacionalização já é
mais desenvolvido, como as IES menores e
mais voltadas para a formação de pessoas
podem e devem se beneficiar das oportu-
nidades trazidas pela internacionalização.
Para cada tipo e tamanho de IES, existem
oportunidades a serem exploradas.
Mas é necessário ir além da questão da
mobilidade. Outras ações de internacio-
nalização devem ser efetivamente abor-
dadas pelas IES brasileiras. A chamada
“Internacionalização em Casa” (Internatio-
nalization at Home), que envolve o desen-
volvimento de atividades internacionais
no campus, voltando-se para aqueles que
não têm a oportunidade de ir ao exterior.
A “Internacionalização do Currículo”, que
prevê, dentre outras atividades, a inclu-
são de componentes internacionais nos
currículos dos cursos, o ensino de línguas
estrangeiras (principalmente o inglês) e
o aumento da presença de estudantes e
professores estrangeiros (que passa pela
oferta de disciplinas em inglês) são algu-
mas das ações a serem desenvolvidas
Para que tudo isso possa ser realizado
adequadamente, é necessário que os res-
ponsáveis estejam capacitados para essas
tarefas. É nesse contexto que atua a Asso-
ciação Brasileira de Educação Internacio-
nal (FAUBAI). Criada há mais de 26 anos,
conta atualmente com representantes
de mais de 200 IES de todos os setores
(federal, estadual, comunitário e privado)
e regiões do país e tem forte atuação no
aperfeiçoamento do intercâmbio e da co-
operação internacionais e na inserção da
educação superior brasileira no cenário
mundial. A FAUBAI realiza anualmente a
mais importante conferência sobre a in-
ternacionalização da educação superior
no país, contribuindo de forma efetiva
para o processo de internacionalização
das IES brasileiras.
Em 2014, o evento contou com cerca
de 400 inscritos, 137 deles estrangeiros,
representando IES dos Estados Unidos, da
Austrália, da Nova Zelândia, da Irlanda, da
França, dentre outros países.
Francisco Marmolejo, coordenador de
Educação Superior do Banco Mundial,
proferiu a conferência de abertura sobre
novos cenários para a internacionalização
da educação superior. Presidentes das
mais importantes associações de edu-
cação internacional do mundo — como
Fanta Aw, da Association of International
Educators (NAFSA), Laura Howard, da
European Association for International
Education (EAIE), Helen Zimmerman, da
International Education Association of
Australia (IEAA), Lavern Samuels, da Inter-
national Education Association of South
Africa (IEASA) — discutiram a declaração
conjunta “Global Dialogue on the Future
of Internationalisation of Higher Educa-
tion”, proposta em 2013, na África do Sul,
com bases para uma efetiva internaciona-
lização da educação superior no mundo.
A FAUBAI 2015 ocorrerá em Cuiabá
(Mato Grosso), de 25 a 29 de abril de 2015,
com o tema geral “Criando parcerias sus-
tentáveis através de uma internacionaliza-
ção equilibrada”, e espera-se um número
ainda maior de participantes e uma im-
portante representação da América La-
tina, o que, sem dúvida, contribuirá para
que a educação superior brasileira alcan-
ce cada vez mais padrões internacionais
de excelência.
Se as IES já estão se adaptando para tratar da
questão da mobilidade de estudantes, muitas outras atividades internacionais ainda precisam ser mais
adequadamente abordadas.
José Celso Freire Junior éAssessor de Relações Externas (AREX)
da UNESP (Universidade Estadual Paulista) e Presidente da FAUBAI
(Associação Brasileira de Educação Internacional).
Foto
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ulga
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