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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Fundada em 18 de Fevereiro de 1808
Monografia
Transplante Duplo de Fígado e Rim:
Relato de Caso e Revisão de Literatura
Karen Caires Borges
Salvador (Bahia)
Junho, 2012
II
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária de Saúde, SIBI - UFBA.
B732 Borges, Karen Caires
Transplante duplo de fígado e rim: relato de caso e revisão
de literatura/ Karen Caires Borges. – Salvador, 2012.
51 f.
Orientadora: Profª. Drª Margarida Maria Dantas Dutra
Monografia (Graduação) – Universidade Federal da Bahia.
Faculdade de Medicina da Bahia, 2012.
1. Transplante. 2. Fígado. 3. Rim. I. Dutra, Margarida
Maria Dantas. II. Universidade Federal da Bahia. III. Título.
CDU 616.36
III
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Fundada em 18 de Fevereiro de 1808
Transplante Duplo de Fígado e Rim:
Relato de Caso e Revisão de Literatura
Karen Caires Borges
Professor-orientador: Margarida Maria Dantas Dutra
Monografia de conclusão do componente
curricular MED-B60, do currículo médico da
Faculdade de Medicina da Bahia (FMB) da
Universidade Federal da Bahia (UFBA),
apresentada ao Colegiado do Curso de Graduação
em Medicina da FMB-UFBA.
Salvador (Bahia)
Junho, 2012
IV
Monografia: Transplante Duplo de Fígado e Rim: Relato de Caso e
Revisão de Literatura
Karen Caires Borges
Professor-orientador: Margarida Maria Dantas Dutra
COMISSÃO EXAMINADORA
Membros Titulares:
Margarida Maria Dantas Dutra (Presidente), Coordenadora do
Serviço de Nefrologia do Hospital Português (Bahia).
Paulo Novis Rocha, Professor Adjunto do Departamento de
Medicina Interna e Apoio Diagnóstico da FMB-UFBA.
Jorge Carvalho Guedes, Professor Adjunto do Departamento de
Medicina Interna e Apoio Diagnóstico da FMB-UFBA e
Coordenador do Internato em Clínica Médica da graduação em
Medicina da UFBA.
TERMO DE REGISTRO ACADÊMICO:
Monografia aprovada pela Comissão, e julgada apta à
apresentação pública no III Seminário Estudantil da
Faculdade de Medicina da Bahia, com posterior
homologação do registro final do conceito apto, pela
coordenação do Núcleo de Formação Científica. Chefia
do Departamento de Medicina Interna e Apoio
Diagnóstico da FMB-UFBA.
Salvador (Bahia)
Junho, 2012
V
INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
Faculdade de Medicina da Bahia
Ambulatório Magalhães Neto
HOSPITAL PORTUGUÊS – Salvador, Bahia
Serviço de Nefrologia
VI
Ao meu cunhado e amigo, Marcelo,
grande exemplo de força e dignidade.
A minha mãe, Dulce, e minha irmã,
Jeanline, eternos amores da minha
vida.
VII
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, por não me deixar fraquejar mesmo nos momentos mais
difíceis, me fazendo confiar na minha capacidade de alcançar os objetivos
aparentemente mais longínquos.
A Drª Margarida, por me acolher com tanta doçura ao longo desses 2 anos de
elaboração deste trabalho. Levarei sempre comigo não apenas o seu exemplo de
profissional extremamente competente e dedicada, mas também o de ser humano
ímpar que é.
Ao Dr Jorge Bastos, por ter cedido tão prontamente as imagens que
compuseram este trabalho.
À Gerência do Hospital Português, que foi muito solícita ao contribuir com as
questões burocráticas da realização desta pesquisa.
À minha família, aqueles a quem sem dúvida devo tudo que sou hoje. Em
especial, à minha mãe, Dulcelina, e à minha irmã, Jeanline, as maiores
incentivadoras não apenas da minha carreira acadêmica/profissional, mas também
da minha felicidade. Vocês são as minhas grandes referências nessa vida! Obrigada
por nunca desacreditarem de mim, até quando eu mesma duvidei.
Aos meus amigos da FMB-UFBA, com quem compartilhei momentos únicos
de alegria e de angústia ao longo desses 4 anos. Com vocês aprendi muito mais do
que a medicina pode ensinar. Juntos superamos mais essa batalha!
A Ramon, por todo amor dedicado a mim e por ter sido tão companheiro
durante o árduo período de elaboração desta monografia.
VIII
“Que os vossos esforços desafiem as
impossibilidades. Lembrai-vos de que as grandes
coisas do homem foram conquistadas do que
parecia impossível.”
(Charles Chaplin)
IX
RESUMO
O fígado e o rim são órgãos nobres na fisiologia humana. Tantos as doenças
hepáticas quanto as doenças renais provocam limitações importantes na vida dos
pacientes à medida que vão se agravando. Ao estágio terminal, o transplante do
órgão é a única alternativa terapêutica eficaz. Até a realização do primeiro
transplante duplo de fígado e rim em 1984, pacientes com acometimento simultâneo
de ambos os órgãos eram excluídos das filas de espera. O presente trabalho tem o
objetivo de relatar o primeiro caso de transplante duplo de fígado e rim realizado na
Bahia, em junho de 2009, e levantar os dados mais relevantes da literatura recente a
respeito da história dos transplantes, as indicações do transplante combinado de
fígado e rim e os resultados já descritos em outras experiências no mundo.
Palavras-chave: transplante simultâneo de fígado e rim, história, indicações,
desfecho.
X
ABSTRACT
Liver and kidney are important organs in human physiology. Both hepatic
diseases and renal diseases lead to important limitations in patients’ lives while
becoming worse. In the end stage diseases, organ transplantation is the only
effective therapeutic alternative. At the moment of the first combined liver-kidney
transplantation in 1984, patients with simultaneous impairment in both organs were
out of the waiting list transplant. The objective of this study is report the first
combined liver-kidney transplantation occurred in Bahia, in June 2009, and reviews
the most important data in the recent literature about the history of transplantation,
indications of combined liver-kidney transplantation and the outcomes have already
described in other experiences around the world.
Key-words: combined liver-kidney transplantation, history, indications, outcome.
XI
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1: Fígado na paciente 29
Figura 2: Fígado da paciente visão frontal 29
Figura 3: Fígado da paciente visão dorsal 29
Figura 4: Enxerto de fígado na paciente 30
Figura 5: Algoritmo de indicação CLKT/transplante isolado de rim na
doença renal
40
XII
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 13
2 OBJETIVOS 16
3 METODOLOGIA 17
4 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA 18
5 RELATO DO CASO 25
5.1 DADOS DO CASO 25
6 DISCUSSÃO 31
6.1 INDICAÇÕES DO TRANSPLANTE DUPLO DE FÍGADO E RIM 31
6.1.1 Controvérsias 32
6.1.1.1 Determinação do grau de insuficiência renal e/ou hepática 32
6.1.1.2 Determinação da irreversibilidade da falência renal no
contexto do transplante hepático
33
6.1.1.2.1 Síndrome Hepatorrenal 33
6.1.1.2.2 Doença Renal Primária 34
6.1.1.2.3 Doença Policística 35
6.1.1.2.4 Toxicidade por inibidores da calcineurina 35
6.1.1.2.5 Hiperoxalúria Primária Tipo I 35
6.1.1.3 O impacto do escore MELD na realização de transplantes
combinados de fígado e rim
36
6.1.2 Avaliação das indicações do CLKT para pacientes cirróticos
com comprometimento renal
38
6.1.3 Avaliação das indicações do CLKT para pacientes em estágio
terminal de doença renal e comprometimento hepático
40
6.2 RESULTADOS DO PÓS-TRANSPLANTE DUPLO DE FÍGADO E RIM 41
7 CONCLUSÃO 44
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 46
ANEXO 1 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 50
ANEXO 2 – Autorização da gerência técnica do Hospital Português 51
- 13 -
1 INTRODUÇÃO
O fígado e o rim são órgãos nobres na fisiologia humana. O fígado funciona
como uma estação no caminho entre a circulação esplâncnica e a sistêmica. Ele
mantém a homeostasia metabólica do corpo, processando proteínas, lipídios,
carboidratos e vitaminas; sintetizando proteínas plasmáticas e degradando
substâncias tóxicas. O rim, por sua vez, excreta os produtos tóxicos do
metabolismo, regula precisamente o equilíbrio hidroeletrolítico e ácido-básico do
organismo, e age como um órgão endócrino, secretando hormônios como
eritropoetina, renina e prostaglandinas (1).
Sendo assim, tanto as doenças hepáticas quanto as doenças renais têm
conseqüências de longo alcance e, portanto, podem submeter o enfermo a uma
qualidade de vida limitada à medida que vão se agravando. Ao estágio terminal das
doenças do fígado e do rim – doença hepática aguda ou crônica em fase terminal e
insuficiência renal crônica em fase terminal – o transplante do órgão, além de
indicado, torna-se a alternativa terapêutica mais eficaz e a que promete melhor
expectativa de vida para os doentes (2,3).
Infelizmente, nem todos os pacientes podem ser beneficiados pelo
transplante. Além dos já conhecidos problemas com a disponibilidade de órgãos
para doação e com a captação deficiente dos órgãos após o diagnóstico de morte
encefálica, existem as restrições relacionadas às condições de saúde do próprio
candidato a receptor.
O transplante de fígado, por exemplo, está contra-indicado nos casos de
tumor primário de grande tamanho ou múltiplo, no tumor metastático com doença
- 14 -
exclusiva do fígado e em casos de co-morbidades em outros órgãos não
relacionadas à hepatopatia de base, como na doença pulmonar crônica avançada,
na insuficiência cardíaca e na insuficiência renal (3).
Já o transplante renal tem, como contra-indicações consideradas absolutas, a
presença de neoplasias malignas (ou já tratadas com menos de 2 anos de
seguimento), pacientes portadores de doença pulmonar crônica avançada, doença
cardíaca ou vasculopatia periférica graves e pacientes com doença hepática
progressiva (2,4).
Não é incomum, entretanto, pacientes apresentarem ambas as co-
morbidades renal e hepática, pois além de poderem se combinar ao acaso há,
ainda, doenças que comprometem o fígado e o rim concomitantemente. É
exatamente neste espectro que se enquadra o presente caso a ser relatado, no qual
a doença de base é a doença policística autossômica dominante. Para tais
situações, a realização do transplante duplo de fígado e rim aponta como uma
possibilidade terapêutica eficaz, de forma a resolver, num só tempo cirúrgico, ambos
os problemas (3).
Atualmente realizados quase que rotineiramente, as primeiras tentativas de
transplantes de órgãos sólidos começaram nas primeiras décadas do século XX e
passaram por um longo período experimental até se fixarem como técnicas seguras.
O primeiro transplante de um órgão vital não regenerativo foi o transplante de rim
efetuado pela equipe de David M. Hume e Joseph Murray na cidade de Boston, em
1954 (4). Já a primeira tentativa de transplante de fígado em humanos foi realizada
mais de 10 anos após, em 1963, por Thomas Starzl nos Estados Unidos, em
Denver, Colorado (5).
- 15 -
Desde o primeiro transplante combinado, realizado em 1983, muitos centros
têm desenvolvido e estendido esta técnica com bons resultados a longo prazo. Um
estudo realizado no Centre Hospitalier Universitaire (CHU) de Rennes, França, entre
julho de 1991 a outubro de 2006 acompanhou 26 pacientes após a realização do
transplante combinado de fígado e rim. Os resultados demonstraram excelentes
resultados a longo prazo, com morbi-mortalidade aceitável e apenas 1 caso de
perda do rim transplantado 12 anos após (6).
O número de transplantes combinados tem aumentado, mas as indicações
para a cirurgia ainda não estão claramente definidas (6). Diante desse cenário,
estudar o transplante de fígado e rim torna-se relevante para demonstrar a
viabilidade do procedimento, que vem a representar uma nova chance para
pacientes que até pouco tempo estavam excluídos das listas de transplantes.
- 16 -
2 OBJETIVOS
1. Relatar o primeiro caso de transplante duplo de fígado e rim do estado
da Bahia, em junho de 2009, realizado em uma paciente portadora de
doença policística hepática e renal.
2. Revisar a literatura sob os seguintes aspectos:
a. História dos transplantes,
b. Indicações do transplante duplo de fígado e rim e suas
controvérsias,
c. Resultados do procedimento já demonstrados em outros
centros.
- 17 -
3 METODOLOGIA
Foi realizada uma revisão de literatura sobre o tema, tendo como motivação o
relato de um caso acontecido em junho de 2009 no Hospital Português, Salvador,
Bahia e suas particularidades.
Foi feita uma pesquisa ampla em bibliotecas eletrônicas com seleção dos
artigos mais relevantes em torno da história dos transplantes, das indicações do
transplante duplo de fígado e rim e dos resultados já obtidos em outros centros ao
redor do mundo.
Foi obtido um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE – vide
Anexo 1) previamente discutido com a paciente em questão, ao qual se seguiu uma
entrevista minuciosa. Com o TCLE, foi realizado levantamento dos dados do
prontuário no Hospital Português e no Ambulatório Magalhães Neto (C-HUPES) e a
descrição dos mesmos.
Finalmente, foi requerido frente à Gerência Técnica do Hospital Português um
documento de autorização para a divulgação dos resultados (vide Anexos 2)
conforme orientações do CONEP para transplantes realizados por instituições por
este Conselho previamente credenciadas e em situação regular com as suas
exigências.
- 18 -
4 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA
Até o início da década de 50 do século XX, a substituição de um órgão
irreversivelmente lesado em humanos como terapia eficiente era considerada um
sonho. A notícia de um diagnóstico de insuficiência hepática ou renal, por exemplo,
era como uma sentença de morte para quem a recebia(7). Embora pesquisas com
animais e até mesmo tentativas em humanos já houvessem ocorrido
esporadicamente na primeira metade daquele século(8), as iniciativas experimentais
emperravam em duas limitações básicas: a técnica cirúrgica e a rejeição do
enxerto(9).
Os primeiros experimentos em animais demonstraram algum resultado no
início dos anos 1900, com as participações fundamentais de Emmerich Ullman e
Alexis Carrel. Coube a Ullman a primeira cirurgia de transplante de órgão (um rim)
em um modelo canino em 1902(10), mas foram as experiências de Carrel com
enxertos vasculares as mais reveladoras para aquela época. O médico francês
desenvolveu uma nova técnica de suturas vasculares denominada anastomose por
triangulação, utilizada amplamente até os dias atuais (e não apenas em
transplantes) e que lhe rendeu o prêmio Nobel de Medicina em 1912. Também
realizando transplantes renais em cães, ele observou, ainda, que autoenxertos e
aloenxertos tinham tempo de sobrevivência diferentes(8): os aloenxertos só
funcionavam poucos dias e eram perdidos mediante “uma intensa reação local não
supurativa”(10), que não compreendia nem um processo infeccioso, nem um infarto.
Carrel não concebeu o conceito em si, mas tinha acabado de identificar um dos
pontos fundamentais para a evolução dos transplantes: a rejeição ao enxerto.
A compreensão desse processo veio algum tempo depois, atrelada a
experimentos com enxertos de pele. Os primeiros relatos datam de 1932, quando E.
- 19 -
C. Padgett usou enxertos de pele de familiares e de doadores não-relacionados para
tratar pacientes com áreas muito extensas de queimaduras graves. Os enxertos
duraram apenas o suficiente para salvar essas vidas, mas permitiram uma
observação importante: enxertos de parentes duraram mais tempo do que os de
não-relacionados. Isso ficou ainda mais evidente quando, em 1937, J. B. Brown
constatou que enxertos advindos de gêmeos idênticos duravam permanentemente,
mas foram T. Gibson e P. B. Medawar que descreveram o fenômeno como um
processo alérgico ou imunológico e potencialmente manipulável(11).
A partir das contribuições de Carrel e dos experimentos com enxertos de pele,
a história dos transplantes é marcada por um longo período de tentativas frustradas
até o relato do primeiro caso bem sucedido em ser humano. Pertencem ao Dr
Joseph Murray e sua equipe os créditos pelo primeiro transplante de órgão sólido
bem sucedido a longo prazo. Tal cirurgia foi realizada em dezembro de 1954, na
cidade de Boston. Nesta ocasião, um paciente de 24 anos de idade com doença
renal em estágio terminal recebeu um rim de seu irmão gêmeo idêntico. Driblada a
rejeição do enxerto – ainda um dos maiores empecilhos aos transplantes naquela
época – o paciente manteve boa função renal até a sua morte oito anos após o
procedimento por falência cardíaca(12).
Apesar dos resultados animadores demonstrados em Boston, o transplante
inter-vivos com gêmeos idênticos como doadores não era uma alternativa viável
para outros órgãos como fígado e coração, além de não contemplar a maioria dos
casos de pacientes em estágio terminal de doença renal. Ainda eram necessários
estudos considerando doadores não-idênticos para que os transplantes se
tornassem uma esperança concreta no tratamento de pacientes com falência de
órgãos vitais e os estudos em curso até então não apresentavam bons resultados.
- 20 -
Em uma publicação de 1955, David Hume e colaboradores relataram suas
experiências com 9 casos de homotransplantes de rim em pacientes graves com
doença renal em estágio terminal. Dentre as conclusões do seu trabalho, Hume
chegou a afirmar que o homotransplante renal não tinha lugar no tratamento de
pacientes humanos até aquele momento(13). Admitiu, entretanto, que os
experimentos com animais poderiam ajudar a elucidar os problemas com a rejeição
dos aloenxertos, uma vez que seus estudos demonstraram que a rejeição em
humanos ocorria de modo diferente da observada em cachorros, com um tempo de
sobrevivência e funcionalidade do enxerto maior do que o observado em qualquer
outro animal experimental.
Os resultados de Hume não desestimularam a comunidade científica e, em
1959, o que parecia impossível se tornou real: a confirmação de dois transplantes
bem sucedidos realizados com aloenxertos(12). O primeiro deles – entre gêmeos
dizigóticos – também foi executado por Dr Joseph Murray e sua equipe na cidade de
Boston, em 24 de janeiro daquele ano(14). Ele e seus colaboradores transplantaram
o rim de um doador vivo a seu gêmeo não-idêntico – previamente submetido à
irradiação de todo o seu corpo com 450-Rad(12,14) com a intenção de minorar os
efeitos imunológicos associados ao processo de rejeição. Este paciente sobreviveu
por mais de 2 décadas após o transplante e o sucesso da nova terapia
imunossupressora impulsionou cirurgiões em todo o mundo: 4 anos após, já eram 6
os sobreviventes de transplante de rim no mundo submetidos previamente a doses
sub-letais de irradiação(14).
Superadas as barreiras da técnica cirúrgica, a evolução no campo dos
transplantes, a partir de então, atrelou-se ao desenvolvimento de novos métodos de
imunossupressão mais seguros e previsíveis que a irradiação com Raios-X. Com
- 21 -
isso, inaugurou-se um novo momento na história dos transplantes: a era dos
imunossupressores farmacológicos(12). Foi neste contexto que a 6-Mercaptopurina
alcançou um destaque importante. Inicialmente sintetizada para o tratamento de
câncer, testes realizados em coelhos demonstraram que a nova droga era capaz de
induzir tolerância imunológica a antígenos administrados concomitantemente a
ela(14). Isso levou, logo em seguida, à hipótese de a droga ser usada em modelos
experimentais de transplantes.
Os resultados encontrados usando a 6-mercaptopurina em procedimentos
com cães – inicialmente inaugurados por Roy Calne (Londres) e seguidos por Jim
Pierce (Minnesota, USA) e Charles Vukowski (Virginia, USA) – foram
encorajadores(14). Já no verão de 1960, a 6-Mercaptopurina foi usada naquele que
provavelmente foi o primeiro relato de uso bem sucedido de imunossupressão
farmacológica, revertendo o processo de rejeição instalado 2 meses após a cirurgia
de transplante de rim em mulher de 26 anos, em Paris(12). Com o uso da 6-
Mercaptopurina, a melhora nas taxas de sobrevivência de aloenxertos foi rápida e
dramática(14).
Pouco tempo depois, os glicocorticóides foram introduzidos com sucesso por
Willard Goodwin para reverter um caso de rejeição e passaram a ser usados como
droga adjuvante a partir de então(12,14). A azatioprina, um derivado da 6-
mercaptopurina, também começou a ser usada, demonstrou possuir um índice
terapêutico melhor e consolidou-se como medicamento de escolha para
imunossupressão pós-transplante por um longo período(14). O uso dessa mesma
droga permitiu que, em abril de 1962, fosse relatado o primeiro caso bem sucedido
de transplante com aloenxerto de rim cadavérico não-relacionado do mundo(11).
Esse paciente sobreviveu por mais de um ano após a cirurgia e, mais uma vez, o
- 22 -
procedimento havia sido realizado pelo Dr Murray e sua equipe. Mais uma etapa
importante da história dos transplantes parecia ter sido superada.
Em 1965, a taxa de sobrevivência de aloenxertos renais superior a 1 ano era
de 80% e a de rins de cadáver era de 65%(8,11,14). O próximo passo, agora, era
alcançar resultados semelhantes para outros órgãos além do rim. O próximo órgão a
ser transplantado com sucesso foi o fígado. Simultaneamente, perseguindo lógicas
diferentes e totalmente inconscientes dos trabalhos um do outro, Francis Moore (em
Boston) e Thomas Starzl (em Denver) estavam desenvolvendo em um modelo
canino a técnica cirúrgica para transplante ortotópico de fígado(15). Nessa corrida,
Starzl saiu na frente e, em 1º de março de 1963, realizou a primeira cirurgia de
transplante de fígado em um humano – uma menina de 3 anos de idade portadora
de atresia de vias biliares(15,16). A tentativa, entretanto, foi frustrada e a paciente
morreu de uma hemorragia incontrolável(15).
Após novas tentativas frustradas desde 1963, Starlz finalmente conseguiu
realizar o primeiro transplante hepático bem sucedido do mundo (com sobrevida
maior que um ano) em 23 de julho de 1967, em uma menina de 1 anos e meio de
idade e portadora de hepatoma(9). A paciente faleceu 13 meses após a cirurgia
devido a metástases da doença original, mas o cirurgião finalmente conseguiu
provar que o transplante de fígado poderia ser viável. Ao final daquele mesmo ano,
Starzl já divulgava os resultados dos 4 primeiros sobreviventes(16) e, por quase 15
anos, ele e Roy Calne (em Cambridge, Inglaterra) realizaram a maioria dos
transplantes de fígado em humanos do mundo(11).
Pouco tempo depois, os transplantes de coração, pâncreas e pulmão também
se tornaram realidade. Fato que merece destaque devido ao impacto que teve na
- 23 -
mídia daquela época é o primeiro transplante de coração em um humano do mundo,
realizado por C. N. Bernard na África do Sul, ainda em 1967(11).
A história dos transplantes no Brasil tem início em 1965, quando Geraldo de
Campos Freire e Emil Sabbaga realizaram com sucesso o primeiro transplante renal
no país, no Hospital das Clínicas da Faculdade Medicina da Universidade de São
Paulo (HC-FMUSP). O primeiro transplante com doador falecido foi realizado pouco
tempo depois, em 1967, pela equipe de Aureo José Ciconelli, no Hospital das
Clínicas do Hospital da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HC-FMRP)(17).
O primeiro transplante hepático bem sucedido realizado na America Latina
aconteceu no Brasil, no HC-FMUSP, em 1º de setembro de 1985, pela equipe do Dr.
Silvano Raia. Tratava-se de uma mulher de 20 anos, que faleceu 13 meses após o
procedimento devido à recidiva do tumor primário de fígado. Pouco depois, em 1988,
o mesmo grupo foi responsável pelo transplante hepático inter-vivos do mundo
empregando doador relacionado(3).
O primeiro transplante de rim a ser realizado na Bahia (e também um dos
primeiros do Norte/Nordeste do Brasil) aconteceu em 1980, no Hospital Português.
O primeiro transplante hepático, entretanto, só veio a ocorrer neste estado vinte
anos depois, em 2001, também no Hospital Português, pela equipe do Dr. Jorge
Bastos(18). Já o primeiro transplante duplo da Bahia aconteceu em julho de 2009,
também no Hospital Português, quando foram implantados um novo fígado e um
novo rim em uma paciente de 44 anos(19).
Atualmente, com o arsenal de imunossupressores farmacológicos existentes
no mercado e a boa técnica cirúrgica alcançada, o maior problema existente
relacionado ao transplante de órgãos como terapia eficiente associa-se a um
desequilíbrio gritante entre a quantidade de pessoas nas filas de espera e a
- 24 -
disponibilidade de órgãos para doação. Problema, este, que perpassa por questões
sociais, políticas, econômicas e culturais de populações e governos que ainda não
compreenderam a real dimensão que os programas de transplante significam.
- 25 -
5 RELATO DO CASO
A doença renal autossômica dominante é uma desordem sistêmica com
manifestações císticas que comprometem principalmente o rim, mas podem
acometer, também, fígado, pâncreas, vesículas seminais e meninges. Manifestações
não císticas também podem comprometer os tecidos vascular, cardíaco e conjuntivo.
Além disso, existe também uma forma geneticamente distinta de doença hepática
policística dominante autossômica sem envolvimento do rim (20).
Cistos hepáticos são as manifestações extrarrenais mais comuns(20) e
desenvolvem-se em mais de 80% dos casos de pacientes com doença renal
policística autossômica dominante. Os cistos são usualmente maiores em mulheres
do que em homens. Nos EUA, a doença afeta aproximadamente 300.000 a 600.000
indivíduos de ambos os sexos e sem predileção racial. A mutação tem penetrância
completa, com 50% de chance de herança do gene mutante para filhos de um pai
afetado(21).
De acordo com o grau de acometimento, a doença policística pode levar à
insuficiência de ambos os órgãos. Dentro deste contexto, o transplante duplo de
fígado e rim tem despontado mundialmente como alternativa terapêutica para esses
casos. O presente relato refere-se à primeira experiência de transplante duplo de
fígado e rim realizado no estado da Bahia, no ano de 2009, no Hospital Português.
5.1 DADOS DO CASO
Paciente do sexo feminino, 47 anos de idade, parda, natural e procedente de
Curaçá, Bahia. Em 2005, a paciente começou a notar aumento progressivo do
volume abdominal com presença de massa palpável, de consistência endurecida e
indolor em hipocôndrio esquerdo. Após investigação com ultrassonografia de
abdome total, foi diagnosticada com doença policística de fígado e rim. O exame,
- 26 -
realizado em 3 de junho de 2005, identificou: (a) fígado aumentado de volume, com
extensão desde a fossa ilíaca direita até diafragma (elevando este até a região
mamária) e tocando o baço à esquerda; (b) fígado apresentando incontáveis cistos
de vários tamanhos, alterando totalmente a estrutura do órgão e impossibilitando
visualização das veias supra-hepáticas e do sistema porta, bem como das vias
biliares intra-hepáticas; (c) rins com perda da estrutura habitual, aumentados de
volume, estendendo-se até região de fossas ilíacas e com incontáveis cistos de
vários tamanhos.
Após o diagnóstico, a paciente evoluiu com aumento progressivo do volume
abdominal e crescimento de massas de características semelhantes em ambos os
hipocôndrios. Em 2007, notou aumento mais pronunciado do abdome, associado a
grande perda ponderal (maior que 10kg em 3 anos) e dificuldade respiratória. Uma
tomografia computadorizada de abdome realizada em 16 de maio de 2008
identificou, além de rins e fígado policísticos, útero aumentado de volume decorrente
da presença de miomatose uterina.
Foi encaminhada pelo médico de sua região para o Ambulatório Magalhães
Neto – Complexo Hospitalar Universitário Professor Edgar Santos (AMN-CHUPES) e
admitida no setor de hepatologia em 26 de janeiro de 2009. Após avaliação inicial,
foi solicitado internamento hospitalar para melhor investigação da possibilidade de
indicação cirúrgica.
Os exames da admissão no Hospital Universitário Professor Edgar Santos
(HUPES) revelavam pressão arterial de 150x100mmHg, frequência cardíaca de
84bpm, frequência respiratória de 28ipm, massa de 62,9kg. Apresentava-se em
regular estado geral, estado nutricional ruim, descorada (+/4+), hidratada, eupnéica,
anictérica. O exame físico evidenciava abdome indolor à palpação, globoso às
- 27 -
custas de: (a) massa de consistência endurecida, contorno irregular e superfície
nodular em hipocôndrio esquerdo alcançando 16cm abaixo do rebordo costal
esquerdo; (b) massa de características semelhantes ocupando região epigástrica e
hipocôndrio direito, estendendo-se até a pelve; (c) massa pélvica, aparentemente
sem relação de continuidade com as descritas anteriormente, chegando a cerca de
5cm abaixo da cicatriz umbilical. Apresentava, ainda, edema de membros inferiores
até joelhos, com presença do sinal do cacifo. Exames laboratoriais realizados em 28
de janeiro de 2009 demonstravam hemoglobina (Hb) 8,5g/dL; leucócitos 5300/mm3;
plaquetas 254000/mm3; AST 12U/L; ALT 21U/L; fosfatase alcalina (FA) 94U/L;
bilirrubinas totais 0,52mg/dL; Uréia (Ur) 74mg/dL; Creatinina (Cr) 3,1mg/dL.
Em 11 de fevereiro de 2009 foi indicada a histerectomia e cirurgia de
destelhamento hepático, seguido de transplante hepático e renal. A paciente
permaneceu internada no HUPES até que em 2 de março de 2009 foi realizada a
histerectomia abdominal seguida de exérese de cistos hepáticos. A paciente teve
alta no dia 23 de março de 2009, com os seguintes resultados de exames
laboratoriais (realizados no dia 21 de março): Hb 7,3mg/dL; Ht 21,8%; Hemácias
2,8milhões; leucócitos 10100/mm3; plaquetas 354000/mm3; proteínas totais 5,6g/dL
(VR 6,4 a 8,2); albumina 2,5g/dL (VR 3,5-5,5); TP 47%; GGT 337U/L; FA 174U/L; Ur
84U/L; Cr 2,5mg/dL; AST 18U/L; ALT 8U/L; bilirrubinas totais 1,3mg/dL; bilirrubina
direta 0,2mg/dL; bilirrubina indireta 1,1mg/dL. No dia 29 de abril de 2009, entretanto,
houve necessidade de novo internamento no Complexo HUPES para realização de
uma paracentese de alívio, tendo sido drenado 4000mL de líquido ascítico. Nesta
ocasião também foi necessário realizar reposição endovenosa de albumina.
Aproximadamente três meses após entrar na fila do transplante de fígado e
rim, a paciente deu entrada no Hospital Português, sendo admitida com os seguintes
- 28 -
valores de exames laboratoriais: Cr 4,8mg/dL; AST 65U/L; ALT 34U/L; FA 256U/L;
Gama Glutamil Transferase (GGT) 210U/L; Hb 9,1g/dL.
A paciente realizou transplante duplo de fígado e rim no dia 17 de junho de
2009, tendo sido doadora uma mulher de 56 anos de idade, com diagnóstico de
morte encefálica em 11 de junho de 2009 por hemorragia subaracnoidea pós-
cirurgia neurológica por adenoma de hipófise. Imediatamente após o procedimento,
a paciente iniciou esquema de imunossupressão com Micofenolato Mofetil,
Tacrolimo, Hidrocosrtisona. Após o procedimento, foram registrados os seguintes
valores de exames laboratoriais: AST 14U/L; ALT 13U/L; FA 150U/L; Gama Glutamil
Transferase (GGT) 239U/L.
Após 24h do procedimento, evoluiu com instabilidade hemodinâmica
secundária a choque hipovolêmico por hemorragia. Foi submetida a uma
laparotomia exploradora que identificou e corrigiu sítio hemorrágico em veia cava.
No dia 21 de junho, 5º dia pós-operatório, cursou com quadro de insuficiência
respiratória, associado a leucograma com 20000/mm3 e febre, evidenciando quadro
de sepse respiratória. Introduzido esquema de antibiótico de amplo espectro com
Meronem (meropenem), Targocid (teicoplanina) e Zoltec (fluconazol).
No dia 22 de junho, apresentou instabilidade hemodinâmica, associada a
piora súbita e progressiva da função renal e fístula urinária. Foi feita uma
reabordagem cirúrgica para reimplante de ureter e indicada hemodiálise. No dia 25
de junho, apresentou melhora do quadro infeccioso, com leucograma de 11.300/mm3
e ausência de febre. As enzimas hepáticas normalizaram-se, seguidas da
normalização da função renal no dia 11 de julho.
A paciente recebeu alta no dia 14 de agosto de 2009 com os seguintes
resultados de exames laboratoriais: hemoglobina 10,2g/dL; hematócrito 31,8%;
- 29 -
plaquetas 215000/mm3; creatinina 0,9mg/dL; ureia 90mg/dL; AST 65U/L; AST 84U/L;
albumina 2,6g/dL; bilirrubinas totais 0,6mg/dL; bilirrubina conjugada 0,3mg/dL;
bilirrubina não conjugada 0,3mg/dL; GGT 211U/L; FA 259U/L.
Mantém uso atualmente das seguintes medicações: micofenolato sódico
360mg a cada 12h, prednisona 5mg/dia, tacrolimo 3mg/dia, anlodipino 50mg/dia,
losartana 10mg/dia. A boa funcionalidade dos enxertos é evidenciada pelos exames
laboratoriais atuais: hemoglobina 13,6g/dL; hematócrito 40,8%; creatinina 1,1mg/dL;
ALT 16U/L; AST 25U/L; GGT 45U/L; fosfatase alcalina 64U/L; bilirrubinas totais
0,7mg/dL; albumina 3,9g/dL; glicemia 76mg/dL. O sucesso do procedimento é
evidente ao se observar o impacto que o transplante duplo promoveu na melhora da
qualidade de vida da paciente.
Figura 1 - Fígado na paciente
Figura 2 - Fígado visão frontal Figura 3 – Fígado visão dorsal
- 30 -
Figura 4 - Enxerto hepático na paciente
- 31 -
6 DISCUSSÃO
6.1 INDICAÇÕES DO TRANSPLANTE DUPLO DE FÍGADO E RIM
A ocorrência de falência renal no curso de uma doença do fígado pode
decorrer de uma isquemia renal induzida pela hepatopatia – como na Síndrome
Hepatorrenal – e/ou a processos que causam doença em ambos os órgãos – como
infecções pelos vírus B e C da hepatite, a deficiência de alfa-1 antitripsina(22),
doença policística, hiperoxalúria primária tipo I e amiloidose(23).
Antes da década de 80 do século XX, pacientes que apresentavam um
quadro de falência renal associado a uma doença hepática em estágio terminal eram
excluídos da fila de transplante de fígado(24). A partir de 1984, quando Margreiter e
colaboradores realizaram o primeiro transplante concomitante de fígado e rim
(combined liver-kidney transplantation – CLKT) no mundo, a insuficiência renal
deixou de ser considerada uma contraindicação ao transplante hepático(23,24,25).
Sendo assim, o número de transplantes combinados vem aumentando em
todo o mundo. Dados consistentes já demonstram um aumento absoluto e
proporcional dos CLKT comparados aos transplantes isolados de fígado nos
EUA(25). Entretanto, por ser uma proposta terapêutica relativamente recente, o seu
uso em larga escala ainda é limitado e as suas indicações geram polêmicas(23).
Após bem estabelecida a técnica cirúrgica, o transplante concomitante de
fígado e rim deveria ser idealmente o procedimento de escolha para pacientes que
possuem uma doença em estágio terminal de ambos os órgãos. A razão principal
para se propor o transplante duplo em pacientes com cirrose e falência renal reside
no impacto negativo que a insuficiência renal tem em pacientes submetidos a
- 32 -
transplante isolado de fígado(26,27). Resultados de vários estudos mostram que a
insuficiência renal em pacientes com doença crônica do fígado está associada com
alta mortalidade e alta morbidade depois do transplante isolado(27).
Ao mesmo tempo, a ocorrência de insuficiência renal antes e depois de
transplantes ortotópicos de fígado está aumentando tanto em frequência como em
duração. Isso se deve especialmente a: (a) maior sobrevivência de pacientes muito
doentes com insuficiência hepática devido ao aprimoramento das técnicas clínicas;
(b) a espera cada vez maior por um transplante hepático que prolonga a isquemia
renal induzida pela insuficiência hepática; (c) a necessidade contínua de inibidores
da calcineurina pós-transplante hepático(28).
Apesar de todos esses indicadores da importância do transplante duplo como
alternativa promissora para pacientes que até pouco tempo tinham pouca chance de
sobrevivência, a determinação exata das indicações para o transplante simultâneo
de fígado e rim é assunto bastante controverso.
6.1.1 Controvérsias
Algumas questões que permanecem controversas na indicação de um
transplante duplo de fígado e rim – como a dúvida quanto à irreversibilidade da
injúria renal, por exemplo – tem peso importante na tomada de decisão por um
transplante de fígado isolado ou um transplante combinado.
6.1.1.1 Determinação do grau de insuficiência renal e/ou hepática
A inexistência de um ponto de corte baseado em marcadores seguros e
eficazes(27) da função de ambos os órgãos, principalmente do rim, é um dos
pontos-chave dessa discussão. O marcador mais usado, a creatinina sérica, sofre
- 33 -
uma variação importante em pacientes cirróticos. Pacientes com disfunção hepática
tem uma reduzida produção de creatinina secundária à perda de massa muscular.
Consequentemente, a creatinina sérica desses pacientes costuma superestimar sua
função renal(27) e, portanto, deixa de ser um critério rigoroso de avaliação.
Outros métodos que não sofrem influência da massa muscular tem sido
cogitados, como a cistatina C, o clearance de inulina e marcadores radionuclídeos.
Entretanto, a sua aplicabilidade não é viável uma vez que sua alta complexidade
dificulta a mensuração repetida tal como necessitam estes pacientes. Portanto, seu
uso rotineiro não é mandatório(27).
6.1.1.2 Determinação da irreversibilidade da falência renal no contexto do
transplante hepático
O transplante duplo de fígado e rim é bem indicado para pacientes com
estágio terminal de doença do fígado e do rim e que estão em hemodiálise ou
possuem insuficiência renal crônica severa. Este ponto de corte, entretanto, é menos
claro para pacientes com doença renal primária com leve a moderado grau de
disfunção renal e aqueles com causa potencialmente reversível de falência
renal(25). A habilidade de predizer a irreversibilidade ou a probabilidade de
progressão da doença renal não é, portanto, exata, o que também pode tornar
imprecisa a decisão de se realizar o transplante duplo de fígado e rim.
6.1.1.2.1 Síndrome Hepatorrenal
A Síndrome Hepatorrenal refere-se à queda da função renal secundária a
uma doença hepática aguda ou crônica em estágio avançado. Configura-se como
uma das mais frequentes causas potencialmente reversíveis de insuficiência renal
- 34 -
pré-transplante hepático e, portanto, não é indicação rotineira para o transplante
simultâneo de fígado e rim. Com a dificuldade recorrente de disponibilização de
órgãos, o tempo de espera aumentado na fila do transplante hepático tem
determinado um maior tempo de exposição à injúria renal. Consequentemente, vem-
se observando um aumento dos casos de danos renais permanentes dentro desse
contexto(25) e, portanto, da necessidade de indicação do transplante duplo também
para estes casos. O questionamento chave é: qual o momento exato capaz de
determinar que a lesão renal se tornou irreversível?
6.1.1.2.2 Doença Renal Primária
Nos casos de doença renal primária em um paciente com insuficiência
hepática, a indicação do CLKT não é automática e vai depender do grau de
severidade da doença no momento. Para pacientes com aceitável nível de função
renal no momento da cirurgia, o transplante isolado de fígado tem um bom desfecho.
Entretanto, quando é esperado que a doença renal primária provoque uma
insuficiência renal precoce após o transplante isolado de fígado, o transplante
combinado está indicado uma na medida em que a sobrevida a longo prazo pode
ser afetada negativamente(25). O transplante combinado deve ser a escolha para
aqueles pacientes que apresentam taxa de filtração glomerular menos que
30mL/min, ou nas doenças conhecidamente de progressão rápida, ou nos quais a
biópsia revele mais de 35-40% de glomeruloesclerose ou mais de 30% de fibrose
tubulointersticial(25).
- 35 -
6.1.1.2.3 Doença Policística
Por ser uma condição que frequentemente acomete ambos os órgãos, a
doença policística é uma das mais comuns indicações de transplante combinado de
fígado e rim. Cerca de 45% a 55% dos pacientes com doença renal autossômica
policística do adulto tem doença policística do fígado, enquanto que 93% daqueles
que tem doença policística do fígado tem a doença renal policística(25). O
transplante isolado de fígado e mais frequentemente o transplante isolado de rim
também são comumente indicados. Entretanto, especialmente no contexto do
transplante isolado de fígado, é comum os pacientes necessitarem de um
transplante de rim subsequente devido à progressão da doença.
Além disso, a bem definida associação entre a doença renal policística
recessiva e a Doença de Caroli (condição que determina fibrose hepática congênita)
também tem se configurado como uma indicação específica para o transplante
combinado de fígado e rim(25).
6.1.1.2.4 Toxicidade por inibidores da calcineurina
Os inibidores da calcineurina – tacrolimo e ciclosporina – são medicamentos
frequentemente usados para promover a imunossupressão no pós-transplante
hepático. Entretanto, a nefrotoxicidade associada a esses medicamentos é a causa
predominante insuficiência renal crônica no acompanhamento pós-transplante
isolado de fígado.
6.1.1.2.5 Hiperoxalúria Primária Tipo I
A hiperoxalúria primária tipo 1 é uma rara doença genética associada à
defeciência da alanina-glicosilato aminotransferase (AGT) que leva a uma produção
- 36 -
e excreção urinária aumentada de oxalato. Essa condição causa urolitíase
recorrente, nefrocalcinose e acúmulo de oxalato insolúvel no corpo (oxalose
sistêmica)(25). Na maioria dos casos, os sinais de lesão em órgãos vitais devido ao
depósito de cristais de oxalato é muito precoce. A insuficiência renal apresenta-se
por volta dos 15 anos de idade em metade dos pacientes.
Para estes casos, o transplante isolado de rim tem um resultado pobre devido
à recorrência universal da doença de base sobre o enxerto. Em contrapartida, o
transplante combinado de fígado e rim tem bons resultados(25), uma vez que
consegue evitar a recorrência da doença no enxerto renal por corrigir a causa base
da desordem metabólica de origem hepática. Entretanto, os resultados positivos do
CLKT na hiperoxalúria primária tipo 1 é mais evidente quando realizado em crianças
muito pequenas(25) pois consegue evitar lesões decorrentes do depósito de oxalato
em outros órgãos e tecidos como ossos e medula.
6.1.1.3 O impacto do escore MELD na realização de transplantes
combinados de fígado e rim
Ao longo do tempo, estudos que observavam a mortalidade na fila de espera
do transplante hepático apontavam as disfunções renais como uma das principais
causas. A partir dessa constatação, o escore MELD (Model for End-Stage Liver
Disease) foi desenvolvido como um sistema de pontuações que considera os valores
de creatinina sérica, bilirrubina e RNI para determinar a severidade da doença
hepática.
Em fevereiro de 2002, o MELD foi introduzido como critério de alocação dos
pacientes na fila de espera para órgãos de doador cadáver com o objetivo de
priorizar os casos mais graves(29), com maior chance de morte, e assegurar a
- 37 -
melhor utilização dos fígados disponíveis. Desde então, a priorização de pacientes
com comprometimento renal tem proporcionado um impacto importante no número
de transplantes simultâneos de fígado e rim quando comparados ao transplante
isolado de fígado.
O número de transplantes combinados de fígado e rim aumentou
dramaticamente(26,29). O número de CLKT esteve próximo de triplicar desde a
implementação do sistema MELD de 134 em 2001 para 399 em 2006(29).
Entretanto, o que se tem observado é que, em alguns casos, pacientes com função
hepática ou função renal ainda não tão prejudicada podem ser privilegiados.
Devido à conveniência de se realizar os dois procedimentos em um mesmo
tempo cirúrgico, pacientes submetidos ao transplante concomitante de fígado e rim
podem receber um fígado precocemente em detrimento de pacientes com doença
hepática mais grave que seriam submetidos apenas ao transplante isolado de
fígado(26). Ao mesmo passo, também é possível um paciente com doença renal não
tão grave passar na frente de uma fila de espera muito longa para um transplante de
rim no contexto de um transplante duplo(30).
Schmmit e colaboradores demonstraram que, apesar do uso do MELD
priorizar pacientes com disfunção renal, estes pacientes continuam a ter resultados
inferiores. No entanto, já é bem determinado a necessidade de hemodiálise pós-
transplante diminui a sobrevivência do enxerto de fígado e do paciente(29). Em seu
estudo realizado com dados da UNOS (United Network for Organ Sharing), os
resultados obtidos sugerem que somente pacientes em diálise se beneficiariam de
um CLKT. Todos os outros pacientes em estágio terminal de doença renal deveriam
receber um transplante isolado de fígado(29).
- 38 -
6.1.2 Avaliação das indicações do CLKT para pacientes cirróticos com
comprometimento renal
Já foi demonstrando que insuficiência renal em pacientes cirróticos está
associada a um prognóstico pobre. Quando encaminhados a transplante isolado de
fígado, apresentam menor taxa de sobrevivência do enxerto e do próprio paciente.
Além disso, existem evidências que demonstram que pacientes que cursam com
disfunção renal (definida por uma creatinina sérica maior que 1,5mg/dL) por 12
semanas ou mais no período pré-transplante isolado de fígado tem uma maior
chance de evoluírem para hemodiálise 3 anos após a cirurgia(27).
Sendo assim, em condições ideais, pacientes com possibilidade de
desenvolver uma falência renal após um transplante isolado de fígado deveriam ser
encaminhados para o transplante concomitante de fígado e rim(27). Entretanto,
diante da dificuldade de se estabelecer um critério exato que identifique os pacientes
de alto risco, o transplante combinado ainda não tem indicações bem estabelecidas
e o seu uso permanece limitado.
Um fator que poderia auxiliar na distinção entre os pacientes com
comprometimento renal que devem ser encaminhados a um transplante duplo ou ao
transplante isolado é a biópsia renal. Uma vez que a causa da disfunção renal
parece influenciar entre aqueles que irão necessitar de uma terapia substitutiva do
rim e aqueles que não necessitarão, a biópsia poderia ser um critério importante no
estabelecimento das indicações do CLKT(27).
Atualmente, a avaliação da função renal de pacientes cirróticos
encaminhados a transplante deve incluir uma história médica completa e exame
físico, pesquisa de diabetes e/ou hipertensão, bem como alguma outra evidência de
- 39 -
dano no órgão. Os exames laboratoriais devem incluir análise da urina para
pesquisa de sinais de nefropatia intrínseca, como hematúria, piúria, células e urina
de 24h para avaliar excreção de proteínas. Uma ultrassonografia renal também deve
ser requisitada, pois pode ser útil na avaliação de doença renal preexistente –
achados como alteração da ecogenicidade renal e diminuição de tamanho dos rins
indicam a existência de doença renal crônica. Finalmente, o diagnóstico final pode
necessitar de uma biópsia renal, que, como já explicitado, também forneceria
informações a respeito do prognóstico. De acordo com um recente consenso, a
biópsia deve ser executada em pacientes com taxa de filtração glomerular menor do
que 30mL/min com um curso crônico(27).
Atualmente, as indicações consensuais de CLKT em pacientes com doença
hepática terminal de acordo com o Consensus Conference on Simultaneous Liver
Kidney Transplantation são(31):
1. Evidência de doença crônica do rim e biópsia renal demonstrando mais de
30% de glomeruloesclerose ou 30% de fibrose intersticial;
2. Na impossibilidade da biópsia, a decisão é feita baseada no critério do
National Kidney Foundation para doença crônica do rim: TFG menor do que
30mL/min por mais de 3 meses;
3. Pacientes com estágio terminal de doença renal em terapia de substituição
renal;
4. Pacientes com síndrome hepatorrenal ou injúria aguda com creatinina maior
ou igual a 2,0mg/dL e em diálise por mais de 8 semanas.
- 40 -
6.1.3 Avaliação das indicações do CLKT para pacientes em estágio terminal de
doença renal e comprometimento hepático:
Os benefícios de um transplante combinado de fígado e rim não são bem
estabelecidos para pacientes com doença renal terminal e cirrose compensada. É
recomendado que pacientes com doença crônica do fígado e doença renal em
estágio terminal que são candidatos a transplante de rim sejam investigados quanto
à presença de fibrose hepática importante e cirrose. A investigação envolve biópsia
hepática e a avaliação do gradiente de pressão venosa hepático (GPVH). Pacientes
com cirrose e/ou hipertensão portal importante (definida por um GPVH maior que
10mmHg) devem ser referenciados ao transplante combinado de fígado e rim. A
opção de transplante isolado de rim deve ser oferecida àqueles pacientes sem essas
características(27).
O diagrama abaixo faz um resumo da conduta mais adequada para indicação
do CLKT em pacientes com doença renal terminal e doença hepática crônica(31).
Figura 5: Algoritmo de indicação CLKT/transplante isolado de rim no contexto de doença renal
- 41 -
6.2 RESULTADOS DO PÓS-TRANSPLANTE DUPLO DE FÍGADO E RIM
O uso mais adequado do transplante duplo de fígado e rim deveria ser no
tratamento de indivíduos que apresentem, simultaneamente, cirrose hepática e
doença renal terminal. Entretanto, o que se observa é que a maior parte das séries
publicadas sobre pacientes tratados com transplante duplo referem-se a casos de
doenças metabólicas como hiperoxalúria e doença policística(32). Por conta disso, o
uso do CLKT na cirrose permanece pouco compreendido.
Devido às altas taxas de mortalidade e de complicações infecciosas sérias, o
transplante concomitante de fígado e rim muitas vezes era desencorajado no
tratamento de pacientes com doenças terminais de ambos os órgãos(33), mesmo
nos casos em que ele poderia representar a única solução.
Os resultados a curto prazo do CLKT até pouco tempo atrás apresentavam-se
piores quando comparados aos resultados do transplante isolado de fígado. A taxa
de mortalidade pós-transplante geralmente é mais alta e especialmente associada a
sepse e falência de múltiplos órgãos, enquanto a taxa de sobrevida do enxerto e do
receptor geralmente são mais baixas no CLKT em relação ao transplante isolado de
fígado(23). Esses resultados parecem ser influenciados pelas piores condições
gerais dos pacientes, com mais comorbidades associadas. Entretanto, os resultados
a longo prazo do CLKT parecem não diferir daqueles do transplante isolado de
fígado(23). Além disso, estudos mais recentes tem apontado resultados mais
animadores quanto ao sucesso da terapia.
Em um estudo publicado em 2001, Ammor e colaboradores(33), ao relatarem
experiências desenvolvidas na França entre 1986 e 1998, constataram que a
- 42 -
sobrevida após o procedimento era satisfatória e representa 85% em 1 ano e 82%
em 5 anos. Estes desfechos excelentes devem-se particularmente a uma precisa
avaliação e seleção dos pacientes.
Baccaro e colaboradores(32) em um estudo retrospectivo publicado em 2010
revistou prontuários do Hospital Clinic, Barcelona, de pacientes submetidos a CLKT
entre 1994 e 2004. Os resultados desse estudo apontaram que o CLKT pode ser
executado em pacientes com cirrose associada a doença crônica do rim com uma
aceitável taxa de complicações pós-operatórias e relativamente alta sobrevivência.
Este dado se torna ainda mais relevante quando levamos em consideração que
estes pacientes já apresentavam duas comorbidades graves anteriormente e que
eles foram submetidos a dois transplantes de órgãos sólidos, procedimentos de alta
complexidade.
Em uma das publicações mais recentes a respeito do assunto, Chava e
colaboradores realizaram uma revisão retrospectiva de todos os pacientes
submetidos a um transplante combinado fígado-rim do King’s College Hospital, em
Londres, entre março de 1992 e janeiro de 2007. Os resultados dessa pesquisa
apontaram uma sobrevivência global de 71,8% dos pacientes acompanhados ao
longo de 37 meses. As taxas de sobrevida de 1 ano, 5 anos e 10 anos foram,
respectivamente, 77%, 73,7% e 73,7% e, portanto, representam valores não muito
distantes daqueles conhecidos para o transplante isolado de fígado(34).
Em comparação ao transplante isolado de rim, os resultados dos
transplantes combinados de fígado e rim são menos favoráveis. Dados da UNOS
revelam que a mortalidade entre pacientes submetidos a CLKT é mais alta quando
- 43 -
comparada a pacientes submetidos a transplante isolado de rim nos primeiros 3 a 12
meses após a cirurgia. A maior causa de mortalidade nesse período é a sepse(34).
Outro aspecto importante a se destacar é a menor taxa de rejeição do enxerto
renal nos transplantes combinados de fígado e rim(34,35). Muitos estudos já
publicados revelam uma maior sobrevivência do enxerto renal em pacientes duplo
transplantados comparados a receptores de fígado isolado. Além disso, a incidência
de rejeição aguda também é reconhecidamente mais baixa(35).
Estudos realizados com animais já demonstraram que a menor rejeição
aguda ao enxerto renal observada nos transplantes duplos de fígado e rim está
associada à tolerância imunológica promovida pelo enxerto de fígado(23). Esses
dados tem sugerido uma certa proteção conferida pelo enxerto hepático sobre o
enxerto renal no CLKT(35), permitindo uma menor carga de imunossupressão após
a cirurgia(23). De maneira prática, isso pode ser bem explicitado pela constatação
de que um fígado recentemente transplantado é capaz de transformar uma prova
cruzada (cross-match) positiva em negativa em curto espaço de tempo como 2h(35).
Existem basicamente duas hipóteses sugeridas que podem explicar a
tolerância imunológica ao enxerto renal pós-CLKT. Um dos mecanismos
imunológicos cogitados possivelmente envolve a adsorção e remoção de anticorpos
alorreativos pré-formados pelas células de Kuppfer, ou sua neutralização por
antígenos HLA classe I solúveis expressos pelo enxerto de fígado(8,23). A outra
hipótese envolve um mecanismo de secreção pelo fígado de citocinas imuno-
modulatórias e a liberação de leucócitos do doador, células-tronco ou células
dendríticas imaturas, com o desenvolvimento subsequente de microquimerismo
hematopoiético e hipo-responsividade doador-específico(8,23).
- 44 -
7 CONCLUSÃO
Devido à existência de diversas doenças que podem desencadear alterações
funcionais importantes em ambos os órgãos simultanemente, o transplante duplo de
fígado e rim aponta como uma alternativa interessante por possibilitar devolver um
pouco de qualidade de vida a pacientes que, via de regra, estão em estados mais
graves.
A introdução do sistema MELD na classificação e alocação de pacientes por
gravidade na fila de espera por um fígado teve fundamental importância quanto à
disseminação da técnica do transplante concomitante como estratégia terapêutica
viável. Apesar dos resultados desvantajosos quando comparados aos transplantes
isolados de fígado e/ou rim, as taxas de sobrevivência do paciente e do enxerto no
período pós-transplante está muito mais associada ao tipo de paciente que
geralmente se submete a esse transplante: pacientes mais graves, que precisarão
de mais tempo em unidade de terapia intensiva (UTI) no pós-transplante e que,
naturalmente, já estão mais predispostos a adquirir alguma infecção importante ou
até sepse.
Apesar disso, os resultados mais recentes tem sido mais animadores e tem
mostrado que vale a pena arriscar num transplante concomitante e resolver, num só
tempo cirúrgico, duas comorbidades com importante impacto na qualidade de vida
de um paciente com tantos problemas clínicos. É importante ressaltar, entretanto,
que a indicação de um transplante combinado deve ser muito criteriosa, baseada em
dados concretos e objetivos da história do paciente e nos indicadores sugeridos pela
literatura, de tal modo que pacientes mais graves e/ou há mais tempo de espera na
fila não sejam beneficiados frente apenas a uma conveniência que não lhe
- 45 -
acarretaria prejuízo maior caso se prosseguisse um transplante isolado de fígado ou
rim sequencialmente ao primeiro.
Vale ressaltar que a política de transplantes no mundo ainda passa por um
problema-chave que é a disponibilidade de órgãos para doação. O número de
pacientes que necessitam de um transplante aumentou muito. Entretanto, o número
de doadores não tem aumentado. Como o transplante combinado envolve a
disponibilização de dois órgãos para uma mesma pessoa, estar atento a essa
questão é importantíssimo no momento de avaliar as indicações desse
procedimento.
- 46 -
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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- 50 -
ANEXO 1
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu, (nome completo da paciente), RG (número do documento da paciente),
após explicadção dada pela Drª Margarida Maria Dantas Dutra, RG-2104901
SSP/BA e CRM-3604, autorizo Karen Caires Borges, RG-09630490-11SSP/BA,
acadêmica da graduação em Medicina da Universidade Federal da Bahia (FMB-
UFBA), a consultar e utilizar os dados do meu pronturário visando a realização do
Trabalho de Conclusão de Curso “Transplante Duplo de Fígado e Rim: Relato de
Caso e Revisão de Literatura”.
Salvador – Bahia, 05 de abril de 2011.
_______________________________________________ (assinatura da paciente)
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Anexo 2