Post on 13-Nov-2018
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBACENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA NATUREZA
PROGRAMA DE PÓS
TURISMO DE SEGUNDAS RESIDÊNCIAS: A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL E PAISAGÍSTICA DAS PRAIAS DE JACUMÃ, CARAPIBUS E TABATINGA
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA NATUREZA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA (MESTRADO)
ILANA BARRETO KIYOTANI
JOÃO PESSOA – PB MAIO DE 2011
TURISMO DE SEGUNDAS RESIDÊNCIAS: A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL E PAISAGÍSTICA DAS PRAIAS DE JACUMÃ, CARAPIBUS E TABATINGA
CONDE/PB
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA NATUREZA
GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA (MESTRADO)
TURISMO DE SEGUNDAS RESIDÊNCIAS: A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL E PAISAGÍSTICA DAS PRAIAS DE JACUMÃ, CARAPIBUS E TABATINGA –
ILANA BARRETO KIYOTANI
TURISMO DE SEGUNDAS RESIDÊNCIAS: A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL E PAISAGÍSTICA DAS PRAIAS DE JACUMÃ, CARAPIBUS E TABATINGA –
CONDE/PB
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Geografia – PPGG, Universidade Federal da Paraíba, em cumprimento às exigências para obtenção do grau de Mestre em Geografia.
Orientador: Profº Dr. Eduardo Rodrigues Viana de Lima (PPGG-UFPB).
João Pessoa, Maio de 2011.
IV
Aos meus pais, Ednalva e Léo Kiyotani, por todo esforço, amor, compreensão e dedicação, razões de ser de minha vida. Imensa é a gratidão e o amor. Aos meus avós Masuji e Tsumoro Kiyotani e Everaldo Barreto (in memorian), por fazerem parte do que hoje sou.
V
Agradecimentos
Sobretudo agradecer a Deus, pelo presente de ter pessoas queridas ao meu redor, pela
saúde, pelas condições e oportunidades de vida que tive e tenho até hoje.
Gostaria de agradecer primeiramente ao orientador Profº Eduardo Rodrigues Viana de
Lima, pela atenção que teve por mim desde 2006, em minha primeira tentativa de entrar no
Programa de Mestrado da Geografia, depois em 2008 quando finalmente consegui ingressar
nesse curso. Obrigada por tudo, pela paciência, pela generosidade de sempre me escutar e
tentar entender como eu queria o trabalho; pela humildade com que nos trata. Nesta reta final,
de produção dos mapas e finalização da dissertação, não sei o que seria de mim sem a
presença do senhor. Grata demais por essa feliz parceria nestes dois anos!!!
A todos os professores do PPGG- UFPB com quem tive o prazer de aprender um
pouco mais: Profº Raimundo Barroso, Profº Max Furrier, Profº Sérgio Alonso. Em especial
gostaria de agradecer a Profª Doralice Sátyro Maia por, sendo minha primeira professora
dentro do PPGG, me dar à certeza de que estava no caminho certo e por ter sido atenciosa e
solícita para comigo em todas as ocasiões, a boa lembrança permanecerá sempre.
Ao Profº Roberto Sassi, tanto por aceitar participar desta banca e assim contribuir para
a melhoria deste trabalho, quanto por toda a atenção e humildade com que sempre nos tratou.
Aos professores visitantes Eliseu Sposito (Unesp – Presidente Prudente/SP) e
Francisco dos Anjos (Univale – Itajaí/SC), pelas aulas de tanto valor à minha formação e que
certamente engrandeceram meu trabalho.
À Profª Fátima Rodrigues que, mesmo não tendo sido minha professora durante o
curso, sempre demonstrou atenção e cuidado para com minha pesquisa e mais que isso,
carinho para comigo. Obrigada! Saiba que me sinto feliz e honrada em ter sua amizade.
À Profª Vanice Selva pela aceitação em participar da formação de banca de
qualificação e defesa. E pelas contribuições de grande valor trazidas ao trabalho.
Aos amigos conquistados neste período, em especial Marquilene Santos, Jean Carlos
Lima, Altemar Bustorff, Saulo Vital, Gilvonete Freitas, Shauane Itainhara e Péricles Batista
(parceiro de artigo). E claro, não podia deixar de reservar um lugar especial para meu
QUERIDOO amigo Henrique Elias Pessoa Gutierres, sem palavras para agradecer todo apoio
e contribuições nesses anos: os textos indicados, os livros emprestados, a companhia em
algumas idas ao campo, as fotografias tiradas e as cedidas, as discussões... E mais que tudo,
obrigada pela grata amizade.
VI
A turma como um todo, sem exceções, meu muito obrigada!!! Nossa turma certamente
foi perfeita para mim, não me imagino dentro do PPGG sem ser parte dessa turma.
A Flávio (ex-presidente da AMATA) e Carlos Santiago (atual presidente da AMATA),
pela atenção e cooperação na obtenção de informações sobre Tabatinga, seja nas conversas
formais ou informais, pela disposição em ajudar e pela receptividade com que sempre me
receberam.
A José Fernades e ao pessoal do INTERPA, pela prestatividade com que me
atenderam na obtenção das fotografias de 1985.
A Leide e Sr Everaldo (CDRM - Campina Grande), também pela grande ajuda na
obtenção das fotografias de 1969.
Aos senhores Saulo Barreto, Eduardo Cassol, Ismael Araujo, pelas entrevistas
concedidas. À Karmen Porto, Juliana Vinagre, Neuma, Niely Monteiro e Kiara pela atenção e
ajuda. Às agentes de saúde do município do Conde, mais especificamente àquelas lotadas nos
Postos de Saúde de Jacumã e Carapibus, que são responsáveis pelo atendimento residencial
das três praias estudadas e me ajudaram no reconhecimento das segundas residências. Em
especial à Lilian Ferreira pela imensurável ajuda cedendo seu material e seu banco de dados
sempre que necessários, sem palavras para agradecer.
Aos meus pais, Ednalva e Léo Kiyotani, pela força e apoio sempre, impossível medir
minha gratidão por tudo que me ofereceram e me oferecem até hoje, seja material, imaterial,
emocionalmente. Impossível também existir amor maior.
Aos meus avós, Masuji e Tsumoro Kiyotani, pelo amor e pelas condições de vida que
também me proporcionaram durante estes anos.
Às minhas irmãs Sara, Lysandra, Yohanna, Carol Costa, pela presença em minha vida,
pela força e apoio sempre, pelo amor dedicado! Amo vocês demais.
A Belchior Celso, amigo de tantos anos, tão importante nestes anos de mestrado e na
minha vida, sempre me apoiando. Amo.
A Félix Brito e Filipe Lucena, pela amizade, amor e apoio em todos os momentos da
minha vida desde 2002. Félix mesmo de longe, bem longe, sempre se fazendo presente e
sendo uma segurança para mim. Amo vocês.
A Giovanni Franca pela revisão gramatical e pela amizade. Obrigada!
Obrigada a todos que contribuíram de alguma forma nesses dois anos e para a
concretização desse trabalho.
VII
Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma de nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo
da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre, à margem de nós mesmos.
Fernando Pessoa
Com exceção das grandes alterações provocadas pelas eras glaciais, as grandes alterações ambientais recentes têm como fator preponderante as intervenções humanas.
Antonio Carlos Diegues
VIII
RESUMO O trabalho aqui exposto parte da categoria geográfica paisagem e do conceito de meio ambiente para traçar uma análise de como esses têm sido constantemente alterados pela atividade turística, mais especificamente pelo turismo de segundas residências. Sabendo que o turismo é hoje uma das maiores fontes de renda no mundo e que promove uma corrida a seu favor por parte dos governos brasileiros das três instancias, procurou-se demonstrar o quanto esta atividade também traz impactos negativos para as áreas onde se desenvolve. Muitas são as pesquisas que norteiam esta percepção, de um turismo que vem ao longo dos anos alterando a paisagem e o meio ambiente. Até que ponto esta atividade é mesmo sustentável como trazem os discursos políticos? Como o poder público tem planejado e se comprometido com a gestão do turismo, bem como com as localidades receptoras? Essas análises foram aqui realizadas a partir de conceitos e teorias como: desenvolvimento sustentável, planejamento espacial e urbano, gestão pública, planejamento da paisagem e do turismo. Empiricamente foi realizada pesquisa em área do litoral sul paraibano, no que constam as praias de Jacumã, Carapibus e Tabatinga. A escolha deu-se por tais praias representarem importante destino turístico e ser alvo de constante especulação imobiliária para segundas residências desde a década de 1980. A pesquisa para reconhecer e comprovar os impactos utilizou-se de entrevistas ao setor público municipal e a proprietários de segundas residências, visitas in loco e análises de fotografia aéreas e imagem de satélite que demonstrassem o crescimento urbano, a ocupação pelas segundas residências e as áreas irregulares loteadas e/ou edificadas. Pôde-se realmente comprovar vários impactos negativos decorrentes das segundas residências e da negligencia do poder público, são áreas de preservação ambiental sendo ocupadas e problemas de ordenamento urbano que acabam por comprometer a paisagem e o próprio meio ambiente. Palavras-chave: paisagem; meio ambiente; planejamento; gestão; turismo de segundas residências.
IX
ABSTRACT Using as starting point the geographical category of landscape and the concept of natural environment, this research sought to analyze changes on landscape and environment triggered by the tourism industry, especially by “second-residence tourism”. Given that tourism is one of the world's strongest industries and that in Brazil it is supported by municipal, state, and national governments, this research aimed addressing the negative impacts this industry may also have in the areas where it is developed. Many studies have approached the idea that tourism changes landscapes and natural environments; they have questioned the sustainability factor frequently proclaimed in political speeches, and how governments have planned and engaged with the management of this industry. Many concepts were observed in this analysis, such as: sustainable development, spatial and urban planning, public management, and landscape and tourism planning. An empirical research was conducted in the southern coastline of the state of Paraiba, more specifically at the beaches of Jacumã, Carapibus and Tabatinga – in the city of Conde. Those areas were sampled as they have been regarded as important touristic areas as well as targets for real estate speculation since the early 1980s. In order to verify and assess the impacts, this research carried out interviews with members of the local public administration as well as owners of second residences (vacation house), in loco visits, and the analysis of aerial photographs and satellite images showing the irregular urban growth throughout the years. The results revealed to the negative impacts stemming from second residences and negligence by public administrators: irregular development in conservation areas and urban planning issues, which have ultimately jeopardized the landscape as well as the natural environment. Key-words: landscape; environment; spatial and tourism planning, public management; second resident tourism.
X
LISTA DE SIGLAS AMATA – Associação de Moradores e Amigos de Tabatinga
APA – Área de Preservação Ambiental
CAGEPA – Companhia de Água e Esgotos da Paraíba
CDRM – Companhia de Desenvolvimento de Recursos Minerais da Paraíba
CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente
EIA – Estudo de Impacto Ambiental
ENERGISA – Empresa de Energia Elétrica da Paraíba
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
IDEME - Instituto de Desenvolvimento Municipal e Estadual
INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
INTERPA – Instituto de Terras e Planejamento Agrícola da Paraíba
PNGC – Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro
PNMA – Plano Nacional de Meio Ambiente
RIMA – Relatório de Impacto Ambiental
SEPLAN/Conde – Secretaria de Planejamento do Município do Conde
SETUR – Secretaria de Turismo
SINAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente
SUDEMA – Superintendência de Administração do Meio Ambiente/PB
LISTA DE FIGURAS Figura 1: Zoneamento por uso do solo..................................................................... 53
Figura 2: Zoneamento por densidade....................................................................... 53
Figura 3: Zoneamento de prioridades....................................................................... 53
Figura 4: Mapa de localização da área...................................................................... 64
XI
LISTA DE FOTOGRAFIAS Foto 1: Vista geral do relevo praia de Jacumã.................................................. 66
Foto 2: Vista geral do relevo praia de Carapibus.............................................. 66
Foto 3: Vista geral do relevo praia de Tabatinga............................................. 67
Foto 4: Laguna costeira de Jacumã no período de carnaval.............................. 68
Foto 5: Vista geral da praia de Tabatinga com destaque à: Coqueiral (1), vegetação pioneira indicadora de estabilidade costeira (2)..............................
69
Foto 6: Vegetação arbustiva na área de praia em Tabatinga............................ 69
Foto 7: Vegetação de maior porte com destaque à mangabeira (Harconia
speciosa), na região de Tabatinga.....................................................................
69 Foto 8: Vegetação de manguezal em Tabatinga.................................................. 70
Foto 9: Vegetação de manguezal em Carapibus................................................. 70
Foto 10: Exemplo de mata de restinga na praia de Tabatinga............................. 71
Foto 11: Esgoto a céu aberto em Jacumã............................................................ 83
Foto 12: Água correndo junto ao lixo na PB-008, principal Avenida em Jacumã...............................................................................................................
83
Foto 13: Falta de calçamento de rua – Jacumã................................................... 83
Foto 14: Falta de calçamento nos arredores da quadra esportiva de Jacumã – principal equipamento de lazer público..............................................................
83
Foto 15: Lixo acumulado na Avenida principal de Jacumã................................ 85
Foto 16: Lixo acumulado nas ruas – Jacumã...................................................... 85
Foto 17: Lixo acumulado nos terrenos baldios – Jacumã ................................... 86
Foto 18: Lixo acumulado na laguna costeira – Jacumã ..................................... 86
Foto 19: Irregularidades na laguna costeira, divisa Jacumã-Carapibus............... 86
Foto 20: Acúmulo de lixo na principal entrada para Carapibus.......................... 90
Foto 21: Acúmulo de lixo na rua paralela à praia – Carapibus........................... 90
Foto 22: Acúmulo de lixo nas ruas de Carapibus............................................... 90
Foto 23: Acúmulo de lixo na laguna costeira – Carapibus.................................. 90
Foto 24: Construções sobre a borda da falésia caracterizando irregularidade ambiental – Carapibus........................................................................................
90
Foto 25: Visão geral da voçoroca – Tabatinga ................................................... 93
Foto 26: Adentrando a área da voçoroca – Tabatinga ....................................... 94
Foto 27: Voçoroca vista da praia, percebendo-se que já está próxima de uma das segundas residências – Tabatinga ............................................................
94
XII
Foto 28: Placa educativa I – Tabatinga............................................................... 94
Foto 29: Placa educativa II – Tabatinga............................................................. 94
Foto 30: Voluntários para o plantio de coqueiros................................................ 95
Foto 31: Faixa convidativa aos moradores de Tabatinga para participar do evento..................................................................................................................
95
Foto 32: Coleta de lixo – Tabatinga.................................................................... 96
Foto 33: Tambores de lixo colocados pela AMATA nas ruas de Tabatinga....... 96
Foto 34: Bar construído na praça pública – Tabatinga....................................... 98
Foto 35: Bar que privatiza praça pública em Tabatinga..................................... 98
Foto 36: Construções irregulares: em borda de falésia (1) e em terreno de marinha (2) – Tabatinga .....................................................................................
98
Foto 37: Casas construídas irregularmente em área de preservação permanente (faixa de proteção de manguezal) – Tabatinga ...................................................
99
Foto 38: Bares frente mar – Jacumã .................................................................. 107
Foto 39: Bares antigos ao redor da quadra – Jacumã......................................... 107
XIII
LISTA DE GRÁFICOS, QUADROS E TABELAS Gráfico 1: Infraestrutura deficitária em Jacumã em 2010..................................... 82
Gráfico 2: Infraestrutura deficitária em Carapibus em 2010................................. 88
Quadro 1: Comparativo das infraestruturas reclamadas pelos proprietários de segundas residências nas três praias.......................................................................
99
Quadro 2: Modificações ambientais e paisagísticas percebidas pelos segundos-residentes das três paias – comparativo.............................................................
100
Quadro 3: Cruzamento de dados da área urbana entre os anos de 1985 e 2008...... 114
Tabela 1: Quantificação de lotes edificados dispostos sobre áreas de proteção ambiental..................................................................................................................
120
LISTA DE MAPAS Mapa 1: Sobreposição das Áreas Urbanas 1985 x 2008....................................... 116
Mapa 2: Área Urbana 2008 e Segundas Residências............................................ 118
Mapa 3: Segundas Residências x Área de Preservação Ambiental........................ 123
XIV
SUMÁRIO
Dedicatória. IV
Agradecimentos V
Epígrafe VII
Resumo VIII
Abstract IX
Lista de Siglas X
Lista de Figura X
Lista de Fotografias XI
Lista de Gráficos, Quadros e Tabelas XIII
Lista de Mapas XIII
Sumário XIV
1. INTRODUÇÃO 16
1.1 Objetivo Geral 19
1.2 Objetivos Específicos 19
2 REFERENCIAL TEÓRICO 20
2.1 Paisagem e Meio Ambiente: o que muda com o turismo 20
2.1.1 Normas legais: estabelecendo formas de uso da terra, protegendo a paisagem e o meio ambiente 29
2.1.2 A Transformação do litoral brasileiro: a ocupação pelas segundas residências 37
2.2 Planejamento e Gestão: premissas para alcançar o equilíbrio 43
2.2.1 Planejando a Paisagem 51
2.2.2 Planejando o Turismo 56
3 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA 62
3.1 Aspectos históricos e geográficos 62
3.1.1 Aspectos históricos 62
3.1.2 Aspectos geográficos 64
4 MÉTODO E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 73
4.1 Método 73
XV
4.2 Procedimentos Metodológicos 75
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES 80
5.1 Entrevistas 80
5.1.1 Percepções dos proprietários de segundas residências: infraestrutura, impactos paisagísticos e ambientais 80
5.1.2 Dados técnicos e percepções dos gestores públicos quanto ao planejamento e gestão: ordenamento urbano, paisagem e meio ambiente 103
5.2 Mapa de uso e ocupação: expansão urbana linear e impactos ambientais 113
6 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES 124 6.1 Conclusões 124 6.2 Recomendações 128
7 REFERÊNCIAS 130 8 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 136
APÊNDICE 137
1 Roteiro de entrevistas 138
1.1 Entrevistas aos proprietários de segundas residências 138
1.2 Entrevistas à administração pública 138
1.2.1 Entrevista ao Secretário de Turismo 138
1.2.2 Entrevistas ao responsável pela Unidade Administrativa de Jacumã 139
1.2.3 Entrevista à Secretaria de Planejamento 139
2 Programa LEGAL (Spring): processado para efetuar a Tabulação Cruzada de dados gerando assim o mapa de Sobreposição Urbana entre os anos de 1985 e 2008 140
ANEXO 141
1. Carta à Comunidade e aos Amigos de Tabatinga 142
16
1. INTRODUÇÃO
Visto pelo lado dos países em desenvolvimento, a oportunidade turística é menos freqüentemente ocultada nas estratégias de desenvolvimento, sobretudo porque ela representa, geralmente, uma alternativa decisiva, um último recurso ante as desilusões encontradas pelos outros setores econômicos. (CAZES, 1999, p.80)
Ao longo dos anos o turismo vem conquistando no Brasil um status de atividade
econômica extremamente viável, aquela que além de impulsionar a economia, traz o
desenvolvimento local e é sustentável. Até que ponto estas verdades reinaram nos estudos
brasileiros e ainda estão presentes no discurso político e no senso comum?
No começo a academia pareceu acreditar nesse fenômeno turístico, a maioria dos
estudos viria para agregar valor a esta atividade. Mas é notável que em meados dos anos 90
muitos trabalhos começaram a questionar as benesses do turismo. Contraditoriamente é
também neste período que a atividade turística é mais valorizada pelas políticas de governo,
talvez até por terem como embasamento as pesquisas que só apontavam as conseqüências
positivas do turismo, talvez por preferirem crescer economicamente sem pensar a longo prazo
e sem considerar as conseqüências negativas.
É bem verdade que anterior as políticas nacionais - que viriam para “oficializar” o
turismo como uma das principais atividades econômicas brasileiras - a atividade cresceu sem
nenhum parâmetro legal específico a seguir, nenhuma diretriz havia sido traçada para o
desenvolvimento do turismo. A partir das Políticas Nacionais do Turismo, como o Plano
Nacional do Turismo surgido no governo Fernando Henrique Cardoso (1994-2002),
acompanhado do Programa Nacional de Municipalização do Turismo e, posteriormente, do
Programa de Regionalização do Turismo – Roteiros do Brasil no governo Luiz Inácio Lula da
Silva (2002-2010), as diretrizes e metas começaram a serem traçadas nos três níveis da
Federação.
Com o surgimento dessas políticas de turismo a atividade ao menos começou a ser
mais discutida dentro dos órgãos públicos. Abriu-se espaço para, na tentativa de implementá-
la com sucesso, o setor público buscar ajuda de profissionais da área, o que, por fim,
proporcionou questionamentos sobre como planejá-la.
Aos poucos se acorda para a realidade sobre o turismo. Por muitos anos e para muitos,
o turismo seguiu representando a atividade primordial da sustentabilidade: lucrativa, não
17
poluente, que proporciona igualdade social, desenvolvimento local, etc. Mas sustentabilidade
não começa no, ou com o turismo, ela é fruto de um espaço cotidiano equilibrado, no qual a
atividade turística pode até contribuir para o alcance da mesma, mas não é o todo (YÁZIGI,
2003).
Assim, diante desse errôneo pressuposto de atividade ideal, o turismo foi tomando
conta muito mais do território brasileiro do que da economia.
Tendo o espaço como principal objeto de consumo, o turismo é uma prática social fortemente territorializada e igualmente territorializante já que introduz nos lugares sua lógica de organização espacial, não raras vezes solapando lógicas pré-existentes (...). Se por um lado, entretanto, os benefícios econômicos do turismo são uma prioridade para os governos, como, por outro lado, alcançá-los, negligenciando-se o território? (SANSOLO e CRUZ, 2003, p. 5)
Coloca-se na balança degradação versus crescimento econômico: até onde se pode
afirmar que o turismo traz progresso? Se for verificado, por exemplo, o extenso litoral
brasileiro, quantas serão as paisagens que não se degradaram; qual a qualidade ambiental
apresentada nesses atrativos turísticos que se “desenvolveram”?
De um lado os investidores buscam o retorno do capital no menor tempo possível,
usando o maior poder de atração dos espaços naturais, por outro lado, as autoridades locais
temem tomar decisões que limitem as iniciativas turísticas. A conjugação destes dois fatores,
somada ao despreparo das atitudes dos turistas, acabam sendo extremamente prejudiciais ao
meio ambiente (AULICINO, 1997, p.34).
Por que, mesmo sendo um dos principais meios de alavancar a economia do país, os
destinos turísticos foram e ainda são tão negligenciados? A proposta dessa pesquisa é mostrar
como o turismo de segundas residências se desenvolveu e vem se desenvolvendo no litoral
brasileiro, mas especificamente no litoral sul paraibano; como essa atividade foi chegando e
consumindo o espaço sem a menor preocupação, modificando e degradando o meio ambiente
e as paisagens locais.
A área de estudo engloba as praias de Jacumã, Carapibus e Tabatinga, todas
pertencentes ao município do Conde, litoral sul do estado da Paraíba. As três praias são
seqüenciais, sendo Jacumã o portal de entrada para as demais; seguida de Carapibus e
Tabatinga. O acesso às praias dá-se, majoritariamente, pela rodovia litorânea estadual PB-008
e as mesmas distam cerca de 23 quilômetros da capital paraibana.
18
As praias possuem grande beleza cênica, dispondo de falésias, manguezais, águas
claras, tornando-se potencialmente turísticas. A praia de Jacumã tem exploração pelo turismo
já acentuada, visto que a mesma vem sendo alvo dessa atividade desde a década de 1970,
principalmente pelo turismo de segundas residências.
Neste processo de ocupação turística de Jacumã, muito se perdeu de sua paisagem
original. A falta de planejamento territorial, ambiental e turístico, causou a essa localidade
degradação ambiental e paisagística. Assim como Jacumã, as praias de Carapibus e Tabatinga
vêm sofrendo um processo similar, e, provavelmente, conseqüente daquele, de ocupação e
exploração turística mal planejada.
Devido ao desgaste da praia de Jacumã percebeu-se que, tendencialmente, a atividade
turística foi “caminhando” em direção às praias vizinhas ao sul, buscando uma paisagem
ainda preservada. Como conseqüência dessa expansão turística para o sul, verifica-se que a
degradação ambiental e paisagística constatada em Jacumã já começa a ser percebida também
nas outras duas praias, principalmente na de Carapibus.
A praia de Carapibus já possui um grande número de pousadas, segundas residências e
loteamentos que, em sua maioria, não atendem às condições ambientais de esgotamento
sanitário e coleta de lixo, bem como é precária a estrutura urbana de ruas e iluminação. As
possíveis conseqüências ambientais, e até mesmo para o turismo, são preocupantes, visto que
pode-se chegar a um nível insustentável de impacto ambiental, ocorrendo inclusive o desgaste
progressivo da atividade, fato que desestabilizaria drasticamente a economia local.
Dentre as três praias, a que menos sofreu impactos negativos até agora foi Tabatinga.
Mas Tabatinga já apresenta parte de seu território construído e/ou loteado, aguardando as
futuras instalações que, possivelmente, darão continuidade aos problemas de poluição,
segregação social, dependência econômica e falta de infra-estrutura, vistos em Jacumã e
Carapibus.
Tais evidências levam ao seguinte questionamento: até que ponto a atividade turística
na região trouxe e traz benefícios, e quais as perspectivas futuras dessas áreas totalmente
desprovidas de planejamento?
Procurando responder essa pergunta, esse trabalho demonstra como, até o presente
momento, o turismo de segundas residências afetou a área, quais suas implicações positivas e
negativas, e, a partir destas constatações, o que esperar do futuro das praias.
Aqui foram identificados os problemas de degradação ambiental e paisagística das
praias citadas, bem como mapeados os impactos negativos descritos ao longo do estudo. Para
isso a pesquisa utilizou-se de aplicação de entrevistas aos proprietários de segundas
19
residências e a gestores públicos, visitas in loco, análise de fotografias aéreas e imagem de
satélite.
Outra preocupação foi possibilitar um melhor entendimento sobre a atividade turística,
desmistificando sua “perfeição” e propondo seu exercício de uma forma menos degradante e
mais consciente. Espera-se que com esta pesquisa a comunidade local, o poder público e a
iniciativa privada possam repensar suas estratégias em vista de melhorar o ambiente, tanto em
seu contexto natural quanto social. Conseqüentemente espera-se também que as discussões e
análises propostas ao final da pesquisa possam embasar decisões acerca do futuro da atividade
nas praias estudadas.
Justifica-se o interesse pela temática por representar parcela importante na economia
do Estado, bem como por representar significante preocupação ambiental para aqueles que
estudam o meio ambiente e os impactos do turismo. Por sua vez, justifica-se a escolha das
praias por serem o principal fluxo turístico de segundas residências no litoral paraibano, sendo
alvo de especulação imobiliária massiva e conseqüente degradação paisagística e ambiental.
1.1 Objetivo geral
Analisar a evolução ocupacional da área, buscando identificar, no tempo e no espaço,
as principais transformações ambientais e paisagísticas advindas da atividade turística de
segundas residências nas praias de Jacumã, Carapibus e Tabatinga, litoral sul do estado da
Paraíba.
1.2 Objetivos específicos
� Caracterizar a região estudada e apresentar um diagnóstico de sua situação,
enfatizando os efeitos do turismo na mesma;
� Identificar os impactos ambientais e paisagísticos reflexos da atividade turística de
segundas residências;
� Gerar mapas que possibilitem a visualização dos impactos negativos causados pelo
turismo na área.
� Mapear as segundas residências.
20
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Paisagem e meio ambiente: o que muda com o turismo
Em nosso século emergiu uma nova modalidade de deslocamento através do planeta: o turismo. Fruto da sociedade industrial e das conquistas sociais, o período anual de descanso pelos que a ele tem acesso, vem sendo aproveitado, cada vez mais, para realização de viagens, alimentando dessa forma, os fluxos de pessoas que se deslocam a pequenas, médias e longas distâncias. (Conti, 2002, p.21).
Esse deslocamento mencionado por Conti (2002) e, consequentemente, a apropriação
do espaço pelas atividades, é o que faz do turismo uma atividade extremamente vinculada à
geografia. É no espaço geográfico que o turismo vai desenvolver-se e configurar-se; é este
espaço também que será, por sua vez, alterado, consumido e modificado pelo turismo. Conti
(2002, p. 17) explica: a geografia, como ciência do espaço terrestre, é uma reflexão sobre a
natureza ocupada pelo homem, ou seja, o meio transformado para abrigá-lo e permitir-lhe a
sobrevivência em sociedade.
Dentro do espaço geográfico, categoria geográfica bastante abrangente, estuda-se aqui
dois conceitos a ele atrelados, os de paisagem e meio ambiente, que estão extremamente
vinculados a ocupação e modificação do espaço pelo turismo e suas conseqüências. Antes de
adentrar nos conceitos específicos propostos, faz-se uma breve conceituação da categoria
espaço para fazer uma ponte com a categoria paisagem e para distingui-las, pois é importante
aqui não as confundir.
Segundo Milton Santos (2008, p.63), “o espaço é formado por um conjunto
indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações,
não considerados isoladamente, mas como um quadro único no qual a história se dá”. O
sistema de objetos é composto por todas as construções físicas do Homem, por todos os
elementos artificiais, ou seja: prédios, ruas, casas, pontes, automóveis, celulares, mobílias,
hidroelétricas, navios, etc. Os objetos estão presentes e são utilizados na vida cotidiana dos
homens. Já o sistema de ações é o composto das ações que dão vida a sociedade, são as
relações humanas propriamente estabelecidas, sejam essas de trabalho, particulares,
acadêmicas, etc.
21
Pela conceituação posta, é fácil resumir que a leitura de espaço é justamente aquela do
palco onde se dá a vida. É o chão que se pisa, os objetos utilizados e as relações que se
constroem. E qual a diferença entre espaço e paisagem?
Mesmo antes de apresentar o conceito de paisagem, é possível pontuar as principais
diferenças entre os dois conceitos. A primeira e grande diferença está no tempo, tempo
cronológico mesmo. Enquanto o espaço exprime o presente, a paisagem é passado e presente
num só; a paisagem é a expressão do tempo concretizada nos objetos artificiais, é uma
fotografia (SANTOS, 1997). “A paisagem se dá como um conjunto de objetos reais-
concretos. Nesse sentido a paisagem é transtemporal, juntando objetos passados e presentes,
uma construção transversal. O espaço é sempre um presente, uma construção horizontal, uma
situação única” (SANTOS, 2008, p.103). A paisagem “congela” o tempo, faz com que a
história de ontem esteja presente no hoje.
A segunda diferença está na presença de relações sociais. Sendo a paisagem a
distribuição de formas e objetos, ela não incorpora essas relações. Apesar de ser uma
fotografia da sociedade, os homens presentes nessa fotografia também estão “congelados”; a
paisagem não revela a relação, mas apenas o homem como mais um objeto que está presente
naquele dado espaço-tempo. Já o espaço “resulta da intrusão da sociedade [todas as relações e
interações dos homens] nas formas-objetos (...). A paisagem é, pois, um sistema material e,
nessa condição, relativamente imutável: o espaço é um sistema de valores, que se transforma
permanentemente.” (SANTOS, 2008, p.104)
Tendo já a percepção do que seja espaço a partir da ótica geográfica e de sua
diferenciação com a paisagem, a partir deste ponto foca-se no debate e aprofundamento dos
conceitos de paisagem e de meio ambiente, já podendo distingui-los do de espaço.
Paisagem talvez seja a categoria geográfica mais discutida desde o reconhecimento da
geografia como ciência, aquela que muitos autores inclusive pontuam como o ponto inicial da
ciência geográfica1. Entretanto, apesar de tão debatido, este conceito é bastante abstrato, no
sentido de muitas serem suas definições e não existir aquela única e consensual. Bertrand
(2004, p.141) diria que este conceito é “impreciso e, por isso mesmo, cômodo, que cada um
utiliza a seu bel prazer, na maior parte das vezes anexando um qualitativo de restrição que
altera seu sentido”.
No inicio a leitura de paisagem adotada pelos geógrafos era mais voltada para a
descrição da fisionomia do local: morfologia, hidrografia, vegetação, etc., sendo somente
1 Autores como: Salgueiro (2001); Humboldt (apud SALGUEIRO, 2001); Domingues (2003).
22
observados os componentes físicos que a paisagem abrigava. Com o tempo, agregou-se ao
estudo um olhar menos racional, onde a paisagem revela não só formas físicas como também
formas marcadas pela produção sócio-cultural.
Os estudos da paisagem, inicialmente muito focados na descrição das formas físicas da superfície terrestre, foram progressivamente incorporando os dados da transformação humana do ambiente no tempo, com a individualização das paisagens culturais face às paisagens naturais, sem nunca perder de vista as interligações mútuas. (SALGUEIRO, 2001, p. 41).
Atualmente, o conceito de paisagem, já bastante discutido por muitos autores,
congrega os dois aspectos, o antrópico e o físico, e suas constantes interações. Alguns
qualificativos o acompanham, como: físico, biológico e antrópico; dinâmica; interação; etc.
O geógrafo francês Georges Bertrand é um dos autores mais citados quando o assunto
é paisagem; é nele também que se encontrou o conceito mais simples, e ao mesmo tempo
completo, para nortear este trabalho. Em 1968, Bertrand concebeu paisagem como “uma
determinada porção do espaço, o resultado da combinação dinâmica, portanto instável, de
elementos físicos, biológicos e antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros,
fazem da paisagem um conjunto único e indissociável, em perpétua evolução” 2.
Seguindo a mesma linha de raciocínio, a partir da leitura da obra de Christofoletti,
Guerra e Marçal dizem que “a paisagem constitui-se no campo de investigação da Geografia,
onde se permite que o espaço seja compreendido como um sistema ambiental, físico e
socioeconômico, com estruturação, funcionamento e dinâmica dos elementos físicos,
biogeográficos, sociais e econômicos” (GUERRA & MARÇAL, 2006, p.97).
Agregando o importante fator tempo, Lombardo e Casella (2002, p.92) baseados em
Rodrigues (1993), definem paisagem como “um sistema territorial composto por diferentes
componentes formados a partir da influência dos processos naturais e da atividade
modificadora da sociedade humana, que se encontram em permanente interação e que se
desenvolvem historicamente”. O mesmo fator cronológico aparece nos estudos do autor Bolós
revisados por Guerra e Marçal que afirmam: a paisagem, em sua abordagem sistêmica e
complexa, será sempre dinâmica e compreendida como o somatório das inter-relações entre os
2 BERTRAND, G. Paisagem e Geografia Física Global: esboço metodológico. Tradução: Olga Cruz. Trabalho
publicado, originalmente, na “Revue Geógraphique des Pyrénées et du Sud-Ouest”, Toulouse, v. 39 n. 3, p. 249-272, 1968, sob título: Paysage et geographie physique globale. Esquisse méthodologique. Publicado no Brasil no Caderno de Ciências da Terra. Instituto de Geografia da Universidade de São Paulo, n. 13, 1972. Republicado na Revista RA´E GA – O espaço geográfico em análise. Curitiba, n. 8, p. 141-152, 2004. Editora UFPR
23
elementos físicos e biológicos que formam a natureza e as intervenções da sociedade no
tempo e no espaço, em constante transformação. (GUERRA & MARÇAL, 2006, p.97-98)
Percebe-se que o processo histórico é incorporado aos conceitos de paisagem. Ele
guarda consigo importantes sinais de como aquela paisagem foi se desenvolvendo: as marcas
dos homens, dos processos naturais; as mudanças culturais, tecnológicas, climáticas,
geológicas, oceânicas; etc3. A paisagem é, enfim, o retrato de certa porção do espaço que
abrange todos os elementos contidos neste, direta ou indiretamente, em um dado momento.
Não se trata de algo estático, por isso, cada hora do dia, cada dia, cada estação climática,
proporcionará uma nova paisagem aos observadores.
No estudo da paisagem os observadores são bastante citados, afinal sem esses o
próprio conceito não existiria, pois não haveria quem o descrevesse. Por isso, fala-se de como
a paisagem vai mudar de acordo com a incidência de luz no local, com a posição física do
observador e de acordo com o seu envolvimento emocional com aquela paisagem observada.
A semiótica e a simbologia estão presentes em muitos conceitos de paisagem; a semiótica
como ciência que estuda a ligação entre os signos – os significados que a paisagem remete ao
observador; e a simbologia que busca entender os laços afetivos que unem paisagem e
observador.
Uma vez que a paisagem é entendida com algo que emite significado e gera
sentimento, vários autores descrevem o processo de sua percepção. Collot (1990, p.25) pontua
que “a ação de ver não se limita a registrar o fluxo de dados sensoriais; ela organiza e
interpreta, de maneira a fazer dele uma mensagem”. Nessa organização e interpretação do que
se presencia perante uma paisagem o observador recolhe para si uma mensagem única, repleta
de subjetivismo4, onde a experiência de vida trazida com o observador faz parte da construção
dessa percepção.
A partir desta significância da paisagem para o homem, aborda-se aqui outra
perspectiva para o conceito, a concepção holística da paisagem. Essa visão holística diz
respeito a prezar mais pelo todo para que com isso se possa conhecer realmente as partes.
Significa que o coletivo se sobrepõe ao individual, pois os processos sofridos nas paisagens
hoje pertencem a um mundo globalizado onde tudo está entrelaçado, transcende a um
movimento pontual, local. (NAVEH, 2000)
3 Estas “marcas” que estão contidas nas paisagens foram por Milton Santos nomeadas rugosidades. 4 Marenzi (2003) em seu artigo intitulado “Percepção da Paisagem” faz uma leitura de vários autores que falam sobre percepção da paisagem e subjetivismo.
24
É importante dizer que o todo não é melhor que a parte, que o global não deve ser
mais valorizado que o local, mas que é necessário existir um equilíbrio, pois no mundo
contemporâneo vive-se muito de especificações, delimitando assim o campo perceptivo e
analítico das pessoas. Também é necessário entender que uma ação local pode transformar-se
em uma conseqüência global e que uma ação global certamente trará conseqüências locais.
Entender o todo por sua vez indica entender o processo, por isso a visão holística da
paisagem tem ligação com a Teoria Sistêmica de Bertalanffy. Neste processo de construção e
percepção da paisagem deve ser levado em consideração a cultura e costumes locais e globais,
os processos naturais e sociais locais e globais, as relações financeiras locais e globais, pois
todos esses fatores se influenciam mutuamente, tanto formando a paisagem como interferindo
na percepção de seu observador.
Outro ponto discutido na concepção holística é o vínculo emocional do observador
com a paisagem5, como outrora mencionado, a paisagem sob essa visão passa a ser sentida.
No processo de sentir a paisagem entra em jogo múltiplas variáveis, como a experiência do
observador, seja a acumulada durante toda sua vida, seja a experiência vivida com
determinada paisagem; o estado de espírito em que se encontra o observador naquele
momento do contato com a paisagem; a relação emocional que o observado tem com a
paisagem (positiva ou negativa), etc. (COLLOT, 1990)
No que tange a avaliação da qualidade da paisagem, Macedo (2002) diz que para
atingi-la a paisagem precisa estar em equilíbrio ambiental, funcional e estético. A qualidade
ambiental preocupa-se com as possibilidades e condições de vida e sobrevida de todos os
seres vivos e comunidades que ocupem o ambiente.
A qualidade funcional é medida pelo grau de eficiência do lugar, ou seja, no tocante ao
bom funcionamento da sociedade que dele desfruta – economia, educação, transporte,
comunicação. O que é revelado durante a pesquisa nas três praias é que funcionalmente elas
também não apresentam equilíbrio.
Já a qualidade estética representa e deve estar congruente com os valores sociais de
cada comunidade. É importante perceber o vínculo que existe entre os valores sociais e a
estética do lugar, é díspar a qualidade estética entre Jacumã e Tabatinga, por exemplo, assim
5 Autores como Antônio Carlos Diegues e Y-Fu Tuan também estudam esse vínculo afetivo (emocional, sentimental) entre observador e paisagem. Tuan inclusive desenvolveu um conceito para isso, a Topofilia. Para maiores esclarecimentos buscar: TUAN, Yi-Fu. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio. Rio de Janeiro: BERTRAND BRASIL, 1980.
25
como o é o posicionamento dos seus freqüentadores6. No geral, percebe-se no litoral brasileiro
que essa condição de qualidade paisagística ainda é pouco vislumbrada.
Pires (1993, p.3250) engloba em sua pesquisa sobre qualidade paisagística o conceito
de fragilidade (ou vulnerabilidade) da paisagem, que equivale ao “grau de susceptibilidade à
deterioração mediante a incidência de determinadas atuações”. Quanto mais frágil a paisagem,
mais vulnerável estará à descaracterização por meio de qualquer ação na área.
Retira-se desse conceito também que quanto mais atrativa e visível a paisagem for,
maior será seu grau de fragilidade, afinal estará propensa a atrair mais atividades/visitantes
para si. Por exemplo, as dunas representam uma paisagem bastante bela e frágil, posto que
com a intervenção maciça do homem elas podem migrar para outro local, provocando o
soterramento de casas e ruas e o assoreamento de rios e lagos, como está acontecendo na
Lagoa do Abaeté, cartão postal da cidade de Salvador- BA7.
Tendo o ambiente litorâneo nordestino como área de estudo, é fato que sua paisagem é
bastante atrativa e procurada para o descanso e lazer. O fluxo turístico no nordeste é intenso
nos meses de verão e a busca pelo litoral corresponde à maior parte desses turistas, incluindo
nesse número aqueles que vêm e hospedam-se em segundas residências. É no verão que essas
paisagens litorâneas estarão mais suscetíveis à degradação, justamente pelo alto grau de “uso”
e ocupação de seus ambientes.
Controlar esse uso é o grande desafio, fazer com que as pessoas tenham consciência de
seus atos, em prol de não degradar a paisagem/ambiente, é uma dificuldade enfrentada no
Brasil. Nestes casos de intenso fluxo a paisagens e ambientes frágeis a melhor solução e de
resultados imediatos é um monitoramento por parte de órgãos públicos, onde a utilização dos
recursos possa ser controlada visando preservá-los.
Essas menções qualitativas fornecem instrumentos para se produzir um projeto
intervencionista que proporcione um resultado final de acordo com as características e
necessidades do lugar. O estudo de qualidade e fragilidade é importante para possibilitar a
prescrição de restrições e proteção de uma área e, conseqüentemente, de níveis de uso e
ocupação. Assim as paisagens se formariam dentro do equilíbrio outrora mencionado. O
6 A partir das entrevistas aos proprietários de segundas residências foi possível analisar como é diferente o discurso entre moradores de Jacumã e Tabatinga, ficando claro que a visão do morador de Jacumã quanto à preservação ambiental é praticamente oposta ao de Tabatinga. Já na praia de Carapibus é interessante perceber que o pensamento é justamente um meio termo entre os demais discursos nas outras duas praias. 7A informação presente neste exemplo pode ser conferida no endereço eletrônico: http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL1396244-10406,00-DUNAS+AMEACAM+CASAS+E+LAGOA+DO+ABAETE+EM+SALVADOR.html
26
planejamento da paisagem, assim como o territorial, são os meios pelo qual atingir a
qualidade paisagística e de moradia almejadas.
No que diz respeito ao meio ambiente, o segundo conceito proposto como base para
essa pesquisa, o primeiro desafio é conceituá-lo, visto que são inúmeras as definições para o
termo, desde as mais limitantes àquelas bem amplas. Na história do conceito de ambiente é
importante não confundi-lo com o conceito de natureza ou de ecologia, nem tão pouco de
ecossistema.
Leff (2001) explica que, enquanto o conceito de natureza está vinculado às formas de
apropriação da mesma e o conceito de ecologia dirige-se a compreensão de várias ciências
interligadas, o meio ambiente não é somente o conceito que reflete a relação sociedade-
natureza, é sim um conceito que reflete a complexidade de inter-relações entre o ontológico e
o epistemológico. “O conceito de ambiente é uma construção social; é um movimento no
pensamento que encontra suas raízes nos significados do real, nos potenciais da natureza e nos
sentidos da cultura” (LEFF, 2001, p.396).
Apesar de muitos equivalerem-no a meio ambiente, o conceito de ecossistema
relaciona-se com o habitat, da mesma forma que a parte se relaciona com o todo (COIMBRA,
1985). Segundo Barbieri (2007, p.6), “organismos da mesma espécie vivendo em conjunto
formam as populações e as populações de várias espécies vivendo numa mesma área
constituem uma comunidade biológica. Os organismos e os elementos físicos e químicos do
meio em que vivem formam um ecossistema”. Um ecossistema é um conjunto de partes em
interação constante que compreende todos os seres vivos, incluído o Homem, e os elementos
abióticos ou do meio físico, como água, ar, solo, luz, temperatura, etc.
Todos os organismos (e ecossistemas) se influenciam mutuamente, ou seja, quando
alterado o estado de equilíbrio de um, outros organismos também vão cambiar-se. Enquanto
os ecossistemas são partes, o meio ambiente é o “conjunto amplo de realidades físicas em que
os indivíduos e as comunidades estão imersos. O ambiente rodeia de forma permanente e
cambiante os seres vivos” (COIMBRA, 1985, p.21).
Pela etimologia do termo tem-se que a palavra ambiente vem do latim, seu prefixo
ambi significa “ao redor de” e o verbo ambire significa “andar em volta ou entorno de alguma
coisa”. Já a palavra meio também traz em si o sentido de “estar rodeado”, estar no meio
remete estar envolto. Sendo assim o termo meio ambiente é, definitivamente, redundante
(COIMBRA, 1985; BARBIERI, 2007). O meio ambiente é então a grande realidade na qual
todos os seres estão envoltos (COIMBRA, 1985, p.25).
27
Entende-se por meio ambiente o somatório entre o ambiente natural e o artificial, o
primeiro é o ambiente físico e biológico originais, não manipulados pelo homem, e o segundo
é o resultado de alterações humanas (como áreas urbanas, industriais e rurais). Percebe-se que
meio ambiente agrega as condições de existência dos seres, então ele não é apenas o espaço
onde estes seres vivem e sim a própria condição para a existência de vida na Terra.
(BARBIERI, 2007, p. 5)
Meio Ambiente é o conjunto dos elementos físico-químicos, elementos naturais e sociais em que se insere o Homem, individual e socialmente, num processo de interação que atenda ao desenvolvimento das atividades humanas, à preservação dos recursos naturais e das características essenciais do entorno, dentro de padrões de qualidades definidos. (COIMBRA, 1985, p.29)
A definição de Coimbra (1985) juntamente a de Barbiere (2007), acima descritas,
nortearam este trabalho no tangente ao meio ambiente. Toma-se aqui essa condição de
existência dos seres, bem como das possibilidades de relação entre estes e entre estes e seu
meio, para debater até que ponto o homem modifica a sua própria condição de vida.
A compreensão que se tinha da relação homem-natureza até meados do século XX,
apropriadas principalmente do sistema de produção capitalista, considerava homem e natureza
como pólos excludentes, onde a natureza como objeto era fonte ilimitada de recursos à
disposição do homem. Nas décadas de 1960 e 1970 essa percepção começa a mudar, constata-
se que os recursos naturais são esgotáveis e que sua utilização indiscriminada se revelaria
insustentável (BERNARDES e FERREIRA, 2003). A partir da década de 1970 começa a ficar
claro que a falência da natureza culminaria na falência da própria sociedade, seja por
incapacidade de produção econômica ou, mais que isso, por alimentos, água e ar, tornarem-se
insuficientes à sobrevivência humana.
A concepção de um ser humano separado dos outros elementos da natureza talvez tenha sido o fato de maior relevância para o aumento dos problemas ambientais. A crença de que a natureza existe para servir ao ser humano contribuiu para o estado de degradação ambiental que hoje se observa. Mas certamente foi o aumento da escala de produção e consumo que iria provocar os problemas ambientais que hoje conhecemos. (BERBIERI, 2007, p.7)
28
É sob essa preocupação, de uma natureza finita, que inúmeros debates, encontros e
contribuições científicas começam a reproduzir-se pelo mundo. A grande questão era (e
permanece sendo): como conciliar crescimento populacional, produção econômica e recursos
naturais? É nessa fase também que o conceito de meio ambiente passa a reforçar sua
perspectiva social e cultural, dando atenção proporcional à natureza, a sociedade e a cultura.
Em 1972, é realizada a primeira reunião ambiental global, a Conferência das Nações
Unidas para o Meio Ambiente Humano, mais conhecida como Conferência de Estocolmo –
em referência à cidade de sua realização. Tal encontro contou com 113 países debatendo em
conjunto, as relações entre sociedade e meio ambiente.
A partir desta conferência, sucessivos encontros foram acontecendo para debater
questões ambientais: Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento, mais conhecida como ECO-92 (156 países participantes); Cúpula Mundial
sobre Desenvolvimento Sustentável, mais conhecida como Conferência de Johanesburgo ou
Rio+10 (191 países participantes); Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças
Climáticas, mais conhecida como Conferência de Copenhagen, último encontro realizado em
2009 para debates sobre o meio ambiente e as mudanças climáticas no qual 192 países
participaram.
Como visto, duas das conferências têm no nome o termo desenvolvimento, e as três
(além de outras) trouxeram para debate o desenvolvimento sustentável – concepção que será
abordada posteriormente. Hoje os conceitos de meio ambiente e de desenvolvimento
sustentável caminham juntos, pois estão demasiadamente ligados, posto que a
sustentabilidade venha justamente para prezar a integridade mínima do ambiente que a
humanidade dispõe para viver e se relacionar.
A sustentabilidade traz uma concepção de conservar os recursos naturais existentes. A
conservação refere-se a uma utilização regrada dos recursos de que se dispõe hoje, de forma
que lhes permita regenerar-se naturalmente. Orientações de uso visando não degradá-los ou
dizimá-los devem ser seguidas, devem ser traçadas pela gestão pública e passadas à sociedade
de forma esclarecedora e educativa. A população também é responsável pela conservação do
meio ambiente, podendo exercê-la de forma individual (cada um fazendo a sua parte) ou
coletiva, realizando projetos e campanhas com esse fim.
Para fins práticos é cabível uma breve distinção entre conservação e preservação
ambiental. Enquanto conservar é fazer uso de maneira sustentável, sem desperdícios,
preservar é reservar uma determinada área com a qual o homem não deverá interagir,
deixando-a intocável (DIEGUES, 2004). Essa é uma definição teórica, porém no Brasil as
29
Áreas de Preservação Ambiental permitem a entrada de pesquisadores, e em algumas têm até
partes abertas ao público, respeitando, claro, regras de visitação.
Sendo o meio ambiente o espaço de vida da sociedade é fundamental que esse seja
conservado e/ou preservado. Como o turismo vem sendo um dos principais modificadores do
meio ambiente e das paisagens é importante dar visibilidade as tais alterações, para que todos
possam atuar em prol de conservar e preservar o meio e conscientizar-se de sua importância.
Jacumã, Carapibus e Tabatinga são apenas três exemplos da modificação e degradação do
meio ambiente e paisagem pelo turismo, mas é importante chamar atenção de cada localidade
impactada negativamente para que a população e o poder público possam se posicionar
quanto aos efeitos destas modificações, com a busca por soluções que diminuam ou cessem os
impactos.
2.1.1 Normas legais: estabelecendo formas de uso da terra, protegendo a paisagem
e o meio ambiente
A década de 1980 foi muito importante para a proteção do meio ambiente no Brasil, é
nela que, logo no início, foi instituída a Política Nacional do Meio Ambiente que vigora em
todas as esferas governamentais. Condizente com o momento histórico que se vivia em todo o
mundo, essa política veio agregar-se ao posicionamento global que demonstrava iminente
preocupação com questões ambientais.
As potências econômicas mundiais traçavam suas leis de proteção ambiental, os
grandes investidores requeriam projetos ambientalmente responsáveis para poder liberar
verbas, o Brasil crescia economicamente e necessitava de investimentos; enfim, o momento
de crescimento industrial e mudanças sociais (representado por grandes projetos, tais como
hidroelétricas, rodovias, entre outros) do país careciam de apoio financeiro estrangeiro e para
isso precisava haver garantias preservacionistas.
Por ser então matéria de interesse público e político, no ano de 1981 foi promulgado a
Política Nacional do Meio Ambiente8.
8 Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981.
30
Art. 2º. A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana.
A Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA traz propósitos gerais a serem
seguidos pelas leis e normas mais específicas que por sua vez definirão metas, proibições,
legalizações, etc. Ela estabelece seus princípios, seus objetivos, seus instrumentos, a formação
e competências do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA e do Conselho
Nacional do Meio Ambiente – CONAMA e institui o Cadastro de Defesa Ambiental. Dentro
dos instrumentos da PNMA é importante frisar o Zoneamento Ambiental, a Avaliação de
Impacto Ambiental e o Licenciamento Ambiental que serão melhor discutidos posteriormente.
Em 1988 foi promulgada a vigente Constituição Federal que, pela primeira vez,
dedicou um capítulo inteiro ao meio ambiente, especialmente o Art. 225:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (CF/1988, Título VIII, Capítulo V, p.44)
Além do equilíbrio ecológico e da qualidade de vida, este artigo que é o caput do
capítulo, traz em si o conceito de sustentabilidade, bastante discutido neste trabalho. É
importante ressaltar também alguns pontos do capítulo como:
Inciso IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; Inciso VII, § 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
Ou seja, a Lei Maior deixa claro que qualquer atividade de significativa degradação
deve passar por estudos prévios de impacto ambiental. Cabe lembrar que tal estudo é
necessário para a liberação de obras impactantes que devem passar pelo processo de
Licenciamento Ambiental - certificado solicitado ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
31
Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), órgão federal que apreciará e analisará o Estudo de
Impacto Ambiental (EIA) e concluirá sobre a autorização ou a não implantação do projeto.
Como expresso no Inciso VII, a Zona Costeira, área do presente estudo, constitui
patrimônio nacional, o que deveria indicar restrições maiores quanto ao uso e maior rigor na
implantação de empreendimentos, de loteamentos e da própria organização urbana. Para dar
especial atenção aos recursos costeiros, o governo brasileiro implantou em 1988 o Plano
Nacional de Gerenciamento Costeiro – PNGC, que visa conscientizar sobre o planejamento
integrado desses recursos.
O Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro tem por finalidade primordial “o
estabelecimento de normas gerais visando à gestão ambiental da Zona Costeira do País,
lançando as bases para a formulação de políticas, planos e programas estaduais e municipais”
(PNGC- atualizado, 1997, p.4). Os objetivos do PNGC foram traçados em prol dessas
finalidades:
� A promoção do ordenamento do uso dos recursos naturais e da ocupação dos espaços
costeiros, subsidiando e otimizando a aplicação dos instrumentos de controle e de
gestão pró-ativa9 da Zona Costeira;
� O estabelecimento do processo de gestão, de forma integrada, descentralizada e
participativa, das atividades sócio-econômicas na Zona Costeira, de modo a contribuir
para elevar a qualidade de vida de sua população, e a proteção de seu patrimônio
natural, histórico, étnico e cultural;
� O desenvolvimento sistemático do diagnóstico da qualidade ambiental da Zona
Costeira, identificando suas potencialidades, vulnerabilidades e tendências
predominantes, como elemento essencial para o processo de gestão;
� A incorporação da dimensão ambiental nas políticas setoriais voltadas à gestão
integrada dos ambientes costeiros e marinhos, compatibilizando-as com o PNGC;
� O efetivo controle sobre os agentes causadores de poluição ou degradação ambiental
sob todas as formas, que ameacem a qualidade de vida na Zona Costeira;
� A produção e difusão do conhecimento necessário ao desenvolvimento e
aprimoramento das ações de Gerenciamento Costeiro. (PNGC, 1997, p.4)
9 Gestão pró-ativa: atividade que busca interferir antecipadamente nos fatores geradores dos problemas para
minimizar ou eliminar sua ocorrência. (PNGC, 1997)
32
Dentre os seis objetivos elencados pelo PNGC, nenhum é efetivamente praticado nas
praias estudadas: não existe postura pró-ativa, a degradação acontece sem o conhecimento do
poder público, que ao tomar conhecimento nem sempre atua para corrigir ou minimizar os
danos; a população local participa muito pouco das tomadas de decisões municipais; não foi
nem está sendo elaborado diagnóstico de qualidade ambiental; inexiste uma postura inter-
setorial para gestão ambiental.
Além de seus princípios e objetivos o PNGC traz ainda os instrumentos de
gerenciamento ambiental; as ações programadas de orientação sistemática para a continuidade
do gerenciamento costeiro; as fontes de recursos; e as atribuições e competências, onde se
frisa para fim prático:
� Nível Municipal: Os Municípios, observadas as normas e os padrões federais e
estaduais, planejarão e executarão suas atividades de Gerenciamento Costeiro em
articulação intergovernamental e com a sociedade.
São atribuições dos Municípios:
a) elaborar, implementar, executar e acompanhar o Plano Municipal de Gerenciamento
Costeiro, observadas as diretrizes do PNGC e do Plano Estadual de Gerenciamento
Costeiro;
b) estruturar o sistema municipal de informações do Gerenciamento Costeiro;
c) estruturar, implementar e executar os programas de monitoramento;
d) promover o fortalecimento das entidades diretamente envolvidas no gerenciamento
costeiro, mediante apoio técnico, financeiro e metodológico; e
e) promover a estruturação de colegiado municipal. (PNGC, 1997, p. 6)
Mais uma vez, não se veem atendidas às funções relativas ao município acima citadas
quando trazidas para a realidade do município do Conde.
Outras normas legais visam proteger e preservar o meio ambiente, criando para isso
limites de uso e ocupação do território. Com o intuito de apresentar leis que dizem respeito,
mesmo que transversalmente, à Zona Costeira, segue abaixo um resumo das que atendem a
esse fim.
A Lei 9.605 de 1998 dispõe sobre crimes ambientais contra flora, fauna, patrimônio
público natural, cultural e arquitetônico. Afora os crimes administrativos relativos ao meio
ambiente e aqueles sobre invericidade e/ou omissão na produção do EIA, cabe ressaltar dessa
lei crimes que atingem a área de estudo:
33
Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção. Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção. (Incluído pela Lei nº 11.428, de 2006). Art. 39. Cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente, sem permissão da autoridade competente. Art. 50. Destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de mangues, objeto de especial preservação. Art. 54, inciso IV - dificultar ou impedir o uso público das praias. Art. 64. Promover construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida.
Diante dos Artigos citados acima cabe lembrar que toda a Zona Costeira brasileira era
coberta por Mata Atlântica que foi ao longo do processo de colonização e, posteriormente,
ocupação pelos próprios brasileiros sendo dizimada. Hoje restam apenas cerca de 7% da mata
original, concentrados basicamente na Serra do Mar e na Serra da Mantiqueira, região sudeste
do Brasil (SOS Mata Atlântica) 10. Assim como toda costa do Brasil, o litoral da Paraíba
também foi cortando a Mata Atlântica existente, inclusive da área estudada. Além da
derrubada da Mata Atlântica outra vegetação protegida por lei e ainda presente nas três praias
vem sendo degradada e até derrubada para ocupação, os manguezais.
Já no referido no Art. 54 inciso IV, o traçado das ruas nem sempre é respeitado e por
vezes é modificado para beneficio do capital, incluindo ruas totalmente fechadas e tomadas
como propriedade privada.
A Lei 4.771 de 1965 que institui o Código Florestal Brasileiro e suas posteriores
alterações também direciona posturas a serem adotadas em prol da preservação do meio
ambiente11. Este documento inicia dizendo que todas as florestas localizadas em território
nacional e as demais formas de vegetação são bens do povo brasileiro, sendo, portanto do
interesse de todos zelar por sua preservação e seguir as normas de uso dos mesmos. Nesse
Código destacam-se para área analisada os seguintes pontos:
10 Fonte: Fundação SOS Mata Atlântica. Disponível em: www.sosmatatlantica.org.br. Acesso em: 16/05/2011. 11 Cabe atentar para o fato de o Novo Código Florestal Brasileiro estar em processo votação na Câmara e no Senado Federal durante a construção desse trabalho. A sua aprovação poderá modificar em muito as porcentagens e limites referentes às áreas de preservação e conservação brasileiras. Considerando até a possibilidade de, com o Novo código, parte da área analisada nesse trabalho e declarada de degradação ambiental, não mais condizer com essa definição, já que não estariam mais em áreas irregulares para o uso.
34
� Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as
florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa
marginal cuja largura mínima será: (Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)
1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura;
(Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)
2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50
(cinquenta) metros de largura; (Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)
3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200
(duzentos) metros de largura; (Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)
b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais;
e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a 100%
na linha de maior declive;
f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em
faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais; (Redação dada pela
Lei nº 7.803 de 18.7.1989)
Parágrafo único. No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos
perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nas regiões metropolitanas e
aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, observar-se-á o disposto nos
respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a
que se refere este artigo. (Incluído pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)
� Art. 3º - Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas
por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural
destinadas:
a) a atenuar a erosão das terras;
b) a fixar as dunas;
c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;
e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico;
f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção;
g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas;
h) a assegurar condições de bem-estar público.
35
� Art. 4º - A supressão de vegetação em área de preservação permanente somente
poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente
caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir
alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto. (Redação dada pela
Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
� Art. 10 - Não é permitida a derrubada de florestas, situadas em áreas de inclinação
entre 25 a 45 graus, só sendo nelas tolerada a extração de toros, quando em regime de
utilização racional, que vise a rendimentos permanentes.
Muitas das construções nas três praias infringem a lei no tangente às margens
protetoras de cursos d’água, lagoas, bordas de tabuleiro, restinga, e às margens de encostas
com declividade superior a 45°.
Para completar o rol de leis que embasam, ou melhor, deveriam embasar a ocupação
territorial, tem-se o Plano Diretor, instrumento legal que organiza o crescimento e o
funcionamento do município, criado pela Lei Federal 10.257 de 2001 e obrigatório para
municípios com mais de 20 mil habitantes. O Plano Diretor deve ser revisto ou refeito após 10
anos de sua elaboração (Cartilha “Plano Diretor”, 200512).
Existe para o município do Conde um Projeto de Lei intitulado Plano Diretor de
Desenvolvimento Sustentável do Município do Conde que tem por princípio base o
desenvolvimento sustentável. Para atingir tal desenvolvimento traça princípios norteadores e
objetivos; ele é ainda o instrumento que define o modelo de desenvolvimento a ser adotado no
município. Em seu artigo primeiro traz a seguinte redação: A promoção da prosperidade do
município do Conde tem como princípio o enfoque da sustentabilidade como pressuposto
básico na produção e gestão do seu desenvolvimento econômico, social e ambiental.
Dentre os incisos do primeiro artigo, consta a utilização racional e responsável dos
recursos naturais, com vistas a permitir sua renovação e conservação.
O Projeto de Lei acima citado elenca seis diretrizes - Diretriz de Produção Econômica,
Diretriz do Desenvolvimento do Turismo, Diretriz da Produção de Infraestrutura, Diretriz da
Estruturação dos Serviços Básicos, Diretriz de Qualificação Ambiental e Diretriz do
Desenvolvimento Institucional. Dentre essas, faz-se necessário verificar os caputs dos
artigos que norteiam suas respectivas diretrizes:
12 Cartilha “Plano Diretor: participar é um direito!” realizada pelo Instituto Pólis, 2005. Disponível em: www.estatutodacidade.org.br ou www.polis.org.br. Acesso: 10/08/2010.
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� Art. 7º - A Diretriz do Desenvolvimento do Turismo tem como objetivo maior
alicerçar o desenvolvimento turístico sustentável, buscando obter a satisfação dos
turistas e cidadãos locais, bem como o retorno dos investimentos com o mínimo de
impactos ambientais e culturais.
� Art. 15 - A Diretriz da Produção da Infra-Estrutura urbana tem como objetivo orientar
as ações de investimentos em infra-estrutura de suporte às atividades turísticas
existentes e potenciais no município, contribuindo concomitantemente para uma
desejada melhoria na qualidade de vida da população do município13.
� Art. 18 - A Diretriz da Estruturação dos Serviços Básicos tem como objetivo geral a
garantia da oferta dos serviços básicos urbanos relacionados ao atendimento da
população local no legítimo exercício da sua cidadania, principalmente aqueles afetos
à educação, saúde, moradia, equipamentos comunitários, cultura, desporto, lazer e
segurança.
� Art. 21 - A Diretriz da Qualificação Ambiental tem como objetivo geral qualificar o
território municipal através da valorização do patrimônio ambiental, promovendo suas
potencialidades e assegurando sua perpetuação, a superação dos conflitos referentes à
poluição e degradação do meio ambiente, garantindo novas condições de equilíbrio
essenciais à sadia qualidade de vida local.
A redação do Plano Diretor do Conde está, em linhas gerais, coerente e bem
formulada. Cada uma das diretrizes traz projetos e sub-projetos para alcançar seus objetivos.
De acordo com este Projeto de Lei, as áreas de preservação ambiental serão protegidas e,
quando já encontradas em uso, serão recuperadas. As propostas são boas em todas as
Diretrizes, é providencial chamar atenção apenas para a redação do Art.15, acima exposto,
pois conforme foi destacado tem-se a compreensão de que as melhorias na infraestrutura do
município são em primeiro plano para atender às necessidades do mercado turístico e, por
conseguinte, em segundo plano, atendem a população local.
É preciso mencionar que, das Diretrizes acima discorridas, a de menor importância
para o turismo é justamente aquela a este destinada, porque diante da situação encontrada
neste município, o turismo é o último ponto a ser resolvido. Os investimentos na atividade
turística deveriam ser discutidos após serem resolvidos todos os demais, e mais importantes,
13 Grifo nosso.
37
problemas da região. Afinal, como já dito, o turismo é apenas uma conseqüência. Cabe ainda
enfatizar que para um verdadeiro planejamento territorial, urbano e turístico, seguir as normas
neste tópico elencadas é essencial.
2.1.2 Transformação do litoral brasileiro: a ocupação pelas segundas residências
Por toda a estratégia e facilidade de acesso, as áreas litorâneas foram desde o tempo da
colonização sofrendo os primeiros processos de ocupação. Mas é a partir do século XX que
sua estrutura vai conhecer modificações marcantes. Foi na então capital nacional, o Rio de
Janeiro, que se deu o primeiro exemplo do subúrbio de veraneio, modelo de ocupação aqui
trabalhado, que posteriormente foi expandindo-se por todo litoral.
O processo de ocupação do litoral brasileiro remonta ao início da colonização do país, mas se estrutura de forma especial a partir do século XX, quando nos subúrbios das grandes cidades costeiras se configura uma nova estrutura urbana, a qual se pode denominar de bairro ou subúrbio de veraneio. (...) Essas práticas sociais [os banhos de mar] 14 induzem a formalização de dois tipos de ocupação urbana de característica residencial no litoral – o bairro ou subúrbio inserido dentro de um contexto urbano complexo, no caso cidades como Rio de Janeiro, Vitória ou Santos, ou o bairro de segunda residência, destinado basicamente a ser utilizado no período das férias de verão, ou nas épocas de grandes feriados. (MACEDO E PELLEGRINO, 1999, p.157).
Esses bairros de segunda residência do século XX citados por Macedo e Pellegrino
(1999) já iniciavam uma atividade que hoje configurar-se-ia como uma forma de praticar o
turismo, o chamado veraneio ou turismo de segundas residências, que está presente em maior
ou menor grau, em todos os estados litorâneos brasileiros.
Para facilitar o entendimento, cabe aqui apresentar uma definição do termo segunda
residência para a academia. A partir da leitura de Tulik (2001) é possível conceituar as
segundas residências15, também chamadas de residência secundária, como: uma propriedade
14 Grifo nosso. 15 Existem estudos e definições para essas habitações turísticas em outros países. Em outras línguas podem ser encontradas sob o nome de: second home, vacation home (inglês); residences secundaires, Maison de campagne (francês); segunda casa, segundo hogar (espanhol). Em português ainda é conhecida por: casa de veraneio, casa de campo, chalé, etc. (TULIK, 2001, p.6)
38
privada remetida ao lazer, situada em local díspar da moradia habitual, que abriga seus
visitantes por períodos de finais de semana, feriados e férias.
Chama-se atenção para o fator de vínculo territorial e social que se forma entre os
moradores-visitantes com o local da segunda residência. Derivado do uso constante do mesmo
espaço, esse vínculo estabelece uma ligação até mesmo afetiva (e de pertencimento).
Residências secundárias representam uma relação permanente entre a origem e o destino, uma vez que estabelecem regularidade entre saídas, chegadas e retornos. Ambos se complementam, pois se existem no emissor fatores que estimulam a procura por residências secundarias, o receptor detém características capazes de atrair, a ponto de justificar um vínculo territorial. (TULIK, 2001, p. 10)
Em geral, o campo emissor está próximo do receptor. Assim como acontece nas praias
aqui estudadas, é comum que os usuários das segundas residências habitem em um raio de
distância que possibilite rápido deslocamento até sua residência de lazer. Além disso, as
segundas residências têm sua escolha condicionada principalmente pelo bem-estar que
determinado local proporciona aos seus proprietários. Por isso, a maioria dessas está em locais
aprazíveis aos olhos e com meio ambiente preservado (pelo menos no ato da compra), afinal
os visitantes pretendem “fugir” da degradação ambiental e paisagística dos grandes centros.
Em 2002, analisando outro momento das ocupações litorâneas, Silvio Soares Macedo
apresentaria uma importante assertiva para os estudos do turismo de segundas residências,
A urbanização turística de segunda residência é, no inicio do século XXI, o mais importante fator de transformação e criação de paisagens ao longo da costa brasileira, tanto em termos de escala e dimensão como em abrangência, já que corresponde a milhares de quilômetros, lineares ou não, de ocupação das faixas de terra lindeiras ao mar. (MACEDO, 2002, p. 181)
É perceptível que o movimento turístico de segundas residências, muito forte no
Brasil, cresceu rápida e vorazmente, tomou boa parte da linha de costa transformando-a, em
alguns estados, praticamente em uma só cidade. Os impactos que essa ocupação vem
causando são inúmeros: ambientais, culturais, sociais e econômicos. O que se vê é o descaso
com as localidades que vão crescendo sem a menor estrutura e sem o menor planejamento. O
poder público, os turistas e mesmo a sociedade local,partilham a responsabilidade dos danos.
39
Na maioria dos casos, começa-se uma ocupação em meio a uma praia desprovida de
qualquer infra-estrutura, onde existe uma pequena comunidade de pescadores artesanais.
Mesmo sem os lotes as pessoas começam a construir suas casas, algumas compram terrenos
de propriedade de pescadores por valores irrisórios. Aos poucos vão se configurando os
traçados das ruas e das quadras, até que o avanço das construções chama a atenção do poder
público que passa a lotear e taxar propriamente o espaço, tornando-o regularizado. Entra aqui
um dos principais agentes envolvido nesse grande mercado: as imobiliárias16.
A praia que poucos anos atrás era um “paraíso” quase desconhecido projeta-se como
objeto de desejo daqueles que vivem nas tumultuadas cidades e que, em busca de sossego e
bem-estar, correm em direção a esses novos lugares; cresce a especulação imobiliária e em
poucos anos, provavelmente, o “paraíso” estará bem longe dali. Essa é uma história bastante
conhecida no nordeste brasileiro, perdem-se de vista quantas cidades turísticas nasceram
dessa forma: Porto Seguro – BA, Maragogi – AL, Porto de Galinhas – PE, Lucena – PB,
Extremoz – RN, Praia da Pipa – RN, Canoa Quebrada – CE17.
Esses padrões de urbanização [de segundas residências] são apontados como principais fatores de destruição dos recursos paisagísticos e ambientais existentes na linha costeira, pois os diversos ecossistemas costeiros como manguezais, dunas e restinga, por exemplo, são extremamente suscetíveis à urbanização e quando fragmentados e drasticamente subdivididos tendem a desaparecer. Do mesmo modo, os recursos cênicos litorâneos, que são também sempre ambientais, como os morros florestados, barras de rio, etc., ao serem ocupados e transformados, tem muitas vezes totalmente eliminadas as características que geram sua ocupação, com uma grande e definitiva perda de suas qualidades paisagísticas originais. (MACEDO e PELLEGRINO, 1999, p158-159)
Entre tornar-se conhecida e começar a degradar-se não é preciso muito tempo, com o
fluxo maior do que a capacidade natural e de infraestrutura suportam, as localidades começam
a saturar. Muita gente, muito lixo, muito carro; falta água, falta luz, faltam suprimentos. Nos
períodos de férias, verão e feriados, as praias muitas vezes aumentam em cinco vezes o
número de habitantes, as casas de veraneio se enchem. A infraestrutura que já não é suficiente
16 “O setor imobiliário procura vender uma moradia na praia ou nas montanhas, como uma rendosa alternativa de investimento de capital. Cresce, espantosamente, a especulação imobiliária e, conseqüentemente, a degradação ambiental, não somente nos ambientes naturais, mas também nos planos social e cultural.” (RODRIGUES, 1999, p.148) 17 Citando apenas as praias mais conhecidas em cada estado nordestino onde as segundas residências foram as propulsoras da urbanização.
40
para a população local, tende a não suportar o excedente, dessa forma, geralmente, o
abastecimento de água torna-se irregular bem como o de iluminação.
A questão do lixo e do esgotamento sanitário é um problema constante para o meio
ambiente, com tanta produção de resíduos nas casas, o lixo se acumula nas lixeiras, ruas e
terrenos baldios. Como muitas localidades turísticas litorâneas não dispõem de rede de
saneamento, as fossas sépticas são utilizadas, mas também não é difícil ver o esgoto correndo
pelas ruas sem a menor preocupação com a saúde pública. Cabe aqui lembrar que o lixo e o
esgoto comumente são lançados diretamente nos rios que cortam o local ou nos manguezais,
sem contar o lixo deixado ali quando esses recursos recreativos são utilizados pelos turistas.
Porém, dentro do propósito deste trabalho, outro problema precisa ser notado: as
construções irregulares que degradam o meio ambiente e alteram a paisagem local. Verifica-
se que os loteamentos e, conseqüentemente, as construções avançam áreas de limites da
marinha ou de preservação ambiental: dunas, falésias, margens de rios e mangues. Ou seja, o
poder público torna-se conivente com essas ilegalidades, pois cabe a esse ente fiscalizar essas
áreas e, principalmente, não torná-las regulares.
É perceptível a derrubada de matas ciliares, o aterro de manguezais, o assoreamento de
rios, construção sobre dunas - que podem posteriormente buscar outro lugar para o deposito
de areia causando transtornos como a “invasão” da areia em área urbana, o assoreamento de
lagunas e rios ou a mudança no curso destes. Como conseqüência, espécies de flora e fauna
nativas são atingidas e podem chegar à extinção, os ciclos da fauna se alteram e, algumas
vezes, aqueles que da pesca dependem ficam sem sua fonte de renda. As paisagens naturais
que antes eram o atrativo começam a se transformar chegando a certos casos de desgaste total,
quando passa a não mais atrair os turistas.
O que fazer com o aumento das edificações? O que pode ser feito com o lixo – degradável ou não? Como facilitar o acesso destas mercadorias [espaços turísticos] sem destruir a “especificidade da área natural” considerada de qualidade para o turismo? É inevitável que ocupar densamente uma área implica alterar as condições anteriores, significa degradar as condições originais. (...) este “tipo” de consumo deveria não ser “destrutivo”. Deveria “preservar, conservar” a mercadoria que deu origem à atividade. Porém, contraditoriamente, destrói as condições que deram origem a esta mercantilização. (RODRIGUES, 1999, p.60-61)
Assim como Rodrigues (1999), acima citada, pactuam deste pensamento sobre o
turismo autodestrutivo outros estudiosos como Eduardo Yázigi, Silvio Soares Macedo, Rita
41
de Ariza Cruz. Mas não é só no Brasil que é possível ver esse processo autofágico do turismo,
pelo discurso de Llinas (1999) percebe-se que o mesmo se multiplica por outras partes do
globo:
El grave problema es que el turismo viene para observar un espacio (paisajes) y al mismo tiempo lo está ocupando (hoteles y apartamentos, oferta complementaria, residencias secundarias). Esto produce un conflicto de intereses, ya que cuanto más atractivo es el paisaje de un destino, mayor número de turistas acuden y, a mayor afluencia turística, mayor ocupación del territorio; y en consecuencia menor paisaje virgen para ser contemplado o visitado. Esto genera un fenómeno de autodestrucción del interés turístico de un espacio por su propio éxito turístico. Es la exigencia de planificar lo que se ha venido en llamar turismo sostenible. (LLINAS, 1999, p. 191)
Como falar tanto em sustentabilidade quando a própria produção turística leva a
atividade à “falência”. Vem desse questionamento, mais que isso, dessa exclamativa, a
percepção de que o praticado está muito aquém do almejado turismo sustentável, nota-se que
essa realidade é algo que só existe até então no papel. São necessárias políticas públicas de
ordenamento territorial, de educação e de incentivos que beneficiem um turismo planejado e
bem implantado, um turismo que melhore o ambiente de que faz uso e não o degrade, um
turismo que saiba respeitar limites. A proliferação das segundas residências tem se tornado o
indício de que os locais aonde chegam, em algum momento, serão drástica e negativamente
modificados.
No seu artigo sobre a Ilha de Malorca - Espanha, Llinas (1999) conta como o processo
da ocupação pelo turismo ocorreu. Segundo o autor foi com o turismo de sol e mar que
ocorreu o boom da atividade na região, mas também foi com ele que veio a depreciação, o
consumo destrutivo das paisagens naturais, e assim do próprio atrativo turístico com a
saturação da oferta, o decréscimo da demanda e a degradação do meio ambiente.
Mas a política de ocupação, resolvendo dar um basta no crescimento desordenado e na
proliferação de equipamentos turísticos e de segundas residências, implantou uma série de leis
que barraram tal crescimento e ainda criou zonas de proteção. O que aconteceu foi mesmo o
esperado: o turismo voltou a desenvolver-se, sem o aumento de residências ou hotéis, apenas
no número de freqüentadores; estes mesmos se conscientizaram da proposta de preservação
do meio ambiente e passaram a valorizá-lo. A ilha se reestruturou com base em uma política
de desenvolvimento correta onde o meio ambiente e a paisagem são protegidos para
continuarem admiráveis e com qualidade, assim sendo, continuam a atrair visitantes.
42
Esse exemplo deveria sugerir um novo posicionamento da política brasileira, impondo
limites e não dando incentivos para o crescimento desordenado da atividade turística em seu
litoral. Perde-se muito da qualidade ambiental, cultural, da qualidade de vida, e, no fim,
perde-se o que era para ser a fonte de renda. É preciso entender que impor ordem ao turismo
não significa perda de cifras e sim ganho; entender que o propósito não pode ser o consumo
desregrado, onde depois da oferta natural “acabar” (ou melhor, ter sido destruída)
simplesmente parte-se em direção a praia ao lado - ainda com belezas “intocadas”, seguindo
um ciclo vicioso.
Em um de seus vários artigos sobre o tema turismo e paisagem, Yázigi (2002, p.12)
afirma: perde-se de vista que cada segmento da natureza aberto ao turismo dá vazão a uma
urbanização tão desregrada quanto selvagem. E continua seu pensamento,
selvagem no sentido negativo da palavra, em suma: carecemos de uma política urbana consistente e coerente, na qual tanto turismo e cultura como preservação natural sejam indicadores corriqueiros de peso, compatíveis com a idéia de desenvolvimento. Ignorando a inserção desses valores espaciais como variáveis obrigatoriamente conectadas ao resto do planejamento, os planejadores acabam por desqualificar o território.
Uma questão preocupante no Brasil é a dos valores da população, cada vez mais
distantes da natureza, do sentido de uma vida em consonância com o meio ambiente. É
fundamental essa percepção, pois aqui ela torna-se um dos pilares do problema ambiental e
paisagístico que o turismo produz. À medida que aos turistas e a população local pouco
importar os impactos negativos causados ao ambiente, esses danos certamente crescerão até o
colapso do meio e o desinteresse pela localidade.
Conforme a indiferença desses dois atores sociais mencionados, será também aquela
por parte do poder público. Infelizmente é visível o desprendimento dos gestores públicos no
que tange qualidade ambiental e, em contra partida, é notável a eterna preocupação pelo
crescimento econômico, sejam quais forem os custos. Isso é perfeitamente visualizado na
maioria dos estados e municípios brasileiros. Dessa forma o planejamento turístico pouco vai
manifestar-se, pois o planejamento prioritário é econômico.
O planejamento turístico e o planejamento da paisagem são abordados com maior
ênfase em um outro tópico deste trabalho. Deixa-se aqui a idéia de como o turismo pode
afetar o meio ambiente e a paisagem, tanto que mesmo a atividade pode exaurir-se, afinal ela
depende do equilíbrio destes. “A beleza de uma paisagem é um recurso renovável para as
43
atividades de turismo, desde que as suas características não se degradem pelo excesso de
visitantes” (BARBIERI, 2007, p. 12).
2.2 Planejamento e gestão: premissas para alcançar o equilíbrio
Planejar é a base de sucessos futuros, afinal como seria uma vida sem seu constante
planejamento? Não é possível depender de um futuro aleatório, como de forma simples expõe
Matus (1996),
Se planejar é sinônimo de conduzir conscientemente, não existirá então alternativa ao planejamento. Ou planejamos ou somos escravos das circunstâncias. Negar o planejamento é negar a possibilidade de escolher o futuro, é aceitá-lo seja ele qual for. (MATUS, 1996, Tomo I, p.14 apud SOUZA, 2008, p.47)
Assim, o ato de planejar constitui-se, antes de tudo, em manter o controle das várias
situações cotidianas; seja particularmente na vida de cada ser, seja num todo complexo, como
em uma sociedade. Planejar significa tentar construir conscientemente uma vida, uma cidade,
um país, um mundo melhor, onde se tem a previsão dos acontecimentos e suas respectivas
soluções.
Até mesmo intuitivamente, planejar sempre remete ao futuro: planejar significa tentar prever a evolução de um fenômeno ou (...) tentar simular os desdobramentos de um processo, com o objetivo de melhor precaver-se contra prováveis problemas ou, inversamente, com o fito de melhor tirar partido de prováveis benefícios. (SOUZA, 2008, p.46)
O futuro deveria partir de ações pensadas e planejadas no passado, praticadas no
presente, para finalmente serem colhidos os frutos. Mas a palavra finalmente, que
normalmente é interpretada como algo já exaustivamente buscado, remete a uma longa
espera, o que não é desejado pelos políticos e, em geral, culturalmente também não o é pela
sociedade.
44
O planejar a médio e longo prazo é não só um ato desinteressante aos políticos, como
a sociedade também deseja ver resultados imediatos, criticando quando esses não acontecem.
Não se quer aqui justificar o não fazer dos governantes com o planejamento a longo prazo
(que trará resultados, porém mediatos), pelo contrário; é claro que a população quer seus
governantes trabalhando, cobram por atitudes, mas existem situações que podem e devem ser
resolvidas no presente como existem aquelas que devem ser planejadas para que os resultados
sejam obtidos no futuro, independente do gestor que estiver no poder.
A cultura de planejar precisa ser fortalecida no Brasil, não adianta um resultado
imediato que dure um ano e que depois prejudique a sociedade ou um local por vários outros.
Planejar constitui-se em traçar metas a serem atingidas no seu devido tempo e os meios de
como alcançá-las. O planejamento deve ser encarado como um processo no qual as ações
traçadas devem passar por sucessivas (re)avaliações, fase a fase, pois nem sempre o que foi
projetado se mostra a melhor forma de alcançar determinado objetivo, muitas vezes é preciso
mudar o caminho, repensar a estratégia. É neste processo contínuo que está parte da solução
dos problemas das cidades brasileiras.
Segundo Murphy (1985, p.156), “planejar tem a ver com prever e regular a mudança
em um sistema e promover um crescimento ordenado a fim de aumentar os benefícios sociais,
econômicos e ambientais do processo de desenvolvimento”. Nessa mudança, em função de
diversos benefícios é perceptível que o desenvolvimento, e ainda o desenvolvimento
sustentável, sejam outros conceitos intrinsecamente vinculados ao planejamento
socioeconômico e ambiental.
Desenvolver é mudar no sentido de conquistar melhorias. O desenvolvimento diz
respeito ao progresso econômico, social e ambiental, sendo esses indissociáveis e interligados
entre si. Cabe frisar que desenvolvimento não é sinônimo de crescimento econômico como
muitos pensam, e que aquele não virá como conseqüência deste. Crescimento econômico dá-
se pelo aumento do Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, do capital que circula no país e que
se pressupõe proporcionar um aumento nas rendas nacionais, o que é sim um dos fatores
necessários para chegar a um desenvolvimento (MOLINA e RODRIGUEZ, 2001).
O crescimento econômico, embora necessário, tem um valor apenas instrumental; o desenvolvimento não pode ocorrer sem o crescimento, no entanto, o crescimento não garante por si só o desenvolvimento; o crescimento pode, da mesma forma, estimular o mau desenvolvimento, processo no qual o crescimento do PIB é acompanhado de desigualdades sociais, desemprego e pobreza crescentes. (SACHS, 2008, p.71)
45
É importante lembrar que dentro dos três âmbitos citados no parágrafo anterior estão
embutidos: a cultura, a saúde, a educação, a moradia, a segurança, o lazer. Tais aspectos não
podem ser desprezados dentro da perspectiva do desenvolvimento, pois sem a substancial
melhoria nesses não se otimizará a qualidade de vida, pressuposto base do sentido de
desenvolver.
O desenvolvimento sustentável, por sua vez, é um conceito que vem sendo discutido
desde a década de 1970, quando a problemática ambiental (nesse começo mais natural que
social) revelou-se mundialmente, e que ganhou força na década de 1990, mais
especificamente no ano de 1992 quando foi realizada a Conferência das Nações Unidas para o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento, mais conhecida como ECO-92. Segundo a Comissão
Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – CMMAD, desenvolvimento sustentável
é:
Um processo de transformação, no qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação da evolução tecnológica e a mudança institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de atender as necessidades e aspirações humanas. (CMMAD 1991, apud
RUSCHMANN 1997, p 109)
Desenvolver sustentavelmente é proporcionar às gerações futuras as mesmas (ou
melhores) condições de vida que se dispõem hoje, é permitir que no futuro se tenha um
ecossistema saudável, a biodiversidade preservada, um ambiente social cada vez mais justo, a
diversidade cultural fortalecida e uma economia equilibrada.
Este conceito sugere uma nova ética e um novo ponto de vista. Sobre ética pode-se
dizer que parte-se de uma postura anteriormente antropocêntrica para uma perspectiva mais
global, biocêntrica. Uma nova visão é adotada: o homem passa a se enxergar como parte da
natureza, formando um novo relacionamento entre ele e os elementos naturais. Percebe-se
ainda uma postura mais solidária para com as futuras gerações quando o consumismo
exagerado, pelo menos por parte de alguns, é freado e repensado; afinal o que será dos filhos e
netos da geração atual? (DIEGUES, 2001).
Mudanças ocorreram de 1992 até agora, porém não na grandeza que se esperava
naquele evento que chamou a atenção do mundo sobre o comportamento humano. Mas parte
da população começou a conscientizar-se sobre comportamentos mínimos que ajudam
bastante como: não jogar lixo nas ruas, nos espaços públicos, rios, córregos, no mar; utilizar
46
esgotamento sanitário quando possível; utilizar lâmpadas e eletrônicos mais eficientes (que
gastam menos eletricidade); fazer a separação de lixo reciclável e orgânico; reutilizar, etc. O
grande infortúnio é que não se adotou em larga escala o chamado terceiro “R”18: reduzir. A
redução do consumo é a maior mudança que se espera por parte da população, pois se a
postura consumista continuar nos níveis atuais não há como melhorar de fato o mundo. A
redução é a tarefa mais difícil da sociedade atual, devido à cultura consumista trazida com o
capitalismo, o consumismo está presente cada vez mais cedo na vida das pessoas.
A sustentabilidade impõe limites, sendo impossível atingi-la com a forma de vida
levada hoje e com a economia degradando a natureza das mais diversas formas. Em artigo
produzido para o Terramérica19, Enrique Leff, conceituado ambientalista, coloca que é preciso
mais que impor limites, é preciso desconstruir a economia atual e construir outra, “baseada
em uma racionalidade ambiental” (LEFF, 2008). Para o autor a raiz do problema não será
extinta com as atuais propostas para um suposto desenvolvimento sustentável, é preciso ir
mais fundo e mudar a economia atual e, conseqüentemente, a cultura que esta impôs ao
mundo.
Ao relembrar a proposta de “crescimento zero”, apresentada pelo Clube de Roma20,
Leff (2008) faz entender que se deve deter o crescimento dos países ricos, mas continuar
estimulando o dos países pobres não é uma saída viável, muito menos sustentável.
ressurge, assim, o fato indiscutível de que o processo econômico globalizado é insustentável. A ecoeficiência não resolve o problema de um mundo de recursos finitos em perpétuo crescimento, porque a degradação entrópica é irreversível. A aposta pelo decrescimento não é apenas uma moral crítica e reativa, uma resistência a um poder opressivo, destrutivo, desigual e injusto; não é uma manifestação de crenças, gostos e estilos alternativos de vida; não é um simples decrescimento, mas uma tomada de consciência sobre um processo que se instaurou no coração do mundo moderno, que atenta contra a vida do planeta e a qualidade da vida humana. (LEFF, 2008)
Diegues (2001) propõe pensar o desenvolvimento sustentável a nível local, inserindo-o
dentro de uma definição de sociedades sustentáveis; na medida em que, sob essa esfera,
“possibilita a cada uma delas [as sociedades] definir seus padrões de produção e consumo,
18 Reciclar, reutilizar, reduzir. 19 Projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud). 20 O Clube de Roma foi um grupo formado por intelectuais e empresários internacionais preocupados com o destino do mundo. Buscava neste grupo discutir e encontrar soluções viáveis para atingir a sustentabilidade. (OSEKI e PELLEGRINO, 2004 p.486)
47
bem como o de bem-estar a partir de sua cultura, de seu desenvolvimento histórico e de seu
ambiente natural”. (DIEGUES, 2001, p.52).
Pertinente esse posicionamento, pois a questão cultural é um dos fatores mais
enfatizados no discurso da sustentabilidade, então, nada mais justo, que cada sociedade buscar
a sua sustentabilidade baseada em tradições culturais próprias, em história e ambiente natural
singulares, nos seus padrões de produção e consumo locais.
Dessa forma, o desenvolvimento deixa de seguir receitas-padrão para se adequar a
cada ambiente específico, prezando e respeitando a diversidade das sociedades. A sociedade
sustentável defendida por Diegues (2001) atenta para que as pessoas que formam a sociedade,
sobretudo as mais pobres, passem a ser sujeitos ativos desse desenvolvimento e não
meramente expectadores das decisões de um grupo limitado.
Unindo dois diferentes pesquisadores, a sociedade sustentável de DIEGUES (2001)
vai ao encontro das adaptações singularizantes de SOUZA (2008), que defende a atuação da
população local no planejamento urbano de sua cidade. Uma vez que desenvolver implica
melhoria social, essa tem de contemplar a qualidade espacial (ou do urbano), dando-a devida
importância, posto que seja palco da vida social e externalidade identitária de seu povo.
As adaptações singularizantes são intervenções físicas necessárias particularmente a
cada localidade, ou mesmo a cada bairro, que não poderão ser “produto de gabinete”, visto
que somente os atores sociais que vivenciam o problema podem dimensioná-lo. Por sua vez, o
planejador tem respaldo técnico para sugerir melhores soluções. Por isso, a união destes dois
lados, o do técnico e o da comunidade, é tão importante para o desenvolvimento sócio-
espacial de um local, só essa junção trará melhorias concretas para o espaço e para a
sociedade.
Sendo o planejamento um processo, e as conseqüências de suas ações virão com o
tempo, outro conceito passa a fazer parte deste monitoramento constante do que outrora foi
planejado e posto em prática: a gestão.
Quando se fala em gestão muitos a vinculam ao campo político, no sentido em que o
gestor é aquele que está no comando de um cargo e/ou de uma ação governamental. Cabe
atentar que, vindo do termo latino gestio, gestão “expressa ação de dirigir, de administrar e
gerir a vida, os destino, as capacidades das pessoas e as próprias coisas que lhes pertencem ou
de que fazem uso” (ANDRADE, 2001, p. 16). Ou seja, todos, de alguma forma, praticam a
gestão, seja de sua própria casa, de sua vida, de seu dia-a-dia.
Nesse sentido, Andrade (2001, p. 16-17) coloca que o termo gestão “acentua a
realidade segundo a qual quem gere alguma ação ou instituição deve fazê-lo de tal forma e
48
com tal capacidade, que sua dedicação ou aplicação torne esse fato mais valioso em si mesmo
e mais produtivo em termos sociais, culturais e econômicos”. O ato de gerir tende a ser
individualista no cotidiano atual, porém quando a gestão diz respeito ao bem público é preciso
que haja consciência de que a mesma deve assumir um caráter comunitário, onde as ações
devem estar voltadas para o benefício da maioria, do conjunto e não do particular.
Para Souza (2008, p. 46), abordando já o lado político-administrativo, a gestão
constitui-se de
administrar uma situação dentro dos marcos dos recursos presentemente disponíveis e tendo em vista as necessidades imediatas (...); é a efetivação, ao menos em parte (pois o imprevisível e indeterminado estão sempre presentes, o que torna a capacidade de improvisação e a flexibilidade sempre imprescindíveis), das condições que o planejamento feito no passado ajudou a construir.
No cotidiano é fácil surgirem imprevistos, ou mesmo uma ação planejada não resultar
no esperado. Nesta “negociação” diária entre ações-reações, é preciso estar apto a lidar com a
nova situação e superá-la da melhor forma; a flexibilidade, que congrega em si segurança nas
decisões (decorrente de conhecimento adquirido) e capacidade de iniciativa, é atributo
fundamental a um bom gestor. É importante que um gestor público conheça sua comunidade
(suas deficiências e aspirações), aquela por ele administrada, pois dentre as opções que
surgirem é preciso saber escolher a mais benéfica para o todo.
Schenini et al (2006) explanam sobre uma nova escola administrativa, bastante
congruente ao que se pretende enfatizar no presente trabalho sendo portanto a linha de
raciocínio aqui adotada: a gestão pública sustentável. Segundo os autores, este “tipo” de
gestão deve buscar bons resultados operacionais priorizando a transparência, a honestidade e a
competência. Essa é uma escola administrativa mais ética e responsável para com o meio
ambiente, para com a sociedade e as relações econômicas, “baseia-se fundamentalmente em
adotar e executar ações que podem ser gerenciais ou operacionais, mas todas com uma visão
duradoura e integrada” (Schenini et al, 2006, p. 59).
A gestão pública sustentável tem como pressuposto básico utilização de instrumentos e mecanismos das tecnologias limpas que permitam otimizar suas operações fabris e de serviços, suas atividades gerenciais e também suas funções de monitoramento e fiscalização. É o papel do Estado como gestor do meio ambiente e da sustentabilidade. (SCHENINI e LOCH, 2006, p. 87)
49
Conforme exposto, a gestão pública sustentável se utiliza de tecnologias limpas, essas
são definidas por Schenini (1999) e dizem respeito a qualquer medida técnica realizada para
reduzir ou eliminar já na fonte, a produção de qualquer tipo de incômodo, de poluição ou de
resíduo e que proporcione economia de matérias primas, de recursos naturais e de energia.
Estas medidas técnicas podem ser encontradas na fabricação de produtos ou na prestação de
serviços (ações e procedimentos). Schenini et al (2006, p. 62-63) enumeram algumas das
quais pode fazer uso a gestão pública sustentável:
� Agenda 21 Local;
� Ética e responsabilidade social;
� Informações geo-espaciais;
� Contabilidade e finanças públicas ambientais21;
� Comunicações ecológicas – cartilhas, mapas ecológicos, campanhas;
� SGA – Sistema de Gestão Ambiental;
� Tributação como elemento restritivo à poluição;
� Auditoria ambiental;
� Projetos ecológicos de recuperação ambiental;
� Plano de proteção à flora, fauna e recursos naturais;
� Parcerias e alianças estratégicas para viabilização de projetos ecológicos;
� Plano diretor ecológico – planejamento territorial urbano;
� Zoneamento ecológico do município;
� Educação ambiental; e
� Estatuto da cidade.
Os autores, Schenini et al (2006, p. 69), concluem que os desafios da gestão pública
sustentável “devem ser compreendidos sob a visão sistêmica e numa perspectiva holística,
conduzindo as análises, as ações e as avaliações de modo a englobar todos os agentes
constitutivos do contexto; segmentos, atores e instrumentos que participam do esforço de
desenvolvimento”.
21 Chama-se atenção que esse instrumento também é apresentado por Diegues (2001) quando o autor coloca a análise econômica dos recursos naturais. Nesta analise/avaliação é contabilizado em valores monetários os benefícios advindos do meio natural (e que são obtidos “de graça”) ou os prejuízos, também monetários, derivados da perda do ambiente natural. Por exemplo, quanto se obtém com a caça de caranguejos no mangue e quanto se deixará de obter caso este seja destruído.
50
O educador José Quintas (2009), traz outro conceito baseado na relação da gestão
pública com o meio ambiente, o de gestão ambiental pública. Ele a conceitua como,
o processo de mediação de interesses e conflitos (potenciais ou explícitos) entre atores sociais que agem sobre os meios físico-natural e construído, objetivando garantir o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, conforme determina a Constituição Federal. Este processo de mediação define e redefine, continuamente, o modo como os diferentes atores sociais, através de suas práticas, alteram a qualidade do meio ambiente e também, os custos e benefícios decorrentes da ação destes agentes. (QUINTAS, 2009, p.5)
Segundo o autor, “as relações (dos seres humanos entre si e com o meio físico-natural)
ocorrem nas diferentes esferas da vida societária (econômica, política, religiosa, jurídica,
afetiva, étnica etc.) e assumem características específicas decorrentes dos contextos sociais e
históricos onde acontecem” (QUINTAS, 2009, p.5). Para viver essas diversas relações os
atores fazem uso múltiplo dos recursos ambientais, com diversificadas práticas de
apropriação. É sobre esses usos e práticas que a administração pública deve atuar,
controlando-os e racionalizando, sendo mediadora dos conflitos e impondo o que é mais
benéfico para o coletivo em detrimento do particular.
Assim tem-se que o poder público tem nas mãos o dever e o poder de gerir os
interesses entre o uso social dos ambientes naturais, fazendo com que as ações da sociedade
não prejudiquem o equilíbrio do meio ambiente, em um processo de análise contínuo.
Expostos planejamento e gestão, fica compreendido o quão tais termos se
complementam: um analisa e traça as ações em prol de mudanças positivas, o outro observa o
andamento dessas e preserva sua meta final, mesmo que fazendo as alterações necessárias
para isto. Um par harmônico de ações que devem estar presentes na administração
governamental.
51
2.2.1 Planejando a paisagem
Pensar em paisagem geralmente remete a uma imagem bela. É difícil escutar essa
palavra e primeiramente pensar em algo não agradável aos olhos; vem logo à mente uma cena
de campo, montanha, praia, tudo bastante preservado, com vegetação, sem poluição, lixo ou
qualquer imagem pejorativa. Para que a imagem almejada seja de fato encontrada, seja real e
não apenas imaginária, é preciso um bom planejamento da área, o qual vise preservar e exaltar
os pontos fortes (e belos) e resolver problemas existentes.
O planejamento da paisagem é entendido como um planejamento e ordenamento
territorial e urbano22, que no Brasil até hoje consiste basicamente em organizar o traçado
urbanístico e equilibrar uso do solo à densidade populacional. O instrumento utilizado para
atingir esse ordenamento é basicamente o zoneamento de uso e ocupação do solo, somado a
parâmetros urbanísticos (SOUZA, 2008) como:
� Gabarito: número de pavimentos ou de metros da edificação, altura máxima permitida
para as edificações de acordo com as zonas. O gabarito pode variar de acordo com a
necessidade de circulação do vento, harmonia paisagística, proximidade de aeroportos,
etc.
� Afastamentos: distanciamento entre edificações, entre cada edificação e seu lote, e
entre esta e o logradouro.
� Área construída: área total da edificação, somando-se todos os pavimentos.
� Taxa de ocupação: relação entre área construída e a área total do lote.
� Índice de permeabilidade: relação entre a parte do terreno que permite infiltração da
água e a área total do mesmo. Este é um importante índice ambiental, pois a
demasiada impermeabilização de terrenos de uma cidade contribua para a formação de
ilhas de calor.
� Índice de área verde: relação entre a parcela do terreno coberta por vegetação e a área
total do mesmo. Outro importante índice ambiental visto que quanto mais áreas verdes
dentro de uma cidade, maior será a filtração do ar poluído, a ventilação e maior
conforto térmico.
22 Além das ferramentas para o ordenamento do urbano serem as mais utilizadas no planejamento de qualquer paisagem, seja urbana ou não, cabe aqui esclarecer que as três praias estudadas nesse trabalho são consideradas área urbana perante a administração municipal.
52
O zoneamento de uso e ocupação do solo consiste em mapear zonas de ocupação de
determinada cidade resultando em um plano de ocupação que recomendará e restringirá o uso
do solo em termos de área para uso intensivo, extensivo, de preservação e de uso múltiplo
(DIEGUES, 2001). No caso de localidades costeiras Diegues (2001, p. 123-124) exemplifica
esses usos:
� Áreas de preservação: áreas em que não se permite atividade econômica produtiva,
reservando-as para pesquisa científica, reserva biológica, etc.;
� Áreas de conservação: áreas em que se permitem atividades econômicas produtivas,
mas controlada, de forma a manter a sustentabilidade dos processos ecológicos;
� Uso econômico intensivo: áreas de atividades portuárias, de pesca, industrial;
� Uso econômico extensivo: áreas de lazer;
� Áreas de uso múltiplo: residencial, comercial, industrial, etc., áreas que congregam
várias funções, nas quais devem ser avaliados seus conflitos e possibilidades.
Segundo Souza (2008), para chegar às conclusões o zoneamento necessita de uma
análise criteriosa de potencialidades, de sensibilidade, de estimativa de risco, de impactos e de
conflitos do uso do solo da área em questão. A análise de potencialidades consiste em um
estudo que indique qual o potencial econômico da área (ex: turístico, industrial, agrícola, etc.);
a análise de sensibilidade demonstra as vulnerabilidades do meio ambiente (sócio e natural); a
estimativa de risco levanta as possibilidades de risco (econômico, ambiental, social, etc); a
estimativa de impacto por sua vez, une os três itens anteriores em um mapa demonstrativo de
impactos; e a análise de conflitos de uso do solo estuda as localizações e usos do solo
avaliando suas incompatibilidades (por exemplo, uso residencial e uso industrial).
Todas essas análises resultarão em mapas específicos que nortearão os diversos tipos
zoneamento, de acordo com a necessidade de cada local. Os mapas poderão zonear: uso e
ocupação do solo, vegetação, áreas de interesses prioritários (social), densidade de ocupação.
Pode-se ainda sobrepor estes mapas/zoneamentos para obter um planejamento urbano final
que congregue aspectos sociais, ambientais e econômicos, visando melhor equipar a cidade e
proporcionar melhor qualidade de vida.
53
Figura 1: Zoneameno por uso do solo. Fonte: Souza, 2008.
Figura 2: Zoneamento por densidade. Fonte: Souza, 2008.
Figura 3: Zoneamento de prioridades. Fonte: Souza, 2008.
Para reforçar a importância da prática do zoneamento, é cabível citar que ele é base
para o gerenciamento geoambiental apresentado por Diegues (2001, p. 75):
O gerenciamento geoambiental visa compatibilizar usos múltiplos no sentido de harmonizá-los com as vocações naturais dos ecossistemas. (...) O zoneamento geoambiental, para ser efetivo, deverá integrar-se dentro de um processo mais amplo de zoneamento ecológico-econômico.
Esta leitura do zoneamento, sob um enfoque ambiental, condiz com aquela já descrita,
a partir de um ponto de vista mais urbano, ou seja, a função do zoneamento é promover um
melhor equilíbrio dos ecossistemas e da relação sociedade-natureza.
Apesar de o zoneamento ser o principal passo no planejamento da paisagem, outros
mecanismos merecem ser citados. A revitalização de prédios históricos é um exemplo, evita-
se com ela a perda da própria história local; a valorização da cultura mediante a arquitetura
construída nos prédios e espaços públicos enriquece o local e fortalece a identidade de seu
povo. A criação de áreas de lazer que possibilite as trocas sociais e a melhoria da circulação
do ar nas cidades; e a implantação de áreas verdes, tanto para melhorar a qualidade do ar
como para tornar o local mais apreciável; são mecanismos dentre tantos possíveis.
Dentro do planejamento territorial corre atualmente uma vertente que deriva da
arquitetura da paisagem somada à questão ecológica, o desenho ambiental, que vai ao
encontro dos propósitos do planejamento citado anteriormente e que é importante destacar
aqui. O desenho ambiental é um instrumento de elaboração de cenários partindo de princípios
de conservação ambiental e objetivando a melhoria da qualidade de vida e o desenvolvimento
sustentável. (FRANCO, 1997)
54
A autora Mª de Assunção Franco aponta que os cenários projetados devem atender às
seguintes premissas:
� “Conservação ambiental mantendo a integridade dos ecossistemas, o que inclui
evidentemente a manutenção da biodiversidade;
� A melhora da qualidade de vida tendo em vista a valorização do homem e de sua auto-
expressão, num processo contínuo de educação ambiental e de justiça social;
� Equilíbrio e harmonização entre as características dos ecossistemas e as necessidades e
aspirações antrópicas traduzidos por um desenvolvimento auto-sustentado.”
(FRANCO, 1997, p. 133)
Esta mesma autora cita ainda os fatores determinantes na criação de cenários tendo por
base a conservação ambiental, seriam eles: o clima (situação geográfica, latitude, longitude,
altitude); a topografia, os sistemas de bacias; as características geológicas e pedológicas; e
características e organização de flora e fauna, bem como as características e estágio do
processo evolutivo do ecossistema como um todo. No que tange a qualidade de vida, os
fatores determinantes são: a organização sócio-política; a organização econômica; e as
invenções – novas tecnologias (de extração e reciclagem dos recursos naturais, de urbanização
e comunicação).
Além dos determinantes, Franco (1997), tomando por ponto de partida o planejamento
ambiental, enumera alguns critérios para a criação de cenários em desenho ambiental:
� Critério da não-ação: ou seja, manter as práticas de manejo que estão referidas nas leis
federais, estaduais ou municipais como o Código Florestal, Lei de Proteção de
Mananciais, etc. nas áreas públicas e privadas23;
� Critério de proteção: em favor da terra e seus recursos, atua na conservação de áreas
silvestres e preservação de plantas do ecossistema, da vida selvagem, cultura e
recursos paisagísticos e históricos;
� Critério de equilíbrio: considera as demandas de desenvolvimento através do manejo
de recursos sob o principio do uso múltiplo, desenvolvimento sustentável e qualidade
ambiental;
23 Franco (1997) não fala em não-ação na esfera privada, porém a presente autora acredita ser pertinente que exista essa fiscalização que atue em prol de uma comunidade maior sendo para isso, quando preciso, impor a não-ação aos proprietários particulares que possuam terrenos dentro de áreas protegidas por lei.
55
� Critério do uso favorável: visa essencialmente à produção, incluindo o uso
recreacional e a exploração mineral.
Todos esses critérios juntos previnem o desgaste ambiental e fortalecem o uso
sustentável. Seria possível incluir aos critérios de Franco (1997) o “critério da precaução”,
onde as atitudes do homem fossem pensadas e realizadas com prudência e em favor do bem
comum, dando extrema atenção às conseqüências que podem surgir de cada ato.
Priorizando a harmonia entre a cultura, a sociedade, a economia e a natureza do local,
prezando pelo equilíbrio entre o que se extrai da natureza e seu poder de regeneração,
o Desenho Ambiental precisa integrar os recursos naturais, arquitetônicos e culturais da cidade no sentido de: produção de alimento e energia; reciclagem dos materiais e do lixo; moderador climático; conservação dos recursos hídricos; valorização das plantas e dos animais; e condições de amenidade e recreação. (FRANCO, 1997, p. 213)
Todas as ferramentas e posturas discutidas aqui – o zoneamento, a gestão
geoambiental, o desenho ambiental, os critérios e premissas na construção de cenários – são
válidos e valiosos para o planejamento da paisagem. O importante é prezar por um
planejamento e ordenamento prévio, que possibilite a não degradação do ambiente. Caso esse
não ocorra deve-se haver uma reavaliação da situação e um planejamento a partir do que já se
tem, visando então a melhoria na qualidade paisagística e ambiental dentro das possibilidades
existentes.
A respeito do planejamento de ambientes e paisagens litorâneas, foco deste trabalho,
pode-se dizer que até hoje esse é um mecanismo pouco utilizado. As zonas costeiras, apesar
de seu grande potencial físico e econômico, permanecem sem a atenção devida às suas
particularidades ambientais e paisagísticas. Ao longo da história as regiões litorâneas foram
sendo ocupadas e devastadas sem o menor cuidado com seus recursos: matas nativas
derrubadas, construção sobre dunas, mangues aterrados ou transformados em criadouros de
peixe e camarão, etc.
As zonas costeiras, que abrigam cerca de 80% da população mundial, permanecem em
contínua degradação, vendo seus múltiplos ecossistemas (mangues, recifes de coral, matas
ciliares, florestas nativas) serem dizimados para a ocupação e “desenvolvimento” humano.
Contraditoriamente, tal crescimento resulta em perda irreversível de vários habitats e recursos
naturais, assim como no empobrecimento de comunidades extrativistas, sem falar na perda de
56
identidade daqueles que fazem da natureza sua fonte de vida e com ela convivem em perfeita
harmonia (DIEGUES, 2001).
Para permitir sustentabilidade às atividades realizadas nas zonas litorâneas é
necessário que seus ecossistemas sejam preservados com fins de possibilitar a continuidade na
economia da pesca, do turismo, da agricultura. Um planejamento costeiro deve assim como
qualquer outro buscar respostas na sua própria comunidade, envolvendo todos os entes que a
constroem, sejam pescadores, agricultores, extrativistas, comerciantes, empresários,
habitantes, turistas, etc.
Com recursos naturais tão belos e abrigando ecossistemas de imensa importância ao
equilíbrio ambiental do planeta, os litorais precisam ser alvo de uma política de conservação e
preservação mais ativa, mais consciente, que proporcione a segurança desses recursos. Uma
vez que os ambientes costeiros entrem em total degeneração, todo o planeta sofrerá
consequencias ambientais. Ambientais, mais uma vez lembrando, não se referindo apenas à
natureza, mas a uma série de consequencias sociais, econômicas e culturais.
2.2.2 Planejando o turismo
Após a Segunda Guerra Mundial, com o rápido desenvolvimento da atividade turística em áreas como o Mediterrâneo, Caribe, dentre outras, o turismo expandiu-se de forma massificada, sem planejamento, causando um alto custo social e ambiental para as localidades envolvidas. (QUEIROZ, 2005, p. 175)
Segundo Edward Inskeep (1991, p.17), os primeiros planejamentos turísticos foram
feitos para a região da Ásia-Pacífico nas décadas 1960 e 1970, como exemplo a Malásia,
Taiwan e Bali; e um ano antes, em 1959 para o Hawai. Na região do Atlântico, cabe
mencionar os planejamentos para as ilhas do Caribe. Já na Europa destacaram-se nessa época
os projetos para a Iugoslávia e para algumas regiões da França.
Hall (2001) fez um estudo sobre a evolução dos métodos de planejamento turístico que
ao longo dos anos foram sendo modificados para atender as necessidades tangentes. Os
enfoques de planejamento turístico apresentado por Hall (2001) foram fornecidos por Getz
(1987), que identificou quatro procedimentos nessa área: o fomento, uma abordagem
econômica voltada para indústria, uma abordagem físico-espacial e uma abordagem voltada
57
para a comunidade. Para o autor desses procedimentos, eles podem ser executados em
conjunto e não necessariamente separados ou seqüenciais.
Pela abordagem do fomento, usado no desenvolvimento e planejamento turístico desde
o início do turismo de massa24, pouca atenção se dá aos impactos negativos ocasionados pela
atividade. Por esta abordagem o turismo é visto unicamente pelo seu lado positivo, com ele
seu anfitrião conhecerá vantagens automáticas. O fomento interpreta que recursos naturais e
culturais são objetos a serem explorados. De acordo com sua visão os residentes do destino
turístico não devem se envolver na tomada de decisão dentro do processo de planejamento da
atividade.
O fomento também não respeita conceitos de capacidade de carga, implicando em
saturação social e ecológica, apresentando um posicionamento totalmente quantitativo. Ou
seja, o fomento é totalmente contrário aos conceitos citados anteriormente de
desenvolvimento e de turismo sustentáveis. Mesmo não atendendo às necessidades atuais de
conservação e sustentabilidade sócio-ambiental o fomento é, ainda hoje, a forma mais comum
de se promover o turismo em boa parte do Brasil.
Pela tradição econômica, que entende o turismo como indústria, a atividade classifica-
se como indústria de exportação que contribui para o equilíbrio nacional e regional nas
relações de troca, na balança de pagamento e/ou em níveis de câmbio exterior. Sob esta ótica
o governo pode utilizar-se do turismo como mecanismo para a reestruturação e crescimento
econômico, para a geração de empregos e desenvolvimento regional. O marketing é uma das
principais características dessa abordagem, é o meio no qual o governo investe muito para
captar turistas.
A abordagem físico-espacial originou-se no trabalho dos geógrafos, profissionais
planejadores do uso do solo e conservacionistas, pois defendem uma vertente racional para o
planejamento de recursos naturais. O planejamento do uso do solo é considerado uma das
formas mais antigas de proteção ambiental. Para Hall (2001, p.48-49) o planejamento físico se
refere ao “planejamento com um componente espacial ou geográfico no qual o objetivo geral
é preparar uma estrutura espacial de atividades (ou uso do solo) que, de alguma forma, é
melhor que o padrão existente sem planejamento”. Esse tipo de planejamento visa minimizar
os impactos negativos do turismo dando atenção a questões de saturação física, social e
ambiental, e a limites ou índices aceitáveis/desejáveis de mudança.
24 Segundo Queiroz (2005) o turismo de massa é reconhecido por volta do ano de 1950.
58
O planejamento físico-espacial trabalha ainda com a estratégia de limitar o número de
visitantes por área/hora, como exemplos têm-se a Ilha de Fernando de Noronha e vários
destinos do ecoturismo, como os atrativos turísticos de Bonito - Mato Grosso do Sul
(cavernas, trilhas, cachoeiras, rios, etc). Na evolução do planejamento de uso do solo, este
começa a integrar-se a uma abordagem ecológica na busca do desenvolvimento sustentável,
sendo descrito como um planejamento ambiental. Segundo Evans (1997, p. 5) o planejamento
ambiental “é concebido como uma abordagem integrada e holística ao ambiente que
transcende os limites departamentais e profissionais tradicionais, e visa a assegurar a meta de
longo prazo de sustentabilidade ambiental”.
A última abordagem aponta para um planejamento turístico voltado para a
comunidade e implica na inclusão dos residentes locais em todo o processo, desde a tomada
de decisões à avaliação dos retornos provenientes da implantação do turismo. O princípio
base dessa forma de planejar é a melhora do padrão de vida da sociedade receptora. Uma vez
que a comunidade local aceita a inserção do turismo, torna-se bem mais fácil expandir o setor.
Fazendo uma ponte, acha-se outra denominação para esse tipo de planejamento, pois
Molina e Rodríguez (2001) o chamam de participativo; somente uma mudança de termos,
pois a lógica e o enfoque são os mesmo. Tais autores adicionam uma reflexão,
fica evidente que para executar o planejamento participativo é imprescindível que exista vontade política para descentralizar o poder. Portanto, é necessário que sejam formulados mecanismos de consulta permanente, desde que sejam identificados organismos ou organizações representativos que se encarreguem de garantir que as decisões últimas do processo de planejamento participativo sejam postas em prática. (MOLINA E RODRÍGUEZ, 2001, p.124)
Na teoria, dois Programas Federais de desenvolvimento turístico propunham esse
método, o Plano Nacional de Municipalização do Turismo – PNMT (1994) e o Programa de
Regionalização do Turismo – Roteiros do Brasil (2004). Esses programas visavam dar
autonomia aos municípios e regiões, respectivamente, de forma a proporcionar um melhor
desenvolvimento regional, pois cada município/região saberia adotar as ações mais viáveis
para seu progresso. Mas é perceptível que o direcionamento para a
municipalização/regionalização e, mais que isso, para a participação da comunidade
efetivamente nas decisões, tem sido pouco consolidado desde sua proposta em 1994.
59
A partir do conhecimento das abordagens de planejamento, é cabível enfatizar que o
turismo sustentável, na verdade, é a junção das três últimas mencionadas. A atividade turística
na sua complexidade demanda planejamento integrado, ou seja, onde os componentes do setor
estejam devidamente sincronizados a fim de atingir metas e diretrizes a um mesmo tempo, o
que dará ao processo o dinamismo necessário a uma boa produtividade e sua sustentabilidade.
(BENI, 1997)
O processo de planejamento integrado necessita de uma parceria eficiente entre
governo, comunidade e iniciativa privada. A gestão participativa tem por propósito envolver,
integrar, a comunidade e o empresariado nas decisões políticas frente às ações que o
município assumirá para seu desenvolvimento. Agindo assim o governo compartilha a
responsabilidade das escolhas e proporciona melhor aceitação de suas ações perante os outros
atores envolvidos nas atividades. (BENI, 1997)
E como se faz o planejamento turístico? O planejamento da atividade é o traçar das
metas que se deseja alcançar com a implementação do turismo e os meios para concretizá-las,
sempre buscando a sustentabilidade do meio e da atividade.
O planejamento turístico ocorre de várias maneiras (desenvolvimento, infra-estrutura, uso do solo e de recursos, organização, recursos humanos, divulgação e marketing); estruturas (outro governo, organizações quase governamentais e não-governamentais); escalas (internacionais, transnacionais, nacionais, regionais, locais e setoriais) e em diferentes escalas de tempo (para desenvolvimento, implementação, avaliação e realização satisfatória dos objetivos do planejamento). (HALL, 2001, p.30-31)
Pela complexidade intrínseca à atividade é preciso um planejamento criterioso de uma
equipe multidisciplinar. Como o turismo envolve o cotidiano das pessoas, o espaço físico, a
economia e a cultura local, é necessário que vários pesquisadores estejam engajados nesse
projeto: bacharéis em turismo, biólogos, geógrafos, sociólogos, economistas, administradores
e representantes da comunidade local e do poder público. Um estudo geral sobre
comportamento econômico, social e ecológico é necessário a este planejamento.
Cabe fazer certos questionamentos: como cada ecossistema e cada sociedade se
comportará com a presença do turismo, do número de pessoas e de edificações que virão com
esta atividade? Os ecossistemas suportarão? A sociedade se beneficiará? É muito importante
que existam estudos que comprovem que o turismo não trará malefícios ou que seu não-êxito
produzirá efeitos drásticos a economia, a sociedade e o meio natural de onde vier a se instalar.
60
O mais comum no Brasil, principalmente em pequenas cidades litorâneas, é que se
promova o turismo sem o mínimo planejamento, seja espacial ou econômico. Visando o lucro
sem pensar nas conseqüências, ou ao menos, saber se o mesmo virá, os governos insistem em
promover o turismo como alicerce de sua economia. Muitas vezes os prejuízos financeiros e
ambientais tornam-se irrecuperáveis.
As áreas costeiras estão sujeitas às pressões urbano-industriais sem precedentes na historia. Em muitas regiões os mangues foram aterrados para a criação de infraestrutura urbana e turística. Alem disso, elas são administradas por instituições variadas com pouca coordenação e, como resultado, ecossistemas costeiros essenciais estão sendo destruídos, antes que um planejamento adequado seja formulado e implementado. (DIEGUES, 1989, p. 40)
Como já mencionado, as cidades precisam de um planejamento espacial (urbano), o
mesmo é apenas um dos primeiros passos ao implantar o turismo. O planejamento turístico
engloba planejamento espacial, econômico, político e sócio-cultural.
Na parte que cabe ao planejamento físico, além do já exposto quanto ao urbano, é
necessário estudo de capacidade de carga25 que possibilite quantificar o número apropriado de
pessoas que cada ecossistema suporta. Por exemplo, quantos turistas por dia ou hora um recife
de corais ou uma caverna suportam receber; ou quantas pessoas/embarcações podem trafegar
por um mangue sem alterar este meio. É imprescindível que o turismo procure sempre não
promover o esgotamento prematuro de recursos não-renováveis e não explorar
irracionalmente os renováveis.
Quanto à sociedade, tanto é importante saber se ela aceita esse fluxo turístico como
também se o mesmo não vai interferir na cultura local. É perceptível que em muitos casos a
comunidade local altera sua cultura devido a presença de turistas, algumas vezes por sentir
vergonha da sua cultura, outras por achar que a “do outro” é melhor. Assim muitos lugares
tornaram-se aculturados, passaram a exibir uma cultura de massa, totalmente artificial.
Outro problema é a perda da identidade local, uma vez que não se fortalecem os
costumes, as crenças, a cultura local, e o número de outras culturas ali circulantes é crescente,
as pessoas já não sabem a que identidade se apegar, o que é próprio do seu lugar ou o que é
forasteiro.
25 Segundo a Organização Mundial do Turismo – OMT (2001), a capacidade de carga refere-se ao grau máximo de uso que se pode fazer de um atrativo turístico sem causar efeitos negativos sobre seus recursos biológicos, sem reduzir a satisfação dos visitantes ou sem que sejam produzidos efeitos negativos sobre a comunidade receptora, a economia e a cultura local.
61
Ações políticas que promovam o turismo precisam ser conscientes, ou seja, com base
em estudos feitos na localidade e com profissionais qualificados para gerir a atividade.
Presença política para impor restrições quando o turismo ou seus produtores faltem com
respeito às leis ambientais ou quando pratiquem segregação social. E ainda, atuação política
de promoção da localidade, o marketing institucional que atraia turistas para seu
país/estado/município.
Economicamente é preciso ter cuidado para que o turismo não se sobreponha
erroneamente sobre outras fontes da economia local. Por exemplo, pescadores artesanais que
sempre viveram e se sustentaram desse trabalho o abandonem para trabalhar no turismo e
neste sejam explorados, sem direitos trabalhistas, com baixos salários, etc.
Por fim, a estrutura própria do turismo como hotéis, pousadas, bares e restaurantes,
equipamentos de lazer e recreação, precisam por sua vez ser edificados em locais apropriados
(definidos no zoneamento); empregar profissionais capacitados para a recepção dos turistas;
cumprir com sua responsabilidade ambiental e social.
Baseado em ações planejadas e em uma gestão coerente com as necessidades sociais e
a preservação ambiental, o turismo pode ser realmente uma atividade sustentável, que traz
desenvolvimento sem causar danos, perdas. Talvez a sociedade atual, como um todo, ainda
não esteja preparada para viver esse turismo, pois não só o poder público e o empresariado
vinculado ao turismo são responsáveis pelo seu êxito, turistas e a comunidade local têm o
mesmo poder de degradar e sobrecarregar o meio ambiente tornando-o incompatível à
atividade. A sociedade tem também responsabilidades para com o meio, dentro delas
inclusive, o dever de cobrar do setor público e do privado a preservação de um direito: um
ambiente saudável para se viver.
62
3 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA
Conforme já exposto, a área de estudo corresponde a três praias do litoral sul
paraibano: Jacumã, Carapibus e Tabatinga. As praias são destaque nos destinos turísticos do
Estado, principalmente as duas últimas, visto que a primeira já não possui tantos atrativos
devido a seu alto nível de degradação. Localizam-se no Município do Conde, este pertencente
à Região da Grande João Pessoa26.
3.1 Aspectos históricos e geográficos
3.1.1 Aspectos históricos
A ocupação do Conde a princípio deu-se pelos indígenas e depois por seus
descendentes, época onde a terra era utilizada para produção de alimentos em pequenas
unidades produtivas. O território do atual Município do Conde foi ocupado pela Aldeia
Jacoca, de índios Tabajaras, que por volta de 1589 era administrada pelos missionários
franciscanos (Plano Diretor do Conde, 2001).
No período colonial, os franceses ali chegaram para comerciar pau-brasil, fazendo de
Jacumã um dos portos naturais mais movimentados do Brasil durante o século XVI. Nesse
período, o município do Conde tinha sua população formada por índios, povo este que foi, ao
longo dos anos, desaparecendo, devido ao processo de mestiçagem27.
Mais recentemente, com a emancipação do município, desmembrado da capital
paraibana em 18 de novembro de 1963, as atividades e usos da terra mudaram bastante. Na
década de 60 surgiram os primeiros loteamentos residenciais, destinados principalmente à
atividade turística. Nos anos 70, o Programa Nacional do Álcool (Pró-Álcool) fez com que a
monocultura canavieira ocupasse grande parte do território do município, mas não chegou a
estar presente nesta área das praias, concentrando-se mais para o interior do município.
26 Que inclui os Municípios circunvizinhos à capital paraibana, além da mesma: João Pessoa, Bayeux, Santa Rita, Lucena, Cabedelo, Conde. 27 As informações contidas neste histórico podem ser estudadas em CAVALCANTI, Maria Helena et al. Uma História do Conde. João Pessoa: Ed Universitária/ UFPB, 1996.
63
Até 1970 a Praia de Jacumã era ocupada, prioritariamente, por pescadores cuja
atividade de subsistência fazia-se artesanal, como parte da cultura da região, e as demais
praias eram praticamente desocupadas. Mas a partir dessa década pode-se observar um
movimento de especuladores imobiliários no intuito de formar ali uma área de veraneio. Esse
processo de especulação se acelerou na década seguinte, anos de 1980, com o asfaltamento da
Rodovia PB-18 que liga a capital do Estado ao litoral sul e pela política de incentivo ao
desenvolvimento da atividade turística, fomentada pela Prefeitura Municipal do Conde e pelo
Governo do Estado da Paraíba.
A ocupação pela atividade turística de segundas residências começou lenta no início
da década de 1980, mas tornou-se massiva na última década do século XX, quando são
instaladas as inúmeras casas de veraneio na Praia de Jacumã e praias vizinhas. A partir deste
momento Jacumã passou a ter um processo de ocupação muito mais intenso em relação às
demais praias do litoral sul paraibano, inclusive em relação à Carapibus e Tabatinga.
Ocupação essa decorrente de um grande fluxo de veranistas e visitantes advindos
principalmente das cidades de Campina Grande, Recife e João Pessoa.
A ocupação da área, bem como a expansão urbana, foi tomando forma com a presença
dos turistas de segunda residência que estão intrinsecamente vinculados a criação do atual
espaço urbano das praias estudadas. Foram as segundas residências que marcaram o início da
urbanização local (começando por Jacumã), bem como a construção de empreendimentos e
implantação de infra-estrutura, que deram forma urbana à localidade. Como conseqüência
dessa apropriação do espaço da Praia de Jacumã e adjacências pelo turismo surgiram os
impactos que hoje são perceptíveis na área (social, ecológico, econômico, cultural e espacial),
os quais interferem negativamente na paisagem local.
Em 1968, foi criado o primeiro loteamento de Jacumã, o Cidade Balneário Novo
Mundo, representando o início da especulação imobiliária daquela área e a retirada da vila
caiçara situada próximo ao mar. Localizado bem no centro da praia, este loteamento hoje está
totalmente ocupado. Chama atenção o fato desse loteamento já ter no mínimo 50% de
moradores fixos, em vários casos aqueles que optaram por morar em Jacumã e trabalhar em
João Pessoa, ou aposentados que escolheram a praia para residir.
O loteamento vizinho ao sul, o Cidade Balneária Novo Mundo II, criado em 1970,
também já se encontra totalmente ocupado na sua porção localizada em Jacumã e em processo
de ocupação avançada na porção localizada em Carapibus. Na porção pertencente a Praia de
Carapibus, a maioria das casas são de segunda residências, sendo improvável encontrar
residentes fixos. Vale mencionar ainda que a Praia de Carapibus fica bastante “deserta” nos
períodos de baixa temporada, no sentido de que a maior pa
pousadas permanecem fechadas.
O loteamento Cidade Balneário II também compreende dentro de seus limites a praia
de Tabatinga, encontrando-
encontra-se em franca expansão, porém bem mais organizado do que nas praias vizinhas.
Cabe ressaltar que a porção do loteamento próxima a divisa com Carapibus é visivelmente
mais ocupada do que àquela próxima a divisa com Coqueirinho, onde Tabatinga possui
número mínimo de casas.
3.1.2 Aspectos geográficos
Para se ter uma visão geral da área de estudo com relação ao meio natural e social,
traz-se aqui uma breve descrição abordando: localização geográfica, vegetação, relevo,
hidrografia, clima e dados populacionais.
A área das três
7°16’45.12’’ e 7°19’42’’ de latitude Sul e 34°48’27.52’’ e 34°47’51.33’’ de longitude Oeste;
faz fronteira com a Praia de Barra de Gramame ao norte, com a Praia de Coqueirinho ao sul,
com o distrito do Guruji a oeste e com o Oceano Atlântico a leste. A área total de estudo
corresponde aproximadamente
Figura 4: Mapa de localização da área. Fonte: Siqueira, 2005.
períodos de baixa temporada, no sentido de que a maior parte de suas casas e pequenas
pousadas permanecem fechadas.
O loteamento Cidade Balneário II também compreende dentro de seus limites a praia
-se, porém em outro nível de crescimento. Nesta praia o loteamento
xpansão, porém bem mais organizado do que nas praias vizinhas.
Cabe ressaltar que a porção do loteamento próxima a divisa com Carapibus é visivelmente
mais ocupada do que àquela próxima a divisa com Coqueirinho, onde Tabatinga possui
Aspectos geográficos
Para se ter uma visão geral da área de estudo com relação ao meio natural e social,
se aqui uma breve descrição abordando: localização geográfica, vegetação, relevo,
hidrografia, clima e dados populacionais.
A área das três praias que está localizada entre as coordenadas geográficas
7°16’45.12’’ e 7°19’42’’ de latitude Sul e 34°48’27.52’’ e 34°47’51.33’’ de longitude Oeste;
faz fronteira com a Praia de Barra de Gramame ao norte, com a Praia de Coqueirinho ao sul,
to do Guruji a oeste e com o Oceano Atlântico a leste. A área total de estudo
rresponde aproximadamente a 4,5 km².
ocalização da área. Fonte: Siqueira, 2005.
64
rte de suas casas e pequenas
O loteamento Cidade Balneário II também compreende dentro de seus limites a praia
se, porém em outro nível de crescimento. Nesta praia o loteamento
xpansão, porém bem mais organizado do que nas praias vizinhas.
Cabe ressaltar que a porção do loteamento próxima a divisa com Carapibus é visivelmente
mais ocupada do que àquela próxima a divisa com Coqueirinho, onde Tabatinga possui
Para se ter uma visão geral da área de estudo com relação ao meio natural e social,
se aqui uma breve descrição abordando: localização geográfica, vegetação, relevo,
praias que está localizada entre as coordenadas geográficas
7°16’45.12’’ e 7°19’42’’ de latitude Sul e 34°48’27.52’’ e 34°47’51.33’’ de longitude Oeste;
faz fronteira com a Praia de Barra de Gramame ao norte, com a Praia de Coqueirinho ao sul,
to do Guruji a oeste e com o Oceano Atlântico a leste. A área total de estudo
65
O relevo que constitui a região está inserido basicamente em dois domínios
geomorfológicos: Baixos Planaltos Costeiros e Baixada Litorânea, cada um contendo várias
unidades morfológicas. Os Baixos Planaltos Costeiros fazem parte dos Tabuleiros Litorâneos,
que são “unidades geomorfológicas de superfícies aplainadas e suavemente inclinadas para
leste, sendo abruptamente interrompidos pelos entalhes fluviais e pelas falésias marinhas
esculpidas pela abrasão marinha atual e/ou pretérita” (FURRIER, 2007, p. 60-61).
As falésias marinhas são justamente o limite entre os Baixos Planaltos Costeiros e a
planície marinha, possuem alturas variadas28 e estão presentes em praticamente toda área de
estudo, estando ausentes apenas no inicio da Praia de Jacumã e nos arredores das lagunas
costeiras. Em uma pequena porção da Praia de Carapibus essas falésias são ativas - quando a
erosão marinha ainda as atinge, as demais encontram-se em inatividade, uma vez que o
processo erosivo marinho já não as atinge e apresentam vegetação no sopé.
A Baixada Litorânea constitui-se de terrenos relativamente planos de baixas altitudes,
geralmente inferiores a 10 metros, formados por sedimentos depositados no Quaternário.
Segundo Furrier (2007, p. 63), “a baixada litorânea é composta de formas variadas que
resultam da acumulação de sedimentos marinhos, fluviais, e flúvio-marinhos. Suas feições
geomorfológicas são divididas em praias, terraços marinhos, planícies marinhas, planícies
flúvio-marinhas, planícies fluviais e terraços fluviais”.
As praias são zonas perimetrais de um corpo de água composta de material
inconsolidado, em geral arenoso, que se estende desde o nível de baixa-mar até a linha de
vegetação permanente, ou quando há mudanças fisiológicas como zonas de dunas ou falésias
(Suguiu, 1998). Suguiu (1998, p. 749-750) define terraço marinho como: antigo relevo
costeiro, situado acima ou abaixo do nível marinho atual, representado por paleolinhas praiais
(ancient strandlenes). Por vezes pode ocorrer uma seqüência de terraços escalonados que
correspondem a estágios interglaciais e glaciais do hemisfério norte durante o período
Quaternário.
No que tange as planícies marinhas, segundo Guerra e Guerra (1997), elas também
podem ser chamadas de planície costeira, cuja definição de Suguiu (1998, p.607) diz: planície
de baixo gradiente que margeia corpos de água de grandes dimensões, como o mar ou oceano,
representado por faixas de terra recentemente emersas, compostas de sedimentos marinhos e
flúvio-marinhos, em igual idade quaternária.
28 Segundo Silva (2010) estas falésias possuem altura média entre 50 e 60 metros.
66
Planícies flúvio-marinas são áreas inundáveis que se localizam nos baixos cursos dos
rios e que sofrem influência das oscilações das marés; constituem-se de sedimentos areno-
argilosos, ricos em matéria orgânica, que dão suporte aos manguezais. Planícies fluviais são
os terrenos que correm ao lado dos rios, constantemente inundados pela vazão do rio,
possuem grande concentração de matéria orgânica. Já os terraços fluviais são aquelas áreas
onde a vazante e enchente do rio não mais alcançam, ou seja, estão após as planícies fluviais.
Foto 1: Vista geral do relevo Praia de Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 2: Vista geral relevo do Praia de Carapibus. Fonte: Kiyotani, 2010.
67
Foto 3: Vista geral do relevo praia de Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
Vários rios, riachos e córregos abastecem o litoral do Conde, tornando-se fonte de
água e fonte econômica, posto que servem para a agricultura, a pesca e o lazer. Destacam-se
na área o Rio Guruji e os Rios Tabatinga e Bucatu. O Rio Guruji é formado da união dos
riachos Estiva e Pau de Ferro, e sua desembocadura no mar forma o estuário do Guruji. O Rio
Tabatinga forma em sua foz uma laguna costeira de mesmo nome e que, freqüentemente, de
acordo com a maré, é barrada por cordão arenoso impossibilitando o contato do rio com o mar
(divisa da praia de Carapibus com a praia de Tabatinga). O Rio Bucatu também forma laguna
costeira na foz, esta denominada Lagoa Preta.
É preciso citar ainda a Lagoa de Carapibus (popularmente conhecido como Maceió de
Jacumã, foto 4), outra laguna costeira importante na região – divisa entre Jacumã e Carapibus.
Chama-se atenção para estas formações lagunares, pois, junto com o mar, são os principais
focos de atração do turista e principal atrativo dos excursionistas29.
29 Excursionista é um conceito diferente do de turista, pois o primeiro é o indivíduo que visita uma localidade por um dia. Normalmente excursões são feitas em ônibus fretado e, no caso de estudo, procedem em geral de municípios interioranos que distam em média 80 km de Jacumã.
68
Foto 4: Laguna costeira em Jacumã no período de Carnaval. Fonte: Sandra Coutinho, 1999.
Inserida na Zona da Mata paraibana a região possui clima AS’ (quente e úmido),
segundo classificação de Köppen, apresentando verões secos com período de estiagem de 5 a
6 meses e invernos chuvosos. A temperatura média anual varia de 23°C a 26°C, apresentando
mínimas médias mensais de 19°C e máximas médias mensais de 32°C. A umidade relativa do
ar é alta, ficando na casa dos 80% (PDDM, 2001).
A vegetação é bastante variada devido à diversidade morfológica e de solos e às
diversas condições ambientais. É perceptível também que, devido à forte ação antrópica,
todos os tipos vegetais da área encontram-se alterados, alguns de forma irreversível, sendo a
especulação imobiliária e a expansão urbana seus maiores propulsores nas praias em questão
(FURRIER, 2007). De acordo com o Plano Diretor do Conde (2001) encontram-se ali três
tipos de vegetação: vegetação pioneira, vegetação de manguezais e Mata Atlântica (ou mata
úmida).
A vegetação pioneira ocupa estreita faixa ao longo do litoral do Conde, geralmente
está presente próximo às falésias inativas da região, constituindo-se em importante indicador
de estabilidade costeira, já que são sensíveis ao embate das ondas. Está composta por
vegetação herbácea adaptada às condições de elevada salinidade, e as espécies comumente
encontradas são a salsa-de-praia (Ipomoea pescaprae) e o bredo-de-praia (Blutaparon
portulacoides).
69
Foto 5: Vista geral da praia de Tabatinga, com destaque à: Coqueiral (1), vegetação pioneira indicadora de estabilidade costeira (2). Fonte: Kiyotani, 2010.
Na medida em que se adentra ao continente, a vegetação passa a ser mais arbustiva de
densidade variável, devido ao menor teor de salinidade e aos solos mais enriquecidos de
matéria orgânica. As espécies mais presentes são o pinheirinho-da-praia (Mariscus maritimus)
e o capim gengibre (Cymbopogon martinii). Verificam-se também árvores frutíferas como o
cajueiro (Anacardium occidentale) e a mangabeira (Harconia speciosa).
Foto 6: Vegetação arbustiva na área de praia em Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 7: Vegetação de maior porte com destaque à mangabeira (Harconia speciosa), na região de Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
2
1
70
Os manguezais possuem vegetação perenifólia que se estabelecem em ambiente
fluviomarinho, suas raízes respiratórias (pneumatóforos) é uma característica forte e servem
para compensar a deficiência de aeração do solo. As principais espécies encontradas são o
mangue vermelho (Rhizophora mangle), o mangue de botão (Conocarpus erectus) e o
mangue branco (Laguncularia racemosa). Em Jacumã encontra-se uma laguna costeira
denominada Lagoa de Carapibus, alimentada provavelmente pelo Riacho Estivas – divisa com
Carapibus. Em Carapibus há uma laguna costeira formada pelo Rio Tabatinga, conhecida
como maceió de Carapibus – divisa com a praia de Tabatinga. Em Tabatinga encontra-se o
estuário e a laguna costeira formados pelo Rio Bucatu, essa laguna é mais conhecida como
Lagoa Preta.
Foto 8: Vegetação de manguezal em Tabatinga. Fonte: Gutierres, 2010.
Foto 9: Vegetação de manguezal em Carapibus. Fonte: Kiyotani, 2010.
Já a formação de Mata Atlântica que originalmente cobria todo litoral nordestino com
árvores de grande porte e vegetação densa, hoje se encontra em pequenas porções espalhadas
por este litoral.
71
Foto 10: Exemplo de mata de restinga na praia de Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
Alguns dados populacionais são necessários para o entendimento da questão abordada
neste trabalho. Os dados demográficos e os referentes aos domicílios do Município do Conde
cadastrados pelo IGBE, também traduzem essa expansão urbana. No VIII Recenseamento
Geral de 1970 (IBGE, 1970) a população total do Conde era de 4.915 habitantes, em 1980
esse número passa a 6.365; em 1991, são 10.396 habitantes; e em 2000 o total é de 16.413
habitantes. A população vinha crescendo rapidamente, comprovando à procura pelo
município ou o crescimento das famílias ali domiciliadas.
Um novo dado trazido pelo Censo 2010 (IBGE, 2011) alerta para um processo
inverso, o total da população do município caiu para 14.495. Provavelmente essa queda da
população total deu-se por êxodo de residentes fixos, já que a especulação imobiliária
demonstra crescimento da procura por lotes advindos de moradores externos ao Conde.
É interessante também registrar que no censo de 1980 (IBGE, 1982), pela primeira
vez, foram analisados os domicílios particulares e coletivos que se encontravam fechados,
vagos ou que tinham uso ocasional. Este ponto é bastante importante para o turismo de
segundas residências visto que se têm números que as indicam, enquadrando-as
principalmente na categoria “uso ocasional”. Para a presente pesquisa, no censo de 1980, a
categoria “vagos” tornou-se mais representativa, pois relatam sobre propriedades urbanas que
se encontram vagas, ao contrário da categoria “uso ocupacional” que somente achou
72
referencias na área rural. Do total de domicílios particulares, 189 estão em área urbana, onde
30 estavam vagas. (IBGE, 1982, p. 38)
O censo de 1991 trouxe pela segunda vez a análise de domicílios particulares e
coletivos que se encontravam fechados, vagos ou que tinham uso ocasional. Neste caso, o
total de domicílios particulares já havia alcançado os 3.500 sendo 1.413 em área urbana, tendo
658 ocupados. Dentre os não ocupados, 755 domicílios estão em área urbana, e 666 deste
estão cadastrados como “uso ocasional”, 09 “fechados” e 80 “vagos”.
Pela primeira vez, no X Recenseamento Geral (1991, p. 205) foi analisado o destino
do lixo por domicílio, registrando-se: total coletado: 245 domicílios, sendo 229 diretamente e
16 indiretamente; queimado: 175 domicílios; enterrado: 53 domicílios; jogado em terreno
baldio: 1.631 domicílios; jogado em rio, lago ou mar: 5 domicílios; outros: 6. Por estes
números é possível verificar que o número de domicílios que ainda descartavam seus resíduos
em lugares impróprios é muito maior que aqueles que têm coleta apropriada. Desse dado,
reflete-se que desde o começo da ocupação da área não houve preocupação em conter a
degradação ambiental. O descaso ainda é visto hoje em dia, com pilhas de lixo espalhadas
pelas ruas e terrenos baldios, principalmente de Jacumã.
Os dados demográficos obtidos pelo Censo 2010 ainda estão sendo processados, por
esse fato não foi possível registrá-los detalhadamente no presente trabalho. Segue os dados
tabulados pelo IBGE (IBGE, 2011) até o momento que possuem vínculo com a pesquisa:
• Total de domicílios particulares não-ocupados fechados: 14;
• Total de domicílios particulares não-ocupados de uso ocasional: 3.315;
• Total de domicílios particulares não-ocupados vagos: 1.178.
Esses números não estão divididos em área urbana e rural, tornando-se assim difícil
analisá-los como números referentes às segundas residências na área urbana Jacumã,
Carapibus e Tabatinga. É possível apenas avaliar que boa parte destes domicílios acima
catalogados provavelmente está na área estudada, já que a mesma possui a maior
concentração de moradias secundárias urbanas, com características de “não ocupados
fechados”, “de uso ocasional” e “não ocupados vagos”.
73
4. MÉTODO E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
4.1 Método
O método estabelece para uma pesquisa científica o norte, no sentido de orientá-la
durante sua composição, sendo fundamental para estruturação de elementos lógicos básicos
para o encaminhamento do raciocínio (SPOSITO, 2004). Segundo Sposito (2004, p.23) o
método tem de ser visto como um “instrumento intelectual e racional que possibilite a
apreensão da realidade objetivada pelo investigador, quando este pretende fazer uma leitura
dessa realidade e estabelecer verdades científicas para sua investigação”.
Diante da escolha do método, a pesquisa aqui exposta baseou-se a princípio no método
hipotético-dedutivo, pois parte-se de uma pergunta-chave (como?) e de uma hipótese (que o
turismo de segundas residências vem degradando o meio e a paisagem local) e ao longo do
trabalho procura-se comprovar que a hipótese é válida e responder à pergunta. Tendo suas
raízes no pensamento de René Descartes esse método faz da razão e do rigor matemático sua
base. Parte-se do pressuposto de que só a razão pode construir ciência, posto que a sensação
(os sentidos) pode enganar o discernimento do pesquisador. A razão nos permite ver com
clareza e encadear as evidências (SPOSITO, 2004).
Esta pesquisa parte da razão, visto que não é possível trabalhar com sensações e com
conceitos preexistentes ao que é nitidamente verificável no campo – área de estudo. Não se
faz possível impor à análise proposta uma visão pessoal (subjetividade) sobre o turismo que
acontece na região, por exemplo. É necessário afastar a visão particular e tornar-se neutro
para poder analisar.
A partir das regras enumeradas por Vergez & Huisman (apud SPOSITO, 2004, p.30),
confirma -se que o trabalho como hipotético-dedutivo:
� Primeira regra: evidência. No presente trabalho pode-se distinguir e comprovar com
propriedade que a paisagem e o meio ambiente foram alterados nas praias de Jacumã,
Carapibus e Tabatinga.
� Segunda regra: análise. Partindo da evidência acima, analisa-se por partes o que foi
alterado: área desmatada, poluição dos rios e mangues, depósito de lixo nas ruas,
esgoto a céu aberto, número de construções irregulares perante legislação, etc.
74
� Terceira regra: síntese. Posto que a análise traga o suporte para concluir a(s)
hipótese(s) previamente colocada, conclui-se por partes como ocorreu o impacto sobre
a paisagem e sobre o meio ambiente, se estes são positivos ou negativos. No caso dos
negativos se são permanentes ou podem ser revertidos.
� Quarta regra: desdobramentos tão completos... Espera-se conseguir responder as
perguntas iniciais com devida clareza ao final da pesquisa, contando com o fato de
desmembrar os problemas de forma que suas análises e conclusões possam ser claras a
qualquer pessoa que leia esta dissertação.
Outro método empregado na pesquisa, principalmente para análise dos dados foi o
funcionalista. No método funcionalista parte-se do pressuposto de estudar o particular sem
perder de vista a generalidade, pois ao mesmo tempo em que cada objeto (paisagem e
ambiente) é único, ele articula-se com outros nas suas igualdades/generalidades. São
analisadas, portanto, as relações e as interações.
O método funcionalista tem relação com a Teoria Organicista das ciências biológicas
e naturais, onde “o todo encontra-se regido pelas diferentes funções das diferentes partes”
(BRAY, 2008, p.4). Ainda sobre isto, para Alves e Ferreira (2009, p.6): a relação entre
organismo das ciências naturais e a organização do espaço da geografia é fundamental para
entender o método funcionalista.
Esse método por sua vez utiliza-se da abordagem sistêmica para sua metodologia de
análise. O pensamento sistêmico adotado proporciona a compreensão da realidade, onde os
elementos do sistema interagem; conseqüentemente, a mudança de estado de um dos
elementos implicará a alteração de todo o conjunto (BRAY, 2008). Segundo Antônio Filho e
Dezan (2009, p. 9), “a abordagem sistêmica entende a realidade como um fenômeno
organizacional. Como um sistema que apresenta partes concatenadas, busca sempre a
harmonia”.
A cooperação entre os elementos de um sistema é analisada por essa abordagem.
Partindo do conceito de sinergia, onde existe um esforço simultâneo das várias partes para a
realização de uma dada função, tem-se como resultado ações conjuntas dirigidas a fins
coletivos (DALLABRIDA, 2006). A atitude cooperativa entre os seres remete mais uma vez à
busca do equilíbrio, este decorrente sempre de reajustamentos constantes que o torne possível.
Um ambiente em equilíbrio depende da harmonia entre as partes.
75
4.2 Procedimentos metodológicos
As técnicas utilizadas para alcançar os resultados foram:
� Pesquisa bibliográfica e iconográfica;
� Trabalho de campo: aplicação de entrevistas e verificação de localização das segundas
residências;
� Produção de mapas.
O trabalho buscou embasamento teórico em pesquisa bibliográfica, utilizando para
isso livros, artigos, teses, dissertações e periódicos que discursem sobre o tema proposto:
paisagem, meio ambiente, degradação ambiental, turismo, Jacumã, Carapibus, Tabatinga,
Município do Conde - PB. Os dados demográficos foram obtidos pelo site do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. A pesquisa bibliográfica foi efetuada nas
bibliotecas da Universidade Federal da Paraíba, em órgãos municipais do Conde, bem como
na Rede Mundial de Computadores.
Fotografias, fotografias aéreas e imagens de satélite foram utilizadas como fontes de
dados espaciais e históricos para verificação do processo de ocupação da área de estudo, bem
como na análise das modificações da paisagem e da deterioração do meio. As fotografias
foram obtidas in loco e mediante outros trabalhos de pesquisa realizados na mesma área. As
fotografias aéreas foram obtidas em dois órgãos governamentais: na Companhia de
Desenvolvimento de Recursos Minerais da Paraíba – CDRM (ano de 1969) e no Instituto de
Terras e Planejamento Agrícola da Paraíba – INTERPA (ano de 1985). A imagem de satélite
utilizada foi captada pelo Satélite Quick Bird em 2008, com resolução de 0,62 metros,
adquirida pela Prefeitura Municipal do Conde.
O trabalho de campo teve propósito na aplicação de entrevistas, na verificação da
localização das segundas residências para posterior mapeamento, como também para
visualizar e registrar a degradação do meio nas praias pesquisadas através de fotografias. As
entrevistas foram aplicadas in loco nas Praias de Jacumã, Carapibus e Tabatinga, em uma
amostragem de 10, 08 e 07 respectivamente. A proporção das entrevistas foi escolhida pelo
montante de casas de cada praia, sendo levado ainda em consideração o número de moradores
fixos presente na área de Jacumã, de casas vazias/fechadas em Carapibus e o pequeno número
de construções em Tabatinga; tais equivalências foram tanto constatadas in loco como através
76
de conversas com as agentes de saúde da região. O critério para escolha dos entrevistados é
que os mesmos sejam proprietários de segundas residências nestas praias.
Outra etapa das entrevistas foi sua aplicação ao setor público municipal,
especificamente ao Secretário de Turismo, ao responsável pelo Núcleo Administrativo de
Jacumã e à Secretaria de Planejamento. Nesta última a entrevista não pode ser realizada com
o Secretário pelo cargo estar transitando para outro responsável, assim o geógrafo da
Secretaria foi a pessoa indicada para conceder a entrevista.
As entrevistas aplicadas foram do tipo semi-aberta na qual, perguntas pré-definidas
são aplicadas de forma não indutiva, deixando o entrevistado livre para apresentar sua
opinião. Esse tipo de entrevista proporciona certa abertura para que o entrevistado exponha
outras colocações sobre o assunto, porém que não estejam necessariamente nas perguntas,
bem como deixa o entrevistador livre para acrescentar questionamentos que surjam durante a
entrevista com propósito de sanar dúvidas ou acrescentar detalhes à pesquisa.
Buscou-se com as entrevistas apreender como se deu o processo de ocupação e qual a
percepção que os entrevistados têm sobre a degradação do ambiente e da paisagem locais.
Também se procurou analisar as preocupações que esses mesmos residentes temporários e
governantes têm perante o meio e, o que ou se, é feito para preservação do mesmo. Com o
conteúdo adquirido através das entrevistas foi possível ratificar a percepção inicial sobre o
processo de ocupação – rápido e desordenado, com deficiências em infraestrutura e
conseqüente degradação ambiental.
Neste trabalho tomou-se por degradação ambiental o impacto30 negativo causado pela
atividade turística, como: desmatamento advindo do turismo para construção das segundas
residências; poluição das praias, lagunas costeiras e mangues com materiais não degradáveis
trazidos pelos turistas/excursionistas; acúmulo de lixo nas ruas e terrenos baldios decorrente
do aumento das segundas residências; falta de saneamento básico, inclusive com esgotos
correndo a céu aberto; construções irregulares que infringem as Leis Ambientais vigentes no
país, Estado ou município.
Já por degradação paisagística, além de todos os fatores citados acima (afinal
degradação ambiental também implica em modificação da paisagem), foi verificado a questão
estética. Por impactos causados a paisagem no local, analisou-se: perda do verde; perda da
30 Segundo o Conselho Nacional do Meio Ambiente, impacto ambiental é “qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas, que direta ou indiretamente afetam: a saúde, a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a biota; as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; a qualidade dos recursos ambientais.” (Resolução 0001/86 - CONAMA)
77
visibilidade/contemplação do mar pelas construções irregulares na borda das falésias; sujeira
nas praias, lagunas costeiras e mangues, prejudicando a apreciação dos mesmos; derrubada de
coqueiros característicos do ambiente daquelas praias; construções em declividades que
margeiam as três praias, que no caso prejudicam a vegetação e/ou a geomorfologia impressa
na paisagem; acúmulo de lixo e esgotos escorrendo nas ruas, que prejudica a própria imagem
que todos levam das praias; as construções particulares irregulares em espaços públicos, que
privatizam e alteram a paisagem pertencente ao coletivo.
Na produção dos mapas tomou-se por base a tecnologia do Geoprocessamento.
Enquanto vários autores fazem uma leitura do geoprocessamento apenas como uma
tecnologia de processamento de dados georeferenciados, Rocha (2000, p. 210) vai além e
define-o como:
uma tecnologia transdisciplinar, que, através da axiomática da localização e do processamento de dados geográficos, integra várias disciplinas, equipamentos, programas, processos, entidades, dados, metodologias e pessoas para coleta, tratamento, análise e apresentação de informações associadas a mapas digitais georeferenciados.
O geoprocessamento tem como principal ferramenta o Sistema de Informação
Geográfica – SIG. O SIG é um sistema que tem capacidade de adquirir, armazenar, tratar,
integrar, processar, recuperar, transformar, manipular, modelar, atualizar, analisar e exibir
informações digitais georeferenciadas, topologicamente estruturadas, que estejam ou não
associadas a um banco de dados alfanumérico (ROCHA, 2000).
Sendo assim, baseado no geoprocessamento e trabalhando com SIG, neste trabalho foi
obtido um banco de dados, anteriormente composto31, no qual foram introduzidos novos e
diferentes dados espaciais para construção do mapa final aqui proposto. O mapa final é uma
análise da ocupação urbana produzida pela atividade turística de segundas residências, exibe
sua extensão espacial e confronta esta área de segundas residências com a legislação
ambiental em vigor, demonstrando o impacto ambiental provocada pela mesma.
Foram produzidos e/ou adaptados mapas que demonstram o processo de ocupação
sofrido pela área de estudo, como também aqueles que apontam a ocupação em áreas
irregulares, ou seja, que por legislação brasileira são preservadas. Para essa produção adotou-
se a técnica de sobreposição de mapas (overlay).
31 O banco de dados foi obtido da pesquisa efetuada pela mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente Lílian Ferreira Cardoso da Silva, titulada pelo PRODEMA/UFPB em 2010.
78
A sobreposição de mapas, ou de cartas temáticas, refere-se a sobrepor duas ou mais
cartas para efetuar uma análise do ambiente. Segundo Moura (1993, p. 4), “os mapas
temáticos, também chamados themes, overlays, coverages, data planes, layers ou levels,
conformam um sistema para responder perguntas, embasar decisões ou auxiliar na resolução
de problemas”. Assim, neste trabalho foi utilizada a carta de localização das segundas
residências sobreposta a de preservação ambiental da área para demonstrar como essas
residências turísticas estão compondo e se relacionando com o ambiente. A carta de
preservação ambiental foi adquirida a partir da dissertação de mestrado de Silva (2010) e
construída com base na legislação ambiental e de uso do solo vigente no país.
A metodologia aplicada tem na Análise Ambiental seu objetivo. Visando reconhecer a
relação entre natureza e sociedade e suas implicações, a análise ambiental é fundamental para
diagnosticar e prognosticar problemas advindos dessa relação. Um importante instrumento na
tentativa de equilibrar as manifestações sociais sobre o meio é o Zoneamento Ecológico
Econômico – ZEE, criado pelo Ministério do Meio Ambiente. Segundo o próprio MMA,
O ZEE é instrumento para planejar e ordenar o território brasileiro, harmonizando as relações econômicas, sociais e ambientais que nele acontecem. Demanda um efetivo esforço de compartilhamento institucional, voltado para a integração das ações e políticas públicas territoriais, bem como articulação com a sociedade civil, congregando seus interesses em torno de um pacto pela gestão do território. (BRASIL, 2010)
Partindo desse pressuposto de gestão ambiental e do uso do solo, o trabalho apresenta
em mapa a situação atual de ocupação por residências secundárias turísticas x impacto
ambiental. Outros dois mapas também foram produzidos para visualizar o crescimento urbano
da área, demonstrando que os loteamentos e construções retiraram bastante da vegetação
nativa, possibilitando ver quanto da mancha urbana é tomada pela atividade turística.
Na construção dos mapas foi utilizado o software Spring. O Spring é um programa
gráfico utilizado nas técnicas do georeferenciamento desenvolvido por pesquisadores do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE e está disponível para download gratuito na
página do mesmo32. O Sistema de Processamento de Informações Georeferenciadas – Spring
é um SIG com funções de processamento de imagens, análise espacial, modelagem numérica
de terreno e consulta a bancos de dados espaciais.
32 A página do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais está disponível no endereço: http://www.inpe.br/.
79
Além do programa Spring, foram utilizados outros dois programas complementares
(que acompanham o software): o Impima, onde foram abertos alguns formatos de
imagens/dados e convertidos para a extensão sgp, assim podendo ser aberto no Spring; e o
Scarta, programa de geração e edição de cartas para posterior impressão.
Como parte da metodologia foi designado um recorte temporal que pudesse envolver e
demonstrar as transformações ocorridas na área analisada, esse período corresponde as
décadas de 1970-2010. No processo de análise, porém, obteve-se via fotografia aérea a
comprovação de que na década de 1970 a urbanização ainda não chegara às praias estudadas,
por isso optou-se por apenas mencionar esta década como parâmetro que possibilitou
veracidade da não ocupação. Já da década de 1980 até o ano 2008 (imagem de satélite mais
recente), foi feita uma análise da progressão da malha urbana e das construções advindas da
atividade turística de segundas residências nesses últimos 28 anos. A evolução dessa malha
urbana pôde ser comprovada pelas fotografias aéreas e pela imagem de satélite.
80
5. RESULTADOS E DISCUSSÕES
As entrevistas realizadas com os proprietários de segundas residências e com o poder
público tiveram como propósito avaliar as condições ambientais e as transformações
paisagísticas identificadas por esses desde quando começaram a freqüentar a praia e/ou
trabalhar no poder público municipal. Especificamente dos gestores públicos entrevistados,
procurou-se saber quais as medidas tomadas para evitar ou mitigar os impactos ambientais e
paisagísticos identificados na área33.
A análise dos resultados parte do princípio de que a atividade turística foi ocupando a
área sem que o poder público agisse com fins de planejamento urbano, deixando de pôr em
prática os instrumentos legais que condicionam essa ocupação (Plano Diretor, Plano Nacional
de Gerenciamento Costeiro, Projeto Orla, etc.).
5.1 Entrevistas
5.1.1 Percepções dos proprietários de segundas residências: infraestrutura,
impactos paisagísticos e ambientais
As entrevistas aos proprietários de segundas residências demonstraram opiniões e
níveis de conscientização bastante diversos entre os entrevistados, bem como foi possível
verificar, em alguns casos, discursos totalmente contraditórios entre o que se pensa a respeito
da conservação do meio ambiente e o que se quer ter no local escolhido para o lazer. Em
várias colocações pôde ser observado que elas partiram de um processo de perceber o
ambiente e a paisagem. A percepção é construída na vivência com o meio e influenciada por
questões particulares a cada indivíduo (valores, motivações, sentimentos, cultura, etc.).
Começando pela análise das entrevistas realizadas em Jacumã, tem-se que a maioria
dos proprietários reside em João Pessoa, ao mesmo tempo essa é a praia que apresenta maior
diversidade de origem do fluxo de segundos residentes. Foram citadas cidades como Olinda,
Recife, Brasília e o interior da Paraíba como local de residência fixa. Os motivos que
33 O questionário das entrevistas segue em anexo.
81
trouxeram essas pessoas à Jacumã também foram diversos: busca de lazer com a família; lazer
com os amigos; a beleza da praia e a tranqüilidade.
Grande parte dos entrevistados comprou suas segundas residências na década de 1990,
apenas 20% realizaram a compra no início dos anos 2000. Apenas duas pessoas responderam
a pergunta quanto à freqüência de visitação com “apenas veraneio”, outras duas responderam
que em média freqüentavam de dois em dois meses mais o veraneio e as demais disseram que
constantemente, todos os finais de semana ou feriados – além do veraneio, estavam na praia.
Quando a pergunta se referiu à preocupação que tiveram quanto a não degradar o meio
ao comprar a casa ou terreno, duas pessoas responderam que não houve preocupação se
ocorreria degradação. As demais disseram haver se preocupado e relatam a derrubada de
vegetação e a construção de fossas como fator principal: “Aqui era quase despovoado, não
havia casa em volta, mas eu me preocupei sim com o meio ambiente porque era toda cheia de
coqueiros na beira-mar e derrubaram os coqueiros todos” – relato do primeiro entrevistado em
Jacumã.
É preciso dizer que o processo de desmate, do corte da vegetação para implantação das
construções (casa residenciais e comerciais, espaços públicos, etc.), é inerente ao próprio
crescimento urbano, mas ele torna-se preocupante quando efetuado dentro de áreas de
preservação, como mangues, falésias, praias, margens de rios, ambientes esses encontrados na
área pesquisada. Algumas das construções acabaram, por estar em área de preservação,
degradando o ambiente já no momento de sua construção, pois derrubaram ilegalmente a
vegetação preservada por lei.
Ainda sobre a derrubada de árvores, é cabível comentar que, apesar de muitas árvores
terem sido cortadas legalmente, é positivo o entendimento geral dos entrevistados de que o
corte é algo que degrada o meio, pois dessa forma alguns tentam, da maneira possível,
preservar um mínimo de vegetação em seu terreno.
Percebe-se que as pessoas por vezes até podem ter a preocupação em não degradar,
mas não fazem muito para evitar as várias formas de degradações encontradas na área. A
segunda entrevistada disse que o IBAMA visitou a propriedade antes da construção da casa e
deu orientações sobre derrubada e replantio da vegetação e concluiu: quem derrubava um
coqueiro, plantava dois – segunda entrevista.
A quinta e sexta pergunta se referem à infraestrutura. Primeiramente foi questionado
se houve preocupação em ter informações sobre esse quesito no momento da compra, três
pessoas disseram não ter se preocupado em saber e sete disseram saber que não havia na área
infraestrutura básica ou de apoio aos moradores e visitantes. Depois foi perguntado se algum
82
tipo de infraestrutura fazia falta na área e qual (is) seria(m), todos responderam que sim;
quanto aos itens de infraestrutura que mais deixam a desejar, segue o gráfico:
Gráfico 1: Infraestrutura deficitária em Jacumã em 2010
Algumas outras respostas convêm mencionar: “[A gente] Sente aqui é falta de
investimento do governo municipal, aqui é esquecido, já mais pra frente tem outras praias que
tem mais estrutura que aqui. Tem uma rua ali que tem esgoto a céu aberto. Calçamento,
quando dá uma chuva aqui empoça água” – sexto entrevistado. “[Aqui] Encontra dificuldade
de encontrar local para pequenas compras, pão, etc.” – oitavo entrevistado. São inúmeras as
queixas, o que se nota é que falta desde necessidades básicas de habitação à conveniências
necessárias.
O esgoto a céu aberto mencionado pelo sexto entrevistado pode ser visto em várias
ruas de Jacumã (fotos 11 e 12), e realmente não encontrado nas duas outras praias. Já a falta
de calçamento (fotos 13 e 14) está presente tanto nas ruas de Jacumã quanto nas das demais.
Em Jacumã nota-se ainda o descuido com os equipamentos públicos, a exemplo das condições
precárias da área em torno da quadra poliesportiva (foto 14).
21%
42%
16%
21%
Infraestrutura deficitária
Água encanada/fornecimento constante
Coleta de lixo
Calçamento de ruas
Equipamentos públicos e privados de apoio a população
83
Foto 11: Esgoto a céu aberto em Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 12: Água correndo junto ao lixo na PB-008, principal Avenida em Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 13: Falta de calçamento de rua – Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 14: Falta de calçamento nos arredores da quadra esportiva de Jacumã – principal equipamento de lazer público. Fonte: Kiyotani, 2010.
O esgoto a céu aberto, além de prejudicar a paisagem do local e degradar o meio, é
acima de tudo um problema de saúde pública, pois pode vir a ser causador de doenças
decorrente dos agentes contaminantes contidos na água poluída do esgoto. Fora a água
poluída com detritos de origem humana, a mesma também está sujeita a contaminação por
urina e fezes de ratos e outros agentes patogênicos.
Já o não calçamento das ruas traz transtornos à população, como a dificuldade em
trafegar e a poeira levantada do barro no período do verão. É fato que a falta de calçamento
em alguns pontos também é prejudicial ao turismo, como as condições encontradas próximo à
Quadra de Jacumã (foto 14), que poderia ser um ponto turístico a partir do momento em que
fosse bem equipada e esteticamente agradável aos olhos. Hoje a quadra é ponto de encontro
de residentes e palco de várias manifestações populares, e mesmo assim não valorizada,
demonstrando que o bem coletivo e as relações sociais não estão sendo levados em
consideração pelo poder público.
84
A sétima e oitava perguntas são respectivamente: se foi, à época, economicamente
viável comprar/construir uma segunda residência em Jacumã e se permanece sendo
economicamente viável mantê-la. Todas as respostas para ambas as perguntas foram que sim,
apenas um entrevistado fez um pesar: “Apesar de ter essas coisas [mencionadas na resposta
6], tem uma praia aí belíssima. O que faz muita gente vir aqui é o mar, porque a cidade em si
não te oferece muita coisa não, se fosse só pela cidade eu jamais investiria aqui. Não só eu,
mas as pessoas que vem aqui só levam a beleza natural mesmo” – quarto entrevistado.
Com relação à modificação percebida na paisagem e no meio ambiente, foi perguntado
se desde o ano da compra/construção a pessoa teria algo a mencionar e/ou reclamar sobre a
área e o que acha que precisa melhorar. Como as respostas para esta pergunta são as mais
importantes para a presente pesquisa, opta-se por transcrevê-las na íntegra aqui:
1º. Entrevistado: “A infraestrutura de ruas tem que melhorar; a coleta e a varredura de
lixo, a sujeira nas praias. (...) Derrubou-se muito coqueiro”.
2º. Entrevistado: “Por exemplo, lixo na frente, deveria ter uma coleta, eles passam todos
os dias, mas jogam no chão, as moscas vêm para dentro de casa (...) falta de esgoto,
saneamento. Mais funcionários também pra limpar as ruas, está muito feia, a gente vai
pela beira-mar e ver os pedaços de sujeira. Também tem que educar o povo (...) o
homem do picolé vem e joga os saquinhos ali no muro. Modificou muito, a
urbanização chegou! O homem que não cuida”.
3º. Entrevistado: “Continua linda”.
4º. Entrevistado: “Mudou muito, o mar avançou, as construções pro lado de Carapibus e
Tabatinga... e as derrubadas, vão derrubando e construindo. Os maceiós são bastante
poluídos, se você vier no domingo ou na segunda cedinho, o que vai ver de garrafa
pet, sacola plástica, de palito e saquinho de picolé, de garrafa de cachaça, você olha
assim e diz meu Deus, muita sujeira mesmo, bastante!(...) Não há preocupação dos
moradores quanto à preservação”.
5º. Entrevistado: “A invasão de barracas, Jacumã cresceu demais, desordenadamente, eu
acho que não houve uma preocupação com o planejamento pra que a gente também
recebesse os turistas nessa temporada. A derrubada de árvores, a exploração dos
imóveis; as pessoas não respeitam as áreas de preservação”.
6º. Entrevistado: “O avanço do mar já derrubou casas de caiçaras e vai destruir barracas”.
85
7º. Entrevistado: “Em termos de estrutura está melhor do que antes. O que falta aqui é
investimento em calçamento, estrutura de saúde, não tem uma ambulância, não tem
nada. Falta coleta de lixo também”.
8º. Entrevistado: “A questão da prefeitura é horrível né, porque a gente vê sujeira na praia
que devia ser limpa”.
9º. Entrevistado: “A praia está mais agitada, tem bem mais gente e casa, ai a praia fica
mais suja. Era preciso mais serviços públicos para dar conta de toda essa população e
também do lixo que produzem né? As pessoas também jogam muito lixo na praia, no
maceió. Fora um bocado de construção irregular por ai. Muita árvore foi derrubada”.
10º. Entrevistado: “Modificou os mangues que têm muitas construções próximo, bar
praticamente dentro. Tem mais lixo nas ruas e mais esgotos correndo”.
A partir das respostas, é possível considerar a insatisfação com relação aos serviços
prestados pelo governo municipal, a infraestrutura local deixa a desejar e não se percebe o
comprometimento para proporcionar melhorias. Necessidades básicas como água, saneamento
básico e coleta de lixo, estão sendo negligenciadas, podendo causar inclusive doenças
provenientes de más condições de higiene. Por enquanto a infraestrutura inexistente causa
estresse e revolta nos visitantes e moradores da área.
Com relação à modificação da paisagem e à degradação do meio, verifica-se que os
principais problemas são: a derrubada de árvores, as construções irregulares e o acúmulo de
lixo pelas ruas, mangues e praias (fotos 15, 16, 17, 18, 19, 20).
Foto 15: Lixo acumulado na Avenida principal de Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 16: Lixo acumulado nas ruas - Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
86
Foto 17: Lixo acumulado nos terrenos baldios - Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 18: Lixo acumulado na laguna costeira - Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 19: Irregularidades na laguna costeira, divisa Jacumã-Carapibus. Fonte: Kiyotani, 2010.
As fotos 15, 16 e 17 mostram o lixo deixado pelos moradores na Avenida principal de
Jacumã, em ruas e em terrenos baldios, respectivamente. O lixo é acumulado nesses locais
para quando o caminhão disponibilizado pela administração municipal passar o recolher, mas
essa coleta, percebe-se, tem sido deficitária, visto que em todas as visitas realizadas foi
encontrada tal situação.
Já as fotos 18 e 19 são da área da laguna costeira de Jacumã. A primeira mostra o lixo
que vai sendo acumulado nas bordas da laguna, em sua maioria plásticos diversos, muito
provavelmente deixados pelos que visitam o ambiente em seus momentos de lazer. A foto 19
Construções irregulares (casas)
Bar à beira do mangue
Manguezal
87
apresenta casas que foram construídas em locais irregulares, não respeitando a legislação
vigente, pois estão dentro das faixas de proteção de mangue, já mencionadas em tópico
anterior.
O que todas essas alterações produzem gera um efeito cascata, pois se o meio
ambiente é degradado, a paisagem perde beleza, e, por fim, o local fica desmerecido pela
população e pelos turistas. Mas é preciso compreender que o mais importante nesta questão
não é a decadência da praia como destino turístico, o que de fato preocupa é a poluição e
degradação ambiental que poderá trazer conseqüências maiores para os seres vivos, como por
exemplo:
� Aumento da temperatura (ou sensação térmica) local;
� Contaminação das águas das lagunas costeiras que poderá acarretar problemas de
saúde para os banhistas e para quem de alguma forma faz uso daquelas águas;
� Contaminação dos peixes e mariscos do mangue;
� Diminuição da renda daqueles que dependem da pesca em rios e no mar, levando os
mesmos a condições econômicas e sociais preocupantes;
� Doenças causadas pelo acúmulo de lixo e pelos bichos atraídos por esse lixo;
� Inapropriação do mar para banho.
Passando para a entrevista aos proprietários de segundas residências de Carapibus,
constatou-se que as repostas são parecidas com aquelas de Jacumã no que tange as
necessidades de infraestrutura e em parte sobre a modificação da paisagem.
Dentre os oito entrevistados, seis são residentes de João Pessoa, um do Recife e um do
Rio de Janeiro. O interesse por Carapibus não foi específico, as respostas giraram em torno da
vontade de ter um local para lazer em alguma praia. Quanto ao ano da compra do terreno ou
casa, cinco são da década de 2000, dois da década de 1990 e o terceiro entrevistado comprou
em 1986. Deu-se ênfase ao terceiro entrevistado, pois o relato dele é importante para
acompanhar a transição da paisagem, já que ele quando ali chegou quase nada se tinha de
construções. A resposta para a freqüência ao local foi majoritariamente “sempre que pode e
no veraneio”.
Quanto à preocupação no momento da compra/construção com o que poderia gerar
degradação do ambiente, o primeiro entrevistado disse não ter tido; o segundo disse ter tido,
mas não especificou. O terceiro disse ter preservado ao máximo as árvores que acharam no
88
local e ter utilizado catavento para captação d’água; o quarto alegou ter tido fiscalização da
SUDEMA para toda a construção da casa e fossa. Já o quinto disse não ter tido preocupação
alguma e acrescentou: “Hoje existe mais do que antes. É tanto que se você vem em Carapibus,
vai a Tabatinga, as construções ai são tudo irregulares” – quinto entrevistado. O sexto
entrevistado citou ter se preocupado com a praia, mas não elencou ações; o sétimo e o oitavo
disseram ter plantado mais árvores em seus terrenos.
Perguntado a preocupação em saber se existia infraestrutura básica e de apoio no ato
da compra, obteve-se: dois nãos; cinco que tinham conhecimento da não existência e um que
não tem interesse em saber disso e até prefere que não haja: “nem tô muito interessado nisso
porque atrai muitas pessoas e acaba estragando o local” - quarto entrevistado.
A resposta dada pelo quarto entrevistado demonstra um percepção que não é só dele,
muitas outras pessoas também fazem logo essa ligação: quanto mais gente visitando e
ocupando um determinado lugar, mais fácil ele ser degradado, perder suas qualidades,
“estragar”. Por que não tentar então excluir as causas que levam a tal pensamento? E como
excluí-las? A partir de uma postura mais ética e cidadã de todos, construídos com base numa
educação consistente, talvez seja possível reverter a situação, mas certamente esse é um
trabalho a longo prazo, o que advém ser iniciado o quanto antes.
A sexta pergunta sobre se e quais infraestruturas precisam ser supridas e/ou
melhoradas, teve este resultado:
Gráfico 2: Infraestrutura deficitária em Carapibus em 2010
A sétima e oitava pergunta são se foi e permanece sendo economicamente viável ter
uma segunda residência em Carapibus e se vale a pena tê-la, respectivamente. Todas as
25%
16%
25%
17%
17%
Infraestrutura deficitária - Carapibus
Água encanada/fornecimento constanteQueda de energia
Saneamento básico
Coleta de lixo
Calçameto de ruas
89
respostas para ambas as perguntas foram que sim. A nona pergunta indaga sobre qual a
modificação percebida na paisagem e no meio ambiente, obteve-se as seguintes respostas:
1º. Entrevistado: “Avanço do mar, a barreira fica sempre caindo ai. O pessoal que mora
ali vizinho deve degradar muito ai acaba com essas quedas de barreira e o mar
avançando. E aumentaram muito as construções, você passa dois meses sem vir já tem
várias novas. (...) Muita sujeira, muita gente vem e suja muito a praia, vem com
embalagem plástica, papelão, até fralda descartável”.
2º. Entrevistado: “A devastação ecológica daqui, por exemplo, essas plantas, a derrubada
das fruteiras para construção”.
3º. Entrevistado: “Era tudo verde e a praia dava pra ver tudo daqui [a casa fica a
aproximadamente 400 metros das falésias], hoje em dia não dá mais porque são várias
casas e hotéis, a diferença é gritante. (...) Hoje em dia tem muito lixo na praia”.
4º. Entrevistado: Não percebeu modificações.
5º. Entrevistado: “Em termos da praia já tem modificado devido ao avanço do mar. Em
termos de construção essa área de Carapibus já era praticamente toda construída aqui
nessa área de falésia desde a década de 90, e veio de Jacumã pra cá né? E depois pra
lá, por exemplo Tabatinga a energia já foi puxada daqui, depois de uns 5 ou 6 anos.
Ele veio seguindo [a linha de construção]”.
6º. Entrevistado: “A queda das falésias e o avanço das construções”
7º. Entrevistado: “A paisagem continua praticamente a mesma, só aumentou o
crescimento urbano mesmo”.
8º. Entrevistado: “Muitas construções e muita derrubada de árvores. A vegetação tem se
degradado muito.”
Excepcional a colocação do quinto entrevistado para a presente pesquisa, é mais uma
verificação da urbanização linear na costa sul do estado da Paraíba. Mais interessante ainda
por vir de uma pessoa leiga perante o assunto, que não tinha conhecimento ainda de que esta
construção linear faz parte de várias pesquisas em todo o país.
Na praia de Carapibus o que mais incomoda os proprietários de segundas residências é
a perda da vegetação e o aumento das construções (várias irregulares como na foto 24), que
alteram a paisagem, inclusive “tampando” a visão de moradores mais antigos que construíram
suas casas em local legal. O lixo acumulado nas ruas (fotos 20, 21 e 22), na areia da praia e na
laguna costeira (foto 23) é outro problema sempre destacado pelos entrevistados. Assim como
90
em Jacumã, estes resíduos jogados na laguna e na praia podem acarretar problemas de
balneabilidade e, conseqüentemente, de saúde aos banhistas.
Foto 20: Acúmulo de lixo na principal entrada para Carapibus. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 21: Acúmulo de lixo na rua paralela à praia - Carapibus. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 22: Acúmulo de lixo nas ruas de Carapibus. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 23: Acúmulo de lixo na laguna costeira - Carapibus. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 24: Construções sobre a borda da falésia caracterizando irregularidade ambiental - Carapibus. Fonte: Kiyotani, 2010.
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A última foto acima (foto 24) mostra uma parte das construções que foram erguidas na
borda da falésia, portanto ilegais perante as leis ambientais. Nesse caso, são nove casas e um
hotel, situados sobre a borda da falésia na primeira enseada de Carapibus. Outras casas e
estabelecimento turísticos (pousadas e hotéis) também estão dispostos em área de preservação
de falésia ao longo da praia de Carapibus, representando a negligência do poder público ao
conceder alvará a tais construções.
Por fim analisando as entrevistas feitas na praia de Tabatinga é possível verificar um
maior engajamento dos proprietários de segundas residências em prol do meio ambiente, com
uma força atuante desses perante órgãos públicos e perante novos construtores da área.
Tornou-se surpreendente encontrar na praia, que tinha tudo para reproduzir as degradações
das outras duas, o nível de conscientização e de preservação dos moradores para com o meio e
a paisagem.
As diferenças em relação às demais praias já aparecem na primeira pergunta. Em
Tabatinga a maioria dos proprietários de segundas residências é residente de João Pessoa e
com condições financeiras visivelmente melhores. Entre as respostas ao por que a escolha por
Tabatinga todas enfatizam as qualidades da praia: a tranqüilidade, a paz, água limpa, ar puro e
a acessibilidade. A quinta entrevistada complementa: “Pelo ambiente, eu considero isso um
paraíso. Aqui as pessoas valorizam muito o lugar, tem uma associação que tem o objetivo
principal de preservar o meio ambiente e veio ao encontro dos meus objetivos”.
Continuando as diferenças, bem como a comprovação de uma expansão urbana que
vem “caminhando” praia a praia a partir de Jacumã, os entrevistados compraram seus terrenos
e começaram suas construções no início dos anos 2000 e o último comprou em 2008. Ou seja,
essa é mais uma evidência de que, somente após serem ocupadas as praias de Jacumã
primeiramente e Carapibus posteriormente, Tabatinga começou a ser alvo da especulação.
Tudo parece contribuir para que o início e aumento das vendas de lotes numa determinada
praia só comece quando a praia vizinha alcança certo nível de ocupação urbana.
Com relação à freqüência, cinco pessoas responderam “toda semana”, uma
“quinzenalmente” e outra “mensalmente”, todas somaram a isto feriados e veraneio. A quarta
pergunta, que faz menção a preocupação se iria degradar o meio ambiente no ato da
construção da casa, terá suas respostas aqui reproduzidas por considerar oportuno demonstrar
a consciência que os proprietários da praia têm. Segue:
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1º. Entrevistado: Não pensou na possibilidade de degradação. “Olha no princípio era
bastante desabitado, quando levantamos essa casa só tinham cinco casas. Era bem
tranqüilo aqui.”
2º. Entrevistado: Sim. Junto com a AMATA34 sempre, desde o início, se reuniu para
discutir questões ambientais da praia. “A gente tem uma associação aqui, a AMATA,
que a gente se reúne de quatro em quatro meses justamente para discutir toda situação:
como está a situação de lixo, água, esgoto, pois tem muita gente já construindo. Então
sempre vem o pessoal da SUDEMA, porque a gente está em área de preservação, pra
ver realmente o que estão fazendo: esgoto, fosso, porque aqui é tudo poço, então não
pode deixar tudo muito a vontade, porque senão daqui a pouco tá todo mundo sem
condições de ter água. Principalmente se as fossas são feitas dentro dos padrões, pra
não haver escoamento. Toda água que temos aqui é do lençol freático, então se não
cuidarmos, né? (...) Tem o IBAMA, tem a preservação do maceió, que é sempre bem
cuidado, o pessoal está em cima direto para não haver degradação pro meio”.
3º. Entrevistado: “A preocupação de manter a área preservada. Nós plantamos várias
espécies aqui nessas voçorocas, replantamos espécies nativas e capim pela borda”.
4º. Entrevistado: “Da minha parte sim, mas nesse período que eu estou aqui já houve
muita depredação, muito lixo, muita garrafa pet, muita coisa que não deveria ter, tem.
Essa idéia agora de uma taxa pro ônibus foi boa porque de certa forma além de
regularizar o turismo, conscientiza também um pouco, não se trata de privatizar, mas
uma forma de manter. Melhorou muito, porque era um caos, deixava lixo”.
5º. Entrevistado: “Os coqueiros que eu tirei, porque estavam com risco de queda, eu
replantei e plantei outras árvores”.
6º. Entrevistado: “Houve! O que foi possível nós preservarmos com relação à vegetação
do terreno, nós fizemos. E também seguimos todos os padrões da SUDEMA35”.
7º. Entrevistado: “Nos preocupamos muito com relação à preservação, principalmente
nessa voçoroca – localizada bem à frente da residência. Nós replantamos árvores
nativas para contenção da voçoroca”.
34 Associação dos Moradores e Amigos de Tabatinga- AMATA. 35 Quando o entrevistado menciona os padrões estipulados pela Superintendência de Administração do Meio Ambiente /PB – SUDEMA, ele refere-se aos padrões impostos à construção de fossas sépticas e de poços artesianos. Pelas entrevistas ficou esclarecido que a SUDEMA fornece as indicações de como devem ser feitas essas construções e faz a vistoria das mesmas.
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Com exceção do primeiro entrevistado, percebe-se como os proprietários de segundas
residências de Tabatinga se importam e se envolvem com a praia. O cuidado em replantar, em
não poluir, em construir poços artesianos e fossas dentro dos padrões impostos pelos entes
ambientais é bem típico das pessoas que freqüentam esta praia, além de estarem sempre
dispostos a lutar por seus direitos e pelos direitos ambientais perante o poder público. Chama-
se atenção para o relato do terceiro e do sétimo entrevistados que citam a plantação de árvores
nativas para contenção de uma grande voçoroca36 (fotos 25, 26 e 27) que se formou em
Tabatinga, postura esta muito ética e consciente em preservar o bem comum. Essa voçoroca é
novamente abordada, com maiores detalhes, no final desse tópico.
Foto 25: Visão geral da voçoroca – Tabatinga. Fonte: Gutierres, 2010.
36 Voçoroca: “escavação ou rasgão do solo ou de rocha decomposta, ocasionado pela erosão do lençol de escoamento superficial. Nas regiões desmatadas observa-se, por vezes, o aparecimento de grandes esbarracamentos de material decomposto, e de solos que são carregados pelas enxurradas. As voçorocas, quando em grande número e relativamente paralelas, dão aparecimento a verdadeiras áreas de badland (terras impróprias para agricultura, muito erodidas) as voçorocas também podem ser formadas pelo escoamento sub-superficial”. (GUERRA, p.637, 2008) No caso desta voçoroca localizada próximo as casas em Tabatinga, verifica-se inclusive que ela atinge lotes e até ruas da praia e, caso não seja contida, a tendência é que se alastre.
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Foto 26: Adentrando a área da voçoroca – Tabatinga. Fonte Gutierres, 2010.
Foto 27: Voçoroca vista da praia, percebendo-se que já está próxima de uma das segundas residências – Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
É preciso mencionar ainda que a AMATA realiza constantes campanhas de
preservação e conscientização ambiental na praia de Tabatinga. Para citar algumas, no
mínimo duas vezes por ano são realizadas caminhadas pela praia e na laguna costeira para
recolher o lixo deixado pelos visitantes; disposição de placas educativas (fotos 28 e 29);
disposição de lixeiras (foto 33); foi realizada campanha de conscientização sobre o tráfego de
motos e automóveis (incluindo os quadriciclos) que foi proibido em toda extensão de
Tabatinga; em dias comemorativos de questões ambientais, também são realizadas várias
campanhas.
No último “Dia do Meio Ambiente” em 05 de Junho de 2010 foi realizado um plantio
de coqueiros pela praia juntamente a discursos sobre meio ambiente e com café da manhã
(fotos 30 e 31), onde todos os moradores foram convidados a comparecer.
Foto 28: Placa educativa I – Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 29: Placa educativa II – Tabatinga. Fonte: Gutierres, 2010.
Voçoroca
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Foto 30: Voluntários para o plantio de coqueiros. Fonte: Gutierres, 2010.
Foto 31: Faixa convidativa aos moradores de Tabatinga para participar do evento. Fonte: Kiyotani, 2010.
A quinta pergunta questionou se existiu a preocupação em saber se havia infraestrutura
necessária para ocupação quando o terreno foi comprado. Três pessoas disseram já saber que
não existia. Duas pessoas responderam o seguinte:
“Iluminação já tinha, e a água depende da energia porque é poço. Por essa situação, por isso é que a canalização é feita toda pra dentro da fossa, estruturada pelo pessoal da SUDEMA e do IBAMA, que eles já dizem como é que tem que ser feito, e faz a regulamentação, e a gente só fecha depois que eles vêm pra dar a aprovação” – segundo entrevistado.
“Quando a gente chegou do Rio Grande do Sul tinha rede de energia instalada, dai supomos que tinha né, mas não tem, hoje ainda não tem. Então cada um tem a sua fossa séptica, a SUDEMA orienta como fazer, vê se tem absorção, tem o dimensionamento e a distância mínima do poço que são de 15 metros” – terceiro entrevistado.
É importante verificar que existe um acompanhamento constante dos órgãos públicos
ambientais, pois somente com fiscalização massiva pode-se deter, conter e reverter a
degradação imposta pelo homem ao meio. Infelizmente esse é o caminho mais adequado para
proteger a natureza em um país como o Brasil, que proporciona a seu povo uma educação e
conscientização tão deficitária. O que se vê de degradação nas três praias é em geral um
problema de postura da sociedade perante o meio, atos que poderiam ser evitados com um
mínimo de consciência cidadã, social e humana, postura essa bem impressa na maior parte
dos proprietários de segundas residências de Tabatinga.
Mais uma diferença entre os proprietários de segundas residências de Tabatinga vem
com a sexta pergunta, quando questionado: sente a falta de alguma infraestrutura na área?
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Qual? Três pessoas responderam não sentir falta de infraestrutura alguma em Tabatinga. Duas
pessoas citaram a rede coletora de esgoto e a água tratada, uma delas somou a melhoria na
iluminação pública. Um único entrevistado reclamou do calçamento inexistente das ruas. A
sétima entrevistada diz sentir falta de Posto de Saúde e do sistema educacional. Ou seja, em
geral as pessoas que têm casas nessa praia estão bastante satisfeitas, talvez não por ter toda a
infraestrutura urbana, mas pela que tem ser suficiente e não causar danos a paisagem ou ao
ambiente local.
Como os poços artesianos e as fossas sépticas estão todas convencionadas e dentro de
padrões de qualidade é possível conviver tranquilamente na área. Outro fator importante é a
coleta do lixo residencial que em nenhum momento foi citada como insuficiente ou
inoperante. Seguem as fotos abaixo que demonstram a coleta do lixo pelo setor público e a
iniciativa da Associação AMATA de compra e disposição de tambores de lixo por toda praia.
Foto 32: Coleta de lixo – Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 33: Tambores de lixo colocados pela AMATA nas ruas de Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
A sétima e oitava perguntas sobre viabilidade econômica no ato da compra/construção
e sobre valer a pena ter uma casa nesta praia foram respondidas positivamente por todos. A
nona pergunta como nas anteriores é sobre a percepção da modificação na paisagem e no
meio ambiente, seguem as respostas na íntegra:
1º. Entrevistado: “O que mudou foi a construção que ficou bastante acelerada nos últimos
anos, também o fator de violência que ultimamente estão arrombando muita casa por
aqui. E também e a alteração no meio ambiente que ultimamente eu tô sentindo falta
de alguns animais que você ta acostumado a conviver, antes você tava na frente de
casa e topava com um camaleão e uma cobra e hoje não mais. E o desmatamento
97
também. E uma alteração no clima também, porque 10 anos atrás era bem fresco aqui,
tinha um ventinho aqui, e hoje não, hoje tá quente demais”.
2º. Entrevistado: “Antes era mata agora ta enchendo de casa, o desmatamento!”
3º. Entrevistado: “A ocupação sempre traz a modificação né? Ali nas barracas do maceió
tem ocupação, mas não chegou a desfigurar totalmente o local, agora é claro que não
está como estava um tempo atrás. Muitos coqueiros aqui da primeira rua caíram com a
erosão marinha, a erosão está se agravando, e uma casa ou outra também tira né
[coqueiros]. Então modificou a paisagem sim”.
4º. Entrevistado: “Com exceção da praça pública que é um bar, e que com certeza esse
bar está dando trabalho em termos de veículos descendo, a vegetação natural já foi
depredada, o mar quando enche já avança porque já encontra nele um declive que os
próprios carros já fazem, essa é uma preocupação da comunidade. Mas fora isso, eu
acho que as pessoas têm respeitado direito. Salvo os que não moram e que vem, por
exemplo, o maceió, é um lugar lindo, mas fica cheio de saco engalhado no mangue,
garrafa pet, a gente vai recolhendo... tem vezes que eu acho que é um sonho o de que
todo mundo tenha consciência”.
5º. Entrevistado: “A própria natureza vai fazendo suas transformações, a própria maré que
vai avançando e derrubando os coqueiros ai. E a própria necessidade que o homem
tem de transformar o meio ambiente pra adaptá-lo pra construir alguma coisa, ai
fazendo o desmatamento. E também pra viabilizar o transporte vêm as mudanças”.
6º. Entrevistado: “Crescimento das construções! Mas está ordenado”.
7º. Entrevistado: “Vejo até que a vegetação aumentou, pelo menos por aqui em volta da
minha casa, a própria população tem plantado. Outra coisa que vejo é o aumento das
construções”.
As opiniões expostas acima dizem por si só sobre o nível de consciência que protege
Tabatinga, aqueles que ali construíram fazem de tudo para manter o bem-estar do ambiente da
praia. A união da população, a vontade de preservar a natureza e a paisagem do local faz com
que novos compradores de terrenos respeitem a forma de habitar aquele lugar, além de
também fazer frente ao poder público conseguindo barrar certas ações que poderiam
prejudicar a praia. Assim, faz-se de exemplo positivo para outras comunidades de segundas
residências país afora, por conseguirem manter seu lugar37 em equilíbrio.
37 O conceito de lugar para geografia também é bastante importante e nele traz o sentimento e sensação de pertencimento ao local, bem como a relação de afetividade que liga aqueles moradores ao local.
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Para visualizar o que a quarta entrevistada fala sobre a praça pública que “virou” bar,
segue abaixo a foto do bar visto da praia e visto por trás, chamando atenção para o isolamento
da área feito por cordas.
Foto 34: Bar construído na praça pública – Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 35: Bar que privatiza praça pública em Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
Apresenta-se também uma foto que demonstra o problema das construções em áreas
legalmente protegidas, como os manguezais, a borda de falésias e a área de marinha, como
seguem nas fotos (33 e 34), de acordo com normas já expostas em tópico anterior. A foto 34
mostra duas segundas residências em áreas irregulares, a primeira em declive acentuado e a
segunda em área de marinha, observado ainda que ao lado dessa casa (2) da imagem, existem
outras quatro seguindo a mesma linha de costa. Já na foto 34, o exemplo de irregularidade
está nas sete casas, das que podem ser contadas, em área de preservação de manguezal.
Foto 36: Construções irregulares: em borda de falésia (1) e em terreno de marinha (2) – Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
Bar
1
2
99
Foto 37: Casas construídas irregularmente em área de preservação permanente (faixa de proteção de manguezal) – Tabatinga. Fonte: Kiyotani, 2010.
A décima pergunta proposta no questionário durante o decorrer das entrevistas ficou
muito próxima ao respondido na nona, por isso todos os entrevistados, de todas as praias,
optaram por dizer que seria o já comentado na anterior. Já a décima primeira e décima
segunda, também parecidas entre sim, questionam se, mesmo com todas as dificuldades, ainda
há interesse na praia escolhida para segunda residência e sobre a pretensão de continuar a
freqüentá-la. Todas as respostas foram positivas.
Para facilitar uma análise entre os relatos das entrevistas com os proprietários de
segundas residências nas três praias foi elaborado quadro comparativo. Seguem os quadros
que indicam infraestrutura deficitária (quadro 1) e modificações ambientais e paisagísticas
(quadro 2).
Infraestrutura deficitária em Jacumã
Infraestrutura deficitária em Carapibus
Infraestrutura deficitária em Tabatinga
Água encanada/fornecimento constante
Água encanada/fornecimento constante
------
Coleta de lixo Coleta de lixo ------
Calçamento de ruas Calçamento de ruas Calçamento de ruas
Equipamentos públicos e privados de apoio à população
Queda de energia Posto de Saúde e escola
------ Saneamento básico ------
Quadro 1: Comparativo das infraestruturas reclamadas pelos proprietários de segundas residências nas três praias.
100
Pelo quadro, verifica-se que as necessidades na infraestrutura de Jacumã e Carapibus
são praticamente as mesmas. A diferença está na falta de equipamentos de apoio à população,
reclamados por proprietários de casa em Jacumã, e na queda de energia citada por
proprietários de casas em Carapibus.
É fácil perceber o porquê dessas queixas, a primeira vem do fato de Jacumã já ser um
centro de referência para as demais praias quanto ao suprimento de artigos para casa e para
saques de dinheiro, o que implica em maior fluxo de pessoas e de necessidades/demandas na
área. Já as quedas de energia chamam atenção dos proprietários de Carapibus, pois com ela
falta também água, que é bombeada de poços artesianos, sendo assim falta um bem vital, por
isso a necessidade de energia.
Positivo mesmo somente o mínimo número de queixas por parte dos proprietários de
segundas residências em Tabatinga, demonstrando com isso uma perfeita harmonia com a
praia. Esse fato se deve tanto as reais melhores condições de habitação da praia como pelas
necessidades dessas pessoas serem menos materiais, delas estarem mais em interação com o
meio ambiente. Pelas entrevistas pôde-se perceber como a maioria dos moradores temporários
de Tabatinga não está preocupada com a chegada de uma infraestrutura urbana, como o
calçamento das ruas, por exemplo, reclamado somente por um. O que realmente importa é
estar em consonância com o meio e mantê-lo em perfeito equilíbrio.
Modificações Ambientais e Paisagísticas percebidas pelos segundos-residentes
Jacumã Carapibus Tabatinga
Derrubada de coqueiros e árvores “Devastação ecológica, como exemplo a derrubada de fruteiras”
Derrubada da vegetação
Crescimento do número de casas Crescimento do número de casas Crescimento do número de casas
Avanço do mar Avanço do mar e conseqüente “queda de barreiras” (erosão das falésias)
------
Construções invadindo o mangue e “invasão” das barracas
“A visão que se tinha do mar foi impossibilitada pelas construções na beira das falésias”
Construções perto do mangue
Aumento do lixo nas ruas e praias e poluição do “maceió”
Praia mais suja ------
Esgoto correndo nas ruas ------ ------
101
------ ------ Desaparecimento de alguns animais nativos
------
------
Transformação da praça pública em bar, implicando maior fluxo de carros e mais erosão da faixa de praia
------ ------ Aumento da violência (arrombamento de casa)
Quadro 2: Modificações ambientais e paisagísticas percebidas pelos segundos-residentes das três paias – comparativo.
No segundo quadro comparativo, apesar de manterem algumas diferenças, percebe-se
mais igualdade nas respostas vindas dos entrevistados das três praias. É fato que não agrada
nas três praias a perda da vegetação decorrente da derrubada constante para possibilitar novas
construções, assim como o crescimento dessas construções e suas irregularidades, como o
desrespeito as leis de localização, por exemplo. Isso só enfatiza a necessidade de maior
controle sobre as novas construções e sobre os padrões de urbanização estabelecidos pelo
governo municipal, é preciso mais fiscalização e mais rigor no ordenamento urbano de
Jacumã, Carapibus e Tabatinga.
Os proprietários de segundas residências de Jacumã e Carapibus, mantendo um padrão
de respostas muito parecidas, apontam como outra modificação o avanço do mar nessas duas
praias. Em Carapibus, esse avanço tem ocasionado quedas de barreiras, ou seja, a erosão das
falésias costeira, o que acarreta além da modificação ambiental e paisagística um risco para
aqueles que irregularmente construíram na borda das falésias.
O problema do avanço do mar é, além de responsabilidade da humanidade, visto que
todos juntos causaram o aquecimento global, também um processo natural de transgressão e
regressão marinha, que ocorrem em períodos geológicos desde a formação da Terra. É preciso
ressaltar que, independente do que ou quem causou a erosão nas falésias, a culpa da possível
queda e perda das construções (incluindo o risco de vida durante esse processo) erguidas nas
bordas da falésia é só, e somente só, de quem as construiu e de quem as permitiu, ou seja, dos
seus proprietários e do poder público municipal.
Os recursos naturais não se esgotam porque querem, não derrubam casas, não
destroem construções, não “matam pessoas”, não é da natureza a culpa pelos desastres
ambientais que estão presentes hoje no mundo inteiro, é de completa responsabilidade do ser
humano tudo o que a ele ocorre. Personificar a natureza é uma saída do homem para eximir-se
102
de culpa. A natureza tem seus processos independentes do ser humano, o problema vem
quando este os altera; sendo assim, muitos dos desastres naturais são apenas respostas às
ações humanas, é apenas o meio retomando seu processo.
O aumento do lixo também é uma queixa em comum entre Jacumã e Carapibus, talvez
seja apenas uma questão de maior número de moradores e freqüentadores destas praias ou
talvez seja uma questão de posição preservacionista que não existe na área. Jacumã e
Carapibus têm mais casas e mais bares que Tabatinga, este é um fator a se levar em
consideração.
O fluxo nos bares deixa muita sujeira nas praias, mas o nível de participação da
comunidade em ações de conscientização e suas próprias atitudes perante o meio também
podem influenciar. Se os moradores de Jacumã e Carapibus fossem mais rigorosos com a
fiscalização da poluição nas praias e lagunas costeiras, ajudando o poder público e também
cobrando deste mais ações, possivelmente a questão do lixo melhorasse. Campanhas de
conscientização ambiental com a população, assim como fazem os proprietários de segundas
residências de Tabatinga, podem contribuir com a melhoria da qualidade ambiental.
Por fim, têm-se três reclamações que ocorrem somente em Tabatinga: o
desaparecimento de espécies animais; a transformação de espaços públicos em privados; e o
aumento dos arrombamentos de casas. O primeiro diz muito sobre esse contato com a
natureza que têm os freqüentadores de Tabatinga, pois provavelmente vários animais
deixaram de ocorrer nas outras duas praias, mas as pessoas não sentiram essa falta. Revela
ainda os impactos que o crescimento urbano causa nos animais, quando seu habitat é
modificado e já não lhes restam condições de permanecer ali, assim as espécies migram.
Com relação aos espaços públicos privatizados, é de conhecimento do poder público
que não somente em Tabatinga ocorrem tais “privatizações”, mas não existe posicionamento
algum. Mais uma vez o governo municipal é negligente ao permitir que essas atitudes se
estendam e permaneçam. Nada mais justo do que cumprir com a lei e devolver o que é
público ao povo, além da aplicação penal referente a cada caso, é claro.
Sobre o crescimento da violência em Tabatinga, mais precisamente no crescimento do
número de arrombamentos, não é possível aqui chegar a sua causa, mas podem-se apontar
alguns fatores que influenciam este fato: o próprio crescimento urbano da área das três praias;
o tempo que as casas permanecem fechadas; a visibilidade crescente do litoral sul paraibano,
sendo Tabatinga a praia “mais rica”; a facilidade de acesso e fuga através da rodovia PB-008.
Essas são as igualdades e diferenças entre as três praias que apontam para uma
realidade diferente da imaginada no inicio da pesquisa, quando se pensou no problema
103
existente no litoral sul paraibano. Dentro do que se esperava, Carapibus vem crescendo como
uma extensão de Jacumã, porém Tabatinga, por sua vez, não é uma extensão de Carapibus, ela
quebra com a constância de suas anteriores. Os problemas e configurações que se esperavam
repetir nas três praias, no geral, só estão presentes em Jacumã e Carapibus.
5.1.2 Dados técnicos e percepções dos gestores públicos quanto ao planejamento e
gestão: ordenamento urbano, paisagem e meio ambiente
As entrevistas ao poder público do município do Conde tiveram por propósito analisar
qual o posicionamento de alguns gestores ligados ao turismo e ao planejamento urbano com
relação ao “desenvolvimento” do turismo na área e, advindo dele, como enxergam o
crescimento urbano nas três praias.
O primeiro entrevistado foi o Secretário de Turismo do município. A primeira
pergunta foi qual a visão geral que ele tem sobre o turismo nas três praias. O Secretário
começou a resposta comentando que a Paraíba sempre investiu no turismo de sol e mar, com
isso, se “desenvolveram” os destinos Baía da Traição e Lucena no litoral norte e Jacumã no
litoral sul.
É preciso destacar que o conceito de desenvolvimento utilizado na resposta está longe
daquele empregado nessa pesquisa, durante a entrevista ficou claro que o termo foi utilizado
pensando apenas no crescimento do fluxo turístico e do urbano, sem ser medido o impacto
causado, sendo indiferente se positivo ou negativo.
Segundo o entrevistado, o crescimento do turismo nas praias do litoral norte
estacionou e em Jacumã foi mais célere, principalmente após a implantação da praia de
Tambaba como importante destino naturista brasileiro, nos anos de 1990. Mas o Secretário
entende que o crescimento não se deu da melhor forma possível, “isso com uma urbanização
desordenada, originada de vila de pescadores que depois passou a ser veraneio e uma
urbanização sem ter escrúpulo nenhum no sentido da sustentabilidade das regras urbanísticas
e da preservação do meio ambiente”. E para finalizar esta resposta o Secretário enfatiza que o
governo agora pretende conquistar e consolidar outro tipo de demanda turística,
104
“nós tivemos várias etapas, tivemos o turismo de veraneio, com turistas de Campina e Recife principalmente, o turismo de massa, e partimos agora para o turismo mais seletivo, turismo de família, que se hospeda em hotéis. Antes nós tínhamos aqueles que ficavam nas casas de veraneio ou que passavam somente o dia, e hoje não, nos temos os que movimentam a hotelaria, que é a segunda maior do estado.”
Tornou-se evidente com a resposta dada e durante toda a entrevista que o Secretário, e
provavelmente essa é uma opinião generalizada dentro do poder público municipal, não
“aprova” o turismo de segundas residências que ocupou a região. A busca é por turistas que
movimentem o mercado hoteleiro, que proporcionem mais lucro e que sejam de uma classe
social mais abastada. Mas como partir em busca desse “novo” fluxo turístico sem resolver
problemas pendentes? E como ignorar um turismo de segundas residências que já é fato na
área?
Compreende-se o desejo de expansão da indústria hoteleira por parte do governo, mas
essa busca não exclui o dever de prover a ocupação já existente de melhores condições de
moradia e lazer. As duas formas de turismo devem ser levadas em consideração e
beneficiadas igualmente, pois uma já tem seu espaço e fluxo concretizados, então os cuidados
para com esta não podem cessar, e a outra necessita de atenção em sua implantação.
A segunda pergunta questiona o que teria para se dizer do turismo de veraneio, ou de
segundas residências na área:
“O turismo de veraneio na costa do Conde tende a desaparecer, porque quase não existem mais essas casas de veraneio, porque ou as pessoas moram ou alugam, pois é um turismo muito dispendioso. É muito melhor você que vem uma vez ou outra ficar em hotel. E também com a proximidade de João Pessoa, daqui a uns cinco anos o Conde será uma cidade integrada com João Pessoa. Vai ser mais barato morar no Conde e mais confortável, questão de transito, segurança, e vir trabalhar em João Pessoa. A tendência é que lá seja primeira residência e nosso turismo será exclusivamente um Pólo Turístico Hoteleiro.”
No discurso do Secretário reitera-se o desejo do governo municipal de frear as
segundas residências e promover um turismo que traga um público mais elitizado. Passa a
impressão de um desejo de negar o turismo de segundas residências, pois é evidente que esse
ainda faz-se muito presente na área, a freqüência dos visitantes é praticamente semanal, as
casas ficam fechadas durante os dias úteis da semana.
105
Outro ponto interessante nesse discurso é o fato de o Secretário considerar o litoral do
Conde mais confortável que João Pessoa para moradia, incluindo ai mais segurança. É
importante dizer que no litoral do Conde só há uma delegacia situada em Jacumã e nenhuma
outra base nas demais praias. Além disso, como ser mais confortável se conforme visitações e
relatos analisados no tópico anterior demonstram que não há equipamentos de atendimento à
saúde suficiente nas praias. Não há também equipamentos financeiros como bancos, nem de
apoio como supermercados. Enfim, para tornar-se local de primeira residência é preciso
investir em melhorias urbanas de primeira e segunda necessidade.
Indagado sobre como se deu o crescimento urbano, principalmente pelas segundas
residências, desde 1970 até hoje, o Secretario relata: o nosso crescimento é maior que a nossa
capacidade de manter a infraestrutura, de coleta de lixo, segurança. Está crescendo mais
rápido do que as ações governamentais. Nessa pergunta assim como na primeira, o Secretário
confirma um crescimento urbano que foge do controle do poder público no que tange
organização e fiscalização. Chama-se atenção ainda nesta resposta a falta de capacidade do
município em acompanhar o crescimento com infraestrutura, coleta de lixo e segurança, ou
seja, mais uma vez, como tornar-se local de primeira residência? Esta resposta dada contraria
a anterior. Além de não ser favorável a residência fixa, também não oferece boas condições
para àquela secundária, implicando em degradação ambiental e paisagística.
Com relação à infraestrutura de apoio aos moradores das praias que também é a
utilizada pelos turistas o Secretário analisa o seguinte:
“Um centro turístico, numa cidade turística só pode ser desenvolvido se for bom também para os moradores. Você não pode ter uma implantação de um pólo turístico se a população é contra isso, se ela não usufrui, não participa, se ela fica à parte disso a tendência é o total caos e o não sucesso. (...) A infraestrutura [atualmente] é muito falha, nós temos falha no saneamento, na distribuição de água e esgoto, de coleta de lixo, porque o desenvolvimento esta sendo muito ligeiro e além da nossa capacidade. Nós temos tido ajuda do governo federal e estadual para suprir as necessidades de saneamento, de energia. Existem projetos da expansão da rede de água e esgoto, já estão aprovados, estão em regime de emendas parlamentares e a gente espera liberação. Como também construção do binário, e a urbanização da faixa de Jacumã, e a implantação de vários equipamentos do mobiliário turístico: rede de informação turística, mercado de artesanato.”
As palavras do Secretário são tecnicamente perfeitas, porém, infelizmente não é o que
se encontra nas três praias. Principalmente em Jacumã, a aceitação do turismo pelos
moradores não foi analisada pelo poder público. Por pesquisas efetuadas na praia de Jacumã
106
desde 2005, pode-se apontar que não houve um diálogo com a população residente para
acompanhar o impacto do turismo na sua vida. Até onde faz-se perceptível, com as visitas ao
local, as necessidades da população com relação à saúde, educação, segurança e infraestrutura
básica não estão sendo atendidas. É preciso que o discurso do Secretário seja posto em prática
e a população residente seja favorecida, sejam supridas suas necessidades, para depois
desenvolver o turismo na região.
Seguem, respectivamente, abaixo as respostas quanto à atenção que se dá às segundas
residências - principalmente no que tange as questões urbanísticas e ambientais, e qual a
percepção sobre a modificação da paisagem desde 1970:
“A atenção é muito grande, porque não fazemos nada sem a avaliação dos órgãos ambientais. Porque nos fazemos um selo do seu projeto, encaminha para uma analise prévia e sem essa análise prévia a gente não dá andamento e aprovação a nenhum projeto. É a garantia de que a gente terá um projeto de sucesso, não adianta liberar e ser embargado. A grande preocupação nossa é que tem que crescer, mas com sustentabilidade, não é destruindo, é preservando porque esse é o grande álibi que temos para vender nosso destino.” “O que nós vemos é uma grande expansão imobiliária, mas que graças chegou com as normas de sustentabilidade. Existe um projeto já de urbanização para as barracas velhas [que não seguiram padrões], mas que é muito difícil, por ser um processo social, paisagístico, urbanístico e político, que não é fácil, mas a gente está em um processo e não libera mais barracas à beira-mar.”
Espera-se que esta fiscalização ambiental dita pelo Secretário realmente aconteça, mas
a de se constatar que o boom do crescimento urbano em Jacumã não aconteceu de forma
sustentável, não obedeceu a padrões de qualidade ambiental e algumas casas até hoje
continuam poluindo o meio com seus esgotos correndo a céu aberto, fossas não regularizadas,
etc.
Quanto ao ordenamento das barracas de praias, este projeto vem delongando desde
2005, e é preciso fazer algo para conter a poluição causada pelas mesmas; além de melhorar o
aspecto visual da área que se encontra prejudicado (fotos 35 e 36). As barracas estão dispostas
na frente mar e também ao lado da quadra de Jacumã, muitas delas não têm fossa, sendo
possível ver a encanação que sai de suas cozinhas. As que estão próximas à quadra ainda
apresentaram, durante algumas visitas, acúmulo de lixo próximo; frisando ainda que essas não
possuem suas ruas (frentes) calçadas (foto 36).
107
Foto 38: Bares frente mar – Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
Foto 39: Bares antigos ao redor da quadra – Jacumã. Fonte: Kiyotani, 2010.
A segunda entrevista ocorreu com o responsável pela Unidade Administrativa de
Jacumã, escolhido por ter um contato mais direto com a população local e vivenciar as
dificuldades da área diariamente. Analisando o turismo nas três praias, o administrador local
acredita que Jacumã e Tabatinga sejam destinos de moradia muito mais que de segunda
residência, segundo o próprio, 70% dos freqüentadores são na verdade residentes fixos. Para
ele só Carapibus recebe turistas de segunda residência.
Sobre a relação que a administração local tem com os proprietários de segundas
residências, o entrevistado afirma: “é bom, e eles me ajudam, eu tenho um ótimo contato com
todos lá. O problema do lixo é o mais discutido por lá, agora montamos uma cooperativa,
estamos com o projeto pronto para fazermos a reciclagem de lixo”. Falando sobre o que
acarreta para o meio ambiente a urbanização da área, constata: “olha, tira um pouco do que
era há algum tempo, tinha mais vegetação, é até um pouco estranho de se ver, porque o
crescimento foi muito rápido e muito desordenado ao mesmo tempo. É complicado do jeito
que está agora e a tendência é aumentar até mais”.
Perguntado sobre as transformações decorrentes das segundas residências e existência
de algum controle sobre a expansão das mesmas, o administrador diz,
“[Mudou a] vegetação, as construções. Antigamente ia pros maceiós, via caranguejos, hoje você não vê mais. Eu acredito que é decorrente das construções mesmo, aumentou muito, de 15 anos pra cá foi um absurdo. Até 2005 eu não sei se existia esse controle, mas hoje eu sei que existe, pela prefeitura, pelo IBAMA e pela SUDEMA. Qualquer casa que você for fazer em Jacumã, em qualquer lugar, você tem que ter a licença da SUDEMA pra fazer a fossa, não importa se é perto do mangue, perto da praia, você tem que ir à SUDEMA senão a gente não da o alvará de construção da casa. E daí a
108
própria prefeitura fiscaliza. Tem muito terreno também que foi vendido dentro de mangue e as pessoas querem construir. Esse loteamento [dentro de mangue] aconteceu 15 anos atrás, tudo foi vendido, hoje a prefeitura não libera... quer dizer, como eles não conseguem o alvará com a SUDEMA, a prefeitura não da o alvará de construção. Esses terrenos os donos perdem, eles tem que correr atrás de quem vendeu pra ressarcir.”
Diante da resposta dada, questionou-se como podem ser vendidos terrenos dentro dos
mangues, já que perante normas legais dos três níveis da federação essa prática é ilegal: em
algum momento houve legalização dessa área? “é, antigamente foi liberado pela prefeitura.
Ele é legalizado, entre aspas, pela prefeitura. Esse prefeito que esta agora não libera nada sem
o alvará da SUDEMA ou IBAMA”.
As palavras do administrador local indicam negligências acontecidas no processo de
crescimento urbano do litoral do Conde. O que precisa ser feito é uma reversão deste quadro e
o comprometimento em não ser conivente com novas tentativas de construção ilegal.
Na tentativa de comprovar um “limite” espacial de abrangência das segundas
residências, foi questionado se haveria um local onde a ocupação fosse prioritariamente de
segundas residências. A resposta foi positiva, “Carapibus como segunda residência, [a partir]
da PB-008 pra praia, e do asfalto pra cima, não. Mas Jacumã, tanto da 008 pra praia ou pra
dentro é misturado”.
Sobre a infraestrutura de apoio à comunidade e aos turistas o administrador somente
enumerou o que há nas praias: “Saúde a gente tem dois PSF – Posto de Saúde da Família e
um posto; polícia tem um posto. Saneamento é fossa, em Jacumã tem um pouco de
saneamento e água da CAGEPA; Carapibus e Tabatinga é poço e fossa. A gente fechou um
contrato com a ENERGISA, então vai ficar bem melhor a iluminação”.
Com relação à atenção dada aos freqüentadores das segundas residências foi
comentado que é a mesma àquela proporcionada a comunidade local.
Por fim, foi perguntado se o administrador identificava alguma modificação necessária
nessas praias, seja com relação à infra-estrutura, ao turismo, aos veranistas e planejamento em
geral. Segue sua resposta:
“Nas praias falta muita coisa, calçamento seria uma coisa importante, iluminação está em andamento, a prefeitura está fazendo um projeto pra Carapibus de água encanada, mas para Tabatinga não tem. Com relação à paisagem, se fosse mais ordenado seria bom, do jeito que foi feito ficou muito desordenado. Então eu não enxergo com bons olhos essa transformação que foi feita, foi feita muito rápido e muito desordenado. É
109
por isso que hoje a prefeitura aumentou muito o imposto pra dar o alvará de construção porque não quer que qualquer um chegue e construa de qualquer maneira, eu acho isso importante. Outra coisa que eu gostaria de falar é que 89% das casas em Jacumã são irregulares, não existem para a prefeitura, só existem terrenos, você vai lá e tira o IPTU e vai ver como terreno e não como casa, é complicado arrecadar pra fazer qualquer coisa. O pessoal constrói a casa e não tira alvará, mas hoje em dia não acontece isso, porque a gente tem os fiscais que atuam muito lá, isso eu estou falando de antes.”
Assim terminou a entrevista ao administrador local, com poucas novidades sobre a
situação em que se encontra a área no quesito modificação da paisagem e do meio. Mas com
suas palavras ficou exposto um fato que pode realmente ser agravante da falta de
investimentos na área, o não recolhimento do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU de
algumas casas devido sua não regularização perante a prefeitura. Enfatiza-se aqui que esse
fato não é uma justificativa para a negligência do governo municipal, mas é também um alerta
para que a fiscalização das construções aumente na área.
A entrevista ao administrador também pode confirmar as percepções sobre as
construções de segundas residências prioritariamente na faixa de terra que limita-se entre o
mar e a rodovia estadual PB-008. A escolha por este limite físico deu-se justamente por essa
percepção.
O último gestor público entrevistado foi o geógrafo pertencente à Secretaria de
Planejamento do Conde. Devido à mudança recente de Secretário, o novo responsável pela
Secretaria não estava apto a responder as questões, visto que acabara de tomar posse na
semana de realização das entrevistas e não possuía as informações necessárias. Já o
funcionário entrevistado já pertence ao quadro fixo da Secretaria a alguns anos e pôde
responder com conhecimento de causa.
Primeiramente se quis saber qual a visão que o funcionário tinha sobre o turismo de
segundas residências nas três praias. A resposta foi que esse tipo de turismo não proporciona
às praias um crescimento sustentável, pois os freqüentadores vêm nos finais de semana e
deixam muito lixo ao sair. Outro fato é que, com um grande número de segundas residências,
torna-se desinteressante ao governo investir na área, pois àquelas pessoas não são eleitores do
município e não renderão votos. Ainda foi mencionada a disparidade social entre os
proprietários de segundas residências e entre estes e a comunidade local, que por vezes gera
desconforto nas relações sociais.
Por esta primeira resposta - tendo deixado claro que não é seu posicionamento
particular, porém uma postura do governo municipal em termos gerais - se verifica um
110
posicionamento bem comum ao restante dos governantes no Brasil: promover ações que
gerem votos. É lamentável tal postura, posto que um governante não esteja no cargo para
angariar votos e sim para cumprir um compromisso assumido para com a sociedade. Não
prezar pela segurança ambiental e social vai além da falta de responsabilidade política, é falta
de cidadania e dignidade. Esse comportamento precisa ser mudado, é necessário governar
com honestidade, traçar planos, realizar obras e ações independente de quantos votos serão
ganhos ou perdidos com as escolhas administrativas, contanto que tudo se dirija ao bem
coletivo.
Com relação ao dito sobre o turismo de segundas residências potencializar a sujeira
deixada para trás pelos visitantes, é bom lembrar que toda e qualquer localidade está propensa
a tal comportamento e que este decorre da falta de educação, tanto educação proporcionada
pela Nação como educação do lar. Como esse problema tem uma extensão bem maior que um
município, sugere-se aqui que sejam efetuadas campanhas educativas que minimizem tais
comportamentos, em uma tentativa também de despertar consciência nas pessoas.
Cabe ainda dizer sobre o comentário do entrevistado que o lixo deixado pela maioria
das segundas residências, de acordo com as entrevistas, é aquele na frente de suas casas ou em
locais determinados para que o caminhão de coleta do município passe e o leve. Dessa forma,
as pilhas de lixo amontoadas pelas ruas e nos terrenos baldios, verificadas em várias
visitações à área e registradas por foto, são de responsabilidade do governo municipal, cabe a
ele a coleta suficiente ao não acúmulo.
Sobre o incômodo social trazido com o turismo pela disparidade social, só mesmo com
a valorização das culturas locais, com o fortalecimento da identidade cultural da comunidade
e proporcionando estabilidade financeira a mesma é possível contornar ou acabar com essa
questão.
Quanto ao que o geógrafo acredita acarretar as segundas residências ao meio ambiente
e a paisagem, segue,
“as pessoas com segundas residências chegam com muita demanda e pouca participação. Elas querem demais do poder público, mas geralmente não contribuem com participação, com formas de melhorias paralelas ao poder público. E uma característica dessas segundas residências no Conde é que muita gente é de fora do próprio país, então essas pessoas demoram a pisar no município. Muita gente não está fazendo turismo, mas comprando terreno pra vender, é especulação imobiliária mesmo. Porque quando a pessoa realmente freqüenta, passa final de semana, essa pessoa pode ser que traga algum benefício para o município, mas as pessoas que compram só pra especular não trazem benefício algum, só encarecem o valor da terra. A questão ambiental nós temos dois pontos a considerar, um é que ninguém
111
segue o Código Florestal, então margem ciliar de rio não é respeitada, e o outro é o das encostas com mais de 45° de inclinação que deveriam ser preservadas não são.”
Com relação à especulação imobiliária o gestor está correto, essa prática crescente no
Conde só impossibilita melhorias, posto que não existe diálogo com os donos dos terrenos e
encarece demais a região, incluindo ai o custo de vida da população já residente. As
construções irregulares, desrespeitando leis ambientais, já foram bastante discutidas e
exemplificadas por fotos.
Sobre as transformações ocorridas desde 1980 na área, decorrentes principalmente do
turismo de veraneio, o gestor lamenta:
“um dos grandes problemas no Conde foi justamente essa especulação ter sido tão avassaladora que não deixou nem área verde nem parques, hoje infelizmente a lógica capitalista no município do Conde é de degradação total do meio ambiente em prol de um desenvolvimentismo. Enquanto JK pensava em seu governo que ia desenvolver o Brasil com indústrias, hoje a gente vê o governo do município do Conde achando que vai desenvolver o município só e unicamente com o turismo de sol e mar e com construções imobiliárias, e se acha que desenvolvimento é isso.”
Mais um relato sobre uma postura política errônea, apostando em um turismo
salvacionista, atividade esta inexistente, seja no Conde ou em qualquer ponto do mundo.
Desde o início deste trabalho vem-se tentando esclarecer que o turismo não salva, mas
contribui para o desenvolvimento de uma localidade, a atividade é uma das possibilidades de
melhoria de um local. Lembrando novamente que desenvolvimento implica avanços positivos
na economia, na preservação do meio ambiente, na saúde, na educação, na segurança e na
cultura de um dado local.
Perguntado se a Secretaria tem dados sobre a expansão urbana proporcionada pelo
turismo de segundas residências foi respondido que não, que somente após o término do
Plano Diretor – que está parado, e tendo feito um cadastro imobiliário, é que será possível
visualizar a real situação do Conde. Mas o entrevistado coloca, “agora pra qualquer pessoa é
perceptível a degradação ambiental que está acontecendo no Conde. Existem vários exemplos
de como o crescimento desordenado tem gerado vários problemas, alguns até irreparáveis”. E
quanto ao controle sobre esse crescimento pelo poder público ele continua:
112
“de certa forma boa parte desses loteamentos são um pouco antigos, são da década de 60, os mais recentes são de 1978/80, então o que aconteceu foi o seguinte, houveram sobreposições de plantas, então as pessoas foram vendendo primeiro os lotes, depois foram loteando as áreas verdes, foram loteando ruas, o caos foi lançado. A Secretaria de Planejamento é recente, só tem cerca de 4 anos, só com ela veio o Plano Diretor mas que teve que parar e talvez agora, com o retorno da verba, a gente continue. Mas algumas outras Secretarias também precisam melhorar, como por exemplo a de infraestrutura com seus fiscais de obra que deveriam fiscalizar mais, por exemplo, essas áreas de margem de rodovias, você tem que dar 15m de margem, pra própria segurança, mas você tem ali dirigindo para Tabatinga verdadeiras quinas de muro dando pra pista e as pessoas trafegam ali a 80km/h. Então a fiscalização que deveria ocorrer com uma Secretaria mais atuante que também é a Secretaria de Obras, também não está ocorrendo não. Mas isso tá dentro do desenvolvimento governamental e é complicado porque os técnicos por mais que tenham conhecimento de como fazer, não tem autorização de fazer”.
Fica evidente através desta última resposta que a administração do Conde ainda
enfrenta problemas de integração entre suas Secretarias, o que possibilitaria um melhor
reconhecimento e controle da área. É preciso trabalhar, planejar e atuar em conjunto, para que
o resultado seja mais positivo e mais preciso. Além de o trabalho em conjunto ser mais fácil
para os gestores e suas equipes, a população certamente sente-se mais segura quando visualiza
essa integração e domínio dos problemas e soluções. Convém mencionar que chega a
incomodar essa verdade brasileira, quando se tem técnicos capacitados e conscientes de suas
responsabilidades que não podem fazer seu trabalho corretamente, ficam à mercê de
autorizações e conveniências inviáveis.
Tendo finalizado as entrevistas, pôde-se verificar a situação atual da área de estudo,
bem como comprovar os problemas ambientais e de planejamento urbano verificados in loco.
Tanto os gestores públicos quanto a população tem, cada um do seu jeito, a forma de
expressar a falta de ordem urbana e a degradação que vem acontecendo em Jacumã,
Carapibus e Tabatinga. Para dar uma visibilidade sob outro ângulo dessas questões discutidas
nas entrevistas, no próximo tópico são apresentados os mapas de expansão urbana e de
impactos ambientais.
113
5.2 Mapas de uso e ocupação: expansão urbana linear e impactos ambientais
Foram produzidos três mapas que possibilitam demonstrar as modificações ocorridas
no espaço estudado no período de 1985 a 2008, enfatizando o crescimento urbano e linear das
três praias, a proporção de ocupações advindas do turismo de segundas residências na área e
como este turismo impacta o meio ambiente.
O Mapa 1, Sobreposição das Áreas Urbanas 1985 x 2008” (p.110), foi elaborado a
partir do cruzamento de dados entre as fotografias aéreas de 1985 adquiridas no INTERPA e
da imagem de satélite Quick Bird do ano de 2008 adquirida através da Secretaria de
Planejamento do Conde.
No processo de produção do mapa foram digitalizadas as fotografias de 198538 (escala
1:40.000) e, em cima das mesmas, feitos os polígonos com as seguintes classes temáticas:
área urbana construída, de área loteada e não construída e de vegetação. Depois dos polígonos
de ocupação terminados foi feito um segundo processo de verificação através de pesquisa no
INTERPA com as mesmas fotografias ampliadas para a escala 1:10.000, para confirmar e
aperfeiçoar os dados registrados. Os polígonos de mesmas classes temáticas foram
construídos na imagem de satélite do ano de 2008.
Tendo construídos os dois mapas de ocupação referentes a cada ano, fez-se a
sobreposição destes mapas através do Cruzamento de Plano de Informação do Programa
Spring. Esta ferramenta possibilita entrecruzar os dados dos dois mapas, ou seja, sobrepõe os
seus polígonos de acordo com as necessidades a serem atendidas. Neste caso, foi feita a
seguinte operação/verificação:
• O que em 1985 era área construída e tonou-se área loteada e não construída até 2008;
• O que em 1985 era área construída e tornou-se vegetação até 2008;
• O que em 1985 era área construída e assim permaneceu até 2008;
• O que em 1985 era área loteada e não construída e assim permaneceu até 2008;
• O que em 1985 era área loteada e não construída e tornou-se área construída até 2008;
• O que em 1985 era área loteada e não construída e tornou-se vegetação até 2008;
• O que em 1985 era vegetação e tornou-se área construída até 2008;
38 Dados das fotografias: INTERPA, 1985. TERRAFOTO: escala 1:40.00; 01/03/85; Obra 497 PB 1 Faixas 06, 07 e 08.
114
• O que em 1985 era vegetação e assim permaneceu até 2008;
• O que em 1985 era vegetação e tornou-se área loteada e não construída até 2008.
A partir desse cruzamento obteve-se a tabulação dos dados que seguem:
Plano 1 – nas linhas: área urbana 1985
Plano 2 – nas colunas: área urbana 2008
2008
1985
Área construída Área loteada e
não construída
Bares Vegetação
Área construída 745 m² 206 m² 6 m² 10 m²
Área loteada e
não construída
851 m² 1.943 m² 60 m² 68 m²
Vegetação 39 m² 31 m² 0 m² 409 m²
Quadro 3: Cruzamento de dados da área urbana entre os anos de 1985 e 2008.
Desta informação retira-se que os números obtidos são condizentes com os interesses
do mercado imobiliário, e do próprio governo municipal, que vêm se impondo desde a década
de 1970 no Conde, quando grande extensão de vegetação já havia sido devastada para fazer os
loteamentos.
Com isso, os números não se tornaram tão alarmantes, porém destaca-se que 39m² de
vegetação tornaram-se área construída até 2008 e 31m², também de vegetação, virou
loteamento até 2008. Ou seja, além de tudo que já havia sido retirado para lotear, continuou-
se o processo de ocupação sobre a área vegetal. Tem-se que 68m² de vegetação conseguiram
se regenerar após terem sido cortados e loteados mesmo constando nos documentos públicos
como loteamento (na cor verde claro no mapa), porém tal fato não significa que permanecerão
vegetação.
Essa regeneração é bem compreensível quando se olha o mapa, pois se deu,
majoritariamente, na área que margeia os manguezais e que mantiveram porcentagem de sua
composição original. Ao mesmo tempo, olhando sobre a mesma categoria e para mesma área
(acompanhando rio e manguezal), chama-se atenção que a proporção de vegetação que se
restabeleceu é bem pequena perante aquela que foi cortada e não conseguiu se regenerar –
representada pela cor marrom no mapa.
115
Os demais números não indicam grandes mudanças: 745m² permaneceram de área
construída durante os anos; 851m² passaram de área loteada para área construída - um
processo natural, e 1.943m² permanecem loteados à espera de suas construções.
Pelo mapa é possível ver a linha de costa sendo ocupada progressivamente. Em 1985
as casas se concentravam apenas na praia de Jacumã. As demais praias juntas não continham
mais que 15 casas, podendo ser observada tal informação na legenda referente à área
construída em 1985 que permaneceu construída em 2008 (hachura vermelha). Já quando
analisada a área loteada e não construída de 1985 que se tornou construída em 2008, se
percebe as construções ocupando o restante da linha de costa. Somando o visual ao que foi
obtido nas entrevistas é possível dizer que as três praias vêm sendo ocupada de forma linear
uma após outra, cronologicamente.
117
O Mapa 2, Área Urbana 2008 e Segundas Residências (p. 112), permite visualizar o
quanto da área urbana nas três praias é ocupado pelas segundas residências turísticas. O mapa
foi elaborado a partir da imagem de satélite Quick Bird de 2008, sendo construídos os
polígonos de área construída, de área loteada e não construída, de bares e de vegetação, e em
outra etapa feitos os polígonos dos lotes das segundas residências. Tenda as duas etapas
prontas (em Planos de Informação diferentes), foi feita a sobreposição, podendo visualizar os
lotes das segundas residências sobre a mancha urbana.
Para o reconhecimento dos lotes das segundas residências foi realizado trabalho de
campo com as agentes de saúde de cada praia. Por essas agentes possuírem um contato
constante com a população do local, bem como percorrerem as casas fazendo suas visitas
rotineiras e pesquisas, elas possuem a informação das casas ocupadas por moradores fixos ou
temporários, assim como sabem das casas fechadas. Tornaram-se assim chave para fazer o
mapeamento das segundas residências, apontando quais as casas habitadas por residentes
fixos e aquelas dos temporários. Além da constatação pelas agentes de saúde, várias visitas à
área foram realizadas a fim de verificar as casas fechadas, postas à venda ou para alugar,
como também para localizar as construções que são pousadas, hotéis ou restaurantes.
Analisando por praia vê-se que em Jacumã a relação entre a mancha urbana e as
segundas residências é menor. Têm-se mais casas de residentes fixos e pontos comerciais do
que casas de veraneio. Mesmo tendo crescido como área turística, Jacumã hoje é
prioritariamente ocupada por nativos, nascidos e criados ali mesmo ou que já estão no local
por vários anos, tendo constituído na praia residência fixa.
Já a praia de Carapibus, pode-se notar pelo mapa, tem um número maior de segundas
residências em relação à mancha urbana e em relação à Jacumã. O reconhecimento in loco
aponta ainda um maior número de pousadas e hotéis, o que faz da praia prioritariamente área
de exploração turística, sendo equilibrada a proporção entre estabelecimentos turísticos
comerciais e segundas residências.
Tabatinga apresenta o maior número de segundas residências dentre as três praias,
tendo seu espaço quase que 100% ocupado por estas. Pode-se até contar quantos lotes não são
segundas residências e quais são destinados a pousadas e hotéis.
Por fim, foram calculadas as áreas totais da mancha urbana (965m²) e dos lotes de
segundas residências (486m²). Fazendo uma razão de proporcionalidade entre essas, obteve-se
que 50,4% da mancha urbana referem-se às casas de segundas residências.
119
O terceiro e último mapa, “Segundas Residências x Área de Preservação Ambiental”
(Mapa 3, p.116), possibilita ver e comprovar quantas segundas residências estão construídas
em áreas irregulares perante as leis ambientais, leis estas que foram anteriormente tratadas
nesse trabalho. O mapa foi elaborado a partir da sobreposição entre o mapa de preservação
ambiental construído por Lilian Ferreira Cardoso da Silva em seu trabalho de conclusão do
curso de mestrado pelo Programa PRODEMA/UFPB39, tendo sido feitas pequenas alterações,
e o mapa com os lotes das segundas residências. Gerou-se com isso o visual de como os lotes
de segundas residências estão dispostos sobre áreas de preservação.
O mapa de preservação traz as seguintes áreas protegidas por lei:
• As faixas de proteção de mangues regulamentadas pela Lei nº 7.803 de
18/07/1989 - e denominadas Buffer Mangue 50-200 no mapa, pois os rios ali
encontrados estão dentro da extensão de 10 a 50 metros e superiores a 50
metros que os fazem ter uma faixa de proteção de 50 a 100 metros;
• As faixas de proteção de falésias regulamentadas pela Lei nº 7.803 de
18/07/1989 - e denominadas Buffer Falésias no mapa, que traçam uma faixa
de 100 metros a partir da falésia em direção ao continente;
• As declividades acima de 45º, aqui representadas por aquelas acima de 30%,
regulamentadas pela Lei nº 4.771 de 1965;
• As áreas de mangues protegidas pela Lei 9.605 de 1998;
• As margens de rodovias regulamentadas pela Lei 4.771 de 1965 - equivalendo,
no caso, à 15 metros para cada lado.
39 A referência consta na bibliografia deste trabalho.
120
Segue abaixo tabela expositiva que quantifica os casos de irregularidade em números
de lotes:
Tabela 1: Quantificação de lotes edificados dispostos sobre áreas de proteção ambiental. Jacumã Carapibus Tabatinga
Buffer Mangue 70 42 62
Buffer Falésia 23 6140 24
Declives 07 35 09
Mangue 0 0541 01
Margem de Rodovia 08 0 02
Total 108 143 98
Como pode ser observado, as três praias apresentam inúmeros casos de irregularidades
(totalizando 349), com lotes já edificados ocupando as áreas que seriam de preservação
ambiental. São lotes que estão dentro das faixas de preservação de falésias, declives e
mangues, ou pior que isso, alguns desses lotes e casas estão exatamente sobre falésias,
manguezais e declives. Os manguezais nas três praias foram aterrados em alguns pontos para
possibilitar a construção de residências, procedimentos como esses nunca poderiam passar
despercebidos pelo poder público, mas por muitos anos isso aconteceu na área de estudo.
Além do aterramento, outro grave problema com relação aos manguezais é que os
detritos domésticos podem estar sendo lançados diretamente nesta área e se não estão, de
qualquer forma, se uma fossa é construída praticamente dentro do mangue/rio certamente ela
causará a poluição do mesmo. Mais uma vez fica aqui a preocupação em uma fiscalização
mais rigorosa por parte do poder público nestes locais.
As faixas de proteção dos manguezais são as áreas de proteção mais adensadas pelas
segundas residências, somando 174 lotes nas três praias. Tal fato prejudica tanto fauna quanto
flora locais: os animais ficam cercados por construções, praticamente sem área de refúgio e
circulação; e são freqüentes os cortes de mata ciliar. Outro problema dessas construções é a
impermeabilização do solo em uma área que, provavelmente, serve também para a vazão do
40 Sendo 46 lotes com sua área total inserida nessa faixa de proteção ambiental e 15 parcialmente. 41 Um dos lotes apresenta mais 50% do seu território total dentro do mangue, comprovando aterramento. Os outros quatro lotes têm proporções menores de áreas dentro do mangue.
121
rio que margeia. Esse fato leva ao possível alagamento dessas casas quando da enchente do
rio.
Além da questão ambiental, perde-se qualidade paisagística, já que em meio à natureza
surge cada vez mais solo edificado, várias casas que acabam “quebrando” a harmonia e o
equilíbrio do meio natural. Onde se espera ver o verde do mangue, encontra-se cada ano mais
concreto, empobrecendo e bloqueando a vista desse ecossistema.
No que tange os proprietários de casas sobre falésias e grandes declividades, 159 no
total, esses não atentam para o próprio risco que correm, visto que a erosão pelas águas
superficiais, dos ventos ou decorrente do avanço do mar pode fazer desabar essas casas.
Pensar em preservação então está muito longe da realidade desses proprietários, se não
prezam pela própria segurança, imagina-se que respeitar a natureza e as leis ambientais não
deve fazer parte de suas intenções.
É preciso citar ainda que algumas ruas transversais à praia em Carapibus, localizadas
nas bordas da falésia, foram literalmente fechadas por construções, ou seja, o que era acesso
público hoje se encontra “privatizado”. As construções sobre as falésias de Carapibus, como
foi mencionado por um dos entrevistados dessa praia, formam ainda um paredão que
“tampou” a vista panorâmica da praia e diminuiu a passagem do vento para áreas posteriores
ao primeiro quarteirão da praia.
Em Tabatinga foi possível ver como o processo de loteamento irregular acabou
prejudicando visivelmente o meio e causando, inclusive, transtornos aos proprietários de lotes
e construções. Por ter sido loteada área dentro da faixa de proteção da falésia e com isso ter
sido desmatada, uma grande voçoroca foi se abrindo e continua em processo de erosão. Não é
possível na verdade dizer se o desmate provocou a voçoroca ou se apenas acelerou seu
processo, é fato que a falta de vegetação nativa, somada ao fluxo de carros nas ruas bem
acima da voçoroca, geram maiores possibilidades de erosão.
A voçoroca hoje atinge e já erodiu ruas e lotes de Tabatinga e está bem próxima de
segundas residências (como se registrou em fotos já apresentadas). Os moradores de
Tabatinga junto a AMATA desejam um projeto de contenção da voçoroca, durante o encontro
no dia 05/06/2010 (dia Mundial do Meio Ambiente), esta vontade foi expressa durante
visitação ao local. Como esses projetos de contenção costumam ser bastante onerosos, é bem
possível que nada seja feito, já que o encargo é pesado para os moradores e o poder público
não parece estar consciente do problema ou interessado em contê-lo.
Todos os problemas citados e confirmados na construção dos mapas tendem a
aumentar com o crescimento do número de construções, é preciso que em um momento breve
122
as autoridades municipais responsáveis atuem em prol de melhorias para a área. Os moradores
e proprietários de segundas residências também devem ajudar o poder público, assim como
tem tentado a Associação de Moradores e Amigos de Tabatinga.
O planejamento urbano da área deve ser participativo na medida do possível, como
também sua concretização. Todos, comunidade e poder público, podem elaborar planos de
manejo ecológico-ambiental para as áreas degradadas e áreas de preservação, contribuindo
para a sustentabilidade local. Sem a contribuição de ambas as partes é possível que um
ambiente até então atrativo passe a não exercer mais essa função perante turistas e residentes,
gerando assim um efeito cascata sobre a economia e a sociedade do município e até mesmo da
capital paraibana.
124
6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
6.1 Conclusões
É inegável que a atividade turística traz alterações aos locais onde aporta, sejam elas
benéficas ou não. A partir da análise dos conceitos sobre paisagem e meio ambiente, bem
como da importância que esses têm para a vida em sociedade, pôde-se avaliar o quanto o
turismo vem interagindo com tais conceitos e analisar o impacto que a atividade proporcionou
nas áreas estudadas. Baseado nas pesquisas realizadas, entrevistas e reconhecimento por
imagens e in loco, constata-se que ao longo destes 30 anos a paisagem e o meio ambiente
locais vêm sendo significativamente alterados (e degradados) nas três praias.
Partindo do que foi discutido acerca da qualidade da paisagem, percebe-se referente à
qualidade ambiental, que fauna e flora foram e continuam sendo bastante modificados,
influenciando assim na vida da sociedade: rios e mangues sendo poluídos prejudicando as
espécies vivas dessas áreas; o corte da vegetação tem provocado o desaparecimento de
espécies da fauna na região; as condições de saneamento básico encontradas na praia de
Jacumã são precárias; as construções irregulares alteram o meio em todas as praias. O que foi
e é devastado no ambiente tem implicado de alguma forma nas condições de vida dos
moradores e/ou visitantes, seja no bem-estar ou por prejudicar a economia do local.
Existe um desequilíbrio da funcionalidade urbana entre as três praias, onde Jacumã
concentra todo o potencial do comércio de bens e de serviços (alimentícios, bancários,
educacionais e de segurança pública) e as demais praias não os oferecem, existindo a
necessidade de constante deslocamento dos residentes secundários para suprir suas
necessidades.
A qualidade estética que vislumbra tanto a paisagem vista quanto o envolvimento
afetivo/emocional que a mesma proporciona, apresenta um processo inverso ao anterior:
enquanto Carapibus e Tabatinga permanecem em certo equilíbrio, Jacumã vem perdendo a
qualidade estética ao longo dos anos. Provavelmente essa perda deu-se por Jacumã ter sido a
primeira praia a ser ocupada e com isso a preocupação quanto ao ordenamento urbano ter se
tornado falha, ou mesmo por concentrar ali um número maior de atividades comerciais, tendo
poupado as duas outras de construções do comércio local e fluxo para estes fins.
Os esgotos correndo a céu aberto, as ruas de barro em estado intransitável pelos
buracos, o lixo acumulado em várias ruas e até na avenida principal, os congestionamentos
125
em períodos de alta estação turística, tudo isso vem se somando e fazendo de Jacumã um local
caótico. A estética de Jacumã é prejudicada ainda pelos bares construídos na beira-mar e na
laguna costeira que empobrecem a paisagem, quebrando a beleza natural e impondo
construções desordenadas que trazem consigo bastante sujeira durante os finais de semana,
feriados e verão.
As dificuldades enfrentadas em Jacumã trazem como conseqüência um retorno
negativo da ligação que seus moradores e freqüentadores têm com a praia, são muitas
reclamações, insatisfação e descomprometimento. As pessoas que ali possuem uma
propriedade demonstram não ter tanto vínculo emocional com a praia.
Carapibus apresenta como maior problema estético as várias construções na borda da
falésia – 46 no total, que prejudicam paisagisticamente o visual da praia, e nos bares a beira-
mar, que oferecem estrutura precária. Diferente de Jacumã, seus residentes secundários
pronunciam-se satisfeitos até então e demonstram ter um sentimento bom pela praia que
visitam.
A praia de Tabatinga tem a melhor qualidade estética dentre as três. Tendo preservado
mais a vegetação que as demais, possuindo apenas um bar a beira-mar que também está em
área verde e promovendo várias campanhas de preservação ao meio, a praia conseguiu se
destacar positivamente durante esta pesquisa. O alto grau de envolvimento afetivo que os
proprietários de segundas residências possuem com Tabatinga, a sensação de prazer em ser
parte daquele meio e daquela paisagem é nítida tanto em todos os entrevistados, como
naqueles com os quais foi possível conviver nestes dois anos de pesquisa in loco.
Vinculado à questão ambiental, mas concluindo agora a participação do poder público
na região, pode-se acrescentar a falta de comprometimento em fazer cumprir as leis
ambientais. As normas, leis e planos citados no tópico “Normas legais: estabelecendo formas
de uso da terra, protegendo a paisagem e o meio ambiente”, foram apresentadas para nortear a
percepção aqui conclusiva de que nenhuma daquelas abordadas vem sendo respeitada, através
das entrevistas, das visitas ao campo e pela imagem de satélite este fato veio à tona.
Pôde-se verificar por parte do governo municipal certo atraso ou certa omissão quanto
suas obrigações estabelecidas no PNGC, bem como em pôr em prática o que o próprio projeto
do Plano Diretor Municipal vem traçando como diretrizes. A exemplo das diretrizes do
Desenvolvimento Turístico e Estruturação dos Serviços Básicos têm-se que, diferente do
determinado, a população local não está satisfeita com as ações, ou melhor, não-ações do
governo. A diretriz da Qualificação Ambiental traz: valorização do patrimônio ambiental,
126
promovendo suas potencialidades e assegurando sua perpetuação. Não foi possível visualizar
esta pretensão quanto à perpetuação desse bem.
Dizer que as políticas de desenvolvimento do turismo nas praias de Jacumã, Carapibus
e Tabatinga vêm contribuindo e estão prezando por um meio ambiente equilibrado para todos,
conforme sugere o conceito de desenvolvimento sustentável e estabelece a Constituição
Federal, é mascarar ações que infringem o bem de todos naquela área, afinal o poder público
tem negligenciado o controle da situação ambiental daquela área.
Ficou claro através da pesquisa que os conceitos e atributos do planejamento, do
planejamento físico-territorial e da gestão, não têm feito parte das ações dos poderes públicos
municipal, estadual e federal na medida em que são necessários. Nenhuma das três esferas
está cumprindo verdadeiramente com seu papel de autoridade ordenadora e fiscalizadora das
áreas de proteção ambiental. Tendo envolvidas leis que incluem as três esferas do poder na
responsabilidade de proteger o meio, é preciso um melhor trabalho em conjunto, que
realmente atue na área cumprindo com seu papel de zelar pelo bem de todos, algo que
deveria, mas não foi expresso nem comprovado nas entrevistas.
Além dos problemas vinculados à legislação ambiental, ainda tem-se aqueles
estruturais, de ordem urbana que também demonstraram a falta de planejamento e gestão
pública, nesse caso a nível municipal: a falta de saneamento básico em grande parte de
Jacumã; o saneamento por fossas nas praias de Jacumã e Carapibus, que não se sabe até que
ponto estão de acordo com os padrões ambientais necessários; as ruas de barro em condições
precárias nas três praias, precisando de um nivelamento ou até o calçamento de algumas vias
principais para acesso; o ordenamento e saneamento dos bares em área de praia em Jacumã e
Carapibus, somado ao bar construído em plena praça pública de Tabatinga; a melhor
distribuição dos serviços necessários para o dia-a-dia (sejam públicos ou privados).
Com todos esses fatos tornou-se inegável a falta de efetivo planejamento urbano. Em
momento algum, durante os dois anos de pesquisas in loco e entrevistas, foi apresentado pelo
poder público ou pelos proprietários de segundas residências fatos ou documentos públicos
que comprovassem qualquer tipo de planejamento para a área. A administração municipal
carece ainda de uma gestão atuante, que produza ações de melhoria para a sociedade e o meio,
que busque a participação social em seus projetos e suas decisões. Falta uma gestão pública
que compreenda os problemas que vem ocorrendo na área, que os estude e trace caminhos que
os solucionem.
Sobre as segundas residências, pôde-se concluir, inclusive apresentando visualmente
pelos mapas, como essa forma de fazer turismo está fortemente presente na área,
127
principalmente nas praias de Carapibus e Tabatinga, não querendo com isso diminuir o
impacto dessa atividade sobre a praia de Jacumã. Dessa conclusão fundamenta-se o
argumento de que é preciso sim analisar o turismo da área como propulsor da forma urbana e
da vida urbana que ali existe. Ou seja, o turismo de segundas residências foi e continua sendo
responsável pela configuração espacial das construções, incluindo nisto as modificações
paisagísticas e ambientais da área.
As praias que são prioritariamente ocupadas pela atividade turística, Carapibus e
Tabatinga, tiveram e têm seu espaço alterado com as construções das segundas residências.
Jacumã por sua vez tem tido seu espaço alterado cada vez mais com construções para atender
ao fluxo de moradores temporários das três praias (além dos fixos de Jacumã). Esta afirmação
se dá com base no processo de conversão de casas habitacionais em comerciais que tem sido
visto na praia, toda a avenida principal, por exemplo, já se transformou em comércio, com
exceção apenas dos prédios residenciais.
Essas alterações modificam também o contexto social e econômico da praia de
Jacumã, e da mesma forma faz com que as outras duas praias permaneçam preservadas ou
estagnadas na “evolução urbana”, dependendo do ponto de vista de quem as observa.
Expondo aqui uma opinião particular, acredito mais em uma preservação das demais praias do
que uma estagnação, pois repetir as condições sociais, espaciais e ambientais de Jacumã seria
perder a qualidade paisagística, ambiental e de vida que ainda se tem.
A ocupação pelas segundas residências trouxe, mesmo que não propositalmente, a
degradação paisagística e ambiental, advindas de suas construções em áreas de preservação
ambiental. Alterando ambientes como manguezais, elas trazem prejuízos a esse ecossistema.
Tendo ocupado falésias e declives acentuados essas casas de segundas residências diminuem
a qualidade estética da paisagem.
Enfim, o trabalho mostrou que as três praias sofreram e sofrem degradação ambiental
e paisagística. Essa degradação é fruto, principalmente, de uma ocupação por segundas
residências que vem se dando, desde seu princípio, de forma desordenada: sem um
planejamento coeso e consistente (urbano, paisagístico, ambiental, social ou econômico) e
sem uma gestão pública apropriada.
128
6.2 Recomendações
Conforme analisado e concluído nesse trabalho, tanto planejamento como gestão são
ferramenta e forma de ação, respectivamente, que auxiliam na obtenção de uma melhor
administração pública e que não vêm sendo utilizadas pela administração pública do Conde.
Durante as entrevistas ao setor público entendeu-se que seus objetivos buscam alcance
imediato, sem levar em conta as reais necessidades e prioridades, pelo menos no que tange
existentes na área pesquisada. Esse imediatismo pode levar a ações que invés de desenvolver
a área, traga problemas posteriores. No caso da implantação do turismo, a falta de
planejamento e acompanhamento constante pode levar ao esgotamento prematuro dos
recursos ambientais e cênicos das três praias.
Espera-se que um dia seja possível ter planejamentos a médio e a longo prazo traçados
coerentemente no Conde, assim como uma gestão consciente que permita a participação
popular verdadeiramente e que defenda o planejamento traçado sem perder a flexibilidade
necessária.
Convém enfatizar a necessidade de um plano de desenvolvimento turístico sustentável
para a área, que englobe questões de conservação e preservação dos recursos naturais, melhor
distribuição do sistema de saúde, de segurança e de educação pública, projetos de
ordenamento urbano e de reurbanização de áreas como a quadra de Jacumã e toda a extensão
dessa praia. É preciso ainda investimento em marketing turístico e uma fiscalização mais
rigorosa em todas as construções da região.
Existem metodologias de análise que fornecem dados para a construção de
planejamentos, projetos e planos e que podem ser de grande valor para a gestão pública, uma
vez que se terá em mãos informações relevantes para o desenvolvimento de uma área (local).
A partir da análise do resultado que essas metodologias fornecem é possível traçar o melhor
caminho a ser seguido pelo setor público, ou por particulares que desejem propor projetos de
manejo para área. Algumas dessas técnicas de análise estão aqui dispostas:
• Técnica de Análise Multicriterial
• Processo de Análise Hierárquica (AHP)
• Matriz de Ponderação
• Quantificadores de Percepção
129
Essas são apenas algumas recomendações baseadas em toda problemática que pôde ser
constatada na área em questão. No decorrer desse trabalho foram pontuadas falhas na gestão
pública bem como ações particulares que precisam ser mudadas para que as praias, hoje
atrativos fundamentais para o turismo e conseqüentemente para a economia do Estado da
Paraíba, permaneçam com seu potencial.
130
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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA COUTINHO, Sandra Maria do Nascimento. Impactos antópicos nas microbacias do litoral sul do Estado da Paraíba: ênfase nos aspectos sócio-ambientais e características estruturais do mangue na laguna de Cumurupim. Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa Regional de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA) da Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, PB, 1999. BERTALANFFY, Ludwig Von. Teoria Geral dos Sistemas. Trad. de Francisco M. Guimarães. 2ª Ed. Petrópolis: Vozes, 1975. GOMES, Márcio Fernando. Metodologia de Análise Hierárquica aplicada para a escolha do sistema de disposição de subprodutos da mineração com ênfase nos rejeitos de minério de ferro. Dissertação de Mestrado apresentada ao Núcleo de Geotécnica da Universidade Federal de Ouro Preto. Ouro Preto, MG, 2009. KIYOTANI, Ilana. Turismo, Urbanização e Paisagem: um estudo de caso da Praia de Jacumã. Monografia de Graduação apresentada ao Curso de Bacharelado em Turismo da Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, PB, 2006. MARENZI, Rosemeri Carvalho. Percepção da Paisagem. 2003. Disponível em: http://www.cehcom.univali.br/educado/percepcao_paisagem.doc. Acesso em: 16/06/2009. ROCHA, José Carlos. Diálogo entre as Categorias da Geografia: espaço, território e paisagem. Revista Caminhos da Geografia, v. 9, nº 27. Uberlândia, MG: 2008. Disponível
em: http://www.ig.ufu.br/revista/caminhos.html. Acesso em: 09/11/2009. SANTOS, Milton. Espaço e Método. São Paulo: Nobel, 1985. SCHIER, Raul Alfredo. Trajetórias do conceito de paisagem na geografia. In: Revista RA’E GA. Nº7, p. 79-85. Curitiba: UFPR, 2003. SIQUEIRA, Patrícia Ximenes. Problemas ambientais e o crescimento urbano do distrito de Jacumã – Município do Conde – PB. Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa Regional de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA) da Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, PB, 2005.
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1. Roteiro de entrevistas
1.1 Entrevistas aos proprietários de segundas residências:
1. O que os levou a buscar/construir uma segunda residência em Jacumã? Qual o interesse por esta área? 2. Em que ano comprou/construiu? 3. Com que freqüência veraneia nesse local? 4. Quando comprou ou começou a construir houve alguma preocupação com o meio ambiente (pensou se iria degradá-lo, se sim, que tipo de degradação iria ocorrer)? 5. Houve a preocupação em saber se existia infra-estrutura necessária para a ocupação? 6. Sente a falta de alguma infra-estrutura na área? Qual? 7. Ter um terreno/casa/apartamento aqui é economicamente viável? Foi na época da compra? 8. Vale a pena ter um imóvel nessa área? 9. Desde o ano da compra/construção até hoje, o(a) senhor(a) tem alguma reclamação a fazer sobre essa área? (no sentido de: infra-estrutura, modificação da paisagem, o que mudou nesses anos, qualidade do lazer, etc). O que acha que tem que melhorar? 10. O(a) senhor(a) identifica algum tipo de degradação (alteração) ambiental nessa área? Se sim, qual (is)? 11. Caso haja a identificação na pergunta 10, perguntar se mesmo assim mantém o interesse em continuar freqüentando a área. 12. Pretende deixar de freqüentar essa área? Se sim, por quê?
1.2 Entrevistas à administração pública
1.2.1 Entrevista ao Secretário de Turismo:
1. Qual a visão geral que o senhor tem sobre a atividade turística nas 3 praias? 2. E mais precisamente sobre o turismo de veraneio (segundas residências) na área? 3. A secretaria tem dados sobre o crescimento do turismo da década de 1970 até agora? E sobre as segundas residências? (Qual sua proporção, seu crescimento, etc) 4. Como se deu esta expansão do turismo de veraneio na área? Quais as transformações ocorridas devido ao turismo de segundas residências? 5. Há como identificar uma área que seria prioritariamente destinada/ocupada às segundas residências? 6. Como é a infra-estrutura de atendimento aos moradores dessas praias e, conseqüentemente, aos turistas veranistas? Qual sua avaliação sobre a mesma? 7. Qual é a atenção dada pela administração pública ao turismo de segundas residências, principalmente com relação às questões urbanísticas e ambientais? 8. O senhor identifica alguma modificação necessária nessas praias? Seja com relação à infra-estrutura, ao turismo, aos veranistas e planejamento em geral. 9. Como o senhor analisa a modificação da paisagem de 70 pra cá?
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1.2.2 Entrevista ao responsável pela Unidade Administrativa de Jacumã:
1. Qual a visão geral que o senhor tem sobre o turismo de veraneio nas 3 praias? 2. Como é a relação entre estes moradores de segundas residências e o poder público local? Existe este contato? Se sim, o que é mais discutido entre as partes? 3. O que o senhor acredita que este nicho de mercado acarreta ao meio ambiente e aos aspectos urbanísticos? Quais as transformações ocorridas nesta área devido ao turismo de segundas residências? 4. Existe algum tipo de controle sobre a expansão das segundas residências? Qual? 5. Há como identificar uma área que seria prioritariamente destinada às segundas residências? 6. Como é a infra-estrutura de atendimento aos moradores dessas praias e, conseqüentemente, aos turistas veranistas? 7. Qual é a atenção dada pela administração pública ao turismo de segundas residências, principalmente com relação as questões urbanísticas e ambientais? 8. O senhor identifica alguma modificação necessária nessas praias? Seja com relação a infra-estrutura, ao turismo, aos veranistas e planejamento em geral.
1.2.3 Entrevista à Secretaria de Planejamento:
1. Qual a visão geral que o senhor tem sobre o turismo de veraneio nas 3 praias? 2. O que o senhor acredita que este nicho de mercado acarreta ao meio ambiente e aos aspectos urbanísticos? 3. Quais as transformações ocorridas nesta área devido ao turismo de segundas residências desde a década de 1970? 4. A secretaria tem dados sobre a expansão urbana proporcionada pelo turismo de segundas residências? Existe algum tipo de controle sobre esta expansão? Qual? 5. Há como identificar uma área que seria prioritariamente destinada às segundas residências? 6. Todos os lotes já construídos e todos os loteamentos existentes nesta área (identificar área exata de estudo) tem sua situação regularizada? E aqueles que ocuparam a área antes mesmo de qualquer interferência governamental na divisão do solo? 7. Como é a infra-estrutura de atendimento aos moradores dessas praias e, conseqüentemente, aos turistas veranistas? 8. Qual é a atenção dada pela administração pública ao turismo de segundas residências, principalmente com relação as questões urbanísticas e ambientais? 9. Com relação ao zoneamento urbano, em que estágio se encontra este processo e quais suas metas? 10. Existem projetos urbanos em vista para os próximos anos? (pois em 2005 existia um projeto de reurbanização da orla que nunca foi começado)
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2. Programa LEGAL (Spring): processado para efetuar a Tabulação Cruzada de dados gerando assim o mapa de Sobreposição Urbana entre os anos de 1985 e 2008.