Post on 05-Jul-2020
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Título: História de PortugalAutores: Diogo Ferreira e Paulo DiasEditoras: Maria João Mergulhão / Maria da Graça DimasRevisão: Nuno PereiraDesign de capa: DesignGlow.comPaginação: Helena GamaImpressão e acabamentos: Tipografia Lousanense
1.ª Edição: agosto de 2016ISBN: 978-989-8816-35-1Depósito Legal N.º 413457/16
© 2016, Verso da Kapa, Diogo Ferreira e Paulo DiasTodos os direitos reservados
Verso da Kapa • Edição de Livros, Lda. Rua da Boavista , 132-1341200-070 Lisboainfo@versodakapa.ptwww.versodakapa.pt
Índice
I – Antes de Portugal: Da Pré-História ao Condado Portucalense 15
•dosprimeirospovoadoresaosceltiberos 15
•OdomíniodeRoma:daRepúblicaaoimpério 18
•Asinvasõesgermânicaseárabes–séculosV-Viii 19
•OcondadoPortucalense–séculosiX-Xii 20
Cronologia 22
II – Portugal Medieval (séculos XII-XV) 25
PolítICA e GuerrA 25
•d.Afonsoi(1139-1185) 25
•d.Sanchoi(1185-1211) 27
•d.Afonsoii(1211-1223) 28
•d.Sanchoii(1223-1248) 29
•d.Afonsoiii(1248-1279) 31
•d.dinis(1279-1325) 33
•d.AfonsoiV(1325-1357) 34
•d.Pedroi(1357-1367) 36
•d.Fernandoi(1367-1383) 37
•d.Joãoi(1385-1433) 38
•d.duarte(1433-1438) 41
•d.AfonsoV(1438-1481) 42
eConoMIA e SoCIeDADe 43
•AigrejaMedieval 43
•UmasociedadedeOrdens 44
•Fome,pesteeguerra–oséculoXiV 45
•Ocrescimentourbano–Lisboa 46
CulturA e ArteS 47
•casteloseigrejas–doRomânicoaoGótico 47
•Oportuguêscomolínguaescrita 49
•Ascrónicasdereiseosromancesdecavalaria 50
•AculturadospríncipesdeAvis 51
Cronologia 52
III – Portugal no início da Modernidade (séculos XV-XVI) 57
PolítICA e GuerrA 57
•Aconquistadeceuta(1415)eaexpansãoportuguesaemMarrocos 57
•Asnavegaçõesatlânticas–doinfanted.Henriquead.Joãoii 60
•A“eradourada”ded.Manueli 63
•OreinodePortugalemtemposded.Joãoiied.Manueli 65
eConoMIA e SoCIeDADe 66
•FidalgoseaventureirosemÁfricaenoOriente 66
•Feitoriasefortalezas 68
•Ocomérciodacostaocidentalafricana–escravos,marfimeanimaisexóticos 68
•OcomérciodoOriente–especiarias 69
CulturA e ArteS 71
•OestiloManuelino–oMosteirodosJerónimos 71
•Areorganizaçãoadministrativamanuelina–adaptaçãodadocumentaçãomedieval 72
•GilVicenteeaspermanênciasmedievais 73
•RenascimentoeHumanismo 74
Cronologia 75
IV – Portugal e as crises da Modernidade (séculos XVI-XVII) 79
PolítICA e GuerrA 79
•OsdesafiosdemeadosdoséculoXVi–d.Joãoiii,d.Sebastiãoed.Henrique 79
•OPortugaldosHabsburgosoudosFilipes(1580-1640) 84
•OimpérioPortuguês(1580-1669)eaconcorrênciaFrancesa,Holandesaeinglesa 89
•doPortugaldaRestauraçãoàGuerradaSucessãodeespanha(1640-1706) 92
eConoMIA e SoCIeDADe 98
•Umpaíspequenoepoucopovoado–onumeramentode1527-1532 98
•OsJesuítas:entrePortugaleaevangelizaçãodoOriente 99
•AsriquezasdoBrasil 100
CulturA e ArteS 101
•doManeirismoaoBarroco 101
•AinquisiçãoemPortugaleaReformaProtestantenaeuropa 101
Cronologia 104
V – Portugal no século XVIII 107
PolítICA e GuerrA 107
•Oabsolutismojoanino(1707-1750) 107
•AGuerradeSucessãodeespanha(1701-1714)eapolíticadiplomáticajoanina 109
•AascensãoeaaçãopolíticadeSebastiãoJosédecarvalhoeMelo 111
•Épocadetransições:doreinadoded.Mariaiàregênciaded.JoãoVi 114
eConoMIA e SoCIeDADe 116
•AsociedadeportuguesanafasefinaldoAntigoRegime 116
•Ociclodoouroedoaçúcarbrasileiro 117
•1denovembrode1755:odiadoterramoto 119
•AexpulsãodosJesuítaseoProcessodosTávoraem1759 120
CulturA e ArteS 122
•AostentaçãodoMagnânimoeasgrandesconstruçõesdoBarroco 122
•AAcademiaRealdasciências:ainspiraçãoiluminista 123
•entreoBarrocotardio,oneoclassicismoeoPré-romantismodofinaldoséculo 124
Cronologia 125
VI – Portugal do final do Antigo regime à afirmação do liberalismo (1807-1890) 127
PolítICA e GuerrA 127
•Asinvasõesfrancesaseodomíniobritânico(1807-1820) 127
•daRevolução«Vintista»àGuerracivilPortuguesa(1820-1834) 129
•dainstabilidadeliberalàRegeneração:devoristas,Setembristasecabralismo(1834-1851) 133
•APazdaRegeneraçãoeoRotativismoPartidário(1851-1890) 137
•Oiníciodofim:ultimatoinglêsde1890erevoltado31dejaneirode1891 140
eConoMIA e SoCIeDADe 141
•Ofimdociclobrasileiro:o«Gritodoipiranga» 141
•Osefeitosdofontismoeotake-off industrialportuguês 142
•OfimdasociedadedeprivilégioseavidaquotidiananoséculoXiX 144
CulturA e ArteS 146
•OséculodoRomantismo 146
•daQuestãocoimbrãedaGeraçãode70aoRealismo 148
•PrincipaisconstruçõesemonumentosdoséculoXiXemPortugal 150
Cronologia 151
VII – Portugal do final da Monarquia à entrada na C.e.e. (1890-1986) 155
PolítICA e GuerrA 155
•AquedadaMonarquiaconstitucionaleaimplantaçãodaRepública(1890-1910) 155
•AinstabilidadeeaaçãopolíticadaPrimeiraRepública(1910-1926) 159
•O28demaioeaditaduraMilitar(1926-1933) 163
•dainstitucionalizaçãodoestadonovoaofinaldaGuerracolonial(1933-1974) 165
•do25deAbrilàentradanacomunidadeeconómicaeuropeia(1974-1986) 171
eConoMIA e SoCIeDADe 174
•«economiadeguerra»:oimpactodoconflitoeaparticipaçãomilitarportuguesa 174
•Ofascismonoquotidiano:corporativismoeorganizaçõesdeenquadramento 177
•Aoposiçãoaoregimeealutapelaliberdade:doMUnAFàseleiçõesde1958 181
CulturA e ArteS 184
•OModernismoemPortugal:darevistaOrpheuaosanos30 184
•A«políticadoespírito»deAntónioFerroeaexposiçãodoMundoPortuguês 186
•entreapolíticados«TrêsF»eacançãodeprotestorevolucionária 188
Cronologia 190
VIII – os últimos trinta anos (1986-2016) 195
Cronologia 199
Bibliografia 203
referência das imagens 205
15
I
AnteS De PortuGAl: DA PrÉ-HIStÓrIA Ao
ConDADo PortuCAlenSe
Dos primeiros povoadores aos Celtiberos
APré-HistóriafoioperíodoqueantecedeuaHistória,peloqueédifícilcalcularaocertoquandocomeçou.considera-se,geralmen-te,queaPré-HistóriaterminounomomentoemqueoSerHuma-noaprendeu,pelaprimeiravez,aregistarosacontecimentosporescrito,oqueocorreunaMesopotâmiaenoegitoporvoltadoano3000 a.c. no entanto, a escrita não surgiu simultaneamente emtodoomundo,peloqueaPré-Históriatemcronologiasdiferentesparacadaregião.
naPenínsulaibérica,aPré-História terá tidoo iníciocercade1.2milhõesdeanosa.c.,quandochegaramàregiãoosprimeiroshumanos.Ofinalocorreuporvoltade218a.c.,anoemquecome-çouaconquistaromanadapenínsula.
APré-Histórianãofoitodaigualedividiu-seemperíodosquereceberamonomedevidoaomaterialqueentãoeramaisutilizadonofabricodeferramentas.Assim,temosaidadedaPedra,aidadedoBronzeeaidadedoFerro.
AidadedaPedrafoimuitolongaedurouatéc.3000a.c.duranteestesmilénios,ossereshumanospassarampormuitastransforma-ções,eassuasferramentaseculturaestiveramemconstante,aindaquelenta,evolução.Asferramentasdepedratrabalhadaeramuti-lizadasparafazertudo:desdepontasdelançaparacaçaranimaisatélâminasparacortaracarne.Osossoseramutilizadosparafazeragulhasquedepoisusavamparafabricarpeçasderoupaapartirdaspelesdeanimais.
entreosanos40.000e8000a.c.,instalaram-senaregiãoociden-tal da Península ibérica tribos de caçadores-recoletores. como o
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nomeindica,viviamdacaçaedeprodutosvegetais(raízesefrutossilvestres) que colhiam na natureza.As ferramentas que utiliza-vam,depedraeosso,erammaisdesenvolvidaserealizavamrituaisfúnebres.Foinascavernasondehabitavamquedeixaramassuasexpressões artísticas: pinturas e gravuras rupestres. O exemplomaisemblemáticodestaarteencontra-senasgrutasdeFozcôa.
Oclimatornou-semaisamenoapósofinaldaúltimaidadedoGelo(em10.000a.c.),oquepermitiuqueoshumanossaíssemdascavernas.Porisso,entre8000e5000a.c.,jáseencontravamhuma-nosaviveremcabanasnosvalesdosriosTejoeSado.Passaramaalimentar-semaisdepeixeemariscoeausarcolaresdeconchascomodecoraçãopessoal.
Porém,foientre7000e3000a.c.quesurgiuamaioralteraçãoà vidadoshomens e mulheresda idade daPedra: a agriculturae apastorícia chegaramàPenínsula ibérica, trazidasporviajan-tesoriundosdoMediterrâneo.noperíodofinaldaidadedaPedra,aoqualsechamouneolítico,oshumanoscomeçaramaconstruirgrandes monumentos de pedra, como antas e menires. em Por-tugal,estesmonumentosmegalíticos(termoquesignificapedrasgrandes)sãomaiscomunsnaregiãodoAltoAlentejo.Precisamen-teemPavia,noAlentejo,podeserencontradaumaantaque,milé-niosmaistarde,foitransformadaemcapela!
nafamosabandadesenhadaAstérix e Obélix,apersonagemObélixéumescultordemenires.Émesmovisto,muitasvezes,acarregarsozinhoumdessesmonumentosmegalíticos!Fantasiaàparte,osmeniresforammonumentosdecultoemváriasregiõesdaeuropa.noReinoUnido,omonumentomegalíticomais importanteeconhecidoéStonehenge.
entretanto,oSerHumanocomeçouautilizarmetalnofabricodeferramentas(comofoicesemachados)edearmas(comopontasdelança).depoisdaidadedaPedravieram,emrápidasucessão,aidadedoBronze(c.de1500a700a.c.)eaidadedoFerro(c.700a218a.c.).OcomérciodemetaistrouxenovospovosàPenínsula
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ibérica,comoosFenícioseosGregos,entre900e700a.c.dalín-guadosFeníciosprovêmtermoscomoOlisipo(Lisboa).
Porvoltade900a.c.,nasregiõesdonortedaPenínsulaibérica(comoMinhoeTrás-os-Montes),surgiuacivilizaçãocastreja,nomequeteveorigemnofactodeoshumanoshabitarememcastros(al-deiasfortificadassituadasnotopodemontes).eraumasociedadequedependiadaagriculturaedapastorícia,equeusavasobretudomadeiranasconstruções(sóasmuralhaseacasadochefeeramfeitasdepedra).
Por volta de 500 a.c., os celtas, um povo oriundo da europacentral,entraramnaPenínsulaibérica.encontraramumaregiãopoucohabitadaenãotardaramamisturar-secomospovoslocais,designadosporiberos.dessafusãodepovosnasceuumnovo:osceltiberos.AmaisfamosadastribosceltiberasfoiadosLusitanos.Atravésdaguerra,conseguiramestenderoseucontrolodaestre-maduraespanholaatéàcostaatlânticaemesmoàregiãodeLisboa.
Curiosidade: OsLusitanosnãopodemserconsideradosantepassa-dosapenasdosPortugueses.istoporqueboapartedoseuterritórioficavasituadoemregiõesforadoqueviria,maistarde,aserPortu-gal.AsuacapitaleraacidadedeMérida,naestremaduraespanhola.
OsLusitanossãofamososporseteremopostoàconquistaro-mana,emparticularduranteoséculoiia.c.Oiníciodaconquistaromana,em218a.c.,significouofimdaPré-HistórianaPenínsulaibérica,jáqueeraaprimeiravezqueumasociedadetãoavançada–edesdelogopossuidoradapalavraescrita–intervinhadeformatãoclaraesistemáticanaregião.
defacto,foramosRomanosque,maistarde,escreveramsobreasderrotasquesofreramàsmãosdosLusitanos,eemparticularsobreaatuaçãodeViriato,chefedosLusitanosentre147e139a.c.
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o domínio de roma: da república ao Império
ApresençaromananaPenínsulaibéricainiciou-seem218a.c.,nocontextodaSegundaGuerraPúnica(218-201a.c.).nestaguer-ra, o controlo do Mediterrâneo Ocidental foi disputado entre aRepúblicadeRomaecartago,umacidade-estadofeníciasituadanonortedeÁfrica.desdecedo,osromanosdedicaram-seàsub-missãodastribosceltiberas.em206a.c.,RomajácontrolavatodaacostamediterrânicadaPenínsulaibérica.
Apacificaçãodefinitivadastribosceltiberassóficouconcluídaemfinaisdoséculoia.c.AromanizaçãodaPenínsulaibéricaco-meçounessaaltura,oquesignificouaadoçãodoscostumes,cultu-raeleisromanas.Oterritóriofoidivididoemprovíncias,parasergovernadodeformamaiseficiente.AsprovínciasdaTarraconense(emais tardedaGalécia)edaLusitâniagovernavamo territórioondeviriaaserfundadoPortugal.
Omododevidaromanofoi-seinstalandonasnovasprovíncias.Fo-ramconstruídasestradas,anfiteatros,aquedutos,pontes,etc.AsruínasdoteatroromanodeLisboaaindahojesãovisíveis.emÉvora,aindaresistepartedeumtemploromano,enquantoquejuntoacondeixa-a--Velhaestãosituadasasruínasdacidadedeconimbriga.
duranteodomínioromanodaHispânia–onomeentãodadoàPenínsulaibérica–ocomércio,aagriculturaeaindústria(comoasalgadepeixe)desenvolveram-seeprosperaram,oquedeuorigemanovaspovoaçõesecidades.AlcácerdoSal,porexemplo,cresceuporseroarmazémdosprodutostransportadosporbarconorioSado.
Curiosidade: AsestradasconstruídaspelosRomanoseramtãoresis-tentesquedurantemaisde1000anos,mesmoapósaquedadoimpé-rioRomanodoOcidente(476d.c.),foramasmelhoresdaeuropa!
FoitambémduranteogovernoromanoqueocristianismoseimplantounaHispânia.noséculoiVd.c.,foramcriadasasprimei-rasdioceses(divisõesadministrativasgeridasporbispos).
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OlegadomaispermanentedosRomanosterásidoalíngua,umavezqueoLatimdeuorigemaváriosidiomas,comooPortuguêseocastelhano.
As invasões germânicas e árabes – séculos V-VIII
em409,osprimeirosinvasoresgermânicosentraramnapenín-sularomanadaHispâniaeinstalaram-seemdiferentesprovíncias:osAlanos instalaram-se na Lusitânia, os Suevos na Galécia e osVândalosnaBética.em415,osVisigodosentraramnaHispâniaenãotardaramadominartodaapenínsula.começaramporexpul-sarosVândalosparaonortedeÁfricae,em585,derrotaramosSuevoseocuparamosseusterritórios (que incluíamaregiãoaolongodacostaquevaidaGalizaatéaorioTejo).OsSuevos,poroutrolado,játinhamconquistadoosAlanos.
Recaredofoioprimeiroreivisigodoaconverter-seaocristianis-mo,em589,porinfluênciadosnovossúbditosSuevos(queeramcristãosdesde558).Aconversãoreforçouopoderdosreisvisigo-dosnaregiãoeaproximou-osdamaioriadapopulaçãodaHispâ-nia,osantigosceltiberosromanizadosecristianizados.
contudo,nãotardouatéqueamonarquiavisigóticasofressevá-riascrisesinternas.em710,iniciou-seumaguerracivilentreoreiVitisaeRodrigo,umpretendenteaotrono.Umdosladosdoconfli-topediuajudaaosBerberesmuçulmanosdonortedeÁfricaque,assim,entrarampelaprimeiraveznaHispânia.
OsVisigodosaperceberam-sedesteerrodemasiadotardee,en-tre711e715,osBerberese,depois,osÁrabes,conquistaramprati-camentetodaaHispânia.Aresistênciadealgunsnobresvisigodosapenassemantevenasmontanhasdonorte,nasAstúrias.estesnobres conseguiriamdefender-se comsucesso e, em722, vence-riamabatalhadecovadongacontraumexércitoárabe.Apesardaderrota,tinha-seiniciadoapresençaislâmicanaPenínsulaibérica.
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ApresençamuçulmananaPenínsulaibérica,enquantogovernan-tes,iniciou-seem711,comocomeçodaconquista,eterminouem1492,comaderrotadoreinodeGranada.Assimsendo,adistânciatemporalquenosseparadaquedadeGranada(524anos)éinferioràdistânciaqueseparavaosprimeirosconquistadoresárabesdossenhoresderrotadosdeGranada(781anos)!
entre756e929,oAl-Andalus(nomedaHispâniaislamizada)foiumemirado,comcapitalnacidadedecórdova,naatualprovínciaespanholadaAndaluzia.Aregiãointegravaentãoosvastosdomí-niosdoscalifas(primeirodadinastiaOmíadae,maistarde,dadinas-tiaAbássida),quetinhamcomocapitalalongínquadamasco,naSí-ria.em929,oemiradopassouacalifadoetornou-seindependente.
Asconstantesdivisõesinternasdosmuçulmanosibéricosajuda-ramoscristãosarecuperarterritórios,numprocessoquesecha-mouReconquista.Apósofimdocalifadodecórdova,em1131,oAl-Andalusdividiu-seemtaifas,pequenosreinos,muitosdosquaisforamsubjugadospelosreiscristãos.
AReconquistafoionomedadoaosavançosparasulprotagonizadospelosguerreiroscristãosduranteaidadeMédia.OsdescendentesdosnobresvisigodoscompreendiamqueeraseudevercombatercontraosMouroserecuperarasterrasquejátinhamsidocristãs.TodososreiscristãosdaPenínsulaibérica,comooreidePortugal,participaramnaReconquistapoisviamnelaaoportunidadedeexpandiremosseusreinos.
no entanto, a Reconquista demoraria séculos, como veremosmais adiante. entretanto, a cultura islâmica foi-se instalando naHispânia, inclusivamente na região que, mais tarde, seria Portu-gal.ÁrabeseBerberestrouxeramparaapenínsulaumanovareli-gião(oislão,quenasceunaArábianoiníciodoséculoVii),novaslínguas(oÁrabe,quedeuaoPortuguêspalavrascomoalgodãoealgarismo)enovasformasartísticas(comoadecoraçãodaantiga
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mesquitadeMértola).Aciência(nomeadamenteaastronomia)eamedicina(comoafarmacologia)árabesforam,duranteboapartedaidadeMédia,superioresàscongénereseuropeias.
nesteperíodo,ocomércioeoartesanatoajudaramcidadescomoLisboa,SantarémeSilvesacrescereganharimportância.Omes-mo aconteceu, claro, nas grandes cidades da restante Hispânia,comoToledo,córdova,SevilhaeSaragoça.Aspopulaçõescristãsqueviviamsobdomínioislâmicopagavampesadosimpostosparaseremprotegidas.Algunscristãoschegarammesmoavestir-seecomportar-secomoÁrabes,emboranãoseconvertessemaoislão.estesindivíduoseramchamadosdeMoçárabes.
À medida que a Reconquista avançava, os povos islâmicos fi-cavam sob domínio cristão. estas populações passaram então ahabitar embairrosprópriosnas cidades, asMourarias, tal comoaconteciacomoscristãosnascidadesislâmicas,eapagarpesadosimpostos.Tantonascidadescristãscomonasislâmicas,osJudeusviviamembairrospróprios,asJudiarias.cristãosemuçulmanoscompreendiamqueerapreferívelmantervivasaspopulaçõesdeoutrasreligiões,jáque,assim,lhespodiamcobrarimpostoseapro-veitarem-sedotrabalhoquerealizavam.
o Condado Portucalense – séculos IX-XII
Apesardavitóriadosnobresvisigodos,lideradosporPelágio,nabatalhadecovadonga,em722,aReconquistacristãnãocomeçounessemomento,umavezqueoscristãoseramaindademasiadofracosparapoderempassaraoataque.
nãotardouatéquesurgissemreisguerreirosquereclamavamserherdeirosdePelágio,quejáentãoviamcomoumherói.FoidestaformaquesurgiuoreinodasAstúrias,lideradopeloreiAfonsoiii(866-910), que recomeçou o povoamento da região em torno doriodouro,naalturamuitodespovoadadevidoàguerra.em868,VímaraPerestomouacidadedePortucale,juntoàfozdodouro,paraaíseinstalar.AssimnasceuocondadoPortucalense,quepas-savaadominarosterritóriosemtornododouroque,maistarde,viriamafazerpartedePortugal.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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Os descendentes deVímara Peres controlaram o condado até1071, anoemqueocondenunoMendes foimortoembatalha,depoisdeserevoltarcontraoreideLeão.Ocondadoficouvagodurante algum tempo, mas, por volta de 1096, foi entregue ad.HenriquedeBorgonha,umcavaleirofrancês.
AReconquistaatraiucentenasdecavaleirosfrancesesparaaPe-nínsulaibérica,umavezque,incitadospeloPapaepelosabadesdecluny(ummosteironaregiãodeBorgonha,França),estavamdispostos a combater contra os muçulmanos em nome dos reiscristãosibéricos.
d.Henriqueeraumcavaleiroparticularmentebemrelacionado,porserfamiliardoabadedeclunyedocondeedoduquedeBor-gonha.Oseudesempenhomilitarvaleu-lheaentregadoconda-dodePortucaleeumcasamentocomd.Teresa,filhailegítimadeAfonsoVi(1065-1109),reideLeãoecastela.
d.HenriquedeBorgonhaacabariaportentartornarocondadoPortucalenseindependentedoreinodecastela,massemsucesso.Quandofaleceu,em1112,deixouocondadoaoseu jovemfilho,d.AfonsoHenriques, que, anosmais tarde, acabariapor fundarumreinopróprio:Portugal.
cronologia
Data Acontecimentos
1.2milhõesa.c. chegadadosprimeirossereshumanosàPenínsulaibérica.
c.40.000a8.000a.c. instalaçãodasprimeirastribosdecaçadores-recoleto-resnaPenínsulaibérica.
c.10.000a.c. FimdaúltimaidadedoGelo.
c.7000a3000a.c. ViajantesoriundosdoMediterrâneointroduzemaagriculturaeapastorícianaPenínsulaibérica.
c.8000a5000a.c. Oshumanosabandonamascavernasepassamahabi-taremcabanasjuntoaosriosTejoeSado.
c.1500a700a.c. idadedoBronze.
c.900a.c. Surgimentodacivilizaçãocastreja.
c.700a.c.a218a.c. idadedoFerro.
História de Portugal
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c.500a.c. chegadadasprimeirastribosceltasàPenínsulaibérica.
218a.c. iníciodaconquistaromanadaPenínsulaibérica.
218a201a.c. SegundaGuerraPúnicaentrecartagoeRoma.
206a.c. RomacontrolatodaacostamediterrânicadaPenínsulaibérica.
147a139a.c. Viriato,chefedosLusitanos,lideraaguerracontraRoma.
409 chegadadosAlanos,SuevoseVândalosàHispâniaromana.
415 chegadadosVisigodosàHispâniaromana.
476 QuedadoimpérioRomanodoOcidente.
558 SegundaconversãodosSuevosaocristianismo.
585 OreinodosVisigodosconquistaoreinodosSuevos.
589 conversão ao cristianismo de Recaredo, rei dosVisigodos.
710 iníciodaguerracivilvisigoda,umconflitoqueopõeoreiVitisaeopretendenteRodrigo.
711-715 conquistaislâmicadepraticamentetodaaPenínsulaibérica.
722 Batalhadecovadonga.VitóriadosVisigodos,lideradosporPelágio.
756 Fundaçãodoemiradodecórdova.
868 VímaraPeresconquistaacidadedePortucaleeintegra--anoreinodeLeão.Poucodepois,éformadoocon-dadoPortucalense.
929 Fimdoemiradodecórdova.criaçãodocalifadodecórdova.
1031 Fimdocalifadodecórdova.divisãodosterritóriosislâmicosdaHispâniaemreinostaifa.
1071 MortedenunoMendes,últimodosdescendentesdeVímaraPeresacontrolarocondadoPortucalense.
1096 AnoprováveldaentregadocondadoPortucalensead.HenriquedeBorgonha,umcavaleirofrancês.
1112 Morte do conde d. Henrique, pai de d. AfonsoHenriques.
1492 castelaconquistaGranada,oúltimoreinoislâmicodaPenínsulaibérica.
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II
PortuGAl MeDIeVAl (SÉCuloS XII-XV)
Política e Guerra
D. Afonso I (1139-1185)
Quandoo conded.Henrique faleceu, em1112, ogovernodocondadoPortucalense foientregueàviúva,d.Teresa.d.AfonsoHenriques passaria a exercer o poder apenas em 1127, quandoatingiuamaioridade.nessemesmoano,comoapoiodosnobresportucalenses,d.Afonsoderrotouamãeeosseusapoiantesgale-gosnabatalhadeS.Mamede,juntoaGuimarães.Apartirdeentão,tornou-selivreparagovernarseminterferências.
PartindodoMinho,edeformaaafastar-sedasinfluênciasdosnobresdePortucale,d.AfonsoHenriquesavançouparasuleinsta-lou-seemcoimbra,para,apartirdessacidade,dilatarasfronteirasdocondado.Foiassimque,em1139,venceuabatalhadeOurique.Poucosesabesobreestabatalha (nemsequerécertoque tenhaocorridojuntoaOurique,noAlentejo),masnãorestamdúvidasdequefoiimportante,poisfoiapartirdaquelavitóriaqued.AfonsoHenriquespassouaintitular-serei.
Hojeemdia,oMilagre de OuriquefazpartedamemóriacoletivadosPortugueses.noentanto,estefoiummitocriadoapenasem1419,ouseja280anosdepoisdaverdadeirabatalha,paraajudaraconstruirumaimagemquaseperfeitadoprimeiroreiportuguês.deacordocomalenda,cristoteriaaparecidoad.AfonsoHenriquesparalhegarantiravitórianabatalhacontraosmuçulmanos.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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nos anos que se seguiram à vitória na batalha de Ourique,d.AfonsoHenriquesconduziunovascampanhasmilitares:parasul,contraosMouros,emesmoparanorteeoeste,contraaGalizaeoreinodeLeão.Foinumadestascampanhas,ocorridaem1147,queoreiconquistouSantarémeLisboaaosMouros.Paraacon-quistadeLisboatevemesmoaajudadeumaarmadadecruzadosoriundosdonortedaeuropa.
Curiosidade:Algunsdoscruzadosqueauxiliaramd.AfonsoHen-riquesaconquistarLisboaacabaramporficaraviveremPortugal.VilaFrancadeXira,porexemplo,obteveoseunomeporaísetereminstaladoFrancos,ouseja,Franceses.
d.AfonsoHenriquescontinuouaexpandiroreinoaté1169,anoemquefoiderrotadoquandotentavaconquistarBadajoz.Foimes-mo ferido numa perna durante os combates e acabou por ficarincapazdemontaracavaloparaorestodavida.
em1179,PortugalfoireconhecidopeloPapacomoumreinoin-dependente,atravésdolançamentodabulaManifestis Probatum.Jáem1143,emZamora,oreideLeãoecastelatinhareconhecidod.AfonsoHenriquescomorei,emboranãolhegarantisseaindaaindependência,queacabouporserasseguradaatravésdoposteriorreconhecimentopapal.
Portugal,comoosrestantesreinoscristãosibéricos,surgiunocon-textodaReconquista.comovimosnocapítuloanterior,aReconquistainiciou-sequandooscristãosqueresistiramàconquistaislâmicacomeçaramareconquistarterrasquetinhamperdidodécadasouséculosantes.PortugalacabariaporterminarasuaReconquistaem1249-1250,comaocupaçãodasúltimasvilasislâmicasdoAlgarve.
História de Portugal
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D. Sancho I (1185-1211)
em1185,d.Sanchoisucedeunotronoaopai,d.AfonsoHenri-ques.Aindaenquantoinfante,d.Sanchotinhademonstradoqua-lidadesgovernativasemilitares.Porumlado,começouaauxiliaropainogovernodoreinodesdequeoprogenitorforaferidonaperna, em1169.Poroutro,deu continuidadeàguerra contraosMouros,defendendo,em1184,Santarémdeumdurocerco.
Ao longodoseureinado,procuroudarcontinuidadeàRecon-quista, expandindo o reino em direção a sul. Foi assim que, em1189,conquistouSilveseAlvor,novamentecomaajudadeumaarmadadecruzados.Ambasasvilasforamperdidaspoucodepois,umavezqueseencontravamisoladasemterritórioinimigo,jáquetodaaáreaentreSilveseÉvoraeraaindacontroladapelosMouros.A ofensiva muçulmana de 1190-1191, comandada pela dinastiadosAlmóadas marroquinos, conquistou todas as terras a sul doTejo,comexceçãodeÉvora.
Acartadeforalconcediaaosmoradoresdeumadeterminadavilaoucidadeumasériedeprivilégios.esperava-se,assim,atrairnovosmoradoresparaumdadolugar,sobretudoparahavermaishomensdisponíveisparaadefesadaterra.Porissoeratãocomumseremdadascartasdeforalavilasdefronteira.
deformaaestabilizarefortificarafronteira,d.Sanchoiconce-deucartasdeforalaváriasvilas,comoAlmada(oTejoeraentãoa fronteira entre o reino de Portugal e os Mouros). Além disso,concedeucastelosàsOrdensMilitares,paraqueaquelasvigiassemaszonasdefronteira.Opai,d.AfonsoHenriques,tinhatidoumapolíticasemelhante.
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Curiosidade:AsOrdensMilitaresnasceramduranteascruzadasparaaconquistadeJerusalémedoslugaressantosdacristandade.comonaPenínsulaibéricatambémsecombatiamosmuçulmanos,nãotardoumuitoatéqueasOrdensdoTemploedoHospitalseinstalassememPortugalenosoutrosreinosibéricos.AOrdemdeSantiagoteveorigemjánaPenínsula,ecedoseinstalouemPortugal.AOrdemdosFreiresdeÉvoranasceunaquelacidadee,maistarde,passariaaseraOrdemdeAvis.AúltimadasOrdensasercriadafoiaOrdemdecristo,em1319,fazendousodosbensdaentretantoextintaOrdemdoTemplo.
D. Afonso II (1211-1223)
d.Afonsoiisucedeuaopai,d.Sanchoi,em1211.Aolongodoseureinado,manteveumapolíticadefortalecimentoecentraliza-çãodopoderrégio.Atravésdaintroduçãodeleisescritas,apoiadasnodireitoRomano,conseguiuafirmarasuperioridadedopoderdoreifaceànobrezaeaoclero.contudo,talpolíticalevouaqueexistissemgravesproblemasderelacionamentoentreomonarcaeváriosmembrosdanobrezaedoclero.
1.OcastelodeAlmourol,entreguepord.AfonsoHenriquesàOrdemMilitardoTemplo,defendiaamargemnortedoTejo,dosMouros.
História de Portugal
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AsinquiriçõesGerais, lançadaspelorei,consistiameminqué-ritosfeitosnoterrenopelosoficiaisdacoroaetinhamcomoob-jetivolimitarasusurpaçõesdeterraslevadasacabopelanobrezaepeloclero.Umaoutralei,adasconfirmações,garantiaqueoreitinhaodireitodedecidir seosnobrespodiammanter as terrasque tinham recebido da coroa. este processo de centralização eaumento do poder da coroa foi prosseguido, de forma mais oumenoscontínua,pelosreisqueseseguiramaolongodosséculossubsequentes.
Curiosidade: Adifícilrelaçãocomanobrezafoitalquechegouaentraremguerracontraasprópriasirmãs.emcausaestavamasterrasedireitosquelhestinhamsidolegadas,emtestamento,pord.Sanchoi.Aquestãosóficouresolvidadepoisdamortedorei,em1223.
d.Afonsoiifoiumreidoente–crê-sequesofriadelepra–e,portanto,incapazdecomandarexércitosembatalha.Masmesmosempoderserumconquistador,comoopaiouoavô,noreinadoded.AfonsoiiaReconquistacontinuou.Foilevadaacabosobre-tudopelasOrdensMilitareseofeitomaissignificativofoiacon-quistadeAlcácerdoSal,ocorridaem1217.Jáantes,em1212,for-çasportuguesastinhamparticipadonabatalhadenavasdeTolosa,ladoaladocomcastelhanosearagoneses.estaimportantevitóriacristãassinalouodeclíniodopoderiomilitarAlmóadanaPenín-sulaibéricae,em1223,osmuçulmanosvoltariamadividir-seempequenosreinostaifa,permitindonovosavançosnaReconquista.
D. Sancho II (1223-1248)
comamorteded.Afonsoii,ocorridaem1223,subiuaotronod.Sanchoii.Onovoreicomeçouporpôrfimàdisputaqueastiastinhammantidocomoseupai.canceloutambémalgumasdasleisde fortalecimentodopoderdacoroapassadaspord.Afonso ii,deformaaagradaraocleroeànobreza.contudo,oreirevelou-se
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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incapazdegovernardeformacapazedemanteraordem.Bandosdecavaleirosandavampeloreinoasaquearigrejasemosteiros,eorei,quetinhaporobrigaçãogarantirajustiça,nadafazia.
AReconquista,entretanto,foiseguindooseurumo.nasdécadasde1220,1230e1240,oavançoportuguêsfez-sepeloAlentejoeAlgarve,tendosidoconquistadasvilascomoelvas,SerpaeTavira.AsOrdensMilitaresdeSantiagoedoHospitalforamdecisivasnoavançodasconquistas,jáqueoreienfrentavaproblemasemmo-bilizaroapoiodanobreza.
Osproblemassociaisepolíticosnoreinoacabaramporsersupe-rioresaossucessosmilitaresed.Sanchoiifoideposto.Osbisposportugueses,descontentescomaatuaçãodoreiperanteaigreja,apelaramaoPapaque,emmarçode1245,depôsd.Sanchoiiatra-vésda emissãodeumabulapapal.Umanovabula, emitida emjulhodomesmoano,ordenavaaoclero,nobrezaeconcelhosdePortugalqueobedecessemaoinfanted.Afonso,irmãodorei,poisdaíemdianteseriaeleagovernar.
nabulapapaldemarçode1245,d.SanchoiieraapelidadopeloPaparex inutilis,ouseja,reiinútil.OreieracensuradopeloPapapornãoconseguirmanterapazdentrodoreinoe,sobretudo,pordeixarqueosbensdaigrejafossematacadoseroubados.
Oinfanted.Afonsoera,àépoca,condedeBolonha,viladonor-te de França, por ter casado com a condessa Matilde. em 1245,emParis,perantebisposportugueseseemissáriosdoPapa,jurourespeitaraigrejaetodososseusprivilégios.Assim,apósadepo-siçãodorei,irmãodoinfante,oPapaconcedeu-lheogovernodePortugal.Quando,noverãodesseano,aportouemLisboa,encon-trouoreinodivididoentreosseuspartidárioseosapoiantesded.Sanchoii.Aguerraentreosdoisirmãosdurouaté1248,alturaemqued.Sanchoiifaleceu,poucodepoisdeterpartidoparaoexílioemcastela.
História de Portugal
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Curiosidade:d.Sanchoiinãoteveherdeirose,aoqueparece,nãoteveumbomcasamentocomaesposa,arainhad.Mécia.Asrela-çõesforamtãomásque,duranteaguerracivil,arainhafoiraptadaeoreifoiincapazdearesgatar.nãofaltou,logonaaltura,quemlevantasseahipótesedearainhaterfugidodelivrevontade,dei-xandooreihumilhado.
D. Afonso III (1248-1279)
d.Afonsoiii,queapenasseintituloureiapósamortedoirmão,passourapidamenteàação.em1249-1250concluiuaReconquistaportuguesa,aoocuparoquefaltavadoAlgarve,desdelogoacida-deprincipal,Faro.Poucodepois,em1250-1251,viu-seobrigadoacombatercontracastela,paramanterapossedanovaconquista.Aquestãosóficoudefinitivamenteresolvidaem1267,passandooGuadianaamarcarafronteirasudesteentreosdoisreinos.
enquantorei,d.Afonsoiiicontinuouapolíticadefortalecimen-toecentralizaçãodopoderdacoroa,seguindoassimospassosdopai,d.Afonsoii.chegoumesmoalançarasinquiriçõesGerais,em1258,paracombaterosabusosdanobrezaedoclero.criouoscar-gosdemeirinho-mor,mordomo-morechanceler-moreentregou-osanobresdasuaconfiança.comoapoiodesteshomens,conseguiuexpandir o poder da coroa pelo reino. Ao mesmo tempo, criouumanovanobreza:anobrezadeserviço,queerasubservienteaoreietornava-sericaepoderosapeloserviçoaomonarca,enãopelocombatecontraosMouros.
Apoiadopelosconcelhosdosuldoreinoduranteaguerracivil,d.Afonsoiiinãotardouarecompensá-los.concedeunovascartasdeforalecartasdefeiraaosconcelhosecriou,em1253,umaleidetabelamentodepreçosesalários.Foitambémoprimeiroreiadarassentoemreuniãodecortesaosdelegadosconcelhios.
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Asreuniõesdecorteseramumaespéciedeparlamentomedieval,noqualparticipavamrepresentantesdoclero,danobrezaedosconcelhos.Ascorteseramconvocadasquandooreibementendia,oumelhor,quandoprecisavadelas,eusava-assobretudoparapedirdinheiro(parapagarumaguerra,umcasamento,etc.)ou,umpoucomaistarde,parajurarumnovoherdeiroaotrono.nãoeram,evi-dentemente,democráticas,poisninguémeraeleito,masnelasoreiouviaasqueixasedecidiaoquesedeviafazer.
Curiosidade: Umadasrazõesparaoconflitoentreoreieaigrejafoioseuduplocasamento.d.Afonsoiiicasouem1253comd.Beatriz,filhadoreidecastela…maseraaindacasadocomd.Matilde!Abigamiaeraproibidapelaigreja,eoPapaviu-seobrigadoaintervir.Aquestãosóficouresolvidacomamorteded.Matilde,em1258.
Aocontráriodoqueseriaexpectáveldeumhomemquefoiele-vadoaotronopeloPapa,d.Afonsoiiinãotardouatécomeçaralimitarosprivilégiosda igreja emproldo seuprópriopoder.Oconflitoentreoreieosbisposportuguesesfoiintensoaolongodetodooreinadoefoiporpoucoqueomonarcanãomorreuexco-mungadopeloPapa.conseguiuoperdãoemjaneirode1279,ummêsantesdefalecer.
AexcomunhãoeraamaispoderosaarmasimbólicadoPapa.Aoexcomungarumrei,oPapacondenava-oaoinferno.Porisso,nãoadmiraquetantosreis,aopressentiremamorte,fizessemaspazescomoPapado,comofezd.Afonsoiii.eopoderdoPapaera,então,muitoimportante,poiseracapaz,comovimos,dedeporreis!
História de Portugal
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D. Dinis (1279-1325)
Alçadoaotronoem1279,d.dinisprocurou,desdecedo,deixarumamarcapessoalnoreino,reorganizando-oporcompletoempra-ticamentetodasasáreas.em1289,comaassinaturadaconcorda-tadosQuarenta Artigos,d.dinispôsfimaoconflitoqueopunhaPortugalaoPapado.emboratenhamexistidofricçõescomocleroportuguês,d.dinisconseguiuváriasdecisõesfavoráveisporpartedoPapa.exemplodissofoiapermissão,concedidaem1319,paraatransferênciadosbensdaextintaOrdemdoTemploparaarecém--criada,eexclusivamenteportuguesa,Ordemdecristo.
d.dinispreocupou-seemconsolidaredefenderasfronteirasdorei-no,umavezquenãoaspodiaalargar.Asulnadamaishaviaaconquis-tare,aleste,castelaeraumvizinhodemasiadopoderoso.em1297,apósumacurtaguerracontracastela,foiassinadooTratadodeAlca-nizes,quegarantiuaestabilizaçãodetodaafronteiralestedoreino.
emtodoocaso,edeformaagarantiradefesadoreino,d.dinismandouconstruirourepararcentenasdecastelosportodooter-ritório,emparticularnasregiõesdefronteira.Tomouaindaoutrasdecisõesdecarizmilitar, comoacriaçãodosbesteirosdoconto,uma milícia de homens dos concelhos armados com bestas. Ouaindaacriaçãodeumamarinhadeguerra,paraprotegeracostae o comércio marítimo dos ataques dos piratas muçulmanos donortedeÁfricaedoreinodeGranada.
AassinaturadoTratadodeAlcanizespermitiuquePortugalpas-sasseaterumafronteiraestávelcomoseuúnicovizinho,castela.Aatualfronteiraportuguesasegueamesmalinhadafronteirade1297,comexceçãodaperdadeOlivença,noiníciodoséculoXiX.Assim,éumadasmaisantigasfronteirasdaeuropa.
Ocomandodamarinhadeguerrafoientregueaoalmirante.Ocargofoicriadoem1317econfiadoaManuelPessanha,umgenovêscomgrandeexperiêncianomar.Ocargo,comoacon-tecianaaltura,foisendopassadoaosseusherdeirosaolongodosséculos.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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Curiosidade: d.dinisnãoplantouopinhaldeLeiriaantevendojáqueaquelamadeiraserianecessáriaaosnaviosdosdescobrimentos.AindaquesejacertoqueexisteumpinhaljuntoaLeiria,nãoépossívelsaberquemomandouplantar.emborad.dinistenhacriadooalmirantadoeinstituído,formalmente,umamarinhadeguerra,nuncapensouemexpandirPortugalalémdaPenínsulaibérica.Foiantesoseufilho,d.AfonsoiV,quemprometeuaoPapaatacaronortedeÁfrica,sem,noentanto,algumavezoterfeito.Foitambémelequeenvioualgu-masembarcaçõesparaadescobertadasilhascanárias,nasdécadasde1330-1340.Sónoreinadoded.Joãoiseiniciariamosdescobrimentospropriamenteditos.
d.dinistambémsepreocupouemreforçarecentralizaropoderdacoroa.Porisso,paracombaterosabusosdanobrezaedoclero,lançouvárias inquiriçõesGerais, entre1283e1307.Tambémsepreocupou,desdeoiníciodoreinado,emacabarcomopoderded.Afonso,seuirmão,quetinhaconstruídoumpoderososenhorionoAltoAlentejo.Assim,o reiatacouo infanteem1281,1287e1299,acabandoporovencereobrigaraexilar-seemcastela.
Apolíticaseguidapeloreigerouumgrandedescontentamentoentreváriaspartesdanobreza,oqueacabouporconduziraumaguerracivil.estadurouentre1319e1324,eopôsoreiàsforçasdanobrezacomandadaspeloseufilhomaisvelho,oinfanted.Afonso.Aguerracorreumalad.dinis,quefoiobrigadoaadmitirader-rotaeafazerváriasconcessões.Morreupraticamenteisolado,emjaneirode1325.
D. Afonso IV (1325-1357)
Aocontráriodoqueseriaesperadodeuminfantequeserevol-toucontraumreicentralizador,d.AfonsoiVseguiudepertoospassosdopai.cedocomeçoua limitarospoderes senhoriaisdanobrezaqueantestinhaajudadoadefender.Atacouederrotouosirmãosbastardosqueselhetinhamopostoduranteaguerracivil,demonstrando,assim,quenãoqueriaterrivaisnoreino.
História de Portugal
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criounovostiposdefuncionáriosrégiosparapoderexercerummaiorcontrolosobreosconcelhos:osjuízesdefora,representantesdajustiçadoreicommaisautoridadedoqueosjuízeslocais;eosve-readores,queintervinhamemassuntoseconómicosemnomedorei.Regulouaindaaaçãodoscorregedores,funcionáriosquecirculavampeloreinocorrigindo–daíonome–oserrosdajustiçalocal.Ocon-trolosobreoreinoiacrescendoe,em1334,d.AfonsoiVchegouaopontodeordenarquetodososdetentoresdeterrasnoreinoseapre-sentassemnacorte.Oreiqueria,destaforma,confirmaralegitimi-dadedasjurisdiçõesdetidaspelanobreza,cleroeOrdensMilitares.
Osfuncionáriosrégios–ouseja,quetrabalhavamparaorei–eramumadasferramentasmaisúteisdacoroa,poispermitiamaomonarcamantercontactocomtodooreino,numaépocaemqueascomunicaçõeseramfeitassobretudodebarcoouacavalo.
Aomesmotempoqueoreiaumentavaoseupoder,começavamasurgirnumerosossinaisdecriseeconómicaesocial.Osmotivosdacriseforam,desdeoreinadoded.dinis,osmausanosagrícolase,maistarde,aPestenegra(1348-1352).
em1340,d.AfonsoiVcomandouoexércitoportuguêsque,aolado dos exércitos castelhano e aragonês, derrotou um numerosoexércitomuçulmanonabatalhadoSalado,nosuldaAndaluzia.AaliançaentreosreinoscristãosfoipatrocinadapeloPapa,eacaboupor resultar na derrota da última invasão islâmica da Penínsulaibérica.d.AfonsoiVnãohesitoumesmoemaliar-seaoreidecaste-la,seugenro,comquemtinhaestadoemguerraentre1336e1339.
Curiosidade: d.AfonsoiVemitiuváriasleisparatentarcombaterosefeitosdacrisesocialeeconómica.nachamadaPragmáticade1340,eramesmoestabelecidoquempodiavestirosváriostiposdetecido.Paraorei,umaformademanterasociedadeemordemeragarantirquecadapessoausavaroupascondizentescomasuaposiçãosocial.Porisso,tecidoscomoasedasóerampermitidosànobreza.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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Foitambémduranteoreinadoded.AfonsoiVquesederamosprimeirospassos,aindahesitantes,naexpansãoportuguesa.Oreienviou,nasdécadasde1330e1340,váriasarmadasàsilhascaná-rias.OPapa,noentanto,nãoreconheceuad.AfonsoiVapossedasilhas.Apesardestesprimeirospassos,aexpansãoalém-marsóco-meçarianoreinadoded.Joãoi,comaconquistadeceuta,em1415.
no final do seu reinado, d. Afonso iV debateu-se com umaquestãoquecolocavaoreinoemrisco:arelaçãoentreo infanted.Pedroed.inêsdecastro.Afamíliadoscastro,quetantospro-blemas políticos dava ao rei de castela, tentava, assim, alcançarumaposiçãofavoráveljuntodofuturoreidePortugal.Percebendoaameaça,eapoiadopelanobreza,quetemia,numfuturopróximo,perderoscargosemfavordoscastro,d.AfonsoiVmandoumatard. inêsdecastro, em1355.Seguiu-sea revoltaded.Pedroqueculminounumaguerracivilcontraopai.
nofinaldoreinado,d.AfonsoiVviveuamesmasituaçãoqued.dinis:umaguerracivilcontraumfilhorebelde.noentanto,ospapéisinverteram-se.Agora,d.AfonsoiVeraopai,enãoofilho.UmadasmuitasironiasdaHistória.
D. Pedro I (1357-1367)
Assimquesubiuaotrono,d.Pedroiprocuroudeimediatovingar--sedosassassinosded.inêsdecastro,tendoconseguidomatardoisdostrêsresponsáveis.Amorteded.inêstinha,noentanto,impedidooscastrodeinfluenciaremapolíticaportuguesa.Aoquetudoindica,ocasalnuncachegouacasar,peloqueosfilhoseramtodosilegítimos.estepormenorseráimportantenofinaldoreinadoded.Fernando.
em10anosdereinado,d.Pedroipercorreutodooreinoepreo-cupou-sesobremaneiracomajustiçaeaformacomoeraaplicadanoterritório.contudo,nãoparecetertidoomesmodesejodealgunsdosreisqueoantecederam,desdelogoopaieoavô,derefrearoscom-portamentosdanobreza,peloquenãolançouquaisquerinquirições.
História de Portugal
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Aindaassim,aaltanobrezatemia-o–maisnãofossepelavin-gança sangrenta que exerceu contra os assassinos de d. inês decastro–eoreino,nogeral,respeitava-oenquantorei.noentanto,a crise socialque teveorigemnasdificuldades económicas enaPestenegraaindasefaziasentircomintensidadenoreino.
enquantorei,d.Pedroisoubemanteraneutralidadeportugue-safaceaosconflitosinternoscastelhanos,embora,porváriasvezes,tenhasidochamadoaintervir.doseucasamentocomd.constan-çaManoel–ocorridoanosantesdoromancecomd.inêsdecastro–nasceuoúnicofilholegítimoeherdeiro,d.Fernando.entreosváriosfilhosilegítimoscontava-sed.João,feitoMestredaOrdemdeAvislogoaos7anosdeidade.eraofuturod.Joãoi.
D. Fernando (1367-1383)
d.Fernandobeneficiou, logono iníciodo reinado,daboa ad-ministração dos bens da coroa operada pelos antecessores, emparticulard.AfonsoiV(1325-1357)ed.Pedroi(1357-1367),quetinham deixado os cofres régios cheios de metais preciosos. noentanto,quandofaleceu,em1383,d.Fernandodeixouoreinomer-gulhadonumafortecriseeconómica,socialepolítico-militar.
As trêsguerrasquemantevecontracastela (1369-1371,1372--1373e1381-1382),conhecidascomoGuerras Fernandinas,deramorigemaumagrandedevastaçãoumpoucoportodooreino,jáqueestefoiváriasvezesatacadoeinvadido.Lisboachegoumesmoaseralvodeumapertadocercoem1373.
Curiosidade:Lisboaaguentouocercocastelhano,masboapartedacidadefoiincendiadaedestruída,precisamenteporseencontrarsituadaforadasantigasmuralhasmouras,asmesmasde1147.Adurezadocercodemonstrouqueeraprecisoprotegermelhoracidademaisimportantedoreino.Porisso,d.Fernandoordenouaconstruçãodeumagrandemuralhaemtornodacidade,achamadacercaFernandina,daqualaindahojeexistemvestígios.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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Apósofimdaúltimadasguerras,foiassinado,em1383,oTra-tadodeSalvaterradeMagos,queestabeleciaapazentrePortugalecastela,aocasarafilhaded.Fernando,d.Beatriz,comoreidecastela,d.Juani.estetratadocolocavaoreinoemperigodeper-deraindependência,poisd.Fernandonãotinhaumfilhohomemquelhepudessesucedernotrono.
Poucodepois,emoutubrode1383,d.Fernandofaleceu,eorei-nopassouasergovernadopelaviúva,d.LeonorTeles.Arainhaeraumamulherimpopularenãotardouatéqueserevoltassemcontraela.Anosantes,quandocasoucomd.Fernando,játinhamacon-tecidorevoltaspopularessemelhantes.Arevoltamaisimportante,ocorreuemLisboaem1383,eobrigoumesmoarainhaafugirparaSantarém,deondepediuajudaaogenro,oreiJuanidecastela.
D. João I (1385-1433)
emLisboa,olíderdarevoltapopularcedoserevelouserd.João,MestredaOrdemMilitardeAvisefilhobastardodoreid.Pedroi.Ao assassinar o conde Andeiro, um dos maiores apoiantes ded.LeonorTeleseseusupostoamante,oMestreobrigouarainhaafugir.Tomouentãoocontrolodacidadeepreparou-aparaocom-bate.durantetodooanode1384aguentouumdurocercoimpostopeloreidecastela.
nunoÁlvaresPereirafoi,aindaantesdocercodeLisboa,envia-doparasul,paradefenderafronteiraalentejana.erajáentãoumdosmaisimportantesapoiantesded.João.FoijuntoàviladeFron-teiraque,emabrilde1384,venceuabatalhadosAtoleiroscontraumexércitocastelhano.
OcercodeLisboaacabouporcorrermalaoreidecastela,queseviuobrigadoaretirardepoisdeoseuexércitotersidoatacadopelapeste.Apartirdeentão,d.Joãoed.nunoÁlvaresPereirainicia-ramumacampanhaparasubjugarasvilasecastelosqueapoiavamoreicastelhano,comoeraocasodeTorresVedras.
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em1383-1384,oMestredeAvisaindanãoeraapoiadoportodooreino.TinhaentãooapoiodecidadescomoLisboa,ÉvoraePorto,bemcomodeconcelhosmaispequenosdosul.noentanto,amaiorpartedonorteemuitadagrandenobrezanãooapoiava.Mesmojáenquantorei,d.Joãoicontinuavaanãoserobede-cido,porexemplo,noMinhoeemTrás-os-Montes.Foiprecisoandaremcampanhascontraestasregiõesdurantemuitosanosnodecorrerdadécadade1380.
noiníciode1385,tiveramlugarcortesemcoimbra.Foiapri-meiravezquenumareuniãodogénerofoieleitoumreidePortu-gal.OMestrefoiescolhidocomorei,epassouaserd.Joãoi.Asuacausadeveumuitoaoapoioarmadoded.nunoÁlvaresPereiraeaosargumentoslegaisdodoutorJoãodasRegras.
nessemesmoanode1385,oreidecastelacomandounovain-vasão contra Portugal, tendo entrado no reino a partir da Beira.PartedoseuexércitofoiderrotadoemTrancosopelosfidalgosbei-rões,masamaiorpartecontinuouaseguirparasul,rumoaLisboa.Onovorei,d.Joãoi,eoseunovocondestável,d.nunoÁlvaresPereira,decidiramsair-lheaocaminhonasproximidadesdeLeiria.deu-seentão,a14deagostode1385,abatalhadeAljubarrota.
Curiosidade: entreoscandidatosderrotadosnascortesdecoimbraencontravam-semaisdoisfilhosbastardosded.Pedro:umoutrod.Joãoed.dinis.eramambosfilhosded.inêsdecastro,aocon-tráriodoMestredeAvis.Maistarde,iriamapoiaroreidecastela.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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Apósavitória,d.Joãoipassouàofensiva,atacandooreinodecastelaparaobrigard.Juaniaassinarapaz.Foiaíque,juntoaBadajoz,emoutubrode1385,d.nunoÁlvaresPereiravenceuabatalhadeValverde.
AaliançaentrePortugaleainglaterrafoiestabelecidapeloTra-tadodeWindsor,em1386.noanoseguinte,d.Joãoicasoucomd. Filipa de Lencastre, prima do rei inglês. A partir de então,d.Joãoipôdecontarcomumapoioinglêsmaisfortequandotinhadeenfrentarcastela.
ApazdefinitivaentrePortugalecastelasófoialcançadacomaassinaturadoTratadodeMedinadelcampo,em1431.noentanto,depoisdachamadaPazdeAyllon,de1411,nãohouvemaiscom-batesentreosdoisreinos.Foiestetratadode1411quepermitiuad.Joãoiatacareconquistarceuta,dandoassimoprimeiropassodaexpansãoportuguesa.Quandofaleceu,em1433,d.Joãoidei-xouumreinomuitodiferentedaquelequetinharecebido.
2.AbatalhadeAljubarrota,14deagostode1385.
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nabatalhadeAljubarrota,d.Joãoinãolutouapenascontraoscastelhanos. do lado do rei de castela encontravam-se muitosportuguesesquenãoqueriamoMestredeAviscomorei.entreelesestavaumirmãoded.LeonorTelesedoisirmãosded.nunoÁlvaresPereira.Alémdisso,oreidecastelatambémcontavacomoapoiodetropasfrancesas,enquantod.Joãoitinhaoapoiodetropasinglesas.
D. Duarte (1433-1438)
d.duarteseguiu,emboamedida,otrabalhoiniciadopelopai.d.Joãoitinhasidoobrigado,noiníciodoreinado,adarmuitasdasterrasdacoroaànobreza,emtrocadeapoiomilitar.comaguerraachegaraofim,oreipassouatentarcomprardevoltaessasterras,emboraanobrezanãooquisesseaceitar.d.duartedeucontinui-dadeaesseprocesso,deformaafortalecer,umavezmais,oseuprópriopatrimónio.Paratal,instaurouaLei Mental,umaleiqueregiaaformacomoasterrasqueanobrezadetinhaemnomedoreipodiamserherdadas.
Curiosidade: ALei Mentalganhouestenomepor,aparentemente,terestadonamenteded.Joãoiantesdeseraplicadapord.duarte.estaleiditavaquequemdetinhaasterrasdadaspelacoroanãoaspodiadividirporváriosfilhos,vendê-lasouabandoná-las.estasterrassópodiamserdeixadasaumfilhohomemeprimogénito.casocontrário,osbensregressavamàcoroa.
Aindaenquantoinfante,d.duartetinhacomeçadoaauxiliaropainastarefasdegovernodoreino.d.Joãoi,nosseusderradeirosanosdevida,preferiacaçaraassinardocumentos.Porisso,quandochegouaotrono,d.duarteerajáumhomemmaduroeexperimen-tado.emborasótenhareinadodurantecincoanos,foielequemgovernouPortugalpraticamentesozinhoentre1411e1433.
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d.duartefoiaindaresponsávelpelacriaçãodeumasériedeou-trasleis,apelidadasdeOrdenações de D. Duarte,quefacilitavamaaplicaçãodajustiçaecontrolavamaaçãodosfuncionáriosrégios.essas leis seriam, mais tarde, ampliadas pelo filho, d.AfonsoV,comapublicaçãodasOrdenações Afonsinas.
O principal acontecimento do reinado de d. duarte foi a ex-pedição fracassadacontraTânger,ocorridaem1437,que iremosabordar no capítulo seguinte. diga-se, no entanto, que quandod.duartemorreu,em1438,vítimadepeste,muitosdosproblemascausadaspelaexpediçãoficaramporresolver.
D. Afonso V (1438-1481)
d.AfonsoVsubiuaotronoapósamorteinesperadadopai,oreid.duarte.Tiveramentãoiníciolutaspelogovernodorei-no,jáqueopequenoreitinhaapenas5anosdeidade.Amãe,d.LeonordeAragão,eotiopaterno,oinfanted.Pedro,lutarampelo poder entre 1438 e 1440. d. Pedro acabou por vencer, ed.Leonorexilou-seemcastela.d.Pedrogovernouoreinoemnomedosobrinhoaté1448,alturaemqueorei,maiordeidadedesde1446,afastouoinfantedacorte.Oexíliodeveu-seàsin-trigasurdidaspelosrivaisded.Pedro.
Oinfanteeraacusadodeserdemasiadoambicioso.comopro-va,eraapresentadoofactodetercasadoafilha,d.isabel,comojovemrei.d.PedroacaboupormorrernabatalhadeAlfarrobeira,em1449.combateucontraasforçasdorei,queentãoeraapoiadopelosrivaisdoinfante,comod.Afonso,filhobastardoded.JoãoieprimeiroduquedeBragança.
duranteosprimeirosanosdoseureinadoautónomo,apartirde1449,d.AfonsoVperseguiuosapoiantesdotioesogro,d.Pedro.iriaperdoá-losanosmaistarde,masatéessemomentotirou-lhesosbensedeu-osaantigosapoiantesdasuamãe,d.Leonor,que,entretanto, tinhafalecidonoexílio,emcastela.Oreirecusou-se,noentanto,aafastararainha,oqueerapedidoporantigosrivaisded.Pedro.disabelacabariaporfalecerem1455,apósdaràluzoprínciped.João,futurod.Joãoii.
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d.AfonsoVfoiumreiqueteveinteressenosdescobrimentos.Apoiou sempre as atividades do infante d. Henrique e, quandoestemorreu,em1460,assumiuocontrolodanavegaçãonacostaocidentalafricana.Tambémteveinteressenalutacontraosmuçul-manosemMarrocos.Porisso,em1458conquistouAlcácerceguere,em1471,ArzilaeTânger.Pelomeioficavaumacampanhafra-cassadacontraTânger,em1463-1464.
nadécadade1450,d.AfonsoVcomeçouaganharinteressenotronodecastela.Assim,aolongodosanosseguintes,foiangarian-doapoiosparasepodertornarreidecastelaePortugalemsimultâ-neo.em1475,casoucomd.Joana,filhadofalecidoreiHenriqueiVdecastela,e reclamouparasiacoroadaquelereino.entrouemguerracontrad.isabeldecastela,meia-irmãdofalecidorei,eoseumarido,d.FernandodeAragão.Aguerranãocorreubeme,em1479,noTratadodasAlcáçovas-Toledo,d.AfonsoVdesistiudotronocastelhano.Faleceuem1481,desapontadopeloinsucesso.
economia e Sociedade
A Igreja Medieval
AindaantesdaquedadoimpérioRomanodoOcidente,ocorridaem476, tinham-seestabelecidováriosreinosgermânicospagãosnaeuropaOcidental.naHispâniaestabeleceram-se,comovimosnocapítuloanterior,osreinosdosSuevosedosVisigodos.
Aigreja,comoPapaàcabeça,conseguiusobreviveràquedadoimpérioRomanodoOcidente.Foimesmoaúnicainstituiçãoque,aosobreviver,conseguiupreservarelementosdaculturaromana,comooLatimouodireitoRomano.Foiaigrejaquecomeçouacristianizarosnovosreinosgermânicos.comovimosantes,oreivisigodo,Recaredo,converteu-se,em589,aocristianismo.
duranteséculos,osclérigosdesempenharamumduplopapel.Porumlado,sóelespodiamgarantiraoSerHumanoasalvaçãoda
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almanumperíodoemqueamorteestavamuitomaispresentedoquehoje.Podiaocorreraqualquermomentoeaconteceraqual-querum,particularmenteàscrianças.
Poroutrolado,osclérigoseramosúnicosquesabiamlerees-crever,e,portanto,tornavam-semuitoúteisparaosreis,quepre-cisavamdegovernarreinoscadavezmaioresemaiscomplexos.Reiscomod.Afonsoii(1211-1223)nuncapoderiamterlançadoasinquiriçõesGeraissenãotivessemfuncionáriosquelessem,escre-vessemeconhecessemalei,ouseja,odireitoRomano.
OpoderdoPapaedaigrejafoimuitoimportanteaolongodaidadeMédia,eajudouamoldaravidadoseuropeus.comovimosantes,opoderdoPapaeratalquepodiadeporreisqueofendiamosbensdaigreja.Foioqueaconteceuad.Sanchoii(1223-1248).
uma sociedade de ordens
AsociedademedievaleuropeiaeraumasociedadedeOrdens,ouseja,cadaindivíduoeracolocadonumgruposocialcomfunçõeseestatutosdiferentes.Aotodo,existiamtrêsOrdensqueseorgani-zavamemformadepirâmide:
no topoficavamosoradores,ou seja,o clero, cuja funçãoerarezarparagarantiraproteçãodivinaparatodos.nomeio,osguer-reiros,portanto,anobreza,quedeviadefenderosclérigoseostra-balhadores.nabase,ostrabalhadores,comummenteapelidadosdepovo,quedeviamalimentaresustentarosclérigoseosnobrescomoseutrabalho.
este era o modelo teórico que deveria guiar toda a sociedademedievale,comosepodeperceber,eraummodeloidealizadoquenunca correspondeu totalmente à realidade. em Portugal, o reid. duarte (1433-1438) escreveu sobre este assunto, aumentandoonúmerodeordensparaintegrarosgruposqueficavamdefora,comoosmercadores,equeeramtãoimportantesparaofunciona-mentodasociedade.
Aindaquedesajustadodarealidade,omodelodastrêsOrdensduroumuitotempo,mesmoparaalémdaidadeMédia,sósendodefinitivamentepostodeparteapósaRevoluçãoFrancesa.novér-
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ticedapirâmideencontrava-seorei,elemesmoorigináriodano-breza,cujosprincipaisdevereseramgarantiradefesadossúbditoseadministrarajustiça,deformaamanterapazsocialnoreino.
Curiosidade: OmodelodasTrêsOrdensfoi,inicialmente,divulgadoemLatim,alínguaeruditadaidadeMédia.emLatimasTrêsOrdenssão,respetivamente:oratores(oradores),bellatores(guerreiros)elaboratores(trabalhadores).
Aascensãosocialexistia,masnãoeramuitocomum.Umcam-ponêsricopodiaserarmadocavaleiroseservisseoreinaguerracomhomensoulheemprestassedinheiro.Masnãopoderiasubirmuitomais.Poroutrolado,pormuitopobrequeumfidalgofosse,nunca deixaria de ser fidalgo, pois assim tinha nascido e assimmorreria.
Fome, peste e guerra – o século XIV
OsséculosXiaXiiiforamumperíodoemqueapopulaçãoeu-ropeiacresceuconsideravelmente,frutodoaumentodaproduçãoagrícola. costuma-se chamar a este período o renascimento dascidades,poisoscentrosurbanostornaram-semaispopulosos,ricose,consequentemente,maisimportantes.
Faceaestesséculosdecrescimento,oséculoXiVaparececomoumperíododegravescrises,portersidoassoladoporfomes,guer-rasepestes.Amáimagemquehojeemdiaimperasobreos1000anosdeidadeMédia(c.500-c.1500)deve-se,emgrandeparte,aoséculoXiV.
Logonasprimeirasdécadasdesteséculo,asalteraçõesclimáti-cas,emparticularoarrefecimentodastemperaturas,provocaramumasériedemausanosagrícolasumpoucoportodaaeuropa.Opãoera,então,abasedaalimentação,eumaescassezdecereaisconduzia,inevitavelmente,àfome.
nessemesmoperíodo,váriosreinoseuropeusenvolveram-seemsangrentosconflitosmilitares.inglaterraeFrançaderaminícioà
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Guerrados100Anos (1337-1453)e,mais tarde,arrastariamPor-tugalecastelaparaoconflito.naPenínsulaibérica,Portugalen-frentounãosóguerrascivis(em1319-1324e1355),comotambémse envolveu em conflitos contra castela (1336-1339; 1369-1371;1372-1373;1381-1382e1383-1431).Aguerraprovocava,natural-mente,grandedestruição:morriamhomens–e,emmuitoscasos,tambémmulheresecrianças–,arruinavam-secamposcultivadoseroubavam-sebens.
APestenegraassolouaeuropaentre1347e1352.chegouaPortugalem1348e,talcomonorestantecontinenteeuropeu,apa-nhouoshabitantesenfraquecidospelafomeepelaguerra.APestenegra foivistadesdeo iníciocomoumcastigodivino,poisnãohaviaformadeacombater.
Portodaaeuropaterãomorridomilhõesdepessoas,emborasejaimpossívelsabernúmeroscertos.Sabe-se,noentanto,quesónoiní-ciodoséculoXViapopulaçãoportuguesaalcançouosvaloresquetinhaantesdachegadadaPestenegra,emmeadosdoséculoXiV.
Curiosidade: Amortedemilhõesdepessoasdevidoàsmaisvaria-dascausasgerouumaescassezdemãodeobraqueacabouporfavo-recerosmaispobres.istoporqueapartirdeentãopuderamexigirmelhoressalários,porexistiremmaiscamposparacultivardoquepessoasparaostrabalhar.Muitasdestasexigênciaseramdemasiadoelevadasparaserempermitidaspelosreis(chegouahaverpastoresquepassaramacobrar10vezesmaisparapastaranimais!).Porisso,monarcascomod.AfonsoiVlegislaramnosentidoderestabeleceraordemsocial,emboracomefeitosmuitolimitados.
o crescimento urbano – lisboa
em1147,quandod.AfonsoHenriquesconquistouLisboa,aci-dadeerajáumimportantecentrourbano.AtéaoiníciodoséculoXiii,acidadenãoterácontadocommaisdoque10milhabitantes.noentanto,nofinaldoséculoXiV,naalturaemqueelevoud.João,MestredeAvis,aregedoredefensordoreino,contariajácomcerca
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de35mil,sendo,semdúvidaalguma,acidademaisimportante.estesnúmerossãoparticularmentesignificativosquandocompa-radoscomapopulaçãodoPorto,que,emtornodoano1400,nãopassariaos4milhabitantes.Lisboafoi,portanto,umexemplocla-rodorenascimentodascidadesqueantesreferimos.
duranteaidadeMédia,acorteeraitinerante,ouseja,oreiper-corriaoreinocomafamíliaeoseuséquitodecavaleiroseservi-dores.istosignificavaalgoque,paranós,éestranho:umacapitalmóvel.Acapitaléondeoreiestá,sejaemLisboa,sejanumapeque-níssimaaldeiaperdidanosmontes.
Aindaassim,osreistiveramsemprealgumascidadesondepas-savammaistempo,comoLisboa,SantarémeÉvora.Aitinerânciada corte devia-se, em grande parte, às dificuldades de abastecercomalimentosumgrandenúmerodepessoas.Ouseja,eramuitodifícil,numasociedadecomumaagriculturapoucoprodutiva,ali-mentarumgrandenúmerodepessoasnumasóregião.TambémporissoosreiscomeçaramapreferirLisboaque,porestarjuntoaoTejo,eramaisfácildeabastecerporviamarítima.
Também o comércio internacional ajudou Lisboa a crescer. AsligaçõesentreoMediterrâneoeonortedaeuropa,feitaspormar,tinham um porto de escala obrigatório em Lisboa. isto tornava acidadeumimportantepoloparamercadoresebanqueiros,sobretudoitalianos.Maistarde,jáduranteaidadeModerna,Lisboaviriaaserumadasmaioresemaisimportantescidadesdomundo,mantendocontactosporviamarítimacomaeuropa,África,ÁsiaeAméricas.
Cultura e Artes
Castelos e igrejas – do românico ao Gótico
ORomânicofoiumestiloartísticoqueseespalhoupelaeuropanosséculosXiaXiii.ASédeLisboafoi,nasuaorigem,umacons-truçãoromânica,tendo,noentanto,sidosujeitaaintervençõespos-
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teriores.ORomânicofoiumestilocaracterizadoporconstruçõesde dimensões modestas e poucos complexas, sobretudo quandocomparadascomedificaçõesdeperíodosposteriores.
Os primeiros castelos de pedra começaram a surgir por voltadoséculoXii,portanto,emplenoperíododearteromânica.eramconstruçõesdepedrasimples,commuralhasgrossasealtas,eumpequenonúmerodetorres.Atorredemenagem–amaisaltaeforte–eraopontomaisimportantedocastelo,poraíhabitaroseusenhoroualcaide.
OGótico,estiloartísticooriundodonortedaeuropa,chegouaPortugalalguresemmeadosdoséculoXiii.AutilizaçãodoGóticomarcouaconstruçãodosedifícios,essencialmente,atéaofinaldoséculo XV, altura em que foi introduzido o estilo Gótico Tardio,comummente apelidado de Manuelino, que abordaremos maisadiante.
Aindahojeexistem,espalhadosportodooPaís,casteloseigre-jasdeestiloGótico.Osclaustroseasnavesdegrandesdimensões,bemcomoosarcobotantes(suportesparaaguentarparedesmuitoaltas),sãoalgunsdoselementosmaisvisíveisdesteestiloarquite-tónico.OsdoismonumentosmaisimponentesdoGóticoemPor-tugalsãoosmosteirosdeAlcobaçaedaBatalha.
3.OmosteirodeSantaMariadaVitória,naBatalha.
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AintroduçãodoGóticoemPortugaltambémoperouevoluçõesnoscastelos, sobretudonoreinadoded.dinis (este reimandourenovar57castelos!).Onúmerodetorresaolongodasmuralhasaumentou,eforammesmocolocadostorreõesemzonasmaisfrá-geis, como juntoàsportas (conformesepodevernocastelodeGuimarães).
Curiosidade: dentrodaSédeLisboaaindahojepodever-searica-mentedecoradaarcatumularemestilogóticodeLopoFernandesPacheco,umfidalgodegrandeimportâncianoreinadoded.AfonsoiV(1325-1357).Otúmuloencontra-secompletocomumaestátuajacentedocavaleiroquealiseencontrasepultadocomamãonaespadaeumcãoaseuspés.
o português como língua escrita
Alínguafoi-sedesenvolvendoapardoreino,tornando-seoPor-tuguêsumelementoimportanteparaacriaçãodeumaidentidadenacional,numprocessoqueteveinícionaidadeMédia,masquedurouváriosséculosatéseconsolidar.
OGalaico-Portuguêsfoiaprimeiraformadessalíngua.debaseslatinas, teveorigemnonoroestedaPenínsula ibérica,na regiãoqueenglobaaGalizaeonortedePortugal,masdesdecedoad-quiriueadaptoupalavrasdeorigemárabe.Omaisantigodocu-mentonão-literárioescritoemGalaico-Portuguêsquechegouatéaopresentefoiotestamentoded.Afonsoii,datadode1214.Jáera,noentanto,umalínguafaladaemesmoutilizadanocontextoda composição literária desde finais do século Xii, sendo dissoexemploascantigasdeamigoedeamorouascantigasdeescárnioemaldizer.
comd.dinis(1279-1325),oPortuguêstornou-sea língua“ofi-cial”dosdocumentosescritoseexpedidosapartirdachancelariarégia,substituindooLatim.Achancelariarégiaeraoorganismoqueacompanhavaempermanênciaoreiequepassavaaescritotodoogénerodiplomase leis.Seo reifizesseadoaçãodeuma
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terra aumnobre, essadoação era feitapor escrito, redigindo-seumdocumentoqueocomprovava.Odocumentoerafeitoemdu-plicado,sendoumacópiaenviadaaonobreeficandooutraparaorei,paraqueestepudessesempresaberaquemtinhadadooquê.
TambémacriaçãodaprimeiraformadeuniversidadeemPortu-gal,oestudoGeral,foi,simultaneamente,causaeconsequênciadoaumentodaimportânciadalínguaportuguesa.
Ao longo do século XiV surgiram novas formas de utilizaçãodalínguaportuguesa,desdelogonaescritadelivrosdelinhagens,comoocélebreLivro de Linhagens do Conde D. Pedro.Umlivrodelinhagenséumdocumentoondeseincluempequenashistóriasso-breaorigemedesenvolvimentodasváriasfamíliasnobresdorei-no.Podemserhistóriasverídicasoulendaspuramenteficcionadas,masopropósitoéomesmo:dignificaredemonstraraimportânciadanobrezaparaaconstruçãodoreino,sobretudonoquedizres-peitoàguerracontraosMourosque,comovimos,eraaprincipalatribuiçãodanobreza.
As crónicas de reis e os romances de cavalaria
Ascrónicasdosreissurgiramcomoumaferramentaparacriarumaimagemquaseperfeitadosreis.Tinham,portanto,umafun-çãosemelhanteàdoslivrosdelinhagensdanobreza.Ascrónicasdeviamserregistosdosacontecimentosocorridosduranteumde-terminadoespaçodetempo,geralmenteoreinadodeumreiespe-cífico.istoéoquesucede,porexemplo,comaCrónica de D. João I,deFernãoLopes.Aindaqueascrónicasfossem,emmuitoscasos,idealizadas,são,porvezes,aúnicafonteparaoestudodecertasépocas.
OséculoXVconstituiuoaugedacrónicarégiaportuguesa,em-borajánoséculoXiVtivessemsidoescritascrónicas,comoaCró-nica Geral de Espanha de 1344(nesteperíodo,espanhareferia-seatodooespaçogeográficodaPenínsulaibérica,enãoaoreinodeespanhaque,naaltura,aindanãoexistia).FoinoséculoXVquesecriouumnovotipodefuncionáriorégio:ocronista-mordoreino,quetinhaporfunçãoaescritadascrónicasdereis.
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Curiosidade: Aprimeiracrónicasobreoreinadoded.AfonsoHen-riques(1139-1185)sófoiescritaem1419,portanto,maisdedoisséculosdepoisdamortedorei.Ascrónicasforamquasesempreescritasmuitotempoapósamortedosreiscujosreinadosaborda-vame,porisso,asinformaçõesquedivulgamsão,emmuitoscasos,duvidosas.Aindaassim,são,namaioriadasvezes,asúnicasfontesdequeoshistoriadoresdispõemparaoestudodecertosperíodos.
Ascrónicasforam,desdeoinício,utilizadasparaeducaranobre-za.istoporqueseesperavaqueaoleremououviremlerosexem-plosdosheróisdopassado,os jovensnobres sentissemvontadedeosimitare,assim,seremmaisleaisaoreioumaiscorajososembatalha.A leitura era ainda uma atividade coletiva: na corte, aoserão,alguémliaenquantodezenasdepessoasouviam.
Tambémos romancesde cavalaria, comoasobras sobreo reiArtureaTávolaRedonda,estiveramemvogaentreanobrezanosséculosXiVeXV.Ojovemd.nunoÁlvaresPereiraleuessesro-manceseambicionoumesmoserumheróicasto,comofora,nalenda,Galahad,umdoscavaleirosdaTávolaRedonda.
A cultura dos príncipes de Avis
comovimos,adinastiadeAviscomeçoucomd.Joãoi(1385--1433),umreique,aolongodavida,demonstrouserculto(foiedu-cadopelaOrdemdeAvis)einteligente,tendochegadoacomporumlivrosobrecaça,oLivro da Montaria.
Oseusucessor,oreid.duarte(1433-1438),teveaindamaisin-teressepelacultura.Tinhaumabibliotecapessoalcommaisde80livros(umnúmeromuitoelevadoparaumaépocaemqueoslivroseram muitos caros e raros). d. duarte escreveu dois livros, algomuitopoucocomumparaumrei.
noLeal Conselheiro,oreid.duarteensinavaoshomensdacorteaseremvirtuososecuidados.escreveuolivroapedidodarainha,suaesposa,tendo-lhededicadoaobra,utilizandovárioselementosquerecolheunumlivrodeapontamentosquetransportavasem-
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preconsigo.JánoLivro da Ensinança de Bem Cavalgar Toda Sela,d.duartepropôs-seaensinarànobrezaosmelhorestruquesparamontareandaracavalo,bemcomoacombatercomarmasemtor-neiosejustas.Amortelevou-oantesdeterminaresteúltimolivro.
Curiosidade: Olivrodeapontamentosded.duartecontinhaassun-tostãovariadoscomomezinhasparaváriasdoenças,asmedidasinterioresdasváriassalasdopaçodaviladeSintraouaindaumarezaparaexpulsarodemóniodocorpodealguém.
Outrosfilhosded.Joãoied.FilipadeLencastretambémde-monstraram qualidades literárias. O infante d. Pedro, duque decoimbra e regente do rei d. AfonsoV, escreveu um livro sobrevirtudes,oTratado da Virtuosa Benfeitoria,alémdetertraduzidoalgumasobrasdoLatim.
Jád.Joãoed.isabeldemonstrarambastanteerudiçãoemalgu-masdassuascartaspessoais.Osmenosbrilhantesaestenívelte-rãosidoosinfantesd.Henriqueed.Fernando,quenãodeixaramescritoalgoquepossaserconsideradoinovadorousequererudito.d. Henrique demonstraria qualidades noutras áreas, como vere-mosnopróximocapítulo,ed.Fernandoacabariaporfalecerpre-maturamentenocativeiro.
Cronologia
Data Acontecimentos
1109 Anoprováveldonascimentoded.AfonsoHenriques.
1112 Mortedoconded.Henrique.
1128 BatalhadeS.Mamede.d.AfonsoHenriquesexerceopoderautonomamente.
1131 d.AfonsoHenriquesescolhecoimbracomoprincipalcentrodeoperações.
1135 AfonsoViideLeãoecastelaintitula-seimperadordaHispânia.
1139 BatalhadeOurique.d.AfonsoHenriquesintitula-serei.
História de Portugal
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1143 TratadodeZamora.d.AfonsoHenriquescoloca-sesobautori-dadedoPapaeéreconhecidocomoreiporAfonsoVii.
1147 d.AfonsoHenriquesconquistaSantarém,Lisboa,AlmadaeSintra.
1153 FundaçãodaabadiadeAlcobaçapelosmongesdaOrdemdecister.
1160 doaçãodeváriaspovoaçõesacolonosfrancos.
1165 conquistadeÉvoraporGeraldo,oSemPavor.
1169 desastredeBadajoz.d.AfonsoHenriqueséferidoepresoporFernandoiideLeão.
1179 Bula Manifestis Probatum.Reconhecimentopapalded.AfonsoHenriquesenquantoreidePortugal.
1184 OsAlmóadasconquistamosterritóriosasuldoTejo,comexce-çãodeÉvora.
1185 Morteded.AfonsoHenriquesesubidaaotronoded.Sanchoi.
1189 conquistadeSilvescomoauxíliodeumaarmadadecruzados.
1190-1191 novaofensivaalmóada.PerdadeSilvesecercodeTomar.
1208-1210 conflitosded.SanchoicomosbisposdoPortoedecoimbra.
1211 Morteded.Sanchoiesubidaaotronoded.Afonsoii.iníciodoconflitocomasirmãs.
1217 conquistadefinitivadeAlcácerdoSal.
1220 PrimeirasinquiriçõesGerais.conflitocomoarcebispodeBraga.
1223 Morteded.Afonsoiiesubidaaotronoded.Sanchoii.
1226 Falhaaconquistadeelvas.
1229 OcupaçãodeelvasedaJuromenha.Anoprováveldapartidadoinfanted.AfonsoparaFrança.
1232 conquistadeSerpaeMoura.
1237-1238 conflitosentreoreieosbisposdaGuardaedoPortoeoarce-bispodeBraga.
1242 conquistadeAlvor,PaderneeTavira.
1245 d.Sanchoiiéconsideradoreiinútil(rex inutilis)peloPapaedeposto.JuramentodeParisdoinfanted.Afonso.
1246 iníciodaguerracivilcontraospartidáriosdoinfanted.Afonso.
1247 intervençãocastelhananaguerracivilaoladoded.Sanchoii.d.Sanchoiiparteparaoexílio.
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1248 d.SanchoiimorreemToledo.Oinfanted.Afonsopassaaseroreid.Afonsoiii.
1249 FimdaReconquistaportuguesacomaconquistadeAlbufeira,Faro,PorcheseSilves.
1250-1251 GuerracomcastelapelapossedoAlgarve.
1253 casamentoded.Afonsoiiicomd.Beatriz,filhadeAfonsoXdecastela.iníciodabigamiadorei.
1267 TratadodeBadajoz.castelarenunciaàpossedoAlgarve.
1272-1275 cartasdeprivilégioconcedidasafeiras.
1273 cortesdeSantarém.Tenta-searesoluçãodosconflitosdoreicomoclero.
1279 d.AfonsoiiijurasubmissãoaoPapadoeé-lhelevantadaaexco-munhão.Morrepoucodepoisesucede-lhed.dinis.
1281 Primeiroconflitoarmadoentred.diniseoseuirmão,oinfanted.Afonso.
1284 LançamentodeinquiriçõesGerais.
1285 Protestosdanobrezacontraasinquirições.
1286 Proibiçãorégiadacompradebensderaizporpartedaigreja.
1287 novoconflitoentreoreid.diniseoinfanted.Afonso,seuirmão.
1293 criaçãodeumabolsademercadoreselivrecomércioentrePor-tugaleainglaterra.
1297 TratadodeAlcanizes.estabilizaçãodafronteiracomcastela.
1308 Tratadodecomérciocominglaterra.
1317 OgenovêsManuelPessanhaénomeadoalmirantedafrotareal.
1319 criaçãodaOrdemdecristocomosbensdaextintaOrdemdoTemplo.
1319-1324 Guerracivilentred.diniseofilhod.Afonso,futurod.AfonsoiV.
1325 Morteded.dinisesubidaaotronoded.AfonsoiV.
1327-1331 instituiçãodosjuízesdefora.
1335 inquiriçõesGeraisemTrás-os-Montes.
1336-1339 Guerracontracastela.
1340 BatalhadoSaladocontraumainvasãodosMerínidasislâmicosnosuldaAndaluzia
1343 inquiriçõesementredouroeMinho.
1348-1349 PestenegraemPortugal.
História de Portugal
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1349 d.AfonsoiVcrialegislaçãoparacombateracrisesocialiniciadapelaPeste.
1355 execuçãoded.inêsdecastroeguerracivilentreoreieoinfanted.Pedro.
1357 Morteded.AfonsoiVesubidaaotronoded.Pedroi.
1364 d.Pedroicolocad.João,seufilhobastardo,comoMestredaOrdemdeAvis.
1367 Morteded.Pedroiesubidaaotronoded.Fernandoi.
1369-1371 PrimeiraGuerraFernandina.
1372-1373 SegundaGuerraFernandina.cercodeLisboade1373.
1373-1375 RevoltaspopularesemváriasregiõesdePortugal.
1381-1382 TerceiraeúltimaGuerraFernandina.
1383 TratadodeSalvaterradeMagos.Morteded.Fernando.Regênciaded.LeonorTeles.d.João,MestredeAvis,aclamadoRegedoredefensordoreino.invasãodePortugalpelasforçasded.Juanidecastela.
1384 cercodeLisboa.BatalhadosAtoleiros.
1385 Ascortesdecoimbraelegemcomoreid.João,MestredeAvis.BatalhasdeTrancoso,AljubarrotaeValverde.
1386 TratadodeWindsoreiníciodaaliançaanglo-portuguesa.
1387 casamentoded.Joãoicomd.FilipadeLencastre.
1393 Tréguascomcastela.
1396-1402 novorecrudescerdaguerracomcastela.
1411 AssinaturadaPazdeAyllon.
1415 conquistadeceutaeiníciodaexpansãoportuguesa.criaçãodotítulodeduque,atribuídoaosinfantesd.Pedroed.Henrique.
1433 Morteded.Joãoiesubidaaotronoded.duarte.
1434 PromulgaçãodaLeiMental.
1437 FracassaatentativadeconquistarTânger.
1438 Mortedoreid.duarteesubidaao tronodoaindamenord.AfonsoV.
1438-1440 Lutapelaregênciaentrearainhad.Leonoreoinfanted.Pedro.
1439-1448 Regênciadoinfanted.Pedro.
1445 Mortedarainhad.Leonornoexílioemcastela.
1448 d.Pedroafastadodacorte.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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1449 Mortedoinfanted.PedronabatalhadeAlfarrobeira.
1455 nascimentodofuturod.Joãoii.Mortedarainhad.isabel,esposaded.AfonsoV.
1458 conquistadeAlcácerceguer,emMarrocos.
1460 Mortedoinfanted.Henrique.d.AfonsoVocupa-sedaexplo-raçãodacostaocidentaldeÁfrica.
1463-1464 campanhafracassadacontraTânger,emMarrocos.
1471 conquistadeArzilaeocupaçãodeTânger.
1475 casamentoded.AfonsoVcomd.Joana,filhadofalecidod.HenriqueiV,reidecastela.
1475-1479 Guerrapelotronodecastela.
1479 TratadodasAlcáçovas.d.AfonsoVrenunciaaotronocastelhano.
1481 Morteded.AfonsoV.Subidaaotronoded.Joãoii.
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III
PortuGAl no IníCIo DA MoDernIDADe
(SÉCuloS XV-XVI)
Política e Guerra
A conquista de Ceuta (1415) e a expansão portuguesa em Marrocos
ApresençaportuguesaemMarrocosdurou354anos. iniciou--secomaconquistadeceuta,em1415,eterminoucomaentregadeMazagãoaoreideMarrocos,em1769.Operíododeexpansãodessapresençaocorreunosprimeiros100anos,entre1415e1515.Apartirdaí,eaté1541,sucede-seumperíodoemqueapresençanaregiãoestabiliza,semganhos,mastambémsemperdas.Masapartirde1541,comaperdadocastelodeSantacruzdocabodeGué,abre-seumanovafase,naqualaposiçãoportuguesaéquaseexclusivamentedefensivaeasderrotastornam-semaisfrequentes.
Aconquistadeceutamarcouoprimeiropassodaexpansãopor-tuguesa.d.Joãoi(1385-1433),apósaassinaturadaPazdeAylloncomcastela(1411),começouapensaremnovasconquistas.Por-tugalnãotinhamaisporondeseexpandirnaPenínsulaibérica,eerademasiadoperigoso afrontaropoderosovizinho castelhano.Porisso,aexpansãovirou-separaonortedeÁfrica.A23deagostode1415foiconquistadaceuta,umacidadericaecomumaposiçãoestratégicavantajosa,poiscontrolavaanavegaçãonoestreitodeGibraltar.Assim,podiafacilitarocomércioentrecristãoseimpos-sibilitarocomércioislâmico.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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Apreparaçãodaarmadadeceutafoiumsegredobemguardadopelo rei e seus conselheiros durante vários anos. Só quando aarmadajáestavaacaminhodacidadeéqued.Joãoirevelouàstropasodestinodaexpedição.OreichegouaopontodefingirqueiaatacarocondedaHolanda,sóparaqueosespiõesinimigosnãosoubessemqualoverdadeiroalvodaarmada!
nosreinadosseguintes,commaioroumenorhesitação,aexpan-sãoprosseguiu.em1437,noreinadoded.duarte(1433-1438),foilançadaumasegundaarmada,comandadapelosinfantesd.Hen-riqueed.Fernando,irmãosdoreiefilhosded.Joãoi.OalvofoiTânger,outracidadericaetambémsituadanoestreitodeGibral-tar.Aexpediçãofracassoueoinfanted.Fernandoficoucativodosmuçulmanos.Acabariaporfalecernocativeiro,em1443,semquetenhasidopossívelresgatá-lo.
d.AfonsoV(1438-1481)foioreidoséculoXVmaisdedicadoàexpansãoemMarrocos,tendolideradopessoalmentetrêscampa-nhas:em1458conquistouAlcácerceguere,em1471,conquistouArzila eTânger. Pelo meio, em 1463-1464, ficou uma campanha
4.Aconquistadeceuta,em1415.
História de Portugal
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malsucedidacontraTânger.Quandooseureinadoterminou,em1481, Portugal controlava uma estreita faixa costeira no nortedeÁfrica,ochamadoAlgarved’Além-MaremÁfrica.Osucessor,d. João ii (1481-1495), apenasporumavez tentou intervirdire-tamente em Marrocos. em 1489, ordenou a construção de umafortaleza,aquechamouGraciosa,asuldeArzila.estatevedeserabandonadalogoapósaconstrução,devidoaumpoderosoataquedoexércitodosultãodeFez.
Curiosidade: AolongodosséculosXVeXVi,tornou-secomumanobreza,eemparticularosmaisjovens,iremaMarrocoscombater.AlutacontraosMuçulmanoseravistacomoumdeverdoscristãos,eaindamaisdanobreza,poisaqueladeviamanterasarmassempreprontasparaocombate.Porisso,nãoadmiraqued.Joãoisetenhafeitoacompanharpelosfilhosmaisvelhos–d.duarte,d.Pedroed.Henrique–noataqueaceuta,em1415.
comd.Manueli(1495-1521),apresençaportuguesaemMarro-cosestendeu-seatéaolimitemáximo.conquistaram-sevilas,comoSafim (1508) e Azamor (1513), e construíram-se fortalezas, comoMazagão (1514). no entanto, também houve alguns desaires. em1515,foienviadaumaexpediçãoparaconstruirumafortalezajuntoaorioMamora.Aarmadafoiatacadaporumexércitomuçulmanoeafortalezafoievacuada,tendo,noprocesso,morridomilharesdeportugueses.Foiamaiorderrotadoreinadoded.ManueliemarcouofimdaexpansãoportuguesanonortedeÁfrica.
Operíododerecuodapresençaportuguesanaregiãoiniciou-seno reinadoded. João iii (1521-1557).Hámuitoqueo rei tinhadecididoqueoesforçofinanceiroparamanterumafortepresençaemMarrocosnãovaliaapena.Paraacoroa,apresençanaÍndiaeacolonizaçãodoBrasileramprioridades.Porisso,aolongodadéca-dade1540foramabandonadasaspraçasmaisdifíceisdedefenderemantidasapenasasmaisimportantes:ceuta,TângereMazagão.
d.Sebastião (1557-1578)voltariaa tentarumanovaexpansãoemMarrocos,massemsucesso.Ostemposeramoutrose,nabata-
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lhadeAlcácerQuibir(1578),oreidesapareceu,pondo,assim,fimàtentativa.
As três praças restantes manter-se-iam em mãos portuguesasdurantemaisalgumtempo.em1640,aquandodaRestauraçãodaindependência, ceuta decidiu permanecer fiel aos reis Habsbur-go.Aindahojeéumacidadeespanhola.JáTângerfoientregueainglaterraem1662, comopartedodotedaprincesad.catarinadeBragança.Mazagão,aúltimafortaleza,foientregueaoreinodeMarrocosem1769.
As navegações atlânticas – do infante D. Henrique a D. João II
numaprimeira fase, asnavegaçõesportuguesas encontraram--se ligadas ao processo de expansão em Marrocos. O infanted. Henrique, principal responsável pelo primeiro momento dasnavegações,foi,logoem1416,encarregadodadefesadeceuta.Foiprecisamentedepoisdeiremaceuta,em1419,queJoãoGonçalvesZarco eTristãoVazTeixeira, escudeirosdo infanted.Henrique,avistaram,poracaso,ailhadePortoSanto.em1420,foiavezdeBartolomeuPerestreloavistarailhadaMadeira.
em1433,oPortoSantoeaMadeiraforamentreguespeloreid.duarteaoirmão,d.Henrique.noentanto,desde1425queaque-lasilhasjáestavamaserpovoadospelosdescobridoresoriginais.estasilhas,talcomoascanárias,jáeramconhecidaspelomenosdesde o século XiV, mas nunca antes tinham sido povoadas. Sóatravésdopovoamentoéqueforam,defacto,colocadassobasobe-raniadeumreino,nestecaso,Portugal.Apartirdadécadade1470,aMadeiratornou-seumimportantecentrodeproduçãodeaçúcar,naalturaumprodutomuitoraroevaliosonaeuropa.
OsAçoresforamdescobertosmaistarde.Asprimeirasilhaste-rãosidoavistadaspordiogodeSilvesem1427.Osesforçosdepo-voamentodasilhascomeçaramporvoltade1433.Tentou-se,desdecedo,ocultivodecereaisparaabastecimentodoreino.em1439,asseteilhasconhecidasforamentreguesaoinfanted.Henrique.Sóem1452foramdescobertasasduasilhasmaisocidentais,Florese
História de Portugal
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corvo.OsAçores,aocontráriodaMadeira,foram,defacto,desco-bertospelaprimeiravezpelosPortuguesesnoséculoXV.
As ilhascanárias (jávisitadasnoreinadoded.AfonsoiV,noséculoXiV)foramalvodeumadisputaentrePortugalecastelaaolongodoséculoXV.Oinfanted.Henriqueenviouváriasarmadasaoarquipélago,entre1424e1456,massemnuncaterconseguidotomarpossedealgumadasilhas.Apartirde1479,Portugaldesis-tiriadapossedascanárias.
Ao mesmo tempo que decorria a expansão em Marrocos e opovoamentodasprimeirasilhasatlânticas,osPortuguesescome-çaramtambémaexploraracostaocidentalafricana.Ainiciativacoubeaoinfanted.Henrique,emborasemprecomoapoiodorei.Sãováriasasrazõesparaoiníciodestasnavegações:acuriosidadedoinfanteemdescobrirnovasterras;odesejodeencontraralia-doscristãosafricanoscomquempudesseestabelecercomérciooualiançasparacombaterosmuçulmanosdeMarrocos;ouaindaavontadedeexpandirafécristã.
OprimeiroobjetivodasnavegaçõesfoiultrapassarocaboBoja-dor,ondesesituavaafronteiradomundoconhecido.AsprimeirasviagensaolongodacostaocidentaldeÁfricaocorreramnadéca-dade1420,massóem1434ocaboBojadorfoiultrapassadope-lasembarcaçõescomandadasporGileanes,escudeirodoinfanted.Henrique.
AescoladeSagresnuncaexistiu.Oinfanted.Henriquenuncafundouumaescoladeformaçãodenavegadores.AescoladeSa-gres é um dos mitos mais duradouros da História portuguesa.essefactonãotiraimportânciaàfiguradoinfantenoqueconcer-neaosdescobrimentos.d.Henriquefoiumhomemquesoubeconvencerosservidoresaaventurarem-sepormaresdesconheci-dos,equejulgavamestarcheiosdemonstros,oqueacabouporresultarnadescobertadenovasterras,povoseprodutosaolongodacostaocidentalafricanaenoOceanoAtlântico.
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nos anos seguintes, as navegações prosseguiram rumo a sul,emdireçãoàMauritânia.em1441,trouxeram-separaPortugalasprimeirasaquisiçõescomerciaisoriundasdaquelaregião:cercade100escravos,algumouroeovosdeavestruz,umprodutoexóticonuncaantesvisto.TambémnaMauritâniafoiestabelecida,noiní-ciodadécadade1440,aprimeirafeitoriaportuguesa,nailhadeArguim,quetinhacomofunçãonegociarcomosnativos.Asnave-gaçõeseramcadavezmaisrentáveise,porisso,nãotardouatéoinfantesentirnecessidadedeguardaromonopóliodanavegaçãoalém Bojador para si próprio. esse direito foi-lhe concedido em1443peloregented.Pedro,seuirmão,quegovernavaoreinoemnomedopequenorei,d.AfonsoV(1438-1481).
Curiosidade: emboraaHistóriarecordeoinfanted.HenriquecomoO Navegador,elenuncafeznenhumaviagemdedesco-berta,masfoiumdosprincipaisresponsáveispeloiníciodestaepopeia.defacto,andoumuitopoucasvezesdebarco,esempreemdireçãoaMarrocos:em1415,1419e1437paraceutaeem1458emdireçãoaAlcácerceguer.
em1444,chegaramosprimeirosnaviosàcostadaGuiné.Atéàmortedoinfante,em1460,asnavegaçõesaindaavançariamatéàcostadaSerraLeoa.Porvoltade1456,descobriramasprimeirasilhasdecaboVerde:Boavista,Santiago,MaioeSal.Osprimeirospovoadoreschegariamaoarquipélagoquandooinfanteaindaeravivo.Asrestantesilhasseriamdescobertasnadécadade1460.
comamortedo infanted.Henrique,em1460,acoroarecla-mouparasiomonopóliodanavegaçãoecomércioalémdocaboBojador.d.AfonsoV(1438-1481)aproveitouaoportunidadeparadarcontinuidadeaotrabalhodoinfantee,entre1468e1474,ar-rendouocomérciodaGuinéaFernãoGomes,escudeiroemerca-dor lisboeta. em troca, Fernão Gomes era obrigado a explorar acostaafricana.Foiassimque, em1471, foi alcançadaa costadoouro,situadanaregiãodoatualGana.
Foinestacostaque,em1481,jáduranteoreinadoded.Joãoii(1481-1495),seconstruiuafortalezadeSãoJorgedaMina.Apartir
História de Portugal
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de então, começaram a rumar ao reino grandes quantidades deouroprovenientesdaquelaregião.duranteestereinado,prossegui-ramasexploraçõesrumoasule,em1488,BartolomeudiasdobrouocabodaBoaesperança,demonstrando,destaforma,queÁfricaeraumcontinentesituadoentredoisoceanos.em1491,dá-seiní-cioàmissionaçãocristãnoreinodocongo,entretantodescoberto.
O Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494 entre Portugal ecastela,foioresultadodenegociaçõesquedurarammaisdeumano.nofinal,ficouestabelecidaadivisãodomundoentrePortugalecastela.Alinhadivisóriaeraummeridianoimaginário,situado370léguasaocidentedecaboVerde.APortugalcaberiamaster-ras aorientedestemeridiano, enquantoquecastelaficaria comasregiõesaocidente.estetratadosurgiupoucodepoisdoregres-sodecolombodascaraíbas–depoisdasuaprimeiraviagemde1492-1493–quetinhademonstradoserpossívelalcançarterrasaOcidente.Aindaassim,nãoera,comocolombopensava,oJapão,massimumnovocontinente:asAméricas.
Os descobrimentos portugueses do século XV tiveram antece-dentes medievais no século XiV. O infante d. Henrique foi oresponsávelpelaprimeirafase,sempreapoiadopelosváriosreisdePortugal.Quandomorreu,oseusobrinho,oreid.AfonsoV(1438-1481),tomouocontrolodoprocessoedepoispassou-oaoprópriofilho,oreid.Joãoii(1481-1495).nadécadade1420ini-ciou-seaexploraçãodacostaocidentalafricana,eestasóficouterminadaem1488,quandoseultrapassouocabodaBoaespe-rança,naatualÁfricadoSul.
A “era Dourada” de D. Manuel I
Assim que subiu ao trono, em 1495, d. Manuel i (1495-1521)teveocuidadodedarcontinuidadeàspolíticasexpansionistasdosantecessores. Assim, em 1497 enviou uma armada, capitaneadaporVascodaGama,paraosuldeÁfricacomoobjetivodecontor-
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narocabodaBoaesperançaetentaralcançaraÍndia.depoisdeváriasparagensaolongodacostaorientalafricana,aarmadadeVascodaGamaalcançouaÍndia,em1498.AviagemderegressoaPortugalfoiiniciadapoucodepois,masapenasficouconcluídaem1499.TinhasidodescobertoocaminhomarítimoparaaÍndia.
QuandoVascodaGamaregressoudasuaprimeiraviagemàÍn-dia,vinhaconvencidodequetinhaencontradocristãos.naver-dade,tudosetratoudeumaconfusão.Oscristãosmaisnãoeramdoquehindus!Asestátuasqueoshinduserguiamaosseusdeu-seseramvistaspelosPortuguesescomosendoimagensdesan-tos.SóquandoPedroÁlvarescabralchegouàÍndia,em1500,équecompreendeuoequívoco.HaviacristãosnaÍndianoséculoXVi,maseramumaminoriareligiosaenãotãopoderososcomoosPortuguesesesperavam.
Parad.Manueli,tornou-seessencialestabelecerbasesdeapoionaÍndia.cedocomeçaramaserenviadasarmadasanuaisquese-guiamarotadocabodaBoaesperançaatéentraremnoÍndico.em1505,d.Manueliescolheud.FranciscodeAlmeidacomoprimei-rovice-reidaÍndiaportuguesa,dandoassiminícioàfundaçãodoestadodaÍndia.
Oprimeirovice-reifoisucedidoporumgovernador,AfonsodeAlbuquerque, que desfrutou dos mesmos poderes. Albuquerqueaproveitoupara,entre1509e1515,estenderocontroloportuguêsaváriasáreasdoÍndico:conquistouGoa,naÍndia(1510),Malaca,nainsulíndia(1511)eOrmuz,noGolfoPérsico(1515).
Curiosidade: noseuauge,aolongodoséculoXVi,oestadodaÍndiaabarcavatodososterritóriossobinfluênciaportuguesadoOriente.estesterritóriosencontravam-seespalhadosumpoucoportodooÍndicoePacífico,eiamdesdeosterritóriosdeMoçambiqueatéMacaueàsfeitoriasdoJapão,passandopelascidadesdeGoaecochim,naÍndia.
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A Índia começou,desde cedo, a revelar as suas riquezas, e osnaviosportugueseseramenviadosparaaeuropacarregadosdees-peciarias.Porissomesmo,aÍndiafoi,apardeMarrocos,umaáreadeintervençãotãoimportantenoreinadoded.Manueli.
OBrasil,poroutrolado,foiachado–esteéotermopreferidodoshistoriadores–em1500.PedroÁlvarescabral foinomeadocapitãodasegundaarmadadaÍndia,em1500.noentanto,antesdeseguirparaaÍndia,aarmadafezumdesvioparaocidenteeaca-bouporchegaraoBrasil.SódepoisaarmadaprosseguiuaviagemparaaÍndia,excetoumdosnavios,quefoienviadoaLisboaparadaranotíciaaorei.duranteoreinadoded.Manueli,oBrasilper-maneceu praticamente intocado. existiram algumas exploraçõescomerciais,comoaextraçãodepau-brasil,massónoreinadoded.Joãoiii(1521-1557)seriapovoadoporportugueses.
o reino de Portugal em tempos de D. João II e D. Manuel I
Osreinadosded.Joãoii(1481-1495)ed.Manueli(1495-1521)nãoseresumiramapenasaosavançoserecuosdaexpansãoportu-guesa.internamente,ambostomaramdecisõesdegrandeimpor-tânciaparaoreino.
d. Joãoiipreocupou-separticularmentecomofortalecimentodo poder da coroa. Logo no início do reinado, em 1482, reuniuascorteseobrigoutodaanobrezadoreinoaprestar-lhehomena-gempelosbenseterrasdacoroaquepossuíam.desagradadacomaatitudedo rei,partedanobrezadecidiuassassiná-lo.em1483e 1484 tiveram lugar duas conspirações que procuraram matard.Joãoii.Ambasfalharameosseuscabecilhas(oduquedeBra-gançaeoduquedeViseu)acabaramporsermortos.
Omaiorproblemapolíticodoreinadoded.Joãoiifoiasuces-são.Oúnicofilholegítimo,oprínciped.Afonso,faleceunumaci-dente,em1491.Oreiaindatentou,semsucesso,legitimarofilhobastardo,d.Jorge,parapoderdeixar-lheotrono.Quandofaleceu,em1495,d.Joãoiiacaboupordeixarotronoaoprimo,d.Manuel,duquedeBeja.
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Assimquesubiuaotrono,d.Manuelipreocupou-seemgarantiraprópriasucessão.Para isso, casou, logoem1497,comd. isabel,princesacastelhanaeviúvadoprínciped.Afonso.OconsentimentodosreisdecastelaeAragãoparaocasamentoapenasfoiconsegui-doapósd.ManuelprometerexpulsardePortugaltodososJudeus(omesmojátinhasidofeitoemcastelaeAragão,em1492).Assim,em1497,osJudeusportuguesesforamobrigadosaconverter-seaocristianismoou,casonãoaceitassem,aabandonaroreino.
d. Manuel acabaria por casar mais duas vezes: em 1500 comd. Maria, irmã da primeira mulher, de quem teve praticamentetodosos seusfilhos, incluindoos futuros reis,d. João iii (1521--1557)ed.Henriquei(1578-1580);em1518casoucomd.Leonor,sobrinhadassuasduasanterioresmulheres.
internamente,d.Manuelitambémsepreocupoucomoaumen-todopoderdacoroa.Aocontrárioded.Joãoii,procuroucontro-laranobrezaatravésdedádivaserecompensas,enãoatravésdaforçaedomedo.Mandourestaurar,desdelogo,acasadeBragança(extintadepoisdeoduquetertentadomatard.Joãoii)efezre-gressarosseusmembrosdoexílio.
d.Manuel ieasuaprimeiraesposa,d. isabel, tiveramapenasumfilho,d.MigueldaPaz,nascidoem1498.d. isabel faleceupoucotempoapósoparto,porisso,oseufilhoduranteosseuscurtosdoisanosdevida,foiherdeirodePortugal,decastelaedeAragão.issosignificavaqueaUniãoibérica–auniãodetodososreinosibéricossobumsórei–poderiaterocorridomuitoantesde1580,anoemqueFilipeiideespanhasetornoutambémreidePortugal.
Anívelexterno,tantod.Joãoiicomod.Manuelipreferirammanter-seforadosconflitoseuropeus.Ambosentendiamquenadahaviaaganharemcombaternaeuropa,equeeraforadelaqueseapresentavamasmelhoresoportunidadesdeexpansãoelucro.istoapesarded.Joãoiitermantido,adadaaltura,relaçõestensascomcastelaeAragão.
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economia e Sociedade
Fidalgos e aventureiros em África e no oriente
Aexpansãoalém-marconcediaaoreimaisterras,maioresrique-zaseummaiornúmerodecargos,civisoumilitares,quetinhamdeserocupados.Anobrezaeraaprincipalbeneficiadapelapolí-ticarégia,jáqueacabavaporreceberterras,riquezaseofíciosporserviracoroacomlealdade.
Ofactoéqueanobrezaesteveligadadesdeoinícioàexpansão.Todaanobrezaesteveaoladoded.Joãoinaconquistadeceuta,em1415.Boapartedanobreza,nosséculosXVeXVi,incluindoduques,marquesesecondes,serviuemMarrocos.Ospróprioscapi-tãesdasembarcaçõesdeexploraçãodacostaafricanaeramnobres,aindaquedecondiçãomaisbaixa(eramsobretudoescudeiros).
noOriente,muitosforamosaventureiros,algunsdelesnobres,queabandonaramoestadodaÍndiaparafazeremfortunaaoser-viçodeoutros senhores.Muitos juntaram-se, ao longodos sécu-losXVieXVii,areinosasiáticos,sendo,muitasvezes,recrutadoscomomercenáriosespecialistasnousodearmasdefogoecanhões.Alguns tornaram-se mesmo piratas, não reconhecendo qualquersenhor,maslutandoapenaspelariquezapessoal.
Aindaassim,foisempremaioronúmerodenobresqueajudouàconstruçãodoestadodaÍndiadoqueaquelesqueoabandona-ram. de Moçambique ao Japão, feitores e capitães de fortalezaseram,invariavelmente,nobres.
Oserviçoàcoroa,emMarrocosounaÍndia,eraquasesemprebenéficoparaafidalguia,poisosreistendiamarecompensarge-nerosamenteosservidores.UmexemplodissomesmoéVascodaGama.AoregressaraPortugal,depoisdaviagemáÍndia,em1499,foi-lheatribuídaadistinçãodedom.Maistarde,ojáentãod.VascodaGamaviriaaserelevadoacondedaVidigueira.
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Feitorias e fortalezas
AsfeitoriaseramosedifíciosondeosPortuguesesconduziamosnegóciosnasregiõesmaislucrativasdoestrangeiro.nadécadade1440,foiconstruídaumafeitorianailhadeArguim,nacostadaMauritânia,paracontrolarocomérciolocaldeouro.OmesmoprocessoviriaaserrepetidocentenasdevezesnoutrasregiõesdeÁfricaedoOriente.
Poroutrolado,afortalezaeraumaconstruçãomilitarerguidaemzonasestratégicasparaprotegerosinteressesdePortugal.estasedi-ficaçõesficavamsemprejuntoaomar,poiserapormarqueeramabastecidasdetudo,desdesoldadosatéalimentosearmas,umavezqueeracomumestaremsituadasemterritórioshostis.Foiprecisa-menteaexperiênciaobtidanadefesadefortalezasemMarrocosqueajudou,maistarde,àimplantaçãodosPortuguesesnaÍndia.
Acombinaçãodasfeitoriascomasfortalezasdeuorigemàsfei-torias-fortaleza:edifíciosqueserviamtantodebasemilitar,comodecentrodenegócios.Porvoltade1464,Arguimtornou-seumafeitoria-fortaleza,parapoderprotegerosinteressescomerciaispor-tuguesesnaregião.SãoJorgedaMinafoi,desdeasuaconstrução,em1481,desenhadacomoumafeitoria-fortaleza.OmesmoviriaaserfeitonaÍndia.
Todososcuidadoscomadefesanãoeramexagerados:afeitoriaportuguesaemcalecute foi atacadaedestruídaem1500,poucodepoisdetersidoestabelecida.Assim,nãoadmiraqueumpoucoportodooimpério,asfeitorias-fortalezafossemabasedapresençaportuguesanumaregião.
o comércio da costa ocidental africana – escravos, marfim e animais exóticos
Asprimeirasviagensaolongodacostaocidentalafricana,ocor-ridasnasdécadasde1420e1430,nãorevelaramnadadevaliosoparacomercializar.noentanto,apersistênciaacaboupordarfru-tos, à medida que as embarcações iam avançando para sul e asterrastornavam-semaisverdes.
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estas viagens começaram a tornar-se rentáveis por volta de1441.FoinesseanoquechegaramaPortugalosprimeirosescravos(cercade100).Apartirdeentão,tornou-secomumasembarcaçõesportuguesasatacaremaldeias costeirasnaMauritânia,GâmbiaeGuinéparaobteremescravos(homens,mulheresecrianças)quedepoisvendiamemPortugal.
Umpoucomaistarde,oscapitãesportuguesesperceberamqueeramaislucrativocomprarescravosàstribosafricanasdoquees-cravizá-losdiretamente.OsváriosreinosetribosasuldodesertodoSaharacombatiam-secomfrequência,peloquetinhamsempremuitos prisioneiros de guerra para venda, tanto a outros africa-noscomoaosPortugueses.OtráficodeescravosafricanosparaasAméricastornou-seumnegóciotãolucrativoquedurouatémea-dosdoséculoXiX,tendosidorealizadoporpraticamentetodasasnaçõesdaeuropaOcidental.
Outro produto que começou a entrar na europa durante esteperíodoforamosanimaisexóticos.Osprimeirosovosdeavestruzchegaram a Portugal em 1441. Seguiram-se outros animais, ou,pelomenos,produtosdeorigemanimal,comoomarfim.nadéca-dade1440,d.AfonsoV(1438-1481)ofereceuumcasaldeleõesaoduquedaBorgonha.
Masfoinoreinadoded.Manueli(1495-1521)quemaisanimaisexóticoschegaramaoreino:papagaiosdoBrasil, leõesdeÁfrica,elefantes e rinocerontesdaÁsia.Onúmerode animais exóticosquechegavaaoreinoeratãogrande,easuararidadeevalornares-tanteeuropatãoelevados,queoreichegouaoferecerumelefanteaoPapaLeãoX,em1514.
o comércio do oriente – especiarias
QuandoVascodaGamachegoupelaprimeiravezàÍndia,em1498,declarouqueosPortuguesesiamembuscadecristãosees-peciarias. na Índia, os cristãos eram poucos, mas as especiariasexistiamemgrandequantidade.
O gosto da europa pelas especiarias orientais vinha desde ostemposdoimpérioRomano.duranteaidadeMédia,foramsobre-
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tudoosárabesquefizeramdeintermediáriosentreoOrienteeoOcidentee,porisso,detinhamocontrolodocomérciodasespecia-rias.
namesmaalturaemqueosPortugueseschegaramàÍndia,asespeciarias eram trazidas para a europa pelos Venezianos, queascompravamemAlexandria,noegito.estaschegavamaoegitoatravésdascaravanasqueseguiamaRotadaSeda,quetinhaori-gemnachina.
OsPortuguesescompreenderam,desdecedo,queparacomprarespeciariasnaÍndiaprecisavamdepagaremouro.Masoouroera,emPortugal,umbemraro,peloquenãopodiaserenviadoparaaÍndia.Porisso,logonoiníciodoséculoXVi,oestadoPortuguêsdaÍndiatomouocontrolodeumasériederotascomerciaismarí-timasqueligavamaÍndiaaÁfrica.
ArotamaisimportanteeratriangulareligavaoGuzerate,umaregiãoaonortedaÍndia,aQuíloa,nacostaorientaldeÁfrica,eacochim,nacostaocidentaldaÍndia.OstecidosdoGuzerateeramutilizadosparaadquirirouronacostaafricanaeoouroeradepoisusadoparacomprarespeciariasemcidadesaliadasdosPortugue-ses, comocochim.Asespeciarias eramentãoenviadas emnauspelarotadocaboatéLisboa.
Boapartedasespeciariasera,depois,enviadaparaafeitoriapor-tuguesadeAntuérpia,naFlandres,deondeeradistribuídapelorestodaeuropa.estecomércioajudouaenriqueceracoroaportu-guesa,emparticularduranteoreinadoded.Manueli(1495-1521).nasprimeirasdécadasdoséculoXVi,chegaramtantasespeciariasaLisboaqueVeneza sentiu-seameaçadaeenviouembaixadasaPortugal.
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Cultura e Artes
o estilo Manuelino – o Mosteiro dos Jerónimos
Oreid.Manueli(1495-1521)decidiu,desdecedo,deixarasuamarcanoreino.Oestiloartísticodesenvolvidoduranteoseurei-nado,umgénerotardiodeGótico,ganhou,maistarde,onomedeManuelino.VáriosedifíciosespalhadosporPortugalmostramtra-çosdesteestilo,comoaTorredeBelémeoMosteirodosJerónimos,emLisboa,eoconventodecristo,emTomar.
Todos os edifícios que d. Manuel i mandava construir ou re-novaracabavamporincorporarosseussímbolospessoais,comoaesferaeasarmasdePortugal–quehojeemdiafazempartedabandeiradaRepúblicaPortuguesa–ouacruzdaOrdemdecris-to–parcialmenteutilizadapelaFederaçãoPortuguesadeFutebol.
Logoem1496,d.Manuelidecidiumandarconstruirummos-teiroemBelém,juntoaolocalondeoinfanted.Henrique,seutio--avô,tinhamandadoerguerumacapela.Asobrastiveraminícioem1501ou1502.OMosteirodenossaSenhoradeBelém,atualmenteconhecidocomoMosteirodosJerónimos,éumadasobrasmaisco-nhecidasdoestiloManuelino.Onomepeloqualomosteiroéhojeconhecidodeve-seaofactode,aindanoséculoXVi,tersidoentregueàordemreligiosadosmongesseguidoresdeSãoJerónimo.
d.Manueligostavatantodaobraquecostumavavisitarolocalduranteaconstruçãoe,poucoantesdemorrer,declarouqueque-riaserenterradolá.estefoioprimeiropassoparaqueoMosteirodosJerónimossetornasseopanteãorealduranteoséculoXVi.nomosteiro,juntoaumadasportas,existemduasfigurasquerepre-sentamoreid.Manuelearainhad.Maria,asuasegundaesposa.Todooedifícioincorporaoutroselementos,esculpidosnapedra,doestiloManuelino:gárgulas,sereias,cordasentrelaçadasouele-mentosvegetais,comofolhasdehera.
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OestiloManuelinofoitãoimportanteque,muitomaistarde,emmeadosdoséculoXiX,setentouintroduziralgumascaracterísti-casdesteestilonaarquitetura.AestaçãoferroviáriadoRossio,emLisboa,bemcomooMosteirodosJerónimos,sãobonsexemplosdaquiloqueganhouonomedeestiloneomanuelino.
A reorganização administrativa manuelina – adaptação da documentação medieval
comovimosnocapítuloanterior, ao longoda idadeMédia,amaioriados reispreocupou-seemaumentaropoderdacoroaeestendê-lo a todoo reino.Reis comod.Afonso ii (1211-1223) ed.dinis(1279-1325)passaramboapartedosreinadosatrabalharnosentidodetornaropoderdacoroa inquestionável.comovi-mosnocapítulodedicadoàidadeMédia,oprocessodeaumentodepoderdacoroadeuorigemamuitosmilharesdedocumentosescritos.
5.PinturadoMosteirodosJerónimos–séc.XViii,anterioraoterramoto.
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nafasefinaldaidadeMédia,osdocumentoselivrosqueperten-ciamaoreieramguardadosnumatorredocastelodeS.Jorge,emLisboa.eraachamadaTorredoTombo.Porisso,hojeemdia,oArquivonacionaldePortugal, emLisboa, chama-seTorredoTombo,emhomenagemaessaantigatorrequefuncionoucomoprimeiroarquivodacoroaportuguesa.
noiníciodoreinadoded.Manueli(1495-1521),oarquivodoreiencontrava-senumaprofundadesordem,oquetornavadifícilaconsultadedocumentos(algoqueoreiprecisavadefazerparato-marcertasdecisões).Assim,parafacilitaraconsulta,d.Manuelor-denouqueosdocumentosmaisimportantesfossemcopiadosparaumasériedelivrosnovos,quepassaramachamar-seLeitura Nova.
d.ManuelicriouaindaasOrdenações Manuelinas(semelhantesàsantigasOrdenações de D. DuarteeàsOrdenações Afonsinas),umasériedelivrosondeestavamescritasasleisdoreino,equeviajavamcomorei,deformaapoderemserconsultadosquandonecessário.
d.Manueliprocedeuaindaaumareformadosforaisque,noessencial,atualizoualgunspontosdasantigascartasdeforalme-dievaisdadasaosconcelhos.
Gil Vicente e as permanências medievais
AsociedadedoiníciodaidadeModerna,porvoltadofinaldoséculoXVeprincípiodoséculoXVi,eraaindaprofundamenteme-dieval.OsPortugueseseramainda,sobretudomedievais,talcomoacontecianorestodaeuropa,emboraemmenorescalaemalgu-mascidadesitalianas.
O teatro de Gil Vicente foi, em boa medida, uma demonstra-ção dessa sociedade medieval. As críticas que fez, por exemplo,à falta de piedade do clero e aos excessos da nobreza tinham ori-gensmedievais.GilVicente(c.1465-1536)foisobretudoumindiví-duoquesoubemanter-senasboasgraçasdosreis,umavezqueassuas peças foram muito apreciadas na corte durante o reinado ded.Manueli(1495-1521)epartedoreinadoded.Joãoiii(1521-1557).
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Váriasforamasocasiõesemqueestaspeçastinhamporobjetivoincitaracorteaapoiarapolíticadorei.exemplodissomesmofoiacriaçãoeexibiçãoemcortedoAuto da Exortação da Guerra,noqualGilVicentelouvavaapolíticadeguerraemMarrocoslevadaacabopeloreid.Manuel i.esteauto,comotambémoAuto da Barca do Inferno,tocavanaprofundareligiosidadedoshomensemulheresdaqueleperíodo.
renascimento e Humanismo
ORenascimentosurgiunaitáliadoséculoXVe,desdeoinício,representouavontadedealgunscontemporâneosemregressaraopassadoemváriasáreasdavida.OsgrandesartistasdoRenascimen-toitaliano,comoBotticellieMiguelÂngelo,embelezaramasmaispoderosasdascidades-estadodeitália,comoRomaouFlorença.
contudo, foi no século XVi que o Renascimento se espalhoupelaeuropaealcançouPortugal.istoapesardejáestarempresen-tesalguns traços renascentistasnoPortugaldo séculoXV, comomostraocontratofirmadoentred.Joãoii(1481-1495)ecataldoSículo,umitalianoqueserviudetutordoprínciped.Afonsoedofilhoilegítimo,d.Jorge.TambémogostopelalínguadosRomanos,oLatim,estavaacrescer,comoprovaodiscursodecataldo,porocasiãodocasamentodoprínciped.Afonso.
Foinoreinadoded.Joãoiii(1521-1557)queoRenascimentotevemaiorimpactoemPortugal.OdesejodeimitaraAntiguidadelevouàconstruçãodenovosedifícioscomumestilomaisitaliano.
OHumanismo surgiu ainda antesdoRenascimento,umavezque se consideraqueo seupai foio italianoFrancescoPetrarca(1304-1374). O Humanismo defendia que o Ser Humano, e nãodeus,deveriaserocentrodopensamentofilosófico;ogostopelaartegregaeromana;ointeressepelaeducaçãodoSerHumano(emparticulardas crianças); e,porfim,oestudodas línguasantigas(comooLatim,oGregoeoHebraico).
Écostumedizer-sequePortugalnãoteveHumanismo,massimhumanistas.Ouseja,nuncachegouahaverumacorrentecontínua,masapenascasosquase isoladosdehomens inteligentesecapa-
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zes,comodamiãodeGóis(1502-1574)ouFranciscoSádeMiran-da(1481-1558).AintroduçãodainquisiçãoemPortugal,ocorridaem1536,nãopermitiuocrescimentodeumacorrenteHumanista,umavezquealgunsdoselementosdoHumanismo–comoacolo-caçãodoSerHumanonocentrodoUniverso–eramvistoscomoheresia.
damiãodeGóis,emparticular,éconsideradoograndehuma-nistaportuguês.Fezdetudoumpouco,desdeservircomopajemnacorteaté serhistoriador.Viajoupor todaaeuropa, tantoemviagenscomerciaiscomoembuscadeconhecimento,efoiamigodeerasmodeRoterdão(1466-1536),umdosgrandeshumanistasdaqueletempoeumhomemqued.JoãoiiipensoucontratarparadaraulasnaUniversidadedecoimbra.Foiatéperseguidopelain-quisição,mascontousemprecomoapoioeproteçãoded.Joãoiii(1521-1557),dequemeraamigodeinfância.
Cronologia
Data Acontecimentos
1411 PazdeAyllonentrePortugalecastela.
1415 ceutaéconquistadapeloexércitoded.Joãoi.
1416 Agestãododinheiroparaadefesadeceutaéentregueaoinfanted.Henrique.
1418-1419 ceutaécercadapelosultãomuçulmanodeFez.
1419 JoãoGonçalvesZarcoeTristãoVazTeixeiraavistamailhadePortoSanto.
1420 BartolomeuPerestreloavistaailhadaMadeira.iníciodasnave-gaçõesaolongodacostaocidentaldeÁfrica.
1424 Primeiraexpediçãoenviadapeloinfanted.Henriqueàscanárias.
1425 iníciodopovoamentodaMadeira.
1427 diogodeSilvesavistaasprimeirasilhasdosAçores.
1433 ilhasdaMadeiraePortoSantoentreguesaoinfanted.Henrique.iníciodopovoamentodosAçores.
1434 GileanesnavegaalémdocaboBojador.
1437 desastredeTânger.infanted.Fernandoficacativo.
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1438 Mortedoreid.duarte.Subidaaotronoded.AfonsoV.
1439 OsAçoressãoentreguesaoinfanted.Henrique.
1439-1448 Regênciadoinfanted.Pedroemnomedojovemd.AfonsoV.
1441 chegada a Portugal dos primeiros escravos oriundos daMauritânia.
1443 Morreoinfanted.Fernandonocativeiro,emFez.Oinfanted.HenriquerecebeomonopóliodocomércioenavegaçãoaolongodacostaocidentalafricanaalémBojador
1452 descobertadasderradeirasilhasaçorianas,Floresecorvo.
1456 Últimaexpediçãoenviadapeloinfanted.Henriqueàscanárias.
1458 Alcácercegueréconquistadapeloexércitoded.AfonsoV.
1460 Mortedoinfanted.Henrique.
1468-1474 ArrendamentodocomércioeexploraçãodacostadaGuinéaFernãoGomes.
1471 Arzila é conquistada eTânger é ocupada pelo exército ded.AfonsoV.
1481 Morteded.AfonsoV.Subidaaotronoded.Joãoii.construçãodafeitoria-fortalezadeSãoJorgedaMina.
1483 Primeiraconspiraçãocontrad.Joãoii.execuçãododuquedeBragança.
1484 Segundaconspiraçãocontrad.Joãoii.MortedoduquedeViseu.
1488 BartolomeudiascontornaocabodaBoaesperança.
1489 Fracasso no estabelecimento da fortaleza da Graciosa, emMarrocos.
1490 casamentodoprínciped.Afonso,filhoded.Joãoii,comd.isa-beldecastela.
1491 Mortedoprínciped.Afonsoapósumaquedadocavalo.
1492 chegadadecristóvãocolomboàscaraíbas.
1494 AssinaturadoTratadodeTordesilhas.divisãodomundoentrePortugalecastela.
1495 Morteded.Joãoii.Subidaaotronoded.Manueli.
1497 casamentoded.Manuelcomd.isabeldecastela.ÉditodeexpulsãodosJudeus.
1497-1499 ViagemdeVascodaGamaàÍndia.
1498 nascimentodoprínciped.MigueldaPaz.
1500 casamentoded.Manuelicomd.Mariadecastela.AchamentodoBrasil.
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1501-1502 iníciodaconstruçãodoMosteirodosJerónimos,emBelém.
1505 d.FranciscodeAlmeidaénomeadocomoprimeirovice-reidaÍndia.criaçãodoestadoPortuguêsdaÍndia.
1508 conquistadeSafim,emMarrocos.
1509-1515 AfonsodeAlbuquerqueégovernadordoestadodaÍndia.
1510 conquistadeGoa,naÍndia.
1511 conquistadeMalaca,nainsulíndia.
1513 conquistadeAzamor,emMarrocos.
1514 construçãodafortalezadeMazagão,emMarrocos.
1515 conquistadeOrmuz,noGolfoPérsico.desastredeMamora,emMarrocos.
1518 casamentoded.Manuelicomd.Leonor.
1521 Morteded.Manueli.Subidaaotronoded.Joãoiii.
1541 PerdadafortalezadeSantacruzdocabodeGué,emMarrocos.AbandonodeSafimeAzamor.
1549-1550 AbandonodeAlcácerceguereArzila.
1578 BatalhadeAlcácerQuibir.desaparecimentoded.Sebastião.
1640 ceuta decide apoiar os Habsburgo durante a guerra daRestauração.
1662 Tângerécedida,juntamentecomBombaím,àcoroainglesa,comopartedodotedainfantad.catarina,casadacomoreicarlosiideinglaterra.
1769 Mazagãoé entreguepeloMarquêsdePombal ao reinodeMarrocos.
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IV
PortuGAl e AS CrISeS DA MoDernIDADe
(SÉCuloS XVI-XVII)
Política e Guerra
os desafios de meados do século XVI – D. João III, D. Sebastião e D. Henrique
Apolíticaseguidapord.Joãoiii(1521-1557)aolongodoseureinado foi, emboamedida,diferentedadesenvolvidapelopai,d.Manueli(1495-1521).d.Joãoiiifoiumreimaisrealistaecau-telosodoqueoprogenitor,porqueoreinocomeçavaadarsinaisdecrise,jáquesesucediamaspestes,osmausanosagrícolas(easconsequentesfomes)easdificuldadesfinanceirasdacoroa.
d.Joãoiiifoisempreapoiadoporgrandesfigurasqueoajuda-ramaconstruireaplicarasuapolítica,comoo1.ocondedacasta-nheira,o1.ocondedeVimioso,arainhad.catarinadeÁustria,oinfanted.Luíseocardeal-infanted.Henrique.
Oreifoiresponsávelporreformasadministrativas,comoacria-çãodenovassubdivisõesnascomarcasdoreino.Ascomarcaseramasunidadesadministrativasdeentão,ehojecorresponderiamaosdistritos.d.Joãoiiilevouaindaabomtermoasnegociaçõescomespanhasobreasdelimitaçõesdeváriasregiõesdefronteira,comooMinho.Oreifoiaindaresponsávelpelaelaboraçãodonumera-mentode1527-1532,oprimeirocensoportuguês,comoveremosmaisadiante.QuantoàsantigasOrdensMilitaresdeAvis,cristoeSantiago,d.Joãoiiiconseguiu,em1551,incorporá-lasnacoroa,aumentandoassimoseupoder.
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comoteremosoportunidadedevermaisàfrente,foinesterei-nadoqueainquisiçãoseinstalouemPortugal,oquedariaorigemaváriasmudançasnasociedade.Todasestasmedidas,donumera-mentoàinquisição,mostravamavontadedeoreiconheceroseupróprioreinoeemtorná-lomaisfácildegeriregovernar.
Anívelexterno,d.Joãoiiiprocuroumanterrelaçõespróximasdeamizadecomespanha.Paratal,casouainfantad.isabel,suairmã,comcarlosV,Sacro-imperadorRomano-Germânicoereideespa-nha.Oprópriod.Joãoiiicasoucomd.catarinadeÁustria,irmãdecarlosV.estesmatrimóniosenvolver-se-iamnaquestãodasMolu-cas,surgidapoucodepoisdasubidaded.Joãoiiiaotrono.
Acircum-navegaçãodoglobo(1519-1521),iniciadaporFernãodeMagalhãese terminadaporSebastiand’elcano, levouoses-panhóisachegaremàsMolucas,ilhasasiáticasasuldasFilipinaseanortedaAustrália,enaqueletempoaúnicafontemundialdecravo,umaespeciariavaliosa.Atualmente,sabe-sequeasilhases-tavam,deacordocomoTratadodeTordesilhas(1494),naáreadeinfluênciaportuguesa,mas,naqueleperíodo,nãoerapossívelter
6.OmaisantigomapadePortugal.Representaoreinoemmeadosdoséc.XVi.
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qualquercerteza.Porisso,iniciou-seumadisputadiplomáticaen-treosdoisreinosqueapenasterminouem1529,comoreconheci-mentoespanholdodireitoportuguêsàsilhas“deMaluco”,onomepeloqualeramentãoconhecidas.
Curiosidade: conformed.Joãoiiienvelhecia,maiorsetornavaainfluênciaexercidapelasuaesposa,arainhad.catarinadeÁustriaouHabsburgo.Opoderdarainhaeravistopelosoutrosconselhei-rosdoreicomoumaafronta,nãosóporsermulher,mastambémestrangeira.
no que se refere ao império, neste reinado assistiu-se ao iní-ciodacolonizaçãodoBrasil,aoabandonodeboapartedaspraçasmarroquinas,àsprimeirastentativasdecolonizaçãodeAngolaeàexpansãodoestadodaÍndianoOriente.
emmeadosdoséculoXVi,aFrançacomeçouatentarpovoarcertasregiõesdoBrasil.Portugal,queconsideravaaregiãoterritó-rioportuguês,nãoopodiapermitir.UmBrasilfrancêsseriaumagraveameaçaparaanavegaçãoportuguesanoAtlântico(jáentãoalvodapiratariafrancesa).Porisso,entre1532e1535,d.JoãoiiicriouasprimeirascapitaniasdoBrasil.noentanto,este sistemafracassou,muitoporculpadoscapitães-donatáriosquenãopovoa-vamedefendiamaregião,comotinhamacordado.
Assimsendo,em1549,d.Joãoiiicriouogoverno-geraldoBra-sil,tendonomeadoTomédeSousaparaprimeirogovernador.Sobumsógovernador,oBrasilfoicapazdeexpulsarosFranceses.nãotardaria a tornar-se a região mais importante do império portu-guês, em termoseconómicos, comoveremosnaáreadedicadaàeconomiaeSociedade.
noOriente,oestadodaÍndiafaziaavançosemváriasfrentes.emtornodeGoa,acapitaldoestadodaÍndia,ocontroloportu-guêsestendeu-seàsprovínciasdeBardezeSalcete.Maisanorte,foiconstruídaafortalezadediuque,em1538e1546,foidefendi-dadedoisgrandescercos.Governadoresevice-reiscapazes,comod.nunodacunhaed.Joãodecastro,contribuíramparaaexpan-
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sãodoestadodaÍndia.em1543,osprimeirosPortuguesesche-garamaoJapãoe,ao longodosanosseguintes,estabeleceram-serelaçõescomerciaiscomaquelaregião.
duranteoreinadoded.Joãoiii,acoroaviu-seforçadaasupor-tarcrescentescustosfinanceiros.AorganizaçãodearmadasparaaÍndiaeradispendiosa,eosproveitoseconómicoscadavezmeno-res.OpovoamentodoBrasileramuitocaro,bemcomoosnaviosarmadosparaenfrentarospiratasfranceses.Foifaceaestasdifi-culdades económicas que, conforme vimos no capítulo anterior,acoroadecidiuabandonarboapartedaspraçasmarroquinasaolongodadécadade1540.
nofinaldoreinado,d.Joãoiiienfrentoudificuldadessucessó-rias.Aolongodavida,oreiviumorrerem10filhos(novelegítimoseumbastardo)enovedos11irmãos,naquiloquesetornouumdramaparaocasalrealeparaoreino.Quandod.Joãoiiifaleceu,em1557,otronofoideixadoaoneto,d.Sebastião,entãocomape-nastrêsanosdeidade.
d.Sebastião(1557-1578)foifilhopóstumodoinfanted.João,fi-lhoded.Joãoiiieded.catarinadeÁustria,eded.Joana,filhadecarlosVeded.isabeldePortugal.d.Sebastiãonasceuem1554,cercadeduassemanasdepoisdamortedopai.
Oinfanted.João,paided.Sebastião,faleceuaos16anosdeida-de.naaltura,apontou-secomocausadamorteoexcessodeamordopríncipepelaprincesa!Atualmente,sabemosqueopríncipesofriadeumaformadediabetesjuvenis,equefoiessaacausadasuamorte.
Ainda antes de nascer, o jovem príncipe já era visto como aúnicaesperançadePortugalsemanterindependentedeespanha.d.Maria,filhaded.Joãoiii,tinhacasadoanosantescomd.Filipe,filhodo imperadorcarlosV.dessecasamentotinhanascidoumfilho,d.carlos,sendoqueamãe,d.Maria,falecerapoucodepois.
Assim,sed.Sebastiãotivessefalecidoaonasceroupoucode-pois – algo muito comum na altura –, o trono recairia sobre
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d.carlos,umavezqueeraoúnicooutroneto–eaindaparamaishomem–ded.Joãoiii.
duranteamenoridadeded.Sebastião,oreinofoigerido,entre1557e1562,pelarainhad.catarinaque,pelosseuslaçosfamilia-res,mantinharelaçõesmuitopróximascomespanha.entre1562e1568,ogovernodoreinofoiexercidopelocardeald.Henrique,umhomem que privilegiava sobretudo os assuntos internos. Só em1568,aos14anos,d.Sebastiãoassumiuogoverno.durantemuitotempo,ocasamentoded.Sebastiãofoinegociadonaeuropa,masoreiacaboupornuncacasar.
d.Sebastiãodemonstrou,desdecedo,interessepelavidamilitar.Porisso,organizouascompanhiasdeOrdenanças–unidadesmili-tares–deformainovadora,eprestougrandeatençãoàdefesadaspraçasmarroquinas.
duranteoseureinado,oestadodaÍndiaenfrentouumagravecrisepolítico-militar,entre1565e1575,que,noentanto,conseguiuultra-passarcomsucesso.em1557,osPortuguesesconseguiram,porfim,autorizaçãodogovernodachinaparaseestabelecerememMacau.nosanosseguintes,acidadetornou-seumimportantepontodecon-tactonocomérciocomachinaeoJapão.Foitambémnoreinadoded.SebastiãoquesefundouacidadedeLuanda(1576),emAngola.
em 1578, d. Sebastião comandou pessoalmente um exérci-to numa expedição ao norte de África. Marrocos encontrava-seameiodeumaguerracivil, eumdos ladospediuauxílioaoreiportuguês, em troca da entrega de algumas praças.A expediçãoportuguesaacabouporserderrotadanabatalhadeAlcácerQuibir,em1578,ed.Sebastiãodesapareceu,sendodadocomopresumi-velmentemorto.
Curiosidade: duranteosanosqueseseguiramaodesaparecimentoded.Sebastião,surgiramváriosimpostoresquejuravamseroreiportu-guês.Todosforamdesacreditadosepresos.noentanto,tambémelesajudaramaocrescimentodalendaded.Sebastião,quehojefazpartedamemóriaculturaldosPortugueses,equedizqueoreiregressaránumamanhãdenevoeiroparasalvaroPaísdetodososproblemas.
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Odesaparecimentoded.Sebastião,semdeixardescendência,le-vou ao trono o seu familiar vivo mais próximo, o cardeal-infanted.Henrique,seutio-avô.d.Henrique(1578-1580)nasceuem1512,filhoded.Manueli(1495-1521).Aolongodoreinadoded.Joãoiii(1521-1557),seuirmão,foiumdosseusconselheirosmaispróximos,tendosidoarcebispodeÉvora,arcebispodeLisboa,etendomesmochegadoadesempenharasfunçõesdeinquisidor-geraldoreino.
Aprincipalquestãodoseureinadofoiasucessãodacoroapor-tuguesa.d.Henriqueeraumclérigo,aindaparamaiscomaavan-çadaidadede66anos,peloquetinhadepedirdispensaaoPapaparapodercasareproduzirherdeiros.devidoàspressõesdiplomá-ticasexercidaspord.Filipeiideespanha,oPapanuncaconcedeua desejada dispensa.Ao rei de espanha interessava, por ser umpretendente ao trono português, que o cardeal-rei falecesse semgerardescendência,comoviriaaacontecer.
d.Henriqueconvocouascortes,em1579e1580,paradecidirquem lhe sucederia no trono. Por não ter um herdeiro direto, ocardeal-reiprocuravanodireitoasoluçãoparaacrise.Ospreten-dentesmaisimportantesaotronoeramd.Filipeii,reideespanhaenetoded.Manueli,ed.catarina,duquesadeBragançaetam-bémnetaded.Manueli.Umoutrocandidato,d.António,priordocrato,tambémeranetodoreid.Manuel,emboraporviailegítima.
d.Henriqueacabouporfalecerem1580,semseteralcançadoumcompromisso,oquegerouumacrisedesucessão.
o Portugal dos Habsburgo ou dos Filipes (1580-1640)
Amortedocardeal-reiprecipitouosacontecimentos.d.António,priordocrato,tentou,numprimeiromomento,anegociaçãocomd.Filipeii.Pediuad.Filipeii,seuprimo,queofizessegoverna-dorperpétuodoreinodePortugal,oqueoreideespanharejeitou.Faceàrecusa,d.AntónioreuniuosseusapoiantesemSantarémeaífez-seaclamarrei,sem,noentanto,chegarasercoroado.entre-tanto,deBadajozpartiaumexércitoedeSevilhaumaarmada.OalvoeraLisboa,poisaconquistadaquelacidadecolocariaPortugal
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nasmãosded.Filipe ii.Por seu turno,d.catarina,duquesadeBragança,preferiuchegaraacordocomoreideespanha,pornãoterapoiossuficientesparalheresistir.
na batalha de Alcântara, ocorrida nesse tão frenético ano de1580,asforçasespanholasvenceramopequenoexércitoded.An-tónioeobrigaram-noafugirparaosAçores.Oarquipélagoresisti-riaaosataquesespanhóisaté1582.Opriordocratoviriaainvadiroreinomaistarde,em1589,comapoiomilitaringlês.essatentati-vafracassoued.Antónioveioafalecernoexílio,em1595.
Anosmaistarde,dir-se-áqued.FilipeiiobteveotronodePor-tugaldetrêsformasdistintas:herdando-o,conquistando-oecom-prando-o. d. Filipe ii era, de facto, um descendente legítimo doreid.Manueli(1495-1521),porserfilhodainfantad.isabel.Poroutro lado, a invasão de Portugal, em 1580, garantiu o controlomilitardoreino.Porfim,nascortesdeTomarde1581,d.Filipeiiiriagarantiroapoiodeboapartedanobrezaaoverdadeiramente“comprar” apoios comaentrega–oupromessadeentrega–detítulos,terrasedinheiro.
OchamadoPactoouestatutodeTomar,saídodascortesde1581,acabou por consagrar a autonomia de Portugal no seio da Mo-narquiaHispânicadosHabsburgo.Alémdeespanha,d.FilipeiicontrolavaoreinodenápoleseaSicília,oducadodeMilão,aFlan-dres,emuitosoutrosterritóriosespalhadospelomundo,emparti-cularnasAméricas,mastambémnaÁsia.comoPactodeTomar,nobreza,cleroeconcelhosconseguiramparaPortugalumestatutoespecialdereinoherdado,ouseja,sujeitoaumgovernodiferentedodeumreinoconquistado.
Assim,quandooreiestivesseausente,Portugalsódeveriasergovernado por um vice-rei de sangue real ou, não havendo um,porumconselhoescolhidopelomonarca,mascompostoapenasporportugueses.Paraoajudaragovernaronovoreino,d.Filipeiicriou,em1582,oconselhodePortugal,umórgãoadministrativoqueauxiliavaoreinosassuntosdePortugal.Tambémesteórgãodeveriaapenassergeridoporportugueses.
d.Filipei,porseroprimeiroreidessenomeemPortugal,per-maneceuemLisboaaté1583, anoemquepartiuparaespanha,parahabitarnoelescorial,emMadrid.
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d.FilipeiideespanhafoioprimeiroreiaconseguirunirtodaaPenínsulaibérica.AUniãoibéricaeraumsonhomuitoantigo,deorigemmedieval,quereistãodistintoscomod.Juanidecastela,quecombateucontrad.Joãoi(1385-1433),ed.AfonsoVdePor-tugal(1438-1481)tinhamacalentado.PortugaleoimpérioPortu-guêsnoBrasil,emÁfricaenoOrientepassaramaintegraroim-périodosHabsburgo,sendoquejáentãod.Filipeiierasenhor,comoentãosedizia,deumimpérioondeoSolnuncasepunha.
OPactodeTomarnãofoi,noentanto,totalmenterespeitadopord.Filipei.contrariamenteaoestabelecido,oreiordenouqueemPortugalpermanecessemtropasespanholas,oquedeixouosPortu-guesesdescontentes.Maistarde,aperdademuitosdosnaviospor-tuguesesqueintegravamaInvencível Armada,em1588,tambémconstituiuumfocodedescontentamentoportuguês.
AInvencível Armadafoicriadapord.FilipeiideespanhaeidePortugalparaconquistarainglaterra.Oreivianainglaterrapro-testante,governadaporisabeli,umgraveperigoparaaeuropacatólica.AarmadaacabouporserderrotadapelaarmadainglesanocanaldaMancha,em1588,istodepoisdetersofridoperdasnumafortetempestade.
d.Filipeifaleceuem1598,deixandooseuvastoimpérioaofi-lho,tambémchamadoFilipe.FilipeiiideespanhaeiidePortugal(1598-1621)foiummonarcamaisapagadodoqueopai.Boapartedo reinado foidominadopelo seufidalgopreferido,oduquedeLerma.
d.FilipeiinãofoicapazdeencontrarparaPortugalumasoluçãodegovernoqueagradasseàmaioriadosPortugueses.OPaíserage-ridodeformapróximaporconselhoscompostospornobresportu-gueses,queestavamempermanentecontactocomorei,atravésdoconselhodePortugal,criadopord.FilipeiesediadoemMadrid.noentanto,oreiestavademasiadolongeparapoderatender,de
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formarápidaeeficaz,aosproblemasqueiamsurgindoemPortu-gale,sobretudo,noBrasil,noOrienteouemÁfrica.
de forma a ter o rei mais próximo e, assim, mais acessível, acâmaraMunicipaldeLisboaprocuroufazerdacidadeacapitaldaMonarquiaHispânica.Paratal,convidoud.Filipeiiavisitá-laeainstalar-se.Oconvitefoiaceitee,em1619,d.Filipeiidirigiu-seaLisboa,comofizerad.Filipei.noentanto,apenassemantevenacidadealgunsmeses–aocontráriodostrêsanosqueopaiperma-necera–efrustrouasideiasdomunicípio.
duranteavisita,chegaramareunir-seascortes,onded.FilipeiiouviuasinúmerasqueixasdosPortugueses.Porém,nãorespondeuàmaioriaenãotardouapartirdevoltaaespanha.Odescontenta-mentonoreinoaumentouemconsequênciadessaatitude.
noentanto,eapesardasqueixasdosPortugueses,aUniãoibé-ricatrouxecertasvantagensaPortugal.Porumlado,permitiuqueosmercadoresportuguesespassassemanegociartambémnaAmé-ricaespanhola,designadamentenoPeruenaArgentina.doPeru,emparticular,começouasertrazidaprata,metalpreciosoquenãoexistiaemPortugal.FoitambémnesteperíododeuniãodinásticaqueosPortuguesessetornaramnosmaioresfornecedoresdees-cravosafricanosdaAméricaespanhola.
d.Filipeiifaleceuinesperadamenteem1621.Oseufilhomaisve-lhosubiuaotronoenquantod.FilipeiVdeespanhaeiiidePortu-gal.Vivia-seentãoumperíododegrandeinstabilidadenaMonarquiaHispânica,frutodasmuitasguerrasemqueaquelaestavaenvolvida.
AolongodoséculoXVii,foicomumalgunsreisservirem-sedeumnobreseupreferidoqueagiacomoprimeiro-ministro.estesindiví-duosganharamonomedevalidos,porseremhomensdavalia–ouseja,daconfiança–dorei.Tantod.Filipeiicomod.FilipeiiidePortugaltiveramvalidos,sendoaqueles,respetivamente,oduquedeLermaeoconde-duquedeOlivares.TambémemFrançaein-glaterraexistiramvalidos,bemcomonoPortugalpós-Restauração,onded.AfonsoVi(1656-1683)mantevecomovalidoocondedecasteloMelhor.
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Ogovernoded.Filipeiiifoimarcado,sobretudo,pelaliderançadoseunobrepreferidoevalido,oconde-duquedeOlivares,que,durantedécadas,controlouaformacomoaMonarquiaHispânicaeradirigida.
ApolíticadeOlivarestinhacomoobjetivoprincipalauniãoefe-tivade todososreinosqueconstituíamaMonarquiaHispânica.OlivarespretendiaquereinoscomoPortugaleAragãoseguissemoscostumespolíticoseculturaisdecastela.Quandotodososrei-nosfossemgovernadosporinstituiçõesiguais,entãopassariamaagircomoumsó,enãocomoumasériedeentidadescomcostu-meseleisprópriasque,porvezes,eramopostas.
Portugalera,então,governadopelosfiéisdeOlivares.Oconse-lhodePortugal,emMadrid,seguiaasordensdovalidodorei.emPortugal,MigueldeVasconceloseraoprincipalapoiantedapolíti-cadeOlivares.estehomemeraosecretáriodeestadodaduquesadeMântua,vice-rainhadePortugaldesde1634,oquesignificavaquetinhaplenospoderesparagovernaroreino.
emPortugal,talcomoemAragão,emesmocastela,aoposiçãoaOlivaresnãoparavadecrescer.BoapartedodescontentamentodosPortuguesesrelacionava-secomasderrotassofridasnoimpé-riocontraHolandeseseingleses,comoveremosnopróximosub-capítulo.
Tambémoexcessodetributaçãoprovocavagrandedescontenta-mentoemPortugal.Foiassimque,em1637,tiveramlugarmotinsantitributários–ouseja,contraosimpostos–umpoucoportodooreino,masparticularmentenaregiãodeÉvora.Osmotinsforamtãoviolentosqueobrigaramàintervençãodetropasportuguesaseespanholas.AsguerrasemqueaMonarquiaHispânicaestavaen-volvida–emparticularcontraFrança–eramcaraseobrigavamaolançamentodepesadosimpostos,comoorealdeágua,umimpostosobreoconsumodecarneepeixe.
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Curiosidade: AolongodoséculoXVii,tiveramlugarmotinsanti-tributáriosumpoucoportodaaeuropa.Osreisexigiamcadavezmaisdinheirodossúbditos,parapagarguerrascadavezmaisdis-pendiosas.naqueleperíodo,eradifícilqueumcamponêsdaBeiraoudoAlentejocompreendesse,porexemplo,quetinhadepagarimpostosparaqueoreipudessefazeraguerracontraosHolandesesnaBaía,noBrasil.Ocamponêsnuncatinhavistoorei,nãosabiaquemeramosHolandesesnemondeeraaBaíaou,sequer,oBrasil.Provavelmente,nuncatinhasequersaídodaaldeia.Assim,paraele,pagaressesimpostoseraconsideradoumacrueldadedesnecessáriae,portanto,preferiarevoltar-se.
em1640,astensõesnoseiodaMonarquiaHispânicaestavamaorubro.nãotardariaadar-searuturaemPortugal,comoveremosmaisadiante.
Portugaleespanhacoexistiramnumauniãodinásticaentre1580e1640.Auniãodinásticasignificavaqueosreinoseramgover-nadospelomesmorei.Porém,Portugalmanteveumaimportantedosedeautonomiaduranteboapartedotempo.
o Império Português (1580-1669) e a concorrência Francesa, Holandesa e Inglesa
AuniãodePortugalaoimpériodosHabsburgo,sobd.FilipeiideespanhaeidePortugal(1580-1598),deuorigemaumasériedeproblemasnoimpério.defacto,espanhadebatia-sejácompo-derososrivais,comoaFrança,ainglaterraeasProvínciasUnidas(atualHolanda).TomandocomodesculpaaintegraçãodePortugalnamonarquiaded.Filipei,osrivaisdeespanhaaproveitaramaoportunidadeparaatacaremváriasposiçõesportuguesasespalha-daspelomundo.
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OsprimeiroscontactosentrePortugueses,Holandeseseingle-sesnaÁsiaocorreramaindaemfinaisdoséculoXVi.noentanto,sóquandoosrivaiseuropeussealiaramapotênciaslocaiséqueconseguiramtersucessocontraoestadoPortuguêsdaÍndia.Foiassimque, em1622,Ormuz,noGolfoPérsico, caiuemmãosdeumaaliançaentre inglesesePersas.Oestadoda Índia,naquelaaltura,jánãoeratãopoderosocomoforaapenasalgumasdécadasantes,muitodevidoàadaptaçãodamarinhaportuguesadoÍndicoàtecnologiaetáticaslocais.
noBrasil,osFrancesesconquistaramoMaranhãoem1612,ten-tando,talcomotinhamfeitonoséculoXVi,criarumBrasilfran-cês.Porém,umavezmais,Portugalnãopermitiu,eoMaranhãofoitotalmentereconquistadoem1615.
OsprincipaisrivaisdosPortuguesesnoimpérioforammesmoosHolandeses–ouneerlandeses–origináriosdasProvínciasUni-dasdosPaísesBaixos.entre1598e1669,PortugaleasProvínciasUnidasenvolveram-senumaguerraque,durante70anos,foicom-batidanaAmérica,naÁsiaeemÁfrica.Aoestender-seatodoomundo,estaguerrapassouaserconsiderada,poralgunshistoria-dores,comoaprimeiraguerramundial.nemsequerofactodePor-tugalsetertornadoindependente,em1640,colocoufimàguerra.
AsProvínciasUnidasforamumarepúblicaprotestanteque,entre1568e1648,combateupelaindependênciacontraaMonarquiaHispânica.Oshabitantesdaquelepaís são, de forma incorreta,apelidadosdeHolandeses.naverdade,sãoneerlandeses,oquesignificaquesãonaturaisdosPaísesBaixos.AHolandaéapenasumadasProvínciasUnidas,enãoopaísinteiro.chamarHolan-desesaosneerlandeseséomesmoquechamaraosPortuguesesapenasalentejanosouminhotos.
em1602,asProvínciasUnidascriaramacompanhiadasÍndiasOrientais(VOc)e,apartirde1619,estabeleceram-seemBatávia,atualJacarta.estacompanhiatinhacomoprincipalobjetivoacap-turadepontosestratégicos,deformaapermitiralivrecirculação
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dos seus navios comerciais. Para tal, começaram a tentar captu-rarpossessõesportuguesas,comoMacau,atacadasemsucessoem1622.OestadodaÍndiaconseguiusobreviveraosavançosdaVOc,masnãosemsofrerperdase tornar-seaindamaisfrágil.Malacacaiuem1641,ailhadeceilãoem1658ecochimem1662.
MasfoinoAtlânticoqueaguerraentrePortugaleasProvínciasUnidasfoimaisimportante.OBrasileraentãoamaioremaisim-portantefontederiquezadePortugal,sobretudodevidoàelevadaproduçãodeaçúcar.essaeconomiaeraalimentadapelosescravosoriundosdacostaocidentaldeÁfricaque,chegadosaoBrasil,eramcolocadosatrabalharnasplantaçõesdecana-de-açúcar.
conhecedoradessasriquezasedaformacomoeramalcançadas,asProvínciasUnidasnãotardaramacomeçaraocuparpontoses-tratégicosdacostaocidentalafricanaeregiõesinteirasdoBrasil.em1612,instalaram-senacostadoOuro,atualGana,massóem1638conseguiramcapturarafortalezaportuguesadeS.Jorge,quefuncionavacomopontodeembarquedeescravosparaoBrasil.
em1621,asProvínciasUnidascriaramacompanhiadasÍndiasOcidentais(Wic).em1624,ocuparamaBaía,acapitaldoBrasilPortuguês. A cidade foi reconquistada nesse mesmo ano, mas aMonarquiaHispânicatevegravesdificuldadesemreunirumexér-cito eumaarmadaparao fazer.em1630, asProvínciasUnidasconquistaramPernambuco,umadasprincipaisregiõesdeprodu-çãodeaçúcardoBrasil.em1641,conquistaramaregiãodoMara-nhão,noBrasil,earegiãodeBenguela,emAngola.
entre1643e1654decorreuacontraofensivaportuguesa,con-duzida, sobretudo,porsenhoresdeengenhosdoBrasil.Portugalcontinental,emguerracontraaMonarquiaHispânica,poucaas-sistênciapodiaoferecer.Logoem1644,oMaranhãofoilibertado.AsvitóriasportuguesasnoBrasileemÁfricaforam-sesucedendo.em1648,AngolaeSãoToméforamrecuperadas.Recife,aúltimapossessãodasProvínciasUnidasnoBrasil,caiuem1654.
Apazfinalsófoiassinadaem1669.AsProvínciasUnidasreco-nheceramaPortugalapossedetodososterritóriosreconquistadosnoBrasileemÁfrica.Porém,Portugaltevedepagarumapesadaindemnização.
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Os principais rivais dos portugueses no império ao longo doséculoXViiforamosHolandesesouneerlandeses.durante70anos,entre1598e1669,osdoisPaísesestiveramemguerra.Hojeemdia,oshistoriadores reconhecemqueasProvínciasUnidasvenceramnaÁsia,PortugalvenceunoBrasilequeambosempa-taramemÁfrica.
Do Portugal da restauração à Guerra da Sucessão de espanha (1640-1706)
A1dedezembrode1640,umgrupodefidalgosenobrespor-tugueseslevouacaboumgolpepalacianoemLisboa.MigueldeVasconcelos, secretário de estado e homem forte da política deOlivaresemPortugal,foiassassinadoeprontamentedefenestrado,ouseja,atiradodeumajanela.Seguiu-seaaclamaçãododuquedeBragançaenquantoreid.JoãoiV(1640-1656).
contrariamenteaoquemuitasvezessediz,ogolpedo1.odede-zembrode1640nãofoilevadoacaboapenaspor40fidalgos,oscélebres40conjurados.Foiantesorganizadoelevadoacabopor71fidalgose36nobres,numtotalde107indivíduos.Todososqueparticiparamtinhammuitoaganharaoteremumreiportu-guês,aindaparamaisumqueelespróprioscolocassemnotrono.Porisso,nãotardouatéqueonovoreiosrecompensasse.
ARestauraçãofoimotivadaporumcrescentedescontentamen-todosPortuguesesfaceaogovernodosHabsburgoeàspolíticasdoconde-duquedeOlivares,ovalidodoreid.Filipeiii.Olivares,conformevimosantes,tinhaporobjetivoatransformaçãodaMo-narquiaHispânicanumsóreino,acabandocomasleiseinstitui-çõesprópriasdePortugal.
Anobrezaportuguesainsurgiu-secontraestapolítica,alegando,desdecedo,queviolavaoestabelecidonoPactodeTomarde1581,
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poiscolocavaemcausaoestatutodePortugalcomoreinoautóno-moediferente.Assim,ogolpede1dedezembrosurgiumaiscomoumarevoltacontraadestruiçãodasinstituiçõeseleisportuguesasdoquepropriamenteuma revoltanacionalista.naqueleperíodoaindanãohaviaumaclaranoçãodenacionalidade,efoitambémporissoquetantosfidalgosportuguesespermaneceramfiéisaosHabsburgo.
Anobrezateveaindaoutrasmotivaçõesparadarinícioaogolpedo1.ºdedezembrode1640:sentia-semal-amadaporumreidis-tante(quenãolheconcediaasriquezasquejulgavamerecer)enãoqueriacombatercontraarecém-revoltadacatalunha,conformeor-denadopord.Filipeiii.
Foi,portanto,odescontentamentodanobrezaquedeuorigemaogolpede1dedezembro.noentanto,nosmesesqueseseguiram,orestodoreinoedoimpério,comexceçãodeceuta,aclamaramd.JoãoiVcomorei.Apopulação,noseugeral,estavafartadospe-sadosimpostoseesperava,portanto,queaoterumreinovoemaispróximoacargafiscalaliviasse,oqueacaboupornãoacontecer.Pelocontrário,aguerraqueentãocomeçouobrigouaoaumentodeimpostos.
noentanto,ogolpedo1.ºdedezembronãopodiaterocorridoemmelhoraltura.d.FilipeiVdeespanha,eantigod.FilipeiiidePortugal,encontrava-seocupadoacombatercontraaFrança–comquemestavaemguerradesde1635–econtraoscatalães,queseti-nhamrevoltadonaprimaverade1640.Arevoltacatalã,quecontoucomumimportantíssimoapoiomilitarfrancês,terminouapenasem1656.Sónesseano,eapósvenceroscatalães, foipossívelad.FilipeiVvirarasuaatençãoparaarevoltaportuguesa,iniciada16longosanosantes!
entre1640e1656,foinecessárioorganizaroreinoeprepará-loparaaguerra.d.JoãoiViniciouoreinadocompromessasdeapoiofrancêsque,noentanto,nuncaseconcretizou.Logoem1641,fo-ramreunidasascortesparalegitimaropoderdonovoreieparaobterdinheiroparafazerfaceàsdespesas.Osimpostosaumenta-ramederam-semesmoalgunsmotins.Onovoreiviveumomentosdramáticosaolongodoseureinado,jáque,porváriasvezes(em1641,1643e1647),houveplanosparaoassassinar.
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Ainsegurançanoreinoaumentouaindamaisquandooherdeirodorei,oprínciped.Teodósio,faleceudedoença,aos19anos.Tor-nou-seentãoherdeirodotronooinfanted.Afonsoque,desdemuitopequeno,eraafligidoporproblemasdesaúdefísicosementais.
Curiosidade: FaceàsdificuldadesdaguerracontraaMonarquiaHispânica,d.JoãoiVdecidiurecorreràajudadivina.Paratal,coroounossaSenhoradaconceição,tornando-apadroeiradePortugal.Faceataldevoção,nenhumoutroreidePortugalvoltariaausaracoroa.
AprimeirafasedaguerradaRestauraçãoabarcoutodooreina-doded.JoãoiV(1640-1656).em1641,oexércitodaAndaluziacer-cou,semêxito,Olivençaeelvas.em1644,umexércitoportuguêssaiuvitoriosonabatalhadoMontijo,juntoaBadajoz.Avitória,noentanto,nãosignificougrandesganhospolíticos.
esteprimeiroperíodo,ondenãoforamcomunsasgrandesba-talhas,foicaracterizadopelasfrequentesescaramuçasqueocorre-ramnasregiõesdefronteira,comooAlentejo.Tornou-senormalaldeiasvizinhasdeambosos ladosdafronteiraatacarem-semu-tuamentepararoubargadoouferramentasagrícolas.
AprincipalarmadaMonarquiaHispânicaduranteosprimei-ros anos da guerra foi a diplomacia, e não a força dos canhões.defacto,d.FilipeiVconseguiuque,internacionalmente,Portugalpermanecessepraticamente isoladoe fosseexcluídode tratados.OPapa,emparticular, recusou-sea reconhecero reidePortugalenquantotalatéaofinaldaguerra(em1668).d.FilipeiVtentoutambémbloquearo comércioexternodePortugal,mascomumgraudesucessolimitado,poisingleseseFrancesesrompiamfre-quentementeobloqueio.
Ao longo do seu reinado, d. João iV viu-se confrontado comcrónicosproblemasderecolhadedinheiroerecrutamentodeho-mens.Porisso,nãopôdeenviarauxílioaoBrasilouaÁfrica,entãoatacadospelasProvínciasUnidas.estasdificuldadesmantiveram--seaolongodaguerraealémdela.d.JoãoiVacabouporfalecerem1656,numalturaemqueaguerracomeçavaatornar-semaisséria.
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d.AfonsoVi(1656-1683)subiuaotronoaos13anos,peloquenãopodia, legalmente,governar.Porisso,asuamãe,d.LuísadeGusmão, assumiu a regência e governou Portugal em nome dopríncipe.Maistarde,d.AfonsoViviriaademonstrarserumreipoucopreocupadocomogovernodoreinoe,decertomodo,poucocapazdeoexercer.Apesardetudo,foinoseureinadoqueaguerrasetornoumaisintensaedecisiva.
em 1659, Portugal venceu a batalha das Linhas de elvas con-traumexércitoespanholquecercavaaquelavilaalentejana.noentanto,foiapartirde1662e1663quesederamascampanhasdecisivas.Umexércitoespanholcomandadopord.JoãodeÁustriainvadiu o Alentejo em 1662. Apenas foi derrotado em 1663, naimportantebatalhadoAmeixial,juntoaestremoz.noanoseguin-te, um ataque de um outro exército espanhol a castelo Rodrigofracassou.Porfim,em1665,tevelugaraderradeiragrandebatalhadaguerra,abatalhadeMontesclaros,juntoaBorba,queterminoucomumavitóriaportuguesa.
Apazfoiassinadaem1668ePortugalfoi internacionalmentereconhecidocomoumreino independentedaMonarquiaHispâ-nica. A vitória portuguesa na guerra foi, na altura, uma grandesurpresa.nãoseesperavaqueumpequenoreinopudessealcançaravitóriacontraapoderosaMonarquiaHispânica.noentanto,Por-tugalnunca esteveverdadeiramente sozinho.Françamanteve-sedurantemuito tempoemguerra contraaMonarquiaHispânica,obrigando-a,assim,adesviarsoldadosque,noutrascircunstâncias,teriamsidousadosparacombaterosPortugueses.
Assim,aFrançaacabouporterumpapeldecisivonaguerra,des-delogopeloapoioàrevoltadacatalunha,emboranãotenhaauxi-liadoPortugaldeformadireta.Alémdisso,ocondedeSchomberg,umgeneralalemãoaoserviçodaFrança,foienviadoparaPortugalem1660efoiessencialnaorganizaçãodoexércitoportuguês.Aelesedeveramboapartedasvitóriasalcançadas.
noentanto,foiainglaterraquemaisajudaprestouaPortugal.desdeoiníciodaguerraquemercenáriosinglesescombatiamnasfileiras do exército português. Porém, em 1661, firmou-se umaaliançaentreosdoisreinos,atravésdocasamentoded.catarinadeBragança, irmãded.AfonsoVi, comcarlos iide inglaterra.
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Odotedaprincesaincluiu,alémdedinheiro,Bombaím,naÍndia,eTânger,emMarrocos.Oapoioinglêsviriaarevelar-sebastanteimportantenafasefinaldaguerra.
em1668,Portugal encontrava-se, pelaprimeira vez emquase30anos,empaz.noanoseguinte,conformevimosnosubcapítuloanterior,tambémaguerranoimpériocontraasProvínciasUnidaschegariaaofim.eraentãoalturadecomeçararecuperaroreino.
Aindaassim,mesmoenquantoaguerradecorria,nãocessaramasintrigaspalacianas.Oreinadoded.AfonsoVi(1656-1683)foimarcadodeformaparticularpelaintrigadecorte.Orei,dadasassuasdebilidadesmentais,erafacilmentecontroladopelosquelheerampróximos.Foiassimque,atravésdeumgolpepalaciano,afas-toud.LuísadeGusmãodaregência,em1662.OcondedecasteloMelhor, jáentãovalidodo jovemrei, foioprincipalresponsávelpelogolpe.Averdadeéquearegênciadarainhadeveriatertermi-nadoanosantes,masoreierapoucodadoaogoverno,preferindodivertir-secomamigos.
entre1662e1667,d.AfonsoVideixouoreinoentregueaogover-nodoseuvalido,ocondedecasteloMelhor.noentanto,aoposiçãoaoconde–eaoprópriorei–foicrescendo.em1667,estalouacriseecasteloMelhorfoiafastadopeloinfanted.Pedro,irmãodorei.Oinfanteera,desdehámuito,vistocomoosucessordoirmão,jáqued.AfonsoVi,apesardecasado,nãopareciacapazdeterfilhos.
OdesterrodecasteloMelhordacorteabriucaminhoaoafas-tamentodopróprioreie,em1668,d.AfonsoVifoiafastadodogovernodoreino.Ascortesreunidasnesseanooficializaramade-cisão.Oreieradeclarado incapazdegovernare,piorainda, im-potente.Oseucasamentocomd.MariaFranciscadeSabóia foianuladoed.Mariacasou-secomoinfanted.Pedro.Oinfantefoientãoescolhidocomoregentedoreinoemnomedorei,eassimpermaneceuatéàmorteded.AfonsoVi.
emborad.Pedroiitenhagovernadooreinodesde1668,sóassu-miuacoroaapósamortedoirmão.Foijád.Pedroque,enquantoregente,assinouapazcomaMonarquiaHispânica(1668)ecomasProvínciasUnidas(1669).Oseureinadocorrespondeuaumlongoperíododepazqueapenasfoiquebradoem1703,quandoPortugaltomoupartenaGuerradaSucessãodeespanha.
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no entanto, até à morte do rei d. Afonso Vi, o governo ded.Pedronuncaesteve totalmenteseguro.Porváriasvezessurgi-ramconspirações(em1672,porexemplo)paralibertaroreiecolo-cá-lodenovoàfrentedopoder.noentanto,d.AfonsoViacabariamesmoporfalecer,em1683,semserlibertado,permitindo,assim,qued.Pedroiisetornassereipordireitopróprio.
Aolongodoseugovernoenquantoregente,edepoisenquantorei,d.Pedroiiviu-seobrigadoaatenderàsvontadesdanobreza,poisforaelaque,emboamedida,ofizerarei.nesteaspeto,orei-nadoded.Pedroiifoisemelhanteaodoseupai,d.JoãoiV(1640--1656).nãosóoreidependiaporcompletodosváriosconselhosparatomardecisões–comooconselhodeestadoeoconselhodaGuerra–,comonuncadispôsdeumvalido.
encontradaapaz,d.Pedroiitentourevitalizaraeconomiadoreino.Ainiciativadecriarmanufaturasnoreinocoubeaocondedaericeira. Foi oprimeiro surto industrialdoPaís,masnão foiparticularmentelongo.AdependênciaexternadePortugalconti-nuariaaaumentaraolongodasdécadasseguintes.
Parafazerfaceàsdificuldadeseconómicasdoreino,eumavezqueoacessoàpratadaAméricaespanholaestavaagoravedado,d.PedroiiordenouoestabelecimentodeumacolóniajuntoaoriodaPrata,noatualUruguai.Assim,em1680,foifundadaacolóniadoSacramentoque,maistarde,viriaaserocentrodediscórdiasentrePortugaleespanha,portersidofundadamesmoemfrenteaBuenosAires,naArgentina.
OBrasilera,àépoca,vistocomooprincipalsustentodacoroa.Porisso,d.Pedroiitentouacautelarosinteressesportuguesesnaregiãoaonegociarnovostratadoscomerciaiscominglaterra,FrançaeProvínciasUnidas.OmaisconhecidofoioTratadodeMethuen,celebradocomainglaterraem1703,equesignificouumaumentodadependênciacomercialportuguesadaquelereino.
Oúltimograndeatodoreinadoded.PedroiifoiaparticipaçãonaGuerradeSucessãodeespanha(1702-1713),umconflitoqueteveinícioapósamortesemherdeirosdoreid.carlosii.Asprin-cipaiscampanhasteriamlugarjánoreinadoseguinte.d.Pedroiifaleceuem1706,deixandootronoaofilhomaisvelho,oprínciped.João,apartirdeentãod.JoãoV.
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economia e Sociedade
um país pequeno e pouco povoado – o numeramento de 1527-1532
entre1527e1532decorreuoprimeirocensodaHistóriadePor-tugal.Longedeserumcensomoderno,era,noentanto,oprimeiroatentarcontabilizartodaapopulaçãodoPaís.Paratal,osoficiaisdoreipercorriamoreinodepontaaponta,apontandoonúmerodefamíliasquemoravamemcadaregião.Ofactodeterdemoradocincoanosacompletardemonstraoquãodifícilerafazeralgodogénero,numtempoemqueascomunicaçõeseramlentaseosca-minhosmauseperigosos.
Onumeramentotevelugarporqued.Joãoiii(1521-1557)de-sejavaconhecermelhororeino.eraútilàcoroaconhecerapopu-laçãoportuguesa,parasaberaocertoquempodiapagarimpostos,quantoshomensestavamdisponíveisparaotrabalhoe,sobretudo,paraaguerra.
estaaçãonãopermitiusaber,aocerto,quantoshabitantesPortu-galtinhaemmeadosdoséculoXVi.istoporquecontabilizavafamí-liasenãoindivíduos.Aindaassim,ebaseando-senonúmerodenú-cleosfamiliaresexistentesnoperíodo,oshistoriadorescalculamquePortugaltivesseentre1milhãoe1.5milhõesdehabitantes.compa-rativamente,espanhateriaentãocercade7milhõesdehabitantes.
Portugal era, no contexto europeu, um país pequeno e poucopovoado,e tambémpor issoasuaexpansãopelomundofoi tãodiferentedadeoutrospaíses.Portugalnão tinha, simplesmente,homensemquantidadesuficienteparaconquistaremantergran-desterritórios.AÍndiaeraincomparavelmentemaispovoadadoquePortugaleasuaconquistapelaforçadasarmasnuncateriasidopossível.Porisso,osPortuguesesdesenvolveramosistemadefeitorias-fortalezas,referidonocapítuloanterior,emantiveram-sesemprepróximosdomar,ondeosnavioslhesgarantiamsuperiori-dademilitar,linhasdecomunicaçãoeabastecimento.
FoinoBrasilquePortugalmaisinvestiunacolonizaçãoaolongodosséculosXVieXVii.e,comoésabido,Portugalnãoencontrou,
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naquele território, uma grande civilização que tentasse impediressacolonização.OsAmeríndios,aocontráriodosincaseAztecasquecombateramcontraosespanhóis,eramdemasiadodesunidosparaimpedirdeformasignificativaoavançodacolonização.Ain-daassim,foi tambémporfaltadepopulaçãoquedurantemuitotempooterritórioportuguêsnoBrasilselimitouàcosta,nãoavan-çandomuitoparaointerior.
os Jesuítas: entre Portugal e a evangelização do oriente
A companhia de Jesus foi fundada por inácio de Loyola em1540.noconcíliodeTrento(1545-1563)ficoudecididoqueosJe-suítasdeveriamseros responsáveispela reconversãodaeuropaprotestante.TiveramalgumsucessoemáreascomoaPolónia,queconseguiramfazerregressaraocatolicismodepoisdealgunsanosdeProtestantismo.
AcompanhiadeJesuschegouaPortugal logonoanodafun-dação,1540.FranciscoXavierfoiohomemescolhidoeenviadoaPortugal,ondefoientusiasticamenterecebidopelosreis,d.Joãoiiied.catarinadeÁustria.nãotardoumuitoatéquepartisseparaaÍndia,paraaídarinícioàmissionaçãodoOriente,projetoqueseriacontinuadoporoutrosJesuítasaolongodosséculosseguintes.
em1559, foi fundadoocolégiodoespíritoSanto, emÉvora.Aquelecolégiotornou-seasegundauniversidadedoreino,aseguiràdecoimbra,eocontrolofoientregueaosJesuítas.Asuafunda-çãoforapatrocinadapelocardeald.Henrique,irmãodoreid.Joãoiii.defacto,aordemtornou-setãoimportantenoreinoqueempoucosanostodososconfessoresdaspersonagensmaisimportan-tes,desdelogodoreiedarainha,eramjesuítas.
noOriente, amissionaçãodos Jesuítas tinhamais sucessodoquea levadaacaboporoutrasordensreligiosas. istoporqueal-gunsJesuítasadaptavamosensinamentosdaBíbliaàsrealidadeslocais,tornando-amaisacessívelàspopulaçõesdaÍndiaoudoJa-pão. Mais, a educação que os membros da companhia de Jesusrecebiameratãocompletaque,muitasvezes,osseusserviçoseram
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requisitadosporreisesenhoresasiáticos.emtrocadapartilhadoconhecimentodosJesuítas–comosabertocarinstrumentosmu-sicaisouterconhecimentossobreAstronomiaeMatemática–osreislocaispermitiamquepregassemdeformalivre.Foiassimque,entreasdécadasde1540e1600,osJesuítasconseguiramcriardonadaumacristandadejaponesacomcentenasdemilharesdefiéis.
As riquezas do Brasil
comovimosnocapítuloanterior,o achamentodoBrasilpelaarmadadePedroÁlvarescabral,em1500,nãoconduziuaumime-diatoaproveitamentodoterritório.Houveinteresseded.Manueli(1495-1521)emmanteroterritóriosobcontroloportuguês,masapenasparagarantirasegurançadarotadocaboqueligavaLisboaàÍndia.duranteessereinado,apequenaporçãodecostabrasileiraqueeraconhecidaficouentregue,sobretudo,aosinteressescomer-ciaisprivados.nesseperíodo,oprincipalprodutoexploradonare-giãoeraopau-brasilqueviria,maistarde,adarnomeàregião.Porentão,oBrasileraaindaconhecidocomoTerradeVeracruzousimplesmenteVeracruz.
comd.Joãoiii(1521-1557),opovoamentodoBrasiltornou-seumaprioridade,tendocomoprincipalobjetivoimpedirainstala-ção de bases de piratas franceses na região, o que colocaria emriscoanavegaçãoportuguesaoriundadaÍndia.
emmeadosdoséculoXVijásepercebiaqueossolosbrasileiros,depoisdefeitaadesflorestaçãodecertasáreas,erammuitomaisférteisdoqueossolosemPortugal.Assim,oBrasilcomeçouaseraproveitadoparaaagriculturae,maistarde,tambémparaapecuá-ria,sobretudodegadobovino.noentanto,foramasplantaçõesdeaçúcarqueconstituíramomotordoBrasilportuguêsduranteosséculosXVieXVii.
Oclimabrasileiroerapropícioàproduçãodeaçúcar,enãotar-douatéqueossenhoresdonosdeengenhosdeproduçãodaque-le produto se tornassem ricos. O açúcar era vendido na europaporpreçosmuitoelevadose,mesmosendojáoriundodoBrasil,continuavamuitasvezes a ser vendido como se fosse açúcarda
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Madeira.Aproduçãodeaçúcarsófoitãolucrativagraçasaotra-balhoescravo.OsescravoseramcompradosnacostaocidentaldeÁfricaelevadosparaoBrasil,ondeeramempregadosnocultivodacana-de-açúcar.
Aproduçãoaçucareiraera tão importantee lucrativaque,emmeadosdoséculoXVii,asProvínciasUnidas,ouseja,aatualHo-landa,invadiramonortedoBrasil.nasdécadasde1630a1650,PortugaleasProvínciasUnidasdisputaramocontroloderegiõesricas em açúcar, como Pernambuco. Os colonos portugueses doBrasil combateram quase sempre sem apoio da metrópole, poisPortugalestava,então,envolvidonaguerradaRestauração(1640--1668)contraaMonarquiaHispânica.
comoveremosnopróximocapítulo,no séculoXViiioBrasiltornou-se aindamais importanteparaPortugal, jáque foi entãoquesedeuinícioaociclodoouroedaspedraspreciosas,queiriaalimentarosgastosdoreinadoded.JoãoV.
Cultura e Artes
Do Maneirismo ao Barroco
OManeirismofoiumestilodetransiçãoentreoRenascentistae o Barroco. consistia, essencialmente, na deturpação de outrosestilos,concedendo-lhescaracterísticasqueaquelesnãopossuíam.Poressemotivodurourelativamentepoucotempo,natransiçãodoséculoXViparaoséculoXVii.
OBarrocofoioestiloartísticoporexcelênciadasgrandescons-truçõesnaeuropa,emparticularnosul.emPortugal,oprincipalexemploéoconventodeMafra,mandadoconstruirpord.JoãoV,comoveremosnocapítuloseguinte.
AsdecoraçõesdoBarrocosãomenosausterasdoqueasdeesti-losanteriores,epredominamasimagenseossímbolosreligiosos.Paraosreiscatólicos(emPortugal,espanhaeFrança),eramuito
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importanteeducaraspopulaçõesdentrodeumamatrizcatólica,paraquenãopendessemparaoProtestantismo.Tambémousodeazulejose,emparticular,detalhadourada(sobretudonasigrejas),revelabemaopulênciadoBarroco.
nãoéporacasoqueasgrandesobrasdoBarrocoportuguêssur-giramnoperíodoemquemaisriquezas,sobretudoouro,tiveramorigemnoBrasil.Tambémnesse território seconstruíramobrasmagníficas,comoaigrejaMatrizdenossaSenhoradoPilar,emOuroPreto,estadodeMinasGerais.nestaigreja,porexemplo,pre-dominaatalhadeouronoaltar.
O auge do Barroco português ocorreu no século XViii, peloqueseráanalisadocommaisdetalhenocapítulodedicadoaesseséculo.
A Inquisição em Portugal e a reforma Protestante na europa
AinquisiçãofoiintroduzidaemPortugalporvontadeexpressaded.Joãoiii,em1536,eapóslongosanosdelutadiplomáticaemRoma.OPapanãoqueriaqueainquisiçãoseinstalasseemPortu-gal,poiscompreendiaqueseriautilizadaparafortaleceropoderdorei.e,defacto,foiissoqueaconteceu,jáqueapartirdeentãoacoroacomeçouaintervirnosassuntosreligiososque,atéaquelemomento,estavamreservadosaoPapa.
naquelaaltura,considerava-sequeumreicatólicosópodiaserverdadeiramenteobedecidoporumapopulaçãocatólicae,porisso,perseguiam-seasminoriasreligiosas.esteprocesso já tinhasidocomeçadomesmoantesda instalaçãoda inquisição,quandoem1497d.Manuelimandouconverter,ouexpulsarcasonãoofizes-sem,osJudeus.
Os problemas religiosos na europa adensaram-se com o iní-ciodaReformaProtestante,promovidaporMartinhoLutero,em1517.defacto,nãotardouatéqueaantigacristandadeeuropeiaseestilhaçasseedesselugaraumaclaradivisãoentrereinoscató-licos(Portugal,espanha,França)ereinosprotestantes(inglaterra,PaísesBaixos,reinosdaescandináviaealgunsestadosAlemães).
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OconcíliodeTrento(1545-1563),convocadopeloPapaparadis-cutir o estado da cristandade com os representantes dos váriosreinoscatólicos,acabouporendureceraindamaisavisãoqueoscatólicos tinham acerca dos protestantes, judeus e muçulmanos.Boa parte das decisões tomadas no concílio foram rapidamenteadotadaspord.Joãoiii,quedesejavaumaigrejaportuguesaforteecapazdelidarcomqualquerameaçaaocatolicismo.TambémporissoapoiouosJesuítasepermitiuquepregassememPortugalenoimpério.nãofoiporacasoqued.Joãoiiiganhou,maistarde,ocognomedeO Piedoso.
emPortugal,ainquisiçãoacabariaporduraratéaoséculoXiX(sófoiextintaem1821).começaram,desdecedo,asperseguiçõescontratodosaquelesque,deacordocomospadrõescatólicos,ofen-diamaordemdoreino.nestelotedeperseguidosincluíam-seasminoriasreligiosas,comooscristãos-novos(judeusconvertidosaocatolicismonoreinadoded.Manueli)emuçulmanos,alémde,naturalmente,protestantes,bemcomominoriassexuais,comooshomossexuais.
Umadasferramentasdecensuradainquisiçãofoioíndicedelivrosproibidos,ondeforamincluídasobrasquesejulgavampre-judiciaisàordemdosreinoscatólicos.nestesíndicesincluíam-se,obviamente,asobrasdeMartinhoLutero,mastambémasdeeras-modeRoterdão(quenuncaquiscortarrelaçõescomaigreja,aocontráriodeLutero).
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Cronologia
Data Acontecimentos
1519-1521 circum-navegaçãodaTerraporFernãodeMagalhãeseSebastiand’elcano.
1521 Morteded.Manueli.Subidaaotronoded.Joãoiii.
1524 casamentoded.Joãoiiicomd.catarinadeÁustria.
1525 casamentodainfantad.isabelcomoimperadorcarlosV.
1529 ResoluçãodefinitivadaquestãodasilhasMolucas.
1527-1532 numeramentodapopulaçãoportuguesa
1532-1535 criaçãodascapitanias-donatáriasdoBrasil.
1536 instalaçãodainquisiçãoemPortugal.
1538 Primeirocercodediu,naÍndia.
1540 ináciodeLoyolacriaacompanhiadeJesus.
1543 chegadadosPortuguesesaoJapão.
1546 Segundocercodediu,naÍndia
1549 Formaçãodogoverno-geraldoBrasil.TomédeSousaénomeadoprimeirogovernador.
1551 integraçãonacoroadasOrdensdeAvis,cristoeSantiago.
1554 Falecimentodoinfanted.Joãoenascimentodoseuúnicofilho,d.Sebastião.
1557 Morteded.Joãoiii.Subidaaotronodoseuneto,d.Sebastião.MacauécedidapelachinaaoestadoPortuguêsdaÍndia.
1557-1562 Regênciaded.catarinadeÁustria.
1559 FundaçãodaUniversidadedeÉvora.
1562-1568 Regênciadocardeald.Henrique.
1565-1575 crisemilitarnoestadodaÍndia.
1568 d.Sebastiãotomaasrédeasdopoder.
1578 BatalhadeAlcácerQuibir.desaparecimentoded.Sebastião.Subidaaotronodocardeald.Henrique.
1579-1580 convocadascortesparaAlmeirimparadecidirasucessãodoreino.
1580 Mortedocardeal-reid.Henrique.d.António,priordocrato,faz-seaclamarcomorei.d.FilipeiideespanhainvadePortugal.BatalhadeAlcântara.d.Filipeiitorna-sed.FilipeidePortugal.
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1581 AscortesdeTomarreconhecemd.Filipeicomorei.d.FilipeigaranteaautonomiadePortugalnoPactodeTomar.
1588 AinvencívelArmadaespanholaéderrotadapelosinglesesnocanaldaMancha.
1589 d.AntónioinvadePortugalcomajudainglesa,masnãoconseguetomaroreino.
1598 Morteded.FilipeidePortugal.Subidaaotronoded.FilipeiidePortugal.iníciodaguerraentrePortugaleasProvínciasUnidas.
1602 AsProvínciasUnidascriamaVOc,acompanhiadasÍndiasOrientais.
1612 OMaranhão,noBrasil,éconquistadopelosFranceses.
1615 ReconquistaportuguesadoMaranhão.
1619 d.FilipeiivisitaLisboa.AVOcfazdeBatávia,nainsulíndia,asuacapital.
1621 Morteded.Filipeii.Subidaaotronoded.Filipeiii.
1622 Ormuz,noGolfoPérsico,éconquistadaporumexércitoanglo--persa.MacauéatacadasemsucessopelaVOcholandesa.
1630 AsProvínciasUnidasconquistamoPernambuco,noBrasil.
1634 AduquesadeMântuaéescolhidacomovice-rainhadePortugal.MigueldeVasconceloscontrolaapolíticaportuguesa.
1635 iníciodaguerraentreaFrançaeaMonarquiaHispânica.
1637 RevoltasantitributáriasdeÉvora.
1640 Revoltadacatalunha.Golpedo1.ºdedezembro.d.JoãoiVaclamadocomorei.iníciodaGuerradaRestauração.
1641 AsProvínciasUnidasconquistamoMaranhão,noBrasil,Ben-guela,emAngola,eMalaca,nainsulíndia
1643-1654 campanhasportuguesascontraasProvínciasUnidas.
1644 LibertaçãodoMaranhão.VitóriaportuguesanabatalhadoMon-tijo,juntoaBadajoz.
1648 ReconquistadeAngolaeSãoTomé.
1654 conquistadeRecife,oúltimoredutodasProvínciasUnidasnoBrasil.
1656 Morteded.JoãoiV.Subidaaotronoded.AfonsoVi.iníciodaregênciadarainhad.LuísadeGusmão.Fimdarevoltadacatalunha.
1658 AsProvínciasUnidasconquistamailhadeceilão,noÍndico.
1659 VitóriaportuguesanabatalhadasLinhasdeelvas.
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1660 chegadadocondedeSchombergaPortugal.
1661 AsProvínciasUnidasconquistamacidadedecochim,naÍndia.Portugaleinglaterratornam-sealiados.d.catarinadeBragançacasacomcarlosiideinglaterra.
1662 Golpepalacianoefimdaregênciaded.LuísadeGusmão.OcondedecasteloMelhortorna-sevalidoded.AfonsoVi.inva-sãoespanholadoAlentejo.
1663 VitóriaportuguesanabatalhadoAmeixial.
1664 FracassodocercoespanholacasteloRodrigo.
1665 VitóriaportuguesanabatalhadeMontesclaros.
1667 OcondedecasteloMelhorcaiemdesgraçaeédesterrado.
1668 d.AfonsoViéconsideradoincapazeimpotente.Éafastadodogovernoeoseucasamentoanulado.Oinfanted.Pedrotorna-seRegedoredefensordoreino.AssinaturadapazcomaMonar-quiaHispânica.FimdaGuerradaRestauração.
1669 FimdaguerracontraasProvínciasUnidas.
1683 Morteded.AfonsoVi.Subidaaotronoded.Pedroii.
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V
PortuGAl no SÉCulo XVIII
Política e Guerra
o absolutismo joanino (1707-1750)
inspiradopelomodelofrancêsdoreiLuísXiV(1638-1715)eporobrascomoO Rei é Rei porque Deus quer(1681),d.JoãoVé,tradi-cionalmente,encaradocomoosímbolomáximodopoderabsolutoemPortugal.Partindodosprincípiosdequeopodererasagradoeasuaautoridadeinquestionável,poremanardiretamentededeus,omonarcapossuíaumconjuntodequalidadessuperioresqueasse-guravamobomgoverno.
7.Reid.JoãoV(1689-1750).
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OlongoprocessodeconsolidaçãoeafirmaçãodopoderrégiononossoPaísfoidesenvolvidoapósarestauraçãodaindependência,em1640,quandod.JoãoiVsentiuanecessidadedeorganizarereestruturaraburocraciaestatal,deformaadarrespostaàsdife-rentesquestõesqueoreinoenfrentavae,simultaneamente,voltaracentralizaropoder,depoisde60anosdedomíniofilipino.
nosdoisreinadosseguintes(d.AfonsoVied.Pedroii),areuniãodascortesfoidecaindoemnúmeroeemimportância,reunindo-sepelaúltimavezem1697,parajuraroherdeiroefuturod.JoãoV,demonstrandoqueoreiabsolutonãosesubmetiaaqualquerórgãodepoderpolítico.comomonarcaMagnânimoatinge-seumpontodegranderelevânciaparaaafirmaçãodoregimepolítico,princi-palmentepelofactoded.JoãoVadmirarprofundamenteoestilodegovernaçãodoRei Sol francês.
Omodelodecontrolopessoalfoiintensivamenteimpulsionadoatravésda reformadas três secretariasde28de julhode1736.Aoreestruturaronúcleoadministrativodoestado,concedeuummaiorgraudeespecializaçãoàsdiferentespastas (SecretariadeestadodosnegóciosinterioresdoReino,SecretariadeestadodaMarinhaedomíniosUltramarinoseSecretariadeestadodosnegó-ciosestrangeiroseGuerra),possibilitandoareduçãosubstancialdopapeldosconselhosumavezqueossecretáriosdeestadopassa-vamatrabalhardiretamentecomorei.Apesardealgunsproble-masgravesdesaúde,d.JoãoVfoiummonarcaquesepreocupouemresolvercadadespachocomamáximaatenção,conhecendoemdetalhetudooquesepassava.
O Absolutismo Régio foi um sistema político que concentroutodosospoderes(legislativo,executivoejudicial)nasmãosdeummonarca,legitimadopelofactodetersidoescolhidopordeusparagovernar.AlcançouoperíodoáureoentreosséculosXViieXViii.
nascidoem22deoutubrode1689,O Magnânimosubiuaotro-nocom17anos,emjaneirode1707,egovernouopaísaté1750,numa época de grande riqueza depois da descoberta do ouro
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(décadade1690)edosdiamantes(1720)brasileiros.numaclaraten-tativadeimitaroluxoegrandiosidadeostentadanacortefrancesa,d. JoãoVprocurou reproduzir esse esplendor emPortugal, ado-tandoapostura,oprotocoloeaetiquetavigentesnumaeuropaondeomonarcaeraocentrodasatenções.Todosdeveriamprestarvassalagemaumreirodeadoporumambientedeluxo,ondeostrajes,osespetáculos,aóperaeosbanqueteseramsímbolosclarosdofaustoquesevivianaépoca.
Ocasamentoded.JoãoVcomd.MariaAnadeÁustria(1683--1754)foiumdosprimeirosexemplosdocarácterfaustosodomonarcaedasuapolíticadiplomática.ParaalémdeenviarumaluxuosaembaixadaaViena,em1708,paraacelebraçãodomatri-mónio,odesembarquedanovarainhaemLisboafoiacompa-nhadoporumaarmadaeasuaentradanacortefoirealizadacomsetepompososcoches.
A Guerra de Sucessão de espanha (1701-1714) e a política diplomática joanina
Aquelequeéconhecidocomooreinado do ouroteveuminícioturbulentoemtermoseconómicosemilitaresumavezqued.JoãoVherdoudopaiaparticipaçãomilitarnaGuerradeSucessãodeespa-nha(1702-1714)eumdosmaiscontroversosacordoscomerciaisdanossaHistória,oTratadodeMethuen(1703).Oconflitoespanholiniciou-seapósamorte,semherdeiros,decarlosiideespanha,passandoacoroaaserdisputadaentreumnetodeLuísXiV,FilipedeBourbon,eoarquiduquecarlosdeHabsburgo.
TornadoreiFilipeVpelotestamentodomonarcafalecido,em1700,aeuropacorriaoriscodeserdominadapelaFrança,oqueobrigouàcriaçãodaGrandeAliança(inglaterra,Holanda,dina-marcaeestadosAlemães)queapoiavaocandidatoaustríaco.Por-tugal,apósumabrevecooperaçãocomoladofrancês,seguiuaspisadasbritânicas,frutodaspressõeseconómicasecomerciais.Os
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momentosaltosdaparticipaçãoportuguesanesteconflitoocorre-ramaquandododesembarqueemLisboadoarquiduquecarlos,a 7 de março de 1704, que, desta forma, reconhecia simbolica-menteadinastiadeBragança,eaparticipaçãomilitarnabatalhadeAlmansa.
Ocasamentoded.JoãoVcomd.MariaAnadeÁustria,irmãdoarquiduquecarlos,consolidoudefinitivamenteaposiçãopolítico--militarnaGrandeAliança.Sóapósacedênciadecolóniasespa-nholas,porpartedeFilipeV,naassinaturadoTratadodePazdeUtrecht(1713-1715)eoapaziguamentodoarquiduquecarlos,quesubiuaotronoimperialaustríacodepoisdamortedoirmãoJoséi,équeaguerraterminou.
Curiosidade: OTratadodeMethuen,assinadoa17dedezembrode1703,estipulouacompra,semrestrições,detecidosbritânicoseavendadevinhoportuguêsapreçosmaisacessíveis.estetra-tadoveioaumentaradependênciaportuguesafaceaomercadoinglêsumavezque90%dovinhonacionaleraexportadoparainglaterra.
daquiemdiante,d. JoãoVdecidiuqueseriamaisvantajosoparaPortugalapostarnaafirmaçãoatlântica,comercialepolítica,impondo,nessesentido,aneutralidadeperantetodososconfrontosmilitaresquesedessemnaeuropa.Aaliançacominglaterrafoiconsolidadaecanalizaram-seesforçosparaoBrasil,colóniaparaondepartirammilharesdeportugueseseseampliaramosefetivosadministrativos,técnicosemilitares.Apolíticadeneutralidadefoiapenascontrariadanocontextocolonial,defendendo-seosinteres-sesportuguesesnaÍndia,AméricaLatinaeMacau.
Apesar disto, a aplicaçãodesta política diplomática neutral fi-coumarcadapelasfabulosasrepresentaçõesportuguesasemParis,Roma, Madrid ou Viena, onde os embaixadores ostentavam ex-traordináriostrajesecochesdeouro.OsresultadosforambastantepositivoscomaSantaSé,apesardocortederelaçõesentre1728e1732,aquemPortugalsocorreumilitarmenteaquandodabata-
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lhadocabodeMatapão(1717),contraoimpérioOtomano,oqueacabouporresultarnafundaçãodoPatriarcadodeLisboa(1737)enumtratamentoigualperanteasoutraspotênciaseuropeias.
d.JoãoV,apósrelevantestrabalhosdiplomáticosdeembaixado-rescomoAndréMelloecastro,recebeu,doPapaBentoXiV,otítulodeRei Fidelíssimo(1748).
Apesar da troca de princesas, em 1729 (a infanta portuguesad.MariaBárbaracasariacomofuturod.FernandoVieainfantaespanhola Mariana Vitória de Bourbon casaria com o nossofuturod.Joséi),o«perigoespanhol»pairouduranteestereinado.ApenascomaassinaturadoTratadodeMadrid(1750),queserviuparadefinirasfronteirascoloniais,équearelaçãoentreospaísesibéricosestabilizou.
A ascensão e a ação política de Sebastião José de Carvalho e Melo
d.Joséi,O Reformador,subiuaotronoa31dejulhode1750eoseureinadode27anosesteveintimamenteligadoàatuaçãopolítica,económicaesocialdeSebastiãoJosédecarvalhoeMelo(1699-1782),maisconhecidoporMarquêsdePombal.estereinadoficoumarcadopelaaçãodesteministro,queofuscouopapelcentraldomonarcaabsolutopelasuaimpulsiva,constanteetransversalintervençãocomohomemdeconfiançadoreiemtodosossectoresdavidacoletivadoPaís.
AascensãopolíticadoMarquêsdePombaliniciou-seentre1750e1755,alturaemquefoinomeadoparaocargodesecretáriodeestadodosnegóciosestrangeirosedaGuerra,umdostrêsministé-riosexistentes,provavelmentepelodesempenhopositivoenquantoembaixadoremVienaeemLondres.nestescincoanosdestacou--sepelaoposiçãoaoTratadodosLimites (oudeMadrid), faceàimportânciaestratégicadacolóniadoSacramento,epeloiníciodocombateàcompanhiadeJesusnoMaranhão(Brasil),ondeinsti-
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tuiuacompanhiaGeraldocomércio,comointuitodereduzirainfluênciadosJesuítas.
Oterramotode1denovembrode1755veioprecipitaraafir-maçãopolíticadesteministroque,comamorteeafastamentodosoutrosdoissecretáriosdeestado,concentrouemsiplenospode-res,sobatutelad’O Reformador.Adeptododespotismoesclarecido(ouiluminado),foinomeadosecretáriodeestadodosnegóciosdoReinoem1756edeparou-secomumpaísquenecessitavadeumconjuntodereformasinstitucionaisquepromovessemaoperacio-nalidadedoestado.nessequadro,aadministração,asfinanças,ofisco,ajustiça,aeconomiaeoensinotornaram-sealvodeprofun-dasalterações.Parapreencherosnovoscargospúblicoselevouossectoresletradosdaburguesia.
Odespotismoiluminadofoiumaformadegovernoemqueummonarcaabsoluto,«iluminado»pelaRazão,lideravaosdestinosdeumanaçãoemproldo seubem-estar e felicidade.Atravésdesteprincípio,osprivilégiosdanobrezaeainfluênciadaigrejaperderamrelevânciaperanteaautoridaderégia.
noâmbitodasfinançaspúblicas,acriaçãodoerárioRégio(1761)potenciouumaclaramelhorianagestãoecontrolodasreceitasedespesasdoestado,centralizandotodososrecursosexistenteseaformadeosaplicar.esteprocessodemodernizaçãofoifundamen-talparadarcapacidadederespostaàreduçãodasremessasdeourodoBrasileànovacrisecomercialquesefezsentir.
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Fazendopartedonúcleodecríticosdadependênciadeingla-terra,oMarquêsdePombalretomou,emparte,omodelomercan-tilistadasegundametadedoséculoXVii.criouascompanhiasdecomérciomonopolistasparaoOrienteeBrasil(1755),fundouaJuntadocomércio(1755),pararegulartodaaatividadeeconómica,estabeleceuacompanhiaGeraldaAgriculturadasVinhasdoAltodouro(1756)einstalounovasunidadesindustriaisdetêxteisemTomar,AveiroeLisboa.
noquadrodajustiça,areformadosistemaprocurouuniformizaralegislaçãonocontextonacional,retirandorelevânciaaodireitotradicionaldaslocalidadesedeterminadosprivilégiosdetidospelocleroenobrezaque,naprática,comandavamashostesnaprovín-cia.Acriaçãodaintendência-GeraldaPolícia,em1760,impulsio-nouumnovoperíodonosistemajudicialportuguês,aopermitirumamaioroperacionalidadedasleiseprendertodosaquelesquecometessemcrimes.
8.MarquêsdePombal(1699-1782).
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Oensinofoiumadasmaiorespreocupaçõesdoestadista,umavezquereconheciaanecessidadededotaraadministraçãocentraldequadrosqualificados.AexpulsãodosJesuítas(1759)reduziuprofundamenteouniversodedocentesnoscolégiosnacionais,per-mitindoumareformaalargadacomnovosprofessores.AreformadaUniversidadedecoimbrapassoupeloencerramentoprovisóriodaUniversidadedeÉvoraepelaimplantaçãodaJuntadaPrevidên-ciaLiterária(1768).Osnovosestatutos(1772)englobaramnovasdisciplinas,ométodoexperimentaleumreforçodopensamentoiluministaquevigoravanorestodocontinente.comointuitodeassegurarapublicaçãodeobrascomumdeterminadocarizpro-gressistaereduziropoderclerical,centralizouoTribunaldeSantoOfícioefundouaRealMesacensória(1768).
emtermosmilitares,PortugalfoiobrigadoaquebrarapolíticadeneutralidadeeaintervirnaGuerradosSeteAnos(1756-1763),umconflitoentreFrança,ÁustriaeRússiacontrainglaterraePrús-sia.em1762,Portugalrecusouaexigênciafrancesadeencerrarosportosaosbritânicos, levandoosfrancesesainvadirem,comosespanhóis,oterritóriodeTrás-os-Montes,depoisGuardae,final-mente,aBeiraBaixa.OcondealemãoLippefoinomeadomarechal--generaldoexércitoportuguêsepagouamilharesdemercenáriosparaatriunfantedefesadeLisboa.
Época de transições: do reinado de D. Maria I à regência de D. João VI
Oiníciodoreinadomarianoétradicionalmenteobservadocomoummovimentodeviradeira,istoé,umcortecomapolíticapomba-linaemdiversossectores.OMarquêsdePombalfoiimediatamentedestituídodetodososcargosedesterrado,acusadodeabusodepoderecorrupção,acabandoporficarconfinadoàssuaspossessenhoriais.estainversãoderumoincluiua libertaçãodeváriospresoseexiladospolíticosearestituiçãodediversostítulosnobi-liárquicos.
Aindaassim,apermanênciadosjuízesnostribunaissuperioresdacoroaoudealgunsministrospombalinos,eaafirmaçãopolíti-
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co-institucionaldaintendênciaGeraldaPolíciaàsmãosdediogoináciodePinaManique(1780)sãoreveladoresdeumacertama-nutençãodealgumaspolíticasdoanteriorreinado.
duranteos15anosdegovernação(1777-1792)ded.Mariai,po-demosdestacar,comofactosmaisimportantes,amanutençãodapaz,nomeadamentepelaviadoscasamentoscruzadosdosinfan-tesdePortugaleespanha,aassinaturadeumimportanteacordocomercialcomaRússia(1789),umconjuntovariadodeperdõese,principalmente,acriaçãodacasaPiadeLisboa(1780).
importasalientar,aindaassim,odecretolançadopeloviscondedeVilanovadecerveira,em15defevereirode1786,que,naten-tativadereduzirotempodeesperadaReal Assinatura,informavaque os despachos régios de conselhos, tribunais, secretarias deestadoeinstânciassuperioresdogovernoseriamautenticadosape-nascomumcarimbodarainha,semqueexigisseasuapresença.destaforma,opoderrealiniciavaumpercursodedescentralização.
ArainhaPiedosa(ouLouca)foiafastadaclinicamentedagover-naçãoem1792,apósamortedomarido,d.Pedroiii(1786),edofilhoepríncipeherdeiro,d.José(1788).Oseucatolicismofervo-rosofazia-aimaginarqueopai,d.Joséi,ardianoinfernoporterexpulsadoosJesuítas.
Militarmente, os efeitos provocados pela Revolução Francesaprecipitaram,apósadecapitaçãodeLuísXVi,aintervençãopor-tuguesaeespanholacontraosrevolucionáriosfrancesesnacam-panhadoRossilhãoedacatalunha(1793-1795),batalhasparaasquaisonossoexércitocontribuiucomcercade6milsoldadosparapesadasderrotas.OséculoXViiiportuguêsterminavatalcomoco-meçara,sobosignodoconflitoedaguerra.Logoem1801eclodiriaa«GuerradasLaranjas»,contraaespanhaeFrança,queresultounaperdadeOlivença.
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economia e Sociedade
A sociedade portuguesa na fase final do Antigo regime
Portugal,noiníciodoséculoXViii,talcomograndepartedaeuropa,vivianumasociedadedeordens,assentenoprivilégio,nariquezaenopoder.estratificadaentreclero,nobrezaeTerceiroestado (vulgarmentedenominado«povo»), onascimentoouasfunçõespolítico-sociaisexercidaspelosindivíduosdefiniamores-petivoestatutojurídico,queincluíadireitos,deveresehonras.OcomportamentoeosvaloresdoAntigoRegimeerammarcadospelaaparência,naqualaostentaçãodopoderedariqueza,nomea-damenteatravésdeumtrajenobreoudobáculodosclérigos,deve-riamcorresponderadeterminadasformasdetratamento.
notopodapirâmidesocialencontrava-seaordemmaispróximadedeus:oclero.isentadeimpostosàcoroa,documprimentodoserviçomilitarecomtribunaispróprios,estaordemprivilegiadausufruíadodízimoeviviadosrendimentosdassuasproprieda-desebens.nãoobstante,asdiferençasentrealtoebaixocleroeramevidentes,estandooprimeiroreservadoasegundosfilhosdanobrezaeaosmaisaltoscargosreligiosos,possuindoinfluêncianapolíticaenacorte,enquantoosegundocoordenavalocalmenteaparóquiaeorientavaespiritualmenteascomunidades.
nosegundopatamarencontramosanobreza,ordemdemaiorprestígioqueocupavaosprincipaiscargosmilitareseadministrati-vos,detinhagrandespropriedadesruraisetambémnãocontribuíacomimpostos.divididaentrenobrezadeespadaoudesangueenobrezadetoga,existiam,noiníciodoséculoXViii,51casastitu-laresnonossopaís.destestítulosnobiliárquicospodemosdestacaroduquedecadaval,oduquedecoimbra,oduquedeLafõesouocondedeBarcelos.
commaiorherançahistóricaelongaslinhagens,anobrezadeespadacaracterizava-sepelacarreiradedicadaàsarmasepelapossedeextensaspropriedadesrurais.Anobrezadetoga,poroutrolado,representava todosaquelesquepassaramaocupar importantes
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cargospúblicosemembrosdaburguesiaqueascenderamsocial-menteatravésdoestudouniversitáriooudocasamento,eaquemomonarcaseviuforçadoaconcedertítulosnobiliárquicos.
Sustentandoasoutrasordensatravésdopagamentodeimpostosetrabalho,oTerceiroestadoeraogrupomaisheterogéneo,emvir-tudedeabrangerumconjuntovariadodecondiçõessocioeconómi-cas.nestaordemépossívelobservarumapequenaeliteburguesa,constituídaporhomensdeletras,mercadorese indivíduoscomofícios«superiores»,comoosjoalheiros.nogrossodapopulação,englobandoartesãoseassalariadosnascidadesenocampo,aindasepodiamencontrarvagabundos.
Apesardeaagriculturacontinuaraseraprincipalatividadeeco-nómicanonossopaís,asuaestagnaçãoprodutivacontribuiuparaaintensificaçãodasrelaçõescomerciais,nomeadamenteatravésdeumarotatriangularnoAtlânticoqueenglobavaotransportedeescravosdeÁfricaparaoBrasiledeaçúcar,tabacoecafébrasilei-rosparaPortugal.
entreofinaldoséculoXViieadécadade1730,Portugalpossuíacercade2milhõesdepessoas.AtéaofinaldoséculoXViiicres-ceria,emtermospopulacionais,atéaos3milhões,pelaviadodesenvolvimentoedodinamismoeconómicoderegiõesportuá-riascomooPorto,Viana,SetúbalouFaro.
o ciclo de ouro e do açúcar brasileiro
Asconstantesapostasnaexploraçãodosertãobrasileiro,atra-vésdosbandeirantes,foramachaveparaadescobertadoouroedosdiamantesnoBrasilnadécadade1690.estemomentoveioremodelarasprioridadesdasrelaçõesinternacionaisportuguesas,tornandoaproteçãodasrotascomerciaisedafronteirabrasileiranosprincipaisaspetosdapolíticaexterna.defacto,oequilíbriofinanceirodamonarquiajoaninabaseou-senaprosperidadeeco-nómicabrasileirae,atéàindependênciadestacolónia,noinício
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doséculoXiX,tornou-seevidenteaclaradependênciadePortugalperanteoBrasil.
A«corridaaoouro»justificaoselevadosníveisdeemigraçãoparaacolóniae,consequentemente,ocrescimentodemográficoque,grossomodo,passoude300milhabitantesnadécadade1690,parapertode2milhõesdepessoasnofinaldoséculoXViii.Oriun-dosdosAçores,daMadeiraedonortedePortugalcontinental,oourobrasileiroobrigouaosurgimentodeumalegislaçãoqueesta-belecesseocontrolodepassaportes.
Paraadministrareficazmenteoespaço,osgovernadores-geraisdoBrasilascenderamavice-reis,em1720,eas famíliasnobresmaisimportantes,comoosMascarenhas,osnoronhaouosMene-ses, foramrodandonocargo.Oestabelecimentodo impostodo«quinto»sobretodososmetaispreciososextraídostornou-seumadasprincipaisfontesdereceitadoestado.
Paralelamente,oaçúcarfoicontinuandoaaumentarosníveisdeproduçãointernoseosvaloresdeexportaçãoparadiversoster-ritórioseuropeus,sempreàcustadotráficodeescravosafricanos.Osengenhosdeaçúcarerammanobradosatravésdemãodeobraescrava,paramanterospadrõesdelucro.Masfoioouro,desco-bertoprincipalmentenaregiãodeMinas,aprincipalapostadoscomerciantesquecomprarammilharesdeescravosparaodolo-rosoprocessodemineração.esteciclodoouroinundouPortugaldeumverdadeirosentimentoderiqueza,jáque,entre1715e1750,amédiaanualderemessasdeourovariouentreos12mileos25milquilos,valoresextraordináriosparaaépoca.
nãoobstante,averdadeéqueodesenvolvimentodeoutrossec-toreseconómicosficoutotalmenteaquémdasnecessidadesreaisdopaís,desanimandooligeiroimpulsomercantileindustrializa-dorverificadonoreinadoded.Pedroii.nomeadoministrodaFazenda,o3.ocondedaericeiratinhainiciadoumaintervençãoeconómicacommedidasprotecionistasquevisavamaintroduçãodaindústriatêxtil,vidreiraemetalúrgica.
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Umbandeiranteeraum indivíduoquecolaboravanumaban-deira,istoé,numaexpediçãoarmadaapartirdolitoralemdire-çãoaointerior(sertão)queprocuravaexplorarterraseencontrarriquezas,comopedraspreciosas.
Parasuprimiroselevadosdéficesnabalançacomercialluso--britânica,provocadospeloTratadodeMethuen,oouroprove-nientedoBrasilacabou,emgrandesquantidades,napossedainglaterra.Omesmoourofoi,ainda,utilizadoparacustearapolí-ticadegrandesconstruçõesded.JoãoVetodososseusluxosassociados.
Porfim,oladonegrodeste«ciclodoouro»prende-secomascen-tenasdemortosnaGuerradosemboabas(1707-1709),umconflitoquesurgiudepoisdeseespalharanotíciadadescobertadeouronoBrasil.Milharesdepessoasdirigiram-seàsregiõesdeMinasGeraiseSãoPauloeentraramemconfrontocomosbandeirantespelodireitodeexploração.
1 de novembro de 1755: o dia do terramoto
consideradocomoumdosmaistrágicosmomentosdanossaHistória, amanhãdodiadeTodososSantosde1755destruiugrandepartedeLisboaesentiu-senazonasuldoPaíseemespa-nha,provocandoamorteamilharesdepessoaseaderrocadademilharesdeedifícios.Pelas9horas,osismo,econsequentetsu-nami,afetaramseveramenteacidade,colocandoemriscodedesa-lojamentomaisdedoisterçosdoslisboetasereduzindoacinzasimportantesehistóricasconstruçõesdacidade.
Osincêndios,quesealastrarampormaisdecincodias,geraramopâniconacomunidade.Ocaosgeradopelosmilharesdedesa-lojadoseaspilhagensconstantesderamaoMarquêsdePombalumaoportunidadeúnicaparaseafirmarpoliticamentejuntodorei.entrepalácios,conventoseigrejassoterrados,atéarecém-inau-guradaóperanãoresistiuaumdosmomentosmaiscomentadosportodaaeuropanasegundametadedoséculoXViii.
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A reconstrução da moderna Lisboa, que inclui, ainda hoje, avulgarmenteconhecidaBaixaPombalina,ficouacargodoenge-nheiro-mordoreino,ManueldaMaia,doengenheirohúngarocar-losMardeledoarquitetoeugéniodosSantosecarvalho.declarainspiraçãoiluminista,onovotraçadodacidadecaracterizou-seporumaausterageometria,quesubstituiuosbecoseruelasporespa-çoslargoseretilíneos,comedifíciosdefachadaealturaidênticas,cujaestruturainternaera«emgaiola»(sistemaantiterramotos).APraçadocomérciosubstituiuovelhoTerreirodoPaço,comointuitodepromoveraelevaçãodaburguesia,eaestátuaequestreded.Joséimanteveosimbolismodopoderabsoluto.
Curiosidade: Traumatizadopeloacontecimento,d.Joséiganhoufobiaaespaçosfechados,tendomandadoconstruirumpaláciodemadeiraemateriaislevesnotopodaAjuda,queficouconhecidocomoaReal Barraca.
A expulsão dos Jesuítas e o Processo dos távora, em 1759
AindaqueoMarquêsdePombaltenhasimbolizadoumciclorelevantededinamismopolítico,culturaleeconómico,averdadeéquepermanececomoumafigurapolémica,devidoaosintensoscombates que teve de travar durante a sua governação. dessescasos,aexpulsãoeconsequenteextinçãodaordemreligiosadosJesuítaseoprocessodosTávorasão,juntamentecomaapertadacensuraliteráriaeasperseguiçõespoliciaisdos«motinsdoPorto»,exemplosclarosdeumaadministraçãocom«mãosdeferro».
Pordecretode3desetembrode1759,todosospadresjesuítasforamexpulsosdePortugaledascolónias,acusadosdeplanearemsecretamentea tomadadepossedoBrasil,ondepossuíamumarelevantepresençanamissionaçãodosíndios.entre«rebeldes»,«agressores»e«adversários»domonarca,aexpulsãodaordemreligiosaacabouporserimitadapelosreinosdenápoles,espanha
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eFrança,obrigandooPapaclementeXiV,em1774,asuprimiraordemdocontinenteeuropeu.
Relacionadocomesteimportanteacontecimentoreligioso,paraalémdocortedasrelaçõesdiplomáticasentrePortugaleaSantaSé,praticamenteduranteumadécada,esteveoprocessoeaconde-naçãodafamíliaTávoraedosduquesdeAveiro.d.Joséifoialvodeumatentativadeassassinatoquandoregressavaacasanoseucoche,tendosidoalvejadoportirosdebacamarte.
conspirandocontraacompanhiadeJesus,oMarquêsdePom-balprocedeuaumainvestigaçãoqueacabouporcondenaràmorte,por«crimesdeLezaMagestade»,todaafamíliadosTávoraeosduquesdeAveiro.executadospublicamente,ascríticasaoMar-quêsdePombalacentuaram-senomeionobiliárquicoeclericalqueassistiuhorrorizadoàstorturaseàexecução.Poucotempodepois,opadreitalianoGabrielMalagrida(1689-1761),tambémelejesuíta,foienforcadoporestarenvolvidonatentativadeassassinatod’O Reformador.
Asubidaaotronoded.Mariai,umadasprincipaisinimigasdoMarquêsdePombal,levou,naépoca,aumanovainvestigação,queconsiderouafamíliaTávorainocente.OsTávorarecuperaram,assim,todosostítulosqueanteriormentedetinham.
Curiosidade: em1757,noPorto,ocorreuummotimpopularcontraacompanhiaGeraldasVinhasdoAltodouroqueacabouporgerar,aproximadamente,400condenados,26execuçõesevárioscastigosàcidade.OsJesuítasforamencaradospeloMarquêsdePombalcomoosprincipaisresponsáveispelainstigaçãodomotim.
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Cultura e Artes
A ostentação do Magnânimo e as grandes construções do Barroco
entre a viragem do século XVii e as primeiras décadas doséculoXViii,dopontodevistacultural,oestiloartísticodoBar-rocoatingiuoapogeunocontextoportuguês.deformagenérica,veiocontrastarcomarigidez,equilíbrio,lógica,linhasclássicaseracionalidadedoRenascimento,procurandoalivreinterpretaçãodaAntiguidade clássica ao exagerar nos adornos, exuberância,grandiosidade,emancipaçãodomovimentoeutilizaçãodecoresfortes,dramáticaseteatrais.natentativadecopiaromodelodeLuísXiV,o MagnânimoutilizouoourodoBrasilparacustearasuanecessidadedeostentarpoderinternaeexternamente.
convocandoosmelhoresartistaseuropeusparaacorteportu-guesaouenviandojovenspintoresnacionaisparaitáliaouFrança,d.JoãoVenveredoupelaedificaçãodegrandesconstruções,ondesedestacaramoAquedutodasÁguasLivres(1748),oPalácio-con-ventodeMafra(1717-1730)ouareconstruçãodaigrejadaMiseri-córdiadoPorto(1748),respetivamenteprojetadosporManueldaMaia,peloalemãoJoãoLudoviceepeloitalianonicolaunasoni.Outrosprojetosdearquiteturabarrocanoperíodojoaninocaracte-rizaram-sepelaexuberâncianointerior,nomeadamenteatravésdautilizaçãodatalhadouradaedoazulejo.nesseâmbito,épossívelevidenciaracapeladeSãoJoãoBaptista(1742-1744),construídapornicolaSalvi,ouaBibliotecaJoaninadaUniversidadedecoim-bra(1717-1728).
Aomesmotempo,potenciou,pelaviadomecenato,asarteseas letras,podendo-sedestacara fundaçãoeaprodução literáriadaAcademiaRealdaHistóriaPortuguesa (1720), soba coorde-naçãoded.AntóniocaetanoeSousaedo4.ocondedaericeira,d.FranciscoXavierdeMeneses(1673-1743).
A própria Língua Portuguesa, no seguimento dos «sermões»domaiorautordobarroco,PadreAntónioVieira(1608-1697),foiimpulsionadapelapublicaçãodeobrasrelacionadascomosmais
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variadostemas,destacando-seopapeldeRaphaelBluteau(1638--1734)eoseuVocabulario Portuguez Latino(1712-1721).
ATorredosclérigos,construídaentre1732e1763nosreinadosded.JoãoVed.Joséi,éumadasmaioresreferênciadobarroconacidadedoPorto.comohomenagemaotrabalhodenicolaunasoni,estefoisepultadonointeriordaigreja.
A Academia real das Ciências: a inspiração iluminista
Apósumperíododerelativafluidezna introduçãodopensa-mentoiluministanosmeiosintelectuaisportugueses,queconvi-veramcomumaintensacensura literáriaduranteagovernaçãopombalina,asubidaaotronoded.MariaipermitiuumnovofluxonaÉpocadasLuzes.AfundaçãodaAcademiadasciênciasdeLis-boa,a24dedezembrode1779,permitiuqueexiladospolíticosdotempodePombal,nomeadamented.JoãocarlosMascarenhasdaSilva,2.oduquedeLafões,eoabadeJoséFranciscocorreiadaSerraassumissemosprincipaiscargosdecomando.
Foram estes dois homens que concentraram esforços para adefiniçãodosobjetivoseconstruçãodosestatutosdaAcademia.nestesestavaprevistaadistribuiçãodosmembrosemtrêsgruposdistintos:ciênciasPuras,ciênciasnaturaiseLiteratura.A13demaiode1783,autilidadepúblicadaAcademia foi reconhecidainstitucionalmente,merecendoaproteçãorealded.Mariaieded.Pedroiii.destaforma,foipossívelconcederváriosprivilégios,nomeadamenteolivreacessoaosarquivospúblicosdoreinoouapossibilidadedeasobrasacadémicasnãoteremdepassarpelacensura.AntesdesefixarnoconventodeJesus,emXabregas,em1834,aprimeirasededaAcademiaRealdasciênciasfoinoPaláciodasnecessidades.
esta academia, encarada como uma clara reação à políticapombalina, foi criadacomo intuitode serumaalternativaaos
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estudos realizados em coimbra, e destacou-se, até meados doséculoXiX,pelapublicaçãodasMemórias da Agricultura (1788--1791),pelasMemórias Económicas(1789-1814),pelos65volumesdasEfemérides Naturais(1788-1862)oupelaarecolhadocumentaldoPortugaliae Monumenta Historica.
norestodaeuropaproliferavamasacademiascientíficasqueprocuravam,fundamentalmente,promoverainvestigaçãoedesen-volverosmétodosdeconhecimentotécnicoecientíficoqueiamsur-gindo,inclusivamenteatravésdacriaçãodelaboratóriosoubiblio-tecas.SãoexemplosaAccademia dei Lincei,deFlorença(1603),aRoyal Society, deLondres(1660),ouaAcadémie des Sciences,deParis(1666).AdiferençadeumséculonafundaçãodaAcademiaRealdeciênciasébemilustrativadoatrasocientíficoeintelectualdeumpaísquetardouemreconheceraimportânciadestasáreas.Aindanoreinadomarianodestacaram-se,dopontodevistacultu-ral,asimportantesmissõescientíficasdeinvestigação,assimcomoafundaçãodaAulaPúblicadodebuxoedesenho(1779)edaRealBibliotecaPúblicadeLisboa(1796).
entre o Barroco tardio, o neoclassicismo e o Pré-romantismo do final de século
AArcádia Lusitana ouUlissiponense,fundadaem1756,foiumaassembleiadeescritoresportuguesesqueprocuraramrenovaraliteraturapelaviadacríticaaosexagerospresentesnoBarrocoaté1776.LideradosporAntóniodinisdacruzeSilva(1731-1799),defendiamainspiraçãonosclássicosgregoselatinosenaprodu-çãoartísticarenascentista,utilizandopseudónimos.FoirefundadacomoArcádia Portuense (1767-1770)e,maistarde,comoNova Arcá-dia (1790-1794).
no longo prazo, foi a atividade literária dos membros destegrupo,comoPedrocorreiaGarçãooudomingosdosReisQuita,quepromoveuaaberturanecessáriaparaafuturaintroduçãodoRomantismo,principalmovimentoculturaldoséculoXiX.Paraalém da relevância cultural que os estrangeirados tiveram nasegundametadedoséculoXViiiportuguês,ainvasãodosideais
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daRevoluçãoFrancesa,iniciadaem1789,potenciouestatransiçãoliteráriaocorridaemPortugal,ondepoetascomoBocagedestaca-vamaânsiapelaliberdade.
nãoobstante,foiaascensãoeconómicaesocialdaburguesia,livredaculturaedosvaloresaristocráticos,queimpulsionouumnovogostopelaexpressão líricadossentimentos.OPré-roman-tismotevena4.amarquesadeAlorna,d.LeonordeAlmeidaPor-tugal(1750-1839),emJoséAnastáciodacunha(1744-1787)eemFilintoelísio(1734-1819),exemplosclarodametamorfoseculturaledeideaisduranteoúltimoquarteldoséculoXViii.
O neoclassicismo português, em termos arquitetónicos, tevecomoprincipaisdestaquesoPicadeiroReal(antigoMuseunacio-naldoscoches)eoHospitaldeSantoAntónio,noPorto.AculturaportuguesanofinaldoséculoXViiiéclaramentetraçadaporumacomplexateiadeinterpenetraçãoentreoBarrocotardio,oneoclas-sicismoeoPré-romantismo,ondeconstruçõescomoaBasílicadaestrela(1779-1790)eoTeatrodeÓperadeSãocarlos(1792)sãobemdemonstrativasdessamisturadeestilos.
Cronologia
Data Acontecimentos
1703 AssinaturadoTratadodeMethuen,entrePortugaleinglaterra.
1703-1714 ParticipaçãoportuguesanaGuerradeSucessãodeespanha.
1706 Falecimentoded.Pedroii,a9dedezembro.
1707 Subidaaotronoded.JoãoV,O Magnânimo.
1708 casamentoded.JoãoVcomd.MariaAnadeÁustria.
1709 BartolomeudeGusmãoiniciaaconstruçãodapassarola.
1713 AssinaturadoarmistíciocomaFrança(TratadodeUtrecht).
1714 nascimento,a6dejunho,dofuturoreid.Joséi.
1715 Assinaturadoarmistíciocomaespanha.
1716 FundaçãodoPatriarcadodeLisboa.
1717 iníciodaedificaçãodaBibliotecaJoaninanaUniversidadedecoimbraedoPalácio-conventodeMafra.
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1720 FundaçãodaAcademiaRealdaHistóriaPortuguesa,sobaégidedo4.ºcondedaericeiraedoclérigod.AntóniocaetanoeSousa.
1729 d.Joséicasacomd.MarianaVitóriadeBourbon.
1732 iníciodaedificaçãodoAquedutodasÁguasLivres(Lisboa)edaigrejadosclérigos(Porto).
1734 nascimento,a17dedezembro,dafuturarainhad.Mariai.
1736 Reestruturaçãodastrêssecretariasdeestado.
1750 Morteded.JoãoV,em31dejulho,esubidaaotronoded.Joséi,O Reformador.SebastiãoJosédecarvalhoeMelo,futuroMar-quêsdePombal,énomeadosecretáriodeestadodosnegóciosestrangeirosedaGuerra.AssinaturadoTratadodeMadrid(oudosLimites).
1751 AlvaráqueproíbeotransportedeescravosprovenientesdoBrasilparaespaçoscoloniaisquenãofossemdePortugal.
1752 Fundaçãodacapitania-GeraldeMoçambique.
1755 Terramotode1denovembrode1755.
1756 FundaçãodacompanhiaGeraldaAgriculturadasVinhasedoAltodouro.MarquêsdePombalassumeapastadosnegóciosdoReino.
1758 Atentadocontrad.JoséiemBelém.ProcessocontraosTávoras.
1759 FundaçãodacompanhiaGeraldecomérciodePernambucoeParaíbaeexpulsãodosJesuítas.
1760 d.Mariaicasacomotio,d.Pedroiii.
1761 criaçãodoRealcolégiodosnobres.
1767 nascimento,a13demaio,dofuturod.JoãoVi.
1768 introduçãodaRealMesacensória.
1777 Falecimentoded.Joséiesubidaaotronoded.Mariai,A Pie-dosa,econsequenteafastamentodoMarquêsdePombaldopoderpolítico.
1779 criaçãodaAcademiaRealdasciências.
1780 criaçãodacasaPiadeLisboa.
1782 Aliançaentred.MariaiecatarinaiidaRússia.
1785 d.JoãoVicasacomd.carlotaJoaquina.
1786 Morteded.Pedroiii.
1792 17médicosreconhecemainstabilidadementalded.Mariai.Governoentreguead.JoãoVi.
1792-1816 Regênciaded.JoãoVi.
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VI
PortuGAl Do FInAl Do AntIGo reGIMe
à AFIrMAção Do lIBerAlISMo (1807-1890)
Política e Guerra
As invasões francesas e o domínio britânico (1807-1820)
Portugal,nosprimeirosanosdoséculoXiX,estavademasiada-menteenraizadonoAntigoRegime,fugindoaosventosrevolucio-náriosquesopravamemFrança,frutodaaçãopolíticadainten-dência-GeraldaPolíciaoudaRealMesacensória.Apenasumapequenaeliteintelectualealgunsmembrosdaburguesiacomer-cial, reunidosmuitasvezes em lojasmaçónicas,pareciamestarinteressadosnosvaloresdaLiberdade,Fraternidadeeigualdade.
numaeuropaemquenapoleãoBonaparteprocuravadominarmilitareeconomicamente,d.JoãoVinãoaderiuaoBloqueiocon-tinental,em1807,mantendoasrelaçõesdeamizadecomosbritâ-nicos.depoisdePortugalterperdidooterritóriodeOlivençaparaespanha,duranteaGuerradasLaranjas(1801),oPaísvoltouaestaremconflitoe,nosquatroanosseguintes,viveuumasituaçãodra-mática:astrêsinvasõesfrancesas(1807-1811).
OBloqueiocontinentalfrancês,impostopornapoleãoBonaparte,em1806,àinglaterra,proibiatodosospaísesdeestabelecerrela-çõescomerciaiscomosbritânicos,comointuitodegerarumacrisenaquelepaíserealçaraimportânciafrancesanosmercadosinternacionais.
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Antesdachegadadas tropascomandadaspelogeneral Junot,emnovembrode1807,d.JoãoVieafamíliarealfugiramparaoBrasil,paraquenãofossemcapturadosePortugalperdesseainde-pendênciaenquantoestado.ORiodeJaneiropassouaserasededegovernoe,noanoseguinte,osportosbrasileirosforamabertosaocomércioestrangeiro,perdendoaexclusividadecomosnego-ciantesportugueses.
comoauxíliobritânico,emparticulardomarechalBeresfordedogeneralWellington,queficaramnocomandodastropasportu-guesas,foipossívelvencerosfranceses,lideradosporJunot,nasbatalhasdaRoliçaoudoVimeiro.Astropascomandadaspelogene-ralSoulttiveramomesmodestino,porocasiãodasegundainvasão(1809),bemcomoasdogeneralMassenanaúltimainvasão(1810-1811).FoinestederradeiromomentodeconflitoqueascélebreslinhasdeTorresVedras(conjuntodefortificaçõesemespaçosestra-tégicosnumsistemadetrêslinhasdefensivas)protegeramLisboa.
Paraalémdetodaadevastaçãoprovocadapelasinvasões,nomea-damentenaindústriaenaagricultura,edosdiversossaquesamos-teiros,paláciosouigrejas,esteperíodoficoumarcadopelodomí-nioeafirmaçãopolíticadosbritânicosemPortugal.entre1808e1820,Portugalviveucomoumacolóniabrasileiraeumprotetoradoinglês.
defacto,d.JoãoVi,aoadiarconstantementeoregressoaPortu-galeelevaroBrasilaoestatutodereino,em1815,permitiuqueosbritânicos,alémdeestaremincumbidosdeorganizaroexércitoeadefesadoterritórioportuguêsnasmaisaltaspatentesmilitares,ganhassemmaispoder.OmarechalBeresfordpassouacontrolarboapartedaeconomiaportuguesa,exerceuumadurarepressãosobretodosaquelesquefossemacusadosdeestaremligadosaosideaisdaRevoluçãoFrancesaereavivouainquisição.
Curiosidade: duranteagovernaçãodeBeresford,ogeneralGomesFreiredeAndradeemais11oficiaismilitaresforamexecutados,em1817,porestaremenvolvidosnumaconspiraçãoliberal.
História de Portugal
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Da revolução «Vintista» à Guerra Civil Portuguesa (1820-1834)
numquadroemqueaburguesiacomercialligadaaosnegócioscomoBrasileimportantesquadrosmilitaresforamsubstituídospelosbritânicos,foifundada,noPorto,em1818,umaassociaçãosecretadenominadaSinédrio.Uniumilitares,nobreseburguesescomumfortecunhomaçónico,etinhacomoprincipalpropósitoterminarcomodomínioinglês.
numclimaderevoluçõesliberaisumpoucoportodaaeuropa,nomeadamenteemespanhaeemnápoles,eaproveitandoadifu-sãodepropagandapolíticaquevinhadopaísvizinhoeaausênciaBeresford,quetinhaidoaoBrasil,oSinédriorecolheuosapoiosnecessários para o pronunciamento militar de 24 de agosto de1820,noPorto.AtravésdaJuntaGovernativa,osgeneraiseastro-pasbritânicasforamexpulsasdopaís.
ManuelFernandesTomásfoioprincipaldirigentedeumarevo-luçãoquerespeitavaocatolicismo,masqueansiavapelaconvo-caçãodascortesconstituintes epelo tão esperado regressoded.JoãoViaPortugal.Omovimentorevolucionáriorapidamentealastrou-sepelopaís,queseuniuemtornodaJuntaProvisionaldoSupremoGovernodoReino,órgãoquepreparouaseleiçõesparaascortesconstituintes.PelomeioaindaocorreuaMartinhada(novembrode1820)queexigiaaentradaemvigordaconstituiçãodecádis.
Aelaboraçãodaconstituiçãode1822duroumaisdeumanoemeioe,deformaresumida,permitiuaseparaçãodepoderes(oexecutivoficounasmãosdomonarcaedogoverno;olegislativonascortes;ojudicialnostribunais),previaaliberdadeeigualdadedoscidadãosperanteasleiseasoberaniadanaçãoatravésdovoto,queestavareservado,commuitasexceções,aoshomenscommaisde25anosquesoubessemlereescrever.
Masaelaboraçãodestaconstituição,alvodeintensosdebatesemdiversostemas,comoareligiãoouovetorégio,antecipouumaclaradivisãoentreumsectormoderadoeummaisradical.LideradoporManuelFernandesTomás,osectormaisradicalficouconhe-cidocomovintista,econseguiuimpediracensuraadeterminados
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escritos,evitarosistemabicameral,mantendoacâmaraúnica,ereduzira influênciadopoderdeveto.destaforma,asoberaniapopular,atravésdosrepresentantesdanação,prevalecia.
Oregressoded.JoãoVi,apósternomeadoofilho,d.Pedro,comopríncipedoBrasil,eoseujuramentoderespeitaraconstituiçãode1822,simbolizouofimdoAntigoRegimeeoiníciodaMonar-quiaconstitucional,emPortugal.
duranteaestadiaded. JoãoVieda famíliarealnoBrasil,aantigacolóniavivenciouumperíododegrandedinamismoeconó-mico,culturalepolítico,frutodaaberturadosportosànavegaçãointernacional,àelevaçãoareinoeaosurgimentodeinstituiçõesjudiciais,deensinoedeumanovadivisãoadministrativa.Maisimportantefoiodesenvolvimentodeumsentimentoindependen-tista/separatistaqueteve,em1789,oprimeiroexemplonainconfi-dênciaMineira.LideradaporJosédaSilvaXavier(oTiradentes),foiumaconspiraçãonacapitaniadeMinasGeraiscontraosimpostoseogovernocolonialportuguêsnoBrasil.
interessadosnoregressoàcondiçãodecolóniaenaproibiçãodocomérciodiretocomoutrospaíses,ascortesconstituintesrejei-tavamo«ReinodePortugaleBrasil»edesejavamqueLisboavol-tasseacontrolaraadministração,ajustiçaeosmilitaresbrasileiros.d.Pedro,quedeveriavoltaràeuropa,acaboupordeclararainde-pendênciadoBrasila7desetembrode1822,nofamoso«Gritodoipiranga».
nuncaaceitandooradicalismopresentenaconstituiçãode1822,ocleroeanobrezasentiam-seprejudicadoscomofimdosprivilé-gios,peloqueiniciarammovimentaçõesparaacontrarrevoluçãoquedeveriarestauraramonarquiaabsoluta.Oprínciped.Miguelearainhad.carlotaJoaquinaforamosprincipaisaliados.
em1823e1824,d.MiguelchefiouosgolpesdaVilafrancadaeaAbrilada,natentativadetravaroradicalismovintista,conseguindocolocarnogovernoliberaismoderadosquepropunhamalteraçõesàconstituição.noentanto,acabouporterdeseexilaremVienaporexigênciadopai.
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Amorteporenvenenamentoded.JoãoVi,O Clemente,a10demarçode1826,reiniciouoperíododetensãoentreliberaiseabsolu-tistas,principalmentedevidoàquestãodasucessão.comolegítimoherdeirodotrono,d.PedroeratambémimperadordoBrasil,oquepoderiacausarproblemas.Acabouporabdicardacoroaemfavordafilha,d.MariadaGlória,de7anos,quedeveriacasaroseuirmão,d.Miguel.Ambos juraramrespeitaranovacartaconstitucionalnumaépocaemqued.isabelMariaeraaregentedePortugal.
Curiosidade: numaanáliserecenteàsvíscerasded.JoãoVifoipos-sívelencontrarquatrovezesmaisdoqueaquantidadedearsénionecessárioparamatarumhomem.naépoca,ocronistaFreicláudiodaconceiçãoacompanhouadoençadomonarcaeasuspeitadeenvenenamentoestavapresente.
Oregressoded.MiguelaPortugal,em1828,acabouporcon-trariarojuramentoquefizera.numascortesconvocadasàmodadoAntigoRegime,foiaclamadocomomonarcaabsoluto,restituiutodososprivilégiosdanobrezaedocleroeiniciouumprocessodeperseguiçãoaosliberais.
duranteosprimeirostrêsanosdereinado,d.Miguelnãoenfren-touproblemasgravesrelativamenteàatuaçãopolítica,excetuandoasdificuldadesclarasnaprocuradelegitimaroseupoder,internaeexternamente.nestequadro,em1831,d.Pedroabdicadotronobrasileiro,concentraassuasforçasnailhaTerceira,reunindofun-dos,naviose7.500homenspararetiraroirmãodopoder.
Tendosidooutorgada,acartaconstitucionalfoiumainiciativadod.PedroiVenãodosrepresentantesdanaçãosendoqueassuasposiçõesrecuarambastantefaceàconstituiçãode1822.Bastasalien-tarqueinstituiuosistemadeduascâmaras(câmaradosdeputadosecâmaradosPares)e,principalmente,introduziuopodermodera-dordoreiquepodianomearedemitirogoverno,dissolveracâmaradosdeputados,nomearosParesouvetaralegislação.
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Aguerracivilportuguesa,entre1832e1834,iniciou-secomodesembarquenoMindeloquepermitiuafácilconquistadoPorto,enquantoastropasded.Migueldefendiam,principalmente,Lis-boa.nesteperíodo,viveu-seodramáticocercodoPorto(dejulhode1832aagostode1833),acabandooduquedaTerceiraporfurarobloqueionavaledirigir-seaoAlgarve,ondevenceuastropasabso-lutistaserumouaLisboasemgrandeoposição.
AassinaturadaQuádruplaAliança(inglaterra,França,espanhaePortugal),emabrilde1834,viriaaconsumaravitóriafinaldosliberaisportugueses,umavezquecontaramcomoapoiodetropasestrangeirasnasbatalhasdeAlmosteredaAsseiceira.d.MiguelfoiobrigadoaassinaraconvençãodeÉvora-Monte,abdicandodotronoepartindoparaoexílio.
9.d.PedroiVrestituiacartaconstitucionalde1826garantindodestaformaqueasuafilha,d.MariadaGlóriaherdaotrono,comod.Mariaii,(1832).
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Da instabilidade liberal à regeneração: Devoristas, Setembristas e Cabralismo (1834-1851)
Poucosmesesapósofinaldaguerracivil,d.PedroiVacaboupormorrer,aos36anos,erapidamenteabreveestabilidadepolí-ticavividafoipostaemcausa.AomesmotempoqueaRegênciaLiberaldosAçoresprocurouderrotarpelasarmasoexércitoabso-lutista,MouzinhodaSilveiraconstruíaoedifíciolegislativoqueasseguravaaperpetuaçãodoliberalismoemtermospolíticoseeco-nómicos.
dentrodestecorpodeleisé importanterealçaraextinçãodegrandepartedosmorgadios(patrimónioherdadopeloprimogé-nito),dosmonopóliosdovinhodoPorto,dodízimo,dosforaisebensdacoroaeamodernizaçãodajustiça,datributaçãoedaadmi-nistraçãopúblicaquedividiuoterritórioemprovíncias,comarcaseconcelhos.
nosquatrogovernosconservadoresnomeadospord.Mariaii,até1836,realceparaoministériolideradopeloduquedePalmelaeduquedeSaldanha,ondeJoaquimAntóniodeAguiar,decretouaextinçãodetodososconventos,mosteiroseordensreligiosasparaquefossemincorporadosnoestado.Asuavendaemhastapúblicareduziuosvaloresdedívidascontraídasduranteoconflito.
Apenasumaminoriadeburguesesendinheiradosfoicapazdeadquiriraimensidãodepropriedadesàvenda.Poressemotivo,epelasacusaçõesdecorrupção,esteperíodoficouconhecidocomoodosdevoristas.
numaclaracríticaàspráticasdestesgovernos,a9e10desetem-brode1836,d.Mariaiifoiobrigadaaentregaropoderaosrevo-lucionários«setembristas»quecontaramcomoapoiodaGuardanacional(umaorganizaçãoparamilitarcriadaem1822,extintaem1823erestauradaem1834),dopovodeLisboa,quedeu«vivas»àconstituiçãode1822,edeumapequenaemédiaburguesia.
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esteperíododaHistóriadePortugalédetalformamarcadoporintensosmomentosdedivisãopolíticaque,mesmoàdistância,noexílio,d.Miguelinuncarenunciouàsuapretensãocomolegí-timomonarca.Apoiou,porexemplo,astropasdolíderguerri-lheiro«Remexido»quesemantevefielàcausamiguelistanosuldoPaís.
divididosentreumafaçãomoderada,quecontavacomimpor-tantes políticos como Passos Manuel, o 1.o visconde de Sá daBandeiraouBernardodeSánogueiradeFigueiredo,eumafaçãoradical,ondesedestacavaJoséestevão,oprincipalpropósitodossetembristaspassavapordevolverasoberaniaànação,verdadeirafontedepoder,contrariandooespíritodacartaconstitucionalde1826,outorgadapelorei.
nestesentido,foipreparadaaconstituiçãode1838que,suma-riamente,manteveoequilíbrioentreoradicalismodaconstituiçãode1822eocarácterconservadordacartaconstitucionalde1826.nestenovotextoconstitucional,influenciadopelasconstituiçõesbelgaeespanhola,adivisãotripartidadopoder(judicial,legislativoeexecutivo)eraimperial.Omonarcaperdeuopodermoderador,masmanteveovetoabsolutodasleissaídasdacâmaradosParesedacâmaradosdeputados.Paraalémdeassegurarosdireitosindividuais,comoaigualdadeperantealei,consolidouadescen-tralizaçãoadministrativaeimpôseleiçõesdiretas,atravésdovotocensitárioquelimitavaamplamenteaparticipaçãopolítica.
Osgovernossetembristaspautaram-sepelatentativadereduzirainfluênciainglesanaeconomiaportuguesa,impondotaxasalfan-degáriassobretodososprodutosqueconcorressemcomaindústriaeagriculturanacionais.Paraalémdetersidoproibidootráficodeescravosasuldoequadoredeseterefetuadoumaprofundareformanoensino,criando-seescolaspolitécnicas,conservatóriosdearteseofíciosoufundando-seosliceus,agravecriseeconómicaqueopaísatravessouduranteesteperíodo,nomeadamenteafaltadecapitais,acabouporinfluenciaracurtavidadaconstituiçãode1838.
Ostrêsgovernos,conhecidoscomoordeiros,foramincapazesdeimplementarnopaísaestabilidadepolíticanecessária,easdivisões
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foram-seperpetuando,sendoumexemploclaroastentativasante-rioresderestauraracartaconstitucional,nomeadamenteatravésdogolpedaBelenzada(1836)oudarevoltadosMarechais(1837).
Curiosidade: nanoitede4para5denovembrode1836,arainhad.Mariaii,osseusconselheiroseoduquedaTerceiratentaramummalogradogolpepalacianopararestauraracartaconstitucional,conhecidocomoBelenzada.
Seriaumpróprioaderentedosetembrismo,oministrodaJus-tiça,Antóniocostacabral(1803-1889),que,emfevereirode1842,promoveriaumgolpedeestadoquepôsfimàconstituiçãode1838erestaurouacartade1826.entre1841e1846,costacabralassen-touasuainfluência,nomeadamenteatravésdagrandeburguesia,nosprincipaisoficiaisdoexércitoecomogrão-mestredoGrandeOrienteLusitano(maiorlojamaçónicaportuguesa).Governouporduasocasiões,1842-1846e1849-1851,ficandoesteperíododaHis-tóriaconhecidocomocabralismo.
coordenadapeloduquedaTerceiraeoduquedeSaldanha,arevoltados«Marechais»iniciou-senaviladePontedaBarca,a12dejulhode1837,terminandooscombatesapenasemsetembro,atravésdaconvençãodechaves,quesimbolizouarendiçãodastropasrevoltosas.
Amplamenteapoiadopelarainhad.Mariaiieporumcontextointernacional propício ao conservadorismo, nomeadamente emespanhaeFrança,costacabralcentralizouoestado,atravésdanomeação de governadores civis, administradores de concelhoeregedoresdeparóquia,edeumexércitofavorávelaocartismoqueassegurasseaordempública.nestequadro,justifica-seonovocódigoAdministrativo(1842)eapolíticadesaneamentodemaisde200oficiaissetembristasporocasiãodarevoltamilitarde4defevereirode1844,iniciadaemTorresnovas.
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natentativadefomentarosdiferentessectoresindustriais,criouacompanhiadasObrasPúblicasdePortugal(1844),parapromo-verumaclaramelhorianasviasdecomunicaçãoportuguesas,efacilitouoacessoaocrédito.comumamaiorparticipaçãoestatalnaeconomiae,consequentemente,umclaroaumentonadespesa,oestadoportuguês,em1846,via-seàbeiradabancarrota.
numcontextosensívelededificuldadeseconómicasesociais,contando-seváriosmotinspopulares,aprimeirafasedegoverna-çãodecostacabralculminariacomapromulgaçãodasleisqueproibiramosenterrosnointeriordasigrejas,as«Leisdaestrada»,e a burocratização do pagamento de impostos. em 1846, já seformavam Juntas Revolucionárias que uniam, espantosamente,setembristasecartistaspuroscontraoautoritarismocabralista.
Curiosidade: Antóniocostacabralfoiaindaacusadodenepotismo,istoé,favorecimentopolíticoaparentes.Oseuirmão,JoséBernardodaSilvacabral,foifeito1.ºcondedecabraleganhoucargosnumgovernoconhecidocomodosCabrais.
comoreaçãoaestas leis,emabrilemaio iniciaram-seváriosmotins que ficaram conhecidos como a revolta da «Maria daFonte»,cujoepicentrofoioMinho.estarevoltateveimpactoumpoucoportodoopaíse,politicamente,forçouaoexíliodecostacabralqueforademitidopelarainhad.Mariaii.
Menos de cinco meses após a tomada de posse de um novogoverno, lideradopeloduquedePalmela,overdadeiroclimadeguerracivilregressavaaoPaís,apósogolpeda«emboscada».comreceiodeserdeposta,arainhadestituiogovernoenomeouocar-tistaduquedeSaldanha.noPortorompearevoltada«Patuleia»,alastrando-seacoimbra,Aveiro,AlgarveeSantarém.
entreoutubrode1846ejunhode1847,opaísatravessououtrogravemomentode instabilidadepolítica, económicae social.Aintervençãoestrangeira,aoabrigodaQuádruplaAliançade1834,terminouoconflito,comaassinaturadaconvençãodeGramido,a27dejunho.estemomentoacabouporrepresentarumdosúlti-mossuspirosdosetembrismo,umavezquecostacabralvoltou
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àliderançadogovernoem1849,permanecendoatéaogolpedaRegeneração,em1851,que,finalmente,trariaaansiadaestabili-dadepolíticaesocial.
Arevoltada«Patuleia»,tradicionalmente,possuiduasorigens/significados:pataaoléu(oupédescalço)ouaexpressãoespa-nhola«soldadescasemdisciplina».
A Paz da regeneração e o rotativismo Partidário (1851-1890)
emabrilde1851,oduquedeSaldanha,noPorto,liderouoiní-ciodeumpronunciamentomilitar,preparadoideologicamenteporAlexandreHerculano,quedestituiuocabralismo.Adecadênciadapolíticaportuguesa,doimpériocolonialeasdivisõessociaisforamascausasparaqueesta«Regeneração»tenhasidoomovimentoquetrouxeconsensopolíticoepazànação.A22demaio,onovogoverno,presidido por Saldanha, teria como ministro da Mari-nha,daFazendaedaindústria,AntónioMariaFontesPereiradeMelo(1819-1887),omaisinfluentepolíticoportuguêsdasegundametadedoséculoXiX.
durante30anos,opaísdigladiou-seeestegolpeprocurouhar-monizar as consciências e as discordâncias entre as diferentescamadassociais,estabelecendotrêsmedidasparaaunião:
1–Revisãodacartaconstitucional,atravésdoAtoAdicionalde1852,queampliouosufrágioeinstituiueleiçõesdiretasparaacâmaradosdeputados;
2–estabelecimentodorotativismopartidário,istoé,apossibi-lidadedospartidospolíticos(PartidoProgressistaRegeneradoreoPartidoProgressistaHistórico)alternaremnopoder,equilibrandoosseusinteresses;
3–Fomentododesenvolvimentoeconómico,atravésdacons-truçãodeinfraestruturasaoníveldasviasdecomunicaçãoedostransportes.
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naprimeira fasedesteperíodo,que incluiofinaldoreinadoded.Mariaii(1853),aregênciaded.Fernandoii(1853-1855),oreinadoded.PedroV(1855-1861)epartedoreinadoded.Luísi(1861-1889),ocorreumarenovaçãonaselitespolíticas,afirmando--seosgovernosdoduquedeSaldanha(1851-1856),doduquedeLoulé(1856-1859),doduquedaTerceira(1859-1860)oudeJoaquimAntóniodeAguiar(1865-1868).Aestabilidadepolíticaobtidapelaalternânciadospartidosfoifundamentalparaodesenvolvimentodopaís,sendoapenasinterrompidapela«Janeirinha»(1868)epela«Saldanhada»(1870).
A«Janeirinha»foiummovimentocontestatárioiniciadoa1dejaneirode1868contraosurgimentodas leisquecriavamumimpostosobreoconsumoeprocediamaumareformaadminis-trativadoterritórioportuguês.Resultandonaquedadogoverno,oduquedeÁvilaacabouporgarantiraafirmaçãopolíticadoPar-tidoReformista,criadoem1862,depoisdeumacisãonoPartidoProgressistaHistórico.
OmarechalJoãoOliveiraedaun(1790-1876),duquedeSalda-nha,depoisdeumalongacarreirapolítico-militar,ecom80anos,liderouopronunciamentomilitarde19demaiode1870(«Salda-nhada»)queforçouoreid.LuísademitirogovernododuquedeLoulé(PartidoProgressistaHistórico).depoisdeapenastrêsmesesnoexecutivo,esemoapoiodomonarca,oduquedeSaldanhafoidestituídoenomeadoembaixadordePortugalemLondres.
duranteasdécadasseguintes,excetuandoempequenoshiatos,oPartidoRegenerador,coordenadoporFontesPereiradeMeloatéàsuamorte,eoPartidoProgressista(fusãoentreoPartidoRefor-mistaeoPartidoHistórico,porocasiãodopactodaGranja,em1876),quecontoucomnomescomoJoséLucianodecastroouAnselmo JoséBraancamp, continuarama alternâncianopoder,impedindoaafirmaçãopolíticadepequenospartidos,comooPar-tidoSocialistaPortuguês(1875)ouoPartidoRepublicanoPortu-guês(1876).
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Divisão político-partidária portuguesa na segunda metade do século XIX
VERSUS
o início do fim: ultimato inglês de 1890 e revolta do 31 de janeiro de 1891
numquadrodedisputa e competição internacional pelo alar-gamentodos impérios coloniais, aconferênciadeBerlim (1884-1885)destacou-seporaquiloqueficouconhecidocomoa«partilhadeÁfrica».Substituindoodireitohistóricodadescobertapelodi-reitodaocupaçãoefetiva,ospaísesmenosindustrializadosecommenospoderforamclaramentesubjugadosaosinteressesbritâni-cos,alemãesefranceses.
comointuitodeafirmarosinteressesportuguesesnocontinenteafricanofoidesenhado,em1886,o«Mapacor-de-rosa».PortugalexigiaaocupaçãodosterritóriosentreAngolaeMoçambique,quehojecor-respondemàZâmbia,ZimbabweeMalawi.enquantoaAlemanhaeFrançaaceitaramasexigênciasnacionais,avelhaaliadainglaterracon-trariouestasreivindicações.Osbritânicos,nomeadamenteograndeempresáriocecilRhodes,tinhamprojetadoocaminhodeferroque
Partido regenerador (1851-1901)RodrigodaFonsecaMagalhães;FontesPereiradeMelo;HintzeRibeiro
Partido Histórico (1852-1876)duquedeLoulé;Alexandre
Herculano
Partido reformista (1862-1876)cisãodoPartidoHistórico–
MarquêsSádaBandeira
Partido Progressista (1876-1910)FusãoentreoPartidoHistóricoeoPartidoReformista
comopactodaGranja.JoséLucianodecastroeAnselmoBraancamp
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ligariaacidadedocabo(ÁfricadoSul)aocairo(egito).nestemapaestavamincluídososterritóriosquePortugaldesejava.
O «Mapa cor-de-rosa» também se denominou projeto BarrosGomes,umavezqueHenriqueBarrosGomes(1843-1898)era,naépoca,oministrodosnegóciosestrangeirosdonossoPaís.emanosanteriores,jásetinhaprocuradoafirmarapresençaportu-guesaemÁfrica,nomeadamenteatravésdediversasexpediçõesdeSerpaPinto,BritocapeloouRobertoivens.
numa clara atitude de supremacia político-militar, o recém--aclamadoreid.carlos i recebeuummemorando,emformadeultimato,dogovernodeLordSalisbury,a11dejaneirode1890,noqualeraexigidoquePortugalretirasseastropasdeSerpaPintodosterritóriosentreAngolaeMoçambique.casoestepedidonãofos-serespeitado,inglaterradeclaravaguerraaPortugal.Ogovernoed.carlosacederamdeimediatoaopedido,oqueacabouporgerarumaintensaondadecontestaçãopopular.
Oaproveitamentopolíticoporpartedosrepublicanosnosmeiosurbanosfoimarcadoporumferozataqueàfigurarealeàsinstitu-içõesmonárquicas,ganhandoadeptosnoPorto,LisboaeSetúbal.A31dejaneirode1891ocorreu,noPorto,aprimeiratentativarevo-lucionáriacontraamonarquiaqueprocurouinstauraraRepública.eraoiníciodofimparaamonarquiaconstitucionalportuguesa.
Curiosidade: O«UltimatoBritânico»estánaorigemdohinonacio-nalA Portuguesa.compostoporAlfredoKeileescritoporHenriqueLopesdeMendonça,osversosContra os canhões, marchar, marchar!eraminicialmentedirigidosaosingleses:Contra os bretões, marchar, marchar!
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economia e Sociedade
o fim do ciclo brasileiro: o «Grito do Ipiranga»
PoucomaisdeumséculodepoisdadescobertadoouroedosdiamantesdoBrasiledodesenrolardeumaclaradependênciadePortugal facea estemercadocolonial, o«Gritodo ipiranga»eaconsequente independência geraram um período de grave criseeconómicanonossoPaís.
comoconsequênciainicialdafugadacorteparaoBrasiledaaberturadosportosbrasileirosa«todasasnaçõesamigas»,istoé,aocomérciointernacional,aperdadomonopóliodematérias-pri-maseprodutosalimentarestrouxeamisériaaosburguesesportu-gueses.Aassinaturadeumtratadodecomérciocomainglaterra,em1810,veioconfirmargrandepartedascláusulasprevistasnoTratado de Methuen, passando as mercadorias inglesas a entrarcomgrandefacilidadenomercadobrasileiroeosbritânicospassa-vamaadquirirprodutosda,ainda,colónia.
Antesdisto,Portugalabastecia-sefacilmentedealimentos,comocafé, arroz ou açúcar, e também de algodão e outros produtos,comotabaco,madeiraoupelesque,posteriormente,eramreexpor-tadosparaosmercadoseuropeus.esteacordofoiprofundamentenegativoparaosnossosinteresseseveioempobrecerseriamenteasfinançaspúblicas.Atítulodeexemplo,entre1796e1806,maisdetrêsquartosdocomércioportuguêscaracterizava-sepelareex-portaçãodeprodutosbrasileiros.
Aomesmotempo,nãoépossívelcolocardeparteossaquesefe-tuadosduranteasinvasõesnapoleónicasouacontraçãodedívidascomaGrã-Bretanhapelaajudamilitarprestadaduranteestesanos.Ajuntagovernativaimpostapelarevoluçãovintista,em1820,de-claravacomoasreceitasdoestadoeramlargamenteultrapassadaspelasdespesas,ocomércioeaagriculturaestavamestagnadoseamisériaimperava.
comaindependênciadoBrasil,em1822,eos30anosdelutasliberais,PortugalacabouporperderocomboiodosefeitosiniciaisdaRevoluçãoindustrial.Apenasumrestritolequedeintelectuais
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compreendiacomoeraurgenteoPaísentrarnumanovafaseeco-nómica,desenhandoumplanoquemodernizasseosectoragríco-laedesenvolvessea indústria,contrariandoosváriosséculosdeexploraçãocomercialultramarina.A«libertaçãodaterra»,atravésdaeliminaçãodosmorgadios,ouaextinçãodeváriosencargosàcirculaçãointernademercadorias,comasreformasdeMouzinhodaSilveira,foramasprimeirastentativaspararecuperaranossaeconomia.
os efeitos do fontismo e o take-off industrial português
ApazdaRegeneração,quetrouxeestabilidadeeequilíbriopolí-tico-partidárioaosistemaportuguês,permitiuumintensoinvesti-mentonamodernizaçãodoPaís.criadoem1852,oMinistériodasObrasPúblicas,comércioeindústriafoichefiadopeloengenheiroAntónioFontesPereiradeMeloque,perantea importânciaquetevenestecontextoatémorrer,em1887,criouoléxicofontismo.Ogovernantedefendia,deformaresumida,quesemacriaçãodein-fraestruturas,comoviasdecomunicaçãoeodesenvolvimentodostransportes,oPaísnãopoderiaenveredarporumvirardepáginanaeconomia.
nestequadrodedesejodecriaçãodeummercadointernoquerompessecomoisolamentodedeterminadasregiõesedemelho-riadasrelaçõesinternacionais,aapostaimediataprendeu-secomaampliaçãodasredesrodoviáriaeferroviária.noprimeirocaso,foipossívelaumentarparapertode10milquilómetrosnofinaldoséculo,enquantoquenosegundo,todoopaísjáestavaligadoatravésdoscomboiosede2070quilómetrosdelinhasdecaminhodeferro.
Oprimeirotroçodecaminhodeferrofoiinauguradoa28deoutubrode1856,pord.PedroV,euniaLisboaaocarregado.OcomboioatingiuoMinhoem1877,Trás-os-Montesem1883eoAlgarveem1889.Aomesmotempo,foramreestruturadosalgunsportos,instalou-seotelégrafo(1857)eotelefone(1882)eforaminauguradasalgumaspontes,comespecialdestaqueparaaponte
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d.MariaPia(1877)ouaponted.Luís(1886)queuniramasmar-gensdoriodouro.
Curiosidade: Ainauguraçãodoprimeirotroçodecaminhodeferro,Lisboa/carregado,teveváriosproblemas.inicialmente,receou-sequeapontedeSacavémnãoaguentasseopesodalocomotivae,depois,omaufuncionamentodomotorobrigouaqueseiscarrua-gensfossemsoltasparasepoderterminarotrajeto.nototal,estaprimeiraviagemduroumaisdecincohoras!
Recorrendoaempréstimosouacapitalestrangeiro,ondesedes-tacou o Henry Burnay (1838-1909), a revolução nos transportesportuguesespermitiuqueacirculaçãodepessoasoumercadoriassetornassemaiscómoda,barata,segurae,maisimportante,muitomaisrápida.domesmomodo,serviçoscomooSud-Express,umaligaçãodiretaLisboa–Madrid–Paris,possibilitouacirculaçãodeescritores,jornalistaseartistasquecontactavamdiretamentecomosprincipaiscentrosculturaisetecnológicos.
Opreçoapagarpeloinvestimentonofontismoacabouporsur-girem1892,quandooestadoportuguêsassumiuaincapacidadedepagarassuasdívidasedeclaroubancarrota.entreogolpedaRegeneraçãoeoUltimatoBritânico,adívidapúblicaportuguesacresceumaisdeoitovezese,aocontráriodoqueseriasuposto,asinfraestruturasnãodinamizaramsuficientementeaeconomiaportuguesa.
Curiosidade: OprimeiroautomóvelemPortugalpertenceuad.Jorged’Avillez,4.ocondedeAvillez,naturaldeSantiagodocacém,tendosidocomprado,em1895,àempresaPanhard & Levassor.Aveloci-dademáximaeraatingidaaos20km/hora!
comcercadeumséculodeatrasofaceainglaterraedecincodécadasrelativamenteaFrançaouAlemanha,otake-offindustrialportuguêsdecorreusobosignodaincapacidadedecompetirnos
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mercadosinternacionaisedopoucoinvestimentodosempresáriosnacionais.Osgrandeshomensdenegóciosviamnomercadoimobi-liárioenosectorbancárioáreasmaislucrativosdoqueaindústria.
Semmatérias-primasourecursoshumanosqualificados,osin-quéritos industriais do final do século demonstram que apenas20%dapopulaçãoestava ligadaaomundo industrial,nomeada-menteàsfábricasdecimentoeconservas,aotabaco,vestuário,cal-çado,àmetalomecânicaouaovidro.Asuadisposiçãogeográfica,comojásereferiu,eranasduasgrandescidades(LisboaePorto),eapenasnoséculoXXviriaaultrapassaraagriculturacomoprinci-palatividadeeconómica.
o fim da sociedade de privilégios e a vida quotidiana no século XIX
entreoadventodaRevoluçãoLiberalde1820eareuniãodascortesconstituintes,comvistaàpreparaçãodaprimeiraconsti-tuição Portuguesa, viveram-se tempos novos no País. inspiradospelaRevoluçãoFrancesaepelaconstituiçãodecádisde1812,apartirde1822surgiramosdireitosindividuais,nomeadamenteagarantiadequetodososportugueseseramiguaisperantealei,quepodiammanifestarlivrementeasuaopinião,queninguémpoderiaserpresosemumjulgamentoetinhamdireitoàpropriedade.
Osrecuospolíticosdacartaconstitucionalde1826,eofactodeestesdireitosteremsidorelegadosparaofinaldodocumento,nãocolocaramemcausaosprofundosavançoscivilizacionaisdestepe-ríodo.Vivia-se,finalmente,numasociedadesemprivilégios,ondetodoseramiguaisperantealei.
Basta,paraisso,sublinharasalteraçõesnavidaquotidianaemPortugal,ondeanobrezapassouapagarimpostoseocleroviuoseupatrimóniobastantereduzidoapósaextinçãodasordensreli-giosas,em1834,eaexpropriaçãodeterrasparapossedoestado.Ao mesmo tempo, a burguesia passou a representar o principalestratosocial,umavezqueosmaisimportantescargosdaadmi-nistraçãopúblicaedogovernoeramocupadosporcomerciantes,industriaisoubancáriospoderosos.
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nãoobstante,averdadeéqueogrossodapopulação,apesardeobterdireitosinalienáveis,continuouaviverempéssimascondições,comafomeeostrabalhosmalremuneradosacaracterizarfamíliasinteirasquesededicavamàagriculturadesubsistência.nocampo,osassalariados trabalhavam,normalmente,paraumnobreouumburguêsimportante.Raroseramoscasosemquepossuíamproprie-dadespróprias.Acriaçãodegado,apardaagricultura,eraoutraativi-dadeeconómicaimportantenumPortugalaltamenteruralizado.
ApartirdasegundametadedoséculoXiX,ecomolentopro-cessodeindustrialização,asmigraçõesinternasparaLisboa,Portoou Setúbal resultaram no fenómeno denominado «êxodo rural».Simultaneamente,aurbanizaçãopotenciouatransformaçõesnascidades,surgindoaaberturadeavenidas,passeios,jardins,merca-dos,teatros,estaçõesferroviáriasoudailuminaçãopública.
comodesenvolvimentoeconómicodoBrasileabancarrotade1892,aemigraçãoparaaantigacolóniateveumgrandeimpacto.cercade50milportugueseschegaramasairdoPaís,em1895.AmaioriaeraprovenientedosarquipélagosdosAçores,Madeira,deTrás-os-MontesoudoMinho.
destemodo,oshábitosecostumesforamsendopaulatinamentealterados, incluindoaonívelda alimentação, lazerouhabitação.enquantoopovotinhaumaalimentaçãodeficitáriaepoucovaria-da,anobrezaeaburguesiaalimentavam-sedeformaabundantenassuasluxuosasmoradias.Passeandonosjardinspúblicos,indoaoscafés,ao teatro,àóperaouaosbailes,opróprioconceitodedivertimentorevolucionou-senestaépoca.
PrimeirosnasgrandescidadesdoPortoeLisboae,maistarde,empequenas«ilhasindustriais»nolitoraldopaís,agrandealteraçãonacomposiçãosocialfoiosurgimentodooperariado.Trabalhandocercade12horasdiáriasemfábricascomcondiçõesdeploráveisecomsaláriosmuitobaixos,asuatomadadeconsciêncianalutapordireitosemelhorescondiçõesdevidaalterouorumodaHistória.Orecursoàgrevecontrariavaasexigênciasdospatrões.Asmulhe-reseascrianças,queocupavamlugaresqueexigiammenorforçafísica,ajudavamosmaridosepaisnaobtençãoderendimentos.
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Cultura e Artes
o século do romantismo
AvagarevolucionáriaqueinspirouoLiberalismoteve,também,impactonaculturaenasartesquesublinhavamarelevânciadatríadeliberdade,igualdadeefraternidade.OlivroOs Sofrimentos do Jovem Werther (1774),doalemãoGoethe,oquadrodopintoreugènedelacroix,A Liberdade guiando o povo(1830),ouasóperasnacionalistasdeGiuseppeVerdisãoexaltaçõesclarasdalongevi-dadedoRomantismo.
contrariando o século das Luzes e da Razão, este movimentoculturalteveorigemnaAlemanhaecaracterizou-sepelahipervalo-rizaçãodoindividualismoeocultodo«eu»,pelarelevânciaeânsiadadaà liberdade,pelocultodoespíritonacionalista,peloprazernanaturezaeexacerbaçãodossentimentos.Omal du siècledosseusautoreséumreflexoclarodeumasociedadeondeirrompeuaRevoluçãoindustrial,cujastransformaçõespromoviamasolidão.ORomantismorepresentouaascensãosocialdaburguesia,alutacontraoabsolutismoeaemancipaçãodosprincípiosdeadmiraçãodosclássicos,traduzindo-seemobraslivres,criativasesubjetivas.
Autores comoWalterScottouVictorHugo, ao contráriodosrenascentistasedosiluministas,recuperaramogostopelaidadeMedieval,ondeencontraramasraízeshistóricasdasnacionalida-des,potenciadascomaunificaçãodaitáliaoudaAlemanha.Osheróismíticoseasprincipaisfigurashistóricasdecadapaíssãoevocadas,numcontextoemqueoscostumes,astradiçõeseopopu-larsãoopanodefundodahistóriadapátria.Énaobscuridadedesteperíodoqueseencontraogostopelasombra,pelatempestadeoupelanoite.nocasoportuguês,SintrafoiacidadedoRomantismo.
Tradicionalmente,ospoemasCamões(escritosemParisnoanode1825),eD. Branca(1826),deAlmeidaGarrett(1799-1854)sãoencaradoscomooiníciodoRomantismononossopaís.
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AlexandreHerculano(1810-1877)foioutroexemplodainfluênciadosromânticoseuropeusporocasiãodoexílio.Osconfrontosentreliberaiseabsolutistastiveramumprofundoimpactoparaatãoal-mejadaLiberdade.doescritoretambémhistoriador,ficaramlivrosdaépocavisigóticaemEurico, o Presbítero(1844)oudoperíododed.JoãoiemO Monge de Cister(1848).Obrasclássicasdequempro-duziudurantetodaavida,incluindoumaHistória de Portugal.
de Almeida Garrett, outro dos vultos do Romantismo, pode-mosdestacarobrascomoUm Auto de Gil Vicente(1842),Frei Luís de Sousa (1844)ouoromancehistóricoViagens na Minha Terra(1846).
numa época posterior, e também demonstrativa da perpetua-çãodestemovimentoculturalemPortugal,camilocasteloBranco(1825-1890) escreveuAmor de Perdição (1861)ouA Queda dum Anjo(1866),ondeseobservaumaumentoprofundodopessimis-mo,doexagerodos sentimentosque serãoaindamaisevocadosnosultrarromânticos,comoAntónioFelicianodecastilho(1800--1875).Rodeadodeescritoresmenosreconhecidos,nomeadamen-teTomásRibeiroouJoãodeLemos,ostemasrelativosàvisãopes-simistadavidaouoamorinfelizvãomarcarestaúltimavagaro-mânticanaliteraturaportuguesa.
Ao contrário de outros períodos, este estilo artístico foi maismarcante na literatura do que em qualquer outro tipo de artes.napinturadestacaram-sedomingosAntónioSequeira,TomásdeAnunciação,JoãocristinodaSilvaouLeonelMarquesPereira,en-quantonaesculturaosnomesmaisreconhecidosforamSoaresdosReis,SimõesdeAlmeida,VictorBastosouAntónioTeixeiraLopes.
Da Questão Coimbrã e da Geração de 70 ao realismo
Aproveitandooclimadeestabilidadepolíticaedeascensãoso-cialpelaviadaocupaçãodecargosimportantesnaadministraçãopública,osultrarromânticos(ousegundageraçãodoRomantismo)jáseafastavamdosideaisdeAlmeidaGarrettouAlexandreHercu-lano,incorporandoumaproduçãoformaleacadémica.
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num quadro de expansão e inovação tecnológica promovidapelo fontismoepelos«melhoramentosmateriais»,umgrupodeestudantesdaUniversidadedecoimbra,entreosquaissedestaca-vamAnterodeQuental,TeófiloBraga,eçadeQueirósouOliveiraMartins,procurou renovaras letras e a culturaportuguesa, comcríticasaoestilodogrupodeAntónioFelicianodecastilho.
Apósapublicação,em1865,deOdes Modernas,deAnterodeQuental,edeTempestades Sonoras,deTeófiloBraga,AntónioFeli-cianodecastilhoaproveitouoposfáciodoPoema da Mocidade(Pinheirochagas)paracriticarabertamenteaposturadosjovensdecoimbraqueescreviamdeformavanguardista,comfaltade«bomsensoebomgosto».comestaspalavrasamargasiniciava-se,a2denovembrode1865,aQuestãocoimbrã.AnterodeQuentalrespondeuatravésdeumacartairónicaesarcástica,comomesmotítulo das palavras escritas por castilho, onde afirmava que osultrarromânticosestavamultrapassadosequeosseusescritosemnadaestavamrelacionadoscomosproblemasreaisdasociedade.
Curiosidade: AQuestãocoimbrãteráterminadonumdueloàespadaentreAnterodeQuentaleRamalhoOrtigão,a4defevereirode1866,emArcad’Água,nacidadedoPorto.nãoobstante,algunsanosmaistarde,ambosacabaramporsetornarbonsamigos.
Semprepreocupadocomoatrasoeestagnaçãoideológicapor-tuguesa, Antero de Quental cria as conferências do casino, emLisboa,atravésdogrupocenáculo,vulgarmenteconhecidocomo«Geraçãode70».ForamesteshomensqueabriramasportasparaaintroduçãodanovavagadeRealismoquemarcariaaviragemdoséculoXiXparaoséculoXXnonossoPaís.
entre22demarçoe26dejunhode1871,noLargodaAbegoa-ria,emLisboa,Adolfocoelho,AnterodeQuental,eçadeQueirós,JaimeBatalhaReis,OliveiraMartins,ManueldeArriaga,TeófiloBraga,entreoutros,reuniram-separadiscutirerefletiremtornodosdiversosproblemasdaculturaportuguesa.AconferênciadeeçadeQueirós,O Realismo como nova expressão da arte,eAsCau-
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sas da Decadência dos Povos Peninsulares,deAnterodeQuental,foramdasmaispopularesnaépoca.
Amplamentepreocupadoscomasrepercussõesquepoderiater,osgovernantesdaépocaencerrarameproibiramasconferênciasdo casino, impedindo palestras programadas para os meses se-guintes.daaçãodesta«Geraçãode70»encontramosa tentativadelevaraopúblicoodebateemtornodaestagnaçãodasclassespolíticaseintelectuaisportuguesas,representandouma«lufadadear fresco»nanossacultura, inspiradapelas tendênciasde ideaiscomoosdeProudhon.
nummundodegrandestransformaçõeseprogressos,oRealis-mosurgecomomovimentoculturalquetravouaadmiraçãopeloperíodoMedievaleprovocouanecessidadederetratarasociedadeemredor,talqualexistia.napinturaenaesculturaevidencia-seareproduçãoneutradarealidade,banalizando-seoretratodoquoti-diano,masmantendoorespeitopelorigoreformalismo.critican-doosubjetivoromântico,aobjetividadedoartistaerafundamen-talparatransmitiraverdadeobservadacomrigoreexatidão.Aquiencontram-seasmaiorescríticasàsociedadeoitocentista,nomea-damenteosmauscostumes,víciosouimoralidade.
nocasoportuguês,destacou-senapintura JoséMalhoa (1855--1933),enquantonaliteraturaeçadeQueirósproduziuumvariadolequedeobrasrealistas,nasquaissedestacamOs Maias(1888),O Crime do Padre Amaro(1875)ouO Primo Basílio(1878).
Principais construções e monumentos do século XIX em Portugal
no âmbito arquitetónico, o Romantismo no nosso País foicaracterizadopelarecuperaçãoerevivalismodetendênciasrela-cionadas com o estilo Manuelino, Gótico e influências árabes,demonstrandoogostopelaevocaçãodeumpassadohistórico.nãoobstante,éimportanterecordarqueaprimeirametadedoséculoXiXfoimarcadapelafugadacorteedafamíliarealparaoBrasil(1807-1820),pelaindependênciadaantigacolóniaepelassucessivasguerrasliberais.nestecontextodedificuldadeseconó-
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micaseconflitos,operíodonãofoipropícioàedificaçãodenovosmonumentos.
noquadrodoRomantismo,d.Fernandoii(1816-1885),maridodarainhad.Maria ii,acabouporpatrocinaramaiorevidênciaarquitetónicadesteestiloemPortugal,oPaláciodaPena,emSin-tra.construídoentre1840e1847,projetadopeloalemãoBarãodeeschwege,ostraçosdeneogóticoeneoárabesãocomplementaresaoestiloneomanuelinoquedominaaconstrução.TambémemSin-trafoiprojetadaaQuintadaRegaleira,porLuigiManini.
AestaçãodoRossioéumdosmaisparadigmáticosexemplosdoneomanuelino.TendosidoprojetadaporJoséLuísMonteiro,foiconstruídaentre1886e1887,tendoasuaedificaçãoficadoacargodasempresasDuParcly & Bartissol,Papot & Blancharde Beraud.Foiinauguradaa18demaiode1890,entrandoemfuncionamentoemjunhodoanoseguinte.
nomesmosentidovaioHotelPaláciodoBuçaco,desenhado,também,porLuigiManini,querevelaumaclara inspiraçãoemdiversoscastelosalemãesqueforamtransformadosempalácios.Asobrasarrancaramem1888,contandocomintervençõesdediversosoutrosarquitetos,podendo-sedestacarrepresentaçõesdeproduçãoartísticapresentesnaTorredeBelém,noconventodecristoounoMosteirodosJerónimos.
emboracommenorpeso,oneogóticoeoneoárabetiveramoapogeunasduasúltimasdécadasdoséculoXiX.OelevadordeSantaJusta,cujasobrasdecorreramentre1898e1902,sobumpro-jetodeRaoulMesnierduPonsard,é,aparcomaigrejadeReguen-gosdeMonsaraz,omaiorexemplodoneogóticononossoPaís.
Jánocasodas construçõesneoárabesé inevitáveldestacaraPraçadeTourosdocampoPequeno,inauguradaem1892,edese-nhada por António José dias da Silva. como outros exemplostemosaQuintadoRelógio,emSintra,eoPaláciodaBolsa,atualsededaAssociaçãocomercialdoPorto.
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Cronologia
Data Acontecimentos
1802 nasce,emQueluz,ofuturod.Migueli.
1806 napoleãoBonaparteimpõeoBloqueiocontinental.
1807 espanhaeFrançaassinamotratadosecretodeFontainebleauqueprevêapartilhadePortugal.PrimeirainvasãofrancesaaPortugalpelogeneralJunot.FugadafamíliarealparaoBrasil.
1808 enviodeumacartarégiaaabrirosportosbrasileirosàs«naçõesamigas».OgeneralinglêsWellingtonlidera,juntamentecomomarechalBeresford,oexércitoanglo-português.BatalhasdeRoliçaeVimeiro.
1809 SegundainvasãofrancesaaPortugal,pelogeneralSoult.
1810 TerceirainvasãofrancesaaPortugal,pelomarechalMassena.BatalhadoBuçacoebatalhadaslinhasdeTorresVedras.
1811 OmarechalMassenaretira-sedePortugal.Fimdasinvasõesfrancesas.
1815 d.João,regente,criaoReinoUnidodePortugal,BrasileAlgarves.
1816 Morteded.Mariaieascensãoaotronoded.JoãoVi.
1817 GomesFreiredeAndradeéexecutadodepoisdeumaconspira-çãoliberal.d.Pedro,filhoded.JoãoVi,recebeotítulodePríncipedoBrasil.
1818 Futurod.PedroiVcasacomd.MariaLeopoldinadeÁustria.
1819 nasce,noRiodeJaneiro,afuturad.Mariaii.
1820 RevoluçãoLiberalnoPorto,a24deagostode1820.
1821 Regressoded.JoãoViaPortugal.d.PedroficacomoregentedoBrasil.
1822 «Gritodoipiranga»–d.PedroproclamaaindependênciadoBrasil.d.JoãoVijuraaconstituiçãoLiberal.
1823 «Vilafrancada»– tentativadegolpedeestado lideradapord.Miguel.
1824 novogolpeded.Miguel,a«Abrilada»,quelevaaoseuexílio.
1825 PortugalreconheceaindependênciadoBrasil.
1826 Morteded.JoãoVi.d.PedroiV,comoreidePortugal,juraacartaconstitucional.PorserimperadordoBrasil,abdicadotronoportuguêsemfavordafilha,d.Maria,quedeveriacasarcomotio,d.Miguel.
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1828 Regressoded.Miguel iaPortugal,ondeéproclamadoreiabsoluto.
1831 d.PedroiVabdicadotronodoBrasileregressaaopaís.
1832 d.PedroassumearegênciaemnomedafilhaedesembarcanoPortocomumexército.ReformasdeMouzinhodaSilveira.
1832-1834 Guerracivilportuguesa,entreliberaiseabsolutistas,ondesedes-tacamasbatalhasdeAlmostereAsseiceiraouocercodoPorto.
1833 OduquedaTerceira,comandantedastropasliberais,ocupaLisboa.d.MigueléforçadoadeslocaroseugovernoparaSantarém.
1834 AssinaturadaconvençãodeÉvora-Monte,onded.MiguelaceitasairdePortugal.decretoqueextingueasordensreligiosas.Morteded.PedroiVesubidaaotronoded.Mariaii.
1836 Revolução «Setembrista» que leva à abolição da cartaconstitucional.Tentativadegolpeda«Belenzada»queenvolverainhad.Mariaii.
1838 d. Maria ii jura a nova constituição votada pelas cortesconstituintes.
1842 costacabralrestauraacartaconstitucional.
1846 Revoltada«MariadaFonte».Guerracivilda«Patuleia».
1851 Pronunciamentomilitarda«Regeneração».
1852 AtoAdicionalàcartaconstitucional.
1853 Morteded.Mariaii.d.Fernandoficanaregência.
1855 d.PedroVsobeaotrono.
1856 PrimeirotroçodecaminhodeferroemPortugal.
1858 d.PedroVcasacomd.estefâniadeHohenzollern-Sigmaringen.
1861 Morteded.PedroVesubidaaotronodoirmão,d.Luísi.
1862 casamentoded.Luísicomd.MariaPiadeSaboia.
1868 Rebeliõescríticasdosistemafiscal–«Janeirinha».
1869 Aboliçãodaescravaturanosterritóriosportugueses.
1876 FundaçãodoPartidoProgressista,atravésdoPactodaGranja.
História de Portugal
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1884 «Mapacor-de-rosa»apresentadonocongressodeBerlim.
1886 d.carlos,príncipeherdeiro,casacomd.AméliadeOrleães.
1889 Morteded.Luísiesubidaaotronoded.carlosi.
1890 «UltimatoBritânico».composiçãodofuturohino,A Portuguesa.
1891 Revoltade31dejaneironoPortoquetentainstauraraRepública.
1892 Bancarrotaparcialdoestadoportuguês.
1895 MouzinhodeAlbuquerquecapturaoGungunhana, reidosVátuas.
155
VII
PortuGAl Do FInAl DA MonArQuIA
à entrADA nA C.e.e. (1890-1986)
Política e Guerra
A queda da Monarquia Constitucional e a implantação da república (1890-1910)
depois da malograda tentativa de implantar a República noPorto,em1891,d.carlosprocurourenovaraselitespolíticasdeumvelhoedesgastadorotativismopartidário.nessesentido,duranteasúltimasduasdécadasdo regimemonárquicoemPortugal, o«regenerador»ernestoHintzeRibeiro(1849-1907)eo«progres-sista»JoséLucianodecastro(1834-1914)foramospolíticosquemaistempoestiveramnogoverno,alterandoostatus quodoscaci-quismoslocaisparaassuasredesclientelares.
10.FamíliaRealdePortugal(1899).
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nãoobstante,aimplantaçãodaRepúblicaemPortugal,a5deoutubrode1910,foioresultadodaconjugaçãodeumacrisemul-tifacetada,marcadaporumacomplexaconjunturapolítica,eco-nómicaesocialnosúltimos20anosdaMonarquiaconstitucio-nal.comocoresprincipaisdestequadro,éimportantedestacaramobilizaçãodaopiniãopúblicaperanteoUltimatoinglês(1890),atentativarevolucionáriadoPorto(1891),abancarrotadoestado(1892),aincapacidadeecorrupçãodosgovernosemsolucionarosproblemasdopaíseoconsequenteaproveitamentodapropagandarepublicanaparaangariarapoiosedifundirosseusideais.
Opanodefundodopaísfoicaracterizadopelamisériadoope-rariadourbano,oselevadosíndicesdeemigração,asdificuldadesdomundoruralouosmagrossaláriosdaclassemédia.excetuandoumaaltaburguesialigadaaopoderpolítico,ainsatisfaçãodasocie-dadeportuguesa,principalmentenosmeiosurbanos,possibilitouoacolhimentodosideaisrepublicanos.
Odescontentamentodasociedadeportuguesaduranteasúlti-masduasdécadasdamonarquiaficoupatenteatravésdasgreves,tendoocorrido60até1899e91entre1900e1910.Asparalisaçõesforamossímbolosdaagitaçãosocialedasdificuldadesvividas.
Paralelamente,deve-seaindasalientaradesvalorizaçãodamoeda,osaltosníveisdeinflação,odesemprego,afalênciadeempresasebancos,osescândalosdos«adiantamentos»àcasaReal(fundospúblicosutilizadospelafamíliareal)eosescândalosfinanceiros(casodocontratodemonopóliodotabacoquefavoreceuafirmadeHenryBurnay).
comumalegislaçãopoucopunitivarelativamenteàimprensa,estaacabouporrepresentarumdosprincipaisveículosdedifusãodopensamento republicano,particularmenteatravésde jornaisqueatacavamferozmenteafigurarealeacorrupçãodospartidosmonárquicos.invocandoanecessidadederecuperaropatriotismoouamoraldehomenscomocamões,adecadêncianacional,pre-sentenostextosliteráriosdeváriosautoresdaépoca,nomeada-
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menteAntónionobreouGuerraJunqueiro,eracoladaaocontextovivido.
OPartidoRepublicanoPortuguês,fundadoem1876,transmitiaaideiadequeaRepúblicaseriaasoluçãoparatodosestesproblemasequeaMonarquiaeraaculpadadetodososmales.HomenscomoTeófiloBraga,Afonsocosta,MagalhãesLima,ManueldeArriagaouAntónioJosédeAlmeidaforamfundamentaisnestasações.Foipossível,assim,obterosvotosnecessáriosparaqueosrepublicanosfossemeleitosduranteamonarquia.
O extremar de posições na vida política portuguesa ocorreuaquandodanomeação,peloreiDiplomata,deJoãoFranco(1855--1929)parachefedegoverno,em1906.estapersonagemliderouumacisãointernanoPartidoRegenerador,criandooPartidoRege-nerador-Liberal,em1901,eaproveitouaquedadosgovernos,pro-vocadapela«QuestãodosTabacos».depoisdeprometer«governaràinglesa»(afastaroreidalutapolíticaepermitiradiscussãonascâmaras),acaboupor«governaràturca»,pedindoad.carlosparagovernaremditadura.
Arepressãodesteperíodo,principalmentedepoisdomalogradoGolpedoelevadordaBiblioteca,acaboupormotivaraconspiraçãorepublicanaparaoassassinatoded.carlosiedopríncipeherdeiro,d.LuísFilipe,a1defevereirode1908,emplenoTerreirodoPaço,àsmãosdeManuelBuíçaeAlfredocosta.
Curiosidade: O«GolpedoelevadordaBiblioteca»,a28dejaneirode1908,foiumatentativadeimplantaraRepúblicaemLisboa.ResultounaprisãodeAfonsocosta,egasMoniz,Franciscocor-reiadeHerédiaeoutrosrepublicanos.Odecretode30dejaneiroobrigavaosconspiradoresaoexílioouaexpulsãoparaascolónias.
Omaisfilhomaisnovoded.carlosieded.Amélia,d.Manuelii,subiuaotronocom19anosetentoucontrariaraspolíticasdopai,aodemitir JoãoFrancoenomearumgovernode«Acalmação».duranteosúltimosmesesdamonarquia,maisdecincogovernosforamincapazesdecontrariarorumodosacontecimentos.
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divididosinternamenteentreumaviapacifista(pelaseleições)e aquelesqueadvogavamavia revolucionária, os republicanosencontraram-seemSetúbal,entreosdias23e25deabrilde1909,paraoXcongressodoPRP,onde sediscutiucomodeveria serimplantadaaRepública.comaeleiçãodonovodiretório,ficoudecididoquearevoluçãoeraocaminhoidealparaderrubarasins-tituiçõesmonárquicas.
nosdias4e5deoutubrode1910,apósconfrontosemLisboa,incluindobombardeamentosaoPaláciodasnecessidades,aRevo-luçãocolocouumpontofinalnoregimemonárquico.ARepúblicafoiproclamadanavarandadoedifíciodacâmaraMunicipaldacidade,às9horas,porJoséRelvas.naericeira,d.ManueliieamãeembarcaramnoiateAméliarumoaoexílio.
Curiosidade: Odr.MiguelBombarda(1851-1910)eoalmirantecândidodosReis(1852-1910)eramdoisdosprincipaiselementosquecoordenavamosplanosparaaimplantaçãodaRepública.Oprimeirofoimortoporumdoentemental,doisdiasantesdarevo-lução,nohospitaldeRilhafoles.Osegundo,entretanto,receandooinsucessodarevolução,suicidou-senavéspera.
11.Revoluçãode5deoutubrode1910.
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entreoutubrode1910eapromulgaçãodanovaconstituição,emagostode1911,ogovernoprovisóriofoipresididoporTeófiloBraga,contandocomapresençadeAfonsocosta(Justiça),AntónioJosédeAlmeida(interior),BernardinoMachado(negóciosestran-geiros),JoséRelvas(Finanças)ouBritocamacho(Fomento)nosdiferentesministérios.A24deagostode1911,ManueldeArriagafoieleitocomooprimeiroPresidentedaRepúblicae,a3desetem-bro,éescolhidooprimeirogovernosegundoosprincípiosdanovaconstituição.
A instabilidade e a ação política da Primeira república (1910-1926)
numaeuropapredominantementedominadapormonarquiaseimpérios,Portugaleraacompanhandoapenaspelarepúblicafran-cesaepelaSuíça,encontrando-sepoliticamenteisolado.Oreco-nhecimentointernacionaldaRepública iniciou-senospaísesdaAméricaLatina,nomeadamentenoBrasileArgentina,seguindo-senaçõescomooseUA.ApromulgaçãodaconstituiçãoeaeleiçãodoPresidentedaRepúblicapermitiuquefranceses,ingleses,alemãeseespanhóisreconhecessemonovoregime.
estanovaconstituiçãotrouxemudançasàvidapolítica,rom-pendoclaramentecomacartaconstitucional,aosubstituirafigurarégiapelaeleiçãodeumPresidente,cujomandatoeradequatroanos(nãorenovável),comumpodersubstancialmentemenor.AoPresidentedaRepúblicacabiaapenasanomeaçãodogoverno,nãopodendovetarleisoudissolveroParlamento.
Por outro lado, o congresso da República, dividido entre acâmaradosdeputados(mandatosdetrêsanos)eoSenado(man-datosdeseisanos),possuíaoprincipalpoderpolítico,umavezqueeraorepresentantedasoberaniadanaçãoeogarantedapro-moçãodobem-estargeral.Atravésdeeleiçõesporsufrágiodireto,ossenadoreseosdeputadosproduziamepromulgavamas leis,elegiamedestituíamoPresidentedaRepúblicaepodiamdemitirosgovernos.Odireitodevotoeraapenasconcedidoaoshomensmaioresde21anosquesoubessemlereescrever,ouaoschefesde
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família,totalizandopoucomaisde400mileleitoresnumuniversode6milhõesdeportugueses.
carolina Beatriz Ângelo (1878-1911), ginecologista, foi a pri-meiramulherportuguesaavotarnumaseleições.Aproveitandoo buraco na lei referente aos «cidadãos portugueses» (que,gramaticalmente,incluiogénerofeminino)argumentouque,porserviúvae«chefedefamília»,tinhadireitoaovotonaseleiçõesparaaAssembleiaconstituintede1911.Aleifoialteradalogoaseguir.
Quantoàbandeiraazulebranca,aoHino da Cartaeaoreal,estesforamsubstituídospelabandeiravermelhaeverde,pelaPor-tuguesaepeloescudo,comosímbolosdeumnovoregime.imi-tandoafiguradeMarianne, tambémumamulherrepresentariaaRepúblicaPortuguesa,tendosidoamodeloildaPulgaamusainspiradoradoescultorSimõesdeAlmeida.
dependendoopoderexecutivo(Governo)dopoderlegislativo(congressodaRepública),ainstabilidadepolíticadaiRepúblicafoipraticamenteumaconstante,conhecendo45governos,oitopre-sidentesdaRepúblicaeseteeleiçõesgeraisparaocongresso.Aolongodestes16anosoPaístevedoisperíodosdeditadura.PrimeirosobocomandodePimentadecastro(janeiro–maiode1915)edepoisdeSidónioPais(dezembrode1917–dezembrode1918).
entreasváriasesferaspolítico-partidáriasdestenovoregimepolítico,osprimeirosanospautaram-sepelapredominânciadoPRP,cujoprincipallíderfoiAfonsocosta(1871-1937),epelaopo-siçãodoPartidoevolucionista,deAntónioJosédeAlmeida(1866--1929)edoPartidoUnionista,deBritocamacho(1862-1934).
comoassassinatodoPresidente-Rei,SidónioPais,a5dedezem-brode1918,eaproclamaçãodaMonarquiadonorte,otempoda«RepúblicaVelha»(1919-1926)chegou,unindounionistaseevolu-cionistasnoPartidoLiberalRepublicano,contraahegemoniadoPRP.Maistarde,em1923,oPartidoRepublicanonacionalistareuniuadireitarepublicana.nestafasedecadentedoregimerepublicano,
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váriasforamascisõesinternasnoPRP,oqueacaboupordarorigemaoPartidoReconstituinte(1920),aoPartidoRepublicanoRadical(1922)ouaoPartidoRepublicanodaesquerdademocrática(1925).
entre19dejaneiroe13defevereiro,aJuntadonorteproclamouaMonarquianoPorto,conhecidocomo«Monarquiadonorte»,constituindo um organismo presidido por Paiva couceiro. AsbatalhasemMonsanto(Lisboa)ouAngeja(Aveiro)acabaramporsecaracterizarcomoumaverdadeiraguerracivilentrerepublica-nosemonárquicos.AentradadastropasrepublicanasnoPortopôsfimaobreveconflito.
Outroexemploparadigmáticoquerefleteacomplexidadepolí-ticadesteperíodofoia«noiteSangrenta»de19deoutubrode1921,apósadeposiçãodogovernodeAntónioGranjo.nestanoiteforam assassinados, por marinheiros e arsenalistas revoltosos,MachadoSantos,carlosdaMaia,FreitasdaSilvaeAntónioGranjo.
Aexecuçãodopensamentorepublicanofoicolocadaempráticaemdiferentescontextos.Aconstituiçãode1911aboliutodosostítulosnobiliárquicoseosprivilégiosexistentespornascimento.Aomesmotempo,oanticlericalismoestevepresenteatravésdaLei da Separação do Estado das Igrejas,implementadapelominis-trodaJustiça,Afonsocosta,em1911.destaforma,ocatolicismodeixoudesera religiãooficialdoestado,oensinoreligiosofoiproibidoeasordensreligiosasforamexpulsaseosbensnaciona-lizados.numPaísmaioritariamentecatólico,estasmedidaschoca-ramasmentalidadesdaépocaeforamumdosprincipaismotivosparaqueaRepúblicaganhassealgunsopositoresentreosmeiosconservadores.
emtermossociais,asLeis da Famíliamelhoraramaigualdadedegénero,terminaramcomadiferençaentrefilhoslegítimoseile-gítimos,implementaramocasamentocomoumcontratocivilquepodiaserrompidopelodivórcioecriaram-seapoiossociaisparaavelhiceenocasodeinvalidez.JáasLeis do Trabalhogarantiramodireitoàgreve,odescansosemanaleafixaçãodas48horasde
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trabalhoporsemana.ParaambososcasosédesalientaracriaçãodoMinistériodoTrabalhoedaPrevidênciaSocial,em1916.
Apesardestesimportantesavanços,queprocuravamcumpriraspro-messasrealizadasaomovimentooperário,olock-outacabouporrepre-sentarumcontrapontonadefesadosdireitoslaborais,jáquereforçouopoderdasentidadespatronais.AprópriaG.n.R.atacouseveramenteouniversooperário,utilizandoarmasdefogoparaoreprimir.
Curiosidade: nacomissãonomeadaparaacriaçãodabandeiranacionalestavamincluídosAbelBotelho,JoãochagasecolumbanoBordaloPinheiro.entreoverde,doscamposeflorestas,eoverme-lho,dosrevolucionáriosedosquemorrerampeloPaís,oescudoeaesferaarmilarevocamafundaçãodoPaíseosdescobrimentos.Asquinassimbolizamosmourosderrotadospord.AfonsoHenriquesnabatalhadeOuriqueeossetecastelosrepresentamosqueforamconquistadospord.Afonsoiii.
FoinoquadrodoensinoqueaRepúblicainvestiumais,natenta-tivadereduzirosníveisdeanalfabetismoexistentes(maisde70%),abrindomaisescolasereforçandooensinoprimárioobrigatório,entreos7eos10anos.Simultaneamente,criouaUniversidadedeLisboaeaUniversidadedoPorto,ambasem1911,estabelecimen-tosdeensinoparaqueosprofessoresobtivessemumaformaçãomoderna,ereformouoensinotécnico-profissional.OMinistériodainstruçãoPública,criadoem1913,conseguiureduzirosníveisdeanalfabetismoemcercade10%em16anos.
Poroutrolado,umadasprincipaiscausasparaaconstanteinsta-bilidadevividaforamasprofundasdificuldadeseconómico-finan-ceiras.durantetodaaiRepública,apenasosgovernosdeAfonsocosta (1913-1914)edeÁlvarodecastro (1923-1924)apresenta-ramvaloresequilibradosnascontaspúblicas.extrapoladaspeloimpactodaGrandeGuerra,oselevadosdéficesdabalançacomer-cial,asubidaexponencialdadívidapúblicaeodesequilíbriodasfinançasmotivaramumadesvalorizaçãodamoeda,altosíndicesdeinflação,reduçãodopoderdecompraeaumentodeimpostos.
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AconsequênciafoiumclarosentimentodetraiçãoporpartedascamadassociaismaisbaixasqueconfiaramnaRepúblicaparaaresoluçãodosproblemas.AiGuerraMundialtrouxeaescassezalimentareaespeculação,eoaçambarcamentoprovocouintensosmomentosdereivindicaçãosocial.Oclimaerapropícioparaumarevoltacontraosistemarepublicano,tendoSidónioPaisiniciadoauniãodasdireitas republicanas edos sectores conservadores,ensaiandooprincípiodofimdoregime.
A ditadura sidonista ficou marcada pelo Presidente da Repú-blicaSidónioPais,quefundouoregimepresidencialistanoqualochefedeestadoé,aomesmotempo, líderdogoverno.Sus-pendendoaconsultadocongressodaRepúblicaereformandoaconstituiçãode1911,centralizouarelevânciapolíticanopoderexecutivo,naprocuradaestabilidade.
o 28 de maio e a Ditadura Militar (1926-1933)
numaeuropamarcadapelaascensãodospartidosedeideolo-giasdeextrema-direita,principalmenteemitália,comMussolini,ouemespanha,comPrimodeRivera,oreceiodaexpansãodocomunismotambémsealastrouemPortugal.Aproveitandoumatempestadeperfeitadeconstantesmudançasnosgovernos,asdifi-culdadeseconómico-financeirasdaRepúblicaeosentimentodetraiçãodoblocosocialdeapoioao5deoutubro,ogeneralGomesdacosta,a28demaiode1926,liderouumpronunciamentomili-tar,provenientedeBraga,quepôsfimaoregimeemLisboa.
AquedadogovernodeAntónioMariadaSilvaeademissãodeBernardinoMachadocomochefedeestadoacabouporcongre-garrapidamenteoapoioaosmilitaresporpartedadireitarepu-blicana,deconservadores,católicos,nacionalistaseatémonárqui-cos.Jáa18deabrilde1925,váriosgeneraistinhamensaiadoumarevoluçãoquepusessetermoao«parlamentarismo»,aocaciquismoadministrativoeaocontroloeleitoraldoPRP.
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numa fase transitória, atéàeleiçãodeÓscarcarmonacomoPresidente da República, em 1928, sucederam-se as quezíliasentreGomesdacosta,Mendescabeçadaseoprópriocarmona,principaisdirigentesdaditaduraMilitar.Os trêsdisputavamopoderentreeles,aomesmotempoqueincorporavamnovoscor-posgerentesnosprincipais cargospolíticos.As suasprincipaismedidascentraram-senadissoluçãodocongressodaRepública,noestabelecimentodacensuraeumaeficazrespostaaosataquesdo«Reviralho».
O«Reviralho»(1926-1940)foionomedadoaoconjuntodeten-tativasrevolucionáriasdereposiçãodoregimerepublicanocoor-denadospelaoposiçãoliberaledemocráticacontraaditadura.
entreestasrevoltasrepublicanas,importadestacaratentativaderevoluçãoemfevereirode1927,arevoltadocastelode1928,arevoltadaMadeira(1931)ouomovimentode26deagostode1931.Portrásdealgunsdestesmomentosestevea«LigadeParis»(LigadedefesadaRepública)quecontavacomantigosrepublica-nosexilados.
numquadropolíticoemqueassoluçõesfinanceirasdaditaduranãopareciamresultar,AntóniodeOliveiraSalazar (1889-1970),professordeeconomiadaUniversidadedecoimbra, foi convi-dadoparaassumiroMinistériodasFinanças.Aascensãopolíticadaquelequefoiapelidadode«MagodasFinanças»ficoumarcadapelassuasexigências,nomeadamenteocontroloabsolutodosorça-mentosdetodososministérios,deformaaimporumaausteridadesevera,nomeadamenteatravésdeumbrutalaumentodeimpostosquedificultaramprofundamenteodiaadiadaspopulações.
Osexcelentesresultadosobtidospossibilitaramque,pelapri-meiravezemváriosanos,opaísapresentasseumsaldopositivo.imitandoa lógica fascistadeMussolini,«Tudonoestado,nadacontraoestado,nadaforadoestado»,Salazarpotenciouoslogan «Tudopelanação,nadacontraanação»,obtendotantoprestígioqueacabouporassumirachefiadogovernoem1932,preparandoopaísparaumnovocapítulodasuaHistória.
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Curiosidade: nodiscursodatomadadepossecomoministrodasFinanças,OliveiraSalazarproferiuafrase:«Seimuitobemoquequeroeparaondevou.»encarandooproblemadasfinançaspúbli-cascomoestandointimamenteligadoàausênciadeautoridadedoestadoliberal,asoluçãodoproblemapolíticoseriaumadasques-tõesbaseparaseimporumnovomodeloeconómico.
Da institucionalização do estado novo ao final da Guerra Colonial (1933-1974)
Pelaviadeumplebiscitonacional,ocorridoemmarçode1933,anovaconstituiçãofoiaprovada,concedendoplenospoderesaumnovosistemagovernativo,denominadoestadonovo,lideradoporOliveiraSalazar.Aexpressãoplebiscitofoiutilizadaapenasporpropaganda,umavezqueopropósitodestaformadevotaçãonãoédelegarpoderesilimitadosaosrepresentanteseleitosintem-poralmente.
nestetextoconstitucional,decunhoprofundamentepresiden-cialista,osdireitosdoscidadãosestavamsubordinadosaosinteres-sescoletivos,rejeitandoporcompletoademocracia,aliberdadeouoparlamentarismo.Anaçãoeraentendidacomoumtodoorgânicoenãoasomadeumconjuntodepersonalidadesisoladas,cujavoca-çãoevontadespolíticassedistinguiam.Aorganizaçãodopoderpolíticoassentavanumaclarasupremaciadopoderexecutivosobreolegislativo,tendoemvistaaconstruçãodeumestadoforteeauto-ritário,paraevitarainstabilidadedoperíodorepublicano.
OpresidentedoconselhodeMinistros(líderdogoverno)pos-suíaatotalidadedospoderes,jáquesuperintendiaaaçãopolí-ticadosministros(quepodiademitirounomear),promulgavadecretos-lei e referendavaos atosdoPresidentedaRepública.Aindaqueafiguramaiordoestado tivesseapossibilidadededemitir o presidente do conselho, Salazar (1932-1968) nuncafoiafastadodaliderança.Paraissomuitocontribuiuo«cultodapersonalidade»,ouseja,aconstruçãodomitodeSalazarcomo«SalvadordaPátria»,comcapacidadessuperioresparaguiaros
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destinosdopaís.nassalasdeaula,oseuretratoencontrava-sejuntoàcruzdecristo.
A Assembleia nacional, composta apenas por deputados doúnicopartidolegal(Uniãonacional),eraoórgãodesoberaniacomopoderlegislativo,massemodireitodefiscalizarasaçõesgoverna-tivas.PodiaserdissolvidopeloPresidentedaRepúblicacaso«assim o exigirem os interesses superiores da Nação»(artigo81.o).
A institucionalizaçãodoestadonovofoiaindaefetuadapelaviadaideologia,incutindoumconjuntodevalores«sagrados»deíndoleconservadoraetradicional,nomeadamente«austeridade»,«Pátria»,«família»,«pazsocial»ou«deus».Paralelamente,surgiuumnacionalismoexacerbadoquepotenciouaelevaçãoapoteóticaeglorificantedaHistóriadePortugal,cujosheróis,comod.AfonsoHenriques,VascodaGama,nunoÁlvaresPereiraoucamões,repre-sentavamagrandezadosportugueses.
nestemesmoâmbito,oestadonovoreforçoua ideiadequeos portugueses eram especialmente aptos para o colonialismo,devendooPaíscontinuaracumprirasua«missãohistórica»,evan-gelizandoospovosnativos.OAtocolonial,publicadoa8dejulhode1930,comOliveiraSalazarnoministériodascolónias,redu-ziuprofundamenteaautonomiaadministrativaeeconómicadascolónias,centralizandoainfluênciapolíticanogovernocentral.Oartigo2.odestetextotransmiteestasideiasdeformaclara:«É daessência orgânica da Nação Portuguesa desempenhar a função his-tórica de possuir e colonizar domínios ultramarinos e de civilizar as populações indígenas que neles se compreendam.»
Curiosidade: OestadonovoempreendeuumapolíticaquetentoupromoveranoçãodequePortugaleraumpaísqueultrapassavameramenteoterritórioeuropeu.em1935,umcartazalusivoàgrandezadoimpériocolonial,organizadoporHenriqueGalvão,colocavatodasascolóniassobreospaíseseuropeusetinhacomotítulo:Portugal não é um país pequeno.
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Apreservaçãodoregimeeocontrolodasmassas,comosepoderávercommaiorprofundidadenosegmentoeconomiaeSociedadedestecapítulo,foipromovidaatravésdarepressãopolíticadaPolí-ciadeVigilânciaededefesadoestado,dacensura,dopartidoúnico(Uniãonacional),daLegiãoPortuguesaoudaMocidadePor-tuguesa.
comforteinfluênciaestrangeiraemodificadoparaocontextoportuguês,ocorporativismofoiométododeintegraçãoeconómicaesocialquepermitiuaoestadonovoafirmaraautarcia(autono-mia/independência)económico-financeiraeo intervencionismoestatalqueparticipava intensamentenaagricultura, indústriaeobraspúblicas.Aestabilidadefinanceira,umdosprincipaisgaran-teslegitimadoresdoestadonovo,procurouserconseguidapelaviadasolidezdamoedaedoaumentobrutaldosimpostos,paraaobtençãodereceitasfiscaiselevadas.Foitambémimplementadaumapolíticadecontrolodasimportações,deformaareduzirsubs-tancialmenteodéficedabalançacomercialportuguesa.
Paraprosseguiromodelodeautarciaeconómica,aagriculturafoialvodeprofundasreformasquevisavampotencializarassuasvirtudes.ParaalémdatentativadefixaçãodepopulaçãonointerioratravésdaJuntadecolonizaçãointerna,dairrigaçãodossolos,doaumentodaproduçãoagráriaemculturascomoacortiça,batataouazeite,deve-sedestacaraimitaçãodaBattaglia del Grano,deitália.A Campanha do Trigo (1929-1937)procuravaaumentarosíndicesdeproduçãodestecerealcomointuitodediminuirasuaimportação.comumsucessorelativo,esteempreendimentoveionalinhacríticadosmalefíciosdourbanismoedaindustrialização.noentanto,aagriculturaportuguesamantevebaixosíndicesdeprodução,quandocomparadoscomarestanteeuropa.
no sector secundário, o condicionamento marcou a políticaindustrial,ondeodirigismoeconómicotevecomomissão,princi-palmentedesdeaLein.o1956,controlareprevenirosurgimentooumodernizaçãodeempresascomdinamismoeconómico.Paracom-prarmáquinas,alargarespaçosdeproduçãoouampliaronúmerodetrabalhadoreseraobrigatóriopassarporumalentaecomplexaburocracia.destaforma,existiaapossibilidadedeoestadoevitarcrisesdesuperproduçãoeaconcorrênciaempresarialquecaracte-
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rizavaocapitalismoliberal.Oresultadofoiumaprofundaestag-naçãotecnológica,acriaçãodemonopólios,comoacompanhiaUniãoFabril(cUF)ouaSiderurgianacional,ealentaultrapassa-gemdonúmerodetrabalhadoresindustriaisfaceaosrurais.
ApósofinaldaiiGuerraMundial,naqualPortugalsedeclarouneutral,ostrêsplanosdefomento(1953-1958;1959-1964;1968--1973)foramlentamentereconhecendoaimportânciadaindústriaparaodesenvolvimentoeconómico,superandoamerapolíticadesubstituiçãodeimportações.Sónoiníciodadécadade1960équeaapostanasindústriasdebase,juntamentecomaintegraçãonaeFTA(europeanFreeTradeAssociation),projetouaeconomiapor-tuguesa,dandoinícioaummovimentoqueculminou,noperíodomarcelista,comorompimentodegrandepartedapolíticadecon-dicionamentoindustrialsalazarista.
PortugalnocontextodaiiGuerraMundialassinoutrêstratados:1–TratadodeAmizadeenão-Agressãocomespanha (1939);2 –PactoAnti-Komitern (1939) comaAlemanha, a itália e oJapão;3–AcordoLuso-Britânico(1943)queconcedeuasLajes(Açores)aosbritânicose,maistarde,aoseUA.
Apesardossobressaltospolíticosprovocadospelaseleiçõesde1945,1949e1958(comHumbertodelgado),edaiiGuerraMun-dialterrepresentadoaderrotadosfascismos,ocontextointernacio-naldeGuerraFria(eUAvsUniãoSoviética)foiumdosprincipaisfatoresparaoprolongamentodosalazarismoduranteboapartedadécadade1950,jáqueocombateaocomunismoerabemmaisimportantedoqueumpequenoestadoditatorial.Asverdadeirasdificuldadesdoregimeiniciar-se-iamnaquelequeficouconhecidocomooAnnus Horribilisde1961.
emprimeirolugar,emjaneirodesseano,HenriqueGalvão,noMardascaraíbas,assaltouonavioportuguêsSanta Maria,natenta-tivadeprotestarcontraaausênciadeliberdadepolítica.Humbertodelgado,umdosprotagonistasqueorganizoueste apresamento,
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encontrava-senoBrasil,paísondeos17oposicionistasiriamobterexílio.nomêsdeabrilde1961,oministrodadefesa,JúlioBotelhoMoniz,liderouatentativadepronunciamentomilitarqueprocuravaafastarSalazardopoder,provandoqueoregimepossuíaopositoresinternoscansadosdorumoqueoPaíslevava.Ocasomaisgravefoi,noentanto,oiníciodaGuerracolonial,comosataquesdasforçasindependentistasdoMovimentoPelaLibertaçãodeAngola(MPLA)edaUPA(UniãodasPopulaçõesdeAngola)emfevereiroemarço.
Paracontextualizarestesacontecimentos,importarelembrarquearevogaçãodoAtocolonial,em1951,pôsfimaoimpériocolonial,umavezqueasantigascolóniaspassaramterestatutoadminis-trativode«provínciaultramarina»,istoé,umaespéciedeexten-sãoterritorialdePortugal.OintuitodestamedidafoiresponderàspressõesdaOrganizaçãodasnaçõesUnidas(OnU).
António de Oliveira Salazar, ao compreender que os ataquesdeAngolaeramoresultadodeumgrupopolíticoorganizado,proferiunumcélebrediscurso:«ParaAngola,rapidamenteeemforça!»nofinalde1961,maisde30milhomensencontravam-senacolóniaparacombaterosmovimentosindependentistas.
Aomesmotempo,existiaumdebateinternoentreaviainte-gracionista(manutençãodoUltramarPortuguês)eaviadofede-ralismo, que permitia a obtenção de autonomia política, admi-nistrativa e económica face à metrópole. esta última visão eraprovenientedoprocessodedescolonizaçãoqueestavaaocorrerpelo mundo, justificando, também, a fundação de vários movi-mentosde libertação:Angola:UPA(1955), lideradaporHoldenRoberto,queseirátornar,em1962,naFnLA(FrentedeLibertaçãodeAngola);MPLA(1956),coordenadoporAgostinhoneto;UniTA(1966),UniãoparaaindependênciaTotaldeAngola,comJonasSavimbi;Guiné:PAiGc(PartidoparaaindependênciadaGuinéecaboVerde),sobaliderançadeAmílcarcabral,noanode1956;Moçambique:FReLiMO(FrentedeLibertaçãodeMoçambique),deeduardoMondlane,em1962.
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esteconflitodurou13anos(1961-1974),mobilizoumilharesdesoldadosportugueseseprovocoumilharesdemortosemutilados.Oscustosparaoorçamentodoestadoforamelevadíssimos,enemcomasubidaaopoderdeMarcellocaetanooconflitoviutréguas.naGuinédesde1963eemMoçambiqueapartirde1964,estefoiomaisterrívelconflitodanossaHistória.AGuerracolonialfoi,semsombradedúvida,umdosprincipaismotivosparaoisolamentointernacionaldoestadonovoedaexpressão:«OrgulhosamenteSós!»(1965).
nafaseinicialdagovernaçãodeMarcellocaetano,quesubsti-tuíraSalazarem1968,a«PrimaveraMarcelista»prometeuumadeterminada aberturademocrática,naqual a expressão«Reno-vação na continuidade» explicitava os princípios que, suposta-mente,iriamequilibrarosinteressesentreosconservadoreseosquedefendiamademocracia.nestequadro,algumasalteraçõesdopontodevistapolíticoeeconómicodevemserrealçadas:aUniãonacional passou a denominar-seAção nacional Popular (AnP),contandocomapresençadeumaala liberal,ondeseencontra-vamFranciscoSácarneiroouFranciscoPintoBalsemão;aPide,reduzindoocarácterrepressorepersecutório,passouaintitular-sedGS(direção-GeraldeSegurança);regressaramalgunsexilados;aseleiçõeslegislativasde1969contaramcomapresençadepartidosnãocomunistas.
nãoobstante,estaaberturaàdemocratizaçãorevelou-sebreve.Aseleiçõesvoltaramaserfraudulentas,ocorreramgravesataquesa estudantesuniversitários,que semanifestarampublicamentecontraaguerracolonial,earepressãopolicialvoltouaatingirumpicodeviolênciaperanteumsurtogrevista.OalmiranteAméricoThomaz,comquase80anoseconotadocomoconservadorismoarcaicodoestadonovo,foinovamenteeleitoporumcolégioelei-toralcomoPresidentedaRepública,em1972,simbolizandoumaprofundaincapacidadedemudançaquesóo25deAbriliriatrazer.
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Do 25 de Abril à entrada na Comunidade económica europeia (1974-1986)
ARevoluçãode25deAbrilde1974pôstermoa48anosdedita-dura,representandoumdosmomentosmaisimportantesdanossaHistóriacontemporânea.Oaumentodocustodevida,provocadopelacrisepetrolíferade1973,odescontentamentogeneralizadodasociedadeportuguesafaceaoregimeeoprolongamentodeumconflitoanacrónico,umavezqueocolonialismojánãotinhasen-tidonomundo,foramalgunsdosprincipaismotivosconjunturaisparaarevolução.
Aomesmotempo,areceçãodosprincipaisdirigentesindepen-dentistasdascolóniaspeloPapaPauloViteveumgrandeimpactonamudançadementalidades,incluindodemuitoscatólicosquecompreenderamcomooisolamentointernacionaldePortugalcres-ciadediaparadia.Pelomeio,aala liberaldaAnPabandonouaAssembleianacional,protestandocontraaguerra, eaGuiné--Bissauchegouadeclararunilateralmenteaindependência,rece-bendooapoioereconhecimentodaprópriaOnU.nestequadro,aincapacidadedoexércitoportuguêsemderrotarestesmovimentosindependentistasanunciavaumavergonhosaderrotaparaoPaís,motivandoasaltaspatentesmilitares,nomeadamenteogeneralAntóniodeSpínola,aafirmar,naobraPortugal e o Futuro,queoconflitotinhadeterminar.
Apassagemdeoficiaismilicianosàcarreiramilitarmereceuforteoposiçãoporpartedosmilitares,queresponderamcomacriaçãodoMovimentodoscapitãesque,maistarde,deuorigemaoMovi-mentodasForçasArmadas(MFA),depoisdaadesãodegeneraiscomocostaGomesouAntóniodeSpínolaedeoutrasestruturasmilitares.OMFA,atravésdoplanocoordenadoporOteloSaraivadecarvalho,nanoitede24para25deabrilde1974,realizouumgolpedeestadoquepôsfimaoestadonovo.OcapitãoSalgueiroMaiacercou,juntamentecomoutrastropas,oquarteldocarmo,ondeMarcellocaetanoacabouporentregaropoderaSpínola.nasruasdeLisboa,milharesdeportuguesesdistribuíramcravospelosmilitares,numarevoluçãosemmortosequeparasempreficouconhecidacomoa«Revoluçãodoscravos».
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AntesdaformaçãodeumGovernoProvisório,oMFAprocuroudesmantelartodasasestruturasdoestadonovo,começandopelademissãodeAméricoThomazedeMarcellocaetano.APide,acensuraeaLegiãoforamextintas,etodososdirigentesdoregimeforamdestituídos.ApreparaçãodaAssembleiaconstituinte,danovaconstituiçãoedadescolonizaçãodascolóniasforamasprin-cipaismissões.
nãoobstante,osprimeirosdoisanosdedemocraciaforammar-cadosporumaprofundainstabilidadepolíticafaceàsdiferençasideológicasentreosdiferentessectores.Oprimeirodosseisgover-nosprovisóriosfoilideradoporAdelinodaPalmacarlos,quesedemitiudoismesesmaistarde,passandoVascoGonçalvesalideraroiiGovernoProvisórioepromovendooMFAaumaradicaliza-çãoàesquerda,entrandoemdissidênciacomSpínola.OcomandoOperacionaldocontinente(cOPcOn),quecontavacomoapoiodoPartidocomunista,entrouemcenaeoPRec(ProcessoRevolucio-nárioemcurso)tomavaforma.
neste período iniciou-se um conjunto de nacionalizações desectores-chave da economia, nomeadamente transportes, bancaousiderurgia,eosmonopóliosdoestadonovoterminaram.Aomesmotempo,aReformaAgráriaexpropriavaosgrandeslatifún-dioscomocupaçõescoletivasnoAlentejoeRibatejo.Peranteestesacontecimentos,asforçasàdireitainiciaramalgumasmovimen-tações,acabandoporsero25denovembrode1975oexemplodoreceiodequePortugalsetornasseuma«democraciapopular»sobalçadasoviética.esteperíodorepresentouumafasedegrandesconquistas,designadamenteatravésdoestabelecimentodosaláriomínimo,dodireitoàgreve,daliberdadesindicaloudareduçãodohoráriodetrabalho.
Apenascomaconstituiçãode1976,depoisdo«VerãoQuente»(conflitosentreas forçaspolíticas)edo«documentodosnove»,quedefendiaqueopaísdeveriaseguirocaminhodeumademocra-ciamultipartidáriaelivre,équePortugalseconsolidoucomoumaRepúblicapluralistaquegarantiaasliberdadesindividuaiseeleiçõeslivres.OPartidoSocialistavenceuaslegislativasde1976contraoPartidoPopulardemocráticoeoPcP.RamalhoeanesfoieleitoPresi-dentedaRepública,garantindoalegitimidadepolíticaedemocrática.
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Aconstituição,revistaem1982,garantiaademocracia-liberalpelaviadasoberaniapopular,representadaatualmentepelos230deputadosdaAssembleia.OPresidente,eleitoparamandatosdecincoanosepormaioriaabsoluta,podedissolveroParlamentoeconvocareleiçõesemcasosexcecionais.AAssembleia,divididaemgruposparlamentaresdospartidos,representaoscidadãosdecadadistritoduranteosquatroanosdalegislatura.
O governo resulta da nomeação do Presidente da República,sendoopartidomaisvotadoincumbidodeguiarapolíticadopaísemtodosossectores,umavezquepossuiopoderexecutivo.UmadasatribuiçõesmaisimportantesfornecidasporestarevisãofoiacriaçãodoTribunalconstitucionalquezelapelosinteressesdaconstituição.
Atéàentradanacomunidadeeconómicaeuropeia(c.e.e.)(1986),osgovernossocialistasdeMárioSoares(1976-1978)e(1983-1985)edacoligaçãoAliançademocrática(PartidoPopulardemocrático,centrodemocráticoSocialePartidoPopularMonárquico),sobaliderançadeFranciscoSácarneiro(1980)eFranciscoPintoBalse-mão(1981-1983),forammuitoimportantesparaaconsolidaçãodademocracia.noprimeirogovernosocialista,MárioSoaresrequereuopedidodeadesãoàc.e.e.,a28demarçode1977,recebendores-postafavorávela19demaiode1978.
Curiosidade: Oentãoprimeiro-ministro,FranciscoSácarneiro,foioprotagonistado«casocamarate».Asopiniõesaindahojesedividemsefoiumacidenteouumatentadoque,a4dedezembrode1980,levouaqueaaeronavequetransportavaochefedogovernosedespenhasseemcamarate.
AentradaoficialdePortugalnac.e.e.,ladoaladocomavizinhaespanha,quetambémpassaraporumprocessodedemocratiza-ção,ocorreua1dejaneirode1986,depoisdaassinaturaoficial,a12dejunhodoanoanterior.estemomentosimbolizouaconsa-graçãointernacionaldosistemarepublicanoportuguês,numclarointentodeparticiparnoprojetoeuropeuquefomentasseopro-
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gressoeconómico,mantivesseumapazduradouraentreospaísesdo«Velhocontinente»egarantissebem-estarsocialeliberdadeatodososcidadãos.
economia e Sociedade
«economia de guerra»: o impacto do conflito e a participação militar portuguesa
AGrandeGuerra(1914-1918)feriudemorteaiRepública.defacto,umpoucoportodaaeuropaassistiu-seàregressãodasdemo-craciasliberaiseàascensãodeforçaspolíticasdeextrema-direita,nomeadamenteemitália,espanhaouGrécia.
O primeiro impacto provocado em Portugal pelo deflagrarda Grande Guerra foi a divisão da sociedade quanto ao debate«intervencionismovsanti-intervencionismo»,istoé,aquelesquedefendiamumaparticipaçãomilitarjuntodosAliados(inglaterra,impérioRussoeFrança)contraosimpérioscentrais(alemão,aus-tro-húngaroeotomano)eosquedesejavamaneutralidade.Ospri-meirosconcentravam-seprincipalmentenoPRP,nosevolucionistasenoramomanuelistadosmonárquicos,enquantoosanti-interven-cionistascentravam-senosunionistas,nadireitamonárquica,emgrandepartedoPartidoSocialistaenosseguidoresdeMachadoSantos.
Motivadospelanecessidadedelegitimarinternacionalmenteoregimerepublicano,pelaameaçaalemãàscolóniasportuguesasemÁfricaepeloeterno«perigoespanhol»(receiodevoltaràmonar-quiadualdoperíodofilipino),ainfluênciapolíticahegemónicadoPRPprocurouaintervençãomilitarimediata.noentanto,a«velha»aliadainglaterra,conscientedaimpreparaçãodoexércitoportuguês,dequeonossoesforçomilitarteriadeserpatrocinadopelosseuscofresedanecessidadedeasseguraraneutralidadedaPenínsulaibérica,impediuaentradaoficialdePortugalnoconflitoaté1916.
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nãoobstante,oexércitoalemãoenvioutropasparaasfrontei-rasdosuldeAngolaeparaonortedeMoçambique,obrigandoaquePortugalrespondessecommaisde25milhomensparaprote-gerduasdasjoiasdacoroadoimpériocolonial.Abatalhadenau-lila(Angola),emdezembrode1914,simbolizouo«desastre»deumperíodoqueficouaindamarcadopelarevoltadaspopulaçõesautóctonescontraosportugueses.
Oapresamentodos72naviosalemãeseaustríacosemportosportugueses,incluindocoloniais,motivaramadeclaraçãodeguerraporpartedoimpérioAlemãoa9demarçode1916,oquelevouPortugalaentraroficialmentenoconflito,paralutaraoladodosAliados, concretizando o desejo dos intervencionistas. daqui, eparafazerfaceaoesforçodeguerra,surgiriaogovernoda«UniãoSagrada»,umdosmaislongosdaiRepública(406dias),quecoli-gavaoPRPeoPartidoevolucionista.
Foramenviados75milhomensparacombateremFrançaenaFlandres,depoisdotreinomilitarqueficouconhecidocomo«Mila-gredeTancos».Amemóriadanossaparticipaçãomilitarficoumar-cadapelabatalhadeLaLys(Bélgica),a9deabrilde1918,cujaderrotaàsmãosdosgermânicosprovocoumaisde7milbaixasportuguesasecentenasdeprisioneirosdeguerraedesaparecidos.
O«MilagredeTancos»foiaorganizaçãodeumcampodeinstru-çãomilitarcomointuitodeprepararastropasparaoscombatesnafrenteeuropeia.entreabrilejunhode1916,sobacoordena-çãodogeneralnortondeMatos,nopolígonomilitardeTancos(Santarém)maisde20milhomensreceberamformaçãoparaomundodastrincheirasqueocorpoexpedicionárioPortuguêsiriasentirdapiorforma.
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Maisdoqueoimpactodaparticipaçãomilitar,afrenteinternaobrigouaqueosgovernosquebrassempartedatradiçãoliberaldepoucaintervençãoestatal.defacto,aGrandeGuerra,atéentãooconflitodemaiorescalanaHistória,forçouumconjuntodenovosmecanismose experiênciaspolíticas.naprocurade concentraresforçosmateriaisparaacomponentebélica,opaíspassouporumcontextodramáticofaceàcrisedesubsistênciasondeafaltadeabastecimentosfezalastrarafome.
Oaumentoextraordináriodocustodevida,emvirtudedapoucaofertaalimentar,intensificouacrispaçãosocialvividaedespertouomovimentooperárioparamomentosdelutacoletivacontraoaumentodospreços,afracacapacidadeparaaresoluçãodopro-
12.despedidadeumsoldadoportuguês–partidaparaaGrandeGuerra.
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blemadosabastecimentose,maisimportante,umasociedadetotal-mentedivididafaceaoconflito.Ossentimentosanti-intervencio-nistascresceramemmilharesdefamíliasquevirampais,maridosoufilhospartiremparaumaguerracujomotivolheseraalheio.
o fascismo no quotidiano: corporativismo e organizações de enquadramento
Aformadeinculcarvaloreseocontrolodasmassastevenasuaestruturaumconjuntodeorganizaçõescriadaspeloestadonovo,comoaLegiãoPortuguesa,aMocidadePortuguesa,opartidodaUniãonacional,aFundaçãonacionalparaaAlegrianoTrabalhoouaObradasMãesparaaeducaçãonacional.Ocorporativismo,oua«Repúblicacorporativa»segundoexpressãodoregime,organizouavidaeconómicaesocialcomointuitodefortaleceroestadoeuniranação.
AUniãonacional,partidocriadoem1930, tornou-seaúnicaorganizaçãopolíticalegalnonossoPaís,umavezque,navisãodoregime,congregavatodososportuguesesnumaestruturateorica-menteapartidária,evitandoaexistênciadepartidosquediscutis-semideaisquedessemorigemadivisões.Umasociedadeassenteno liberalismoparlamentarerasinónimodedesordem, instabi-lidadeedesorganização.extinguindoodireitoaovoto livreemeleiçõesmultipartidárias,oestadonovoestabeleceuumsistemapolíticobaseadonototalitarismo, istoé,ondeaUniãonacionalcoordenavaavidapúblicanumcontroloabsolutoe transversalsobreoindivíduo,comSalazaràcabeçadoregime.
como intuitodearregimentar,fidelizaremoldar ideologica-menteasociedadeportuguesaaoregime,aMocidadePortuguesa,criadaa19demaiode1936,matriculoutodososjovensdoensinoprimárioesecundário.nestaorganizaçãoeramtransmitidostodososvalorespatrióticosenacionalistasqueofascismoexacerbava,pelaviadeumensinoemqueos livrosoficiais sublinhavamagrandezadoregime.Paralelamente,aLegiãoPortuguesa,fundadaa30desetembrode1936,tinhacomoprincipalmissãocombateroanarquismoeocomunismo.Ojuramentodetodososlegionários
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destamilíciaarmadaparamaioresde18anosincluíaapromessadepreservara«moralcristã»eo«patrimónioespiritualdanação».
Curiosidade: escritoporJoséGonçalvesLobo,em1937,ohinodaLegiãoPortuguesaerainiciadodaseguinteforma:Nós teremos que vencer/Nada temos a temer/Da invasão comunista/ Já existe a Legião / Ao vento solta o pendão / Dá combate ao anarquista.
Paraprepararasmãesparaaeducaçãodosfilhoseparavidadoméstica,sobosvaloresdoestadonovo,foicriada,peloministroAntóniocarneiroPacheco,a15deagostodomesmoano,aObradasMãesparaaeducaçãonacional (OMen).como intuitodereeducarestasmulheres,foramfundadoscentrossociaiseeduca-tivos,ondehaviapossibilidadedecontinuarosestudos,assistirasessõesdepropagandaereceberauxíliomaterno-infantilpelaviadecantinas,caridadeeliçõesdehigiene.estaobra,cujoobjetivoeracongregartodasasmulheresportuguesasetransformarassuasmentalidades,nãoalcançounúmerosmuitoexpressivosoumobi-lizousignificativamenteouniversofemininodoregime.Oscursosdeeducaçãodomésticaforamampliadosparaque,noâmbitodoconceitosalazaristade«família»,amulherfosseamãeeesposaquesededicavaexclusivamenteàvidaparticulardolar.
Aprocuradaconcórdiaedapazsocialcorporativabaseou-seinicialmentenapromulgaçãodoestatutodoTrabalhonacional,a23desetembrode1933,queseinspirouabertamentenaCarta del Lavorodoregimeitaliano.ilegalizandotodosossindicatoseassociaçõesdeclassesnascidasdesdeaMonarquiaconstitucional,aorganizaçãodostrabalhadoresemsindicatosnacionais,casasdospescadoresecasasdopovo,edospatrõesemgrémios,permitiaqueoestadocontrolasse todaacomplexidadedasrelações laborais,procurandooequilíbrioentreosdesejospresentesnoscontratoscoletivoseossalários.nosgrémios,comoosdalavoura,ospatrõeseempresáriosregulavamaproduçãoeadistribuição,estabeleciamospreçosdosprodutos,paraevitaraconcorrênciadesleal,efunda-vammétodosdefinanciamento,comoocrédito.
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Satisfazendoambasaspartes,olockouteagrevetornar-se-iamdesnecessários,jáquerepresentavamaantítesedaharmoniasocialque o regime desejava construir e apenas aconteceriam numasociedadedominadapelalutadeclasses.Ostrabalhadores,peranteapossibilidadedeacederemàassistênciasocialnointeriordossin-dicatos(subsídiodedesempregoepensãodevelhiceouinvalidez)eacontratosdetrabalhoseguros,aderiramaocorporativismo.
Aomesmotempo,osgrémios,ascasasdopovoeossindicatosnacionaisintervinhamdiretamentenavidamunicipal,umavezqueintegravamfederaçõesnacionaisouregionaisqueacabavamporestarrepresentadasnacâmaracorporativa,atravésdedelega-dos.Ascorporaçõesexistentespoderiamser,paraalémdaseconó-micas,culturais(gruposdesportivos,culturais,artísticosoucientífi-coseuniversidades)emorais(misericórdias,hospitais,asilos,etc.).
OMinistériodascorporaçõeseoinstitutonacionaldoTraba-lhoedaPrevidênciaSocialdominaramporcompletoestapequenacapacidadederepresentaçãoregionalenacional,jáqueasativi-dades eram plenamente supervisionadas por membros ligadosaoregime.Ocorporativismoserviuparasuprimirecontrolararesistênciaoperárianosgrandescentrosurbanos,osgrandespro-prietáriosagrícolasepartedomundoruralondeexistissemcasasdopovo.Aomesmotempo,oestadonovopassavaaternasmãosasferramentasparaaafirmaçãodaautarciaeconómica,istoé,aautossuficiênciapelaviadointervencionismo,doprotecionismoedo«nacionalismoeconómico».
Foradohoráriodeexpediente,paraalémdetodaainformação,comunicaçãoepropagandaseremcontroladaspelacensuraPréviaepeloSecretariadodePropagandanacional,aFundaçãonacionalparaaAlegrianoTrabalho(atualinATeL),baseadanaKraft durch Freude(1933)doiiiReichenaOpera Nazionale Dopolavoro(1925)italiana,procuravapromoveratividadeslúdicasparaosperíodosdelazerdostrabalhadores.
criadaa13dejunhode1935,qualquerpessoapoderiausufruirdaofertadecolóniasdeférias,passeiosturísticos,espetáculosdeteatroemúsica,bibliotecas,educaçãofísicaeginástica,bastandoapenassersóciodeumsindicatonacional,deumacasadopovooudeumacasadepescadores.
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Oladosombriodoestadonovofoiarepressãopolicialviolentaquevigiou,perseguiu,prendeu, torturouematouqualquertipodeopositoraoregimeatravésdaPVde(PolíciadeVigilânciaededefesadoestado)e,desde1945,daPide(Políciainternacionalededefesadoestado).Apolíciapolíticautilizavaumadensarededeinformadoresumpoucoportodoopaís,quecolaboravaemtrocadefavoresedinheiro,fazendocomquemilharesdeportuguesessofressemcomoregime.AaberturadeprisõespolíticasemPeni-che,AljubeecaxiaseacriaçãodeumcampodeconcentraçãonoTarrafal(caboVerde)foiaclararepresentaçãonegradestelongoperíododeditadura.
entre tantosprisioneirospolíticos épossíveldestacarnomescomoÁlvarocunhal, JaimeSerra,FranciscoMartinsRodrigues,Urbano Tavares Rodrigues, José Manuel Tengarrinha, MiguelTorga,LuísdeSttauMonteiro,JoséMedeirosFerreira,Mariaeugé-niaVarelaGomesoununoTeotónioPereira,etc.
Curiosidade: BentoAntónioGonçalves(1902-1942)foiumdosprimeirossecretários-geraisdoPartidocomunistaPortuguês,tendo--sefiliadonopartidoem1928.ApósoregressodoViicongressodainternacionalcomunista,emMoscovo,noanode1935,foipresojuntamentecomoutrosmembrosdoPcP.FoienviadoparaocampodeconcentraçãodoTarrafal,inauguradoem1936,ondeacabariapormorrer.
A oposição ao regime e a luta pela liberdade: do MunAF às eleições de 1958
Apósointensocombatedoestadonovoparaesvairacapacidadederesistênciadomovimentooperárioedosantigosrepublicanosduranteoperíododo«Reviralho»,asdificuldadeseconómicasesociaisprovocadaspelaiiGuerraMundialpermitiramareunifica-çãopolíticadosdiferentesblocospolítico-partidáriosantifascistas.
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em1943foicriadooMovimentodeUnidadenacionalAnti-Fas-cista(MUnAF),ondeseencontravamelementoscomoBentodeJesuscaraça,AntónioSérgio,MáriodeAzevedoGomeserepre-sentantesdoPartidocomunistaPortuguês,daSecçãoPortuguesadainternacionalOperária,doPartidoRepublicanoPortuguês,daconfederaçãoGeraldoTrabalhooudarevistaSeara Nova.nortondeMatos,JoséMagalhãesGodinho,JacintoSimõesouFernandoPiteiraSantosfaziampartedacomissãoexecutiva.
comofinaldoconflitomundialeaderrotaoficialdosfascis-mosnaeuropa,aesperançadedemocratizaçãodoregimeinun-douasociedadeportuguesaquesemanifestou, inclusivamente,numarevoltamilitarnonorte(queincluiuumamarchadoPortoàMealhada),em1946.Apressãointernacional,nomeadamentedoseUAedainglaterra,paraumprocessodedemocratizaçãodurouatéaoiníciooficialdaGuerraFria,ondeocombateàexpansãodocomunismosoviéticotornou-seprioritáriorelativamenteàmanu-tençãodosregimesfascistasdaPenínsulaibérica.AadesãodePor-tugalàOTAn(OrganizaçãodoTratadodoAtlânticonorte),em1949,foiexatamenteessereconhecimento.
numa clara tentativa dedemonstrar àsnações aliadas queoregimenãoerafascista,SalazarexigiuadissoluçãodaAssembleianacionaleconvocoueleiçõesditas«livres»para18denovembrode1945.numaaçãoconjuntaparalutarpelaliberdade,oMUnAFcriouoMovimentodeUnidadedemocrática(MUd),a8deoutu-brode1945,comadevidaautorizaçãodoestadonovo.Oclimadeeuforiainstalou-seumpoucoportodoopaís,associando-seaoMUdmaisde50milsubscritores.
ApesardeSalazarcomunicar,numaentrevistaaoDiário de Notí-ciaseaoO Século,nodia14denovembro,“Considero as próximas eleições tão livres como na livre Inglaterra»,averdadeéqueasexigênciasdoMUdparaaseleiçõesforamrecusadas.entreestasestavam a renovação dos cadernos eleitorais, o adiamento daseleiçõesparaaconstruçãodasestruturasdospartidoseaverda-deiraliberdadedeimprensaparadivulgarosideaisdecadapar-tido.Faceaestaincapacidade,oMUddesistiudaseleições,umavezquenãoeramlivres,eos120deputadoseleitospertenciamàUniãonacional.
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Umdosmaioresproblemaslevantadosporestaseleiçõesfoiaexi-gênciadoestadonovoemconsultaralistadosmembrosqueade-riramàMUd.estaferramentapermitiuaoregimereconhecer,emváriosquadrantessociaiseemváriasáreasdoPaís,osopositores.destaforma,osinterrogatórioseprisõesàsmãosdaPide,avigilânciapolicialeasdemissõesdealgunselementosligadosàfunçãopúblicaforamclarasrepercussõesparagrandepartedestesmembros.
PorligaçõesaoPcP,SalazarproibiuoMUdem1948,mas,apesardeavanços,divisõeseretrocessos,aoposiçãodemocráticaconti-nuariaalutaclandestinaaté1974.Logonoanoseguinte,em1949,aseleiçõespresidenciaispermitiramqueaoposiçãoapresentasseovelhogeneralrepublicanonortondeMatos,ex-líderdoMUnAF,comocandidatocontraogeneralÓscarcarmona.Apesardaslimi-tações,acabouporconseguirapresentarumacandidaturaquesecaracterizoupeloapontardascontradiçõesdosalazarismo,nomea-damentearepressãopolíticaeacensura,epelodesejodeinstaurarumregimedemocrático.
Aindaassim,talcomoem1945,peranteaincapacidadedegaran-tirareformadoscadernoseleitoraisealiberdadedevoto,retirouacandidaturaalgunsdiasantesdaseleições.estemomentoficouaindamarcadopeloiníciodeumafragmentaçãopolíticanaopo-sição,comdivergênciasentresocialistas,republicanosmoderadoseoPartidocomunistaqueenfraqueceramalutapelaliberdade.OpróprioPcPapresentoulistasseparadasdogrupoliberal.
Apósesteperíododecrisedoregime,amortedeÓscarcarmonaeaeleiçãodeFranciscocraveiroLopes,ambasem1951,eaentradadePortugalnaOrganizaçãodasnaçõesUnidasacabaramporcon-solidaropoderpolítico.naeleiçãodecraveiroLopes,ocontra--almiranteQuintãoMeirelesfoiocandidatomoderadodaoposi-ção,enquantooprofessorRuyLuísGomesrepresentouaesquerdapolítica.Oprimeiro retirou-seda campanhaantesdas eleições,enquantoRuyLuísGomesfoiproibidosecandidatarpeloTribunaldeJustiça,depoisdetersidoagredidoemRioTintoporadeptosdaUniãonacional.craveiroLopesacaboueleitosemqualquertipodeobstáculonumcenáriodeeleiçõesfantoche.
nãoobstante,ostemposnovosqueseiamconstruindoanívelinternacionalpotenciaramumdesgastepolítico-institucionalde
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umregimeanacrónicoque,em1958,iriasofrerumadasmaiorescrisesqueantecederiamasuaqueda:o«furacão»delgado.Aocon-tráriodaseleiçõesanteriores,ogeneralHumbertodelgado(1906--1965)optouporiratéaofimeconseguiuangariarumforteapoiopopularumpoucoportodoopaís,fazendotremerasestruturaspolíticasdoestadonovo.
AntigoapoiantedaditaduraMilitaredoregime,Humbertodel-gado,o«GeneralSemMedo»,modificouaformadeestareviverapolíticaduranteoscincoanosqueviveunoseUA,comoembai-xadordePortugal.Semgarantiasnaliberdadedevotoesemreno-vaçãodoscadernoseleitorais,obtevecercade25%dosvotos,per-dendoparaoalmiranteAméricoThomaz(1894-1987).
Curiosidade: nosalãodorestaurantedocaféChave de Ouro,emLisboa,a10demaiode1958,ogeneralHumbertodelgadoreu-niutodososelementosdasuacampanhaeleitoraleconvidouaimprensanacionalaassistir.numarondainicialdequestões,umjornalistaperguntou:«SeforeleitoPresidentedaRepública,oquefaráaopresidentedoconselho[Salazar]?».Arespostafoirápida:«Obviamente,demito-o!»,tornando-senumadasmaiscélebresfra-sesdapolíticaportuguesa.
nestaseleições,aoposiçãodemocráticavoltouaunir-se,depoisdeocandidatodoPcP,ArlindoVicente,terdesistidodacampanhaemfavordosucessogeneralizadoqueogeneralHumbertodelgadoobteve.Afraudenessaeleiçãoacabouporsercomprovadamuitosanosmaistarde,apósasevidentessuspeitasdaépoca.noexílio,o«GeneralSemMedo»fundouaFrentenacionalindependenteeliderouaFrentePatrióticadeLibertaçãonacional,acabandoporserassassinadoemLosAlmerines(Badajoz),a13defevereirode1965.
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Cultura e Artes
o Modernismo em Portugal: da revista Orpheu aos anos 30
numPaísculturalmentevincadoaorealismoliterário,aonatu-ralismonapinturaouaoclassicismoracionalistanaarquitetura,ageraçãodeFernandoPessoa(1888-1935),Almadanegreiros(1893--1970),MáriodeSá-carneiro(1890-1916)ouAmadeodeSouza-car-doso(1887-1918),entreoutrostantosbolseirosoficiaiseestudantesportuguesesqueestiveramnocentrodaeuropa,ansiava,talcomonoutrosperíodos,rompercomainérciaedecadênciaintelectualemPortugal.
entreaúltimadécadado séculoXiXeosprimeirosanosdoséculoXX,opúblicoeaeliteartísticapremiavammaioritariamenteosvelhosmestres,comoJoséMalhoa.inspiradospormovimentoscomoofuturismoitaliano,oexpressionismoalemãoouocubismodePicasso,estesjovensreuniram-senatentativadequebrarcomoconservadorismodomundourbanoecaptaraatençãodeumasociedademaioritariamenteanalfabeta.
Osprimeirosmodernistasaproveitaramocontextodaimplanta-çãodaRepública,doiníciodaGrandeGuerra,doimpactodaRevolu-çãoRussa(1917),quegeraramumintensodebatepolítico-ideológico,edaafirmaçãodasnovascorrentesestéticaseartísticas,paraorgani-zarem,semapoios,exposiçõesdepinturaeconferências.AprimeiratentativadeintroduzirumanovatendênciamodernanaculturaenasartesportuguesasocorreunoSalãoBobone,emLisboa,sobacoordenaçãodeManuelBentes(1885-1961)ecomaparticipaçãodeartistascomoemmericonunes(1888-1968).estasmostrascontinua-ramcomasExposições dos HumoristaseasExposições dos Modernis-tas, entre1912e1926,noPortoeemLisboa.nolongoprocessodecortecomaherançaoitocentista,cristianocruz,Stuartcarvalhais,MilyPossoz,eduardoVianaouJorgeBarradastiveramoportunidadedeapresentarassuasobrasnestasexposições.
Aindaassim,aprimeirageraçãodoModernismoficouconhe-cidaatravésdapublicaçãodosdoisnúmerosdarevistaOrpheu,em
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1915.criticandoavelhaordemliteráriaepromovendoafragmen-taçãodoeudosujeitopoéticooupodercriativodapalavra,oseupropósitoeracriarumaartecosmopolita.Apesardaincapacidadefinanceiradecontinuarapublicação,estageraçãoseriaa«geraçãod’Orpheu»quedeixouumaherançaculturalfundamentalequeinfluenciouosartistasdosperíodosseguintes.
Curiosidade: O Manifesto Anti-Dantase por extenso,escritoporAlmadanegreirosem1915,foiumdosmaisimportantesdocumen-tosdecortecomaherançaliteráriadaépoca,acabandoporchocarasmentalidadesburguesasconservadoraspelasseverascríticaspresentes.Aexpressão«Morra o Dantas, Morra! PIM!»,utilizandooescritorJúliodantascomoexemplodoatrasointelectualvivenciadoemPortugal,ficoufamosa.
OúniconúmerodarevistaPortugal Futurista,representandoaintroduçãoefetivadoFuturismoitalianoemPortugal,contoucomacolaboraçãodeSantaRita-Pintor,Almadanegreiros,MáriodeSá-carneiro(suicidou-seem1916),FernandoPessoa,edoseuhete-rónimoÁlvarodecampos,eAmadeodeSouza-cardoso.Publicadaem1917,encerrouoprimeiroModernismoportuguês, faceaosfalecimentosdeSantaRita-PintoreAmadeoSouza-cardozo,em1918,edapartidadealgunsartistasparaParis.
Tambémumarevista,aPresença – Folha de Arte e Crítica,cen-tralizoua segunda fasedoModernismoportuguês (1924-1940).coordenadaporumgrupodejovensestudantesdaUniversidadedecoimbra,nomeadamenteJoãoGasparSimões,JoséRégioeBran-quinhodaFonseca,acabouporcontarcomoregressodeparteda«geraçãod’Orpheu»ecomosurgimentodenovosartistaseescrito-res,comoAdolfocasaisMonteiro,dórdioGomesouMiguelTorga.Oscaféseclubesforamoseuespaçodeexposição,ondecontinua-ramocombateparadivulgarasideiasmodernistas,alutacontraoacademismoliterárioeadenúnciadoscostumesburgueses.
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A ‘política do espírito’ de António Ferro e a exposição do Mundo Português
noquadroda construçãodeumestado totalitárioque inter-viesseemtodosossectoresdavidanacional,oestadonovoviu--seobrigadoaorganizarumapolíticaculturalquefavorecesseosinteressesdoregimeequetambémpassassepelocrivodacensura.Umconjuntovariadodeartistas,escritoreseoutrosintelectuaispassaram,desde1926,porumaapertadapressãoqueosimpediudeproduzirlivremente.FoientãocriadooSecretariadodePropa-gandanacional(S.P.n.),sobaégidedeAntónioFerro(1895-1956),umíntimoamigoecolegada«geraçãod’Orpheu»,umavezque,nãocolaborandocomtextosliterários,estevesempremuitopró-ximodeSá-carneiro.
PartindocomoadeptodoPartidodemocrático,passandocomoentusiastadeSidónioPais,AntónioFerrotornou-seumfervorosoapoiantedo fascismo italiano.desta forma,possuíaumaduplafaceta,jáque,dopontodevistacultural,patrocinavaavanguardamodernista,mas,noâmbitodonovoorganismodoS.P.n.,deveriaprocurarenfatizaragrandezadoestadonovo.
Oplanoculturaldoregimebaseava-seemtrêsfundamentosprin-cipais:utilizaçãodaculturacomoveículodepropagandadeglorifi-caçãoeexaltaçãodoregimeedochefedeestado;concretizaçãodeumprogramaquepromovesseosentidocoletivonacionaleosmaisimportantesideaisepropósitosdoestadonovo;compatibilizaçãodarenovaçãoartísticaeculturaldoModernismocomarecuperaçãodastradiçõespopularesedosmomentosdeglóriadopassadoportuguês.
AntónioFerrodeveriaassegurar,atravésda«políticadoespírito»,arenovaçãoeaformaçãodohomemnovo,mantendooequilíbrioentreavanguardamodernaeoconservadorismoque,durantemui-tosanos,caracterizariaoregime.Aruralidade,omundocolonial,asvirtudesdafamíliaeaculturanacionalista(«amoràpátria»)foramexacerbadasatravésdaconvocaçãodediversosmembrosdasgera-çõesmodernistasnoâmbitodasartes,nomeadamentecinema,tea-troouarquitetura.
Aproveitando o oitavo centenário da fundação de Portugal(1140)eoterceirocentenáriodaRestauraçãodaindependência
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(1640),umadasmaiscarismáticasehistóricasaçõesdoSecreta-riadonacionaldePropagandafoiaorganizaçãoda«exposiçãodoMundoPortuguês»,entrejunhoedezembrode1940.consideradaamaiorexposiçãodetodosostemposrealizadanonossopaís,comumaáreaqueultrapassavaos550milmetrosquadrados,entreamargemdireitadoTejoeoMosteirodosJerónimos,recebeuapro-ximadamente3milhõesdevisitantesqueencontraramaexaltaçãodosfeitosgloriososdosdescobrimentoseasupostagrandezadoimpériocolonialportuguês.Aomesmotempo,oPaístransmitiaumaimagemdepaznumaeuropaquejásedigladiavanoâmbitodaiiGuerraMundial(1939-1945).
Oregimeconvocou17arquitetos(comocristinodaSilva,RaúlLino, Porfírio Pardal Monteiro ou o arquiteto-chefe cottinelliTelmo),43pintores(entreosquaisAlmadanegreiros,emmericonunes,MilyPossozouJorgeBarradas)e24escultores(queincluí-ramLeopoldodeAlmeida,cantodaMaiaouRuyGameiro)paraumconjuntodiversificadodepavilhõesalusivosàfundação,aosdescobrimentoseàcolonização.OPavilhãodeHonraedeLisboa,daautoriadecristinodaSilva,foiconsideradoamaiorobradeartedetodaaexposição.
Curiosidade: OPadrãodosdescobrimentos,daautoriadoarquitetocottinelliTelmoedoescultorLeopoldodeAlmeida,foiconstruídoem1940paraseintegrarnoâmbitodaexposiçãodoMundoPortu-guês.Asuaestruturamaterialnãofoiidealizadaparaolongoprazo.Apenasem1960,noâmbitodos500anosdofalecimentodoinfanted.Henrique,équeoPadrãofoireconstruídoembetãoepedra.
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entre a política dos «três F» e a canção de protesto revolucionária
Umdosprincipaiscaminhospercorridosnatentativadealie-naçãoculturaldasmassas,aproveitadopeloregimeditatorialdoestadonovo,foiapolíticados«TrêsF»(Futebol,FadoeFátima).noâmbitododesporto-rei,depoisdeesteganharumprofundodinamismoeinteressenasociedadeportuguesadesdemeadosdosanos20,ostriunfosdoSportLisboaeBenficanamaiorcompetiçãointernacionaldeclubes,aTaçadoscampõeseuropeus,em1961e1962e,principalmente,o3.ºlugarobtidopelaSeleçãonacionalnoMundialdeFutebolde1966,eminglaterra,procuraramresponderàs críticas internacionais ao colonialismo português, já que omelhorjogadordomundotinhaorigemafricana:eusébiodaSilvaFerreira(1942-2014).
Poroutrolado,o«MilagredeFátima»,ocorridoem1917,poten-ciouum intensocrescimentona fée crençadeumapopulaçãodesfavorecida e cuja tradição do catolicismo apenas tinha sidoquebradaduranteaiRepública.defacto,oreconhecimentodaapariçãodenossaSenhoradeFátimaaostrêspastorinhosacabouporincutirosurgimentodeumnovocentrodeperegrinaçãoportu-guês,angarioufundosparaaigrejacatólicaepermitiuumacríticaabertadoanticlericalismorepublicano.
nocasodofado,oSecretariadodePropagandanacional(maistardeSecretariadonacionaldeinformaçãoeTurismo)utilizouoosmeiosdecomunicaçãocomoplataformadedoutrinaçãoecon-trolodosgostose interessesdaopiniãopública.dessaforma,acriaçãodoRádioclubePortuguês (1931),daemissoranacional(1935)oudaRádioRenascença,paralelamenteaodesenvolvimentodocinemaportuguêsedoteatroderevista,possibilitaramumaintensaprojeçãonacionaldonacional-cançonetismoedofado.
Aimportânciadofadonomeiotradicionalportuguêsfoinatural-menteutilizadocomoformadevalorizaçãodoregime.nadécadade1950,eatravésdosurgimentodatelevisão,amaiorfadistadetodosostempos,AmáliaRodrigues(1920-1999),levouonomedamúsicaportuguesaaultrapassarbarreirasgeográficas,suplantandoaimpor-tanteatividadedecantorascomoBertacardosoouercíliacosta.
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Jáonacional-cançonetismo,istoé,amúsicaligeira,exaltavaedifundiaosideaisdoregime(onacionalismo,alutapelaPátria,avidarural,oscostumesetradiçõesouacasaportuguesa)econtavahistóriasdeamor.OSerão para Trabalhadores,criadoem1941pelaemissoranacional,deuvozaartistascomoMariadaGraça,Milú,TonydeMatos,MariadeFátimaBravoouJúliaBarroso.OapogeudesteestilomusicalocorreucomacriaçãodoGrandePrémioTVdacançãoPortuguesa,em1964.Aquificamalgunsclássicosdesteestilomusical:A minha casinha(Milú);O meu Alentejo(carlosGui-lherme);Deixa lá falar(MariadeFátimaBravo);O arroz está cru(JúliaBabo);Porta Secreta(ArturGarcia);Encontro às dez(RuideMascarenhas).
desgastadoscomaconstante tentativade ludibriare iludiropovoportuguêsdosproblemassociaisdaépoca,novosmúsicoscomoJoséAfonso(1929-1987),SérgioGodinho(1945-),JoséMárioBranco (1942-),ArydosSantos (1937-1984)ouPaulodecarva-lho(1947-),passaramacomporcançõesdeprotesto,vulgarmenteconhecidascomo«músicadeintervenção».JoséAfonsoassumiu,inclusivamente,queacomposiçãodacélebreletradeOs vampiros surgiucomoumaclarareflexãofaceàproduçãomusicalportu-guesa,totalmenteacríticadocontextohistóricovivido,alheiadarealidadeemredor.
neste caso, o contexto cultural internacional teve uma forteinfluêncianestageraçãodemúsicosecompositores,umavezque,desdemeadosdadécadade1960,bandascomoTheBeatlesouTheRollingStones,oueventoscomooFestivalde Woodstock,evi-denciavamanecessidadedeliberdadedeexpressão,determinarcomconflitosmilitares,comoaGuerradoVietname(1955-1975),oucomodesarmamentonuclearemplenaGuerraFria.naeradopeace and love,omovimentodecontracultura,tambéminfluen-ciadopelacançãodecoimbra,organizouoprimeirofestivaldejazznonossopaís,emcascais,ondeonorte-americanocharlesHadenfoipreso,interrogadoeexpulsodopaísàsmãosdaPide,porterdedicadoumacançãoaosmovimentosindependentistasdaÁfricacolonialportuguesa.
MuitosdestesmúsicosforamobrigadosaoexílioatéàRevoluçãode1974,nomeadamenteSérgioGodinho(canadá)e JoséMário
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Branco(França),masoseupapeldopontodevistadaintervençãosocialfoifundamentalparaarenovaçãodasmentalidadeseparaacrençanapossibilidadedemudaroregime.Ostemasprincipaisdestescompositorescentravam-senamanifestaçãododesejodemudançaderegimeperanteaguerracolonial,aemigraçãoforçada,apobrezaeosabusosdoregime.
Curiosidade: AsmúsicasE depois do Adeus,dePaulodecarvalho,eGrândola, Vila Morena,deZecaAfonsoforamassenhassecretasutilizadaspeloMovimentodasForçasArmadasparasinalizaroiníciodaRevoluçãodoscravos,nanoitede24deabrilde1974.
Cronologia
Data Acontecimentos
1901 entrefevereiroemarçoocorremmanifestaçõesanticlericaisperantea«Questãocalmon».
1904 desastremilitaremVaudoPembe(Angola),a25desetembro,provocandoamortedemaisde200portugueses.
1905 escândalodomonopóliodostabacos.
1906-1908 Governoe«ditadura»deJoãoFranco.
1908 Regicídiodoreid.carloseassassinatodopríncipeherdeirod.LuísFilipe,a1defevereiro,noTerreirodoPaço.
1908-1910 Aclamaçãoereinadoded.Manuelii.
1910 A5deoutubroéimplantadaaRepúblicaPortuguesa.exílioded.Manueliied.Amélia.
1911 constituiçãodaRepúblicade1911.emagosto,ManueldeArriagaéeleitooprimeiroPresidentedaRepública.PrimeiraincursãomonárquicalideradaporPaivacouceiro.
1913-1914 PrimeirogovernodeAfonsocosta.
1914 noverãocomeçaaGrandeGuerra.PortugalenviatropasparaosuldeAngolaeparaonortedeMoçambiqueparadefenderasfronteirasdeataquesalemães.
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1915 ditaduradogeneralPimentadecastro,entrejaneiroe14demaio.
1916 A Alemanha, a 9 de março, declara guerra Portugal. iní-ciodogovernoda«UniãoSagrada»entreoPRPeoPartidoevolucionista.
1917 iníciodoenviodetropasportuguesasparaFrançaatravésdocorpoexpedicionárioPortuguês.iníciodaditaduradeSidónioPais.
1918 A11denovembroterminaaGrandeGuerra.A5dedezembroSidónioPaiséassassinadonaestaçãodoRossio.
1919 António JosédeAlmeidaéeleitoPresidentedaRepública.«Monarquiadonorte»entrejaneiroefevereiro.
1921 na«noiteSangrenta»sãoassassinadoshistóricosrepublicanos.FundaçãodoPartidocomunistaPortuguês.
1922 PrimeiratravessiaaéreadoAtlânticoSulporGagocoutinhoeSacaduracabral.
1923-1924 GovernodeÁlvarodecastro.
1925 BernardinoMachadoéeleitoPresidente.ÉoúltimoPresidentedaiRepública.emdezembro,tomaposseoúltimogovernorepublicano,chefiadoporAntónioMariadaSilva.
1926 A28demaio,ogeneralGomesdacostalideraopronunciamentomilitarquepõefimàRepública.iníciodaditaduraMilitar.
1927 Primeiratentativarevolucionárianoquadrodo«Reviralho».
1928 SalazarénomeadoministrodasFinançasemabril.Óscarcar-monaéPresidentedaRepúblicaaté1951.
1929 MorreAntónioJosédeAlmeida.
1930 ÉpromulgadooAtocolonial.
1931 PrimeirasemissõesdoRádioclubePortuguês.
1932 Salazartorna-sechefedogoverno.
1933 Anovaconstituiçãoiniciaoestadonovo.FundadaaPolíciadeVigilânciaedefesadoestado(PVde).
1934 icongressodaUniãonacional.
1936 criadaaMocidadePortuguesaeaLegiãoPortuguesa.Portugalenviaos«Viriatos»paracombateraoladodosnacionalistasnaguerracivilespanhola.
1937 AtentadofalhadocontraSalazar.
1939 iníciodaiiGuerraMundial.Portugaldeclara-seneutral.
1940 concordatacomaigrejacatólica.exposiçãodoMundoPortuguês.
1942 inauguradooAeroportodaPortela.
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1944 inauguradooestádionacional,noJamor.
1945 FinaldaiiGuerraMundial.FundaçãodoMovimentodaUnidadedemocrática(MUd).
1949 campanhaeleitoraldogeneralnortondeMatosparaaspresi-denciais.PortugaléumdospaísesfundadoresdaOTAn.
1951 craveiroLopestorna-sePresidentedaRepública,depoisdamortedogeneralÓscarcarmona.Ficanocargoaté1958.
1952 PromulgadaaLeido«condicionamentoindustrial».
1955 PortugalentranaOrganizaçãodasnaçõesUnidas.
1957 erupçãodovulcãodoscapelinhos,nailhadoFaial(Açores).
1958 O«GeneralSemMedo»,Humbertodelgado,vaiaeleiçõescomocandidatodoregime,AméricoThomaz.
1959 inauguradoometropolitanodeLisboa.
1960 ÁlvarocunhalfogedaprisãodePeniche.Portugalédosmem-brosfundadoresdaeuropeanFreeTradeAssociation(eFTA).
1961-1974 GuerracolonialPortuguesa.
1961 Annus Horribilisdoestadonovo:assaltoaopaqueteSantaMaria;iníciodaguerracolonialemAngola;tentativadedeposiçãodeSalazarpelaschefiasdasForçasArmadas.
1963 Aguerracolonialpropaga-senaGuiné-Bissau.
1964 com a campanha da FReLiMO, conflito alastra-se paraMoçambique.
1965 AssassinatodeHumbertodelgado,emespanha,pelaPide.
1966 inauguradaapontesobreoTejo.
1968 SalazarésubstituídoporMarcellocaetanonaliderançadoregime.
1970 MortedeSalazar,a27dejulho.
1972 ReeleiçãodeAméricoThomaz.MassacreWiryamu(Moçam-bique)resultanamortede400pessoasàsmãosdoexércitoportuguês.
1973 FundaçãodoPartidoSocialista,lideradoporMárioSoares.
1974 Revoluçãodoscravosa25deAbril.Fimdoestadonovo.
1975 ProcessoRevolucionárioemcurso(PRec).independênciadeMoçambique,caboVerde,SãoToméePríncipeeAngola.
1976 PromulgadaanovaconstituiçãoPortuguesa.PartidoSocialistavenceasprimeiraseleiçõeslegislativaslivresecomsufrágiouniversal.RamalhoeaneséeleitoPresidentedaRepública.
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1978 FundoMonetáriointernacional(FMi)entraemPortugal.
1980 caso«camarate»levaaofalecimentodoprimeiro-ministro,Fran-ciscoSácarneiro.
1982 Primeirarevisãodaconstituição.VisitadoPapaJoãoPauloiiaPortugal.
1983 Governodo«Blococentral».SegundaentradadoFMi.
1984 carlosLopesvenceaprimeiramedalhaolímpica,emLosAngeles.
1986 Portugalentra,juntamentecomaespanha,nac.e.e.
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VIII
oS últIMoS trIntA AnoS (1986-2016)
dopontodevistapolítico,aconsolidaçãodemocráticadePortu-gal,estabilizadaprincipalmenteapósaadesãoàcomunidadeeco-nómicaeuropeia,ficoufortementemarcadapelaprevalênciadedoispartidos:oPartidoSocialistaeoPartidoSocialdemocrata.nasúltimastrêsdécadas,assistimos,aproximadamente,a17anosdegovernaçãodoPSd(1985-1995;2002-2004;2004-2005;2011-2015)e13anosdoPS(1995-2002;2005-2011;2015-presente),lideradosporpersonalidadescentraisdanossavidapública,nomeadamenteAníbalcavacoSilva(PSd,1985-1995),AntónioGuterres(PS,1995--2002),JosédurãoBarroso(PSd/cdS,2002-2004),PedroSantanaLopes(PSd/cdS,2004-2005),JoséSócrates(PS,2005-2011),PedroPassoscoelho(PSd/cdS:2011-2015)eAntóniocosta(PS:2015-).
AoPS,PSd,cdSePcP,junta-sedesde1999,oBequecompletaascincoforçaspartidáriasmaisrelevantesdaatualdemocraciapor-tuguesa.
noâmbitodapresidênciadaRepública,MárioSoares(PS,1986--1996),JorgeSampaio(PS,1996-2006)eAníbalcavacoSilva(PSd,2006-2016)foramostrêschefesdeestadodopaís,reeleitosparasegundosmandatos.destaforma,podemosencontrarumfiocon-dutornapolíticanacional,oconservadorismonovotoque,desdeaRevoluçãode1974,émantidonosmesmospartidosefiguras.nasúltimaspresidenciais,ocorridasa24dejaneirode2016,Mar-celoRebelodeSousa,professoruniversitárioecomentadorpolí-tico,apoiadomaioritariamentepeladireita,venceuaseleiçõesàprimeiravolta,com52%dosvotos.
Atéàexplosãodacriseeconómicainternacional,em2008,gran-dementebaseadanacorrupçãodosectorfinanceiroeimobiliário,osmaisde20anosdesdeaentradadePortugalnac.e.e.forammarcadosporumlentoecomplexoprocessodedesenvolvimento
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civilizacional,amparadopelaestabilizaçãoeevoluçãodasinstitui-çõesdemocráticasportuguesas.defacto,oacessoàsaúde,edu-caçãoeempregosdignospossibilitaramumamaiorigualdadeejustiçasocial,aindaquemuitolongedaquiloqueénecessário.Asgeraçõesnascidasnasdécadasde60,70,80e90do séculoXXforam,provavelmente,asquetiveramasmelhorescondiçõesmate-riaisdesempre.
Para issomuitocontribuíramosfundosestruturaisdac.e.e.,que,desdeotratadodeMaastricht(1992),sechamaUniãoeuro-peia,cujoprincipalintuitoeraaaproximaçãopolítica,económicaesocialaoutrospaísesmaisdesenvolvidosdentrodoprojetoeuro-peu.estesfundosmodernizaramaeconomiaportuguesapelaviadeinvestimentosnaagricultura,indústria,infraestruturasesectordosserviços,permitindoquePortugalatingisseumpatamardepro-gressonuncaantesvisto.Aquebradasbarreirasculturaisprove-nientesdofascismo,oprestígiointernacionaldopaíseaaberturaàeuropaeaoMundo,pelaviadamelhoriadosportos,estradas,ferroviasouaeroportos,queincrementaramaposiçãoestratégicadePortugalperanteummundocadavezmais«globalizado»,foramaspetosfundamentaisparaqueosvaloresdaliberdadeedademo-craciaseintegrassemnoseiodanossasociedade.
Paralelamente,foifundadaacPLP(comunidadedosPaísesdeLínguaPortuguesa),em1996,integrandoAngola,Brasil,Moçambi-que,caboVerde,SãoToméePríncipe,Guiné-Bissau,Timor-LesteePortugal,comointuitodepromoveralínguadecamõesnoplanointernacionalemelhorarasrelaçõeseconómicas,sociais,culturaisediplomáticas.desta forma,Portugal respondiaàafirmaçãodoprocessodeglobalizaçãonummundopós-guerrafria,ondeocapi-talismoneoliberalatingiaopico.
Asdificuldadeseconómicaseainstabilidadepolíticadosprimei-rosanosapóso25deAbrilforamultrapassadascomaajudadeumenquadramentointernacionalderelativaprosperidade,ondeoinvestimentoestrangeiro(casodaAutoeuropaemPalmela)ofe-receuumcrescimentobastanterelevante.Maisimportantefoiamelhoriaefetivadospadrõesdequalidadedevida,nomeadamentenoaumentodaesperançamédiadevida,noacessolivreeuniver-salaoServiçonacionaldeSaúdeounoaumentoexponencialdo
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númerodealunosnoensinosuperior.Aterciarização(sectordosserviços)daeconomiafoi,também,umreflexoclarodamudançaestruturaldaeconomiaedotrabalhoemPortugal.
AexposiçãoMundialde1998,entre22demaioe30desetem-bro,comemorouos500anosdosdescobrimentosPortugueseseconcretizouademonstraçãodemodernizaçãoeprogressodoPaís,recebendopertode11milhõesdevisitas.AponteVascodaGama,anonamaisextensadetodooplaneta,construídaentre1994e1997,evidenciouumpaíspreparadotecnologicamenteparaoséculoXXi.
nãoobstante,averdadeéqueo iníciodoséculoXXirapida-menteiriatrazeraodecimaasprofundasdeficiênciasestruturaisdaeconomiaportuguesa,nomeadamenteadependênciaexterna,ocrónicodéficeorçamental,asbaixasqualificaçõesacadémicasecientíficasouumapopulaçãocadavezmaisenvelhecidaecomaltosíndicesdeemigração.Portugaldemonstrouumaclaraincapa-cidadeparacompetirnummercadodelivrecirculaçãodepessoasemercadoriasecomumamoedaúnica(desde2002),reduzindoainfluênciadaagriculturaedaindústrianumasociedademaiorita-riamenteempregadanosectordosserviços.AdeslocalizaçãodeempresasparaospaísesdeLeste,entre2004e2007,iniciouumanovavagadedesemprego.
OgovernosocialistadeJoséSócrates,profundamenteafetadopelacriseinternacionalde2008,viuadívidapúblicasubirdrasti-camenteeopaísaentrarnumaescaladanuncaantesvista,pres-sionadofortementeporescândalosfinanceirosepelosmediaalta-menteinfluentes.Portugalviu-seforçadoapedirajudaaoFundoMonetáriointernacionalparaevitarabancarrota,em2011,levandoàdemissãodeJoséSócrates.Osquatroanosdegovernodecoliga-çãoentrePSdecdS(2011/2015),coordenadosporPedroPassoscoelhoePauloPortas,impuseramníveisdeausteridadequecontra-riaramtodososavançosproporcionadospelac.e.e.,acabandoporrecuaraqualidadedevidadosportuguesesemmaisde20anos,atésesituarcercade25%abaixodamédiaeuropeia.
O desemprego atingiu valores recorde que ultrapassaram osnúmerosoficiaisdoinstitutonacionaldeestatística(cercade18%)emaisde500milportugueses,maioritariamentejovens(muitosaltamentequalificados),foramobrigadosasairdopaísembusca
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deemprego.Aomesmotempo,osvaloresdasprestaçõessociaisforamreduzidos,asprivatizaçõesapreçodesaldoretiraramaoestadograndepartedaintervençãonosectorprodutivoeodiaadiademilhõesdefamíliasficoumarcadopelodesespero,tristezaedificuldades.Reduziu-seonúmerodeestudantesuniversitários,ainvestigaçãocientíficaperdeufulgoreasaúdediminuiuoseuraiodeaçãouniversal.Tudoemproldarecapitalizaçãodabancaedopagamentodeumadívidasemrostoepoucoexplícitaparaapopulaçãoportuguesa.Acrescenteagitaçãosocial foialimen-tadapelosescândalosfinanceirosdoBancoPortuguêsdenegó-cios(BPn),BancoPrivadoPortuguês(BPP),BancoespíritoSanto(BeS)eBAniF(BancointernacionaldoFunchal)quejustificaramaintervençãodecapitalestatalprovenientedoesforçodetodososcontribuintes.
nas eleições legislativas de 4 de outubro de 2015, a maioriarelativaasseguradapelacoligaçãoPSd/cdS(36,8%)acabouporserderrubadanaAssembleiadaRepública,oquepermitiuumanovapáginananossahistóriapolítica.OPS(32,3%)assumiuogoverno,comAntóniocostacomoprimeiro-ministro,comumabasedeapoioparlamentarqueincluioBlocodeesquerda(10,2%)eacoligaçãoPcP/Verdes(8,2%).ApósasaídadoFMi,estenovogovernotemprocuradopromoverumprogramaderecuperaçãodesaláriosepoderdecompradasfamílias,reduzindogradualmenteosimpostosetentandorespeitarasnormasemetasorçamentaisdaUniãoeuropeia.
noutroquadro,temsidonasáreasdodesportoedaculturaquePortugal temconseguidomanterumprestígio internacionaldeenormevalor,contribuindocomimportantíssimosinvestigadoresdasmaisdiversasáreasdaevoluçãodoconhecimentocientíficoepossuindoalgumasdasmaioresreferênciasmundiaisnofutebol,hóqueiempatinsouatletismo,entreoutrosdesportos.
nodia10deJulhode2016,comandadospeloengenheiroFer-nandoSantos,os23futebolistasescolhidospararepresentaremoPaísnocampeonatoeuropeudeFutebolvenceramosfrancesesemplenacidadedeParis.AtletascomoRicardoQuaresma,RenatoSanches,RuiPatrício,nani,cristianoRonaldo,PepeeÉderbateramosfeitosdaseleçãodeeusébionocampeonatoMundialdeFutebol
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de1966,eminglaterra,edaseleçãodeRuicostaeFigonoeuropeude2004,realizadoemPortugal.OgolodeÉder,nominuto109doprolongamento,foiomaisimportantegolodahistóriadestedes-portononossopaís!
nesteanode2016,cristianoRonaldoePepeconquistaramaLigadoscampeõespelocolossoRealMadrideoeuropeuporPor-tugal,estandoocapitãodaseleçãoportuguesaclaramentenafrenteparasereleito,pelaquartavez,omelhorjogadordomundo.
nosórgãosdecomunicaçãosocial,nasredessociaisenaruaestavitória foi efusivamente festejada, representandoummomentorarodeunidadecoletivaedeorgulhonacional,ondeseesquece-ramasprofundasdiferençaseassimetriasqueaindasevivemnonossoPaís.
noquadroatual,ondealeidaprobabilidadepareceterosdiascontadoseoterrorismoceifaavidaainocentes,importarecordareestudaraHistória,peloseucarácterpragmáticoeutilitário,umavezqueaquelesquedesconhecemoserrosdopassadoestãocon-denadosarepeti-los.
Cronologia
Data Acontecimentos
1986 Portugaleespanhaentramconjuntamentenac.e.e.eMárioSoareséeleitoPresidentedaRepública.
1987 AníbalcavacoSilva,peloPSd,obtémaprimeiramaioriaabsolutanumaseleiçõeslegislativas.
1988 incêndiodochiadoa25deagosto.RosaMotavenceamedalhadeouronosJogosOlímpicosdeSeul(coreiadoSul).
1989 AsegundarevisãoàconstituiçãoPortuguesacolocaumtermonairreversibilidadedasnacionalizaçõespós-25deAbril.
1990 RestosmortaisdogeneralHumbertodelgadosãocolocadosnoPan-teãonacional.numcongresso,ex-combatentesdosdoisladosguerracolonialabraçaram-senumimportantegestodepaz.
1991 MárioSoareséreeleitoPresidentedaRepúblicacom70,4%dosvotos.Realizaçãodomaiorcensoestatísticoatéentão.
1992 PSePSdvotamfavoravelmenteoTratadodeMaastricht.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
200
1993 iníciodasobrasparaaeXPO98.Revoltasestudantiscontraaspropinas.
1994 eleiçõesparaoParlamentoeuropeuvencidaspeloPS.
1995 PSdeAntónioGuterresvenceaseleiçõeseformagoverno.
1996 JorgeSampaioderrotacavacoSilvanaseleiçõespresidenciais.
1997 convençãosobreoReconhecimentodasQualificaçõesRelativasaoensinoSuperiornaRegiãoeuroparealizadoa11deabril.
1998 eXPO98emLisboaeinauguraçãodaponteVascodaGama.
1999 FimdaadministraçãoportuguesaemMacau.Segundogovernolide-radoporAntónioGuterres,apósaseleiçõesde10deoutubro.
2000 ABolsadeValoresdeLisboapassaanegociarapenascomoeuro.PapaJoãoPauloiivisita,umavezmais,Portugal.
2001 JorgeSampaioéreeleitoPresidentedaRepúblicacontraJoaquimFerreiradoAmaral.
2002 Amoedaúnica,oeuro,iniciaasuacirculaçãoemPortugal.OgovernodedurãoBarrosoentraemfunçõesapósaseleiçõesde17demarço.
2003 Ponteinfanted.Henrique,entreasmargensdodouro,éinaugurada.
2004 nasequênciadademissãodedurãoBarroso,JorgeSampaionomeiaumnovogoverno,lideradoporSantanaLopes,a17dejulho.
2005 OPSvenceaseleiçõeslegislativasde20defevereiro,iniciandooprimeirogovernodeJoséSócrates.
2006 AníbalcavacoSilvaéeleitoPresidentedaRepúblicacontraManuelAlegreeMárioSoares.
2007 nasautárquicas,AntóniocostaéeleitopresidentedacâmaraMuni-cipaldeLisboa.TratadodeLisboa.
2008 iníciodacrisefinanceirainternacional.
2009 OPSvenceaseleiçõeslegislativasde27desetembro.JoséSócratesdáinícioaosegundomandato.
2010 MedidasdeausteridadeapresentadaspeloministrodasFinanças,TeixeiradosSantos.cimeiradanatoemPortugal.FalênciadoBPP.
2011 A6deabril,ogovernosocialistapedeauxíliofinanceiroaoFMiepedeademissão.A5dejunho,oPSdvenceaseleiçõescommaioriarelativaepromoveumacoligaçãocomocdS.
2012 A15desetembro,maisde1milhãodeportuguesesmanifestam-senopaíscontraaausteridadeeaTroika.
2013 crisenacoligaçãoPSd/cdScomPauloPortasademitir-se«irrevogavel-mente».Poucotempodepois,serianomeadovice-primeiro-ministro.
História de Portugal
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2014 Mortedoex-jogadoreusébiodaSilvaFerreiraqueiráparaoPanteãonacional,tornando-senoprimeirodesportistaaterestahonra.
2015 naseleiçõeslegislativasde4deoutubro,amaioriarelativadacoliga-çãoPSd/cdSpermiteumgovernoPS,lideradoporAntóniocosta,combasedeapoioparlamentarnoBe,PcPeOsVerdes.
2016 Portugalconquista,pelaprimeiravez,ocampeonatoeuropeudeFutebol,emFrançaecontraaFrança.
203
Bibliografia
como se percebe, o presente livro é uma obra de divulgaçãoque visa suscitar o interesse pela História de Portugal num pú-blico vasto e não especializado. Assim sendo, a bibliografia queaquiapresentamoscontemplaapenasasobrasqueconsiderámosabsolutamenteessenciaisparaaescritadestelivro.Muitasoutrasobrasdequalidade, foram tambémconsultadas epoderiam,porisso,integrarestalista.contudo,paranãosobrecarregaremdema-siaoleitor,decidimosmanterabibliografiaomaiscurtaesintéticapossível.
AsváriascoleçõessobreaHistóriadePortugal,nosseusmúlti-plosvolumes,foramabsolutamenteessenciais.citem-seaHistória de Portugal,dirigidaporJoséMattoso;aNova História de Portugal,dirigidaporJoelSerrãoeA.H.deOliveiraMarques;aHistória de Portugal, dirigidapor JoaquimVeríssimoSerrão; e aHistória de Portugal,escritaporJoaquimVeríssimoSerrão.
Refiram-seaindaascoleçõesdaNova História Militar de Portu-gal,dirigidaporManuelThemudoBarataenunoSeverianoTei-xeira,edaNova História da Expansão Portuguesa,dirigidaporJoelSerrãoeA.H.deOliveiraMarques.
Tambéma coleçãodebiografiasdos reisdePortugal,dirigidaporRobertocarneiro,ArturTeodorodeMatose JoãoPauloOli-veiraecosta,revelou-sedegrandeimportânciaparaaelaboraçãodestaobra.
Porfim,destacamosalgumasobrasmaisespecíficasqueforamimportantesparaaescritadestelivro:
AFOnSO,Aniceto;GOMeS,carlosdeMatos,Guerra Colonial,editorialnotícias,Lisboa,2002.
AFOnSO,Aniceto,Grande Guerra: Angola, Moçambique e Flan-dres, 1914-1918,coleçãoGuerrasecampanhasMilitaresdaHistó-riadePortugal,Quidnovi,Matosinhos,2008.
BOXeR,c.R.,O Império Colonial Português,Lisboa,edições70,1977.
Diogo Ferreira e Paulo Dias
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cOSTA, João Paulo Oliveira e, Henrique, o Infante, Lisboa, AesferadosLivros,2009.
cOSTA,JoãoPauloOliveirae,Mare Nostrum: Em busca de honra e riqueza nos séculos XV e XVI,Lisboa,Temasedebates,2013.
LAinS,Pedro;SiLVA,ÁlvaroFerreiradaSilva;História Econó-mica de Portugal 1700-2000, vol. ii,O século XIX, imprensadeciênciasSociais,Lisboa,2005.
MARcOcci,Giuseppe;PAiVA,JoséPedro,História da Inquisição Portuguesa, 1536-1821,Lisboa,AesferadosLivros,2013.
MARQUeS,A.H.Oliveira,Breve História de Portugal,editorialPresença,Lisboa,1995.
MARTinS,MiguelGomes,Lisboa e a guerra: 1367-1411,Lisboa,LivrosHorizonte,2001.
MARTinS,MiguelGomes,Guerreiros de Pedra: Castelos, mura-lhas e guerra de cerco em Portugal na Idade Média,Lisboa,AesferadosLivros,2016.
MORenO,HumbertoBaquero,A Batalha de Alfarrobeira. Ante-cedentes e significado histórico,2vols.,coimbra,BibliotecaGeraldaUniversidade,1979-1980.
nUneS,Teresa,Maria da Fonte e Patuleia, 1846-1847,coleçãoGuerrasecampanhasMilitaresdaHistóriadePortugal,Quidnovi,Matosinhos,2008.
ROSAS,Fernando (coordenador),O Estado Novo (1926-1974),vol.Vii,História de Portugal,direçãode:MATTOSO,José,editorialestampa,Lisboa,1998.
ROSAS,Fernando;ROLLO,MariaFernanda(coordenação),His-tória da Primeira República Portuguesa,Tinta-da-china, Lisboa,2011.
ROSAS,Fernando,Salazar e o Poder: A Arte de Saber Durar,Tin-ta-da-china,Lisboa,2012.
SAMARA,MariaAlice,Verdes e Vermelhos: Portugal e a Guerra no ano de Sidónio Pais,editorialnotícias,Lisboa,2002.
História de Portugal
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TeLO,AntónioJosé,História Contemporânea de Portugal,vol.ii,Do 25 de Abril à Actualidade,editorialPresença,Lisboa,2008.
THOMAZ,LuísFelipe,De Ceuta a Timor,Lisboa,difel,1994.
VenTURA,António,As Guerras Liberais, 1820-1834,coleçãoGuerrasecampanhasMilitaresdaHistóriadePortugal,Quidnovi,Matosinhos,2008.
referências das imagens
1.FotografiacedidaporOLiRAFFotografia
2.BritishLibrary:Royal14eiV,f.204;c.1475
3.FotografiacedidaporOLiRAFFotografia
4.BibliotecanacionaldePortugal:e.291A.;c.1900
5.BibliotecanacionaldePortugal:e.979A.;c.1910
6.BibliotecanacionaldePortugal:c.c.950V.;1561
7.BibliotecanacionaldePortugal:e-42-V;1740?
8.BibliotecanacionaldePortugal:e-332-V;1841
9.BibliotecanacionaldePortugal:e-277-A;1832
10.BibliotecanacionaldePortugal:e-1355-V;1899
11.BibliotecanacionaldePortugal:Pi-2516-P;1910
12.BibliotecanacionaldePortugal:OriginaldoMuseuMilitar;1914-1918