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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
A avaliação psicomotora como facilitadora ao conhecimento da
criança de 5 a 7 anos de idade para seu desenvolvimento.
Por: Eloah Machado de Souza
Orientadora
Profª. Mestre Fátima Alves
Rio de Janeiro
2010
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
A avaliação psicomotora como facilitadora ao conhecimento da
criança de 5 a 7 anos de idade para seu desenvolvimento.
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em
Psicomotricidade
Por: Eloah Machado de Souza
AGRADECIMENTOS
A minha querida mamãe, a
quem devo tudo na vida.
Aos meus familiares, sempre
carinhosos e compreensivos.
A minha orientadora, Fátima
Alves, sempre paciente comigo.
A minha Mestre Sissi Martins,
por introduzir a Psicomotricidade na
minha vida.
DEDICATÓRIA
A minha querida mamãe, por quem
tenho amor eterno.
RESUMO
A presente pesquisa teve como objetivo identificar como a avaliação
psicomotora pode ajudar na detecção e resolução de dificuldades encontradas
por crianças durante seu desenvolvimento psicomotor. O método utilizado para
realizar a pesquisa foi uma revisão de literatura, tendo como base para análise,
os pontos de vista de autores como Gislene de Campos Oliveira, Francisco
Rosa Neto, Vítor da Fonseca, entre outros, o que possibilitou uma maior
compreensão sobre o desenvolvimento psicomotor e a avaliação psicomotora
como facilitadora deste processo. Cada assunto foi mencionado
separadamente e, depois, fez-se uma relação entre os dois. Delimitou-se uma
idade para o estudo (crianças de 5 a 7 anos) e percebeu-se que há
necessidade de focalizar os estudos dessa área na criança porque é na
infância que as mudanças mais marcantes acontecem.
Palavras chaves: Desenvolvimento psicomotor infantil, avaliação
psicomotora, criança.
METODOLOGIA
O método empregado para realizar esta pesquisa foi uma revisão de
literatura, tendo como base para análise livros e artigos abrangendo as
opiniões de autores reconhecidos como Francisco Rosa Neto, Vítor da
Fonseca, Gislene de Campos Oliveira, Lapierre & Aucouturier, entre outros.
Procurou-se absorver o máximo de informações necessárias nas consultas a
estes livro e artigos para o desenvolvimento de uma boa pesquisa e
esclarecimento das questões colocadas na mesma.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
O Desenvolvimento Psicomotor 10
CAPÍTULO II
A Avaliação Psicomotora 42
CAPÍTULO III
Relacionando o Desenvolvimento Motor com a
Avaliação Motora 51
CONCLUSÃO 57
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 59
ÍNDICE 61
8
Introdução
O Desenvolvimento Psicomotor é um processo contínuo e demorado
que ocorre durante toda a vida do ser humano, porém, pelo fato de mudanças
mais marcantes acontecerem nos primeiros anos de vida (do nascimento aos
seis anos de idade), há a necessidade de focar na criança. As experiências
que a criança tem no decurso desta fase determinarão, por grande extensão,
que tipo de adulto ela se transformará.
O Desenvolvimento Psicomotor Infantil, se orientado de forma eficaz,
ocorre de maneira natural e sem problemas. Para LIMA (2008), o professor
deve estar sempre atento as etapas do desenvolvimento do aluno. Ele deve
ser um agente facilitador do mesmo, proporcionando a criança suas vivências
corporais, percebendo a importância de um trabalho psicomotor,
principalmente da avaliação psicomotora, para a detecção de dificuldades no
processo ensino-aprendizagem, pois o mesmo está intimamente ligado aos
aspectos afetivos com a motricidade, com o simbólico e o cognitivo.
A criança deve ter o ensejo de vivenciar e experimentar o mundo a sua
volta (prática psicomotora), com todos os órgãos dos sentidos e riscos que ela
possa correr, sempre com a supervisão de um adulto (Pais, responsáveis,
professores, cuidadores e outros). LAPIERRE & AUCOUTURIER (2004) dizem
sobre esta vivência que ela é “primeiramente motora”. É extremamente
necessário que a criança, através de atividades que privilegiem o ato físico
associado com o trabalho mental e proporcionem prazer, possa tocar, mexer,
deslocar objetos, jogá-los, virá-los, subir em cima deles, entrar neles, passar
por debaixo, para aprender as formas, as dimensões, as direções, as
orientações, as superfícies, os volumes, ou seja, para descobrir as estruturas.
Estas atividades devem também permitir que as crianças criem, interpretem,
imaginem, organizem, representem, passem da idéia para o ato concreto e se
relacionem com este mundo. Porém algumas crianças, por não terem a
oportunidade de vivenciar estas práticas ou de serem impedidas de realizá-las,
podem encontrar dificuldades em alguma etapa deste desenvolvimento.
9
Para JOHNSON & MUKLEBUST (apud OLIVEIRA, 2009b) estas
dificuldades são tidas como não-verbais, já que são dificuldades de orientação
espacial, lateralidade, orientação temporal, especialmente de ritmo, saber o
significado das expressões faciais, de limitações de percepção social, entre
outros. E a avaliação psicomotora, por ser, segundo OLIVEIRA (2009a), um
instrumento valioso para medir a potencialidade do comportamento da criança,
sua aquisição, sua elaboração, integração e regulação, pode fornecer algumas
informações sobre estas dificuldades apresentadas em determinada fase do
desenvolvimento infantil através de uma anamnese e de testes motores.
Este trabalho irá apresentar o desenvolvimento psicomotor infantil, dos 5
a 7 anos de idade, e como a criança se apresenta, ou deveria se apresentar,
no âmbito emocional, social, motor, afetivo e cognitivo. Será apresentada
também a avaliação psicomotora que é voltada para esta faixa etária e como
ela pode ser facilitadora do desenvolvimento psicomotor.
No primeiro capítulo será apresentado o Desenvolvimento Psicomotor,
suas habilidades e fases. Como já foi dito, será focada a criança, mas não
significa que o indivíduo não continue se desenvolvendo durante sua vida.
No segundo capítulo será falado sobre a Avaliação Psicomotora, como
se desenvolve e como pode ser um instrumento rico para ajudar na detecção e
correção de dificuldades psicomotoras que a criança possa ter durante seu
desenvolvimento.
No terceiro capítulo será feita então, uma relação entre desenvolvimento
psicomotor e avaliação psicomotora.
Será feita, por fim, a conclusão da pesquisa, ou seja, serão expostos
todos os resultados encontrados durante o período de estudo do tema.
Esta pesquisa contará ainda com a opinião de alguns autores, como
ROSA NETO, para ajudar a compreender o desenvolvimento psicomotor
infantil e a influência, como instrumento facilitador, da avaliação psicomotora
para este desenvolvimento.
10
CAPÍTULO I
O Desenvolvimento Psicomotor
O Desenvolvimento psicomotor ocorre desde a vida intra-uterina,
quando a criança começa a organizar seu comportamento, dando sinais de
vida ao mundo exterior basicamente através de atividades motoras. O
desenvolvimento Psicomotor avança gradualmente de acordo com as
experiências que a criança vive e a permitem explorar o mundo que está a sua
volta e que chama sua atenção.
As experiências motoras são importantíssimas para o desenvolvimento
psicomotor infantil, pois permitem às crianças tomarem consciência de si e do
mundo exterior.
Estas experiências são delimitadas por fases (serão explicadas mais a
frente), que representam o grau ou o nível de maturidade do desenvolvimento
que o indivíduo se encontra (idade cronológica e emocional).
A seguir serão apresentadas as estruturas psicomotoras que contribuem
para o desenvolvimento da motricidade de um ser humano, cujo ápice de
desenvolvimento se dá na infância.
1 – Esquema Corporal
Thompson (2000, p. 49) define esquema corporal como “as relações
que existem entre a percepção que o indivíduo tem de seu corpo e o conceito
que faz de si mesmo”.
Segundo Oliveira (2009a), baseando-se nos estudos de Le Boulch, o
esquema corporal passa por três etapas e cada uma delas possui
aprendizagem própria, por causa da maturação da criança e da sua idade
cronológica. Neste trabalho serão focadas a primeira e a segunda etapa. São
elas:
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1ª etapa: Corpo Vivido (até os três anos de idade)
Quando nasce até os três meses de vida, a criança apresenta
movimentos reflexos e, aos poucos, vai se desvencilhando dos reflexos
arcaicos. A partir de uma maior maturidade do sistema nervoso, na medida em
que a criança cresce, ela vai aumentando suas experiências e manipulando o
espaço que a rodeia.
Nesta fase a criança tem necessidade de se movimentar e vai
aumentando assim sua experiência subjetiva de corpo e de sua experiência
motora.
Traçando um paralelo com os estudos de Jean Piaget, esta etapa é
considerada a fase da inteligência sensório-motora, na qual a criança se
sente parte do meio e não tem consciência de si, o que a leva a se confundir
com o espaço em que esta vivendo. Seus movimentos são interessantes e
puramente espontâneos, ou seja, não são pensados já que a criança não tem
consciência do seu intelecto. Esta fase também é conhecida como vivência
corporal.
A criança começa a manusear objetos, a andar, a brincar, a correr e a
trabalhar seu corpo, conhecendo assim as partes deste. É a fase que os
elementos psicomotores e cognitivos estão juntos no desenvolvimento da
criança já que não podem ser trabalhados separadamente porque possuem
uma ligação de interdependência.
Esta é a fase do reconhecimento das partes do corpo. A criança passa a
sentir interiormente, ou seja, ter consciência de cada segmento. E, na medida
em que ocorre a maturação da preensão e da óculomotricidade, acontece uma
maior dominância sobre o objeto e a criança vai ordenando melhor seus
movimentos.
Esta fase é marcada pela experiência vivida pela criança quando ela
explora o meio em que vive. A criança utiliza-se da imitação para se
12
movimentar corretamente no meio ambiente e é pela prática pessoal, sem
interferência de um adulto, que ela vai se ajustar, se adequar, descobrir,
dominar e compreender este meio de forma a coordenar a execução de seus
movimentos. Este ajuste, mesmo que a criança o faça sem perceber, adapta
suas ações às novas disposições, desenvolvendo assim, uma das funções
mais importantes: a função de ajustamento.
No final desta fase, a criança já se utiliza de uma memória corporal, o
que corresponde a uma eficácia dos ajustamentos anteriores. Já se pode falar
em sentimento subjetivo sobre o corpo porque a criança já enxerga seu corpo
como unidade e que é particular, individual.
2ª etapa: Corpo percebido ou “descoberto” (três a sete anos)
É a fase em que o ajustamento do corpo ao meio deixa de ser
espontâneo e passa a ser mais controlado, embora a criança ainda não
possua uma boa dissociação gestual. Isto implica dizer que a criança passa a
ter um maior domínio sobre seu corpo. Acontece então um aperfeiçoamento de
suas ações fazendo-a adquirir uma maior coordenação dentro de um espaço e
tempo determinados.
A criança começa a perceber tomadas de posições e a se ajustar a
situações e objetos ao seu redor, por exemplo, quando pega objetos pesados
ou leves, ela regula a força necessária para cada um deles.
O aperfeiçoamento de suas ações (ou movimentos) permite que a
criança desenvolva uma percepção voltada para seu próprio corpo, que é
denominada por Le Boulch (Oliveira, 2009a, p. 102) de “função de
interiorização” que possibilita a criança mudar o foco de sua atenção do meio
ambiente para o seu próprio corpo, podendo assim tomar consciência dele.
Esta função de interiorização é que vai proporcionar à criança transformar seus
movimentos espontâneos em movimentos mais controlados e elaborados.
A criança chega então na fase de representação mental do corpo e do
espaço e isto é possível graças às primeiras experiências e descobertas
13
vividas por ela. A criança descobre a sua dominância e também seu eixo
corporal. Seu corpo passa a ser um ponto de referência para se localizar e
localizar os objetos em seu espaço e tempo.
Nesta fase a criança já consegue se representar através de desenhos,
não só por ter uma maior consciência das partes do corpo, mas também pela
consciência do seu corpo no espaço, associando-o com objetos de sua vida
cotidiana. Esta percepção permite que a criança possa distinguir, por exemplo,
a orientação das letras e das palavras na escrita.
A percepção de seu eixo corporal também permite à criança a
descoberta das dimensões e das formas. Ela consegue distinguir conceitos
como embaixo/em cima, dentro/fora, pequeno/grande, esquerda/direita. A
criança, nesta fase, também já consegue ter melhor apurada sua noção de
tempo, ou seja, a duração dos intervalos de tempo, o antes e o depois,
primeiro e último.
3ªetapa: Corpo representado (sete a doze anos)
Nesta etapa a criança já está com a estruturação do esquema corporal
completa, ou seja, já tem noção de todas as partes do corpo, conhece as
posições e consegue se movimentar no ambiente em que vive com controle e
dominação corporal maior. A partir desta etapa a criança consegue ampliar e
organizar seu esquema corporal sem dificuldades.
Na etapa anterior, a criança tinha noção de seu esquema corporal
porque se voltava única e exclusivamente para ele, para o seu próprio corpo, a
fim de descobri-lo (imagem reprodutora, estática). Nesta etapa ela passa a
descentralizar este foco, ou seja, sua orientação de espaço não toma mais seu
próprio corpo como ponto de referência, mas consegue utilizar outros pontos
de referência externos (imagem em movimento) que irão orientá-la.
Podemos citar o exemplo de direita/esquerda. Antes, a criança percebia
isso somente em função de seu corpo. Com pouco mais de oito anos, ela já
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consegue observar isto em reversibilidade, isto é, consegue perceber que as
outras crianças também possuem características corporais como as suas.
A criança, a partir dos dez anos, vai se disponibilizar de uma imagem
corporal em movimento, o que significa que atingiu a capacidade de visualizar
mentalmente o ato motor antes de sua execução.
A criança adquire uma imagem corporal antecipatória, operatória que
permite que ela organize e efetue mentalmente suas ações, tornando-se capaz
de combinar diversas orientações, tais como a conservação da distância, das
quantidades, das formas, assim como encontrar soluções e se organizar
perante diversas situações. Torna-se capaz então de trabalhar em um espaço
orientado.
O desenho da figura humana, nesta fase, ganha mais traços e detalhes
se assemelhando muito com a visão de um adulto. A criança consegue
desenhar, com riqueza de detalhes, as diferentes fases do desenvolvimento,
uma situação vivida ou sonhada, mostrar sentimentos e suas emoções.
Com a aquisição do domínio corporal, a criança consegue descobrir qual
a maneira mais eficaz de melhorar ainda mais este domínio. Aos doze anos,
seus gestos são adaptados a situações imediatas permitindo que suas reações
sejam também imediatas, pois seu corpo deve obedecer-lhe.
Segundo Rosa Neto (2002), as primeiras situações corporais que a
criança tem consciência, manipula, e com as quais joga, são de seu próprio
corpo: satisfação, dor, choro, alegria, deslocamento, e seu corpo é o
instrumento pelo qual ela vai realizar estas ações. O desenvolvimento do
esquema corporal exerce um papel fundamental na vida da criança, já que isto
representa o ponto de partida para as suas diversas possibilidades de ações.
Sendo assim, “esquema corporal é a organização das sensações relativas ao
seu próprio corpo em associação com os dados do mundo exterior” (p. 20).
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De acordo com Thompson (2000), a criança não consegue se
reconhecer como indivíduo enquanto não toma consciência de que é ela
mesma, em qualquer lugar que esteja.
A autora define a tomada de consciência como “um produto do cérebro
(enquanto conteúdo) e uma função (enquanto forma)” (p. 46). A maneira pela
qual é produzida submete-se basicamente a sincronização breve de neurônios
que significam diferentes aspectos do mundo externo, interno, concreto e
abstrato. A criança coordenada seus movimentos através do entendimento dos
estímulos oriundo do meio externo, porém nem todo conhecimento vem do
meio externo. O ser humano possui um sentido interno, denominado cinestesia
que o permite sentir a tensão muscular e o seu movimento. A criança só
consegue desenvolver suas capacidades a partir do momento em que obtém
conhecimento e domínio de seu potencial corporal. Para automatizar o
movimento, a criança recorrerá à prática constante do mesmo, o que resultará
em uma atividade que ela realizará inconscientemente.
Em seu desenvolvimento, a função motora resulta da ação conjunta dos
três sistemas neurológicos (Thompson, 2002, p. 47):
Sistema piramidal
Principal função: responsável pelo movimento voluntário (elabora as
praxias, dirigindo o movimento para um fim).
Todo movimento voluntário deve basear-se nos movimentos
inconscientes inatos ou aprendidos que convoca em sua ajuda e que lhe
regulam o movimento. Presumi-se da associação de três condições:
1) A exibição do movimento a executar, que é uma síntese sensorial, um
entendimento simultâneo do movimento global;
2) A vontade, o propósito da execução do movimento, sua realização, a
parte psicofisiológica;
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3) O próprio progresso do movimento, ou seja, sua efetuação.
Sistema extrapiramidal
Principal função: controle do movimento automatizado.
No instante em que se toma conhecimento do movimento, este passa a
fazer parte da memória e fica sob o comando desse sistema, trabalhando
como se fosse um depositário das aprendizagens motoras que serão
necessárias na progressão corporal do indivíduo. Quando este sistema é
afetado, pode levar a falta do gesto espontâneo, à dificuldade de domínio e
coibição do movimento corporal.
Sistema cerebelar
Principais funções: - regula a proprioceptividade1 inconsciente.
-obtém informações que são oriundas dos músculos,
dos tendões e das articulações, responsabilizando-se pelas sinergias
musculares, isto é, pela organização e amplidão dos movimentos, efetuando
também a coordenação visuomotora.
O movimento não ocorre no vácuo, pois, devido às interações
entre o indivíduo e seu meio ambiente, o mesmo está sujeito a
constante modificação, através das experiências motoras, da
estrutura de personalidade, das percepções pessoais do
ambiente sociocultural e do ambiente físico. (Thompson, 2000.
Pág. 47)
Isto consiste em dizer que os movimentos modificam-se em movimentos
que serão fixados no cérebro e nos sistemas sensorial e motor.
_______________________
1. Proprioceptividade: capacidade de perceber a posição das extremidades do corpo no espaço, detectar a força dos movimentos e a resistência que se opõe a eles. (ROSA NETO, Francisco, 2002, p. 127)
17
A medida que, no decurso de seu desenvolvimento, o sistema nervoso
da criança se altera, alteram-se também as formas de comportamento.
Crianças que possuem dificuldades na esfera da conscientização de seu
corpo não têm capacidade de perceber a posição de seus membros e, em
conseqüência disto, o seu desenho da figura humana é muito pobre. Também
apresentam dificuldades para se deslocar em um ambiente pré-determinado e
em se localizar em relação ao tempo (a noção corporal está intensamente
ligada à orientação espaço-temporal). Elas geralmente se confundem em
relação às coordenadas espaciais e, consequentemente, devido ao
relacionamento desajustado com as outras pessoas, sua linguagem fica
comprometida.
2 – Motricidade ou Coordenação Motora Fina
É a coordenação motora que se usa quando precisamos ter um controle
muito grande sobre a ação que iremos ou que já estamos executando.
Para Rosa Neto (2002, p. 15), “é um processo de ação em que existe
coincidência entre o ato motor e uma estimulação visual percebida” e
representa a ação que o homem exerce com mais frequência, na qual “atua
para pegar um objeto e lançá-lo, para escrever, desenhar, pintar, recortar, etc”
(p.14). Inicia-se pela fase de deslocamento da mão, sucedida pela fase de
agarre e manipulação, terminando em um conjunto com três elementos:
objeto/olho/mão.
A atividade manual, guiada por meio da visão, faz interferir, ao
mesmo tempo, o conjunto dos músculos que asseguram a
manutenção dos ombros e dos braços, do antebraço e da mão,
que é particularmente responsável pelo ato manual de agarrar
ou pelo ato motor, assim como os músculos óculomotores que
regulam a fixação de olhar, as sacudidas oculares e o
movimento de perseguição. (Rosa Neto , 2002. Pág. 14)
18
Para que seja feita a organização dessas ações é indispensável a
participação de diversos centros nervosos motores e sensitivos que se
explicam pela ordenação de programas motores e por intermédio de várias
sensações advindas dos receptores sensitivos, articulares e cutâneos do
membro requerido. O modo com o qual o encéfalo usa as informações
visuoespaciais, das quais se retiram também medidas temporais para originar
ações guiadas pela visão, fica, entretanto, desconhecido.
O deslocar da mão para um determinado alvo, perseguido anteriormente
com os olhos, termina quando o agarre manual do objeto é concretizado,
representando o que é uma das ações mais complexas do ser humano. Antes
de a mão ter contato com o objeto, os dedos já estão predeterminados quanto
ao seu grau de abertura e quanto a sua orientação, no que diz respeito a
percepção do formato do objeto. Quando se tem contato com este objeto, os
receptores sensitivos enviam ao encéfalo informações específicas sobre a
força que é necessária para movimentá-lo (levantar, empurrar, lançar,
amassar, etc).
Adiantando o movimento do braço, surgem outras ações da parte distal
dos dedos da mão em repouso. Os dedos se esticam e abrem-se de acordo
com a dimensão do objeto. A abertura apropriada é conquistada por meio do
trajeto feito pela mão e não se modifica até ter contato com o objeto. Os
movimentos dos dedos acompanham uma rotação de punho que põe a mão
em uma posição adaptada para o agarre.
O córtex pré-central correspondente à motricidade fina tem uma função
indispensável no controle dos gestos solitários das mãos e dos dedos para
pegar o alimento. As áreas córtico-sensomotoras das mãos e dos dedos são
de grande importância fazendo destacar a fineza extrema dos controles táteis
e motores. As explorações táteis e palmatórias possibilitam o reconhecimento
das formas sem intervenção da visão. As percepções cutâneas e articulares
ligadas à motricidade dos dedos possibilitam as indicações a partir das quais
as formas podem ser reconstituídas.
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A exemplo de uma atividade motriz usual que solicita controle de
músculos e articulações de um membro superior ligada à coordenação
visuomanual temos a escrita. Se levarmos em consideração que a mão e os
olhos são absolutamente fundamentais, a escrita manual conduzida pela visão
proporciona o padrão gráfico mais regular e rápido. A escrita conta de uma
organização de movimentos ordenados para imitar as forma e os modelos;
compõe uma praxia motora. Esta coordenação visuomanual se arruma
gradualmente com o progresso motriz da criança e de seu aprendizado. Visão
e feedback perceptivo-motor estão dispostos e ordenados visando gerar um
comportamento motor ajustado a qualquer situação.
Segundo Chicon (1999), baseado nos estudos de Le Boulch, a
coordenação óculo-motora envolve o desenvolvimento da sincronia entre os
campos visuais e motor requerendo o domínio da manipulação dos objetos.
Inclui uma relação restrita entre a visão e a motricidade do membro superior e
inferior. Suas atividades colaboram com o fator de realização dominante no
mecanismo da escrita, bem como no aperfeiçoamento das habilidades das
mão e dos pés. A ação educadora abrange exercícios manipulativos como
jogos de construção, recortar, colocar pequenos objetos sobre uma linha,
lançar e apanhar, exercícios de desagregação com dois objetos (ex: fazer girar
um aro em uma das mãos e fazer malabarismo com uma bola na outra);
exercícios de pontaria, e outros.
De acordo com Oliveira (2009b, p. 42), a coordenação motora fina “diz
respeito à habilidade e destreza manual e constitui um aspecto particular da
coordenação global”. A sistematização elaborada dos dedos da mão vai
facilitar a obtenção de novos conhecimentos. É pelo ato de agarrar que o
indivíduo vai descobrindo gradativamente os objetos que estão no ambiente
em que o rodeia.
Não é suficiente ter uma boa coordenação motora fina, é preciso haver
também um controle visual, ou seja, os olhos devem seguir os movimentos da
20
mão. É o que se pode chamar de coordenação óculo-manual ou
visuomotora.
Uma das perspectivas que a prática do corpo todo favorece é a
autonomia do braço em relação ao ombro, e da mão em relação aos dedos,
fatores cruciais na precisão da coordenação visuomotora. A escrita precisa
desta autonomia dos membros para se processar de modo econômico, sem
exaustão, e para que a criança obtenha o domínio da pressão sobre os dedos.
Praticar movimentos como lançar – pegar são essenciais para o
desenvolvimento da escrita, pois auxiliam o indivíduo a memorizar a atividade
entre o campo da visão e a coordenação motora fina da mão e dos dedos,
ocasionando uma maior coordenação visuomotora.
Para que a criança tenha um bom aprendizado da escrita é preciso que
ela tenha uma boa coordenação ao sentar, ou seja, é necessário que ela
adquira uma postura correta para executar os movimentos gráficos a fim de
tornar a sua posição mais cômoda, mais relaxada. É preciso também que
saiba dissociar e controlar os movimentos. Além de ser fundamental o fato de
conseguir controlar a pressão gráfica desempenhada sobre o lápis e o papel,
para atingir maior habilidade, resultando em uma maior velocidade de
movimento. Isto se torna mais fácil quando a criança possui uma lateralidade
bem definida.
3 – Motricidade ou Coordenação motora global
Segundo Chicon (1999, p. 38) baseado nos estudos de Le Boulch, a
motricidade global (ou motricidade dinâmica geral) “envolve um ajustamento da
totalidade das partes do corpo, implicando, na maioria das vezes, na
locomoção”. É a motricidade que não exige tanta firmeza e/ou destreza na
execução dos movimentos que nela se incluem. Esses movimentos são menos
complexos e mais amplos.
A coordenação motora global tem por objetivo melhorar na criança uma
possível adaptação as novas situações, necessitando, de maneira geral, a
21
utilização de mecanismos que regulam o equilíbrio e a postura e,
simultaneamente, fortificam certos fatores de realização: força, resistência,
velocidade e agilidade.
As habilidades de uma criança, seus atos, sua movimentação e o ritmo
com que executa suas atividades podem nos auxiliar a conhecê-la mais
claramente do que se tentássemos fazer isto através das palavras que são
ditas por ela. É natural que a criança busque situações no seu dia-a-dia,
momento em que ela possa transformar em teatro e interpretá-los (ex: fatos
que ocorreram em casa, na escola, no parque) tornando isto uma prática lúdica
que lhe traga prazer e que exercite sua criatividade. Dessa forma ela está
trabalhando a sua afetividade e desenvolvendo/estimulando sua inteligência.
Por passar grande parte de sua vida na escola, o comportamento de
uma criança é retratado pela sua atividade motora. Correr, saltar como
cangurus, imitar os passos de uma onça ou imaginar-se como um carro em
uma pista de alta velocidade, galopar, subir em árvores, etc., isto se chama
relaxamento corporal, o bem-estar da liberação física. Como sabemos, cada
criança tem seu próprio ritmo e é muito importante que saibamos respeitar este
ritmo individual. Esta diferença de ritmos se dá não só pela originalidade mas
pelo amadurecimento dos centros nervosos que não acontece da mesma
maneira, nem no mesmo nível, para todas as crianças. O que importa mesmo
é a criança desenvolver um trabalho, nem tanto o resultado deste trabalho.
Para Rosa Neto (2002), a perfeição gradual da ação motora envolve um
funcionamento globalizado dos mecanismos que regulam o equilíbrio e a
atitude. Quando a criança tem habilidade para isto, certas condições de
realização permitem fortalecer certos fatores da ação (vivacidade, força
muscular, resistência, etc.). Estes fatores também vão desenvolver o domínio
da motricidade espontânea, à medida que a situação-problema requer o
respeito de certas situações que determinam as circunstâncias de espaço e
tempo em que se deve executar a tarefa. Durante suas brincadeiras, a criança
consegue captar do meio, os utensílios necessários para que possa explorar o
22
mesmo, ou seja, a criança utiliza-se da imaginação para criar suas próprias
experiências. E vai ser através da atividade lúdica espontânea que ela
descobre a ajustagem diversa, complicada e gradual da atividade motriz,
resultando em um grupo de gestos coordenados em função de um final a ser
atingido.
Também segundo autor, o gesto motor global seja o mais singelo que
for, é um gesto sinestésico, tátil, labiríntico, visual, espacial, temporal e assim
por diante. Os gestos dinâmicos corporais representam um importantíssimo
papel na melhoria dos comandos nervosos e na aprimoração da sensações e
das percepções.
“O que é educativo na atividade motora não é a quantidade de trabalho
efetuado nem o registro (valor numérico) alcançado, mas sim o controle de si
mesmo obtido pela qualidade do movimento executado, isto é, da precisão e
da maestria de sua execução.” (Rosa Neto ,2002. Pág. 17)
De acordo com Oliveira (2009b, p. 41), a coordenação global “diz
respeito à atividade dos grandes músculos”. Ela depende do equilíbrio postural
da criança e este equilíbrio depende de sensações proprioceptivas
cinestésicas e labirínticas. Quando o indivíduo se movimenta e tem suas
experiências práticas com o seu corpo, ele está procurando seu eixo corporal e
com isso vai se adequando e buscando um equilíbrio cada vez melhor. Em
conseqüência disso, vai coordenando seus gestos, vai tomando consciência de
seu corpo e de suas posturas. “Quanto maior o equilíbrio mais econômica será
a atividade do sujeito e mais coordenadas serão suas ações” (p. 41).
Com uma boa coordenação global e um elevado nível de
experimentação, a criança obtém a dissociação dos movimentos, tendo
condições de executar múltiplos gestos simultaneamente, cada membro
executando uma ação diferente, ocorrendo uma conservação de unidade do
movimento.
23
Existem exemplos de muitas atividades que levam a criança a se
conscientizar de seu corpo como o andar, que requisita equilíbrio e
coordenação; correr, que requisita, além destes, resistência e força muscular; e
outros como saltar, rolar, arrastar-se, nadar, sentar, etc.
Todas as crianças, desde cedo, realizam estas atividades e quando
chegam a escola, já possuem certo controle sobre a coordenação global de
seus gestos. Algumas crianças podem ainda manifestar algumas complicações
quanto a esta coordenação e o educador deve, antes de mais nada, levar em
consideração essas possibilidades, analisando as conquistas anteriores. Além
disso, o educador deve observar também a relação entre postura e controle do
corpo, e se a criança demonstra fadiga ou falha na execução de seus gestos.
Este educador necessita corrigir, com paciência e segurança, as posturas
erradas para que possa melhor ajudar estas crianças no desenvolvimento de
uma coordenação mais adequada.
4 – Equilíbrio
Um indivíduo está equilibrado quando consegue se manter de pé ou em
qualquer outra posição (natural ou não) sem cair ou se inclinar para qualquer
um dos lados.
Segundo Thompson (2000, p. 51), “o equilíbrio reúne um conjunto de
aptidões estáticas e dinâmicas”. Como o equilíbrio estático apresenta maior
dificuldade por ser abstrato, exige muito mais concentração e, por isso, seu
domínio é indispensável para a aprendizagem. E o equilíbrio dinâmico tem uma
estreita ligação com as funções tônicas motoras, com os membros e com os
órgãos, tantos os sensitivos quanto os motores.
Um corpo está em equilíbrio quando tem a capacidade de sustentar e
dominar posturas, posições e atitudes. O equilíbrio é o alicerce fundamental de
toda a coordenação dinâmica geral e também de toda atividade Se o equilíbrio
for defeituoso, o indivíduo encontrará fadiga, pois estará sempre combatendo a
24
falta de estabilidade corporal, contra tensões e sincinesias2. O equilíbrio, assim
como diversos outros componentes psicomotores, é mantido sob o domínio
dos mecanismos neurológicos, mas sem que isso possa comprometer a
utilização de um controle consciente.
A ausência de equilíbrio pode obter sua origem na inexistência de
confiança que o indivíduo possui dele próprio, e pode seguir-se de
perturbações da coordenação.
Sendo assim, “crianças instáveis do ponto de vista psicomotor, que a
todo instante mudam de posição a fim de tentar estabilizar seu equilíbrio,
acabam por prejudicar sua capacidade atentiva” (Thompson, 2000, p. 51).
De acordo com Rosa Neto (2002, p. 17), o equilíbrio “é a base primordial
de toda ação diferenciada dos segmentos”. Quanto mais falhas se tem na
execução do movimento mais cansaço a pessoa sente por que gasta mais
energia para realizá-lo. Essa energia gasta em excesso poderia ser melhor
encaminhada para outras tarefas neuromusculares. Do combate contínuo,
mesmo que inconsciente, em oposição ao desequilíbrio, redunda em um
estado de fadiga corporal, mental e espiritual, intensificando o nível de
estresse, ansiedade e angústia do indivíduo.
Através da história o homem assumiu a postura em pé para poder se
adaptar ao meio em que vivia, ou seja, esta evolução postural fez parte de uma
experiência corporal onde percebeu-se que a nova postura assumida dava
mais imposição de poder para o homem em relação aos outros animais.
A postura nada mais é que a ação reflexa do corpo em relação ao
espaço. Esta ação reflexa pode interferir nos músculos, segmentos corporais
ou no corpo todo. A criança pequena, antes de atingir o equilíbrio, assume
somente posturas, o que significa dizer que seu corpo responde de modo
________________________
2. Sincinesia: Perturbação da execução de um gesto voluntário acompanhada da
execução de outro gesto não controlado pelo sujeito
25
reflexo aos diversos estímulos do meio. A postura está organizada sobre o
tônus muscular (condição de leve contração sustentada dos músculos
esqueléticos que se encontram sadios. Será analisado mais adiante neste
estudo)
As grandes modificações que o esqueleto humano sofre têm relação de
dependência com a postura vertical permanente e com a marcha bípede,
particularidade entre os mamíferos. “A justificativa está preferencialmente na
extensão da pélvis e articulação do joelho, já que ambas permitem a
manutenção vertical da coluna vertebral”. (Rosa Neto, 2002, p. 17)
O peso corporal está sendo suportado pela base de apoio dos pés que,
apesar disso, não provoca restrição quanto ao equilíbrio postural e é a
circunstância ideal para o movimento, já que se sabe que para isto acontecer é
requisitado um mínimo de energia tônico-muscular. A marcha é composta por
uma queda controlada, combinando algumas funções do cerebelo e do cérebro
que inteiram aspectos do equilíbrio do domínio do próprio corpo e da
coordenação motora. A posição vertical e o alinhamento da cabeça são os
causadores do desenvolvimento cortical dos seres vivos. A posição horizontal
que a visão proporciona ao cérebro, fornece uma excelente colocação para a
centralização e integração de todas as informações que geram a conduta
humana. Tomando esta postura vertical o homem tem condições de reagir de
maneira mais natural as exigências que seu mundo lhe impõe.
O tono postural de manutenção é o resultado de um conjunto
de reações de equilíbrio e de manutenção de atitude, e fornece
referência e suporte para a execução das ações motrizes. O
ajuste postural se apóia nas aferências vestibulares que
indicam a posição de cabeça no espaço sobre as aferências
proprioceptivas que sinalizam tanto a posição da cabeça em
relação ao tronco como a quantidade de tono muscular da
base, as aferências cutâneas plantares que abastecem índices
de pressão e as aferências visuais. (Rosa Neto, 2002, p. 18)
26
A postura em pé presume que o sistema motor do organismo humano
garante a manutenção do equilíbrio estático ou dinâmico e, assim, entra em
combate contra as forças da gravidade. O tono de manutenção postural e suas
variações que são controladas pelo sistema neuromuscular estabilizam o
centro de gravidade no íntimo do quadrilátero de sustentação. Esse sistema
neuromuscular recebe aferências proprioceptivas, labirínticas e visuais que lhe
avisam o deslocamento do centro de gravidade e dão origem as correções
apropriadas para que possa dispor de uma posição estável. (Idem)
Durante o gesto, o tono-postural deve ser regulado de maneira que
possa compensar o deslocamento do peso corporal de uma perna para outra e
garantir, simultaneamente, o equilíbrio de todo o corpo. A ação muscular
postural contrabalança automaticamente as forças dinâmicas mais
desestabilizadoras geradas pelo gesto.
O equilíbrio tônico-postural é caracterizado pelo “mecanismo complexo
dos reflexos” (Rosa Neto, 2002, p. 18), provido, por sua vez, de um grupo de
informações proprioceptivas. Tal grupo é composto por redes de informações
sensitivas. Esse jogo complexo é o que explica as variações e as mudanças
que formam a realidade do equilíbrio na posição ortostática. No plano da
ordenação neuropsicológica, é possível dizer que o equilíbrio tônico-postural
compõe o padrão de auto-regulação do comportamento.
5 - Lateralidade
Segundo Rosa Neto (2002), o corpo humano possui duas partes
anatômicas que o separam em lado esquerdo e lado direito e que possuem
simetria. Porém, há uma assimetria funcional no sentindo de que algumas
atividades só assistem a uma dessas partes (Ex: escrevemos com uma mão
só). Na maior parte das pessoas, os centros de linguagem se situam no
hemisfério esquerdo (cérebro). O autor define lateralidade como “a preferência
da utilização de uma das partes simétricas do corpo: mão, olho, ouvido, perna;
a lateralização cortical é a especialidade de um dos dois hemisférios quanto ao
27
tratamento da informação sensorial ou quanto ao controle de certas funções”.
(Pág. 23 e 24)
Oliveira (2009b, p.62) diz que a lateralidade “é a propensão que o ser
humano possui de utilizar preferencialmente mais um lado do corpo do que o
outro em três níveis: mão, olho e pé”. Isto quer dizer que existe uma
dominância motora maior em um dos lados do corpo. Este lado dominante
manifesta mais força muscular, maior precisão nos movimentos e mais
rapidez. Na realização da função principal, este lado dominante inicia e
executa a ação sendo auxiliado pelo outro lado que é de igual importância. Os
dois lados não trabalham isolados, mas sim complementando um ao outro.
Vários exemplos nos mostram como estes lados se complementam e
qual é o dominante e o auxiliar.
Na dominância manual podemos perceber o lado dominante de uma
criança quando pedimos para ela escrever ou desenhar em uma folha de
papel. Uma das mãos vai segurar a folha (mão auxiliar) e a outra executará a
ação (mão dominante). Isto também ocorre quando pedimos para que a
criança se penteie ou recorte alguma figura.
A dominância ocular pode ser observada através de um teste que
consiste em perfurar um cartão e pedir para que a criança veja um objeto
qualquer que esteja a sua frente através do furo no cartão. Devemos tomar
cuidado ao confirmar a dominância ocular de uma criança, pois ela pode ter
algum problema de visão, o que pode mascarar esta dominância.
Para podermos observar a dominância dos pés, um bom exercício é
pedir para a criança brincar de amarelinha com um pé e depois com o outro.
Assim pode-se verificar o lado que ela teve mais facilidade, ou seja, o lado que
teve maior demonstração de força, destreza e estabilidade.
Se um indivíduo possui dominância nos três níveis do lado direito, isto
significa que podemos denominá-lo destro homogêneo. Já se um indivíduo
possui dominância nos três níveis do lado esquerdo, dizemos que ele é
28
canhoto ou sinistro homogêneo. Porém se um indivíduo consegue executar
os mesmos movimentos do lado direito e do lado esquerdo com precisão, de
forma espontânea, o que não se encontra com facilidade, o chamamos de
ambidestro.
Existem, porém, casos de crianças que fogem a esta regra, podendo
usar a mão não-dominante em desvantagem da dominante. É que chamamos
de lateralidade cruzada, quando a criança utiliza o pé direito, a mão e o olho
esquerdo, entre outras combinações. Neste caso podemos encontrar uma
pessoa destra utilizando a mão esquerda (destralidade contrariada) ou um
canhoto usando a mão direita (sinistralidade contrariada)
Alguns motivos podem levar a um desvio de lateralidade. Oliveira
(2009b) destaca um exemplo em que um acidente causa a amputação ou a
paralisia no lado que exerce dominância. A pessoa que sofre este acidente
pode começar a usar o outro lado. Este fato pode ser chamado de falsa
destralidade ou falsa sinistralidade.
Este desvio de lateralidade pode ocorrer também se houver, por parte
da criança, identificação com alguém ou por imposição dos pais e/ou
professores.
Para Rosa Neto (2002, p. 24), “a lateralidade está em função de um
predomínio que outorga a um dos dois hemisférios a iniciativa da organização
do ato motor, o qual desembocará na aprendizagem e na consolidação das
praxias”. Essa ação prática, que dará apoio para que a criança consiga
resolver antecipadamente os seus gestos, se desenvolve de maneira
indispensável no momento em que a criança vivencia a atividade de
investigação, no decorrer da qual ela vai conviver com o seu meio. A ação
educativa essencial para que a criança possa se encontrar nas melhores
condições para adotar uma lateralidade definida, respeitando os fatores
genéticos e ambientais, é a que deixa-lhe ordenar suas ações motoras.
29
Thompson (2000, p. 50) diz que “o desenvolvimento da lateralidade é
extremamente importante já que permite fazermos uma relação correta entre
as coisas do mundo que nos cerca”.
A lateralidade refere-se ao espaço interno de cada indivíduo,
habilitando-o utilizar um lado do corpo com mais eficiência que o outro.
Se a criança não consegue distinguir o que é esquerda e direita, ela não
conseguirá, por conseqüência, exteriorizar este conhecimento, ou seja, terá
dificuldade em discriminar a direção em que se encontram os objetos externos
a ela.
A lateralidade é uma noção de espaço que se constrói lentamente e que
se forma por impressões prévias que moldaram o esquema corporal.
Baseando-se em uma boa organização do próprio corpo, um bom
entendimento de sua imagem corporal, de seu EU, a criança, gradativamente,
vai ampliando seu espaço.
Não se pode renunciar a esta conquista da imagem corporal no
desenvolvimento das noções de espaço e tempo, porque são duas noções
adquiridas quase que concomitantemente, ainda que os conceitos acerca do
espaço e do tempo continuem desconhecidos pela criança até uma idade mais
avançada.
6 – Estruturação ou Organização Espacial
De acordo com Rosa Neto (2002, p. 21), “a noção do espaço é
ambivalente, pois, ao mesmo tempo é concreta e abstrata, finita e infinita”. Isto
quer dizer que a noção de espaço tem relação com o corpo, que nos está
sempre acessível, e com o ambiente que nos rodeia, sendo finito, enquanto
conhecemos, e infinito, quando foge das barreiras do nosso conhecimento, ou
seja, quando conhecemos um lugar novo. O espaço concreto existe
independentemente do que é feito e de nossa vontade. Já o espaço
psicológico, que se relaciona com a nossa atividade intelectual, manisfesta-se
diretamente em nosso consciente. No nosso dia-a-dia utilizamos os sentidos e
30
a percepção no ambiente em que vivemos. Estes sentidos contêm dados sobre
os objetos que constituem este ambiente, porém é a nossa percepção através
da aprendizagem, que vai dar sentido a organização dos mesmos. A
organização espacial depende de três fatores: da estruturação corporal, da
natureza do meio em que vivemos e de suas características. Nós adquirimos a
noção de espaço pouco a pouco. Essa noção que temos de espaço e a
relação com os objetos que o constituem, evolui e se transforma de acordo
com a faixa etária e com a experiência. Esta relação vai progredindo, tornando-
se objetiva e independente.
Todas as formas de sentido participam em certa medida da percepção
do espaço: visão, audição, tato, propriocepção e olfato. Nem sempre as
informações que recebemos estão de acordo e envolvem percepções
contraditórias, particularmente quando se trata da definição da verticalidade.
Nossa orientação espacial nos permite examinar com precisão a relação
concreta entre nosso corpo e o meio que nos rodeia, permitindo que possamos
efetuar as mudanças necessárias no rumo de nossos deslocamentos.
As primeiras noções que temos de espaço estão intimamente ligadas ao
funcionamento dos diferentes receptores sensoriais (sem eles nós não
teríamos a capacidade de perceber o espaço a nossa volta). Os olhos e os
ouvidos, o labirinto, os receptores articulares e tendinosos, os fusos
neuromusculares e a pele significam o ponto de partida da experiência corporal
de cada indivíduo. Para obtermos a percepção relativa à posição que o corpo
se encontra no espaço, precisamos da ajuda destes receptores. Já para
obtermos a orientação quanto a localização dos objetos no espaço, utilizamos
mais a visão e a audição.
O progresso da noção espacial ressalta a existência de duas etapas:
uma se liga à compreensão rápida do ambiente, que se caracteriza pelo
espaço sensório-motor; e a outra baseada nas operações intelectuais que
saem do espaço representativo (mente). Essa evolução acontece, partindo do
estabelecimento das relações da criança, na sua fase egocêntrica, e vai se
31
descentralizando gradualmente e consegue, assim, avaliar suas relações com
pontos de vistas diferentes dos seus. É assim que a criança adquiri o
conhecimento de direita/esquerda. Deste modo, se obtém de forma gradual,
com a evolução mental da criança, a conquista e preservação das noções de
distância, superfície, volume, perspectivas e coordenadas que delimitam suas
possibilidades de orientação e de estruturação do espaço em que vive.
Segundo Oliveira (2009b) a estruturação espacial é muito importante
para que vivamos em sociedade. É através da percepção espacial que nos
localizamos no ambiente em que vivemos, fazemos relações com os objetos a
nossa volta, fazemos observações, comparando, combinando e detectando
diferenças e semelhanças entre eles. É através do trabalho mental que
selecionamos, fazemos comparação entre objetos, tiramos, reunimos e
chegamos a algumas conclusões sobre estes objetos e suas características
Diversas atividades efetuadas na sala de aula (ex: a escrita), dependem
de como a criança manipula as relações espaciais entre os objetos. Estas
relações espaciais são sustentadas pelo desenvolvimento da estruturação
espacial. Sem ela nós perdemos muitas dessas relações e acabamos
sofrendo, no âmbito comportamental, por receber informações incorretas.
A estruturação espacial não é inata, nós a adquirimos devido a
elaboração e construção mental que se realiza através dos movimentos que
fazemos em relação aos objetos que nos rodeiam e a posição dos mesmos.
Para Fonseca (2008), a criança cria uma relação mágica com o espaço
bucal por ser o espaço que mais está a seu alcance, já que necessita dele
para se alimentar. A partir daí, a criança usa a boca não só para sugar os seios
da mãe, mas para sugar objetos outras pessoas e suas próprias extremidades,
como mãos e pés.
De acordo com Oliveira (2009b), as relações de bem ou mal-estar da
criança, na fase inicial da vida, está relacionada diretamente com a afetividade.
32
No decorrer de seu desenvolvimento, a criança se torna capaz de notar e por
em ordem suas sensações visuais, táteis, auditivas e cinestésicas3.
Dar nomes aos objetos também ajuda para a organização da vivência
espacial e para uma melhor convivência das diferentes partes do corpo e de
suas posições.
Desde muito cedo a criança seleciona e dispõe seus objetos em ordem.
Ela precisa se vestir, comer, brincar, colocar o sapato e amarrar o cadarço.
São atos de seu dia-a-dia que a estimulam a realizar gestos diferenciados para
que ocorra a sua execução.
Para que a criança possa entender a posição dos objetos no espaço, ela
necessita, antes de mais nada, ter uma boa imagem corporal, pois utiliza seu
corpo como fonte de referência. Quando ela possui um bom domínio de seu
corpo, possui também uma boa estruturação espacial.
Também é preciso, para um bom desenvolvimento da estruturação
espacial, que a criança possua uma lateralidade bem definida porque se torna
mais fácil discernir as diferentes localizações dos objetos em relação ao
espaço que se encontram.
Podemos dizer que a criança atingiu a etapa final da orientação espacial
quando sabe compreender perfeitamente algumas noções como as de
situação (dentro/fora, longe/perto); de tamanho (pequeno/grande); de posição
(em pé/deitado); de movimento (subir/descer); de formas (círculo, quadrado);
de qualidade (cheio/vazio); de superfícies e de volumes.
Isto significa que a criança tem maior possibilidade de realizar ações
mais precisas a partir do momento em que consegue identificar o espaço que a
rodeia.
___________________
3. Sensações cinestésicas: dão capacidade ao indivíduo de avaliar, sem controle visual, a direção e a velocidade do movimento e a posição das extremidades e do tronco. (ROSA NETO, Francisco, 2002, p. 118)
33
Indivíduos com uma boa organização de espaço conseguem ter
consciência dos objetos que fazem parte deste espaço estando à sua frente,
ao seu lado, longe, perto e atrás. As crianças pequenas ou que não
desenvolveram bem esta noção espacial têm certo custo para perceber este
espaço existente atrás delas, por isso, quando elas se voltam, os objetos e as
situações localizadas atrás deixam de existir.
Quando a criança consegue se orientar no meio em que vive, estará
mais preparada para compreender a orientação espacial no papel (Oliveira,
2009b). Muitos educadores, preocupados somente com o desenvolvimento
espacial vinculado a aprendizagem da leitura e da escrita, não se preocupam
em trabalhar estas noções em nível de movimentação corporal, de assimilação
das ações, e tentam iniciar esta orientação pelos exercícios que envolvem a
grafia. Isto é uma falta gravíssima, pois levam as crianças apenas a aprender a
partir da imitação de gestos e memorizar o que lhe é imposto sem que haja
alguma modificação mental expressiva.
A criança que tem uma boa orientação espacial no papel, mentalmente
ordena sua folha ao exprimir-se por meio da escrita, antes de executar estas
ações.
Depois que já assimilou e orientou as coisas, a criança passa a ordená-
las, combinando-as com diversas orientações. Neste momento, a criança não
utiliza mais de seu corpo como fonte de referência, escolhendo ela mesma
suas próprias referências, sob diversas orientações. Ela aprende então as
noções de distância, direção, passa a antever, a adiantar e transpor objetos.
A criança desenvolve também a memória espacial, o que vai lhe permitir
sentir a ausência de um objeto em determinado lugar e copiar uma ilustração
anteriormente observada.
A partir de uma boa estruturação espacial a criança se torna capaz de
se localizar e se mover tranquilamente no meio em que vive. É uma fase
baseada unicamente no raciocínio (pensar/prever para depois agir/executar).
34
Muitas complicações podem resultar de uma má integração da
estruturação espacial. São várias as razões que impedem ou delongam o total
desenvolvimento da criança, como por exemplo (Oliveira, 2009b):
a) Restrição de seu desenvolvimento mental e psicomotor;
b) Crianças impedidas de terem experiências corporais e espaciais e que
não possuem oportunidades de manipular objetos a sua volta;
c) Crianças que não desenvolveram a idéia de esquema corporal,
ocasionando prejuízo na função de interiorização;
d) Crianças que ainda não conseguiram determinar a dominância lateral e
nem compreender as noções de direita e esquerda através da
internalização de seu eixo corporal.
e) Dificuldades na interpretação mental de várias noções.
As causas não terminam aqui. Muitas podem ser calamitosas na
aprendizagem escolar. A autora, baseada nos estudos de alguns autores,
como Le Boulch e De Meur, conclui que:
• Muitas crianças que não conseguem compreender os termos espaciais
se confundem quando se exige delas uma noção de localização, de
orientação, tanto em seus momentos de lazer, quanto na sala de aula;
• Às vezes elas têm conhecimento dos termos espaciais mas não
distinguem as posições. Isto pode colocar sua aprendizagem em risco,
pois não diferenciam as direções das letras. Ex: “b” e “p”, “6” e “9”, “b” e
“d”, “p” e “q”, etc.
35
• Algumas crianças, aparentemente, percebem o espaço que as rodeia
mas não têm memória espacial. Elas “esquecem”, ou se confundem
com o sentido das representações gráficas (letras).
• A falta de organização espacial é um fator muito detectado, até mesmo
em adultos. Significa que são indivíduos que constantemente colidem ou
tropeçam em objetos. Manifestam diversas vezes indecisões quando
necessitam desviar de um empecilho no caminho, não sabem que
direção tomar. Além de não conseguirem arrumar seus objetos pessoais
em um armário ou gavetas.
Não consegue também, por conseqüência, ter a orientação espacial no
papel, a consciência da dimensão de seus desenhos ou escrita. Isto vai obrigar
o indivíduo a desenhar algumas partes e apertar outras em um canto da folha.
Na escrita, não obedece a direção horizontal da linha, podendo ocorrer
declives ou aclives. Na leitura e na escrita, tem complicações para obedecer a
ordem e a sequência das letras nas palavras e das palavras na frase. Podem
não ter capacidade para locomover os olhos no decurso da leitura seguindo o
sentindo esquerda-direita e até chegar a saltar uma ou duas linhas.
A orientação espacial, que a criança tem que aprender quando tem
oportunidade de interagir com o meio que vive, está intimamente associada a
orientação temporal. Todo e qualquer indivíduo só consegue se locomover em
um espaço e tempos definidos. Não se pode citar um sem falar no outro.
7 - Estruturação ou Organização Temporal
Segundo Thompson (2000, p. 50), “é dentro do tempo que nos
orientamos no espaço e que organizamos nosso espaço vital”. Como são
noções muito abstratas, as noções de tempo podem ser bem difíceis de serem
absorvidas pelas crianças e, a fim de auxiliar a aprendizagem destas noções, é
necessário fornecer os vários elementos que fazem parte do tempo
(velocidade, duração e sucessão).
36
A criança localiza seus atos e suas práticas em períodos de vigília-sono,
de antes-depois, manhã-tarde-noite, ontem-hoje-amanhã. As relações de
tempo apenas existem pelas ligações estabelecidas mentalmente pela criança
entre suas ações. Para o entendimento do tempo é essencial a ação da
memória.
Crianças com modificações nessa área não conseguem antecipar as
suas ações; não completam todas as atividade propostas por que se atrasam
na realização de alguma outra; não conseguem unir o gesto a palavra na
leitura expressiva; não notam a duração dos eventos (se vai devagar, se vai
depressa ou quando ocorre uma pausa).
Para que uma criança aprenda a ler é indispensável que obtenha
domínio do ritmo, uma sequência de sons no tempo, uma memorização
auditiva e diferenciação dos sons.
“O ritmo é uma condição inata do ser humano, e é suscetível de
educação. A falta de habilidade rítmica pode ser causa de uma leitura lenta e
silabada, uma vez que a leitura é constituída por uma sucessão de elementos
gráficos que são traduzidos em elementos sonoros”. (Thompson, 2002. pág.
51)
Segundo Oliveira (2009b, p. 85), “as noções de corpo, espaço e tempo
tem que estar intimamente ligadas se quisermos entender o movimento
humano”. O corpo se organiza, se move de forma contínua dentro de um
espaço definido, em função do tempo, em relação a um conjunto de
informações.
Por isso sempre há citações da orientação espacio-temporal, de
maneira agregada. Porém há necessidade de estudar espaço e tempo
separadamente para que possamos compreender melhor seus fenômenos
constitutivos.
Existem dois tipos de tempo: o estático e o dinâmico (Oliveira, 2009b, p.
86). Quando um escritor de romance histórico define como presente uma série
37
de acontecimentos em um determinado tempo na história, está manipulando o
tempo estático. Todos os fatos ocorridos terão correlação anterior e posterior
com este presente estático e é este o fim do tempo histórico que foi
apresentado por ele.
Nós estamos vivendo no tempo dinâmico, que também pode ser
chamado de experiencial, onde o curso do tempo transcorre pelas noções de
passado, presente e futuro. Este curso do tempo quer dizer que eventos do
passado são conhecidos, os do futuro desconhecidos ou que podem ser
antevistos e os do presente podem ser praticados imediatamente.
Da mesma maneira que é importante ter uma boa orientação da escrita
no papel, a palavra falada requer que sejam proferidas palavras de uma
maneira organizada e consecutiva, uma atrás da outra, seguindo certo ritmo e
dentro de um tempo definido.
Para que uma criança seja capaz de assimilar a leitura é indispensável
que ela tenha domínio do ritmo, uma consecutividade de sons no tempo, uma
memorização auditiva, uma diferenciação de sons, um reconhecimento das
repetições e da duração dos sons das palavras.
Percebe-se uma grande conexão entre estruturação temporal e a
linguagem. A obtenção da palavra presume uma passagem no tempo, uma vez
que a linguagem é uma sequência de fonemas no tempo. Presume-se também
uma melodia das palavras e das frases, uma variedade na frequência e na
intensidade e finalmente uma ordenação das informações percebidas.
Uma pessoa deve possuir a competência de distinguir os conceitos de
ontem, hoje e amanhã. Uma criança pequena não consegue ultrapassar suas
ações para o passado ou para o futuro. Para ela o importante é o presente, o
que está sendo vivenciado agora. Os eventos que acontecem no passado
geralmente se encontram confusos e misturados com a noção de presente. Ela
não consegue perceber a sucessão de acontecimentos.
38
A estruturação temporal é o que vai lhe assegurar uma prática de
localização dos acontecimentos já ocorridos, e a capacidade de lançar-se para
o futuro, podendo assim planejar suas atitudes e decidir que rumo tomar na
vida.
A palavra “tempo” é utilizada para apontar os instantes de mudança. O
homem se inclui no tempo. Ele nasce, cresce e morre e sua ação é uma
sucessão de mudanças. O organismo humano “vive em função de um certo
‘relógio interno’, condicionado pelas suas atividades diárias” (Oliveira, 2009b,
p. 88).
As horas em que nos alimentamos também devem ser respeitadas. Se
um indivíduo almoça no mesmo horário, todos os dias, saberá especificar as
horas pela necessidade que tem de se alimentar. Se ele passa do horário em
que está acostumado, na maior parte das vezes, sua fome tende a se
tranquilizar, o que leva o seu organismo a programar outros hábitos,
interferindo no seu “relógio interior”.
Para Rosa Neto (2002), nós entendemos a passagem do tempo a partir
das mudanças que se originam em um período instituído e da sua sequência
que transforma pouco a pouco o futuro em presente e depois em passado.
A organização temporal pode ser devida a dois elementos: a ordem e a
duração que o ritmo reúne. A primeira elucida a sucessão existente entre os
acontecimentos que se criam, uns sendo o seguimento dos outros, em um
arranjo físico sem volta; a segunda consente a variabilidade do período que
separa dois momentos, isto é, o início e o final de um evento.
A noção que temos de duração redunda em uma elaboração ativa do
indivíduo de informações sensitivas. Sua análise é extremamente difícil e
torturante porque nos mostra o passo obrigatório do tempo. O conteúdo
concreto da duração (mudança, velocidade, espaço percorrido, movimento,
crescimento da medida) possibilita a base de nossas informações de tempo e
sua organização.
39
Temos que acrescer à noção de tempo, a de velocidade e suas relações
circulares, o tempo e sua duração são analisados em função de uma ação cuja
velocidade é constante (ex: rotação da Terra ou dos ponteiros de um relógio),
enquanto a velocidade se entende como uma distância percorrida durante um
período de tempo.
Dentro da estruturação temporal inclui-se uma dimensão racional
(conhecimento da ordem e da duração, fatos que acontecem com intervalos),
uma dimensão convencional (sistema cultural de referências, horas, dias,
semanas, meses, anos) e uma aparência de comportamento que se manifesta
antes dos outros dois (percepção e memória da sequência e da duração dos
fatos na inexistência de componentes racionais) ou convencionais. O
conhecimento do tempo se organiza sobre as modificações percebidas –
independentemente de ser continuação ou duração, seu atraso está ligado à
memória e à reunião da informação contida nos eventos. As perspectivas
relacionadas à percepção do tempo progridem e aprimoram-se com a idade.
“No tempo psicológico, organizamos a ordem dos acontecimentos e
estimamos sua duração, construindo assim, nosso próprio tempo. A percepção
da ordem nos leva a distinguir o simultâneo do sucessivo, variando o umbral de
acordo com os receptores utilizados”. (Rosa Neto, 2002. Pág. 23)
Oliveira (2009b), baseada nos estudos de De Meur, Santos, Morais,
Kephart e outros autores, concluiu que existem algumas dificuldades que
podem se originar de uma má orientação temporal. São elas:
• Algumas crianças podem não perceber os intervalos de tempo, ou seja,
não perceber que existem espaços entre as palavras. Não percebem
também se estão indo devagar ou rápido. Geralmente, estas crianças
escrevem as palavras sem interrupções, uma ligada na outra, além de
se confundirem com a ordem dos acontecimentos.
• Algumas crianças podem demonstrar confusão na organização e na
sequência dos componentes de uma sílaba, ou seja, não percebem o
40
que vem primeiro e o que vem por último. É uma noção importante pois
sua falta impede a criança de começar seu gesto no local certo. Ex:
Poderá, na formação de palavras, escrever a segunda letra na frente da
primeira. A criança pode escrever “porblema”, ao invés de problema,
pois não entende a sequência gráfica (espaço) de movimentos e não
percebe o som da letra “r” como ocorrendo primeiro. Esta dificuldade
está vinculada ao espaço e ao tempo simultaneamente.
• Há possibilidade de ocorrerem problemas de ausência de padrão rítmico
contínuo.
A ausência de ritmo motor provoca uma falta de coordenação na
execução dos movimentos. A criança se move (anda, corre, salta) em um
período de tempo sem continuidade, isto é, sem coordenar muito bem o ritmo
dos membros superiores em relação aos inferiores.
O ritmo auditivo geralmente está vinculado ao motor, já que é estudado
junto com as atividades que envolvem a dança e os jogos.
• Problemas na ordenação de seu tempo: a criança não consegue antever
suas atividades. Se delonga em uma tarefa e não consegue terminar
outra por “falta de tempo”.
• Crianças com dificuldades de fazer representação sonora no cérebro:
elas se esquecem da correlação dos sons com as letras que as
correspondem.
• Quando uma criança desenvolve apenas as estruturas espaciais se
transforma em mera “repetidora de palavras”. Isto significa que identifica
as relações espaciais no papel, distinguem as palavras, porém não
conseguem incorporá-las no tempo; elas ficam soltas e, por
conseguinte, a criança não compreende o sentido. Isto compromete sua
percepção, que acaba sendo aquém do esperado e, consequentemente,
41
sua escrita também fica prejudicada por obter sequências de eventos no
espaço.
• Quando a criança tem uma boa estruturação temporal, mas não
espacial, transforma-se em uma leitora pobre, atrasa-se numa leitura
que deveria ser breve e, por isso, fica muito dependente ao contexto.
Muitas vezes se utilizam de sinônimos para preservar o contexto, mas
não conseguem reproduzir o que está na folha.
42
CAPÍTULO II
A Avaliação Psicomotora
Segundo Chicon (1999, p.52), a Avaliação Motora (ou Exame Psicomotor ou
Avaliação Psicomotora) é “um instrumento de aplicação individual que objetiva
avaliar o desenvolvimento das capacidades psicomotoras gerais dos sujeitos”.
É um instrumento riquíssimo para o descobrimento e medição da qualidade de
alguns processos psíquicos que estão na base de diversos comportamentos.
Masson (1985, p.58), diz que “o exame psicomotor se aproxima
evidentemente do exame neurológico, porque vão ser sucessivamente
testadas as diferentes funções do sistema nervoso”.
O exame motor é um recurso que se faz indispensável para atender o
desenvolvimento das pessoas, especialmente das crianças, com o maior
número de acertos possíveis para que este desenvolvimento ocorra dentro dos
períodos desejáveis, ajudando para um desenvolvimento perfeito.
Tal teste é muito vantajoso porque proporciona a apreciação, com
margem de erro muito reduzida, da importância das informações que são
detectadas por ele. Isto ocorre tanto em grupos de indivíduos normais quanto
para aqueles que demonstram transtornos de desenvolvimento de uma
maneira geral. Para este tipo de experiência, se faz necessária a aplicação de
mais de um teste, ou seja, uma bateria de testes, para que se possa examinar
a criança sob todos os aspectos.
Os testes utilizados para estudar a motricidade infantil geralmente são
aplicados a fim de conhecer melhor as crianças e poder estabelecer
ferramentas de confiança para avaliar, analisar e estudar o desenvolvimento
de alunos em diferentes etapas evolutivas.
A avaliação psicomotora após os 3 anos de idade é confiada ao
professor ou psicomotricista para uma avaliação com mais detalhes que
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deverá abranger a personalidade da criança e, para isso, a própria avaliação
deve estar envolvida com a personalidade de quem vai aplicá-la.
Sobre a avaliação motora, segundo Rosa Neto (2002), é obrigação do
avaliador optar por um instrumento válido de avaliação que obedeça a alguns
critérios como:
• Saber qual a intenção do exame (orientação, seleção, avaliação,
diagnóstico clínico, etc), já que cada objetivo necessita de enfoque e
instrumentos específicos;
• Identificar os aspectos que são importantes para o examinador, ou seja,
que tipo de informação ele deseja obter;
• Obter informação técnica e científica sobre o teste: confiança, precisão e
consistência do instrumento.
Podemos dizer que a maior contribuição da avaliação psicomotora é
conceder pistas para descobrir e identificar crianças com dificuldades
psicomotoras que encontram-se prejudicadas em suas habilidades corporais
resultando em dificuldades em seu relacionamento efetivo com o meio.
Segundo Oliveira (2009a, p.28), os objetivos da avaliação psicomotora
estão enumerados da seguinte forma:
1. Avaliar as realizações e habilidades psicomotoras da criança e não só
as desadaptações que interferem na aprendizagem escolar;
2. Verificar a possibilidade motora (habilidade motora), a maturidade
neurológica, levando em conta o equipamento neurofisiológico da base;
3. Verificar o nível de reflexão cognitiva uma vez que muitas funções da
inteligência têm uma relação estreita com a psicomotricidade;
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4. Detectar o estilo motor, considerar os elementos da motricidade que
definem a execução do ato motor, ou seja, a maneira de estar e de
executar de cada criança, levando em conta as diferentes modalidades
de integração afetivo emocional;
5. Traçar o perfil de dificuldade que servirá de base para estabelecer um
plano de orientação terapêutica, isto é, estabelecer estratégias para
uma educação e reeducação mais adequadas.
Estes objetivos enfatizam a idéia de que o exame psicomotor é uma
ferramenta importante para o descobrimento precoce de uma dificuldade, para
averiguar a fase de maturidade psicomotora da criança, além de detectar
indícios das discrepâncias evolutivas de muitas crianças em situação de
aprendizagem.
Ainda de acordo com Oliveira (2009a), o avaliador ou examinador deve
tomar algumas atitudes para que o teste possa fluir com naturalidade e
aceitação. Tais como:
• Tomar cuidado com o local de exame. O lugar deve reunir condições
mínimas para a realização do teste (iluminação, higiene, espaço para a
execução das atividades, etc)
• Checar se o material que será utilizado na aplicação do teste está
preparado e organizado antes do início do teste;
• Buscar deixar a criança à vontade para que ela se libere de inibições e
bloqueios que possam atrapalhar uma observação mais apurada;
• Propiciar um ambiente agradável. É indispensável que se estabeleça
uma relação de afeto com a criança antes da aplicação do exame
motor;
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• Não se deve desmerecer a importância da voz, do calor e do ritmo com
que se faz as perguntas;
• A importância da qualidade de escutar deve ser ressaltada;
• E, em especial, o examinador deve respeitar todas as dadas pela
criança sem que sejam emitidos juízos de valor que possam atrapalhar
a espontaneidade da mesma.
O comportamento da criança deve ser descrito, ou seja, tudo aquilo que
se puder observar da criança no decorrer do exame. Existem variáveis que
podem interferir fortemente nos resultados e outras que informam como a
criança atua e se comporta diante de algumas dificuldades.
É recomendado que se observe e descreva:
• O tipo físico da criança (magra, alta, atlética, baixa);
• As características sociais;
• Se a criança fica cansada facilmente;
• Postura e comportamento geral da criança como: timidez, alteração na
respiração, inibições, ansiedade;
• Se possui alguma manifestação alérgica;
• Aspectos ortopédicos que possam exercer influência nos resultados das
provas (se faz uso de algum aparelho ortopédico);
• Se a criança tem alguma mania ou tique e quando tais gestos se
apresentam acentuados;
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• Expressão verbal: o timbre da voz, a maneira de falar, de se expressar,
espontaneidade e o conteúdo da linguagem;
• Se a criança consegue entender as instruções da prova;
• Se a criança consegue se manter concentrada na atividade ou se
dispersa facilmente;
• Nível de efetuação de todos os exercícios:
- apresenta dificuldade?;
- velocidade e ritmo de execução;
- se a fadiga interfere a execução;
- se é impedida de realizar a ação por se sentir inibida.
Sobre o conjunto de teste, podemos chamá-los de Bateria Motora.
Oliveira (2009a) sugere que os aspectos psicomotores sejam agrupados e que
a bateria motora seja aplicada da seguinte forma:
• Coordenação e equilíbrio;
• Esquema corporal;
• Lateralidade;
• Orientação espacial;
• Orientação temporal.
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Depois do exame motor pode-se realizar uma análise qualitativa,
tomando nota de todas as respostas das crianças e debatendo os resultados à
luz do desenvolvimento da psicomotricidade. É uma análise rica em detalhes e
mais precisa.
Pode-se fazer também uma análise quantitativa, somando os pontos
obtidos em cada prova de acordo com as tabelas de pontuação a serem
propostas.
De acordo com a quantidade de pontos, pode-se definir a idade motora
que a criança se encontra, bem como especificar as fases pelas quais está
passando em cada habilidade.
Oliveira (2009a) propõe que cada fase da bateria motora seja separada
por uma tabela de pontos de 0 a 2 e que sejam marcadas as pontuações
correspondentes as respostas das crianças.
Ex: Coordenação e equilíbrio
1) Coordenação global
Provas Pontuação
Observações 2 1 0
1. Andar
2. Correr
3. Dismetria de olhos abertos
4. dismetria de olhos fechados
5. Postura ao sentar
Total de pontos
E, assim por diante, durante todo o exame motor, marcando na coluna
correta a pontuação da criança de acordo com o observado nos testes.
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Traça-se o perfil do desenvolvimento psicomotor da criança, ou seja, a
idade psicomotora, somando os resultados dos testes de cada área
psicomotora, de acordo com a tabela a seguir:
Habilidades Psicomotoras
Estágios - Pontuação Esperada
I IA IB II IIA IIB III
Coordenação e equilíbrio 2 3 a 14 15 a 20 21 22 a 27 28 a 33 34
Esquema corporal 2 3 a 12 13 a 18 19 20 a 24 25 a 33 34
Lateralidade 2 3 a 9 10 a 16 17 18 a 25 26 a 33 34
Orientação espacial 2 3 a 9 10 a 14 15 16 a 23 24 a 33 34
Orientação temporal 1 2 a 8 9 a 14 15 16 a 25 26 a 33 34
Tabela das fases da evolução das habilidades psicomotoras verificadas
pelo exame psicomotor
Onde:
I – Corpo vivido (até 3 anos de idade)
IA – Reorganização do corpo vivido (3 a 4 anos)
IB – Indícios de presença do corpo percebido
II – Corpo percebido (7 anos)
IIA – Reorganização do corpo percebido (8 a 9 anos)
IIB – Indício de presença do corpo representado (10 a 11 anos)
III – Corpo representado (a partir de 12 anos)
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Tomaremos como exemplo uma criança com idade cronológica de 7
anos que possui a seguinte pontuação:
• Coordenação e equilíbrio: 14;
• Esquema corporal: 18;
• Lateralidade: 17;
• Orientação espacial: 9;
• Orientação temporal: 15.
Estes resultados transpostos na tabela acima terão o seguinte perfil:
Habilidades Psicomotoras Pontos Estágios de desenvolvimento
I IA IB II IIA IIB III
Coordenação e equilíbrio 14 x
Esquema corporal 18 x
Lateralidade 17 x
Organização espacial 9 x
Organização temporal 15 x
Sua idade psicomotora será:
1) Reorganização do corpo vivido (3 a 4 anos);
2) Indícios de presença do corpo percebido (5 a 6 anos);
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3) Corpo percebido (7 anos);
4) Reorganização do corpo vivido (3 a 4 anos);
5) Corpo percebido (7 anos)
Pode-se concluir que em lateralidade e organização temporal ela se
encontra com a idade psicomotora de acordo com a cronológica. Estes dados
são muito esclarecedores e indicativos para o planejamento de atividades de
reeducação, ou seja, nos mostra quais habilidades devemos estimular mais,
quais podemos manter o ritmo de estímulos e quais devemos desacelerar em
relação aos estímulos a fim de que se igualem e proporcionem um
desenvolvimento psicomotor pleno, sem falhas.
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CAPÍTULO III
Relacionando o Desenvolvimento Psicomotor com a Avaliação
Psicomotora
A Psicomotricidade é a relação de consciência entre o corpo, a mente e
a sociedade. Pelo fato de estar ligada ao desenvolvimento do ser humano
desde muito cedo, ela ajuda no processo de formação e estruturação do
esquema corporal e objetiva estimular a prática de movimento em todas as
etapas da vida de uma pessoa, principalmente na infância.
Uma criança cujo esquema corporal é mal elaborado não organiza bem
os movimentos. Suas habilidades manuais tornam-se limitadas, a leitura perde
a harmonia, o gesto vem após a palavra e o ritmo da leitura não é mantido, ou
então é interrompido no meio de uma palavra.
De acordo com Oliveira (2009b), o esquema corporal é dividido em três
etapas: Corpo Vivido (até os três anos), Corpo Percebido (de três a sete anos)
e Corpo Representado (sete a doze anos). Vamos nos voltar para a definição
de “Corpo Percebido” porque envolve a faixa etária descrita neste estudo.
O Corpo Percebido (ou “Descoberto”) é a fase em que o ajustamento do
corpo ao meio deixa de ser natural e passa a ser controlado, apesar de a
criança não ter uma boa dissociação gestual. A criança passa a ter um maior
domínio de seu corpo, melhorando suas ações e adquirindo uma maior
coordenação dentro de um espaço e tempo determinados.
É sabido que o desenvolvimento psicomotor de um indivíduo ocorre,
inicialmente, na vida intra-uterina da criança e é nesta fase que ela começa a
organizar o seu comportamento através de sinais emitidos ao mundo exterior
sendo estes, basicamente sinais motores.O desenvolvimento psicomotor é
considerado a base do comportamento, não apenas nos primeiros meses de
vida, quando a motricidade compõe a resposta comportamental preferencial,
mas durante a vida, uma vez que todas as formas de comportamento, do mais
52
singelo ao mais complexo, do reflexo a reflexão, são realizados por meio de
uma resposta adaptativa motora ou muscular. O domínio dos movimentos e a
perfeição com que eles são executados “garantem a criança a sua
independência e autonomia locomotora o que torna disponível para sua
sociabilização da sua experiência”. (Fonseca, 2008, p.495)
Na criança, o desenvolvimento psicomotor surge nos analisadores
sensoriais e, depois, nos efetores motores. Sendo assim, a criança obtém
primeiro a capacidade de focagem atencional e espacial, sem a qual não
poderia estabelecer relações com os outros, ou até mesmo com os objetos que
a rodeiam, e é através dessa apreensão de espaço que virá a gerar
movimentos como reais ações objetivas orientadas para os objetos,
manipulando-os e explorando-os, ou seja, aprendendo-os e, por analogia,
aprendendo-se.
Já vimos no capítulo anterior que a avaliação psicomotora é um
instrumento utilizado para medir e avaliar o desenvolvimento das capacidades
psicomotoras gerais dos indivíduos. Não é, obrigatoriamente, aplicada somente
em crianças, mas geralmente isto ocorre porque esta etapa da vida é muito
importante para o desenvolvimento psicomotor do indivíduo por ser mais fácil a
detecção e correção de distúrbios psicomotores.
A avaliação psicomotora nos indica alguns aspectos do desenvolvimento
infantil como idade psicomotora e, a partir de um estudo de comportamento
dos avaliados, quais serão os exercícios que poderão ser aplicados para cada
criança.
Algumas crianças podem ter a mesma idade cronológica, porém
desenvolvimento psicomotor diferente. Pode acontecer, por exemplo, de uma
criança de 6 anos de idade apresentar uma habilidade psicomotora abaixo do
rendimento esperado para esta idade. Cabe ao profissional, que aplicará a
bateria de exames, perceber esta diferença e apresentar à criança atividades
que explorem esta habilidade que está deficiente para que ela possa se
desenvolver tanto quanto as outras.
53
Sabemos que, se o educador e os pais proporcionam às crianças
experiências psicomotoras desde cedo, elas provavelmente terão um bom
desenvolvimento psicomotor. Crianças que não têm ou não tiveram
experiências psicomotoras enfrentam problemas para se situar claramente em
seu próprio corpo e acabam tendo um atraso em relação aos que a rodeiam.
Sendo assim, se for detectada alguma dificuldade na aprendizagem ou no
comportamento da criança, pode-se lançar mão da avaliação psicomotora para
confirmar as suspeitas e ajudar a sanar o problema.
Esta avaliação psicomotora não deve ser trabalhada apenas por um
profissional porque a criança não desenvolve suas habilidades psicomotoras
em um local determinado. Estas habilidades estão sendo desenvolvidas a todo
momento.
Segundo Oliveira (2009a) se faz necessário que os responsáveis pela
educação da criança (pais, professores e responsáveis) se unam e se
completem no sentido de trabalharem juntos as dificuldades que possam estar
por trás do não aprender e do não desenvolvimento psicomotor.
De acordo com Fonseca (2008), os problemas de atraso motor sofrido
por algumas crianças dependem, em grande proporção, da cultura e da
capacidade dos adultos que, por exemplo, continuam esquecendo as
necessidades espaciais e de movimento, que são fundamentais para o
desenvolvimento global da criança.
Pode-se dar ênfase a atividades relacionadas à habilidade relatada por
educadores e pais como sendo a habilidade em que a criança apresenta
dificuldade, mas é importante que todas as habilidades psicomotoras sejam
avaliadas pois elas também podem estar sendo prejudicadas por esta
habilidade que está deficiente. O objetivo é aplicar atividades que possam
revelar a situação atual da criança e ajudá-la no seu desenvolvimento
psicomotor.
54
Segundo Rosa Neto (2002), é importante que a avaliação siga alguns
critérios como:
• Saber qual a intenção do exame (orientação, seleção, avaliação,
diagnóstico clínico, etc), já que cada objetivo necessita de enfoque e
instrumentos específicos;
• Identificar os aspectos que são importantes para o examinador, ou seja,
que tipo de informação ele deseja obter;
• Obter informação técnica e científica sobre o teste: confiança, precisão e
consistência do instrumento.
Além disso, é preciso que saibamos que tal avaliação também necessita
ter objetivos traçados antes de ser aplicada nos indivíduos. Alguns destes
objetivos são:
1. Avaliar as realizações e habilidades psicomotoras da criança e não só
as desadaptações que interferem na aprendizagem escolar;
2. Detectar o estilo motor, considerar os elementos da motricidade que
definem a execução do ato motor, ou seja, a maneira de estar e de
executar de cada criança, levando em conta as diferentes modalidades
de integração afetivo emocional;
3. Traçar o perfil de dificuldade que servirá de base para estabelecer um
plano de orientação terapêutica, isto é, estabelecer estratégias para
uma educação e reeducação mais adequadas.
Para que a avaliação aconteça dentro do previsto pelo avaliador é
preciso que o mesmo tome algumas atitudes como:
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• Tomar cuidado com o local de exame. O lugar deve reunir condições
mínimas para a realização do teste (iluminação, higiene, espaço para a
execução das atividades, etc) e checar se o material que será utilizado
na aplicação do teste está preparado e organizado antes do início do
teste
• Propiciar um ambiente agradável e buscar deixar a criança à vontade. É
indispensável que se estabeleça uma relação de afeto com a criança
antes da aplicação do exame motor;
• E, em especial, o examinador deve respeitar todas respostas dadas pela
criança sem que sejam emitidos juízos de valor que possam atrapalhar
a espontaneidade da mesma.
Para se avaliar o nível de desenvolvimento motor de uma criança, mais
alguns aspectos, além dos relacionados acima, devem ser observados. Tudo o
que ocorre antes, durante e, se possível, depois da aplicação do teste, deve
ser observado e descrito pelo avaliador. Alguns exemplos destes outros
aspectos a serem observados são :
• O tipo físico da criança (magra, alta, atlética, baixa);
• As características sociais;
• Se a criança fica cansada facilmente;
• Postura e comportamento geral da criança como: timidez, alteração na
respiração, inibições, ansiedade;
• Aspectos ortopédicos que possam exercer influência nos resultados das
provas (se faz uso de algum aparelho ortopédico);
56
• Expressão verbal: o timbre da voz, a maneira de falar, de se expressar,
espontaneidade e o conteúdo da linguagem;
• Se a criança consegue entender as instruções da prova e se consegue
manter a concentração na atividade ou se dispersa facilmente;
O avaliador deve ter em mente que o exame psicomotor deve ter
objetivos sérios e não deve ser aplicado de qualquer forma e em qualquer
lugar. É preciso ter acesso aos instrumentos básicos requeridos pelas
atividades que foram selecionadas para serem aplicadas as crianças com a
intenção de que os testes sejam bem sucedidos. Também é necessária uma
ótima organização das atividades e que elas sejam aplicadas de acordo com
uma estratégia pré-planejada pelo avaliador. Se o exame motor for aplicado de
forma errada pode causar uma má interpretação dos resultados e não
satisfazer a pesquisa.
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CONCLUSÃO
Vimos neste estudo que o desenvolvimento psicomotor é muito
importante para a vida de uma pessoa e que seu ápice ocorre na infância. Ele
é principal maneira, se não a única, de o indivíduo adquirir conhecimentos
sobre o seu corpo e aperfeiçoar habilidades como lateralidade, coordenação
motora global e fina, estruturação espacial e temporal, equilíbrio, ritmo e sua
noção de esquema corporal e imagem corporal.
Tivemos a oportunidade de entender com este trabalho o que é a
Avaliação Psicomotora, como ela é aplicada e de que forma pode contribuir
com os professores, pais e responsáveis e, principalmente, com o próprio
avaliador para que descubram o nível de desenvolvimento psicomotor da
criança, se este acompanha a idade cronológica e de que maneira pode
contribuir para a solução das dificuldades que são relatadas pela criança e
descrita pelo avaliador.
Tivemos acesso a fundamentações propostas por vários autores a
respeito do desenvolvimento psicomotor e da avaliação motora, como o
primeiro ocorre e como a segunda pode ser utilizada.
Vimos que é importante uma boa organização da avaliação motora
embasada em critérios e objetivos para que os resultados sejam mais
fidedignos possíveis e que tal avaliação possa colaborar para a educação e
reeducação (caso haja necessidade de reparar alguma habilidade
prejudicada). É preciso também, como já foi dito, um lugar apropriado para a
aplicação do teste. O avaliador deve proporcionar encontros sempre
agradáveis para a criança e a avaliação motora, uma melhor qualidade de vida.
Podemos concluir então que qualquer criança tem direito a prática
psicomotora para que suas habilidades possam ser desenvolvidas. É
importante a conscientização de professores, pais e responsáveis para esta
condição da criança: necessidade de movimento. É preciso, caso notem
58
alguma coisa diferente no comportamento da criança, confiar estes problema
aos professores e profissionais capacitados (psicomotricistas) para que
possam aplicar a avaliação motora (se necessário) e ajudar a sanar o
problema, com respaldo científico e técnico adequado.
59
Referência Bibliográfica:
CHICON, José Francisco. Prática Psicopedagógica em Crianças com
Necessidades Educativas Especiais: Abordagem Psicomotora. Vitória:
CEFD/UFES, 1999.
BALBÉ, Giovane Pereira. “Educação Física e suas contribuições para o
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FONSECA, Vitor da. Desenvolvimento Psicomotor e Aprendizagem. Porto
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LAPIERRE & AUCOUTURIER. A Simbologia do movimento: Psicomotricidade
e educação. 3ª Ed. – Curitiba, PR: Filosofart Editora, 2004.
LIMA, Sandra Vaz de. (2008) A Importância da Psicomotricidade na educação
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em: 25/06/2009
MONTERO-SENDIN, Marisol. Desenvolvimento motor. In: SLYWITCH, Miron
Vladmir. Desenvolvimento psicossocial da criança: abordagem pediátrica e
psicológica. São Paulo: Sarvier, 1988.
OLIVEIRA, Gislene de Campos. Avaliação Psicomotora à luz da psicologia e
da psicopedagogia. 7ª Ed. Petrópolis: Vozes, 2009a.
____________. Psicomotricidade: Educação e reeducação num enfoque
psicopedagógico. 14ª Ed. Petrópolis: Vozes, 2009b.
ROSA NETO, Francisco. Manual de Avaliação Motora. Porto Alegre: Artmed,
2002.
SILVEIRA, Carolina Rodrigues Alves. “Avaliação motora de pré-escolares:
relações entre idade motora e idade cronológica.” Disponível em:
http://www.efdeportes.com/efd83/avalia.htm. Acessado em: 29/11/2010.
60
THOMPSON, Rita. Desenvolvimento Psicomotor e Aprendizagem. In:
FERREIRA, Carlos Alberto de Mattos. Psicomotricidade: Da Educação Infantil
à Gerontologia. Teoria e Prática. São Paulo - Lovise, 2000.
61
ÍNDICE
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I 10
O Desenvolvimento Psicomotor 10
1. Esquema Corporal 10
2. Motricidade ou
Coordenação motora fina 17
3. Motricidade ou
Coordenação motora global 20
4. Equilíbrio 23
5. Lateralidade 26
6. Estruturação ou
Organização Espacial 29
7. Estruturação ou
Organização Temporal 35
CAPÍTULO II 42
A Avaliação Psicomotora 42
CAPÍTULO III 51
Relacionando o Desenvolvimento Motor com
a Avaliação Motora 51
62
CONCLUSÃO 57
ÍNDICE 61