UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE … · objeto de ensino-aprendizagem...

Post on 20-Jan-2019

218 views 0 download

Transcript of UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE … · objeto de ensino-aprendizagem...

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

LUCILA CARVALHO LEITE

GÊNEROS DO DISCURSO E ESCRITA: O QUE AS COLEÇÕES DIDÁTICAS

DE PORTUGUÊS (DES)PRESTIGIAM NO ENSINO DA PRODUÇÃO TEXTUAL?

NATAL - RN

2014

LUCILA CARVALHO LEITE

GÊNEROS DO DISCURSO E ESCRITA: O QUE AS COLEÇÕES DIDÁTICAS

DE PORTUGUÊS (DES)PRESTIGIAM NO ENSINO DA PRODUÇÃO TEXTUAL?

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do

título de Mestre em Educação.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Tatyana Mabel Nobre Barbosa

NATAL - RN

2014

UFRN. Biblioteca Central Zila Mamede.

Catalogação da Publicação na Fonte.

Leite, Lucila Carvalho

Gêneros do discurso e escrita: o que as coleções didáticas de português (des)prestigiam no ensino da

produção textual?. / Lucila Carvalho Leite. – Natal, RN, 2014.

266 f.; il.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Tatyana Mabel Nobre Barbosa.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Educação. Programa de

Pós-Graduação em Educação.

1. Gêneros do discurso – Dissertação. 2. Situações de produção textual escrita – Dissertação. 3. Coleções

didáticas – Dissertação. I. Barbosa, Tatyana Mabel Nobre. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III.

Título.

RN/UF/BCZM CDU 37:81’366.52

LUCILA CARVALHO LEITE

GÊNEROS DO DISCURSO E ESCRITA: O QUE AS COLEÇÕES DIDÁTICAS

DE PORTUGUÊS (DES)PRESTIGIAM NO ENSINO DA PRODUÇÃO TEXTUAL?

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do

título de Mestre em Educação.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Tatyana Mabel Nobre Barbosa

Aprovada em 21/02/2014

Banca Examinadora

___________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Tatyana Mabel Nobre Barbosa (UFRN)

Orientadora

____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Araceli Sobreira Benevides (UERN)

Examinadora externa

____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Claudianny Amorim Noronha (UFRN)

Examinadora interna

____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Maria da Penha Casado Alves (UFRN)

Suplente interna

Dedico esta dissertação aos meus alunos, que

sempre acreditaram em mim, até mais do que

eu mesma.

A CADA VOZ DE INSPIRAÇÃO E DE INCENTIVO,

MEUS SINCEROS AGRADECIMENTOS!

Agradeço a Deus pelo fôlego da vida, enchendo-me de fé, ardor e consolo para transpor os

percalços desta caminhada. Com o Seu auxílio, pude renovar as forças, o entusiasmo, a

esperança e o desejo de continuar a prosseguir.

Aos meus pais, pela dedicação incondicional para que eu trilhasse novos caminhos em minha

formação. A felicidade pela conclusão desta etapa, certamente, transborda em seus corações.

A Carlos, meu amor, meu companheiro e meu amigo, que foi compreensivo quando seria

compreensível já não ser. Agradeço pelo sacrifício, amparo e presença constante nos

momentos de angústia em que necessitei de colo e afeto.

À minha irmã Lorena, aos meus avós Aluízio e Inês, aos meus tios Marcus, Mary e Eurico e

às minhas primas Érica e Larissa, pelas constantes orações e pela compreensão nos momentos

de ausência, até mesmo quando estava presente.

À minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Tatyana Mabel Nobre Barbosa, a qual me guiou não somente

para a construção desta dissertação, mas que guia meus passos desde a Graduação. Obrigada

por abrir-me as portas da pesquisa, pelos momentos de contínuo aprendizado, por dar

credibilidade a minha voz, por apresentar-me o lado mais poético das palavras, por dar

melodia e suavidade à aridez da formalidade acadêmica. A sua poesia faz-me entender que é

preciso sonhar, por mais espinhosas que sejam as circunstâncias. A você, minha eterna

gratidão!

À Prof.ª Dr.ª Claudianny Amorim Noronha, por suas ponderações precisas às linhas e

entrelinhas desta pesquisa, seja nos diálogos entretecidos no Exame de Qualificação, seja nas

discussões promovidas no âmbito do Grupo de estudos CONTAR. Agradeço pela dedicação,

disponibilidade e intervenções instigantes, com as quais me encaminhou desde os primeiros

passos desta investigação.

À Prof.ª Dr.ª Araceli Sobreira Benevides, pelas contribuições proporcionadas na Defesa de

Mestrado. Agradeço pelas valiosas sugestões, que enriqueceram sobremaneira minhas

reflexões.

À Prof.ª Dr.ª Maria Estela Costa Holanda Campelo, por compartilhar de sua serenidade,

sabedoria, afeto e paciência. A cada palavra sua pronunciada, só aumenta meu encanto pelo

seu exemplo de profissionalismo e humildade.

Ao Prof. Dr. João Maria Valença de Andrade, pelo primeiro incentivo para que eu

enveredasse nos caminhos da pesquisa. Jamais irei esquecer-me do estímulo dispensado a

mim desde a Graduação.

À Prof.ª Dr.ª Marta Maria de Araújo, pelos saberes compartilhados na disciplina cursada no

Mestrado e pela generosidade em ajudar-me. Seu conhecimento, presteza e dinamismo

intelectual são admiráveis.

Ao Prof. Dr. Juan Pablo Martín Rodrigues, pelas relevantes orientações delineadas no Exame

de Qualificação, que se revelaram imprescindíveis para o avanço deste trabalho.

Aos membros do Grupo de estudos CONTAR, pela riqueza dos ensinamentos e das

experiências partilhadas. Agradeço pela forma carinhosa com que fui recebida a cada

encontro realizado. Em especial, a Aline, Luanna, Márcia e Maria da Conceição, pelo

companheirismo e alento nos momentos de incerteza.

Aos meus colegas de Pós-Graduação, sobretudo, Geisy, Francisco Carlos, Juliana, Kívia e

Lydiane, por trilharmos juntos este caminho de crescimento intelectual.

À minha querida amiga Raquel, pela disponibilidade irrestrita em ouvir-me e que, mesmo a

distância, transborda incentivos.

Ao Grupo Nós 10, eternas amigas de colégio, que me alegraram com as reclamações de minha

ausência e que me animaram com as leves e agradáveis presenças.

Ao Programa de Pós- Graduação em Educação da UFRN, pela seriedade em contribuir para o

meu crescimento acadêmico.

Aos funcionários do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRN, em especial, a

Edenise, Letisandra e Milton, pela atenção no atendimento às frequentes solicitações.

A todos da Escola Municipal Raimunda Maria da Conceição, no município de

Parnamirim/RN, pela harmoniosa convivência diária.

À CAPES, por custear a minha participação em importantes eventos que contribuíram para o

avanço deste trabalho.

A tantas outras vozes que dialogaram comigo ao longo desse tempo, deixo aqui meus sinceros

agradecimentos.

A vida deve ser levada para dentro das paredes da escola: vida do

aluno, vida do professor, vida da comunidade, do país. A palavra que

se produz na escola deve refletir essa realidade e a ela retornar. Texto

sobre texto, discurso sobre discurso, encontro de saberes, de

experiências, de culturas, de sujeitos. Conhecimento produzindo vida,

vida produzindo conhecimento. Conhecimento que gera

compromissos de transformação e constitui o sujeito enquanto

cidadão. (FREITAS, 2007, p. 148).

RESUMO

A partir dos indicadores oficiais, é possível observar que a escrita tem sido apontada como um

dos principais problemas da escolaridade básica obrigatória. Em contrapartida, esse mesmo

objeto de ensino-aprendizagem constitui-se como um dos objetivos centrais da escola, sendo

essencial aos diferentes componentes curriculares, como também às próprias demandas de

interação requeridas pela sociedade. Tal paradoxo aponta, então, para a relevância de

investigações que analisem os elementos intrínsecos à formação da criança como produtora

do texto escrito. Nesse sentido, o objetivo principal desta pesquisa consiste em analisar o

tratamento dado aos gêneros do discurso e às situações de produção no ensino do texto

escrito, mediante coleções didáticas de língua portuguesa aprovadas pelo Programa Nacional

do Livro Didático (PNLD 2010) e trabalhadas nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Tais

materiais correspondem às coleções adotadas em escolas da rede pública municipal de

Natal/RN que estiveram abaixo do IDEB 2009. Assim, as questões que norteiam este trabalho

assim se configuram: 1. No ensino de produção escrita, a diversidade dos gêneros do discurso

é efetivamente trabalhada nas coleções didáticas? 2. Quais são os gêneros do discurso e as

esferas sociais priorizados no ensino de produção escrita? 3. Como é abordada a situação de

produção em o que o texto escrito deverá ser produzido? Para a pesquisa, retomamos Bakhtin,

Bunzen, Faraco, Freire, Rodrigues, Rojo, Schneuwly e Dolz, e realizamos o levantamento de

todos os gêneros e esferas contemplados nas propostas de produção escrita dos livros

didáticos, referentes às oito coleções que compõem esse primeiro momento de análise. Em

seguida, verificamos como a situação de produção é orientada em duas coleções didáticas - se

e de que forma explicitam os elementos relativos ao contexto histórico-social, funcional e

linguístico-discursivo do texto a ser produzido. Os dados obtidos indicam: a falta de

diversificação dos gêneros no conjunto da Amostra Global da pesquisa; a concepção de uma

diversidade baseada na didática da visitação; o reconhecimento dos tipos textuais canônicos e

hegemônicos como um dos objetos privilegiados de estudo; a centralização na norma padrão

culta da língua e a desvalorização dos gêneros representativos da diversidade cultural; a

escassez de produções que remontam a linguagem escrita das diferentes tecnologias de comunicação e informação; e a pouca ênfase com os gêneros da instância pública da

linguagem. Quanto às situações de produção, observa-se: a predominância da escola enquanto

promotora das relações dialógicas, cujas propostas apresentam, por exemplo, destinatários,

posições enunciativas, suportes e contextos de circulação restritos, sobretudo, ao âmbito

escolar; e duas situações divergentes entre as coleções - a inexistência de um trabalho com a

situação de produção sob a perspectiva dos gêneros como objeto de ensino-aprendizagem; e a

concepção dos gêneros como objeto de reflexão. Nossa pesquisa contribui, portanto, para uma

cartografia da existência e do tratamento dos gêneros do discurso nas propostas de produção

escrita dos livros didáticos; com a análise crítica da abordagem das atividades de escrita,

considerando os elementos do contexto histórico-social, funcional e linguístico-discursivo; e,

desse modo, com o ensino, a pesquisa e as políticas públicas para elaboração, uso e seleção de

materiais didáticos da área de referência.

Palavras-chave: Gêneros do discurso. Situações de produção escrita. Coleções didáticas.

ABSTRACT

Through the examination of official indicators, it can be observed that writing is pointed out

as one of the main problems concerning formal basic education. However, this teaching-

learning object is one of the central objectives at school, having an essential role in different

curricular components as well as in the interaction demands required by society. Such

paradox indicates, therefore, the relevance of investigations which analyze the intrinsic

elements of child development as written text producer. Hence, the main purpose of this

research consists of analyzing the treatment given to the types of discourse and the teaching

situations in which the written text are produced, concerning Portuguese language didactic

material collections approved by Programa Nacional do Livro Didático (PNLD 2010) – the

Brazilian program of didactic book – and worked at elementary school. Such materials

correspond to the collections adopted in municipal education system schools from Natal, RN

which were below the official education indicator IDEB 2009. Thus, the questions that guide

this work are: 1. During writing production lessons, is the diversity of types of discourse

effectively worked on didactic collections? 2. Which are the types of discourse and the social

spheres prioritized when teaching writing production? 3. How is the situation addressed in the

production of the written text should be produced? For this research, we retook the authors

Bakhtin, Bunzen, Faraco, Freire, Rodrigues, Rojo, Schneuwly e Dolz and we made a list of all

types of discourse and spheres contemplated in the propositions of the writing production in

didactical books, concerning the eight collections which compounds the first moment of

analysis. Then, we verified how the situation of production is oriented by examining two

didactic collections – if and how they express the elements referring to the social-historical,

functional and linguistic-discursive context of the text to be produced. The data obtained

indicate: lack of diversification of types of discourse in the collection that compounds the

Aggregate Sample of the research; the conception of a diversity based on the didactic of

visiting; the recognition of all canonical and hegemonic types of text as one of the privileged

objects of study; the centralization on the standard variety of the language and the devaluation of the representative types of cultural diversity; the shortage of productions which retrace to

written language related to different technologies of communication and information; and the

little emphasis on the types of discourse related to public language practices. As for the

situations of production, it is observed the predominance of the school as a producer of

dialogic relationships, whose propositions present, for example, text addressees, enunciative

positions, support and contexts of restricted circulation, especially at school. Two divergent

situations are observed among the collections: the lack of a work in which the situation of

production is under the perspective of the types of discourse as object of teaching-learning;

the concept of the types of discourse as object of reflection, presenting a differentiated

didactic orientation towards the situation of production. This research contributes, therefore,

with a mapping of the existence and the treatment of the types of discourse on propositions of

writing production in didactic books; with the critical analysis of the approach of written

activities, considering the elements of the historical-social, functional and linguistic-

discursive context; thus, through teaching, research and public policies, use and selection of

didactic material for the area.

Keywords: Types of discourse. Writing production situations. Didactic collections.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Sugestão de gêneros para o 1º ciclo do EF 105

Figura 2 - Sugestão de gêneros para o 2º ciclo do EF 105

Figura 3 - Modelo de questionário 113

Figura 4 - Narração a partir de uma sequência de imagens 141

Figura 5 - Narração a partir de uma temática 142

Figura 6 - Narração a partir da reprodução de telas 142

Figura 7 - Narração a partir de uma introdução apresentada 143

Figura 8 - Descrição de um ser folclórico 143

Figura 9 - Descrição do cômodo de uma residência 144

Figura 10 - Descrição de uma rua 144

Figura 11 - Construção temática a partir de tópicos sugestivos 175

Figura 12 - Construção temática a partir de questionamentos 176

Figura 13 - Construção temática a partir dos textos trabalhados na seção de

leitura

176

Figura 14 - Exemplo de atividade 178

Figura 15 - Exemplo de atividade 178

Figura 16 - Destinatário da produção 180

Figura 17 - Destinatário da produção 180

Figura 18 - Destinatário da produção 180

Figura 19 - Destinatário da produção 180

Figura 20 - Exemplo de atividade 182

Figura 21 - Exemplo de atividade 185

Figura 22 - Exemplo de atividade 185

Figura 23 - Exemplo de atividade 186

Figura 24 - Exemplo de atividade 187

Figura 25 - Exemplo de atividade 188

Figura 26 - Construção temática a partir de tópicos sugestivos 200

Figura 27 - Construção temática a partir de questionamentos 200

Figura 28 - Construção temática a partir de textos lidos e estudados 201

Figura 29 - Exemplo de atividade 204

Figura 30 - Exemplo de atividade 204

Figura 31 - Destinatário / Alunos de outras turmas e vizinhança 205

Figura 32 - Destinatário / Colegas da turma 206

Figura 33 - Destinatário / Colegas da turma e comunidade escolar - Suporte

final / Mural

206

Figura 34 - Destinatário / Comunidade escolar - Suporte / Revista Sem

Preconceito!

206

Figura 35 - Exemplo de atividade 209

Figura 36 - Exemplo de atividade 210

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Gêneros contemplados / Recorrências 137

Gráfico 2 - Somatório de recorrências dos gêneros / Dados comparativos 138

Gráfico 3 - Somatório de recorrências / Índice de participação 139

Gráfico 4 - Esferas contempladas / Percentual de participação 152

Gráfico 5 - Somatório de recorrências das esferas / Dados comparativos 153

Gráfico 6 - Gêneros contemplados / Recorrências 168

Gráfico 7 - Somatório de recorrências dos gêneros / Dados comparativos 169

Gráfico 8 - Esferas contempladas / Percentual de participação 170

Gráfico 9 - Somatório de recorrências das esferas / Dados comparativos 172

Gráfico 10 - Somatório de recorrências dos gêneros / Dados comparativos 195

Gráfico 11 - Esferas contempladas / Percentual de participação 196

Gráfico 12 - Somatório de recorrências das esferas / Dados comparativos 197

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Proposta provisória de agrupamento de gêneros 101

Quadro 2 - Coleções didáticas x Escolas municipais 114

Quadro 3 - Coleções didáticas para análise - 1º ao 5º ano 115

Quadro 4 - Coleções didáticas para análise - 1º ao 5º ano 118

Quadro 5 - Procedimentos de análise 120

Quadro 6 - Amostra de gêneros contemplados no 5º ano x Conhecer e Crescer 122

Quadro 7 - Amostra de gêneros contemplados no 4º ano do EF 123

Quadro 8 - Amostra de esferas contempladas no 4º ano do EF 123

Quadro 9 - Amostra de gêneros contemplados no 1º ciclo do EF 124

Quadro 10 - Amostra de esferas contempladas no 1º ciclo do EF 124

Quadro 11 - Amostra de gêneros contemplados ao longo dos anos iniciais do EF 125

Quadro 12 - Amostra de esferas contempladas ao longo dos anos iniciais do EF 125

Quadro 13 - Gêneros contemplados ao longo dos anos iniciais do EF 134

Quadro 14 - O que os autores dizem sobre o conto 147

Quadro 15 - O que os autores dizem sobre o poema 149

Quadro 16 - Recorrência das esferas sociais ao longo dos anos iniciais do EF 150

Quadro 17 - Gêneros do discurso contemplados ao longo dos anos iniciais x

AADL

166

Quadro 18 - Esferas sociais contempladas x AADL 170

Quadro 19 - Esferas priorizadas em cada volume x AADL 171

Quadro 20 - Gêneros do discurso contemplados ao longo dos anos iniciais x AS 193

Quadro 21 - Esferas sociais contempladas x AS 196

Quadro 22 - Tema dos gêneros 202

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO

16

1.1 Continuidade às notas introdutórias

18

2 DESCORTINANDO O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA:

REVISITAR O PASSADO PARA COMPREENDER O PRESENTE

26

2.1 Brasil Colonial: do ensino jesuítico às reformas pombalinas 27

2.2 Brasil Imperial: interface com a valorização da “língua nacional” 30

2.3 Brasil Republicano: retrato de novas mudanças 34

2.4 Brasil Republicano: anos 70 às itinerâncias atuais

38

3 LINGUAGEM, ENSINO E GÊNEROS DO DISCURSO

51

3.1 Linguagem e educação: diálogos entre Mikhail Bakhtin e Paulo Freire 51

3.2 Os gêneros do discurso sob a perspectiva bakhtiniana 70

3.2.1 Enunciado: um elo na cadeia da comunicação discursiva 71

3.2.2 Gêneros do discurso: tipos relativamente estáveis de enunciados 80

3.2.3 O texto como enunciado: dado primário para a compreensão humana 88

3.3 Os gêneros do discurso como objetos de ensino-aprendizagem

91

4 PERCURSO METODOLÓGICO: DESCORTINANDO OS CAMINHOS

PARA A ANÁLISE DO ENSINO DA PRODUÇÃO TEXTUAL

109

4.1 O pesquisador e o pesquisado: aproximação versus distanciamento 110

4.2 Critérios de escolha das coleções didáticas 112

4.3 A natureza da pesquisa 118 4.3.1 Mapeando os caminhos da natureza quantitativa da pesquisa 121

4.3.2 Mapeando os caminhos da natureza qualitativa da pesquisa

126

5 GÊNEROS DO DISCURSO E SITUAÇÕES DE PRODUÇÃO: O QUE É

(DES)PRESTIGIADO NAS COLEÇÕES DIDÁTICAS

133

5.1 O lugar dos gêneros e das esferas nas propostas de produção escrita 133

5.2 Os elementos constitutivos da situação de produção escrita 162

5.2.1 A Aventura da Linguagem: um breve perfil da obra 163

5.2.1.1 O lugar dos gêneros e das esferas: análise quantitativa 166

5.2.1.2 Situação de produção: análise qualitativa 175

5.2.2 Aprendendo Sempre: um breve perfil da obra 191

5.2.2.1 O lugar dos gêneros e das esferas: análise quantitativa 193

5.2.2.2 Situação de produção: análise qualitativa

199

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

213

REFERÊNCIAS

222

APÊNDICES 232

16

1 INTRODUÇÃO

A investigação se torna interrogação e conversa, isto é, diálogo. Nós não

perguntamos à natureza e ela não nos responde. Colocamos as perguntas

para nós mesmos e de certo modo organizamos a observação ou a

experiência para obtermos a resposta. (BAKHTIN, 2011, p. 319).

Este texto científico é fruto de um diálogo com o vivido pelas itinerâncias enunciadas

em determinados tempos e espaços. É o enunciar de motivações e de questionamentos, os

quais não são tessituras do acaso, mas o emergir de réplicas a outros enunciados e que, agora,

deseja suscitar respostas futuras, enriquecendo e completando o já-dito.

Desde a graduação em Pedagogia, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte

(UFRN), surgiu o interesse por um estudo mais aprofundado acerca da escrita, dos gêneros do

discurso e dos livros didáticos, mediante a interlocução emanada entre a experiência

profissional e a formação acadêmica.

Inicialmente, tal interesse emergiu a partir de minha primeira experiência como

professora, seis meses depois ao ingressar na UFRN. Decerto, com esse curto período de

tempo, ainda não havia cursado disciplinas mais específicas para com a prática de ensino-

aprendizagem.

Por esse contexto, alguns dos meus memoráveis professores de Ensino Fundamental

tornaram-se o principal referencial a cada passo por mim dado, a cada planejamento realizado.

Em razão disso, reconheço que desenvolvi atividades que criticava, inclusive, enquanto

estudante de EF - escrita criada com o propósito de o professor identificar se o aluno já sabia

utilizar as unidades gramaticais e as convenções ortográficas, o que imprimia a ideia de que

esse tipo de correção era garantia para a apreensão da capacidade de se produzir bons textos.

Em face dessa abordagem, os dizeres dos meus alunos ressoavam os próprios dizeres

de uma época, em que eu e meus colegas de turma experimentávamos o dissabor da escrita:

“Produção de texto?! A gente cria, cria, escreve, escreve, só pra professor corrigir. Isso não

tem graça!”.

Por esse entrecruzamento de vivências, o questionamento “Como ensinar aos meus

alunos a produzir um texto?”, inquietava-me constantemente, pois sabia que os desafios

haviam sido lançados e que, algo em mim, precisava ser mudado.

Em meio a dúvidas e incertezas, fui ao encontro da disciplina Processo de

Alfabetização, ministrada pela professora Dr.ª Maria Estela Costa Holanda Campelo e a

17

posterior, das disciplinas Ensino da Língua Portuguesa no Ensino Fundamental I e O Ensino

da Língua Portuguesa no 1º Grau II, ambas ministradas pela professora Dr.ª Tatyana Mabel

Nobre Barbosa.

Os estudos compartilhados por cada uma dessas professoras ensejaram o amparo para

minhas inquietações, de forma que ambas levaram-me a compreender: a importância de

permitir o aluno vivenciar os usos sociais que se fazem da escrita a partir dos diferentes

gêneros; e que somente o domínio do código não garantiria uma boa formação da criança

como produtora de textos.

Perpassar por uma formação no ensino da língua materna subjacente ao elo entre

escrita e gêneros, fez-me não somente entrelaçar esse conhecimento teórico para com minha

prática em sala de aula, mas também com o meu trabalho monográfico.

Se fui apresentada a uma linguagem como razão de paixão, liberdade, poesia e ação

no mundo (BARBOSA, 2011), só poderia, então, encantar-me e desejar que essa linguagem

dialogasse comigo nas itinerâncias científicas.

Nesse sentido, contando com a orientação e a colaboração da professora Tatyana

Mabel, desenvolvemos uma pesquisa monográfica intitulada Formação do texto escrito:

significados, tendências e abordagens de ensino. De natureza bibliográfica, objetivávamos

refletir sobre as diferentes concepções de escrita, analisando as possíveis contribuições dos

gêneros para a construção do texto escrito.

Com o término dessa etapa, tive duas certezas: o caráter de incompletude e de

continuidade da pesquisa. Incompletude, pois a cada novo ano/dia letivo, o contato com os

livros didáticos aos quais utilizava em sala de aula, com suas qualidades e lacunas, fazia-me

perceber a relevância deles como objeto de investigação. Isso gerava a sensação de que

deixava um vazio na construção textual da monografia. Por outro lado, a certeza da

continuidade, uma vez que pretendia desenvolver, após a conclusão da graduação, pesquisas

em torno dos livros didáticos e da produção escrita com base nos gêneros.

Realizando pesquisas iniciais através de artigos publicados em congressos, decidi

buscar o aprofundamento dos meus estudos na Pós-Graduação, através do Mestrado em

Educação na UFRN. Em paralelo a isso, surgiu a oportunidade de participar do Grupo de

estudos CONTAR (Departamento de Práticas Educacionais e Currículo, Centro de Educação,

PPGED-PPGEL-PPGECM), como bolsista-professora do projeto Leitura e escrita: recortes

inter e multidisciplinares no ensino de matemática e português. Tal projeto, sob a

18

coordenação das professoras Tatyana Mabel Nobre Barbosa e Claudianny Amorim Noronha,

é desenvolvido junto a CAPES - Observatório da Educação (Ed. 038/2010).

Dentre os vários objetivos do projeto, encontra-se: focalizar como a escrita é orientada

nos livros didáticos de Língua Portuguesa (LDLP) destinados aos 4º e 5º anos do EF. Para

isso, conta-se como campo de investigação, todas as escolas da rede pública municipal de

Natal/RN que estiveram aquém da meta do IDEB 2009 e, consequentemente, os LDLP

adotados por essas escolas, no que condizem aos 4º e 5º anos.

Assim, como nesse projeto há o envolvimento de diferentes colaboradores -

graduandos, mestrandos, ex-alunos, professores da rede pública, bolsistas-voluntários, dentre

outros - posso dizer que a pesquisa desta dissertação é fruto da contribuição de diferentes

vozes, vozes essas que expressam a riqueza de experiências, de conhecimentos, de

aprendizados, de apreciações e de desafios. Vozes que relatam o vivido, formulam questões e

apresentam a contra-palavra, dando vida a este trabalho.

Reconhecendo, pois, a importância dos diferentes diálogos entretecidos no processo de

(re)construção desta pesquisa, a partir de agora, substituirei o eu pelo nós, consciente que os

laços de coletividade têm marcado este estudo.

1.1 Continuidade às notas introdutórias

De acordo com os indicadores oficiais, como o Índice de Desenvolvimento da

Educação Básica (IDEB), um dos principais problemas do ensino refere-se à escrita. Por

outro lado, esse mesmo objeto de ensino constitui-se como um dos objetivos centrais da

escolaridade básica obrigatória, sendo essencial aos demais componentes curriculares, como

também às demandas sociais.

Decerto, a produção do texto escrito tem sido considerada como uma importante via

para que as pessoas possam transitar com mais familiaridade entre as diversas instâncias

sociais, conscientes de suas funções e de suas possibilidades de ação.

Toda educação verdadeiramente comprometida com o exercício da cidadania

precisa criar condições para o desenvolvimento da capacidade de uso eficaz

da linguagem que satisfaça necessidades pessoais - que podem estar

relacionadas às ações efetivas do cotidiano, à transmissão e busca de

informação, ao exercício da reflexão. De modo geral, os textos são

19

produzidos, lidos e ouvidos em razão de finalidades desse tipo. Sem negar a

importância dos que respondem a exigências práticas da vida diária, são os

textos que favorecem a reflexão crítica e imaginativa, o exercício de formas

de pensamento mais elaboradas e abstratas, os mais vitais para a plena

participação numa sociedade letrada. Cabe, portanto, à escola viabilizar o

acesso do aluno ao universo dos textos que circulam socialmente, ensinar a

produzi-los e a interpretá-los. (BRASIL, 1997, p. 25-26).

Partindo dessa colocação, vê-se a incumbência da escola em oportunizar o contato dos

alunos com uma linguagem escrita, perpassada pelas práticas de interação da sociedade

contemporânea.

Sendo assim, é possível afirmar que, ao longo das últimas décadas, as novas

abordagens que surgiram no trabalho com a língua materna, têm retratado mudanças que

buscam contemplar às imanentes exigências sociais que impõem a revisão de paradigmas

(BATISTA, 2008, p. 42).

No que diz respeito ao ensino da produção escrita, os efeitos dessas novas perspectivas

repercutiram no próprio tratamento dado aos gêneros do discurso. Estes, passam a ser

figurados como objetos de ensino-aprendizagem e o ensino da escrita, por sua vez, a ser

concebido sob o enfoque dos gêneros.

A partir de então, o advento das pesquisas sobre os gêneros vem conjugado às

contribuições dos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997) para a educação

brasileira, ao adotar o texto como unidade básica de ensino e os gêneros, por sua vez, como

objetos desse ensino. Tais concepções também são compartilhadas pelo Programa Nacional

do Livro Didático (BRASIL, 2010)1, ao requerer que as obras didáticas contemplem, nas

propostas de produção escrita, a diversidade dos gêneros do discurso.

Por esse viés, tornou-se não apenas imprescindível reconhecer e compreender a

constituição e o funcionamento dos gêneros, como também inteirar-se dos subsídios teóricos,

metodológicos e aplicados que perpassam a ação docente, frente ao novo objeto de ensino-

aprendizagem.

Sob esse enfoque, o material a qual o professor recorre basicamente, o livro didático, é

fundamental, por ser parte constitutiva da construção dos saberes produzidos e legitimados em

diferentes esferas, as quais retratam sobre o que é e como ensinar a língua materna.

1 Para mais informações sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e o Programa Nacional do Livro

Didático (PNLD), ver capítulo dois.

20

Para um melhor entendimento, é relevante destacar os escritos de Batista e Bunzen,

respectivamente, ao preconizarem que:

[...] o livro didático brasileiro se converteu numa das poucas formas de

documentação e consulta empregadas por professores e alunos. Tornou-se,

sobretudo, um dos principais fatores que influenciam o trabalho pedagógico,

determinando sua finalidade, definindo o currículo, cristalizando abordagens

metodológicas e quadros conceituais, organizando, enfim, o cotidiano da

sala de aula. (BATISTA, 2008, p. 28).

Assumir tal posicionamento não significa dizer que acreditamos que os

livros didáticos são um mal necessário, mas que eles têm, por razões

históricas e culturais, um papel na engrenagem escolar. Defendemos que eles

são, na sala de aula, assim como os programas de ensino, objetos de

movimentos de recontextualização e de re-significação, em que as

concepções dos professores e dos alunos assumem importantes significados

nesse processo. (BUNZEN, 2005, p. 12).

Atendo-nos às considerações precedentes, não parece haver dúvida quanto à influência

do livro didático no contexto escolar, atuando como um dos principais (ou mesmo, o

principal) orquestradores do processo educacional brasileiro. Decerto, é um dos poucos

materiais presentes no cotidiano das redes públicas de ensino, aos quais são apreendidos como

locus de orientação do trabalho a ser desenvolvido em sala de aula.

Convém acrescentar também que, devido, principalmente, aos programas do governo

federal de compra e distribuição de livros didáticos para as escolas públicas, o Brasil é hoje,

um dos maiores produtores de livros do mundo. (OLIVEIRA, 2008).

Portanto, dada a sua expressiva participação no setor editorial brasileiro, bem como de

sua influência na prática pedagógica, tornou-se essencial conceber os livros didáticos como

objeto a ser pesquisado, analisado e problematizado.

Por esse direcionamento, esta pesquisa tem como objeto de estudo os gêneros do

discurso e as situações de produção presentes nas coleções didáticas de língua portuguesa dos

anos iniciais do EF. Nesse caso, o objetivo geral desta pesquisa consiste em analisar o

tratamento dado aos gêneros do discurso e às situações de produção2 no ensino do texto

escrito, a partir das coleções didáticas de língua portuguesa aprovadas pelo PNLD 2010,

2 As situações de produção a que nos referimos vinculam-se aos seus elementos constitutivos, como destinatário,

finalidade, posição enunciativa, esfera de produção e circulação, estrutura composicional, conteúdo temático,

etc. No capítulo três, isso será mais bem detalhado.

21

trabalhadas nos anos iniciais do EF e adotadas em escolas da rede pública municipal de Natal

que estiveram abaixo do IDEB 2009.

Lembremos que, as coleções a serem analisadas integram o Banco de Dados do grupo

de estudos em língua portuguesa e matemática - CONTAR. Por isso, na escolha das obras,

tomamos como parâmetro inicial as coleções adotadas em escolas da rede pública municipal

de Natal/RN que estiveram abaixo do IDEB 2009. Inclusive, esses materiais estão

disponibilizados em formato digital, graças ao apoio do PNLD, sediado na UFRN e

coordenado pela Prof.ª Dr.ª Margarida Maria Dias de Oliveira, do Departamento de História.

A fim de melhor guiar a análise, foram elaboradas as seguintes questões de pesquisa:

1) Quais são os gêneros do discurso e as esferas sociais priorizados no ensino de produção

escrita?

2) No ensino de produção escrita, a diversidade dos gêneros do discurso é efetivamente

trabalhada nas coleções didáticas?

3) Como é abordada a situação de produção em o que o texto escrito deverá ser produzido?

Acreditamos que, ao responder às perguntas anteriormente mencionadas,

conseguiremos alcançar os seguintes objetivos específicos:

I. Identificar quais são os gêneros do discurso e as esferas sociais priorizados nas propostas

de produção escrita.

II. Investigar se as coleções didáticas analisadas contemplam a diversidade dos gêneros no

ensino de produção escrita.

III. Verificar como a situação de produção é orientada na apropriação do gênero escrito.

Para nós, as reflexões em torno desses objetivos e dessas questões norteadoras,

elucidam um corpus de investigação que vai ao encontro dos interesses da rede pública de

ensino, dos órgãos responsáveis pelas políticas públicas da educação e das próprias pesquisas

vinculadas a área. No caso, promover a convergência entre escola, políticas públicas e

pesquisa, está em conformidade com o desejo de contribuir para a qualidade da educação

básica.

22

Ao observar os indicadores oficiais, verifica-se que o município de Natal

figura num dos últimos lugares (IDEB, 2009). De acordo com os indicadores

oficiais, o contexto global das escolas da Rede Municipal de Natal-RN

demanda políticas de investimento em pesquisa e ações de intervenção

contínua que permitam identificar as causas de permanência da média dos

índices de desenvolvimento para grande parte das escolas dos anos iniciais

do EF. (BARBOSA; NORONHA, 2010, p. 6, grifo nosso).

Em conformidade com o exposto, se o panorama global das escolas públicas

municipais de Natal conclama por investimentos em pesquisa, a análise amparada sob o viés

dos livros didáticos e das produções escritas com base nos gêneros é, certamente, uma réplica

às necessidades pedagógicas e às preocupações institucionais.

De um lado, esta pesquisa leva em conta o livro didático que, tradicionalmente, se

legitimou como elemento constitutivo do contexto escolar. Assim, mesmo com as novas

tecnologias da comunicação e da informação ou mesmo, dos programas relacionados à

biblioteca escolar, como o Programa Nacional da Biblioteca Escolar (PNBE), a centralidade

no uso dos livros didáticos ainda é significativa.

Por outro lado, esta pesquisa contempla os gêneros do discurso, elemento considerado

indispensável para a formação escrita da criança. No momento, os gêneros passaram a ser um

saber que precisa ser ensinado e aprendido, por refratar e refletir as atividades humanas em

suas diversas situações de interação. É, portanto, um saber social que se transforma em um

importante objeto de ensino-aprendizagem.

Por isso, tratar sobre a esfera social e outros elementos intrínsecos à situação de

produção (conteúdo temático, estrutura composicional, estilo da linguagem, destinatário,

finalidade comunicativa, posição enunciativa, suporte, etc.) também têm sua relevância, por

caracterizarem as relativas padronizações dos gêneros do discurso, intrinsecamente ligadas ao

contexto comunicativo no qual estão inseridas. Isso, certamente, pode levar os alunos a

entender que cada gênero é produzido e compreendido mediante as necessidades requeridas

pelas condições específicas das variadas práticas sociais.

Espera-se, então, que as reflexões entrelaçadas no decorrer desta dissertação possam

contribuir para os diferentes interlocutores da prática educacional:

para o PNLD, com a possibilidade de refletir sobre os critérios de avaliação estabelecidos

no ensino da produção textual;

23

para os autores das coleções didáticas, em busca da qualificação das obras de sua autoria,

especialmente, no que diz respeito às propostas de produção escrita.

para os professores, com o propósito de que estes possam encontrar, nesta pesquisa,

subsídios para o ensino do texto escrito com base nos gêneros, de forma a se enunciarem

diante das possíveis lacunas evidenciadas nos livros;

para os pesquisadores que, interessados em temáticas como produção textual e gêneros do

discurso, possam ver, neste trabalho, uma referência para seus estudos.

Em vista disso, o desenvolvimento das análises desta pesquisa fundamenta-se,

primordialmente, na perspectiva bakhtiniana acerca dos gêneros do discurso. Para tanto, além

de basearmo-nos em Bakhtin (2002; 2008; 2011; 2012), buscamos apoio nos estudos de Alves

(2012), Alves Filho (2011), Bunzen (2005; 2007; 2009; 2011), Faraco (2009), Faraco, Tezza e

Castro (2007), Faraco e Castro (2000), Freire (2006; 2008; 2011a; 2011b; 2012), Rodrigues

(1999; 2001; 2005; 2008), Rojo (1999; 2000; 2006; 2008; 2010), Schneuwly (2011 [1994]),

Schneuwly e Dolz (2011 [1996; 1997; 1998]), dentre outros teóricos que contribuem para a

construção desta pesquisa.

Portanto, além deste capítulo 1 de caráter introdutório, estruturamos a organização da

dissertação da seguinte maneira:

No segundo capítulo, fizemos um breve percurso dos caminhos trilhados pelo ensino de

língua portuguesa e pelo próprio livro didático, considerando as mudanças ocasionadas

durante o Brasil Colonial, Imperial e Republicano.

No terceiro capítulo, apresentamos a fundamentação teórica que conduziu a nossa

compreensão acerca das discussões e das análises desta pesquisa. Para isso, propomos um

estudo sobre os gêneros na teoria bakhtiniana, articulando com outros conceitos como

linguagem, enunciado e texto, dentre outros aspectos relevantes para nossas reflexões.

No quarto capítulo, descrevemos o percurso metodológico da pesquisa, expondo os

procedimentos referentes à construção, recorte e análise dos dados. Nesse caso, traçamos,

mais detalhadamente, os critérios de escolha das coleções didáticas e quais delas

compõem o corpus da investigação, mediante os objetivos a serem alcançados.

24

No quinto capítulo, expomos as análises dos dados, necessariamente relacionadas aos

elementos-chave que norteiam às questões da pesquisa: diversidade de gêneros, gêneros e

esferas priorizados e elementos constitutivos da situação de produção.

No sexto capítulo, apresentamos uma revisão sintética dos principais resultados da

pesquisa, conforme as discussões anteriormente feitas. Indicamos também,

direcionamentos para futuras investigações.

É importante aqui ser mencionado que, ao longo desta pesquisa, procuramos conceber

os livros didáticos como um gênero do discurso, e não como um mero suporte de atividades a

serem trabalhadas pelos alunos. Embora não seja necessário o aprofundamento dessa

discussão para com os objetivos deste trabalho, acreditamos que, ao menos, é cabível uma

explicação para a escolha de tal posicionamento.

A respeito disso, Bunzen (2005) e Bunzen e Rojo (2008) têm advogado que estudar o

livro didático como um gênero do discurso significa situá-lo como um produto sócio-histórico

e cultural, em que diferentes agentes, como autores, editores, professores, leitores, críticos,

dentre outros, atuam com uma certa relação social entre si na busca em satisfazer as

necessidades de ensino-aprendizagem formal da língua materna. Segundo esses teóricos, tal

entendimento dá relevo a própria historicidade do livro, que reflete as várias tradições, as

inovações e as utopias de uma época.

Para esses pesquisadores, a concepção com a qual eles polemizam refere-se ao que foi

preconizado por Marcuschi, ao defender o livro didático como um suporte.

Sabemos que há quem trate o livro didático como gênero, mas aqui o livro

didático será decididamente visto como um suporte, com os argumentos a

serem apresentados adiante. Seguramente, o livro didático é um suporte bem

diverso do que uma revista semanal. Não só os destinatários e os objetivos

do livro didático e da revista semanal são diversos, mas também as esferas

de atividade discursiva são outras. [...] Não obstante os argumentos em

contrário, ainda se pode dizer que o livro didático (LD), particularmente o

LD de língua portuguesa, é um suporte que contém muitos gêneros, pois a

incorporação dos gêneros textuais pelo LD não muda esses gêneros em suas

identidades, embora lhe dê outra funcionalidade [...]. (MARCUSCHI, 2003,

p. 14-21).

25

Em contrapartida a esse encaminhamento, Bunzen e Rojo assim questionam:

Como estabelecer uma unidade textual-discursiva? É possível? Como ficaria,

então, a questão da autoria e do estilo? [...] estamos defendo que há sim

unidade discursiva, autoria e estilo no LD, proporcionada via fluxos e

alinhamentos do discurso autoral, responsável pela articulação de textos em

gêneros diversos e que tal processo indicia muito mais a produção de

enunciados em um gênero do discurso do que um conjunto de textos num

suporte, sem um alinhamento específico, sem estilo e sem autoria.

(BUNZEN; ROJO, 2008, p. 86, grifo dos autores).

Com base nas duas fundamentações teóricas, cremos que a compreensão do livro

didático como um gênero do discurso mostrou-se necessária para esta pesquisa. Para nós, fica

claro que, conceber o livro didático como um gênero sócio-historicamente construído, nos

ajuda a perceber que ele dialoga com os velhos/novos paradigmas traçados para o ensino-

aprendizagem, com os documentos oficiais, como os PCN, com as sucessivas avaliações do

PNLD, etc. Ou seja, se há esse diálogo, não existe um discurso monológico do autor da obra,

mas um conjunto de vozes que se compartilham em busca da qualificação da prática

pedagógica.

O capítulo dois, então, tem sua relevância, uma vez que nos indicará que a própria

história do livro didático em nosso país reflete, indiretamente, a concepção bakhtiniana - de

que o gênero renasce e se renova a cada nova conjuntura das atividades humanas.

(BAKHTIN, 2008; 2011).

Por fim, só poderíamos dizer que o debate está aberto. Que você, leitor, se sinta

convidado a dialogar com este texto. Que os diálogos se entrecruzem, se complementem, se

partilhem, se questionem, se contraponham. Que a sua palavra, saturada de visões de mundo,

ajudem-nos a transitar nas problemáticas do contínuo porvir.

26

2 DESCORTINANDO O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: REVISITAR O

PASSADO PARA COMPREENDER O PRESENTE

A retomada da história da disciplina português há de trazer à tona [...] cada

momento passado e também o momento presente. E certamente evidenciará,

ainda, a importância de uma perspectiva histórica para compreender e

explicar o estatuto atual da disciplina. Só assim, compreendendo-a e

explicando-a, a partir de sua história, pode-se interferir nela. [...] Buscar no

passado compreensão e explicação, para que não façamos, no presente,

interferências de forma a-histórica e acientífica. (SOARES, 2004, p. 176).

Percorrer o passado sobre o ensino de língua portuguesa significa, neste texto, buscar

o curso da história que revele a forma de sua constituição e de existência enquanto área

curricular na educação brasileira ao longo do tempo. É, então, tecer a mudança e a evolução

pelas quais vem passando, de forma a compreender como as suas características atuais foram

historicamente produzidas.

Sem pretender fazer uma discussão exaustiva sobre isso, consideramos importante

destacar alguns momentos históricos dos saberes escolares preconizados, sobretudo, no ensino

da língua escrita. Por isso, tal estudo não poderia deixar de ser feito sem mencionar a

consolidação das práticas curriculares prescritas em documentos oficiais e em livros didáticos,

nos quais legitimam os saberes de cada época.

Não podemos negar, também, que traçar esse percurso histórico visa a compreender os

objetos/objetivos de ensino privilegiados nas orientações encaminhadas às produções escritas

presentes nas coleções didáticas do PNLD/2010, foco de nossa análise no quinto capítulo.

É nesse sentido que o encontro histórico com a língua portuguesa necessita ser

apreciado, mediante o crivo de ideias e de convergências que se impõem e se interpõem na

esfera educacional, em diferentes momentos espaço-temporais.

27

2.1 Brasil Colonial: do ensino jesuítico às reformas pombalinas

No decorrer do período colonial, a gênese da educação brasileira esteve sob a

responsabilidade dos jesuítas, que objetivaram catequizar e instruir os índios, assim como os

filhos dos colonos que para cá vieram, submetendo-os às novas regras de convívio social.

A educação seria, assim, instrumento básico para legitimar os conhecimentos

necessários à melhoria existencial e material, em prol dos interesses do domínio

governamental português.

Nesse contexto, a língua portuguesa não foi tratada como um componente curricular,

mas sim como um instrumento para a alfabetização, por não constituir-se como língua

dominante no intercâmbio social. Junto dela encontravam-se a língua geral, provinda de

línguas indígenas que, em sua maioria, originavam-se do tupi; e o latim, tratado como a língua

preferencial na formação secundarista e superior.

Desse modo, no ensino de primeiras letras, referente à educação de crianças indígenas

e de filhos dos colonizadores, prevaleceu-se a aprendizagem da língua geral, sistematizada,

sobretudo, por José de Anchieta, no seu escrito intitulado Arte da gramática da língua mais

usada na costa do Brasil. Inclusive, conforme o padre João de Mello (1988), a partir dessa

gramática, tornou-se obrigatório o estudo da língua nativa, fazendo-se necessário que:

[...] em casa se lesse a arte da lingua brasilica que compoz o irmão Joseph.

[...] Desta lição nem reitor, nem pregador, nem outra pessoa é isenta. Vai a

cousa tão deveras que ha quem diga que dentro de um anno se obriga,

desocupado, falar a língua [...]. (MELLO, 1988, p. 279).

Como mencionado, convém notar que, embora o português fosse a língua oficial, o

domínio do vocabulário indígena foi visto como condição mínima necessária para se

promover a mudança e o convívio nas relações sociais do cotidiano.

Além disso, através do programa de estudo elaborado pelos jesuítas, a Ratio Ataque

Instituto Studiorum Societas Jesu, estudou-se gramática latina e retórica no ensino secundário

e no superior, mediante um programa educativo solidamente respaldado pela literatura greco-

latina. No caso, essa prática pedagógica abrangeu um currículo baseado em textos clássicos

como os de Horácio, Ovídio, Virgílio, Cícero e Homero.

28

Tratou-se, pois, de uma educação escolar pensada para os filhos das elites sociais, em

prol do aprendizado retórico-gramatical, com destaque para a supremacia do latim. De fato, a

preferência por essa língua clássica em detrimento do português foi evidenciada, por exemplo,

nas próprias profissões clericais, públicas e liberais, que exigiam o domínio da eloquência

latina.

Soares (2004) ressalta, consequentemente, a falta de motivação para instituir o

português como disciplina curricular, tendo em vista que não houve:

[...] nem condições internas ao próprio conteúdo - que ainda não se

configurara como área de conhecimento, a que faltava uma tradição como

área de estudos - nem condições externas a ele - seu uso apenas secundário

no intercurso verbal, a precariedade de seu estatuto escrito, na incipiente

sociedade brasileira, enfim, seu pouco valor como bem cultural [...].

(SOARES, 2004, p. 159, grifo da autora).

No entanto, em meados do século XVIII, sob o controle assumido por Marquês de

Pombal no território de Portugal e do Brasil, mudanças ocorreram na educação, com o intento

em propor que a língua portuguesa adquirisse maior status na construção dos saberes

escolares. Por isso, dentre as reformas pombalinas, consolidou-se uma política de divulgação,

de inclusão e de valorização do ensino de português.

Em função disso, criou-se a carta régia de 12 de setembro de 1757, que não só obrigou

o ensino dessa língua aos povos indígenas, como também proibiu o uso de línguas indígenas

na colônia brasileira, como forma de impedir a prática pedagógica baseada na língua geral. A

respeito disso, Bunzen (2011) afirma que alguns autores defendem que essa carta de 1757

assinalou o nascimento oficial da língua portuguesa no Brasil, bem como sua oficialização no

reino de Portugal.

Assim, introduziu-se no ensino de primeiras letras a alfabetização do ler e do escrever

em português, além do estudo, no ensino secundário, da gramática portuguesa em

coexistência com o latim e com a retórica. Porém, é válido ressaltar que, inicialmente, o

objetivo de implementar o ensino de língua portuguesa teve um caráter meramente

instrumental, ou seja, viabilizar o aprendizado da gramática latina.

29

[...] o latim deixava de ser a língua exclusiva dos conhecimentos doutos para

enriquecer-se como matéria de uma formação. [...] A língua portuguesa seria

desta forma um instrumento propedêutico destinado a diminuir os cansaços e

conduzir rapidamente os estudantes à compreensão da latinidade.

(CARVALHO, 1978, apud ARAÚJO, 2009, p. 356).

Por essa dimensão pedagógica, entende-se que a transmissão das noções de língua

portuguesa tornaria possível, em tempo mais rápido, o aprofundamento dos conhecimentos

necessariamente úteis para se lidar com a compreensão do latim.

Desse modo, as reformas pombalinas foram materializadas por medidas e

reformulações pedagógicas imperativas, em conformidade com interesses seculares da Coroa

(ARAÚJO, 2009). Portanto, a recomendação de ensinar o português refletiu o interesse de que

se precisava divulgar e preservar a língua do “dominador” aos “povos dominados”.

Com as novas prescrições à educação, os livros escolares tiveram o encargo de

substituir as antigas orientações pedagógicas norteadas pelos jesuítas. Com base nisso,

produziu-se, por exemplo, o texto Memória dos livros aconselháveis e permitidos para o

Novo Método3, que apresentava uma listagem de obras a serem utilizadas pelo novo grupo de

professores.

No entanto, segundo Bunzen (2009), como ainda não havia uma produção de livros

escolares em território brasileiro, utilizavam-se as obras (como compêndios, cartilhas e

gramáticas) normalmente fabricadas no continente europeu, o que encareceu seu consumo no

Brasil-Colônia. Em decorrência disso, tais materiais voltaram-se, prioritariamente, para

atender ao professor e para veicular os conhecimentos a serem ensinados. Lembremos

também que, para muitos professores, seus recursos financeiros não lhes permitiram ter

acesso à compra de obras, resultando em sua pouca circulação no preparo das aulas.

Isso vem a retratar o feitio de que a administração colonial proibia qualquer iniciativa

vinculada à impressão de textos no território brasileiro, sob o argumento de que a circulação

de ideias geraria riscos para o domínio português.

Progressivamente, nesse contexto de mudanças, a língua portuguesa foi adquirindo seu

valor social como área de conhecimento e o latim, por sua vez, desvalorizando-se. Dentre o

processo histórico que contribuiu para isso, destacou-se a chegada da Família Real Portuguesa

ao Brasil em 1808, o que ocasionou o aumento no número de falantes do português;

3 Disponível em <http://www.unicamp.br/iel/memoria/crono/acervo.html> Acesso em: 08 maio 2013.

30

instalação da Imprensa Régia no Rio de Janeiro, possibilitando que obras de autores

brasileiros fossem editadas; criação da biblioteca (futura Biblioteca Nacional), favorecendo a

consulta ao acervo de livros, manuscritos, gravuras, mapas, etc. para estudiosos, mediante

consentimento régio, e posteriormente, para o público; e proclamação da Independência do

Brasil, já no período imperial.

2.2 Brasil Imperial: interface com a valorização da “língua nacional”

No momento histórico vivenciado, sobretudo, após a Independência do Brasil, o

português foi ganhando seu valor não apenas como a língua oficial, mas também como a

língua nacional, no intuito de transformar a língua do colonizador na língua da nação

brasileira. Houve, desse modo, o interesse crescente de vincular a língua portuguesa às

condições advindas e peculiares do território brasileiro, de forma a criar um símbolo de

identidade própria.

Em razão disso, manifestou-se a preocupação em prol da escolarização pública, como

forma de promover a garantia de um lugar ao mundo “civilizado”.

No intuito de instruir a população para atender as necessidades requeridas com a

constituição do Estado Imperial, promulgou-se a Lei de 15 de outubro de 1827, celebrada

como a norma que fundou a escolarização primária pública no Brasil.

Em seu artigo 1º, a referida lei determinou a criação de escolas de primeiras letras em

todas as cidades, vilas e lugares mais populosos. Assim, para Faria Filho (2002), o nível

primário, também chamado de ensino elementar ou de primeiras letras, tornou-se, durante as

primeiras décadas do Império, a instituição responsável para ordenar o social, formando o

caráter de cada pessoa pelo império da lei.

A educação escolar primária foi concebida, então, como estratégia do Estado para

controlar qualquer tipo de desordem de um povo sem instrução, em vista da tranquilidade

pública e da estabilidade política.

No entanto, Faria Filho (2002) assevera que a inserção das camadas populares na

instrução primária deu-se em caráter autoritário e excludente, por deixar claro os limites da

inclusão - não colocar em risco as formas tradicionais de submissão da maioria ao jugo e à

exploração da elite imperial.

31

Isso significa que as políticas educacionais continuaram voltadas aos interesses da

elite, apresentando a desigualdade no ensino entre os diferentes grupos sociais. Por isso, a

democratização da instrução primária não se efetivou enquanto prática, evidenciando o

descaso do governo com a educação popular.

No que tange à matriz curricular, em seu artigo 6º, a referida lei deliberou que os

professores deveriam trabalhar não apenas com a alfabetização do ler e do escrever, mas

também com a “gramática da língua nacional”. Portanto, ter a gramática como objeto de

ensino ajudaria a dar prosseguimento aos estudos de quem ingressasse no ensino secundário.

Essas preocupações sinalizam uma mudança na definição da leitura e da

escrita. Era o início de um processo de deslocamento das habilidades de

decifrar textos e repeti-los de cor, assim como da capacidade de caligrafar

para a aprendizagem da leitura e da escrita do português conhecendo a

língua e as suas armadilhas, trazendo a possibilidade de escrever por si só

textos sem erros na grafia das palavras. (INÁCIO, 2003, p. 162).

Houve, assim, uma preocupação em ensinar os elementos da língua nacional,

apresentando exercícios gramaticais para que o aluno desenvolvesse a capacidade de redigir

bons textos e ortograficamente corretos. Sob esse enfoque, o ensino de língua baseou-se no

processo de fixação e de memorização, através da cópia de textos (preferencialmente, de

autores clássicos) e de ditados, a serviço da aquisição das normas que regiam a língua

materna.

Sobre o ensino secundário, à medida que o português foi ganhando seu valor na

prática social e no sistema de ensino, a retórica passou a ser estudada não só em autores

latinos, como também em autores de língua portuguesa.

Por isso, com as mudanças históricas e, consequentemente, com as novas demandas da

sociedade, a retórica configurou-se tanto como a arte de falar bem quanto como a arte de

escrever bem, por meio de recursos estilísticos próprios da poética, com destaque para o

estudo dos textos literários. No caso, a introdução da cultura escrita no ensino surgiu como

necessidade de atender aos novos processos de produção e de relação social, nos quais se

promovia uma maior circulação e acesso aos materiais de textos impressos.

Nesse contexto, sobressaiu-se a fundação do Colégio Pedro II, criado no Rio de

Janeiro, em 1837. Tal colégio constituiu-se, até meados do século XX, como instituição-

modelo para o ensino secundário público e privado do Brasil.

32

Diante dessa conjuntura, assim como ressalta Bunzen (2011), o estudo de língua

portuguesa foi oficialmente introduzido nos primeiros currículos do Colégio Pedro II, mesmo

que de forma ainda bastante tímida. O português foi, pois, estudado sob a forma da retórica e

da poética para, posteriormente, ser focado também nas aulas de gramática nacional. O autor

informa, ainda, que é quase no final do Império - fim do século XIX - que a gramática, a

retórica e a poética fundiram-se em uma só disciplina curricular, denominada Português4.

Fundamentalmente, o alunado que frequentou o sistema institucionalizado do ensino

secundário provinha das camadas privilegiadas da sociedade, embora não se excluísse a

possibilidade de os alunos de camadas populares frequentarem instituições como o Colégio

Pedro II.

[...] a escola de que estamos falando obviamente tem papel social muito

diverso do atual: destina-se a uma elite da população que pretende seguir

estudos universitários; tem, portanto, função propedêutica e caráter não

obrigatório, destinando-se à formação dessas elites para os exames

preparatórios. (ROJO, 2010, p. 81).

Caracterizado por uma escolarização que privilegiou os interesses da elite, coube aos

alunos do ensino secundário (isso equivale também para o primário) ter um razoável domínio

da norma padrão culta. O modelo de ensino, portanto, baseou-se predominantemente na

concepção de língua enquanto sistema único e homogêneo, mediante o uso correto das regras

e das nomenclaturas sintetizadas pelos compêndios de gramáticas, como também dos modelos

de escrita presentes nas antologias e nas cartilhas.

Em decorrência disso, o ensino de português ainda se espelhou nos consagrados textos

clássicos, por estes serem concebidos como legítimos representantes do caráter valorativo e

do uso correto da gramática normativa.

4 A mudança para a denominação da disciplina Português ocorreu, inicialmente, apenas no 1º ano do ensino

secundário, em 1862. Já no fim do período imperial, antes mesmo da emergência do nacionalismo republicano,

assistiu-se à ampliação e à ascensão da disciplina na grade curricular dos diferentes anos de ensino secundarista.

Alguns fatores contribuíram para isso, como a criação do cargo de “professor de português” em 1871; e a

exigência, cada vez maior, dos conhecimentos específicos do vernáculo nos exames obrigatórios para admissão

nos cursos superiores. (BUNZEN, 2011).

33

Quanto aos livros escolares produzidos no Brasil, o Colégio Pedro II ocupou

centralidade não somente na estruturação dos programas curriculares que orientaram o ensino

de língua portuguesa, como também na adoção de materiais elaborados por seus professores.

Lembremos, pois, que muitas das obras utilizadas foram proeminentemente elaboradas

pelos docentes do Colégio Pedro II, os quais adquiriram uma figuração de respeito diante da

política educacional brasileira.

Estudando sobre isso de maneira mais detalhada, Bittencourt descreve as estratégias

das editoras quanto à escolha das obras a serem publicadas.

As estratégias das primeiras editoras centraram-se na aproximação ao poder

institucional, podendo-se entender por essa via o critério de escolha dos

autores. Estes correspondiam a um perfil que expressava essa dependência

política. Compêndios, cartilhas eram textos que precisavam da aprovação

institucional para que pudessem circular nas escolas, o que acabava por

direcionar as opções dos editores na seleção dos autores. Entende-se,

portanto, a preferência por autores oriundos do Colégio Pedro II [...]. Além

de assegurarem uma vendagem, dificilmente seus nomes seriam vetados

pelos conselhos educacionais que avaliavam as obras [...]. A figura do autor

era assim realçada, sua biografia geralmente exposta na página de rosto, e os

editores esmeravam-se em valorizar sua posição social. (BITTENCOURT,

2004, p. 482).

Houve, desse modo, a centralização pedagógica e a consequente hegemonia do poder

dos professores do Colégio Pedro II para com a função de redigir obras que, atendendo ao

poder educacional instituído, pudessem ser trabalhadas, sobretudo, no ensino destinado aos

interesses das elites. Inclusive, mesmo que os professores/autores de outras instituições

conseguissem publicar suas obras, a aceitação e circulação eram apenas locais.

É válido ressaltar que o mercado editorial apresentou apenas algumas contribuições

para o ensino de primeiras letras. Dentre o tímido interesse de formação para a infância,

destacou-se João Ribeiro5 com a obra Grammatica da Infância, atendendo crianças de até, no

máximo, onze anos.

5 No Colégio Pedro II, João Ribeiro foi professor de História, tendo vários de seus livros adotados no ensino

primário e secundário.

34

2.3 Brasil Republicano: retrato de novas mudanças

Já em meados da implantação da República, o Brasil experimentou um vigoroso

crescimento no processo de industrialização e de urbanização. Com a intensificação do

modelo urbano-industrial, delineou-se a necessidade de formar recursos humanos que

atendessem as novas necessidades da política e da economia vigentes. A educação seria, pois,

condição imprescindível para que isso acontecesse.

Em decorrência disso, houve uma intervenção mais efetiva do Estado na organização

da educação brasileira, inclusive, do ensino primário, desvalorizado durante tanto tempo.

[...] o ensino primário carecia de diretrizes nacionais, o que demonstra o

desinteresse do governo para com a educação popular que dispensava, num

modelo agrário-exportador, uma formação escolarizada ao trabalhador.

Somente com o desenvolvimento industrial, a política educacional passa a

dar prioridade à formação da classe trabalhadora, do primário aos diversos

cursos profissionalizantes. (ZOTTI, 2006, s.p.).

O ensino primário passou, assim, a receber atenção das políticas educacionais, uma

vez que foi preciso desencadear uma formação mínima para a classe trabalhadora,

promovendo a transmissão de conhecimentos necessários para a vida em sociedade, como

também para a preparação ao mundo do trabalho.

Por esse contexto, decretou-se a Lei Orgânica do Ensino Primário, pela lei nº 8.529,

em janeiro de 1946. Com esse decreto, precisou-se oferecer às crianças de sete a doze anos o

ensino gratuito e obrigatório.

Dentre os conteúdos a serem trabalhados, o referido documento apresentou a

disciplina Leitura, linguagem oral e escrita. Por isso, para o ensino de língua materna, essa

disciplina representou a junção de uma proposta pedagógica que enfatizaria a oralidade, a

leitura, a escrita e os elementos gramaticais (mesmo que, na prática, fossem trabalhados

distintamente).

No ensino secundário, por sua vez, embora a disciplina curricular já se denominasse

Português, manteve-se, até os anos 40 do século XX, o ensino pautado na individualidade e

na autonomia da tradicional gramática, retórica e poética. Desse modo, conservou-se a

independência da publicação de dois diferentes manuais - as gramáticas e as coletâneas de

textos, sendo estas destinadas aos estudos retóricos e poéticos. (SOARES, 2004).

35

Quanto aos materiais escolares adotados, além das cartilhas utilizadas no ensino,

encontravam-se, em geral, obras que se limitavam à exposição de textos gramaticais e

literários produzidos por consagrados autores, o que evidencia, conforme Soares (2004, p.

166), a concepção de professor - “[...] aquele a quem bastava que o manual didático lhe

fornecesse o texto, cabendo a ele, e a ele só, comentá-lo, discuti-lo, analisá-lo, e propor

questões e exercícios aos alunos.”.

Por esse raciocínio, pode-se dizer que a ausência de quaisquer orientações didáticas,

seja por falta de exercícios, de questionários, seja de explicações, reflete o caráter monológico

do ensino que se tinha naquele momento - a propagação, durante a aula, de uma única voz, a

voz do mestre.

Aproximadamente em meados dos anos 1950 e 1960, como consequência da

necessidade de ampliar os recursos humanos em função do modelo político e econômico

vigente, fomentou-se, cada vez mais, o direito às camadas populares de acesso à

escolarização. Essa situação acentuou a alteração do perfil não somente do alunado e do

professorado, bem como da própria função do professor. Inclusive, conforme Soares (2004), o

número de alunos no ensino primário quase duplicou e, no médio, quase triplicou.

Um dos efeitos dessa ampliação foi o aumento da demanda por professores, o que

gerou uma menor seletividade na contratação desses profissionais e um evidente

comprometimento na qualidade de ensino. Devido a isso, intensificou-se o processo de

depreciação da função docente, somado ao rebaixamento salarial e condições de trabalho.

Nesse sentido, os materiais de apoio para o ensino da língua materna sofreram também

mudanças, ampliando o auxílio ao professor na realização das aulas. Como bem mostra

Batista (2008), esse novo tipo de material propôs-se a condicionar, orientar e facilitar as

práticas docentes, apresentando os conteúdos curriculares, as atividades didáticas e os modos

de abordagem desses conteúdos, com uma organização e distribuição mediante o tempo

escolar, em séries e unidades de ensino.

Por isso, na falta de professores bem qualificados, o surgimento da concepção de livro

didático como estruturador do trabalho pedagógico caracterizou-se pela função de preparar

aulas e de formular exercícios.

Nesse contexto, com o crescente aumento de alunos no ensino primário, manifestou-se

um maior interesse pela elaboração e publicação de livros destinados às crianças,

36

promovendo, pois, a constituição dos saberes específicos do público infantil. Esse período

correspondeu, de fato, a uma sensível mudança quanto ao público do livro didático.

[...] o livro didático não era um material de uso exclusivo do professor, que

transcrevia ou ditava partes do livro nas aulas, mas que ele precisava ir

diretamente para as mãos dos alunos. O aluno era (e ainda é) um público

compulsório, mas assumi-lo como consumidor direto do livro significava,

para autores e editores, atender a novas exigências, transformando e

aperfeiçoando a linguagem do livro. As ilustrações começaram a se tornar

uma necessidade, [...] não se limitando mais a compêndios e cartilhas.

(BITTENCOURT, 2004, p. 483-484).

Partindo dessa reflexão, é possível afirmar que, tendo também o alunado como

consumidor, seja ele infantil, seja juvenil, a valorização pela experiência pedagógica dos

autores do livro didático tornou-se um importante critério por parte das editoras. Ou seja, um

bom escritor seria aquele que tivesse a vivência em sala de aula, a fim de desenvolver um

material consumível que atendesse a heterogeneidade e as especificidades do público-alvo.

Pelo exposto, evidencia-se que o uso desse livro, em um sistema educacional cujos

profissionais apresentavam sérios problemas na qualidade de formação, compôs-se como

material imprescindível ao ensino e, paralelamente, ao acesso do professor e do aluno a uma

fonte de conhecimento.

O novo tratamento dado ao livro refletiu-se também na relação entre a gramática e a

coletânea de textos - o que antes eram dois livros passou a compor um só.

É então que gramática e texto, estudo sobre a língua e estudo da língua

começam a constituir realmente uma disciplina com um conteúdo articulado:

ora é na gramática que se vão buscar elementos para a compreensão e a

interpretação do texto, ora é no texto que se vão buscar estruturas

linguísticas para a aprendizagem da gramática. (SOARES, 2004, p. 167,

grifo da autora).

Desse modo, as aulas de português pautaram-se na busca pela gramática para

compreender o texto e na busca pelo texto para ensinar a gramática. Porém, apesar da

aparente junção da gramática e do texto em um único livro didático, ainda se observou a

ênfase na sistematização gramatical em detrimento das atividades textuais, sejam de leitura,

sejam de produção de texto.

37

É sob esse aspecto que o texto adquiriu uma função modelar para o ensino de língua

portuguesa - referenciar a leitura e a escrita a partir de regras estabelecidas, mesmo que, nessa

condição, anulassem-se os sujeitos dos discursos. Para a produção de texto, por exemplo,

sobressaiu-se a preocupação pela assimilação de regras, correção de erros limitados à

ortografia e ação mecânica de decodificação gráfica, não havendo praticamente reflexão sobre

o que se escreveu.

Ou, ainda, como afirma Geraldi (2003), é o texto concebido sob vários sentidos: objeto

de leitura vozeada, no qual o professor lia o texto em voz alta, a fim de que o aluno seguisse o

mesmo modelo de leitura; objeto de imitação, em que se lia o texto como modelo para a

produção escrita dos alunos; e objeto de uma fixação de sentidos, cuja compreensão textual

dos alunos baseava-se no entendimento do professor sobre o texto por ele lido.

Por esse raciocínio, verifica-se a permanência pela concepção que leva em conta a

língua da norma padrão, concebida como homogênea, culta e de prestígio para a sociedade.

No caso, ainda não havia diálogo entre o ensino disseminado nas aulas de português com a

variedade linguística trazida pelas camadas populares.

Devido a isso, o processo de ensino-aprendizagem tornou-se algo alheio à vivência de

muitos alunos, que presenciaram o descompasso entre a língua valorizada na escola e a língua

por eles utilizada com sua família, com seu grupo social, etc. Por isso, se houve o

silenciamento das vozes dos alunos na medida em que o seu dialeto foi discriminado, pode-se

preconizar que, para as classes desfavorecidas, a instituição escolar simbolizou mais exclusão

que participação na sociedade.

Por um ensino coercitivo e discriminatório, resultou-se, consequentemente, na

dificuldade cada vez maior dos alunos em ler e escrever de forma clara e bem articulada,

demonstrando, pois, a ineficácia do ensino ao acesso democratizado da escola pública

brasileira.

Logo, fez-se necessária a busca por modelos teórico-metodológicos que respondessem

aos desafios socialmente colocados para a instituição escolar. Assim, nos anos 70 do século

XX, a conjuntura educacional brasileira apresentou propostas de mudanças para com os

saberes tradicionalmente exigidos nas aulas de língua portuguesa.

38

2.4 Brasil Republicano: anos 70 às itinerâncias atuais

Com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 5.692/716,

coube à escola oferecer “[...] especial relevo ao estudo da língua nacional, como instrumento

de comunicação e como expressão da cultura brasileira.”. Por essa razão, a denominação da

disciplina Português passou a ser Comunicação e Expressão nas séries iniciais do 1º grau (1ª

a 4ª série); e Comunicação e Expressão em Língua Portuguesa nas séries finais do 1º grau (5ª

a 8ª).

Considerou-se, nesse período, a concepção de língua como instrumento de

comunicação, alterando-se a valorização da gramática normativa como referência central para

o ensino do vernáculo.

Os objetivos passam a ser pragmáticos e utilitários: trata-se de desenvolver e

aperfeiçoar os comportamentos do aluno como emissor e recebedor de

mensagens, através da utilização e compreensão de códigos diversos -

verbais e não-verbais. Ou seja, já não se trata mais de estudo sobre a língua

ou de estudo da língua, mas de desenvolvimento do uso da língua.

(SOARES, 2004, p. 169, grifo da autora).

Com base na afirmação precedente, compreende-se que os objetivos de ensino, ao

assumirem um caráter pragmático e utilitário, definiram a aprendizagem da língua materna

como a aprendizagem de um instrumento de comunicação. Por essa perspectiva, coube ao

professor desenvolver no aluno a capacidade de emitir e receber mensagens verbais e não

verbais com eficácia.

No caso, com a reavaliação do valor conferido ao estudo no saber da língua/ sobre a

língua, surgiu o debate em torno da polêmica - ensinar ou não gramática nas práticas

escolarizadas de ensino. Tal discussão refletiu nas variadas limitações da gramática

tradicional - seu normativismo renitente, sua descontextualização a um melhor entendimento

para o processo de produção e de compreensão textual, sua restrição ao trabalho com a

oralidade, etc.

6 Por meio dessa lei, ampliou-se a obrigatoriedade escolar para oito anos (1ª a 8ª série), com o chamado 1º grau

obrigatório e gratuito, também nomeado de ensino fundamental.

39

Fundamentalmente, constituiu-se um ensino mais preocupado com a diversificação

textual. Portanto, a utilização dos textos em sala de aula passou a ser feita para além dos

excertos literários, baseando-se na recorrência de sua presença nas práticas sociais.

Segundo Rojo (2010) e Soares (2004), o que aconteceu foi a ampliação dos textos

incluídos nas escolas, pois adentraram nos livros didáticos, histórias em quadrinhos e textos

de natureza jornalística, publicitária e humorística, por exemplo. De fato, tendo a concepção

de língua como instrumento de comunicação, era preciso diversificar certamente os textos que

circulariam na esfera escolar.

Embora os defensores da nova concepção de língua reproduzissem mudanças no

processo de ensino-aprendizagem, não houve um completo rompimento com o ensino até

então realizado pela escola. A produção de texto, por exemplo, continuou sendo vista como a

prática do bem escrever, a fim de o professor avaliar sistematicamente as capacidades de

escrita do aluno, independente de quem escreve, para quem se escreve e do que se escreve.

Chamamos a atenção, no tocante ao mercado dos livros didáticos, que os anos 70 do

século XX acentuaram ainda mais o desenvolvimento da indústria gráfica no Brasil, fazendo

crescer a produção, a publicação e a distribuição desses materiais para as escolas públicas.

Um dos fatores que motivaram esse crescimento foi a criação da coedição do Programa do

Livro Didático (PLID), que abrangeu tal distribuição para os diferentes níveis de ensino -

fundamental, médio, superior e supletivo.

Sob esse enfoque, Bunzen (2009) comenta a participação estatal na função de

financiar a indústria dos livros para algumas escolas públicas (as verbas eram insuficientes

para atender a todas), especialmente das que recebiam crianças de famílias de baixa renda.

Assim, houve o aumento considerável de tiragens para as quatro primeiras séries do ensino

fundamental.

O autor destaca ainda a insatisfação dos professores por pouco colaborarem no

processo de avaliação e de seleção dos livros didáticos, de forma que muitos desses

profissionais nem os utilizavam em sala de aula, por não concordarem com o perfil teórico-

metodológico, com os conteúdos, etc. Tal trabalho de avaliação era feito pelos órgãos

responsáveis pela política estadual do livro didático e de estudos pedagógicos, que listavam os

livros aprovados a serem distribuídos pelo PLID.

40

Desse modo, observa-se que caberia ao professor conhecer, aceitar e se adaptar às

propostas pedagógicas da equipe que elaborava os novos livros didáticos que, por sua vez,

estaria submissa às exigências do PLID.

Em meados da década de 80 do século XX, período marcado pelo processo de

redemocratização política do país, novos rumos se impuseram à esfera educacional. Com o

fim da ditadura militar, emergiu fortemente no Brasil, o discurso pela mudança de ensino, que

já não encontrava alicerce no contexto político agora vigente.

Intensificaram-se, então, pesquisas sobre as práticas escolares, na busca de apresentar

reflexões quanto aos elementos intrínsecos ao ensino de língua materna. Em meio a

dissertações, teses e outros textos de divulgação, encontra-se a intensa presença dos estudos

publicados por autores como João Wanderley Geraldi, Magda Soares e Paulo Freire, além da

influência do pensamento bakhtiniano que chegava ao Brasil.

Dentre as mudanças educacionais a serem ressalvadas, destacamos, primeiramente, o

retorno da chamada disciplina Português para os currículos do ensino fundamental e médio,

em substituição às denominações relativas à perspectiva comunicacional de língua. Isso

refletiu não apenas numa mudança curricular, mas também na representação de uma nova

identidade escolar, voltada para outras bases teóricas e metodológicas.

A partir dessa reformulação, instaurou-se uma nova concepção de língua, como pode

ser verificada na passagem a seguir.

[...] a influência que vem sendo exercida sobre a disciplina português [...]

traz, basicamente, uma nova concepção de língua: uma concepção que vê a

língua como enunciação, não apenas como comunicação, que, portanto,

inclui as relações da língua com aqueles que a utilizam, com o contexto em

que é utilizada, com as condições sociais e históricas de sua utilização. Essa

nova concepção vem alterando em sua essência o ensino da leitura, da

escrita, as atividades de práticas da oralidade, e até mesmo o ensino da

gramática. (SOARES, 2004, p. 173).

Vê-se, por esse pensamento, a incitação por uma proposta que fosse além da

concepção comunicativa da língua materna, a fim de oportunizar uma prática de ensino

baseada no estudo da língua em suas condições mimeticamente autênticas de uso. Dessa

forma, abrir-se-ia espaço para a valorização do sujeito no processo de interlocução,

minimizando as propostas pedagógicas consideradas tradicionais, discriminatórias e

prescritivas.

41

Em consequência disso, surgiu a defesa pela prioridade do texto como unidade de

ensino-aprendizagem, tanto da leitura, como da escrita e análise linguística. Por esse motivo,

estimulou-se o uso do texto como o principal objeto de trabalho do professor nas aulas de

português.

Uma reflexão como essa nos anos 80 do século passado foi, sem dúvida, motivada por

uma das coletâneas em destaque na época - O texto na sala de aula, de 1984, organizada por

Geraldi7.

Não se aprende por exercícios, mas por práticas significativas. Essa

afirmação fica quase óbvia se pensarmos em como uma criança aprende a

falar com os adultos com quem convive e com seus colegas de brinquedo e

interação em geral. O domínio de uma língua é o resultado de práticas

efetivas, significativas, contextualizadas. (GERALDI, 2008 [1984], p. 36).

Não há como deixar de registrar que, em meio a esse debate, ecoou também a voz de

Paulo Freire8, através de sua obra publicada em 1982 - A importância do ato de ler.

Cada um de nós é um ser no mundo, com o mundo e com os outros. Viver ou

encarnar esta constatação evidente, enquanto educador ou educadora,

significa reconhecer nos outros - não importa se alfabetizandos ou

participantes de cursos universitários; se aluno de escolas do primeiro grau

ou se membro de uma assembléia - o direito de dizer a sua palavra.

(FREIRE, 2006 [1982], p. 26).

Reforçou-se, assim, o interesse em adotar uma concepção de língua e de ensino a favor

do uso efetivo de textos situados na esfera social, em oposição às atividades mecânicas de

repetição, de reconhecimento de estruturas e de leitura/produção de frases isoladas. Por isso,

uma das orientações didáticas apresentadas referiu-se à prática da produção textual,

destacando-se a importância de se diversificar as situações de escrita.

7 De acordo com Rojo (2010), reflexões como a de Geraldi foram de extrema importância para se pensar nas

práticas pedagógicas dos anos 80, uma vez que os estudos desse autor foram divulgados no momento em que se

almejava por mudanças nos programas e nos currículos de língua portuguesa.

8 Paulo Freire também se destacou como figura expressiva nesse momento histórico. Após voltar do exílio,

retomou suas ideias acerca das práticas escolares, no intuito de pensar num ensino que atendesse as demandas da

educação popular.

42

Dessa maneira, esperava-se que o educando dominasse os diferentes textos

correspondentes às práticas de referência, como forma de responder satisfatoriamente as

exigências comunicativas oriundas do seu dia a dia. Isso implicou, sem dúvida, a busca pela

constituição de um ensino de língua portuguesa fundamentado no respeito ao aluno e que

promovesse a então desejada transformação social.

Como se vê, os anos 80 representaram para o país um solo fértil para entretecer a

formulação basilar de Bakhtin (2011, p. 356) sobre a linguagem e sua natureza dialógica - “A

palavra, a palavra viva, indissociável do convívio dialógico, por sua própria natureza quer ser

ouvida e respondida.”.

Nesse sentido, se a interação verbal é um componente para a construção de sentidos,

ampliou-se a defesa em conceber a sala de aula como fenômeno social e eminentemente

dialógico. Nesse caso, a aula de português não deveria centrar-se na figura exclusiva do

professor, uma vez que o aluno também deveria ser tratado como sujeito do processo

dinâmico da interação verbal e da produção dos saberes escolares.

Lembremos, todavia, que algumas críticas se fizeram à nova concepção teórico-

metodológica de ensino. Um dos aspectos apontados, por exemplo, referiu-se à falta de

orientação didática no que diz respeito à sistematização e ao planejamento do trabalho com a

modalidade escrita, dando a impressão de que bastaria o aluno ter contato com os materiais

escritos para adquirir a habilidade de produzir um texto.

Em outros termos, faltaram referências que melhor auxiliassem os caminhos a serem

percorridos pelos professores, mediante as mudanças empreendidas na maneira de abordar o

novo objeto de ensino.

De fato, embora o objetivo fosse levar o aluno ao uso da escrita em situações

extraescolares, a escola não soube lidar com essa nova necessidade, criando uma cultura de

produção textual distante das práticas sociais de interação. A escrita, na verdade, pautou-se

nos chamados tipos textuais, tais como narração, descrição e dissertação, a fim de “[...]

desenvolver e avaliar, progressiva e sistematicamente, as capacidades de escrita dos alunos.”

(SCHNEUWLY; DOLZ, 2011[1997], p. 66).

Convém ressaltar que, para esses autores, a escola, ao longo de sua história, elaborou

instrumentos (tipos textuais) que se cristalizaram em formas de linguagem específica,

perpetuando, assim, sua própria norma textual. Ou seja, criou modelos de escrita

exclusivamente escolares, desprovidos de qualquer referência textual extraescolar.

43

Devido a uma prática de escrita que desvinculou os tipos de texto à natureza do gênero

a que podem pertencer, é que os autores Schneuwly e Dolz denominaram tais estruturas como

gêneros escolares, por se constituírem, de certo modo, como uma prática discursiva

predominante da esfera escolar. Ou seja, limitar a organização da escrita sob a perspectiva de

apenas ter o professor como destinatário, a escola como contexto de produção e de circulação

e o texto escrito como o objetivo de uma atividade para cumprimento avaliativo.

Certamente, essa é uma informação importante a ser apresentada, pois ao analisarmos

as coleções didáticas, poderemos verificar se ainda há, nas atividades para a produção escrita,

uma orientação baseada na tradição dos gêneros escolares, como descrição, narração e

dissertação.

Destacar aqui a existência de lacunas não significa deixar de reconhecer os inegáveis

avanços alcançados por meio das transformações advindas do ensino-aprendizagem de língua

materna. Levar em conta a valorização do diálogo no âmbito educacional e a utilização de

textos autênticos na produção escrita ressoaram como elementos de fundamental importância

para um momento histórico que necessitava explicitamente de mudanças.

Por essa perspectiva, o uso exaurível do livro didático também foi colocado sob

debate, tendo em vista que, para alguns estudiosos, tal material era o maior divulgador do

chamado ensino tradicional e um dos principais responsáveis pelo fracasso escolar. Na obra

Texto em sala de aula, após Geraldi apresentar alguns exemplos de atividades para o

professor de língua materna, fez o seguinte comentário: “Gostaria [...] de ressaltar que

estamos, até aqui, com um roteiro e algumas sugestões de trabalho em classe, ocupando três

horas-aula da semana e até o presente momento não precisamos utilizar o livro didático.”

(GERALDI, 2008, p. 73).

Havia, pois, um discurso de que os livros didáticos de língua materna, muitas vezes de

baixa qualidade, apresentavam deficiências em suas propostas conceituais e metodológicas,

sendo essas, inclusive, originadas de asserções ideológicas e discriminatórias.

Por outro lado, os livros didáticos já eram tratados pelos professores como

instrumentos facilitadores de seu trabalho e socialmente arraigados em sua prática. Então, o

afastamento desses materiais em sala de aula não se efetivou na prática.

Nesse processo de reconstrução epistemológica a respeito da produção didática

brasileira, elaborou-se o Decreto nº 91.542 de 1985.

44

Art. 1º. Fica instituído o Programa Nacional do Livro Didático, com a

finalidade de distribuir livros escolares aos estudantes matriculados nas

escolas públicas de 1º Grau.

Art. 2º. O Programa Nacional do Livro Didático será desenvolvido com a

participação dos professores do ensino de 1º Grau, mediante análise e

indicação dos títulos a serem adotados.

Analisando o Decreto, percebe-se que o PLID transformou-se no PNLD (Programa

Nacional do Livro Didático), tendo a função inicial de adquirir e distribuir os livros didáticos

para as escolas públicas de ensino fundamental. Entende-se, com isso, que a avaliação da

qualidade desses materiais ainda não se constituía como critério central nas demandas postas

ao PNLD.

Um aspecto de mudança que merece destaque refere-se à participação dos professores

na escolha dos livros a serem adotados e distribuídos gratuitamente nas escolas públicas,

abrindo, pois, possível espaço para as vozes desses profissionais.

Em síntese, as propostas desenvolvidas nos anos 80 vieram a simbolizar o possível

caminho para com a transposição das configurações educacionais já tão arraigadas na escola -

má qualidade de ensino e de formação dos professores; falta de interesse dos alunos pela

leitura e produção de texto; artificialidade da espontaneidade, da criatividade verbal e da

interlocução em sala de aula; orientações pedagógicas delineadas pelos estereótipos dos livros

didáticos; entre outras.

Os estudos em torno de um posicionamento pedagógico que considerasse a

diversidade das interações sociais ficaram mais explícitos nos documentos oficiais dos anos

90. Dentre eles, destaca-se a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais(PCN)9 de

Ensino Fundamental, ao adotarem o texto como unidade de ensino e os gêneros do discurso

como objetos desse ensino.

Os PCN, como o próprio nome diz, buscam trazer fundamentações para as práticas

educativas do ensino brasileiro, a fim de contribuir para a construção de diretrizes aos

currículos estaduais e municipais das diferentes áreas. Para a disciplina de língua portuguesa,

propõem subsidiar o trabalho do professor em sala de aula a respeito da aquisição e do

desenvolvimento da língua materna.

9 Como não é objetivo da dissertação fazer um estudo detalhado sobre os PCN, indicamos a leitura do livro A

prática de linguagem em sala de aula: praticando os PCNs, organizado por Roxane Rojo.

45

Uma das propostas dos PCN10

(1997) é a prática da produção textual com base nos

gêneros do discurso, sendo estes concebidos como as formas relativamente estáveis de

enunciados e construídos sócio-historicamente. Nesse sentido, é apresentado o interesse de

ampliar a competência linguística do aluno para que ele possa, assim, participar das diferentes

situações comunicativas.

Suas orientações, nesse caso, compartilham de ideias baseadas na concepção dialógica

da linguagem, assim como defendida por Bakhtin, um dos teóricos que embasam tal

documento, sobretudo, no que refere-se aos gêneros.

Aproximar-se dos conceitos bakhtinianos para repensar a escrita é, de certa maneira,

preencher as lacunas deixadas pelas críticas feitas nos anos 80 em relação à produção de

texto. Em nosso entendimento, isso sinaliza a própria relação dialógica do documento para

com os debates que o antecederam, caracterizando-se, pois, como uma súmula do que foi

possível aprender e avançar.

A elaboração e a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o

Ensino Fundamental representam, em minha opinião, um avanço

considerável nas políticas educacionais brasileiras em geral e, em particular,

no que se refere aos PCNs de Língua Portuguesa, nas políticas lingüísticas

contra o iletrismo e em favor da cidadania crítica e consciente. (ROJO, 2008,

p. 27, grifo da autora).

Para tanto, compreende-se que os PCN representam um grande avanço para as

transformações no ensino-aprendizagem de língua materna. Certamente, os parâmetros

provocados por esses documentos, idealizados para contribuir com o aprimoramento do

ensino, atestam uma proposta advinda de sua contraposição às práticas docentes tradicionais,

norteadas pelas concepções desvinculadas das atividades linguísticas do cotidiano.

Seguir as perspectivas apresentadas pelos PCN é, então, eleger a diversidade de

gêneros como objeto privilegiado de ensino nas aulas de português, aliada à discussão anterior

da diversificação das situações de produção e de circulação de textos na escola e fora dela.

Em conformidade com o exposto, compreendemos que as orientações didáticas para a

produção escrita e presentes nas coleções didáticas devem contemplar a diversidade dos

10

Referimo-nos, doravante, aos PCN de Língua Portuguesa do 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental.

46

gêneros e das situações de produção e de circulação de textos, adotando-os como elementos

importantes para a formação do aluno-escritor.

Desse modo, as práticas pedagógicas vigentes na década de 90, e que subsistem aos

dias atuais, veem nos gêneros a possibilidade de resolver uma parte das lacunas deixadas pelo

processo histórico do ensino de língua materna.

Como bem notavelmente diz Rojo (2006, p. 57), “Para ajudar os alunos a cruzarem

essas fronteiras é preciso organizar uma iniciação que diga respeito a todos os campos da vida

humana. E, para isso, os gêneros de texto/discurso, sendo a linguagem viva, o discurso na

vida, servem-nos à maravilha.”.

Eleitos como verdadeiros instrumentos de interação e de mediação para o

envolvimento dos alunos nas mais diversas situações de uso da linguagem, a noção de gênero

permite integrar a concepção de língua revelada e constituída nos mais diferentes processos de

interlocução, sendo esses vinculados às esferas cada vez mais amplas de atuação social.

Dentre as ações dos anos 90, vale ressaltar também a implementação, pelo PNLD11

, de

uma sistemática avaliação pedagógica dos livros didáticos nele inscritos. Suas principais

finalidades passaram a ser, a partir de 1996, não somente a aquisição e a distribuição gratuita

de tais livros no ensino fundamental público brasileiro, como também a análise e a avaliação

dessas obras.

Levando em conta o exposto, convém reproduzir as palavras de Batista, ao fazer uma

análise sobre a política de educação empreendida pelo PNLD.

As seguidas modificações no PNLD evidenciam um esforço de auto-

avaliação e uma busca permanente para responder, de modo mais adequado,

à complexa realidade do livro didático nos contextos editorial e educacional

brasileiros. Embora não se disponha, ainda, de dados que permitam

apreender globalmente os impactos do Programa nas escolas e no campo

editorial, observam-se indicadores de que esse esforço vem apresentando

resultados positivos. (BATISTA, 2008, p. 37-38).

Observa-se, pois, o crescente interesse pela qualidade dos materiais didáticos, na busca

de que eles atendam as aspirações do contexto socioeducacional brasileiro, veiculadas,

principalmente, pelos próprios documentos oficiais. Os PCN, por exemplo, embora sem o

11 Para um maior aprofundamento crítico sobre o PNLD, sugerimos a seguinte leitura: Livro didático de Língua

Portuguesa, letramento e cultura da escrita, sob a organização de Antônio Batista e Roxane Rojo.

47

caráter de obrigatoriedade, passaram a constituir-se como referência às reformulações dos

livros didáticos.

Por isso, pode-se afirmar que o conjunto de medidas proposto pelo PNLD procura

trazer, como critério comum de adequação pedagógica, a presença de textos mimeticamente

autênticos nas obras analisadas, com base em contextos sociais pelos quais circundam os

gêneros do discurso.

Em decorrência disso, a avaliação realizada pelo PNLD é tratada como elemento

importante para este estudo, de forma a ajudar-nos na construção do corpus desta pesquisa,

bem como das análises a serem feitas com as coleções didáticas aqui escolhidas.

Transcorridas as várias alterações implantadas na escola brasileira, permanecem as

reflexões sobre os caminhos a serem trilhados para o ensino de língua materna. Investigações

e estudos sempre virão, pois como sujeitos da história, experimentamos mudanças

conjunturais sociopolíticas que acarretam, por sua vez, desafios à esfera educacional.

Certamente, vivemos as mudanças também percorridas no século XXI. É o constante

devir emoldurado pelas demandas da vida em que diariamente somos confrontados.

Confrontados, sobretudo, por uma sociedade globalizada que promove as renovadas e

desafiadoras transformações - na aquisição de conhecimentos e de habilidades e na

emergência de apreendê-los; na formação do cidadão e do que se espera dele; no perfil dos

alunos que chegam às escolas; na formação dos professores; nas práticas conceituais e

metodológicas de ensino-aprendizagem; nas regras, lógicas e formas de interação social;

dentre outras reformulações advindas de uma sociedade cada vez mais centrada na alta

circulação das tecnologias de comunicação e de informação.

Por esse âmbito, Moita Lopes (2012) enfatiza a importância da linguagem para

enfrentar o modo como a sociedade contemporânea está se organizando.

[...] é preciso entender as mudanças vertiginosas que experimentamos para

que não sejamos tragados por elas. Tal compreensão é especialmente

relevante se almeja-se uma educação linguística coadunada com a

importância que a linguagem tem em nossos tempos e com os novos modos

de construir significado constitutivos dos letramentos atuais. (MOITA

LOPES, 2012, p. 205).

48

Complementando mais adiante, ainda afirma que:

[...] atravessamos fronteiras por meio da linguagem sem nos movermos

quando conversamos, discutimos, trabalhamos, estudamos, aprendemos e

compartilhamos nossa vida com outros participantes na rede, que podem

estar fisicamente muito distantes de nós ou mesmo participantes que não

conhecemos ou que, de fato, nunca venhamos encontrar face a face. A

topografia do mundo está, portanto, alterada. (MOITA LOPES, 2012, p.

209).

O ensino de língua portuguesa, nesse contexto, é (ou deveria ser) estabelecer

aproximações entre as práticas de linguagem na esfera escolar e nas esferas extraescolares

mais amplas do cotidiano, no intuito de adaptar-se às necessidades da contemporaneidade. A

linguagem que promove as vozes da interlocução parece facilitar a aproximação referida,

proporcionando uma formação dos aprendizes ao movimento de sentidos que se intenciona

produzir a cada novo diálogo.

Levando em conta, portanto, que o conhecimento se constrói a cada transformação da

sociedade, é requerida “[...] uma visão situada de língua em uso, linguagem e texto e práticas

didáticas plurais e multimodais, que as diferentes teorias de texto e de gêneros favorecem e

possibilitam.” (ROJO, 2010, p. 91-92).

Sob esse enfoque, saber lidar com a diversidade da linguagem é um dos desafios da

escola atual e uma habilidade da qual não se pode distanciar-se. Compreender e produzir o

texto escrito no século XXI é, por exemplo, lidar não apenas com a linguagem verbal, mas

também com os conhecimentos semiotizados - imagem, imagem em movimento, cores, sons,

infográficos, etc., para com eles apreender um sentido.

Dentre as demandas deste século, questionamo-nos se os gêneros da esfera digital, tão

recorrentes nas relações dialógicas atuais, fazem-se presentes nas coleções didáticas que

compõem o corpus de nossa pesquisa.

Isso implica, de fato, colocar a perspectiva dialógica em funcionamento na prática

escolar, a fim de que os alunos-cidadãos, por meio da linguagem, estejam mais aptos para agir

na construção da vida social.

À luz das considerações apresentadas, percebe-se que o ensino de língua portuguesa

no cenário brasileiro encontra-se historicamente marcado pelo crivo das singularidades,

49

rupturas, similaridades, tensões e alteridades ocasionadas, em geral, pela dinâmica discursiva

de/entre cada momento histórico.

Em vista disso, pudemos ver que a escola, o ensino-aprendizagem, o perfil do aluno e

do professor, os documentos oficiais e a função dos materiais didáticos vão se reconfigurando

a cada diálogo com o contexto histórico, político, social, econômico, cultural, bem como do

científico e educacional. Partindo disso, infere-se que:

[...] quando novidades da pesquisa chegam à escola não é porque ‘agora tudo

mudou’ ou porque ‘o que se pensava antes estava errado’ e é preciso

‘embarcar na nova onda’. [...] É preciso entender que iluminações novas são

conseqüências de definições novas do objeto de estudos. (GERALDI, 2003,

p. 84).

De acordo com essa colocação, entende-se que as transformações inerentes à nossa

sociedade são promotoras da redefinição dos objetos/objetivos de ensino, ao fomentarem a

busca por concepções teórico-metodológicas que respondam a cada novo desafio que surge.

Por isso, iluminações novas são resultados de posicionamentos favoráveis à renovação de

teorias e práticas educacionais, as quais precisam melhor integrar-se aos dilemas decorrentes

de uma conjuntura em mudança.

Vimos, no decorrer do texto, que os objetos/objetivos de ensino privilegiados nos

livros didáticos são frutos do momento histórico a que pertencem, advindos de um processo

que reflete e refrata as tensões de diferentes campos de interesse. Isso vem a mostrar que a

elaboração do livro não é mais concebida sob a voz monológica do autor, uma vez que há, em

sua constituição, o dialogismo com outras vozes - as vozes dos documentos oficiais, como as

do PCN; as vozes das sucessivas avaliações feitas pelo PNLD; as vozes dos estudos

científicos; as vozes dos anseios do professor; dentre outras relações dialógicas.

Isso é importante de ser enfatizado, pois acreditamos que, ao analisarmos as coleções

didáticas, estaremos dialogando não apenas com os autores desses materiais, mas também

com outros sujeitos que ressoam suas vozes na elaboração dos livros, como os avaliadores do

PNLD.

50

Embora se discuta até que ponto as mudanças se efetivam, ou como e onde se

efetivam12

, pode-se assegurar que, ao menos, elas nos conduzem às indagações sobre as

crenças cristalizadas na esfera educacional, em suas formas de construir conhecimentos e

pelas quais os professores e alunos são envolvidos.

Mas, como sabiamente pondera Clare (2002, s.p.), a “Educação será sempre um

processo de questionamento. Temos consciência de que nunca chegaremos a uma plenitude

[...]”, “Novos caminhos sempre se abrirão e devemos estar sempre preparados para a reflexão.

Acolhendo-os ou não, precisamos conhecê-los.”.

Dito de outra forma, defendemos que a educação, em cada momento histórico, é um

tesouro a ser (re) descoberto, é um grito do alvorecer a cada enriquecimento contínuo dos

saberes. Se novos caminhos sempre se abrirão, a própria educação estará em plena mutação, a

fim de prefigurar o mundo de amanhã.

12

Conforme Rojo (2006, p. 77), “[...] pesquisas feitas sobre a escolha dos manuais didáticos pelos professores de

Ensino Fundamental brasileiros têm mostrado que, em alfabetização e Língua Portuguesa, os professores

preferem escolher obras mais conservadoras, baseadas na transmissão das regras e normas da língua e no

tratamento do texto como pretexto para essa transmissão.”.

51

3 LINGUAGEM, ENSINO E GÊNEROS DO DISCURSO

Levando em conta que, no capítulo anterior, procuramos apresentar o ensino de língua

portuguesa mediante o processo histórico que a configurou como um saber a ser ensinado,

buscamos, agora, desenvolver um conjunto de reflexões a partir da perspectiva dialógica da

linguagem, proposta por Mikhail Bakhtin.

Para tanto, considera-se, primeiramente, a linguagem como o fio condutor para

pensarmos no uso do gênero do discurso como objeto de ensino-aprendizagem, em vista de

desenvolver a concepção de escrita enquanto processo interlocutivo, em sua inter-relação com

o fluxo das mais variadas formas de relação social.

Por essa razão, a fim de melhor estabelecer relações de sentido com as ideias

bakhtinianas, recorremos a outros referenciais que nos ajudem a construir e a reconstruir o

funcionamento da prática de produção escrita, implicado nas coleções didáticas que compõem

o corpus desta pesquisa.

3.1 Linguagem e educação: diálogos entre Mikhail Bakhtin e Paulo Freire

E que as crianças cantem livres sobre os muros

E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor

E que o passado abra os presentes pro futuro

Que não dormiu e preparou o amanhecer

(Taiguara - Que as crianças cantem livres)

Taiguara Chalar da Silva (1945-1996), um dos compositores mais censurados na

história da música popular brasileira durante a ditadura militar, representou, nos versos da

canção Que as crianças cantem livres, a esperança por tempos melhores diante das diversas

vozes silenciadas por uma política de censura à liberdade de expressão. Porém, assim como

Taiguara, sabe-se que Mikhail Bakhtin (1895-1975) e Paulo Freire (1921-1997), em

condições adversas ao regime político russo e brasileiro, também se posicionaram a favor da

condição humana em sua natureza essencialmente dialógica, na qual a linguagem servisse

como fulcro das relações sociais.

Este texto pretende, então, esboçar a interface entre linguagem e educação, tomando

como teorias-chave a perspectiva interacionista de Bakhtin e de Freire e, mais

52

particularmente, o conceito de linguagem e os estudos com ele entrelaçados sobre diálogo,

palavra, consciência, sujeito e relações dialógicas presentes na educação.

Apesar do distanciamento espaço-temporal entre esses dois pensadores, objetiva-se

verificar as possíveis aproximações entre essas vertentes teóricas, a fim de analisar os dados

desta pesquisa, a partir de um quadro teórico que considere os elementos constitutivos da

produção escrita como ações de linguagem vinculadas a uma dimensão específica da

educação: com usos, objetivos e conteúdos didático-pedagógicos.

O interesse em fazer o correlato entre Bakhtin e Freire pode ser representado pelo

pensamento de Moura, ao preconizar que ambos têm em comum:

[...] a preocupação com as concepções dos seres humanos, de sua ação e de

seu posicionamento no mundo. Embora em tempos e espaços diferentes,

duas consciências intencionadas a objetivos divergentes, mas que

apresentavam, no percurso de suas reflexões, pontos que se tangenciam.

Bakhtin aprofundou o estudo da linguagem, entendendo-a como propriedade

intrínseca ao ser humano. Portanto, ao examinar a linguagem, ele também

analisa o homem. Freire, por sua vez, elabora uma proposta educativa cujos

fundamentos sejam capazes de responder a indagações dos homens sobre si

mesmos. Os dois estudiosos, como se vê, entendem o ser humano [...] como

indivíduos em construção na/pela linguagem. (MOURA, 2012, p. 167).

Com base nisso, partimos da hipótese de que entretecer as vozes bakhtiniana e

freireana incentiva-nos a tecer reflexões sobre a práxis pedagógica, fazendo emergir o escruto

dialógico que contribua para a compreensão da linguagem em sua mobilização com as

implicações concretas e cotidianas que ocorrem na prática educativa.

Mikhail Bakhtin, considerado um dos mais importantes filósofos do século XX nas

áreas humanas e sociais, trouxe significativas contribuições aos estudos da linguagem e,

atualmente, ainda é alvo de interesse para a crescente legião de estudiosos que procuram

responder aos dilemas da vida moderna. Percebe-se, assim, que o pensamento bakhtiniano

[...] é certamente um dos mais fascinantes acontecimentos das ciências

humanas deste século. O conjunto de suas idéias - abordando temas fulcrais

para todo o estudo das realidades humanas (a linguagem e, por meio dela, o

sujeito, as relações sujeito/sociedade, a estética e a ética) - constitui uma

revolução epistemológica de grande porte, cujos contornos e cujas

consequências não foram ainda de todo percebidos. (FARACO; CASTRO;

TEZZA, 2007, p. 9).

53

Nesse sentido, pode-se dizer que o pensamento bakhtiniano fundamenta-se no esforço

em pensar a condição humana em sua profunda interação com a vida social, entendendo o

homem como um ser de linguagem e, portanto, marcado por sua dimensão ativa, criativa e

crítica.

Vê-se, então, que, para Bakhtin (2011), as diversas esferas da atividade humana estão

ligadas ao uso da linguagem, uma vez que esta é concebida sob um ponto de vista histórico e

social, o que inclui sua integridade e sua função mediadora no momento e no lugar das

manifestações humanas. Por esse motivo, a categoria básica da concepção de linguagem em

Bakhtin é a interação verbal, cujo princípio unificador é seu caráter dialógico.

Desse modo, o conceito de linguagem que emana dos trabalhos bakhtinianos

compromete-se com a sua natureza constitutivamente heterogênea, ou seja, com a

multiplicidade de vozes13

que ecoam em nosso mundo - as vozes contraditórias existentes na

comunicação humana, que necessitam da linguagem para alicerçar-se nas relações sociais.

Assim é que “A linguagem não é um meio neutro que se torne fácil e livremente a

propriedade intencional do falante, ela está povoada ou superpovoada de intenções de outrem.

Dominá-la, submetê-la às próprias intenções e acentos é um processo difícil e complexo.”

(BAKHTIN, 2002, p. 100).

O caráter dialógico da linguagem assume, com isso, uma intricada rede de relações

plenamente estabelecida no social e das quais os sujeitos participam de forma ativa,

transformadora e em permanente devir. Linguagem, pois, marcada por uma intensidade de

visões de mundo, tencionada de ações e adaptável à heterogeneidade da vida humana.

Por esse raciocínio, tomamos também para análise os escritos de Paulo Freire, uma

vez que esse filósofo também se baseia em pressupostos que tratam a linguagem no centro das

relações humanas, assim como defende Bakhtin.

Segundo o professor Ernani Fiori, no prefácio do livro Pedagogia do Oprimido,

PAULO FREIRE É UM PENSADOR comprometido com a vida: não pensa

ideias, pensa a existência. É também educador: existencia seu pensamento

numa pedagogia em que o esforço totalizador da práxis humana busca, na

interioridade desta, retotalizar-se como ‘prática da liberdade’. (FIORI, 2011,

p. 11, grifo do autor).

13 Para Bakhtin (2011), as vozes não se restringem à emissão vocal sonora. Elas são entendidas sob um caráter

metafórico, em que as relações dialógicas saturam-se de vozes que concordam ou discordam entre si.

54

Por essa definição, pensando a educação como prática de liberdade, Freire apresenta,

em suas obras, estudos que favorecem a liberdade no âmbito escolar, incentivando a prática

da fala e da escuta tanto na ação docente quanto na formação do educando.

De acordo com Geraldi (2005), é possível conceber a linguagem em Paulo Freire com

base em três sentidos:

1. Pode-se tratar da linguagem em seu sentido estrito de língua ou dos

recursos linguísticos que Paulo Freire usou, e muitas vezes, criou em suas

obras, e então a expressão poderia ser traduzida por outra: a linguagem de

Paulo Freire.

2. Pode-se tratar da linguagem enquanto estruturação discursiva do

pensamento de Paulo Freire, buscando na sua ‘ordem’ discursiva um

conjunto de elementos que poderiam ajudar a caracterizar o ethos do locutor,

o lugar que escolheu e de onde proferiu suas falas, e então a expressão

poderia ser traduzida por outras: o discurso de Paulo Freire.

3. Pode-se tratar da linguagem enquanto fenômeno ou categoria de

pensamento tal como concebida pelo autor em seu funcionamento próprio a

partir do qual outros fenômenos sociais e pedagógicos podem ser explicados

ou pela qual estes outros fenômenos necessariamente transitam. (GERALDI,

2005, p. 8).

Para este estudo, adotamos o conceito de linguagem presente na terceira definição

exposta por Geraldi, uma vez que trata da linguagem enquanto fenômeno de compreensão do

mundo, na relação entre o sujeito com os processos interlocutivos que isso implica.

A linguagem, na perspectiva de Freire (2008), incide no caminho pelo qual o sujeito

interage com o mundo e com os outros, em uma relação que visa à democracia e à liberdade.

Para ele, no caso, a construção do pensamento crítico sobre as contradições da realidade é

mediatizada pelo uso da linguagem, pois graças a ela os laços de coletividade são constituídos

em diálogos vivos, o que permite o pensar sobre as experiências vividas.

A respeito disso, é válido citar uma das narrativas feitas por Freire, ao presenciar

camponeses realizando análises de sua realidade local e nacional, através do Círculo de

Cultura14

.

14 O Círculo de Cultura, idealizado por Freire, era um ambiente alfabetizador formado por um grupo de pessoas

que se reuniam em círculo, a fim de refletirem sobre as situações de vida por elas vivenciadas. Com esse

momento reflexivo, buscavam elaborar estratégias que interviessem nessa realidade. Para saber mais, ler

Pedagogia do Oprimido, sob autoria de Paulo Freire.

55

Era como se, de repente, rompendo a ‘cultura do silêncio’, descobrissem que

não apenas podiam falar, mas também, que seu discurso crítico sobre o

mundo, seu mundo, era uma forma de refazê-lo. Era como se começassem a

perceber que o desenvolvimento de sua linguagem, dando-se em torno da

análise de sua realidade, terminasse por mostrar-se que o mundo mais bonito

a que aspiravam estava sendo anunciado, de certa forma antecipado, na sua

imaginação. E não vai nisto nenhum idealismo. A imaginação, a conjectura

em torno do mundo diferente do da opressão tão necessários aos sujeitos

históricos e transformadores da realidade para sua práxis, quando

necessariamente faz parte do trabalho humano que o operário tenha antes na

cabeça, o desenho, a ‘conjectura’ do que vai fazer. Aí está uma das tarefas da

educação democrática e popular, da Pedagogia da esperança - a de

possibilitar nas classes populares o desenvolvimento da linguagem, jamais

pelo blábláblá autoritário e sectário dos ‘educadores’, de sua linguagem, que,

emergindo da e voltando-se sobre sua realidade, perfile as conjecturas, os

desenhos, as antecipações do mundo novo. Está aqui uma das questões

centrais da educação popular - a da linguagem como caminho de invenção

da cidadania. (FREIRE, 2008, p. 40-41).

Pelo exposto, a linguagem como caminho de invenção da cidadania demonstra o

interesse do teórico acerca de uma educação15

respaldada em relações dialógicas de caráter

democrático e antiautoritário, que levam o sujeito a compreender e a atuar socialmente, a

analisar e a interpretar sua realidade, a agir e a se comunicar nas diferentes atividades

humanas. Isso revela um posicionamento contrário à linguagem autoritária, que sufoca a

variedade e a riqueza que há nas diferentes vozes da comunicação discursiva.

Sob esse enfoque, pode-se afirmar que a linguagem na perspectiva bakhtiniana e

freireana está marcadamente integrada ao diálogo com a vida humana. Dessa forma,

encontram-se sujeitos como atores sociais da história, inseridos no/com o mundo a partir de

uma visão dialógica da linguagem, o que vem a favorecer uma prática também dialógica de

ensino-aprendizagem no âmbito escolar.

Em consonância com esse percurso temático, é possível observar que, para Freire

(2012), o diálogo é indispensável entre os participantes do processo educativo, como também

no ensino em todos os seus passos. Essa afirmação é justificada pelo autor, ao dizer que os

sujeitos, por estarem vinculados existencial e historicamente na sociedade e no mundo,

podem, através do diálogo, contribuir com a complexa construção das relações sociais e de

sua própria existência.

15

Em suas obras, Paulo Freire não restringe a educação ao ambiente formal da escola, mas a todos os ambientes

que suscitam relações de aprendizado, como empresas, famílias, etc. Porém, para nosso estudo, remetemos a

educação para com as práticas pedagógicas que acontecem estritamente no âmbito escolar.

56

Por essa acepção, compreende-se que o estímulo ao diálogo na educação, sobretudo,

na relação entre professor e aluno, favorece a busca na coletividade diante da discussão sobre

um objeto cognoscível. Em razão disso, têm-se sujeitos dialógicos que, em diferentes vozes,

tratam a respeito de uma problemática, aprendendo e crescendo na diferença presente em sala

de aula. Nesse caso, a descrição da seguinte passagem confirma isso.

O diálogo, por isso mesmo, não nivela, não reduz um ao outro. Nem é a

favor que um faz ao outro. Nem é tática manhosa, envolvente, que um usa

para confundir o outro. Implica, ao contrário, um respeito fundamental dos

sujeitos nele engajados, que o autoritarismo rompe ou não permite que se

constitua. Assim também a licenciosidade, de forma diferente, mas

igualmente prejudicial. Não há diálogo no espontaneísmo como no todo-

poderosismo do professor e da professora. A relação dialógica, porém, não

anula, como às vezes se pensa, a possibilidade do ato de ensinar. Pelo

contrário, ela funda este ato, que se completa e se sela no outro, o de

aprender, e ambos se tornam verdadeiramente possíveis quando o

pensamento crítico, inquieto, do educador ou da educadora não freia a

capacidade de criticamente também pensar ou começar a pensar do

educando. Pelo contrário, quando o pensamento crítico do educador ou da

educadora se entrega à curiosidade do educando. Se o pensamento do

educador ou da educadora anula, esmaga, dificulta o desenvolvimento do

pensamento do educando, então o pensar do educador, autoritário, tende a

gerar nos educandos sobre quem incide, um pensar tímido, inautêntico ou, às

vezes, puramente rebelde. O diálogo, na verdade, não pode ser

responsabilizado pelo uso distorcido que dele se faça. Por sua imitação ou

por sua caricatura. O diálogo não pode converter-se num ‘bate-papo’

desobrigado que marche ao gosto do acaso entre professor ou professora e

educandos. O diálogo pedagógico implica tanto o conteúdo ou objeto

cognoscível em torno do que gira quanto a exposição sobre ele feita pelo

educador ou educadora para os educandos. (FREIRE, 2008, p. 118, grifo do

autor).

De acordo com essa colocação, acreditamos que a prática educativa baseada nas

relações dialógicas permite que o educador dê ao educando o direito de falar, de ter voz, de

construir o seu discurso crítico. Dessa forma, o educador não restringe o diálogo em sala de

aula apenas aos conteúdos a serem ensinados, nem somente à troca de conhecimentos a serem

apreendidos, mas sim, a desafiar o educando a produzir sua compreensão e reflexão crítica,

em face de sua autonomia e identidade.

Por esse sentido, compreendemos o conceito de diálogo como princípio teórico-

metodológico essencial para as orientações didáticas da produção escrita. Sua definição,

segundo Freire, a partir do respeito fundamental, (da iniciação) ao pensamento crítico, da

57

curiosidade, apoiada no conteúdo ou objeto cognoscível e na exposição sobre ele, constituem-

se elementos-chave para a escrita no contexto escolar a partir: da consideração do

conhecimento de mundo partilhado pelo educando; da construção da autonomia discente

sobre os elementos linguístico-discursivos; da significação da atividade para o aluno; e da

pertinência do conteúdo textual e das orientações pedagógicas.

Nesse direcionamento ao direito do falar, Freire (2011a) enfatiza, consequentemente, a

importância da escuta - ouvir o educando e ser ouvido por ele. Com isso, ambos podem

melhor preparar-se em seus posicionamentos, sem negar, porém, o exercício ao direito de

discordar, de se opor, etc.

Visando a esse propósito, entende-se que a escuta é também um processo fundamental

na prática educativa, uma vez que ela permite (re) conhecer o sujeito em sua individualidade.

Portanto, se o que foi dito merece ser ouvido, percebe-se que, entre quem fala e quem escuta,

há uma doação que visa à vivência do diálogo, mesmo sabendo que ela é marcada por

convergências ou divergências, adesões ou recusas, complementos ou embates diante daquilo

que é partilhado.

Por isso, ressaltamos que não afligir o aluno em seu processo de ensino-aprendizagem

denota exalar a alegria que dele brota, mergulhando em seu mundo e ouvindo a sua voz. Voz

que, segundo Bakhtin (2011), necessita ser compartilhada no concreto das interlocuções, não

enquanto fala individual, mas enquanto instância significativa das interações entre os sujeitos.

Mais uma vez, os desdobramentos do pensamento freireano e bakhtiniano ganham, na

dimensão escolar de ensino da escrita, uma relevância fundamental, visto que sinalizam a

possibilidade de dar voz ao aluno, legitimidade do contraditório, (contra)argumentação e

oposição.

Nesse processo de reconstrução epistemológica, verifica-se que, em Bakhtin, as

relações dialógicas possuem algumas características específicas, como: não prescindem de

relações meramente lógicas nem linguísticas (sintático-composicionais); ocorrem no âmbito

dos enunciados de diferentes sujeitos; e realizam-se pela dialogização da palavra.

Em outros termos, as relações dialógicas não são possíveis em uma abordagem de

cunho especificamente linguístico, baseada nos elementos constituintes do sistema da língua.

Precisam, pois, da linguagem em uso, como ato concreto de comunicação entre sujeitos que

entrecruzam, complementam, discordam, refletem e refratam os elementos históricos, sociais

e linguísticos de um enunciado. Nesse sentido, entende-se que:

58

Cada enunciado é pleno de ecos e ressonâncias de outros enunciados com os

quais está ligado pela identidade da esfera de comunicação discursiva. Cada

enunciado deve ser visto antes de tudo como uma resposta aos enunciados

precedentes de um determinado campo16

[...]: ela os rejeita, confirma,

completa, baseia-se neles, subentende-os como conhecidos, de certo modo

os leva em conta. [...] Por isso, cada enunciado é pleno de variadas atitudes

responsivas a outros enunciados de dada esfera da comunicação discursiva.

(BAKHTIN, 2011, p. 297, grifo do autor).

O pensamento apresentado remete-nos à afirmação de Bakhtin (2011) quando diz que,

o diálogo não acontece estritamente na interação verbal de pessoas colocadas face a face, mas

em toda comunicação discursiva constituída numa relação, numa alternância entre

enunciados. Temos o livro como exemplo dado por ele, pois como ato da fala impresso,

assume uma influência educativa sobre os leitores, em suas convicções e respostas críticas.

Nessa mesma direção, as próprias produções escritas estão voltadas a outros enunciados, em

uma atitude responsiva ao que é contestado, elucidado e avaliado sobre o objeto de um

discurso.

Tais considerações podem, portanto, ajudar-nos a compreender a escrita no contexto

escolar, desde as coleções didáticas trabalhadas no ensino da produção escrita, a produção

textual solicitada ao aluno e o conjunto de gêneros usados nas atividades que condizem com a

orientação da escrita (receitas, contos, notícias, anúncios, etc.).

Logo, considerando não apenas a interação face a face, compreende-se a importância

das relações dialógicas enquanto relações de sentido, apreendidas pelo posicionamento de

sujeitos que respondem e realizam réplicas ao dito, carregando, pois, visões de mundo que

não são restritas apenas a análise de conversação.

Para exemplificar melhor a concepção de Bakhtin sobre o funcionamento da palavra

em um contexto dialógico, é válido destacar a citação a seguir.

16 Segundo Grillo (2010), Bakhtin substitui, em muitos momentos de suas obras, o termo esfera por campo. Por

isso, no decorrer desta dissertação, adotaremos tais termos como conceitos similares ao estudo dos gêneros do

discurso. Para mais informações, consultar GRILLO, Sheila V. de Camargo. Esfera e campo. In: BRAIT, Beth

(Org.). Bakhtin: outros conceitos-chave. 1. ed. São Paulo: Contexto, 2010.

59

As palavras são tecidas a partir de uma multidão de fios ideológicos e

servem de trama a todas as relações sociais em todos os domínios. É

portanto claro que a palavra será sempre o indicador mais sensível de todas

as transformações sociais, mesmo daquelas que apenas despontam, que ainda

não tomaram forma, que ainda não abriram caminho para sistemas

ideológicos estruturados e bem-formados. A palavra constitui o meio no qual

se produzem lentas acumulações quantitativas de mudanças que ainda não

tiveram tempo de adquirir uma nova qualidade ideológica, que ainda não

tiveram tempo de engendrar uma forma ideológica nova e acabada. A

palavra é capaz de registrar as fases transitórias mais íntimas, mais efêmeras

das mudanças sociais. (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV17

, 2012, p. 42).

Por essa perspectiva dialógica, a palavra relaciona-se à vida, isto é, a todos os sujeitos

que a utilizam ou a têm utilizado enquanto vozes sociais e históricas, sendo marcada pelos

muitos sentidos por ela absorvidos no contexto em que surge. Portanto, a palavra atua como

expressão de certo posicionamento valorativo dos sujeitos, como, por exemplo, alguém

dotado de autoridade, escritor, mestre, amigo, pai, mãe, cientista, etc.

Assim, como vimos anteriormente, sabe-se que a palavra, enquanto produto

ideológico, revela os valores sociais contraditórios ao longo da história social humana, pois,

como preconiza Bakhtin/Volochínov (2012, p. 98), “[...] não são as palavras o que

pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou

triviais, agradáveis ou desagradáveis, etc.”.

Ao chamar a atenção para isso, percebe-se que, para Bakhtin, os sentidos da palavra

não decorrem da própria palavra como unidade da língua, uma vez que eles são resultados da

realidade concreta de uma interação.

Para melhor esclarecer esse pensamento, Cereja (2012) utiliza a palavra companheiro

como exemplo, ao dizer que, nas últimas décadas, tal termo se modificou ou se atualizou

conforme a situação histórico-social vivenciada. Por isso, ainda conforme o autor, se

observarmos a situação concreta de um enunciado, identificaremos se a palavra companheiro

é designativa daquele com quem se tem vida conjugal ou se corresponde a alguém que

acompanha o outro em uma atividade (viagem, esporte, etc.) ou se está ligada a uma natureza

político-ideológica (defesa por uma causa comum), por exemplo. 17

A autoria de alguns escritos ainda gera controvérsias sobre quem de fato os escreveu (Bakhtin, Medvedev ou

Volochínov). Por isso, no caso da obra Marxismo e filosofia da linguagem, alguns tradutores assumem o

compromisso de reconhecer o texto como de dupla assinatura - Bakhtin/Volochínov. Para obter mais

informações, consultar o livro Linguagem & Diálogo: as ideias linguísticas do Círculo de Bakhtin, de Carlos

Alberto Faraco.

60

Tomando a palavra no sentido bakhtiniano, o trabalho com a produção de sentidos em

uma situação enunciativa18

específica, como, por exemplo, a produção de texto solicitada nas

coleções didáticas, deve considerar seus interlocutores, seus objetivos e seu contexto

histórico-social, não se limitando apenas ao vocabulário já dicionarizado ao longo dos

tempos.

Diante do exposto, fica claro que, para Bakhtin, se há uma concepção de linguagem

mais ampla de sujeitos que se constituem no diálogo, é necessário fazer uma leitura mais

cuidadosa dos estudos filosófico-linguísticos que são por ele denominados de subjetivismo

idealista e objetivismo abstrato.

Segundo Bakhtin/Volochínov (2012), o subjetivismo idealista, fundamentado,

sobretudo, pelo pensamento de Wilhelm Humboldt, preconiza que o ato da fala, de criação

individual, materializa a língua, sendo essa um processo criativo ininterrupto de construção.

Portanto, as leis da criação linguística são, na verdade, as leis da psicologia individual, ou

seja, do enunciado monológico como expressão das particularidades do sujeito.

Pela análise bakhtiniana, o subjetivismo idealista apoia-se na crença de que toda e

qualquer expressão que se forma na consciência do indivíduo (desejos, intenções, gostos, etc.)

exterioriza-se objetivamente com a ajuda de algum sistema de código. Por isso, até mesmo os

conteúdos ideológicos estariam igualmente ligados ao psiquismo individual, já que o exterior,

segundo esse autor, constitui-se apenas como um material passivo do que está no interior.

A crítica realizada por Bakhtin a essa corrente concentra-se no fato de que, se a língua

é concebida como um ato puramente individual, a natureza social do enunciado é

desconsiderada e, portanto, a criação ideológica de um grupo social e da época em que os

interlocutores estão inseridos também não são levados em conta.

No que se refere ao objetivismo abstrato, representado principalmente pela obra de

Ferdinand Saussure, na chamada escola de Genebra, Bakhtin/Volochínov (2012) diz que a

mesma trata a língua como um sistema de formas normativas e imutáveis. Desse modo,

apenas os traços fonéticos, gramaticais e lexicais garantiriam a compreensão da língua por

todos os locutores envolvidos na realização enunciativa.

18

Sobre esse assunto, a seção seguinte - Os gêneros do discurso sob a perspectiva bakhtiniana - abordará mais

enfaticamente a importância de considerar, para a produção de sentidos, os interlocutores, as finalidades e o

contexto de um enunciado.

61

Complementando mais adiante, Bakhtin vai afirmar que essas formas linguísticas não

se relacionam com os valores ideológicos (cognitivos, artísticos, etc.), nem dependem de toda

ação individual. Sobre isso, diz o autor: “Não há lugar, aqui, para quaisquer distinções

ideológicas, de caráter apreciativo: é pior, é melhor, belo ou repugnante, etc. Na verdade só

existe um critério lingüístico: está certo ou errado [...].” (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012,

p. 81).

Levando em conta o exposto, entende-se que, se o objetivismo abstrato separa a língua

de seu conteúdo ideológico, tal concepção não considera as necessidades concretas da

comunicação discursiva. Por isso, é possível inferir que a comunicação é tratada de maneira

simplificada, bastando apenas ao falante a forma linguística como sinal estável e submetido às

leis da língua, desprezando, pois, o que Bakhtin tanto defende: compreender e ser

compreendido em um contexto preciso em que ocorre a interação.

Por essa perspectiva, se, para Bakhtin, a palavra dimensiona-se plenamente no social,

converge-nos a refletir sobre a palavra fundamentada pela assertiva freireana, que a coloca

também no devir de uma situação real e concreta.

A existência, porque humana, não pode ser muda, silenciosa, nem tampouco

pode nutrir-se de falsas palavras, mas de palavras verdadeiras, com que os

homens transformam o mundo. Existir humanamente, é pronunciar o

mundo, é modificá-lo. O mundo pronunciado, por sua vez, se volta

problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar.

(FREIRE, 2011b, p. 108, grifo do autor).

Com a citação apresentada, compreende-se que o dizer da palavra implica conhecer a

realidade e dela participar criticamente, agindo e desvelando-a em sua capacidade

transformadora de mudar o mundo. No dizer de Freire (2012), é a palavra como linguagem

existencial que porta as notícias da vida real.

Assim, tal entendimento remete ao que Bakhtin/Volochínov (2012, p. 42) já

preconizava em seus estudos ao afirmar que “[...] a palavra penetra literalmente em todas as

relações entre indivíduos, nas relações de colaboração, nas de base ideológica, nos encontros

fortuitos da vida cotidiana, nas relações de caráter político, etc.”.

Com base nos aspectos apontados, é possível perceber que, similarmente a Bakhtin, a

abordagem freireana também trata a palavra como essencialmente dialógica, concebida e

praticada em um contexto histórico-social a partir das experiências vividas. No caso, para

62

ambos os teóricos, a palavra é capaz de elucidar as práticas sociais e os problemas existentes,

uma vez que carrega consigo a função de mediar as relações humanas.

Ao adotar a palavra em seu caráter dialógico e adentrada como fenômeno humano,

Freire destaca a importância de o educador conhecer e considerar as diferentes vivências e

experiências de cada educando.

[...] nossas relações com os educandos, exigindo nosso respeito a eles e a

elas, demandam igualmente o nosso conhecimento das condições concretas

de seu contexto, contexto que os condiciona. Procurar conhecer a realidade

em que vivem nossos alunos é um dever entre outros que a prática educativa

nos impõe. Sem conhecer a realidade de nossos alunos não temos acesso à

maneira como pensam, dificilmente podemos saber o que sabem e como

sabem. (FREIRE, 2012, p. 152).

Conhecer o modo de vida dos alunos faz-nos realmente refletir acerca da necessidade

de pensar neles em seu próprio mundo, o que exige do professor uma prática que vislumbre a

seguinte indagação: “Por que não estabelecer uma ‘intimidade’ entre os saberes curriculares

fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos?” (FREIRE,

2011a, p. 32). É possível, pois, sinalizar esse questionamento freireano para as situações de

produção escrita, gêneros selecionados, objetivos e conteúdos como resultantes da

preocupação com a filiação entre a proposta de ensino da escrita e os conhecimentos,

interesses e necessidades socioeducativas dos alunos.

Por esse raciocínio, os educandos têm a possibilidade de serem compreendidos e

respeitados em uma etapa singular de sua existência e, sobretudo, como sujeitos capazes de

aprender. Por isso, é importante que o educador conheça bem esses alunos que ingressam no

âmbito escolar, a fim de desenvolver atividades que levem em conta as características do seu

alunado.

Vê-se, por essa compreensão, que o processo educativo de caráter dialógico precisa

basear-se não em um discurso autoritário do professor, em que se abafam as experiências, os

desejos e as necessidades de cada aluno, mas em uma proposta pedagógica que enfatiza a

importância do outro, do seu contexto e dos seus valores. Ou seja, um processo de ensino-

aprendizagem que não considera apenas o ambiente escolar como “asséptico”, ou seja,

apartado do contexto social do aluno. Mas uma educação que expõe, mostra e/ ou deixa

63

escutar o dialogismo que constitui a sala de aula, a fim de que as diferentes vozes convivam e

coexistam na coletividade.

Assim, segundo Freire (2011b), o professor suscetível a abrir-se à realidade do aluno

com quem partilha sua atividade pedagógica precisa desenvolver conteúdos programáticos

que conduzam às condições de vida do educando. Nesse caso, ele sugere, por exemplo, que o

professor leve em conta o universo vocabular dos alunos para contatar com a sua real

linguagem, com os seus falares típicos.

Sobre isso, diz Fiori no prefácio do livro Pedagogia do Oprimido:

[...] Paulo Freire não ensina a repetir palavras, não se restringe a desenvolver

a capacidade de pensá-las segundo as exigências lógicas do discurso

abstrato; simplesmente coloca o alfabetizando em condições de poder re-

existenciar criticamente as palavras de seu mundo, para, na oportunidade

devida, saber e poder dizer a sua palavra. (FIORI, 2011, p. 17).

Por isso, as palavras são, para Freire, não apenas um instrumento de leitura e de escrita

da língua, mas também um instrumento de releitura sobre a experiência vivida. Palavras, pois,

que abrigam um teor pragmático do contexto social dos educandos enquanto sujeitos da

história.

Por essa acepção, o pensamento de Freire (2011b) é estruturado em sua crítica à

educação bancária, assim por ele nomeada. Essa educação, em sua antidialogicidade, prioriza

a memorização mecânica de conteúdos narrados pelo educador, em que o ensinar é pautado na

transmissão do chamado saber acumulado que faz uma geração a outra, e o aprender é, então,

a pura recepção do aluno a esse saber transferido.

Tal crítica feita por Freire faz-nos lembrar a crítica de Bakhtin a respeito do

objetivismo abstrato, por conceber a língua como um produto acabado e fora do fluxo da

comunicação discursiva, sendo transmitida de geração em geração.

Esses elementos, apontados por Bakhtin e Freire, ajudam-nos a compreender a

linguagem e sua relação com a educação, a partir da possibilidade de releitura da experiência

vivida pelo educando, do seu contexto social e da posição crítica e transformadora que pode

assumir frente ao saber. Essa conjuntura contribui para pensar o quadro da produção textual e,

especialmente, a seleção dos gêneros com base na necessidade de filiação entre as práticas de

64

linguagem e seus usos, entre os propósitos educacionais e o contexto social dos educandos,

entre o texto e a possibilidade de releitura da experiência vivida.

Logo, para a arquitetônica freireana, as fragilidades das relações educador/educando

na concepção bancária refletem no ensino e na aprendizagem, por desvincularem a palavra de

seu caráter reflexivo e ativo. A esse uso de palavra, Freire chama de palavreria, verbalismo,

oca, alienada e alienante, já que dela, não há o compromisso para com as significações do

mundo, pois “[...] se nós perdermos de vista a significação da palavra, perdemos a própria

palavra, que fica, assim, reduzida à sua realidade física, acompanhada do processo fisiológico

de sua produção. O que faz da palavra uma palavra é sua significação.”

(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p. 50).

No âmbito dessas observações, fica claro que os estudos de Bakhtin sobre a palavra e a

de Freire, em sua crítica à palavreria, permite-nos entender que o ensino-aprendizagem de

língua portuguesa não deve restringir-se à decodificação pura da palavra lida e escrita,

enquanto palavra doada pelo professor aos alunos. É preciso que a palavra, nas atividades

propostas em coleções didáticas, esteja carregada de sentidos entre a linguagem e a realidade,

ou seja, da experiência existencial dos educandos.

Por isso, acreditamos que na educação de caráter dialógico, não cabe ao professor

(incluindo, aqui, os autores das coleções didáticas) trabalhar a língua simplesmente como um

código autônomo e estruturado conforme um sistema abstrato de normas, desvinculando a

palavra do contexto que a ela se liga. Isso pressupõe dizer que se faz necessário estimular o

aluno a empreender não apenas as capacidades linguísticas, como também os caminhos de

diálogo materializados pela palavra em seu contexto, o que sugere uma proposta enraizada no

uso da linguagem como um fenômeno que vive e evolui na comunicação discursiva.

Em razão disso, é preciso enfatizar que a educação constituída como uma atividade

dialógica (chamada por Freire de educação problematizadora) incursiona a compreensão do

educador para com seu posicionamento sobre o ato de ensinar.

[...] ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para

a sua própria produção ou a sua construção. Quando entro em uma sala de

aula devo estar sendo um ser aberto a indagações, à curiosidade, às

perguntas dos alunos, a suas inibições; um ser crítico e inquiridor, inquieto

em face da tarefa que tenho - a de ensinar e não a de transferir

conhecimento. (FREIRE, 2011a, p. 47, grifo do autor).

65

Desse modo, o ensino reside na prática de um professor que busca problematizar e

mediatizar os conteúdos com os alunos, a fim de que eles se tornem investigadores críticos

dos objetos cognoscíveis para melhor refletirem e agirem sobre uma dada realidade.

O correlato da educação dialógica, uma vez problematizadora, implica a presença de

educandos que, em diálogo com o educador, tornem-se ambos, sujeitos participantes da

construção e da reconstrução do saber ensinado. Para tanto, há uma postura conscientemente

crítica por parte dos envolvidos, os quais aprofundam suas interpretações sobre os problemas.

Chamamos a atenção, no tocante a Freire (2011b), que essa educação como ato de

conhecimento, de compromisso, de engajamento e de integração no mundo pela busca por

transformação, conjuga-se diretamente ao desenvolvimento da consciência.

A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a

libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres

vazios a quem o mundo ‘encha’ de conteúdos; não pode basear-se numa

consciência especializada, mecanicistamente compartimentada, mas nos

homens como ‘corpos conscientes’ e na consciência como consciência

intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos, mas a da

problematizadora dos homens em suas relações com o mundo. (FREIRE,

2011b, p. 94, grifo do autor).

Verifica-se que a perspectiva freireana, ao propugnar seu pensamento sobre a

intencionalidade da consciência, mostra que ela sempre provoca uma aproximação reflexiva

sobre um objeto cognoscível, de forma que não é a realidade concreta que penetra na

consciência, mas é justamente a consciência, em caráter reflexivo, que tende à realidade. Por

isso, conforme Freire (2011b), educar é sinônimo de conscientizar, e conscientizar é

transformar, o que necessita de sujeitos unidos para intervir sobre a realidade que os circunda.

É possível entender, então, que corpos conscientes não se encontram no vazio de si

mesmos, uma vez que a consciência de mundo emerge das experiências vividas, em um

diálogo que mediatiza o processo conscientizador das relações humanas com o mundo.

Como lembra muito bem Freire (2011b, p. 184-185), “O diálogo, como encontro dos

homens para a ‘pronúncia’ do mundo, é uma condição fundamental para a sua real

humanização”. Em outros termos, é o diálogo que se impõe como caminho de consciência

para o mundo, de forma a promover o encontro de sujeitos que buscam, em comunicação e

em colaboração, o compromisso de problematizar e de responder aos desafios a eles

colocados.

66

O diálogo, como condição para o processo conscientizador, corresponde ao estudo

bakhtiniano que tece considerações sobre o encontro de consciências.

Eu tomo consciência de mim e me torno eu mesmo unicamente me

revelando para o outro, através do outro e com o auxílio do outro. Os atos

mais importantes, que constituem a autoconsciência, são determinados pela

relação com outra consciência [...]. Todo o interior não se basta a si mesmo,

está voltado para fora, dialogado, cada vivência interior está na fronteira,

encontra-se com outra, e nesse encontro tenso está toda a sua essência. [...].

Ser significa conviver. (BAKHTIN, 2011, p. 341, grifo nosso).

Nesse sentido, entende-se que o outro é imprescindível para a formação basilar do eu,

já que o ser humano define-se na alteridade, nas relações que o ligam ao outro. Então, se Ser

significa conviver, a formação da consciência humana é delimitada e construída em diálogo

com outras consciências.

Entende-se, assim, que a consciência é engendrada como produto social que se

constitui através das relações dialógicas, conforme a mediação da linguagem. Para um melhor

esclarecimento, vale destacar os escritos de Jobim e Souza ao preconizar que:

É na linguagem, e por meio dela, que construímos a leitura da vida e da

nossa própria história. Com a linguagem somos capazes de imprimir sentidos

que, por serem provisórios, refletem a essencial transitoriedade da própria

vida e de nossa existência histórica. Ao mesmo tempo, a linguagem também

registra aquilo que permanece no mundo como fator humano, relacionando-

se do mesmo modo e com a mesma intensidade, quer seja com o efêmero ou

com o permanente, transitando entre os extremos da realidade humana e

permitindo um contato mais profundo com a verdade do homem. (JOBIM &

SOUZA, 2008, p. 21).

Novamente aqui, é possível entender que é a visão dialógica da linguagem na vida

cotidiana, com seus elementos históricos, sociais e linguísticos, que possibilita a formação da

consciência humana no diálogo entre a particularidade da experiência individual com a

experiência do outro. Portanto, pode-se dizer que a construção da consciência é mesclar-se às

experiências alheias e com elas manifestar-se.

Para tanto, Bakhtin (2011) ressalta que a produção da consciência humana não reflete

um ato passivo por parte do sujeito, submetido ao ambiente histórico-social. Conceber o

sujeito é, para Bakhtin, um agente ativo em relação à realidade por ela influenciada, mas ao

67

mesmo tempo, por ele ressignificada, por constituir-se pelo outro, mas também por ser

constituinte do outro.

Por esse encontro de consciências tecido por Bakhtin, há também o seu entrelaçar para

com o pensamento de Freire (2012, p. 103, grifo do autor) ao dizer que “[...] é sempre o outro

enquanto tu que me constitui como eu na medida em que eu, como tu do outro, o constituo

como eu.”.

Com essas reflexões entretecidas, percebe-se que tanto Bakhtin quanto Freire

sinalizam a importância do diálogo na formação da consciência e, consequentemente, na

formação do sujeito como indivíduo em construção na/pela linguagem. Há, em ambos os

teóricos, uma preocupação em humanizar-se na coletividade, em uma relação vivida com a

experiência social e histórica.

Por isso, apesar de Bakhtin não deter-se explicitamente sobre as problemáticas da

educação, pode-se afirmar que a sua concepção de linguagem, enquanto ponte de interação

por onde transitam significações e pluralidade de vozes, permite-nos pensar na relação entre

professor, aluno e coleções didáticas diante dos conhecimentos a serem construídos e

partilhados em sala de aula.

A propósito disso, apresenta-se a seguir uma citação de Freitas que, baseada no

pensamento bakhtiniano, exprime a significância da educação defendida neste texto.

Educar não é homogeneizar, produzir em massa, mas produzir

singularidades. Deixar vir à tona a diversidade de modos de ser, de fazer,

de construir: permitir a réplica, a contrapalavra. Educar é levar o aluno a

ser autor, a dizer a própria palavra, a interagir com a língua, a penetrar

numa escrita viva e real. O professor precisa também ser autor: penetrar na

corrente da língua, recuperar sua palavra, sua autonomia, sem fazer dela uma

tribuna para o poder, mas um meio de exercer uma autoridade que se

conquista no conhecimento partilhado. (FREITAS, 2007, p. 147, grifo

nosso).

Entender a abordagem desse ensino-aprendizagem possibilita a interação dialogal em

sala de aula, considerando-a como um local propício à troca de informações, ao confronto de

opiniões e à produção de sentidos realizados pelo encontro de diferentes vozes - vozes essas

ecoadas não só pelo professor e autores das coleções didáticas, mas também pelos alunos. No

dizer de Freitas, é a educação vinculada a uma linguagem que permite a diversidade, a autoria

e, especialmente, a escrita viva e real.

68

Por isso, é possível preconizar que o direcionamento das orientações didáticas para

com a construção do conhecimento pode ser coerente com as singularidades do aluno, desde

que se baseie em atividades expressivas a ele, a fim de que construa significados para o que

faz, para o que vê e para aquilo que experimenta. E é nesse sentido que os elementos

constitutivos da prática de ensino e de aprendizagem do texto escrito - gêneros do discurso e

situações de produção - devem, portanto, apoiar-se.

Nessa direção, aponta Freire que:

[...] o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é

educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa.

Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em

que os ‘argumentos de autoridade’ já não valem. (FREIRE, 2011b, p. 95-96).

Por esse viés, a arquitetônica freireana fundamenta-se na concepção de que, se o aluno

torna-se também produtor do conhecimento que lhe foi ensinado, é possível ao professor

aprender enquanto ensina. No pensar de Freire (2011b), isso ocorre, porque o educador

procura não apenas repensar o conhecimento antes aprendido, mas também de envolver-se

com a curiosidade do educando, que expressa perguntas, experiências e sugestões que não

foram antes percebidas pelo educador.

Levar em conta, então, o ressoar de vozes que se cruzam e se interagem para a

produção do conhecimento humano expressa a importância da valorização dos sujeitos

envolvidos no processo educativo, o que vem a conduzir a presença de educadores e de

educandos que ensinam e aprendem mutuamente.

Compreende-se que, na educação de caráter dialógico, o verdadeiro ensino-

aprendizagem preconiza a importância do que vem a ser o construir, o reconstruir e o mudar

diante da abertura crítica ao objeto cognoscível. Se há, assim, uma prática que afirma a

mutualidade das experiências formadoras, tem-se professores e alunos imersos na curiosidade

que os move e que os inquieta na busca pela construção e reconstrução do conhecimento.

Dessa forma, observa-se que debater sobre a educação com base em uma concepção

de linguagem favorece a reflexão sobre os suportes teóricos que, conceitualmente, podem

suscitar as diretrizes metodológicas de ensino. Portanto, as contribuições dessa discussão

conceitual para a esfera escolar conduzem a apontar: a necessidade de valorizar o contexto de

vida do aluno; a compreensão da sala de aula como lugar onde diferentes vozes intercruzam-

69

se num dinamismo dialógico; a vinculação do ensino-aprendizagem da linguagem às

diferentes práticas sociais e às características da época em que se vive; e a concepção do

educador e dos educandos como participantes da construção do conhecimento do qual são

também sujeitos.

Em razão disso, o encontro aqui promovido entre a linguagem bakhtiniana e a

educação freireana possibilita o pensar em uma prática pedagógica enquanto ação

compartilhada que humaniza o próprio processo educativo. Ou seja, o humanizar de vozes que

se fazem ouvir em sala de aula é respeitado enquanto construção de vozes sociais e históricas

que dialogam para serem ouvidas, respondidas e reapreciadas.

Assim, a tessitura desta reflexão celebra os escritos desses filósofos com as citações

que descortinam a riqueza que há na comunicação humana.

A vida é dialógica por natureza. Viver significa participar do diálogo:

interrogar, ouvir, responder, concordar, etc. Nesse diálogo o homem

participa inteiro e com toda a vida: com os olhos, os lábios, as mãos, a alma,

o espírito, todo o corpo, os atos. Aplica-se totalmente na palavra, e essa

palavra entra no tecido dialógico da vida humana, no simpósio universal.

(BAKHTIN, 2011, p. 348).

O fato de me perceber no mundo, com o mundo e com os outros me põe

numa posição em face do mundo que não é de quem nada tem a ver com ele.

Afinal, minha presença no mundo não é a de quem a ele se adapta, mas a de

quem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser apenas objeto,

mas sujeito também da história. (FREIRE, 2011a, p. 53, grifo do autor).

Portanto, se o viver significa ocupar uma posição axiológica em cada momento da

vida; se a vida desabrocha no concreto das relações sociais; se a relação do eu com o mundo

não é solitária de um vazio axiológico; e se a palavra emana-se em sua natureza dialógica; é

admissível que a educação soerga os dizeres ao silêncio dos silenciados; existencie a

consciência responsiva à consciência enformada; propague as vozes às palavras reificadas;

suscite dúvidas a verdades absolutas; estimule o colaborar ao isolar da produção; desenvolva a

criticidade à passividade do pensar; e releia o mundo à realidade enevoada.

70

3.2 Os gêneros do discurso sob a perspectiva bakhtiniana

Todos os diversos campos da atividade humana estão ligados ao uso da

linguagem. Compreende-se perfeitamente que o caráter e as formas desse

uso sejam tão multiformes quanto os campos da atividade humana, o que, é

claro, não contradiz a unidade nacional de uma língua. O emprego da língua

efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos) concretos e únicos,

proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo da atividade humana.

[...] Evidentemente, cada enunciado particular é individual, mas cada campo

de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de

enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso. (BAKHTIN, 2011,

p. 261-262, grifo do autor).

Na perspectiva bakhtiniana, conceitualizar os gêneros do discurso implica situá-los na

abordagem dialógica da linguagem, por ser esta marcada pela intersecção das diversas vozes

sociais que participam do desenvolvimento contínuo das atividades humanas, assim como já

vimos neste trabalho.

Nesse sentido, se os usos da linguagem correspondem aos enunciados que,

historicamente, tipificam-se em formas relativamente estáveis, denominadas gêneros do

discurso, compreende-se que há uma relação inseparável entre enunciados, gêneros e práticas

da atividade humana.

Por isso, a reflexão acerca dessa relação faz-se pertinente e responde, em parte, aos

propósitos desta pesquisa. Ou seja, para analisar a seleção dos gêneros do discurso e sua

diversidade nas coleções didáticas, materiais privilegiados no ensino escolar, faz-se

necessário o aprofundamento teórico acerca do pensamento bakhtiniano sobre os gêneros e

seus contextos de uso.

Desse modo, retomaremos, aqui, conceitos-chave da teoria bakhtiniana - enunciado,

gênero do discurso e texto como enunciado - a fim de produzirmos um quadro teórico que

parametrize as etapas de construção dos dados e de análise, como também do aprofundamento

entre os gêneros do discurso e o ensino da língua portuguesa.

71

3.2.1 Enunciado: um elo na cadeia da comunicação discursiva

Segundo Bakhtin (2011), cada enunciado constitui-se um elo na cadeia complexa e

contínua da comunicação discursiva, estando ligado entre si por relações dialógicas. No caso,

a formação de todo enunciado emerge, com maior ou menor nitidez, em resposta a outros

enunciados precedentes, baseando-se neles, polemizando com eles e correlacionando-se uns

com os outros pelas mais variadas atitudes responsivas.

Essas reações têm diferentes formas: os enunciados dos outros podem ser

introduzidos diretamente no contexto do enunciado; podem ser introduzidos

somente palavras isoladas ou orações que, neste caso, figurem como

representantes de enunciados plenos, e além disso enunciados plenos e

palavras isoladas podem conservar a sua expressão alheia mas não podem

ser reacentuados (em termos de ironia, de indignação, reverência, etc.); os

enunciados dos outros podem ser recontados com um variado grau de

reassimilação; podemos simplesmente nos basear neles como em um

interlocutor bem conhecido, podemos pressupô-los em silêncio, a atitude

responsiva pode refletir-se somente na expressão do próprio discurso - na

seleção de recursos linguísticos e entonações, determinada não pelo objeto

do próprio discurso mas pelo enunciado do outro sobre o mesmo objeto.

(BAKHTIN, 2011, p. 297).

Essas considerações a respeito das atitudes responsivas apontam para uma importante

dimensão bakhtiniana sobre o enunciado - de que ele é único e historicamente irrepetível

(ainda que possamos citá-lo), uma vez que a postura ativa dos interlocutores nasce de um

campo específico do objeto e do seu sentido. Por isso, ao atentarmos para o pensamento de

Bakhtin, entende-se que o processo de assimilação ao enunciado alheio acontece em

diferentes graus de alteridade, o que contribui para a existência e a evolução das ressonâncias

dialógicas presentes nos enunciados.

Nesse intercâmbio da comunicação discursiva, é válido ressaltar que o dizer

tencionado na interação verbal não é somente uma reação-resposta a outros enunciados, já que

remete também às palavras que vêm de uma réplica ainda não dita, porém, já esperada e

presumida no itinerário das relações dialógicas.

Dessa forma, Bakhtin/Volochínov (2012) chama a atenção para o fato de que o

enunciado integra-se à situação social (também chamada de situação extraverbal) que o

72

suscitou, o que destaca sua importância como parte constitutiva à compreensão semântica e

axiológica da realização enunciativa.

Assim é que, para Bakhtin (2011, 2012), a dimensão social afigura-se ao espaço

(onde) e ao tempo (quando) histórico em que ocorre o enunciado; ao conhecimento produzido

pelos interlocutores no processo da interação verbal; e ao valor apreciativo desses

participantes no que se refere ao objeto do enunciado, aos interlocutores envolvidos e aos

próprios enunciados precedentes e presumidos.

Esse conjunto da dimensão social compõe-se, portanto, como elemento importante

para compreender a linguagem como objeto de ensino no âmbito escolar, uma vez que

pensado a partir desse viés social, vincula a atividade pedagógica às práticas de uso da

linguagem (espaço e tempo), à interação e às possibilidades valorativas do sujeito. Esses são

aspectos importantes para se pensar no ensino da produção textual atualmente, visto que o

relacionam às práticas mimeticamente autênticas, preparando melhor o aluno para as

diferentes demandas de escrita.

Sob esse enfoque, é possível perceber que qualquer constituição do enunciado situa-se

na inter-relação socialmente dirigida à plenitude de sentidos entretecida nas interações

dialógicas. Lembremos, a propósito disso, que:

Essa posição não subestima a dimensão verbal (ou outro material semiótico)

do enunciado, uma vez que sem uma expressão material semiótica já não se

está também mais diante de um enunciado, mas de um fenômeno natural,

não sígnico. A problemática levantada é que a noção de enunciado como um

todo de sentido não se limita apenas a sua dimensão lingüística.

(RODRIGUES, 2005, p. 160).

Reportando essa análise à teoria bakhtiniana, verifica-se que todo enunciado necessita

da interdependência entre o aspecto verbal e o extraverbal da linguagem humana, a fim de

gerar as condições da real cadeia da comunicação discursiva. Em outros termos, o enunciado

sob uma perspectiva dialógica não pode restringir-se apenas à função meramente linguística,

pois isso recairia ao enfoque da língua como um sistema de formas normativas, precisando,

então, da dimensão social para ser compreendido no contexto da vida do qual ele é parte

integrante.

É nesse sentido que a perspectiva bakhtiniana pode contribuir para se pensar no ensino

da língua escrita. Sem restringir-se a seus aspectos linguísticos, mas articulado à sua dimensão

73

social, tal princípio pode ser tomado como um dos elementos orientadores para o ensino de

língua e, particularmente, para a produção de texto. Nessa abordagem, ganha-se a

possibilidade de se conceber os gêneros do discurso como objetos de ensino-aprendizagem,

constituindo-se na síntese entre linguagem e dimensão social, viabilizando uma proposta

pedagógica mediada na interface com o contexto histórico-social, funcional e linguístico-

discursivo de uma dada situação escrita.

Desse modo, a preocupação de Bakhtin (2011) em elucidar o enunciado como unidade

da comunicação discursiva, em distinção à oração como unidade da língua, é relevante

enquanto mudança de paradigma teórico no campo dos estudos da linguagem, colocando-se

também como elemento catalisador de mudanças nos parâmetros de ensino da língua escrita.

A oração enquanto unidade da língua [...] não é delimitada de ambos os

lados pela alternância dos sujeitos do discurso, não tem contato imediato

com a realidade (com a situação extraverbal) nem relação imediata com

enunciados alheios, não dispõe de plenitude semântica nem capacidade de

determinar imediatamente a posição responsiva do outro falante, isto é, de

suscitar resposta. A oração enquanto unidade da língua tem natureza

gramatical, fronteiras gramaticais, lei gramatical e unidade. (BAKHTIN,

2011, p. 278, grifo do autor).

Como visto, a oração, por possuir natureza e limites gramaticais, não se correlaciona

de imediato com a situação extraverbal, é desprovida da capacidade de ativar a posição

responsiva do falante, nem se direciona a um destinatário. Nesse caso, por estruturar-se como

unidade da língua, a oração é reiterável em forma absolutamente idêntica, uma vez que

independe dos fatores relacionados às condições de produção do enunciado e,

consequentemente, às relações dialógicas.

Seguindo a concepção bakhtiniana, se considerarmos a oração enquanto forma da

língua, analisando-a isoladamente do meio extraverbal, compreenderemos apenas o seu

significado linguístico denotado pelo direcionamento formal dos recursos lexicais,

morfológicos e sintáticos. Por outro lado, se a inserirmos na cadeia da comunicação discursiva

da qual o enunciado é um elo inseparável, a oração passa a ser concebida como a parte ou o

todo de um enunciado.

Logo, na distinção entre enunciado e oração, Bakhtin (2011) destaca as peculiaridades

intimamente vinculadas à realização enunciativa: a alternância dos sujeitos do discurso, a

conclusibilidade e a expressividade.

74

Pela análise bakhtiniana, a alternância dos sujeitos do discurso, também chamada de

alternância dos falantes, delimita as fronteiras de cada enunciado, uma vez que este:

[...] tem, por assim dizer, um princípio absoluto e um fim absoluto: antes do

seu início, os enunciados de outros; depois do seu término, os enunciados

responsivos de outros (ou ao menos uma compreensão ativamente

responsiva silenciosa do outro ou, por último, uma ação responsiva baseada

nessa compreensão). (BAKHTIN, 2011, p. 275).

Circunscrito por limites precisos devido à alternância dos falantes, compreende-se que,

a cada propósito discursivo do enunciado, o sujeito conclui o que pretendera dizer para ceder

lugar ao enunciado do outro ou à sua compreensão ativamente responsiva. Dessa maneira,

cabe ao ouvinte/leitor perceber19

o dixi conclusivo do locutor, para, então, suscitar uma

resposta ou uma posição responsiva que, segundo Bakhtin (2011), pode ser imediata,

retardada, etc.

Por isso, esse teórico acrescenta adiante que, se há diferentes condições e situações de

comunicação, há também alternância de sujeitos de natureza diferenciada e que assume

variadas formas nas diversas esferas da atividade humana.

Para fundamentar essa proposição, reiteramos que, de um lado, pode-se ter a

alternância dos sujeitos de modo mais evidenciado no diálogo real, uma vez que se trata da

forma mais simples e clássica da comunicação discursiva, por ser excepcionalmente

caracterizado pela alternância enunciativa dos interlocutores. Por outro, tem-se também tal

alternância, nos enunciados pertencentes às esferas da comunicação complexamente

organizadas, como as concernentes aos gêneros científicos.

A partir do exposto, é possível perceber que a alternância dos falantes é uma das

características que distinguem o enunciado da oração. Isso ocorre devido aos limites da

oração não serem delimitados pela alternância de sujeitos do discurso, mas sim pelo próprio

contexto de pensamento do mesmo falante, que dá continuidade às suas ideias. Inclusive, é

válido enfatizar que, se houver alternância emoldurando uma oração, significa que esta foi

incorporada a um enunciado pleno.

Outra característica constitutiva do enunciado como unidade da comunicação

discursiva é a conclusibilidade que, conforme Bakhtin (2011), refere-se ao aspecto interno da

19

Essa percepção do ouvinte/leitor advém com a compreensão do sentido.

75

alternância dos sujeitos. Em outros termos, a conclusibilidade, também nomeada como

acabamento do enunciado, representa a delimitação daquilo que o falante disse ou escreveu,

de forma a mostrar a inteireza enunciativa, bem como a possibilidade de o interlocutor

assumir uma atitude responsiva em relação ao que ouve ou lê.

Esclarecendo de modo bakhtiniano, essa postura responsiva corresponde:

[...] a pergunta sucinta do cotidiano, por exemplo, ‘Que horas são?’ (a ela

pode-se responder), e o pedido cotidiano que pode ser cumprido ou

descumprido, o discurso científico com o qual podemos concordar ou não

concordar (inteiramente ou em parte), e o romance ficcional, que pode ser

avaliado no seu conjunto. Alguma conclusibilidade é necessária para que se

possa responder ao enunciado. (BAKHTIN, 2011, p. 280).

Como visto, o acabamento do enunciado pode condicionar uma atitude responsiva por

parte dos interlocutores, resultando tanto em convergência como em divergência, fusão ou

recusa, acordo ou desacordo, dentre outras posturas frente ao exposto. Em decorrência disso,

Bakhtin ressalta que uma oração pode ser compreensível e acabada, entretanto, por não ser

um enunciado, não suscita resposta.

Portanto, à luz da concepção bakhtiniana, a conclusibilidade é caracterizada por três

elementos que a demarcam na totalidade orgânica do enunciado: a exauribilidade do objeto e

do sentido; o projeto de discurso ou a vontade de discurso do falante; e as formas típicas

composicionais e de gêneros do acabamento.

A exauribilidade do objeto e do sentido, referente ao esgotamento do tema do

enunciado, flexibiliza-se de acordo com as diferentes esferas da comunicação discursiva. No

caso, essa exauribilidade pode ser facilmente identificada nas trocas verbais que acontecem,

por exemplo, na vida cotidiana (perguntas e respostas de caráter fático) e na vida militar

(comandos e ordens), por pertencerem aos gêneros do discurso mais padronizados e

estabilizados, cujo fator criativo está praticamente ausente. Em razão disso, entende-se que os

enunciados, na forma de gêneros tipicamente identificados pelos sujeitos da interação e com

padrões determinados pelo grupo social em que circulam, são quase extremamente exauríveis

na exposição de seus temas. Já os enunciados procedentes da esfera científica, sendo esta

caracterizada pelo trabalho criativo do locutor, apresenta apenas um mínimo de

conclusibilidade, necessário à adoção de uma posição responsiva do interlocutor. Isso

76

significa que, para Bakhtin (2011), o objeto é, em si, inesgotável, porém, ao tornar-se tema de

um enunciado, adquire uma relativa conclusibilidade.

O projeto de discurso ou a vontade de discurso do falante, por sua vez, diz respeito ao

propósito discursivo ou ao querer dizer do locutor, de maneira a delimitar o todo do

enunciado, o seu volume e as suas fronteiras. Tal intenção discursiva é, para Bakhtin,

manifestada tanto na réplica monovocal do cotidiano quanto nas extensas obras literárias ou

científicas. Percebe-se, então, que mediante a interpretação da vontade discursiva pelos

participantes diretos da interação verbal, é possível medir o caráter de conclusibilidade do

enunciado. Inclusive, a essa intenção discursiva, delimita-se também a própria escolha do

gênero no qual se construirá o enunciado, o que remete a outro importante aspecto da

conclusibilidade: as formas típicas composicionais e de gêneros do acabamento.

Com base nisso, Bakhtin parte do pressuposto de que a vontade discursiva do falante,

com toda a sua individualidade e subjetividade, realiza-se através da seleção de um gênero do

discurso, o que dependerá da especificidade de uma dada esfera da comunicação discursiva,

por considerações sobre o sentido do objeto (temática), da situação concreta da comunicação,

dos participantes envolvidos, etc.

Rodrigues, baseando-se na concepção bakhtiniana, preconiza que:

É a noção acerca da forma do enunciado total, quer dizer, do gênero do

discurso, que orienta o falante no processo discursivo (na seleção dos

recursos linguísticos, da forma composicional, na consideração do conteúdo

temático) e o leitor na interpretação da consideração do acabamento do

enunciado (cálculo do seu volume, da extensão, da atitude valorativa etc.).

(RODRIGUES, 2001, p. 39).

Dessa forma, observa-se que a conclusibilidade, ou seja, o acabamento do enunciado,

é constituído não apenas pela exauribilidade do tema e pela intenção do locutor, mas também

pelos gêneros do discurso, tendo em vista que a comunicação discursiva dá-se apenas por

essas formas relativamente estáveis de enunciados.

Assim, além dos aspectos que envolvem a conclusibilidade e a alternância dos sujeitos

do discurso, faz-se necessário tecer considerações sobre a expressividade, outro elemento que

compõe o enunciado.

De acordo com o pensamento de Bakhtin (2011), a expressividade é uma característica

que condiz com a peculiaridade de o enunciado possuir um elemento expressivo, isto é, de

77

poder expressar uma posição valorativa na relação do falante com o objeto do discurso, com

os outros participantes da comunicação discursiva e com os próprios enunciados já-ditos e

prefigurados. Em razão disso, é que “[...] o elemento expressivo tem significado vário e grau

vário de força, mas ele existe em toda parte: um enunciado absolutamente neutro é

impossível.” (BAKHTIN, 2011, p. 289).

No âmbito desse raciocínio, pressupõe-se que a expressividade sempre acompanha o

enunciado, pois mesmo que haja variados sentidos nas esferas diversas da comunicação

discursiva, entende-se que não há neutralidade no processo enunciativo. Isso quer dizer que o

elemento expressivo não pode ser considerado como fenômeno da língua enquanto sistema,

uma vez que:

A língua como sistema possui, evidentemente, um rico arsenal de recursos

linguísticos - lexicais, morfológicos e sintáticos - para exprimir a posição

emocionalmente valorativa do falante, mas todos esses recursos enquanto

recursos da língua são absolutamente neutros em relação a qualquer

avaliação real determinada. (BAKHTIN, 2011, p. 289-290, grifo do autor).

Para mostrar a amplitude desse pensamento, Bakhtin reitera mais adiante:

[...] só o contato do significado linguístico com a realidade concreta, só o

contato da língua com a realidade, o qual se dá no enunciado, gera a centelha

da expressão: esta não existe nem no sistema da língua nem na realidade

objetiva existente fora de nós. (BAKHTIN, 2011, p. 292).

Mediante essas colocações, observa-se que a oração, por ser concebida como unidade

da língua, é desprovida do elemento expressivo, adquirindo tal característica somente no

contexto de um determinado enunciado. É possível compreender, portanto, que a

expressividade é um traço constitutivo do enunciado, manifestando-se apenas em situações

concretas da comunicação discursiva.

Ainda é preciso salientar que, para melhor entender o elemento expressivo, faz-se

necessário levar em conta os seus participantes. Por isso, Bakhtin destaca outro aspecto

substancial e inalienável do enunciado - o seu direcionamento a alguém, isto é, de voltar-se ao

destinatário.

78

De acordo com a perspectiva bakhtiniana, todo enunciado, ao possuir autor e

necessariamente destinatário, constrói-se em vista de uma possível reação-resposta do seu

interlocutor. Então, Bakhtin (2011) preconiza que, em decorrência das especificidades de cada

esfera da atividade humana, há várias faces e vários perfis dimensionados na concepção de

destinatário. Para esse filósofo, o destinatário pode ser tanto um participante direto do diálogo

cotidiano, um público mais ou menos diferenciado, o chefe, o subordinado, uma pessoa

íntima, um estranho, etc., como também um interlocutor ainda não totalmente concretizado,

como no caso de enunciados monológicos de tipo emocional.

Fica, assim, claro que todas essas concepções de destinatário são de fato definidas pela

esfera de circulação e da vida à qual o enunciado se refere. Com base nisso, verifica-se que o

direcionamento a um destinatário (presente ou presumido) tem relevância e,

consequentemente, influência na construção do enunciado, pois, como já dissemos, o locutor

espera e prevê uma ativa compreensão responsiva por parte do seu interlocutor.

No caso, o autor do enunciado molda a sua fala/escrita de acordo com a percepção que

faz de seu destinatário, de forma a considerar os conhecimentos deste sobre o assunto a ser

tratado, com suas convicções, objeções, preconceitos, preferências, etc. Dessa forma, o

destinatário não é um mero interlocutor que apenas ouve ou lê sem uma posição responsiva,

mas sim um ativo participante da comunicação discursiva. Inclusive, tais considerações são

para Bakhtin (2011), determinantes na escolha do gênero, da composição e do estilo do

enunciado relativamente estável20

.

Por isso, ao reconhecer a função do sujeito na e sobre a linguagem, a abordagem

bakhtiniana legou aos estudos linguísticos e, especialmente, às perspectivas teórico-

metodológicas do ensino da língua escrita a plasticidade, a dialogicidade, a interação e a

possibilidade de crítica e de autonomia frente à produção de sentidos.

Pensar, portanto, nas orientações didáticas para a produção do texto escrito implica

conceber o educando como o sujeito que dialoga com o outro, seja este real ou imaginário,

prevendo o que ele sabe e o que espera saber. Isso revela a importância de os autores das

coleções didáticas proporem atividades que considerem a dinâmica da interação, tendo em

vista que a linguagem tem a capacidade de exercer sua função mediadora quanto aos

20

Esse assunto será discutido mais profundamente na subseção 3.2.2 - Gêneros do discurso: tipos relativamente

estáveis de enunciados.

79

posicionamentos enunciativos - do aluno, enquanto enunciador, e dos seus possíveis

destinatários.

Isso posto, é necessário lembrar, ainda, que, pela assertiva bakhtiniana, há também no

enunciado um supradestinatário (destinatário superior), que transpõe as fronteiras de espaço e

de tempo. Dito de outro modo, é o destinatário superior que pressupõe a compreensão de um

enunciado, seja na distância metafísica, seja num tempo historicamente distante.

Em relação a isso, é importante ressaltar que, através de uma percepção variada de

mundo, “[...] esse supradestinatário e sua compreensão responsiva idealmente verdadeira

ganham diferentes expressões ideológicas concretas (Deus, a verdade absoluta, o julgamento

da consciência humana imparcial, o povo, o julgamento da história, etc.).” (Bakhtin, 2011, p.

333).

Pode-se, pois, afirmar que, em uma relação dialógica, além da existência de um

destinatário, há também a presença de um outro, o destinatário visto como superior e ideal,

uma vez que compreende perfeitamente o que o autor do enunciado quer dizer. Por essa razão,

cada enunciado efetua-se como se fosse desenvolvido por um terceiro invisivelmente

presente, porém, dotado de uma compreensão responsiva que é, por sua vez, precisamente

modelada com o que é esperado pelo locutor.

Por esse viés, percebe-se que o supradestinatário não participa diretamente do diálogo,

mas o entende na medida em que representa o ouvinte/leitor idealizado, de forma a atuar

como termo de garantia à exequibilidade da compreensão enunciativa. Por isso é que, para

Bakhtin (2011), o autor do enunciado sempre conjetura, com maior ou menor grau de

consciência, uma certa instância superior que presume a viabilidade da compreensão,

tratando-se, pois, de um momento constitutivo que caracteriza a natureza do enunciado.

Em síntese, é possível verificar que o enunciado em sua plenitude - ser irreprodutível,

ter relação imediata com a situação extraverbal, pressupor enunciados que o antecedem e o

sucedem, direcionar-se a alguém, dispor de uma ativa posição responsiva, dentre outros

aspectos - é enformado por particularidades que o ligam às relações dialógicas. Assim, o

estudo do enunciado, marcado em geral pela alternância dos sujeitos do discurso,

conclusibilidade e expressividade, permite compreender mais adequadamente a sua natureza

enunciativa, caracterizando-se como um elemento inalienável e singular da totalidade

discursiva.

80

Vê-se, então, que conceber o enunciado como a unidade concreta da comunicação

discursiva afigura-se como uma das formulações basilares da perspectiva bakhtiniana. Logo,

isso coloca em evidência a própria importância concernente à caracterização dos gêneros do

discurso, tendo em vista que a realização enunciativa vincula-se às possibilidades discursivas

mediatizadas pelos gêneros.

3.2.2 Gêneros do discurso: tipos relativamente estáveis de enunciados

Partindo da concepção bakhtiniana segundo a qual os gêneros do discurso ligam-se

diretamente aos enunciados relativamente estáveis, em cuja formação entram elementos do

ponto de vista temático, estilístico e composicional, depreende-se que os gêneros estão

essencialmente envolvidos no caráter dialógico da linguagem, definidos por situações

enunciativas concretas e específicas.

Por isso, os gêneros do discurso não podem ser tratados independentemente de sua

relação com as atividades humanas, uma vez que se incorporam às situações vividas nas

práticas sociais - reportagem jornalística para relatar um fato real ocorrido, receita culinária

para orientar no preparo de uma comida, classificados para divulgar produtos e serviços,

regulamentos para orientar o comportamento das pessoas, cumprimentos diários para manter

um contato social, etc.

Sendo necessários para a interlocução humana, Bakhtin preconiza que (2011, p. 283),

“Se os gêneros do discurso não existissem e nós não os dominássemos, se tivéssemos de criá-

los pela primeira vez no processo do discurso, de construir livremente e pela primeira vez

cada enunciado, a comunicação discursiva seria quase impossível.”. Isso quer dizer, então,

que os sujeitos de uma dada comunicação precisam dispor de um gênero para produzir o

enredamento dialógico, de forma a balizar sua participação para com o funcionamento da

linguagem.

Consequentemente, é possível perceber que há, na práxis humana, a existência de uma

grande diversidade de gêneros do discurso. Na esfera jornalística, por exemplo, tem-se a

notícia e o editorial; na científica, a palestra e a tese; na cotidiana, o bilhete e a carta pessoal;

na escolar, o resumo e o diário de classe; na publicitária, o anúncio e o slogan; e na jurídica, o

decreto e a petição.

81

Os gêneros, assim concebidos, por mobilizarem diferentes práticas sociais,

acompanham a variabilidade das interações verbais. Ou seja, enquanto entidades dinâmicas

que incorporam as transformações histórico-sociais, os gêneros são flexíveis e variáveis, pois

se as atividades humanas mudam e evoluem, os gêneros também se modificam e se

reestruturam, atendendo as necessidades das relações dialógicas.

Com base nisso, é válido destacar o pensamento de Bakhtin (2008), que ao tratar sobre

a literatura, articula os gêneros à estabilidade e à mudança. Conforme esse teórico, cada

gênero tem a capacidade de garantir a ininterrupta continuidade de seu desenvolvimento, uma

vez que vive tanto do presente, como também da memória ao seu passado. Para ele, a vida do

gênero renasce em cada nova etapa de desenvolvimento da literatura e em cada obra

individual, tendo em vista que os próprios elementos mais arcaicos preservados em um gênero

renovam-se continuamente.

É por essa razão que essas características de estabilidade e de flexibilidade permitem

que os gêneros do discurso sejam capazes de, simultaneamente, viverem o presente e

recordarem o passado. Portanto, convém ressalvar que, ao afirmar que os gêneros são

relativamente estáveis, Bakhtin dá relevo ao fato de os gêneros serem formas estabilizadas, de

um lado, por resultarem de atividades sociais reiteradas ao longo do tempo e instáveis, por

outro, ao serem maleáveis às novas conjunturas que demandam adaptações.

Por exemplo, muitos telejornais de hoje são bem diferentes de telejornais de

20 anos atrás. Naquela época os apresentadores falavam de modo frontal

para a câmera, dificilmente emitiam uma opinião ou impressão sobre o fato

noticiado e usavam uma linguagem estritamente formal. Hoje, com

frequência, assistimos a telejornais em que os apresentadores conversam

entre si de modo bem descontraído, emitem impressões e opiniões sobre os

fatos e usam um registro de linguagem menos formal e mais flexível.

Certamente essa mudança pode ser explicada em função de necessidades

comunicativas dos tempos de hoje: as pessoas não querem apenas ser

informadas acerca dos fatos, mas exigem também que a informação chegue

até elas de um modo mais descontraído, mais agradável, mais interativo. Por

outro lado, a competição entre muitas emissoras e entre muitos meios de

comunicação acirra a concorrência e produz mudanças na forma dos

gêneros. (ALVES FILHO, 2011, p. 21-22).

Trata-se, mais precisamente, de um duplo direcionamento para com a formação dos

gêneros - reiteração e abertura para o novo. Ou seja, uma tensão entre os elementos que

permanecem, os quais condicionam às escolhas sobre qual gênero utilizar, e os elementos que

82

variam, resultados das novas necessidades comunicativas que surgem, como os decorrentes

dos avanços tecnológicos.

Com esses avanços, tem-se, por exemplo, a reconfiguração da carta e do bilhete em e-

mail, a conversa face a face em chat, o diário pessoal em blog e twitter, ou, ainda, a aula

presencial projetada na aula de educação a distância. Dessa forma, entende-se que:

Ao nascer, um novo gênero nunca suprime nem substitui quaisquer gêneros

já existentes. Qualquer gênero novo nada mais faz que completar os velhos,

apenas amplia o círculo de gêneros já existentes. Ora, cada gênero tem seu

campo predominante de existência em relação ao qual é insubstituível [...]

Ao mesmo tempo, porém, cada novo gênero essencial e importante, uma vez

surgido, influencia todo o círculo de gêneros velhos: o novo gênero torna os

velhos, por assim dizer, mais conscientes, fá-los melhor conscientizar os

seus recursos e limitações, ou seja, superar a sua ingenuidade. (BAKHTIN,

2008, p. 340).

Vê-se, portanto, que os gêneros do discurso, ao surgirem, fundamentam-se em outros

já existentes, de maneira a não suprimir aqueles já configurados no intercâmbio comunicativo

da sociedade. Assim, é possível identificar que os gêneros não são constituídos isoladamente,

como uma inovação absoluta, tendo em vista que há um processo de complementaridade entre

o “velho” e o “novo”, comprovando sua dinamicidade e sua capacidade de adaptar-se às

demandas sociais.

Nesse sentido, o conceito bakhtiniano de gêneros do discurso pode ser evidenciado nas

relações espaciais e temporais, o que define seu caráter cronotópico. Em outras palavras,

pode-se dizer que o cronotopo21

é, para Bakhtin (2002; 2011), a porta de entrada para análise

dos gêneros, visto que representa a interligação fundamental dos acontecimentos espaço-

temporais, os quais se associam necessariamente aos demais elementos (tema, finalidade

discursiva, autor, destinatário, etc.) que compõem o enunciado concreto.

A capacidade de ver o tempo, de ler o tempo no todo espacial do mundo e,

por outro lado, de perceber o preenchimento do espaço não como um fundo

imóvel e um dado acabado de uma vez por todas mas como um todo em

formação, como acontecimento; é a capacidade de ler os indícios do curso

do tempo em tudo, começando pela natureza e terminando pelas regras e

ideias humanas (até conceitos abstratos). (BAKHTIN, 2011, p. 225, grifo do

autor).

21 Nas obras bakhtinianas, o conceito de cronotopo é mais desenvolvido no estudo sobre o romance. Porém,

Bakhtin (2002) enfatiza que a dimensão cronotópica pode ser direcionada a outros domínios discursivos.

83

Como mencionado, deixemos entrever que a dimensão cronotópica expõe a

importância do tempo e do espaço na apreensão do mundo e, similarmente, na compreensão

acerca da identidade do gênero, uma vez que há vinculação com os momentos da história

humana. Assim, entende-se que a indissolubilidade de tempo e de espaço revela as mudanças

deflagradas na sociedade, nas quais as atividades humanas encarnam as interações espaço-

temporais em que ocorrem, revelando diferentes relações dialógicas, com seus

posicionamentos, valores e tensões.

Observemos, ainda, que, quando Bakhtin (2002) analisa os variados cronotopos

presentes no romance, por exemplo, ele reitera a importância de considerar as relações

espaço-temporais neles instaurados, justamente para conhecer a relação existente entre o

homem e todas as suas ações com o mundo.

Portanto, a nosso ver, se o entrelaçamento entre espaço e tempo traz consigo a abertura

para as permanentes transformações coadunadas nas práticas sociais, há, então, construções

cronotópicas historicamente singulares que produzem, por sua vez, diferentes gêneros do

discurso. No caso, cada gênero, ao incorporar as mudanças impostas historicamente,

pressupõe um cronotopo que necessita ser considerado, a fim de ser enunciado e recebido

pelos seus interlocutores.

Tal desdobramento temporal faz-nos pensar que vislumbrar o conceito de gêneros do

discurso em sua cronotopia é pensar também no grande tempo. É o presente, que seduzido

pelo passado, mantém a permanência dos gêneros sob novas características. É o presente, que

ao ecoar o futuro, compõe novos gêneros que embalam as práticas sociais. Passado, presente e

futuro que, envoltos pela dimensão cronotópica, revelam a capacidade criadora dos gêneros

em adaptarem-se ao contínuo porvir.

É necessário enfatizarmos que, nessa mudança cronotópica, Bakhtin preocupa-se em

destacar a diferença existente entre gêneros primários (simples) e secundários (complexos),

como também em sinalizar a relação recíproca entre eles.

De acordo com Bakhtin (2011), os primários são os gêneros constituídos em situações

ligadas à vida cotidiana, geralmente mediadas pela oralidade. Trata-se da comunicação

discursiva desenvolvida em circunstâncias mais espontâneas, como o relato do dia a dia e o

diálogo face a face. Já os secundários são os gêneros que aparecem em comunicações

discursivas mais complexas e relativamente mais evoluídas, com predominância da escrita.

Para isso, há gêneros como a tese científica, o editorial e a notícia jornalística.

84

É importante destacar, porém, que a modalidade oral da linguagem não é exclusiva

dos gêneros mais simples, nem a escrita, dos gêneros mais complexos, visto que podemos

encontrar, por exemplo, o diário íntimo e o bilhete como gêneros primários escritos e a

palestra e o seminário, como gêneros secundários orais.

Desse modo, pode-se afirmar que os gêneros primários estão fortemente relacionados

às trocas verbais que nascem da experiência pessoal de cada sujeito, estando próximos da

esfera do cotidiano desde os eventos mais casuais, como um pedido de informação na rua. E

os secundários, mais relacionados à esfera científica, burocrática, jurídica, dentre outras, que

necessitam de um tipo particular de aprendizagem.

Apoiando-se no pensamento de Bakhtin (2011), convém ressaltar que os gêneros

secundários, em seu processo de formação, incorporam e reelaboram os gêneros primários.

Estes, consequentemente, transformam-se ao serem inseridos nos secundários, perdendo o seu

vínculo com a situação comunicativa imediata, como a réplica do diálogo e a carta pessoal em

um romance. Para o autor, a réplica do diálogo e a carta pessoal conservam sua forma e sua

relevância cotidiana só como parte do romance, participando do enunciado apenas através

desse gênero secundário, enquanto acontecimento artístico, e não da vida cotidiana.

Certamente, trata-se de um processo dialógico e interdependente entre os dois grandes

tipos de gêneros defendidos por Bakhtin - primários e secundários. Ou seja, relação não

dicotômica entre eles, que reflete a natureza inerentemente dinâmica dos gêneros para com a

situação social de interação.

Nesse sentido, se os gêneros do discurso são marcados pelas especificidades da práxis

humana, as suas dimensões constitutivas caracterizam-se pelos elementos que compõem cada

enunciado concreto: o conteúdo temático, o estilo da linguagem e a construção

composicional.

Tomando por referência o pensamento bakhtiniano, entende-se que o conteúdo

temático, também chamado de tema, define-se como os assuntos vinculados a determinada

esfera social, os quais recebem formas típicas de tratamento. Logo, cada gênero possui o seu

tema próprio, mais ou menos previsível.

Como preconizado por Alves Filho (2011), o gênero notícias tende a apresentar temas

sobre os acontecimentos reais e considerados relevantes para uma comunidade discursiva, ao

contrário do gênero piada, caracterizado por temas que ridicularizam diversos atores da vida

85

social, como negros, loiras, políticos e padres. É por isso que o tema do gênero não se refere

apenas à temática em si, mas ao tratamento conferido a ela.

A partir disso, é possível afirmar que os gêneros podem tratar, de maneiras diferentes,

de um mesmo tema, se de forma positiva ou negativa, engrandecedora ou depreciativa,

realística ou fantasiosa, etc.

Ademais, verifica-se que o horizonte temático diz respeito não somente ao que é

dito/escrito explicitamente, mas também ao que é muitas vezes tomado como implícito,

resultado da apreciação (reação-resposta) construída pelos participantes da interação. É o

conteúdo temático que, associado a uma realização enunciativa, recebe diferentes valorações

pelos seus interlocutores.

Sobre o conceito de estilo, Bakhtin (2011) o relaciona com os recursos lexicais,

fraseológicos e gramaticais da língua, não o limitando, entretanto, a esses elementos

genuinamente linguísticos. Para ele, a estilística “[...] é, acima de tudo, o estilo da própria

visão de mundo e só depois é o estilo da elaboração do material” (BAKHTIN, 2011, p. 187),

além do que “A visão de mundo constrói e unifica o horizonte do homem, o estilo constrói e

unifica o seu ambiente.” (BAKHTIN, 2011, p. 189).

Em outras palavras, o estilo inscreve-se nas coerções linguísticas, mas também em

seus usos situados no tempo e no espaço das relações dialógicas. No caso, o estilo só pode ser

mais bem compreendido ao ser pensado conjuntamente como procedimento da dimensão

comunicativa.

É por isso que, para Bakhtin, todo estilo vincula-se indissociavelmente ao enunciado e

as formas típicas de enunciados que são, pois, os gêneros do discurso. Para o filósofo, cada

enunciado, por ser único e irrepetível, possui naturalmente um estilo individual (pessoal) por

parte de quem fala ou escreve, ao contrário dos gêneros, que não são igualmente capazes de

absorver tal individualidade.

Simetricamente a esse pensamento, lembremo-nos dos gêneros literários e alguns da

esfera publicitária, que apresentam condições mais propícias a desenvolver um estilo pessoal,

por ser este parte do propósito comunicativo desses gêneros. Já outros, como documentos

oficiais, ordens militares, fichas administrativas e catálogo telefônico, possuem condições

menos suscetíveis, por serem gêneros mais padronizados, prezando mais pelo caráter

normativo do que pelo criativo da produção.

86

Observemos, ainda, que, em decorrência do elo entre estilo, enunciado e gênero, há

então um vínculo inalienável entre a perspectiva estilística e os participantes da interação

verbal - o locutor em sua relação com o ouvinte, o leitor, o discurso do outro, o interlocutor

presumido, etc. No caso, entende-se que o estilo, em seu caráter dialógico, depende do modo

como o locutor percebe e imagina seu destinatário.

Desse modo, os gêneros do discurso, como formas típicas de enunciados e,

semelhantemente a estes, possuem sua própria concepção de autor e de destinatário, conforme

os vários âmbitos da troca verbal. Portanto, o autor faz uso do estilo da linguagem que julga

mais adequado à situação interlocutiva.

Essa acepção leva-nos a pensar que a riqueza conceitual sobre estilo encontra-se na

dinâmica entre o individual e o social de uma relação dialógica.

É por esse caminho que poderemos entender a argumentação [...] segundo a

qual a elaboração estilística [...] é uma atividade de seleção, de escolha

individual, mas de natureza sociológica, já que o estilo se constrói a partir de

uma orientação social de caráter apreciativo: as seleções e escolhas são,

primordialmente, tomadas de posição axiológicas frente à realidade

linguística, incluindo o vasto universo de vozes sociais. (FARACO, 2009, p.

137).

Por esse raciocínio, verifica-se que o estilo é resultado da intersecção entre as escolhas

individuais e sociais, ou seja, fruto da dimensão do sujeito como ser único, singular e, ao

mesmo tempo, como ser inteiramente social. Assim, o estilo é individual, ao ser realizado por

sujeitos marcados por singularidades. É social, pois ao ser concretizado em um gênero do

discurso, baseia-se na relação do eu com o outro, mediante a relativa estabilidade que cada

gênero mantém.

No tocante à construção (estruturação) composicional, Bakhtin (2011, p. 266) a define

como “[...] determinados tipos de construção do conjunto, de tipos do seu acabamento, de

tipos de relação do falante com outros participantes da comunicação discursiva [...]”. Desse

modo, os gêneros possuem elementos composicionais que possibilitam a organização, o

acabamento e o elo entre os interlocutores da comunicação discursiva.

Nessa linha de pensamento, entende-se que essa composição possibilita caracterizar

um gênero do discurso, distinguindo-o em meio a outros. Isso ocorre, uma vez que os gêneros

apresentam regularidades composicionais que permitem a sua identificação em cada esfera da

87

atividade humana. Todavia, como já dito neste texto, os gêneros do discurso não podem ser

concebidos como formas estáticas, uma vez que se adaptam a cada nova demanda social.

Pode-se admitir, portanto, que cada gênero apresenta uma relativa padronização de

estrutura composicional, como é o caso da carta, comumente constituída pelo local e data em

que foi escrita, endereçamento (a quem se dirige), vocativo, saudação, corpo do texto,

despedida e assinatura.

Nesse sentido, as três dimensões dos gêneros como tipos temáticos, estilísticos e

composicionais dos enunciados relativamente estáveis apresentam-se como elementos

intrinsecamente ligados e dependentes do contexto comunicativo no qual estão inseridos.

Poderíamos dizer, então, que esse contexto comunicativo, referente à esfera social em

que o gênero é produzido e compreendido, condiciona o modo de caracterização, apreensão e

transmissão da linguagem verbal humana.

Fica, assim, claro que, para Bakhtin, gêneros do discurso e atividades são

mutuamente constitutivos. Em outras palavras, o pressuposto básico da

elaboração de Bakhtin é que o agir humano não se dá independentemente da

interação; nem o dizer fora do agir. Numa síntese, podemos afirmar que,

nesta teoria, estipula-se que falamos por meio de gêneros no interior de

determinada esfera da atividade humana. Falar não é, portanto, apenas

atualizar um código gramatical num vazio, mas moldar o nosso dizer às

formas de um gênero no interior de uma atividade. (FARACO, 2009, p. 126-

127).

Essa afirmação, baseada nos estudos bakhtinianos, leva-nos a entender que toda esfera,

ao desenvolver um gênero do discurso apropriado às suas especificidades, reflete a

importância do propósito comunicativo na configuração de um gênero. Por essa acepção,

observa-se que cada gênero surge para atender as necessidades requeridas pelas condições

específicas de interação, as quais convergem à modalidade oral ou escrita, à possibilidade de

participação dos interlocutores, ao grau de formalismo da comunicação, dentre outros

aspectos.

De fato, inferimos que, para os autores das coleções didáticas ajudarem a escola a ser

um ambiente de produção, é preciso que oportunizem a apropriação de diferentes gêneros do

discurso, a fim de que os alunos tenham contato com as variadas práticas sociais, não ficando

restritos às práticas de texto cristalizadas pela tradição escolar.

88

Sob esse enfoque, se os gêneros do discurso viabilizam e efetivam nossa participação

social, compreende-se que a escolha de um ou outro gênero não é adquirida aleatoriamente

aos interesses específicos de uma atividade humana. Isso remete à importância de

conhecermos e dominarmos o gênero de uma dada esfera.

Sobre isso, Bakhtin (2011) preconiza que, quando dominamos melhor um gênero, o

empregamos mais livremente na relação dialógica, sendo mais flexíveis e sutis ao que é

exigido. Assim, o filósofo chama a atenção, por exemplo, ao fato de muitas pessoas sentirem-

se impotentes em algumas esferas da comunicação discursiva, precisamente porque não

dominam, em termos práticos, certos gêneros do discurso. Para ele, não se trata de uma

pobreza de domínio vocabular ou gramatical, mas de uma inabilidade para dominar o que é o

todo de um enunciado, ou seja, as especificidades de um gênero em determinado contexto

comunicativo.

Entretanto, é válido ressaltar que, como usuários da língua, não precisamos nos

apropriar de todos os gêneros, uma vez que assumimos funções que variam conforme o meio

social e linguístico no qual estamos, o que demanda a produção de um gênero específico.

Em síntese, conhecer e dominar certos gêneros correlaciona-se com a sua grande

relevância social, visto que essas formas típicas de enunciados proporcionam um melhor

funcionamento da linguagem em situações de comunicação. Portanto, apropriar-se dos

gêneros implica a possibilidade de influenciar os próprios usuários da língua em uma prática

de socialização, ajudando-os a reconhecerem e a desempenharem suas funções emergentes

nas diferentes esferas da prática humana.

3.2.3 O texto como enunciado: dado primário para a compreensão humana

A definição de texto, tal como nas formulações bakhtinianas sobre enunciado e gênero

do discurso, é também concebida no fluxo das relações dialógicas. Isso é proposto, visto que

Bakhtin (2011) reconhece o texto, seja oral, seja escrito, como o dado primário e o ponto de

partida para a realidade imediata do pensamento e das vivências humanas.

Levando em conta o acima mencionado, é possível afirmar que o ser humano se

constrói no e por meio do texto, uma vez que “Onde não há texto não há objeto de pesquisa e

89

pensamento.” (BAKHTIN, 2011, p. 307). Assim, a premissa em compreender a noção textual

surge como necessidade de entender também o dinamismo da linguagem humana.

Portanto, por trás de cada texto está o sistema da linguagem. A esse sistema

corresponde no texto tudo o que é repetido e reproduzido e tudo o que pode

ser repetido e reproduzido, tudo o que pode ser dado fora de tal texto (o

dado). Concomitantemente, porém, cada texto (como enunciado) é algo

individual, único e singular, e nisso reside todo o seu sentido (sua intenção

em prol da qual ele foi criado). [...] Esse segundo elemento (polo) é inerente

ao próprio texto mas só se revela numa situação e na cadeia dos textos (na

comunicação discursiva de dado campo). (BAKHTIN, 2011, p. 309-310).

Com base nisso, pode-se identificar, em Bakhtin, uma dupla abordagem (polo) na

análise teórica do texto: o do sistema da língua e o do enunciado.

No primeiro polo, o texto é tratado como fenômeno estritamente linguístico, pois é

abstraído o seu caráter dialógico, o seu contexto social e os interlocutores nele envolvidos.

Por isso, o primeiro polo relaciona-se com os elementos repetíveis e reproduzíveis do texto, o

que enfatiza o interesse pelas regularidades da língua.

No segundo polo, por sua vez, o texto é visto como fenômeno dialógico, individual e

irrepetível, caracterizando-se como um enunciado. Nesse tipo de abordagem, o texto é

concebido a partir de sua relação viva e concreta com a comunicação discursiva, ou seja,

manifestando-se num contexto social e num vínculo dialógico com outros

interlocutores/textos de uma dada esfera.

Por esse entendimento, adotamos essa concepção de texto para verificarmos como os

elementos intrínsecos à produção escrita (gêneros do discurso e situações de produção) são

trabalhados nas coleções didáticas de língua portuguesa. Compreendemos que tal concepção,

o texto como enunciado, aponta a relevância do uso dos gêneros e dos demais elementos

constitutivos das situações de produção, em vista de construir e de estruturar a natureza

dialógica da linguagem.

A respeito disso, Bakhtin (2011) destaca dois aspectos que põem em evidência a noção

de texto em sua qualidade enunciativa: a intenção comunicativa e a realização dessa intenção.

Para isso, observa-se a necessidade de considerar o locutor e sua intenção comunicativa, o

destinatário, a relação dialógica no interior do texto e entre os textos, a esfera social de

interação, dentre outros elementos que possibilitam a constituição do texto como enunciado.

90

Sob esse enfoque, entende-se que o texto, em seu caráter enunciativo, não pode ser

restringido à sua materialidade linguística, tendo em vista que a sua existência pressupõe um

processo de interação dialógica na/para a dimensão social. Então, quando Bakhtin situa o

texto como dado primário para a compreensão humana, certamente ele refere-se ao texto

como enunciado.

Na leitura bakhtiniana, feita por Rodrigues, essa mesma orientação pode ser

estabelecida na relação entre texto e gênero.

Se se considera o texto como enunciado, os gêneros do discurso se

constituem como tipos históricos relativamente estáveis de textos. [...].

Entretanto, na abordagem do texto como objeto da lingüística, a noção de

tipo de texto não corresponde à noção de tipo relativamente estável de

enunciado, ou seja, ao conceito de gênero. Isso porque se abstraem os

aspectos sócio-discursivos, estando a noção de tipo textual não assentada em

um princípio histórico, mas abstrato-formal. Daí que é possível falar em

tipos ou protótipos de texto, mas não de gêneros. (RODRIGUES, 2001, p.

65-66, grifo da autora).

Com base nisso, Rodrigues acrescenta ainda que falar sobre texto é ir de encontro às

diferentes concepções teóricas, o que gera a polissemia do termo e, consequentemente, a sua

ambiguidade. Nesse sentido, a noção de enunciado, gênero e texto, bem como a relação entre

eles, dependerá das abordagens teóricas adotadas, que ora os aproximam, ora os diferenciam.

No caso de Bakhtin, que apresenta uma dupla orientação teórica, a análise textual

puramente linguística é reconhecida pelo filósofo em sua legitimidade, porém, ele destaca

que, em seus estudos, interessa-se “[...] primordialmente nas formas concretas dos textos e nas

condições concretas da vida dos textos, na sua inter-relação e interação.” (BAKHTIN, 2011,

p. 319).

Seguindo a linha bakhtiniana, interessa-nos a concepção de texto que, vinculada às

condições concretas da vida, constitui-se no dialogismo entre os interlocutores e também no

dialogismo com outros textos (enunciados). Tem-se, então, o texto relacionado à manifestação

viva da linguagem, de forma a desconsiderar o monologismo da existência humana, em vista

do entrecruzamento das múltiplas vozes sociais.

Dessa forma, é possível dizer que os fundamentos bakhtinianos nos dá sustentação

teórica para melhor percebermos a relevância de os alunos relacionarem-se com o uso efetivo

91

da linguagem em sala de aula, mediante os próprios limites naturais que a escola oferece.

Como dizem Faraco e Castro:

Do ponto de vista metodológico, o conceito de enunciado de BAKHTIN -

daqui para frente, também de texto - é um princípio teórico importante,

porque pode elucidar algumas de nossas ações que dizem respeito ao modo

como conduzimos o trabalho de leitura e de prática de texto na sala de aula.

(FARACO; CASTRO, 2000, p. 185, grifo dos autores).

Em suma, compreender o enunciado, o texto e o gênero do discurso do ponto de vista

dialógico possibilita que criemos relações de sentido para a constituição e o funcionamento da

linguagem. É, assim, a tessitura da linguagem sendo fiada a cada construto humano, o que

pode favorecer a nossa reflexão no que concerne ao ensino-aprendizagem da escrita.

3.3 Os gêneros do discurso como objetos de ensino-aprendizagem

A língua materna - sua composição vocabular e sua estrutura gramatical -

não chega ao nosso conhecimento a partir de dicionários e gramáticas mas

de enunciações concretas que nós mesmos ouvimos e nós mesmos

reproduzimos na comunicação discursiva viva com as pessoas que nos

rodeiam. (BAKHTIN, 2011, p. 282-283).

É exatamente nesse sentido que ensinar não se esgota no tratamento do

objeto ou do conteúdo, superficialmente feito, mas se alonga à produção das

condições em que aprender criticamente é possível. (FREIRE, 2011a, p. 28).

Iniciar esta seção com as citações de Bakhtin e de Freire faz-nos reafirmar a

necessidade de adotar uma prática pedagógica que leve em conta o caráter dialógico da

linguagem e da educação, em vista da interligação dos saberes escolares aos contextos sociais

que circundam na vida dos educandos.

Tal pensamento nos conduz a uma proposta que se preocupe com a formação do

aluno-escritor, enquanto cidadão apto a produzir textos adequados às necessidades a eles

requeridas no âmbito das atividades humanas.

Baseando-se nisso, discorreremos sobre as próprias orientações dos PCN (1997), que

elegem o texto como a unidade básica de ensino e os gêneros, como objetos desse ensino, ou

seja, como os instrumentos articuladores do trabalho em língua portuguesa. Isso representa,

92

para nós, uma possibilidade de concretizar o uso/produção da escrita a partir de uma situação

mimeticamente concreta das práticas sociais.

Tendo em vista que muitas são as formas de abordar o texto e o gênero em sala de

aula, recorremos às reflexões teóricas e práticas que buscam favorecer o acesso do aluno a

uma produção escrita coadunada com as mais variadas situações de comunicação.

Segundo Geraldi (2004), conceber o texto22

como unidade de ensino-aprendizagem é

entendê-lo como o lugar das correlações de sentidos socialmente constituídos, a partir do

diálogo com outros textos/interlocutores, sem os quais não existiria. Em outros termos, se a

sala de aula é tratada como âmbito de interação verbal, o texto é precisamente o lugar que

materializa as relações dialógicas entre professores e alunos.

Desse modo, observa-se que a produção de texto compreendida como forma de

diálogo é, portanto, uma atividade a construir sentidos. Assim, o texto produzido não é um

mero estoque de palavras ou de regras gramaticais/ortográficas que somente visam à fixação

de uma escrita correta, mas sim, uma prática que permite ao aluno articular pontos de vista

com seus possíveis interlocutores, constituindo sentidos que não preexistem à interlocução.

Sob esse enfoque, Geraldi (2003) destaca que, para produzir um texto, é preciso criar

necessárias condições que envolvam o educando ao processo da produção escrita. Dentre

essas condições, ele ressalta que é fundamental que se tenha o que dizer, a fim de ampliar a

escrita não só com os dizeres da escola, mas também com os dizeres dos alunos enquanto

sujeitos sociais que se completam e se constroem nas diferentes experiências do vivido. Outra

condição é que se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer, ou seja, uma intenção

comunicativa por parte de quem escreve. Além desses aspectos, é preciso que se tenha para

quem dizer o que se tem a dizer, o que destaca a importância de se definir os interlocutores

reais ou possíveis do texto.

Por essa abordagem, produzir um texto constitui a possibilidade de vivenciar situações

de escrita inseridas num contexto social e, consequentemente, nas próprias experiências

valorativas do educando, com propósitos claros e destinatários variados. Tais considerações

são por nós elencadas como critérios de análise no que condizem às orientações da produção

escrita, existentes nas coleções didáticas constitutivas do nosso corpus de pesquisa.

22

Apesar de Geraldi não mencionar a discussão de Bakhtin sobre texto como sistema e texto como enunciado,

entendemos que sua abordagem assemelha-se à concepção bakhtiniana de texto como enunciado.

93

É importante ressaltar que as condições de escrita destacadas por Geraldi advêm da

constatação de que, em muitas escolas, a produção de texto solicitada aos educandos

distancia-se das situações sociais por eles vivenciadas. É o ensino que o autor chama de:

[...] simples sistema de normas, conjunto de regras gramaticais, visando a

produção correta do enunciado comunicativo culto, lança mão de uma

concepção de linguagem como máscara do pensamento que é preciso

moldar, domar para, policiando-a, dominá-la, fugindo ao risco permanente

de subversão criativa, ao risco do predicar como ato de invenção e liberdade.

(GERALDI, 2008, p. 24).

A citação apresentada explicita o contexto de ensino em que a criança é convidada a

escrever mediante os objetivos de natureza meramente escolar - escrever para aprender,

escrever para ter nota, escrever para atender às solicitações do professor. Assim, é a criança

também convidada a escrever para o destinatário preferencial e quase sempre o único leitor - o

professor.

Certamente, levamos em conta que “escrever para aprender” é uma das mais

importantes responsabilidades da escola para com a formação do aluno-escritor, o que é

necessário ter o professor como o interlocutor dos textos produzidos por cada educando.

Porém, julgamos que, paralelamente a esses aspectos, os alunos podem escrever enquanto

autores que assumem sua palavra na interação com outros destinatários, a fim de atenderem a

objetivos que os aproximem das práticas comunicativas da sociedade.

Como dizem os PCN:

É necessário, portanto, ensinar os alunos a lidar tanto com a escrita da

linguagem - os aspectos notacionais relacionados ao sistema alfabético e às

restrições ortográficas - como com a linguagem escrita - os aspectos

discursivos relacionados à linguagem que se usa para escrever. Para tanto é

preciso que, tão logo o aluno chegue à escola, seja solicitado a produzir seus

próprios textos, mesmo que não saiba grafá-los, a escrever como lhe for

possível, mesmo que não o faça convencionalmente. (BRASIL, 1997, p. 48-

49).

94

A propósito disso, o Guia de Livros Didáticos23

do PNLD/2010 também destaca que a

proficiência em língua escrita é melhor apreendida, caso as propostas de produção de texto

não deixem de:

[...] considerar o uso social da escrita, levando em conta, portanto, o

processo e as condições de produção do texto, evitando o exercício

descontextualizado da escrita; explorar a produção dos mais diversos

gêneros e tipos de texto, contemplando suas especificidades [...]. (BRASIL,

2010, p. 24).

Faz-se necessário, então, que os autores das coleções didáticas fomentem um trabalho

que alie tanto a aquisição quanto o desenvolvimento da língua para com a vivência dos alunos

em situações mimeticamente reais de uso da escrita.

As reflexões aqui expostas permitem aproximar a proposta de Geraldi às práticas de

produção de texto que têm os gêneros do discurso como objetos de ensino-aprendizagem, o

que amplia as possibilidades de trabalhar, no ensino da língua materna, a linguagem em uso

corrente nas esferas sociais.

De acordo com Alves (2012), a ênfase em ensinar ou não os gêneros tornou-se motivo

de discussões entre muitos teóricos. Segundo ela, há aqueles que questionam tal ensino,

alegando que o gênero não pode ser ensinado, uma vez que não há como replicar as diversas

práticas sociais autênticas em sala de aula.

Entretanto, para Alves (2012, p. 310), o gênero pode nortear as práticas de leitura e de

escrita no contexto escolar “[...] se considerar com Rojo (2005) uma orientação bakhtiniana

para além da forma do texto, dos elementos linguísticos e, de forma paralela, do tratamento do

contexto.”. Acrescenta ainda que:

23

O Guia de Livros Didáticos é um documento publicado pelo PNLD, a fim de subsidiar o professor no que

tange à escolha das coleções didáticas a serem trabalhadas com os alunos por três anos consecutivos. Nesse

Guia, há algumas informações importantes, como: critérios segundo os quais as coleções foram analisadas e

avaliadas; resenhas das obras aprovadas; roteiro para análise e escolha das coleções; e ficha de avaliação. Tais

elementos visam a colaborar no planejamento e na organização para com o processo de escolha das coleções

didáticas.

95

A nossa proposta [...] é a de que os gêneros discursivos podem orientar as

práticas de leitura e de escrita em sala de aula, uma vez que, de um lado,

estes são mediadores/matizes/nutrizes de todas as nossas atividades de

linguagem e, como tal, permitiriam a tão necessária relação entre o mundo

da escola e o mundo da vida; de outro, ler e escrever nessa visão, seriam

atividades responsivas a diferentes demandas e, portanto, situadas,

posicionadas e significativas para os sujeitos nelas envolvidos. (ALVES,

2012, p. 319).

Conceber os gêneros do discurso como norteadores do ensino-aprendizagem da língua

materna adquire uma função de suma importância para o uso eficaz da produção escrita em

sala de aula. Por isso, apropriar-se dos gêneros é também apropriar-se da possibilidade de

levar o aluno-escritor a um processo de socialização não só com as práticas linguajeiras da

escola, mas também com outras diferentes situações de comunicação que o interligam ao

mundo da vida para nele atuar.

Parece-nos fundamental reconhecer, então, que o trabalho com os gêneros oportuniza

associar a escrita à vida em sociedade, em vista da concepção dialógica da linguagem, assim

como tratada por Bakhtin.

Se levarmos em consideração tal posicionamento, é preciso que as orientações

pedagógicas procurem trazer o dinamismo dos gêneros para a sala de aula. Nesse caso, é

sempre bom lembrar que, para Bakhtin (2011), os gêneros:

a) são tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais condicionam a escolhas sobre qual

deles utilizar;

b) são extremamente heterogêneos, assim como os usos da linguagem que são tão

multiformes quanto às esferas da atividade humana;

c) são flexíveis e variáveis, ao incorporarem novas necessidades comunicativas;

d) refletem as condições específicas e as finalidades de cada referida esfera, pelo seu

conteúdo temático, estilo da linguagem e construção composicional.

Por isso, convém abordar de forma mais sistemática o que foi anteriormente elencado,

discutindo, inicialmente, os itens a e b, seguido a posterior pelos itens c e d.

Se uma das características do gênero do discurso é a sua relativa estabilidade, reiterada

ao longo do tempo pelas atividades histórico-sociais, compreende-se que um dos objetivos do

ensino de língua é justamente preparar o aluno a dominar a produção de textos dos mais

96

variados gêneros. Quer dizer, possibilitar ao aluno o domínio das formas relativamente

estáveis das interações linguísticas.

Nesse sentido, faz-se necessário que os autores das coleções didáticas proporcionem

situações de comunicação que ampliem as experiências de escrita do aluno, selecionando

textos de gêneros diversos e que os caracterizem em suas especificidades.

Cabe a ele [o professor] mostrar o papel desses gêneros no processo social

de interação verbal, como forma de garantir a competência e a adequação

discursiva do aluno para as mais variadas situações de interação socioverbal

a que ele poderá ser exposto fora dos limites escolares. Isto é, no fundo, o

que devemos fazer como professores de língua materna é, mais do que tudo,

seguindo os princípios teóricos de BAKHTIN, levar para dentro da sala de

aula - até onde o limite natural da escola permite - a realidade dinâmica das

relações lingüísticas que estão acontecendo fora dela. (FARACO; CASTRO,

2000, p. 186, grifo dos autores).

Trata-se, em nosso entendimento, de propiciar a competência comunicativa de cada

educando, de modo que desenvolva a capacidade de transferir o que aprende na sala de aula

para a diversidade de contextos com que convive fora da escola. É, pois, colocar o aluno em

uma situação mimeticamente relacionada à situação original de produção do gênero, a fim de

participar, com maior consciência, dos diferentes lugares a partir dos quais se comunica.

Sobre a competência comunicativa do aluno-escritor, os PCN afirmam que:

Um escritor competente é alguém que [...] sabe selecionar o gênero no qual

seu discurso se realizará escolhendo aquele que for apropriado a seus

objetivos e à circunstância enunciativa em questão. Por exemplo: se o que

deseja é convencer o leitor, o escritor competente selecionará um gênero que

lhe possibilite a produção de um texto predominantemente argumentativo; se

é fazer uma solicitação a determinada autoridade, provavelmente redigirá um

ofício; se é enviar notícias a familiares, escreverá uma carta. Um escritor

competente é alguém que planeja o discurso e conseqüentemente o texto em

função do seu objetivo e do leitor a que se destina, sem desconsiderar as

características específicas do gênero. (BRASIL, 1997, p. 47-48).

Por esse viés, é certo que a vida contemporânea exige cada vez mais o

aperfeiçoamento quanto às nossas habilidades comunicativas, pelas quais se intervém na

dinâmica social. Por isso, o ensino-aprendizagem da produção textual a partir dos gêneros

oportuniza a construção de conhecimentos adequados aos usos da linguagem, o que dá

97

condições ao educando para melhor adaptar-se à situação relativamente real de escrita, com

vistas a sua inserção social.

É importante ressaltar, por outro lado, que, se há transformação nos gêneros na medida

em que as demandas sociais se evoluem, é preciso que o professor conscientize os alunos de

que os gêneros são estáveis, mas não imutáveis.

Desse modo, um dos equívocos do professor é conceber os gêneros em uma visão

prescritiva de ensino - modelo a ser copiado, classificado e repetido pelos alunos, sem levar

em conta o seu caráter flexível e variável.

Em decorrência disso, Alves Filho (2011) sugere que seria mais apropriado pensar em

uma proposta, acerca do texto e do gênero, que se mostre mais flexível quanto às

classificações, compreendendo-as como categorizações históricas, culturais e ideológicas,

passíveis de sofrerem mudanças. Para ele, isso remete a uma classificação que “[...] em vez de

uma camisa de força, ela pode ser encarada como uma massinha de modelagem na sua

capacidade adaptativa.” (ALVES FILHO, 2011, p. 25).

Complementando mais adiante, o autor acrescenta que um mesmo texto pode

pertencer a diferentes gêneros, uma vez que estes não dependem apenas de sua forma, mas

também do seu propósito comunicativo, do contexto no qual é utilizado e de quem os usa, por

exemplo.

Pelo exposto, infere-se que trabalhar apropriadamente um gênero não implica somente

focar o seu processo de regulamentação e de normatização para com as necessidades

comunicativas. Ou seja, não se trata apenas de escrever um conjunto de textos a partir de uma

rotulação definitiva sobre um determinado modelo formal de gênero. É válido lembrar que a

própria estrutura composicional é variável entre diferentes momentos históricos, instituições,

comunidades, suportes, etc.

Em razão disso, os educandos precisam ser encorajados a perceber que a produção

textual, sob o enquadre de um gênero, é condicionada por sua adequação às necessidades

sociais de uma específica situação.

Assim, se o gênero do discurso é concebido como objeto de ensino-aprendizagem, os

alunos poderão compreender que o complexo processo de construção escrita envolve os

diversos elementos constitutivos da situação de produção, como: quem escreve, para quem,

em que posição enunciativa, com qual finalidade, em que suporte, qual o conteúdo temático (o

que se torna dizível através do gênero), qual o estilo da linguagem (marcas linguísticas

98

orientadas pela posição enunciativa do escritor), em qual construção composicional

(elementos da estrutura comunicativa que organizam a forma de escrever), além dos próprios

acontecimentos intrínsecos ao aspecto histórico-social em que o gênero se configura.

Para um melhor esclarecimento, é válido destacar a citação a seguir.

[...] quando se fala de tomar os gêneros, e não meramente os textos ou os

tipos de texto, como objeto de ensino, fala-se de constituir um sujeito capaz

de atividades de linguagem, as quais envolvem tanto capacidades

lingüísticas ou lingüísticas discursivas, como capacidades propriamente

discursivas, relacionadas à apreciação valorativa da situação comunicativa

ou contexto, como também, capacidades de ação em contexto. Fala-se de um

outro modo de se produzir e de se compreender/ler textos em sala de aula.

(ROJO, 2006, p. 27).

Poderíamos dizer, então, que, nas orientações didáticas voltadas à aprendizagem do

aluno, o conteúdo temático, o estilo da linguagem e a estrutura composicional de um gênero

precisam ser vistos num caráter funcional, produzindo um efeito de sentido ao texto em

construção. Trata-se, portanto, de uma prática textual a serviço do gênero, isto é, um ensino

que visa não só à materialidade linguística do texto a ser produzido, como também a observar

se a produção textual assumida pelo gênero atende ao cumprimento de seu propósito social.

Para tanto, faz-se necessário que o ensino da língua paute-se na dimensão heterogênea

implicada na concepção de gênero aqui adotada, orientando os alunos na riqueza, na

dinamicidade e na funcionalidade dos gêneros do discurso.

Por esse raciocínio, lembremo-nos do pensamento freireano (2012) ao mostrar que a

produção no ato de ensinar e de aprender gira em torno da compreensão do mundo, dos

objetos, da criação, da boniteza, da exatidão científica, do senso comum. A produção é, para

Freire (2012, p. 53), “[...] tão social quanto a produção da linguagem, que é também

conhecimento.”.

Trata-se de fomentar uma prática de escrita que dê legitimidade ao dizer do aluno, na

qual sua voz seja dialogada com seus possíveis interlocutores, a fim de constituir-se como um

escritor para o mundo da vida.

Em consonância com as reflexões teóricas e práticas aqui expostas, é relevante

ressaltar que não temos a ilusão de que a inserção dos gêneros como importante objeto de

ensino da língua reproduzirá, para dentro da sala de aula, as práticas sociais tais quais

aparecem na sociedade. Obviamente, as situações de produção textual precisarão adaptar-se às

99

características peculiares da escola, que tem por dinâmica uma intervenção sistemática e

planejada no ensino-aprendizagem da escrita.

Por outro lado, entendemos que é função da escola e, concomitantemente, dos autores

das coleções didáticas, permitirem o acesso do aluno a uma produção escrita mais próxima da

situação real de comunicação. Os gêneros do discurso, no caso, vêm atender a esse objetivo.

Não obstante as observações entretecidas, verifica-se que, ao pensar no ensino de

língua materna a partir dos gêneros, vêm à tona os desafios sobre o que merece ser focado e

privilegiado: quais gêneros escolher para trabalhar em sala de aula? Quais são os mais

relevantes em cada nível de ensino? Como organizá-los ao longo de cada ano letivo? Quais

critérios podem ser usados para fazer essa organização?24

Decerto, perguntas como essas são elaboradas por educadores preocupados com a

formação de seus alunos e que, na busca por respostas, têm a árdua tarefa de refletirem sobre

os objetivos de ensino a serem alcançados.

Nesse sentido, pesquisadores de Genebra, como Schneuwly e Dolz, defendem que:

Toda introdução de um gênero na escola é o resultado de uma decisão

didática que visa a objetivos precisos de aprendizagem, que são sempre de

dois tipos: trata-se de aprender a dominar o gênero, primeiramente, para

melhor conhecê-lo ou apreciá-lo, para melhor saber compreendê-lo, para

melhor produzi-lo na escola ou fora dela; e, em segundo lugar, de

desenvolver capacidades que ultrapassam o gênero e que são transferíveis

para outros gêneros próximos ou distantes. (SCHNEUWLY; DOLZ, 2011

[1997], p. 69).

Assim, como um dos objetivos é ampliar a capacidade dos alunos de produzir textos, o

que demanda a exploração das interseções e das diferenças entre os gêneros do discurso, os

autores genebrinos ajudam-nos a estabelecer uma variada seleção de gêneros com base numa

progressão curricular.

Para Schneuwly e Dolz (2011 [1996]), a progressão dos gêneros, ou seja, a

organização temporal do seu ensino, situa-se essencialmente em dois níveis: na progressão

interciclo, que remete à divisão de gêneros entre os diferentes ciclos do ensino fundamental, e

na progressão intraciclo, que permite ao aluno desenvolver o mesmo gênero nos diferentes

ciclos.

24 Não temos a pretensão de responder a todos esses questionamentos, mas de mostrar apenas as possíveis

dúvidas que surgem a partir de um trabalho que adota a produção textual com base nos gêneros.

100

A esse respeito, vale destacar o pensamento de Schneuwly (2011 [1994]), que,

metaforicamente, concebe o gênero como um megainstrumento, ou seja, uma ferramenta

complexa que integra um conjunto articulado de outros instrumentos, os quais contribuem

para a produção de objetos. Em outras palavras, a ideia do gênero como um megainstrumento

é entendida como o grande instrumento, por meio do qual outros instrumentos - definidos

pelo autor como conteúdo, estrutura comunicativa e configurações específicas das unidades

linguísticas25

- vêm a contribuir para a compreensão e produção de textos.

Vê-se, então, que a organização progressiva dos gêneros, ao longo dos anos ou ciclos

escolares, traz em si mesmo a própria seleção de conteúdos intrínsecos a eles e que podem,

consequentemente, ser explorados como conteúdos disciplinares em sala de aula. Isso remete,

pois, à importância de elaborar uma seleção criteriosa dos gêneros, a fim de garantir a

continuidade de ações didáticas direcionadas aos alunos.

Schneuwly e Dolz (2011 [1996]) sugerem, portanto, um agrupamento de gêneros

elaborado em torno de três critérios: domínios sociais de comunicação (cultural literária

ficcional; documentação e memorização das ações humanas; discussão de problemas sociais

controversos; transmissão e construção de saberes; instruções e prescrições), aspectos

tipológicos (narrar, relatar, argumentar, expor e descrever ações) e capacidades de linguagem

dominantes (mimeses da ação através da criação da intriga no domínio do verossímil;

representação pelo discurso de experiências vividas, situadas no tempo; sustentação, refutação

e negociação de tomadas de posição; apresentação textual de diferentes formas dos saberes; e

regulação mútua de comportamentos).

Com base nesses critérios, os pesquisadores propõem cinco agrupamentos,

contemplando tanto os gêneros orais quanto os escritos.

25

Esses “instrumentos” situam-se na perspectiva bakhtiniana, segundo a qual os gêneros do discurso apresentam

as dimensões constitutivas que caracterizam o enunciado: o conteúdo temático, o estilo da linguagem e a

estrutura composicional.

101

Quadro 1: Proposta provisória de agrupamento de gêneros26

Domínios sociais de comunicação

Aspectos tipológicos

Capacidades de linguagem dominantes

Exemplos de gêneros orais e escritos

Cultura literária ficcional

Narrar

Mimeses da ação através da criação da

intriga no domínio do verossímil

conto maravilhoso

conto de fadas

fábula

lenda

narrativa de aventura

narrativa de ficção científica

narrativa de enigma

narrativa mítica

sketch ou história engraçada

biografia romanceada

romance

romance histórico

novela fantástica

conto

crônica literária

adivinha

piada Documentação e memorização das ações humanas

Relatar

Representação pelo discurso de experiências

vividas, situadas no tempo

relato de experiência vivida

relato de viagem

diário íntimo

testemunho

anedota ou caso

autobiografia

curriculum vitae

...

notícia

reportagem

crônica social

crônica esportiva

...

histórico

relato histórico

ensaio ou perfil biográfico

biografia

...

Discussão de problemas sociais controversos

Argumentar

Sustentação, refutação e negociação

de tomadas de posição

texto de opinião

diálogo argumentativo

carta de leitor

carta de reclamação

carta de solicitação

deliberação informal

debate regrado

assembleia

discurso de defesa (advocacia)

discurso de acusação (advocacia)

26

Sobre essa proposta, os tradutores da referida obra destacam em nota de rodapé que “[...] tomamos a liberdade

de inserir no Quadro 1 alguns gêneros que circulam com frequência em nossa sociedade e que não figuram no

Quadro original. Também aproximamos ou adaptamos a designação de alguns deles.” (ROJO; CORDEIRO,

2011, p. 51).

102

resenha crítica

artigos de opinião ou assinados

editorial

ensaio

...

Transmissão e construção de saberes

Expor

Apresentação textual de diferentes

formas dos saberes

texto expositivo (em livro didático)

exposição oral

seminário

conferência

comunicação oral

palestra

entrevista de especialista

verbete

artigo enciclopédico

texto explicativo

tomada de notas

resumo de textos expositivos e explicativos

resenha

relatório científico

relatório oral de experiência

...

Instruções e prescrições

Descrever ações

Regulação mútua de

comportamentos

instruções de montagem

receita

regulamento

regras de jogo

instruções de uso

comandos diversos

textos prescritivos

...

Fonte: Schneuwly e Dolz (2011 [1996], p. 51-52)

A partir do exposto, é possível observar que um gênero é agrupado junto a outros

conforme a combinação em comum dos três critérios já citados. No entanto, os autores

destacam a impossibilidade de ter, em um dos agrupamentos, uma forma cristalizada de

classificação, devido à própria interferência das condições de produção em uma dada situação

comunicativa. Por isso, um gênero pode transitar de uma categoria a outra, o que nos remete à

perspectiva bakhtiniana de que os gêneros são tipos relativamente estáveis de enunciados.

A propósito disso, outro aspecto a ser ressaltado é que, segundo Schneuwly e Dolz, os

gêneros do discurso não podem, por si sós, fornecer uma base suficientemente ampla para a

elaboração de progressões, uma vez que:

103

A própria diversidade dos gêneros, seu número muito grande, sua

impossibilidade de sistematização impedem-nos, pois, de tomá-los como

unidade de base para pensarmos uma progressão. Não há eixo de

continuidade que permitiria pensar a construção de capacidades, senão

aquele de dominar cada vez melhor um gênero, e outro, e outro e, por meio

deles, a arte de escrever em geral. (SCHNEUWLY; DOLZ, 2011 [1996], p.

49.).

Por esse viés, entende-se que a variabilidade contínua dos gêneros é uma característica

que impede a formalização mais sistemática para a organização curricular. Nesse sentido, é

preciso buscar elementos que proporcionem critérios mais claros para se pensar a progressão

com base no agrupamento de gêneros.

Para tanto, critérios como domínio social, tipologia e capacidades de linguagem

possibilitam o reconhecimento para com as possíveis semelhanças existentes entre alguns dos

gêneros do discurso, o que pode auxiliar na reflexão sobre os gêneros a serem selecionados e

a progressão didática a ser desenvolvida ao longo de cada ano/ciclo de ensino.

Seguir a proposta apresentada consiste em elencar, em todos os níveis de escolaridade,

gêneros de cada um dos agrupamentos, de modo que os alunos desenvolvam capacidades

necessárias para dominar algumas das variadas produções de linguagem. Isso é, para os

autores, a chamada aprendizagem em espiral, segundo a qual um mesmo gênero pode ser

abordado diversas vezes ao longo da escolaridade, com objetivos cada vez mais complexos;

ou, diferentes gêneros de um mesmo agrupamento podem ser abordados no decorrer de cada

ano/ciclo escolar, em níveis crescentes de complexidade.

Percebe-se, assim, que tal proposta não se baseia no fundamento de adotar gêneros

mais fáceis ou mais difíceis a um ano ou ciclo escolar, mas sim uma abordagem diferenciada

a cada momento de escolarização. Trata-se de apresentar novos desafios aos alunos,

oportunizando-lhes descobrir o que antes não foi explorado.

Vejamos o que diz Barbosa a respeito do agrupamento de gêneros, assim como

definido por Schneuwly e Dolz.

Essa não é a única possibilidade que poderíamos conceber para agrupar

gêneros, mas tal classificação possui a vantagem de tematizar o contexto

social e histórico - pelo critério de domínio social de comunicação - e de

considerar aspectos relativos ao ensino/aprendizagem dos gêneros -

capacidades de linguagem envolvidas. O importante em uma classificação de

gêneros, seja esta ou outra qualquer, é permitir que se possa efetivar uma

progressão curricular. (BARBOSA, 2008, p. 171).

104

Em outro momento, Barbosa (2001) também afirma que a proposta dos autores

genebrinos concretiza-se como a sistematização de um trabalho em torno dos gêneros do

discurso, já que pode favorecer um tratamento da linguagem em consonância com o

desenvolvimento das capacidades linguísticas e discursivas, além das finalidades sociais de

comunicação. Em razão disso, ela afirma que a proposta de Schneuwly e Dolz serve como

ponto de partida para a efetivação de novas abordagens sobre a progressão com base no

agrupamento de gêneros.

Dito de outro modo, compreende-se que a organização de uma progressão temporal,

tal como aqui esboçada, evoca a gradação de aptidões necessárias à produção de texto com

base num gênero. Por isso, a sua relevância pode ser constatada, uma vez que possibilita o

enfoque com a diversidade e a especificidade dos gêneros escritos, permitindo ao aluno o

acesso a importantes conhecimentos sobre o modo de funcionamento da linguagem.

Isso, certamente, vai ao encontro do que é tencionado pelos PCN (BRASIL, 1997, p.

33), ao objetivar que os alunos “[...] adquiram progressivamente uma competência em relação

à linguagem que lhes possibilite resolver problemas da vida cotidiana, ter acesso aos bens

culturais e alcançar a participação plena no mundo letrado.”. Ou como preconizado pelo Guia

do PNLD/2010 (BRASIL, 2010, p. 168), ao orientar que o ensino deve levar em conta “[...] o

processo de apropriação e de desenvolvimento, pelo aluno, da linguagem escrita e da

linguagem oral [...] em situações o mais complexas e variadas possível.”.

Sobre os PCN, inclusive, é válido ressaltar que esses documentos apresentam em suas

orientações, algumas sugestões de gêneros adequados para o trabalho com a linguagem

escrita. A seguir, veem-se essas sugestões que são, respectivamente, para o 1º e 2º ciclo do

EF.

105

Figura 1: Sugestão de gêneros para o 1º ciclo do EF

Fonte: PCN (BRASIL, 1997, p. 72-73)

Figura 2: Sugestão de gêneros para o 2º ciclo do EF

Fonte: PCN (BRASIL, 1997, p. 82)

106

No entanto, apesar de os PCN apresentarem essas sugestões, não há definição nem

clareza quanto aos critérios utilizados para a seleção desses gêneros. Os documentos, por

outro lado, são enfáticos quanto à importância de variar o grau de aprofundamento e de

sistematização para com os conteúdos de língua portuguesa.

Por isso, entendemos que os PCN preveem que o professor aborde a apropriação

diversificada dos gêneros ao longo dos anos iniciais do EF, de forma a adequar o grau de

complexidade dos objetivos de ensino às possibilidades de aprendizagem dos alunos.

É oportuno esboçar, por sua vez, o princípio de organização (agrupamento) dos

gêneros do discurso, sugerido por Rodrigues (2001). Visando a um ensino pautado na

diversidade das formas relativamente estáveis de enunciados, a autora propõe que as

diferentes esferas sociais constituam-se como critério pertinente para a organização desses

gêneros.

Nessa perspectiva, pode-se falar de gêneros cotidianos, literários, religiosos,

jurídicos, escolares, científicos, jornalísticos etc. como princípio de

agrupamento de gêneros que mantêm entre si determinados aspectos em

comum. Os gêneros estão vinculados às esferas sócio-comunicativas. Eles se

formam e se desenvolvem à medida que se desenvolve e se ‘complexifica’ a

sua esfera social. Eles ‘refletem’ nos seus diferentes momentos constitutivos

as particularidades da sua situação social, constituem-se como ‘modelos’

(referências) para a construção e interpretação dos discursos das suas esferas.

(RODRIGUES, 2001, p. 74).

De acordo com o exposto, essa proposta de organização considera que cada esfera da

comunicação discursiva (cotidiana, literária, religiosa, jurídica, escolar, etc.) gera gêneros

particulares, o que implica a concretização de uma das formas do intercâmbio comunicativo

social, específicos para cada esfera. Trata-se, pois, de estudar os gêneros como um tipo de

enunciado que tem contornos próprios, de forma a atender as necessidades de uma dada

situação da atividade humana.

No entanto, se o repertório de gêneros é ampliado à medida que cada esfera se

desenvolve e se complexifica, Rodrigues ressalta que não é possível criar um agrupamento de

gêneros estável e definitivo. No caso, em decorrência da relativa estabilidade dos gêneros, a

proposta por ela apresentada está sujeita a revisões e sugestões.

107

Obviamente, se variados agrupamentos são pautados por diferentes critérios,

provavelmente algumas características são priorizadas em detrimento de outras. Por isso,

observa-se que:

O estabelecimento de agrupamentos, como toda classificação fatalmente

apresentará problemas: desconsiderará algum aspecto que alguém julgará

relevante; apresentará exceções; excluirá algum elemento que, por sua

natureza, deveria fazer parte de um dos conjuntos; incluirá algum elemento

que não compartilha de todas as propriedades comuns; apontará intersecções

etc. Mas a classificação é condição para o desenvolvimento epistemológico,

pois nos obriga a comparar, a estabelecer relações, a perceber o singular e o

comum etc., o que nos ajuda na compreensão dos fenômenos.

(BARBOSA, 2001, p. 122, grifo nosso).

Com base nisso, as categorias de análise desta pesquisa (gêneros do discurso e

situações de produção) foram organizadas a partir das diferentes contribuições partilhadas

pelos referenciais aqui utilizados, mediante a influência de cada teórico, de cada documento.

Em consonância, portanto, com o percurso traçado acerca do tratamento dos gêneros

no decorrer da escolarização, é possível observar que os diferentes referenciais apresentam

elementos que contribuem para nossas análises nas coleções didáticas. Há, desse modo,

parâmetros que nos permitem fazer uma análise mais sistemática sobre os elementos

orientadores para a produção escrita.

Conjetura-se que esses materiais didáticos teçam orientações que emanem a

diversidade de gêneros escritos em suas especificidades, desde os primeiros anos do Ensino

Fundamental. Há, com isso, o desejo subentendido de encontrar orientações que ajudem os

alunos a construir representações adequadas às situações extraescolares de escrita.

O que podemos depreender do recorte que fizemos no decorrer deste texto é a

preocupação com a busca de um ensino de língua materna que responda, relativamente, aos

diálogos da linguagem bakhtiniana com a educação freireana - “[...] o pensar em uma prática

pedagógica enquanto ação compartilhada que humaniza o próprio processo educativo [...]

enquanto construção de vozes sociais e históricas que dialogam para serem ouvidas,

respondidas e reapreciadas.” (p. 69).

Por essa acepção, compreende-se que as produções textuais com base nos gêneros do

discurso disponibilizam as condições pedagógicas que podem levar o aluno a: quebrar a

fronteira entre a escola e a sociedade; conhecer a multiplicidade de experiências humanas;

108

circunscrever as formas de dizer que circulam socialmente; responder às exigências postas

pelas práticas sociais; agir com a linguagem de forma mais eficaz.

Logo, se há compreensão sobre as diversas funções sociais de escrita, as produções

com base nos gêneros também podem levar o aluno ao entendimento de que escrever é:

emoldurar o conteúdo da vida real; sintonizar-se com a situação concreta de comunicação;

construir e socializar conhecimentos; entretecer elogios, desculpas, julgamentos, instruções,

dentre outas tessituras do pensar e do agir.

Escrever na escola deve ser visto, portanto, como uma ação interlocutiva para

aprender, refletir, sentir e viver, no direito de dizer sua palavra, numa consciência dialogada

com o mundo da vida.

109

4 PERCURSO METODOLÓGICO: DESCORTINANDO OS CAMINHOS PARA A

ANÁLISE DO ENSINO DA PRODUÇÃO TEXTUAL

As metodologias são [...] modos de fazer: objetos domésticos, rodovias,

argumentos, teses, pinturas, esculturas, culinárias. Para cada uma das coisas

feitas, por um sujeito, há uma metodologia. [...] Para cada uma das coisas

feitas, por inúmeros sujeitos, existem inúmeros modos de fazer. [...] No

seguinte passo, podem perceber que a pesquisa não cria apenas

interpretações. A pesquisa cria metodologias enquanto cria interpretações. O

fazer alimenta o pensamento que mobiliza a arte de refazer diferente.

(HISSA, 2013, p. 125, grifo do autor).

Trataremos, neste capítulo, dos caminhos metodológicos percorridos em nossa

pesquisa, descrevendo os procedimentos referentes à construção, recorte e análise dos dados.

A metodologia aqui adotada visa, sobretudo, a construção de dados que deem

visibilidade as propostas de produção escrita estruturadas nas coleções didáticas. Nossa

preocupação deriva, exatamente, do percurso histórico da área de língua portuguesa enquanto

disciplina curricular, como também dos elementos históricos constitutivos a ela relacionada:

elitização do ensino; tradição relativamente recente de livros didáticos para a infância;

ausência de materiais sem quaisquer orientações didáticas, tendo a voz predominante do

professor na realização das aulas; uso da escrita para a produção de bons textos e

ortograficamente corretos.

Além disso, no movente percurso desenhado pela investigação, a abordagem

metodológica nasceu vinculada aos referenciais teóricos que sustentam o nosso estudo,

imprescindíveis não somente à definição do que foi investigado, mas também à análise dos

dados que foram construídos. Por isso, os modos de fazer estabeleceram relações com os

modos de pensar desta dissertação, exercitando a prática no exercício com a reflexão teórica,

especialmente, de reflexões fundamentadas na perspectiva bakhtiniana sobre os gêneros do

discurso.

110

4.1 O pesquisador e o pesquisado: aproximação versus distanciamento

Levando em conta que o objeto desta investigação refere-se aos elementos

constitutivos da produção escrita (gêneros do discurso e situações de produção), lembremos

que, teoricamente, o capítulo três abordou os gêneros em conformidade com os estudos de

Bakhtin, relacionando com outros conceitos centrais desenvolvidos pelo autor, tais como

linguagem, relação dialógica, enunciado e texto.

Com base nisso, optamos por uma metodologia que trata as ciências humanas pela

perspectiva bakhtiniana, de forma a explicarmos o posicionamento do pesquisador durante a

trajetória metodológica.

Nas palavras de Bakhtin (2011), as ciências humanas têm o texto como objeto de

pesquisa, visto que o intelecto não está diante de um objeto mudo ou de um fenômeno natural,

mas sim de um texto que traz a expressão de um sujeito. Ou seja, na medida em que o objeto

de análise é integralmente um texto (enunciado), materializa-se o pensamento de alguém, em

sua visão valorativa sobre o mundo.

Nesse sentido, a produção de conhecimentos está necessariamente apoiada na relação

entre investigador e investigado. Em outros termos, nós, enquanto pesquisadores, situamo-nos

axiologicamente diante dos sujeitos da pesquisa, sendo estes representados pelos autores das

coleções didáticas.

Por esse contexto, a análise feita não se limita a uma mera transcrição dos

conhecimentos produzidos durante a coleta de dados, como se a pesquisa resultasse de dados

assépticos, neutros e abstratos. Trata-se, pois, de uma análise baseada na posição valorativa do

pesquisador e do sujeito a conhecer, a fim de que os sentidos sejam produzidos e,

simultaneamente, interpretados.

Parece-nos fundamental entretecer, então, que:

Cada palavra (cada signo) do texto leva para além dos seus limites. Toda

interpretação é o correlacionamento de dado texto com outros textos. O

comentário. A índole dialógica desse correlacionamento. [...] A interpretação

como correlacionamento com outros textos e reapreciação em um novo

contexto (no meu, no atual, no futuro). O contexto antecipável do futuro: a

sensação de que estou dando um novo passo (saí do lugar). [...] O texto só

tem vida contatando com outro texto (contexto). Só no ponto desse contato

de textos eclode a luz que ilumina retrospectivas e prospectivamente,

iniciando dado texto no diálogo. Salientemos que esse contato é um contato

111

dialógico entre textos (enunciados) e não um contato mecânico de ‘oposição’

[...] Por trás desse contato está o contato entre indivíduos e não entre coisas

[...]. (BAKHTIN, 2011, p. 400-401).

Similarmente, em outro momento, Bakhtin/Volochínov (2012, p. 137) afirma que

“Compreender27

é opor à palavra do locutor uma contrapalavra [...] como uma faísca elétrica

que só se produz quando há contato dos dois pólos opostos.”.

Vê-se, então, que, para o pensamento bakhtiniano, a interpretação é um processo ativo

e responsivo, constituído dialogicamente e manifestado pelo encontro de dimensões

axiológicas com quem se interage.

Desse modo, a nossa interpretação não deve ser entendida simplesmente como um

reconhecimento passivo, como mera decodificação de um objeto contemplado. Ao contrário,

para esta pesquisa, entende-se que a análise dos dados é uma réplica ativa, uma tomada de

posição diante do texto, de forma a reagirmos valorativamente às manifestações que nos

cercam.

Por esse entendimento, é possível perceber que a abordagem bakhtiniana transpõe a

epistemologia convencional, a qual defende a neutralidade do pesquisador para com o objeto,

em vista de obter o êxito da pesquisa. Todavia, questionamos: “Quando leio o mundo, como

retirar a minha história de leituras do mundo [...], de modo a permitir, paradoxalmente, uma

leitura asséptica que faço do mundo? Como fazer que a minha leitura do mundo exista

independentemente da minha existência?”. (HISSA, 2013, p. 175, grifo do autor).

Por isso, defendemos que a nossa presença deve ser compreendida como

condicionante para a produção de conhecimentos com o outro, e não para o outro. É, portanto,

um procedimento metodológico que reconhece que a análise assevera nossos valores enquanto

pesquisador, ao fazer réplicas ao dito, ao enunciar concordâncias, objeções e confirmações, ao

buscar responsivamente um sentido diante da posição valorativa do outro - os autores das

coleções didáticas.

Por outro lado, Bakhtin destaca também a importância de o pesquisador assumir um

certo distanciamento/estranhamento do objeto falado/falante, o que nos remete ao conceito de

exotopia, que consiste no encontro com o outro a partir de um lugar exterior. Se para Bakhtin

27

Bakhtin utiliza os termos interpretação e compreensão como equivalentes.

112

(2011, p. 341) “Ser significa ser para o outro e, através dele, para si”, esse lugar exterior

possibilita que se veja algo que o sujeito pesquisado, em sua posição, não pode ver.

Logo, assumimos também o nosso lugar exotópico como condição para a análise

interpretativa desta pesquisa. Assim como somos responsáveis em completar os sujeitos da

pesquisa, reconhecemos que também precisamos deles para dar forma ao nosso pensamento,

criando uma negociação de sentidos e confronto interdependente de ideias.

Para destacar a importância das ciências humanas esboçada por Bakhtin, Brait

preconiza que tal abordagem:

[...] tem a vantagem de valorizar o corpus e despertar no

leitor/analista/fruidor a capacidade de dialogar com esse corpus e, a partir de

sua materialidade, de suas particularidades, surpreender nas incontáveis

formas assumidas pela língua, no caso a Língua Portuguesa, o interdiscurso,

as memórias aí contidas e em constante movimento [...]. (BRAIT, 2008, p.

16-17).

Por esse raciocínio, ainda que não tenhamos um contato face a face com os respectivos

autores das coleções didáticas escolhidas, entende-se que as nossas vozes somadas às deles

estão materializadas não por uma relação de ordem impessoal e neutra, mas por uma relação

de sentidos marcada pelos modos de ser, de dizer, de fazer, de pensar, de silenciar, de

dialogar, de influenciar, de se deixar influenciar, de compreender o mundo, etc.

4.2 Critérios de escolha das coleções didáticas

Como já mencionado na Introdução desta dissertação, o presente estudo vincula-se ao

projeto Leitura e escrita: recortes inter e multidisciplinares no ensino de matemática e

português. Em razão disso, tomamos como parâmetro um dos campos de investigação do

projeto - coleções didáticas de língua portuguesa para o 4º e 5º do Ensino Fundamental,

aprovadas pelo PNLD 2010 e adotadas em escolas da rede pública municipal de Natal/RN,

situadas aquém da meta do IDEB 2009.

Essas informações foram coletadas, primeiramente, junto à Secretaria Municipal de

Educação de Natal/RN. Posteriormente, a fim de confirmar as informações recebidas, os

113

membros do CONTAR fizeram-se presentes nas escolas, para que a equipe de professores

respondesse a um questionário. Dentre as perguntas feitas, destacamos:

Figura 3: Modelo de questionário

Fonte: Programa Observatório da Educação (“Leitura e escrita: recortes inter e

multidisciplinares no ensino de matemática e português”; CAPES/INEP; Grupo

CONTAR - UFRN; Centro de Educação)

Ao observar que a Secretaria e os professores forneceram informações sem

discrepâncias, elaborou-se um quadro apresentando as coleções adotadas pelas respectivas

escolas municipais de Natal abaixo do IDEB 2009.

114

Quadro 2: Coleções didáticas x Escolas municipais COLEÇÃO DIDÁTICA DE

LÍNGUA PORTUGUESA - 4º E 5° ANO

IDEB

2009

ESCOLAS MUNICIPAIS

1. CONHECER E CRESCER -

LÍNGUA PORTUGUESA

3,5 ESC. MUN. NOSSA SENHORA DA

APRESENTAÇÃO

3,4 ESC. MUN. CHICO SANTEIRO

2. INFÂNCIA FELIZ -

LÍNGUA PORTUGUESA

3,4 ESC. MUN. PROF. JOSÉ DE

ANDRADE FRAZÃO

3,1 ESC. MUN. CELESTINO PIMENTEL

3. A GRANDE AVENTURA –

COM ATUALIZAÇÕES

3,3 ESC. MUN. JOÃO PAULO II

4. ASAS PARA VOAR –

LÍNGUA PORTUGUESA

3,4 ESC. MUN. JUVENAL LAMARTINE

5. APRENDENDO SEMPRE –

LÍNGUA PORTUGUESA

3,0 ESC. MUN. SÃO JOSÉ

3,1 ESC. MUN. PROF. ULISSES DE GOIS

3,0 ESC. MUN. NOSSA SENHORA DAS

DORES

6. APRENDER JUNTOS -

PORTUGUÊS

3,1 ESC. MUN. PROF.ª FRANCISCA DA

SILVA

3,1 ESC. MUN. PROF. AMADEUS

ARAÚJO

2,7 ESC. MUN. PROF. MÁRIO LIRA

0,5 ESC. MUN. PROFESSOR FRANCISCO

DE ASSIS VARELA CAVALCANTI

7. A ESCOLA É NOSSA –

LÍNGUA PORTUGUESA

2,9 ESC. MUN. PROF.ª ALMERINDA

BEZERRA FURTADO

8. A AVENTURA DA LINGUAGEM 3,4 ESC. MUN. PROF. BERNARDO DO

NASCIMENTO

9. PORTUGUÊS - LINGUAGENS 3,5 ESC. MUN. PROF. MARECI GOMES

DOS SANTOS

3,0 ESC. MUN. PROF. JOSÉ DO

PATROCINIO PEREIRA PINTO

10. DE OLHO NO FUTURO –

LÍNGUA PORTUGUESA

2,8 ESC. MUN. PROF. LUIS MARANHÃO

FILHO

3,5 ESC. MUN. PROF.ª JOSEFA

BOTELHO

3,4 ESC. MUN. PROF.ª LOURDES

GODEIRO

11. HOJE É DIA DE PORTUGUÊS 3,5 ESC. MUN. PROF.ª FRANCISCA DE

OLIVEIRA

Fonte: Programa Observatório da Educação (“Leitura e escrita: recortes inter e

multidisciplinares no ensino de matemática e português”; CAPES/INEP; Grupo CONTAR -

UFRN; Centro de Educação)

Vê-se, então, que o quadro exposto contempla apenas as coleções trabalhadas nos 4º e

5º anos, embora o projeto tenha feito a coleta de dados sobre todo o conjunto de livros

didáticos adotados no Ensino Fundamental, bem como de níveis correspondentes a Educação

de Jovens e Adultos.

Para a análise desta pesquisa, no caso, apreciamos as coleções dos anos iniciais do EF

em todos os seus volumes - do 1º ao 5º ano. Por isso, não fizeram parte desta pesquisa as

115

coleções Asas para voar, Aprender Juntos e De olho no Futuro, por não terem sido aprovadas

pelo PNLD 2010 no que se refere ao 1º e ao 2º ano.

Para uma melhor visualização, construímos outro quadro, de forma a mostrar as

coleções didáticas selecionadas, com seus respectivos autores e editora.

Quadro 3: Coleções didáticas para análise - 1º ao 5º ano

Coleção Nome Autor(es) Editora

1 Conhecer e Crescer - Cristiane Buranello Escala

Educacional

2 Infância Feliz - Albanize Aparecida Arêdes Neves

- Ângelo Alexandref Stefanovits

- Míriam dos Santos Grilo

Escala

Educacional

3 A Grande Aventura - Vera Regina Lima Anson

- Maria Regina Carvalho da Silva

FTD

4 Aprendendo Sempre - Cláudia Miranda

- Vera Lúcia Rodrigues

Ática

5 A Escola é Nossa - Márcia Aparecida Paganini Cavéquia Scipione

6 A Aventura da Linguagem - Silvana Costa

- Zélia Almeida

- Maria Luisa Campos Aroeira (livro do 1º

ano)

- Luiz Carlos Travaglia (livros do 2º ao 5º

ano)

Dimensão

7 Português: Linguagens - Thereza Cochar Magalhães

- William Roberto Cereja

Atual

8 Hoje é Dia de Português - Samira Campedelli Positivo

Com base nisso, lembremos que, inicialmente, utilizamos as oito coleções didáticas (5

livros didáticos cada uma/1º ao 5º ano) para responder as seguintes questões de pesquisa:

Quais são os gêneros do discurso e as esferas sociais priorizados no ensino de produção

escrita?

No ensino de produção escrita, a diversidade dos gêneros do discurso é efetivamente

trabalhada nas coleções didáticas?

Além disso, é válido ressalvar que, para os anos iniciais do Ensino Fundamental, o

PNLD apresenta coleções didáticas de Letramento e Alfabetização, como também coleções

didáticas de Língua Portuguesa. A primeira, oferecida para os dois primeiros anos do

116

primeiro segmento (1º e 2º ano), destina-se ao processo inicial de alfabetização e letramento;

e a segunda, oferecida para os três últimos anos do primeiro segmento (3º, 4º e 5º ano)28

,

destina-se a desenvolver e a consolidar esse processo de letramento e alfabetização

linguística. No entanto, segundo o Guia do PNLD 2010:

[...] os cinco primeiros anos formam um segmento integrado do novo ensino

fundamental, por mais que o ciclo de letramento e alfabetização iniciais, de

um lado, e o de consolidação desse processo, de outro, devam receber

tratamentos didático-pedagógicos próprios. Assim, convém que os

professores considerem, tanto na leitura das resenhas quanto na escolha das

coleções para a primeira e a segunda etapas desse período da escolarização,

propostas compatíveis, não só entre si, mas também com as opções do

projeto pedagógico da escola e dos professores responsáveis por um e outro

momentos. (BRASIL, 2010, p. 27).

Desse modo, mesmo com objetivos específicos, compreende-se que cada ciclo precisa

complementar-se em seu trabalho didático-pedagógico, em vista da construção do ensino-

aprendizagem da língua materna. Inclusive, para ambos os ciclos, o Guia do PNLD 2010

ressalta a importância de desenvolver a proficiência na escrita, de acordo com a exploração

dos mais diversos gêneros, evitando, pois, o uso descontextualizado da produção de texto.

Assim, entendemos que, mesmo que esta dissertação não desenvolva estudos

específicos sobre o processo de alfabetização inicial, acreditamos que os referenciais teóricos

utilizados neste trabalho nos permitiram fazer uma análise sobre o tratamento dado aos

gêneros do discurso não só nas coleções didáticas de Língua Portuguesa, como também nas

de Letramento e Alfabetização.

Por conseguinte, para responder ao questionamento “Como é abordada a situação de

produção em que o texto escrito deverá ser produzido?”, escolhemos, dentre as oito coleções

selecionadas para a pesquisa, duas delas (5 livros didáticos cada uma/1º ao 5º ano) para

compor o segundo momento de análise.

Para realizar tal escolha, recorremos às resenhas elaboradas pelos pareceristas do

PNLD 2010, os quais mencionam o perfil de cada coleção aprovada, com suas qualidades e

ressalvas. Logo, a avaliação contida nas resenhas foi tratada como dado válido para o

levantamento de hipóteses sobre as situações de produção presentes nas obras didáticas.

28 Nas escolas da rede pública municipal de Natal, o 3º ano encontra-se inserido no ciclo destinado à

alfabetização inicial.

117

Através da leitura das resenhas, percebeu-se, a princípio, que as coleções explicitam

para o aluno as situações de produção, umas, porém, priorizando mais que outras. Levando

isso em conta, estabeleceu-se a escolha de duas coleções, conforme os seguintes critérios:

1. Uma coleção que, possivelmente, apresenta um excelente trabalho com a situação de

produção, contemplando os diferentes contextos social, funcional e linguístico-discursivo;

2. Uma coleção que, possivelmente, contribui de forma parcial com a situação de produção,

evidenciando lacunas para com o tratamento dado aos contextos social, funcional e

linguístico-discursivo.

É importante enfatizar que não figurou como objetivo deste trabalho julgar ou validar

as avaliações feitas pelos pareceristas do PNLD 2010. Intencionou-se, na verdade, recorrer à

riqueza das informações contidas nesse programa, a fim de obter “pistas” sobre a situação de

produção no texto escrito. Por isso, a partir dessa seleção, visamos a análise de duas coleções,

as quais sirvam como amostra para dois parâmetros de excelência de material didático,

concernente à produção textual.

Esse tipo de procedimento remete-nos ao método denominado paradigma indiciário,

baseado nos estudos de Ginzburg (1991). Segundo o autor, tal abordagem focaliza os resíduos

e os dados marginais e que, ao considerar os pormenores e as características de detalhes, pode

oferecer ao investigador o levantamento de indícios e de hipóteses reveladores sobre os

aspectos da realidade. Para nós, tal abordagem contribui, portanto, para uma pesquisa de

caráter interpretativista e indutiva.

Corroborando ao pensamento de Padilha e Barros-Mendes (2008, p. 122), esse

procedimento é o que “[...] a nosso ver, melhor possibilita captar indícios revelados a partir

[...] das resenhas para selecionar livros didáticos em uma pesquisa que busca tomá-los como

corpora.”.

Portanto, com base no paradigma indiciário, selecionamos as duas coleções que

compõem o segundo momento de análise.

118

Quadro 4: Coleções didáticas para análise - 1º ao 5º ano

Coleção didática

Critério 1 - Aprendendo Sempre

1º ano 2º ano 3º ano 4º ano 5º ano

Critério 2 - A Aventura da Linguagem

1º ano 2º ano 3º ano 4º ano 5º ano

Em geral, observa-se que o percurso aqui traçado expressa a construção de um objeto

de estudo elaborado cautelosamente, a partir de diálogos que se entrelaçam para dar forma à

presente pesquisa. Escolha de um caminho teórico-metodológico que possibilita a ampliação

de interpretações e o refinar de possibilidades, mediante um processo que cultiva o pensar e o

repensar, o fazer e o refazer.

4.3 A natureza da pesquisa

Ao considerar a perspectiva bakhtiniana na relação entre pesquisador e pesquisado,

esta pesquisa fundamenta-se nas abordagens quantitativa e qualitativa, por estas se firmarem

como métodos pertinentes à realização deste trabalho.

Em vista disso, com base nas definições de Chizzotti (2010), o estudo proposto

apresenta características qualitativas, por ressaltar os sentidos contidos nas ações e inter-

relações criadas pelos sujeitos integrantes do processo de conhecimento; e características

119

quantitativas, por dimensionar e quantificar os dados, mediante instrumentos adequados à

mensuração e à análise.

No entanto, a mensuração quantitativa não teve a finalidade de propor meramente a

explicação do conjunto de dados coletados, mas de produzir informações válidas que

aprofundassem, com maior fidedignidade, os dados interpretados qualitativamente.

Sobre a possibilidade de relacionar o quantitativo com o qualitativo, buscamos em

Santos Filho e Sánchez Gamboa, respectivamente, uma prática de pesquisa que procura

articulá-las e complementá-las, a fim de superar as aparentes contradições existentes entre

elas.

[...] é pragmaticamente defensável que no presente estágio de

desenvolvimento do conhecimento humano, e de modo especial na área das

Ciências Humanas e da Educação, se admita e se adote a articulação e

complementaridade dos paradigmas a fim de fazer avançar o conhecimento

humano. [...] A tolerância e o pluralismo epistemológico justificam a não

admissão de uma única ratio e a aceitação do pluralismo teórico-

metodológico nas Ciências Humanas e da Educação. (SANTOS FILHO,

2013, p. 52).

[...] na medida em que inserimos os dados na dinâmica da evolução do

fenômeno e este dentro de um todo maior compreensivo, é preciso articular

as dimensões qualitativas e quantitativas, em uma inter-relação dinâmica,

como categorias utilizadas pelo sujeito na explicação e compreensão do

objeto. Como vemos, a superação do falso dualismo técnico implica a

abrangência de outros elementos constitutivos do processo científico [...]

extrapolando as polarizações entre quantidade-qualidade, sujeito-objeto,

explicação-compreensão etc. (SÁNCHEZ GAMBOA, 2013, p. 104).

Observa-se, portanto, que as dimensões quantitativa e qualitativa podem estar

intimamente imbricadas, como modo de ampliar e de complementar os elementos

constitutivos da investigação. Nesse caso, embora de naturezas diferentes, é possível que

ambas dialoguem, em função da riqueza de conhecimentos que pode ser agregada entre elas.

Por isso, na abordagem quantitativa, fizemos o levantamento de todos os gêneros do

discurso solicitados para as atividades de produção escrita e presentes nas coleções

escolhidas. Além disso, realizamos, a priori, o levantamento de um dos elementos

correspondentes à categoria de análise “contexto histórico-social” - a esfera de circulação à

qual o gênero está vinculado. Para uma melhor visualização sobre a incidência desses gêneros

120

e dessas esferas, apresentamos os dados em quadros e gráficos, analisando-os também

qualitativamente.

Posteriormente, à luz da teoria bakhtiniana e de seus adeptos, verificamos, através da

abordagem qualitativa, como a situação de produção é orientada nas coleções didáticas - se e

de que forma explicitam os aspectos relativos a alguns elementos do contexto histórico-social,

funcional e linguístico-discursivo de um texto escrito.

O quadro, a seguir, sintetiza o exposto, relacionando as questões de pesquisa, a

metodologia adotada, as categorias de análise e as coleções didáticas escolhidas.

Quadro 5: Procedimentos de análise

Questões de pesquisa Metodologia

adotada

Categorias de análise Coleções didáticas

1. Quais são os gêneros do

discurso e as esferas

sociais priorizados no

ensino de produção

escrita?

2. No ensino de produção

escrita, a diversidade dos

gêneros do discurso é

efetivamente trabalhada

nas coleções didáticas?

Quantitativa

Qualitativa

-Identificação e recorrência

dos gêneros do discurso.

-Identificação e recorrência

das esferas sociais.

40 livros didáticos referentes

às oito coleções escolhidas

para análise:

- Conhecer e Crescer;

- Infância Feliz;

- A Grande Aventura;

- Aprendendo Sempre;

- A Escola é Nossa;

- A Aventura da Linguagem;

- Português: Linguagens;

- Hoje é Dia de Português.

3. Como é abordada a

situação de produção em o

que o texto escrito deverá

ser produzido?

Qualitativa -Orientações sobre a

situação de produção

(contexto histórico-social,

funcional e linguístico-

discursivo).

10 livros didáticos referentes

às duas coleções escolhidas:

-Aprendendo Sempre;

- A Aventura da Linguagem.

Pela natureza dos dados aqui analisados, as abordagens quantitativa e qualitativa não

se excluíram nem se opuseram na pesquisa. Ao contrário, ambas convergiram na

complementaridade mútua, articulando-se na dinâmica da produção do conhecimento e unidas

por um só propósito - analisar os elementos intrínsecos à produção escrita.

121

4.3.1 Mapeando os caminhos da natureza quantitativa da pesquisa

No procedimento quantitativo dos dados, fizemos o levantamento de todos os gêneros

do discurso e esferas sociais envolvidos nas seções específicas para a produção do texto

escrito, a partir do que foi pedido nos enunciados das atividades.

Inicialmente, listamos os gêneros trabalhados nos volumes de cada coleção didática,

seguindo a nomeação utilizada pelos próprios autores das obras analisadas. Em alguns poucos

casos, quando o gênero foi apenas implicitamente sugerido na orientação, precisou-se

consultar referenciais teóricos e documentos oficiais, sobretudo, o Guia do PNLD/2010, a fim

de conferir a identificação do gênero com base em suas relativas características. Com a

identificação feita, relacionamos os gêneros com as esferas de maior influência no contexto

escolar.

É importante ressalvar que seguimos a definição proposta por Schneuwly e Dolz

(1997), complementada também por Rojo (2000), quanto aos gêneros escolares e gêneros

escolarizados.

Conforme visto no capítulo dois, para os autores genebrinos, há gêneros que

funcionam como instrumento de comunicação escolar, por se cristalizarem em formas de

linguagem sistematicamente específicas da escola, como os tipos textuais sedimentados pela

tradição escolar. Esses “gêneros” são classificados pelos autores como gêneros escolares 1.

Rojo os denomina, por sua vez, de gêneros escolares.

No caso, adotamos a expressão gêneros escolares, quando nos referimos às produções

autênticas desta esfera como, por exemplo, a narração, a descrição, a dissertação, a

argumentação, o texto opinativo, o texto expositivo, etc.

Os gêneros escolares 2 são, para os autores genebrinos, objetos de ensino-

aprendizagem que, migrados de outras esferas sociais, são utilizados na sala de aula. Rojo, no

caso, os denomina de gêneros escolarizados, uma vez que são transpostos para a escola com

finalidades didáticas.

Baseando-se nisso, os gêneros escolarizados são, para nós, os gêneros concebidos de

outras esferas mais amplas, como o artigo de opinião, o anúncio-classificado, o e-mail, a

cantiga de roda, a carta comercial, a biografia, etc.

No que se refere à recorrência das esferas sociais, pautamo-nos, sobretudo, nos

estudos de Rodrigues (2001; 2005), ao destacar a importância de correlacionar os gêneros do

122

discurso às esferas da atividade humana (cotidiana, científica, escolar, religiosa, artística,

jornalística, jurídica, etc.), tendo em vista que os gêneros se constituem e se estabilizam

historicamente no interior dessas esferas. Assim, a nomeação das esferas correspondentes aos

gêneros contemplados, baseia-se na proposta sugerida por Rodrigues, no que condiz ao

agrupamento de gêneros mediante às suas esferas de origem.

Os resultados obtidos por essa cartografia proporcionaram não apenas a visualização

dos gêneros e das esferas abordados nos volumes de cada coleção, como também o subsídio

para a produção dos dados subsequentes. Vejamos um exemplo da coleta feita em um dos

volumes das coleções, mediante a construção de um quadro, com indicação da unidade e/ou

capítulo do livro, gênero solicitado, esfera de origem e página(s) em que a produção é

solicitada.

Quadro 6: Amostra de gêneros contemplados no 5º ano x Conhecer e Crescer

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Narração Escolar 17 a 19

2 Notícia Jornalística 41

Foto-legenda Jornalística 46

3 Artigo informativo Jornalística 64 e 65

4 Narração Escolar 91

5 Crônica Jornalística 121 a 123

6 Dissertação Escolar 137

7 Anúncio Publicitária 151 e 152

Após produzir esse quadro com cada coleção didática e com seus respectivos volumes

(1º ao 5º ano), partimos para outra coleta de dados - levantamento dos gêneros do discurso e

das esferas sociais por ano inicial do EF. Para o 4º ano, por exemplo, reunimos os gêneros e

as esferas que apareceram em todas as coleções no tocante a esse nível de ensino, elaborando,

pois, quadros como estes:

123

Quadro 7: Amostra de gêneros contemplados no 4º ano do EF

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 17 Escolar

Conto; conto (indígena, de fadas, de

aventura)29

8 Literária

Entrevista 7 Jornalística

Artigo de opinião 5 Jornalística

Cartaz 5 Publicitária

Descrição 5 Escolar

Notícia 5 Jornalística

Lista 5 Cotidiana

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Quadro 8: Amostra de esferas

contempladas no 4º ano do EF

Esfera Recorrência

Escolar 33

Jornalística 27

Literária 19

Cotidiana 17

Publicitária 17

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Com esse tipo de cartografia, pode-se verificar se há diversidade dos gêneros e das

esferas em cada ano inicial; quais destes anos apresentam mais diversidade; quais gêneros e

quais esferas são os mais e menos recorrentes em cada ano; dentre outros aspectos possíveis

de serem investigados.

Posteriormente, organizamos mais dois quadros - gêneros do discurso e esferas sociais

por ciclo de ensino. No caso das escolas municipais de Natal, lembremos que o 1º ciclo

refere-se ao 1º, 2º e 3º ano; e o 2º ciclo, ao 4º e 5º ano. Desse modo, a partir da coleta

anteriormente feita (gêneros e esferas contemplados por cada ano inicial do EF), listamos

todos os gêneros e todas as esferas que apareceram no 1º e no 2º ciclo (correspondentes às

oito coleções selecionadas), com suas respectivas ocorrências.

29 Em alguns livros das coleções didáticas, os autores nomeiam esse gênero apenas como conto e outros,

especificam como: conto indígena, conto de fadas e conto de aventura. Isso é recorrente não só no 4º ano, mas

também em outros níveis de ensino.

124

Quadro 9: Amostra de gêneros contemplados no 1º ciclo do EF

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 32 Escolar

Conto; conto (infantil, engraçado,

maravilhoso, popular, de fadas)

22 Literária

Descrição 20 Escolar

Poema 19 Literária

Lista 17 Cotidiana

Bilhete 14 Cotidiana

Ficha técnica 11 Científica

História em quadrinho(s) 11 Jornalística

Convite 10 Cotidiana

Receita 9 Cotidiana

Fábula 9 Literária

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Quadro 10: Amostra de esferas

contempladas no 1º ciclo do EF

Esfera Recorrência

Cotidiana 101

Escolar 80

Literária 56

Jornalística 30

Da tradição oral 27

Publicitária 25

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Com essa cartografia, é possibilitado ao pesquisador observar se há equivalência de

gêneros e de esferas entre o 1º e o 2º ciclo; quais os gêneros e quais as esferas priorizados em

cada uma dessas etapas de ensino; etc.

Por fim, elaboramos mais dois quadros, nos quais se contemplam os gêneros e as

esferas sociais selecionados para a produção escrita ao longo dos anos iniciais. Para essa

etapa, elaboramos um quadro com todos os gêneros explorados, contabilizando a quantidade

de vezes em que cada um aparece. O mesmo foi feito com a recorrência das esferas.

125

Quadro 11: Amostra de gêneros contemplados ao longo dos anos iniciais do EF

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 63 Escolar

Conto; conto (infantil, engraçado,

maravilhoso, popular, indígena, de

fadas, de aventura)

33 Literária

Poema 31 Literária

Descrição 28 Escolar

Lista 25 Cotidiana

Relato 19 Cotidiana

Bilhete 18 Cotidiana

História em quadrinho(s) 15 Jornalística

Entrevista 15 Jornalística

Ficha técnica 14 Científica

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Quadro 12: Amostra de esferas

contempladas ao longo dos anos iniciais do EF

Esfera Recorrência

Cotidiana 146

Escolar 140

Literária 99

Jornalística 79

Publicitária 49

Da tradição oral 41

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Para alcançar os objetivos desta pesquisa, os dois quadros acima foram os que mais

nos ajudaram, tendo em vista que fornecem uma visão geral dos gêneros e das esferas

trabalhados nas propostas de produção escrita, consoante a totalidade das coleções didáticas

que compõem o corpus da pesquisa.

Portanto, não tivemos a pretensão de analisar minuciosamente os dados contidos em

cada um dos quadros construídos, porém, nos apêndices da dissertação, apresentamos cada

quadro na íntegra, dada a riqueza das informações.

Pretendemos, com isso, criar uma Base de Dados a ser inserida no projeto Leitura e

escrita: recortes inter e multidisciplinares no ensino de matemática e português, contribuindo

com pesquisas a ele vinculadas. Além disso, desejamos que tal instrumento ajude a novos

126

pesquisadores, suscitando possíveis problemáticas advindas dos dados apresentados pelos

quadros construídos.

4.3.2 Mapeando os caminhos da natureza qualitativa da pesquisa

Para a elaboração das categorias de análise, realizamos a leitura interpretativa dos

conceitos teóricos, dos documentos oficiais e dos dados pré-coletados nas coleções didáticas

escolhidas. Para isso, buscamos as ideias contidas por trás dos textos, de forma que as

categorias foram construídas e reconstruídas segundo o exercício dialógico que se fez com

cada um desses referenciais.

Tal procedimento, essencialmente indutivo, constituiu-se como:

[...] um processo mental por intermédio do qual, partindo de dados

particulares, suficientemente constatados, infere-se uma verdade geral ou

universal, não contida nas partes examinadas. Portanto, o objetivo dos

argumentos indutivos é levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais

amplo do que o das premissas nas quais se basearam. [...] Portanto, como

primeiro passo, observamos atentamente certos fatos ou fenômenos.

Passamos da mesma espécie, segundo a relação constante que se nota entre

eles. Finalmente, chegamos a uma classificação, fruto da generalização da

relação observada. (MARCONI; LAKATOS, 2010, p. 68-69).

Por esse motivo, as categorias de análise produzidas foram além dos limites das falas e

dos fatos descritos, tendo em vista que as (re)descobertas foram feitas a cada nova

possibilidade de interpretação e construção de sentidos.

Para uma melhor visualização, destacamos a seguir alguns estudos que nos inspiraram

na construção mais direta e específica das categorias de análise. Ressaltamos que tais estudos

retomam os teóricos como Bakhtin, Freire, Faraco, Rojo e Rodrigues, assim como os

documentos oficiais (PCN e Guia do PNLD 2010), que têm contribuído para as nossas

reflexões acerca da linguagem, relação dialógica, gênero do discurso, produção de texto, etc.

127

Por isso, inicialmente, delimitamos os gêneros do discurso como um dos elementos

necessários para a produção do texto escrito. Nesse sentido, restringimos as análises apenas às

atividades que vinculassem a produção escrita com a presença de um gênero.

Levando isso em conta, pudemos verificar, previamente, se as atividades

proporcionavam um melhor funcionamento da linguagem escrita, mediante a existência ou

não da diversidade de gêneros que atendessem às diferentes necessidades sociais.

128

Porém, concordamos com Schneuwly e Dolz (2011[1996]) quando afirmam que a

própria diversidade dos gêneros em si não garante o desenvolvimento da comunicação

discursiva do aluno para as mais variadas necessidades sociais, uma vez que determinados

gêneros apresentam características semelhantes.

Pensando nisso, buscamos elaborar outras categorias de análise que nos ajudassem a

melhor refletir sobre as orientações da produção escrita com base em um gênero. São elas:

I. Contexto histórico-social (esfera de comunicação; elementos históricos; suporte

textual).

II. Contexto funcional (destinatário; posição enunciativa; apreciação valorativa; finalidade

comunicativa).

III. Contexto linguístico-discursivo (conteúdo temático; estilística; estrutura

composicional; tipologia textual; texto de referência linguístico-discursiva).

Certamente, para cada livro didático que compõe as coleções escolhidas, não tivemos a

pretensão de analisar cada um dos elementos que formam os contextos aqui apresentados. No

decorrer da pesquisa, as próprias coleções nos suscitarão os elementos relevantes a serem

destacados.

Assim, consideramos oportuno recuperar também alguns estudos que influenciaram

nesse processo de categorização.

129

A categoria de análise intitulada contexto histórico-social surgiu pelo entendimento

de que, o gênero do discurso se integra às situações vividas nas práticas sociais e que,

historicamente, acompanha a variabilidade das interações verbais. Compreende-se, então, que

a diversidade dos gêneros deve ser acompanhada também pela diversidade das atividades

130

humanas, de forma a viabilizar as relações dialógicas do educando na/para a dimensão

histórico-social.

No que se refere ao contexto funcional, destacamos:

A importância do contexto funcional é aqui entendida como elemento que estimula o

aluno, enquanto sujeito participante, a assumir sua posição de autoria e sua apreciação

valorativa, moldando a escrita de acordo com a finalidade enunciativa e com a percepção que

faz de seu destinatário.

131

Quanto ao contexto linguístico-discursivo, baseamo-nos, por exemplo, nos seguintes

estudos:

É possível enfatizar, por sua vez, a importância do contexto linguístico-discursivo,

por representar as características relativamente estáveis (reconhecíveis empiricamente) e

consagradas das interações verbais. Nas especificidades de cada relação dialógica, o contexto

linguístico-discursivo ajuda a moldar os modos enunciativos dos gêneros do discurso.

Por suas particularidades e similaridades, definimos os contextos histórico-social,

funcional e linguístico-discursivo como as categorias de análise que recuperam os elementos

132

constitutivos da situação de produção do texto escrito. São critérios que se inter-relacionam

para se promover o acesso à construção de sentidos.

Por outro lado, reconhecemos que as orientações para o texto escrito devem pautar-se

também por outros importantes critérios que auxiliem na construção de sentidos, como, por

exemplo, as estratégias que se pretende levar ao processo de produção (planejamento, escrita,

revisão e reescrita). Porém, dada a necessidade de limitar o estudo, selecionamos os

elementos da situação de produção como critérios de análise a compor o corpus da pesquisa.

Apresentando, então, a trajetória teórico-metodológica deste trabalho, discorreremos,

no capítulo a seguir, a respeito dos resultados condizentes com a análise das propostas de

produção escrita, com base nas coleções didáticas selecionadas.

133

5 GÊNEROS DO DISCURSO E SITUAÇÕES DE PRODUÇÃO: O QUE É

(DES)PRESTIGIADO NAS COLEÇÕES DIDÁTICAS

Responder eticamente às atuais questões colocadas sobre as dificuldades

generalizadas com a leitura e com a escrita por parte dos alunos, em

qualquer nível de ensino, nos implica com um ensino responsivo à vida e

aos sujeitos; um ensino de língua materna que não se apresente como

enfoque de uma língua apresentada em recorte, em fragmento a ser

classificado, rotulado à exaustão, mas um ensino de uma língua na qual esse

sujeito se reconheça e reconheça cronotopicamente a voz do(s) outro(s).

(ALVES, p. 2012, p. 320, grifo nosso).

Na busca por um ensino responsivo à vida e aos sujeitos, esperamos que os

educandos, através das coleções didáticas, tenham a oportunidade de escrever a vida nas

palavras. Fazer da escrita não apenas as emoções do não vivido, figurados por fraseologias

instrumentais, estereotipadas e impessoalizantes, mas a escrita que revivifica a linguagem,

redescobrindo e atribuindo sentidos a ela.

5.1 O lugar dos gêneros e das esferas nas propostas de produção escrita

Conforme exposto no capítulo anterior, a análise de natureza quantitativa da pesquisa

baseia-se nos seguintes questionamentos: Quais são os gêneros do discurso e as esferas

sociais priorizados no ensino de produção escrita? No ensino de produção escrita, a

diversidade dos gêneros do discurso é efetivamente trabalhada nas coleções didáticas?

A seguir, delineamos os resultados obtidos mediante a verificação dos gêneros e das

esferas contemplados nas atividades de produção escrita, o que nos ajuda a perceber se há, de

fato, a diversidade de tais gêneros no conjunto das oito coleções (40 livros) que compõem o

corpus da pesquisa.

134

Quadro 13: Gêneros contemplados ao longo dos anos iniciais do EF

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 63 Escolar

Conto; conto (infantil, engraçado,

maravilhoso, popular, indígena, de

fadas, de aventura)

33 Literária

Poema 31 Literária

Descrição 28 Escolar

Lista 25 Cotidiana

Relato 19 Cotidiana

Bilhete 18 Cotidiana

História em quadrinho(s) 15 Jornalística

Entrevista 15 Jornalística

Ficha técnica 14 Científica

Fábula 13 Literária

Cartaz 13 Publicitária

Convite 11 Cotidiana

Receita 10 Cotidiana

Artigo de opinião30

10 Jornalística

Texto informativo 9 Escolar

Notícia 9 Jornalística

Anúncio 9 Publicitária

Foto-legenda 8 Jornalística

Texto expositivo 8 Escolar

Anúncio classificado 8 Publicitária

Carta pessoal 7 Cotidiana

Cantiga (infantil, de roda, de ninar) 7 Da tradição oral

Parlenda 7 Da tradição oral

Instruções de brincadeira ou jogo 7 Cotidiana

Instruções de montagem 7 Cotidiana

Cartão-postal 7 Cotidiana

Folheto 6 Publicitária

Diário 6 Cotidiana

Lenda 5 Da tradição oral

Capa (de livro, de filme) 5 Publicitária

Diálogo 5 Cotidiana

Biografia 5 Literária

Regras de convivência 5 Escolar

Argumentação 5 Escolar

Resenha (de livro, de filme) 5 Jornalística

30 Para não confundir o texto opinativo (enquanto gênero escolar) e o texto de opinião (enquanto gênero

escolarizado), substituímos este por artigo de opinião. Tal mudança ocorreu nas coleções A Escola é Nossa e

Português: Linguagens.

135

Resumo 5 Escolar

Texto teatral 5 Literária

Reportagem 5 Jornalística

Placas de sinalização 4 Cotidiana

Comentário opinativo 4 Escolar

Carta-resposta 4 Cotidiana

Anedota 4 Da tradição oral

Redação 3 Escolar

Adivinha 3 Da tradição oral

Paródia de uma cantiga de roda 3 Da tradição oral

Slogan 3 Publicitária

Texto opinativo 3 Escolar

Manchete 3 Jornalística

Dicas 2 Cotidiana

Trava-língua 2 Da tradição oral

Declaração 2 Jurídica

Quadrinha 2 Da tradição oral

Tomada de notas 2 Escolar

Calendário 2 Cotidiana

Piada 2 Da tradição oral

Verbete literário 2 Literária

E-mail 2 Digital

Paródia de um conto 2 Literária

Artigo informativo 2 Jornalística

Charge 2 Jornalística

Pesquisa de opinião 2 Publicitária

Poema visual 2 Literária

Dissertação 2 Escolar

Narrativa mitológica 2 Da tradição oral

Cordel 2 Da tradição oral

Gráfico 2 Científica

Rótulo 1 Publicitária

Ficha de identificação 1 Escolar

Cardápio 1 Dos negócios

Recado 1 Cotidiana

Diagrama 1 Científica

Índice 1 Jornalística

Aviso 1 Cotidiana

Lista telefônica 1 Cotidiana

Embalagem 1 Publicitária

Quadro 1 Científica

Faixa de segurança 1 Cotidiana

Quadro-resumo 1 Escolar

Verbete de enciclopédia 1 Científica

Certidão de nascimento 1 Burocrática

Carteira de identidade 1 Burocrática

Música 1 Artística

Acróstico 1 Literária

136

Ingresso 1 Dos negócios

Programação televisiva 1 Artística

Perfil 1 Digital

Filme 1 Artística

Ficha individual de saúde 1 Da saúde

Apólogo 1 Literária

Cruzadinha 1 Jornalística

Haicai 1 Literária

Cartão-resposta 1 Cotidiana

Cartão 1 Cotidiana

Ditado popular 1 Da tradição oral

Carta comercial 1 Dos negócios

Carta de reclamação 1 Cotidiana

Instruções de localização 1 Cotidiana

Carta à redação 1 Jornalística

Fichamento 1 Escolar

Autobiografia 1 Literária

Trocadilho 1 Da tradição oral

Narrativa de viagem 1 Literária

Cartão-convite 1 Cotidiana

Crônica 1 Jornalística

Paródia de música popular 1 Artística

Cartilha de brincadeiras 1 Cotidiana

Crônica literária 1 Literária

Quadro de instruções 1 Cotidiana

Telegrama 1 Cotidiana

Logomarca 1 Publicitária

Enquete 1 Científica

Tabela 1 Científica

Caderno de jornal 1 Jornalística

Total: 114

Não identificado: 24

Sem produção escrita: 39

Total: 590

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Com base nos indicadores esboçados no Quadro 13, observa-se que foram

quantificados 114 gêneros em 590 atividades de produção escrita.

No caso, a partir da Amostra de coleções aprovadas pelo PNLD 2010, os cinco

gêneros mais frequentemente propostos são: narração, proeminentemente em primeiro lugar,

com 63 recorrências; conto, em segundo lugar, com 33 recorrências; poema, em terceiro

lugar, com 31 recorrências; descrição, em quarto lugar, com 28 recorrências; e lista, em

quinto lugar, com 25 recorrências. Isso equivale a dizer que a soma de recorrências de cada

um desses gêneros corresponde a 180 propostas de produção escrita, o que condiz a 30,50%

das atividades presentes nas coleções da Amostra.

137

Consideremos, agora, o resultado obtido se levarmos em conta o dobro dos cinco

gêneros mais contemplados, ou seja, os dez gêneros seguintes. Para uma melhor interpretação,

apresentamos o Gráfico 1.

Gráfico 1: Gêneros contemplados / Recorrências

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Ao vincular os 10 gêneros seguintes - relato (19 recorrências), bilhete (18

recorrências), HQ (15 recorrências), entrevista (15 recorrências), ficha técnica (14

recorrências), fábula (13 recorrências), cartaz (13 recorrências), convite (11 recorrências),

receita (10 recorrências) e artigo de opinião (10 recorrências) - pode-se afirmar que o

somatório de suas recorrências representa 138 propostas de produção escrita, o

correspondente a um percentual de 23,38% de participação.

Em comparação com o resultado alcançado pela soma de propostas reservadas aos

cinco primeiros gêneros mais priorizados, vejamos o Gráfico 2.

138

Gráfico 2: Somatório de recorrências dos gêneros / Dados comparativos

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Em outras palavras, o dobro dos 5 gêneros mais contemplados não equivale,

igualmente, ao dobro de recorrências para com o somatório das propostas reservadas à

narração, conto, poema, descrição e lista. Inclusive, para que conseguíssemos alcançar,

aproximadamente, o percentual esboçado pelos 5 primeiros gêneros, precisaríamos levar em

conta, além dos 10 gêneros seguintes, mais cinco gêneros (texto informativo, notícia, anúncio,

foto-legenda e texto expositivo).

Além disso, se considerarmos os 114 gêneros apontados na sequência do Quadro 13, o

somatório de propostas escritas para os 20 primeiros gêneros apresentará um resultado

superior, se tomarmos para análise os 94 gêneros restantes.

139

Gráfico 3: Somatório de recorrências / Índice de participação

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Ou seja, dos 114 gêneros encontrados, 20 respondem por 361 recorrências (61,18%)

do total de propostas, restando 229 recorrências (38,81%) aos 94 gêneros seguintes.

Esses resultados obtidos para com a análise dos dados parecem, portanto, divergir com

a menção avaliativa apresentada pelo Guia do PNLD 2010. Para este, as coletâneas do 1º e 2º

ciclos trabalham com a diversidade de gêneros do discurso e esclarece, por exemplo, que nas

coleções didáticas do 2º ciclo, os textos são efetivamente diversificados do ponto de vista dos

gêneros em jogo, ao envolverem as principais esferas discursivas socialmente relevantes,

como a cotidiana, a jornalística, de divulgação científica, etc.

Por isso, corroboramos com a afirmação de Pedrosa (2006)31

, ao refletir sobre os

critérios estabelecidos pelo processo avaliativo do PNLD.

31 Certamente, o estudo desenvolvido por Pedrosa ajudou-nos a proceder na análise de cunho quantitativo da

pesquisa, inspirando-nos na construção e na compreensão dos resultados. Pedrosa, em sua dissertação e sob a

orientação da Prof.ª Dr.ª Roxane Rojo, desenvolveu uma pesquisa sobre os gêneros do discurso nas atividades de

produção textual, presentes nos livros didáticos de Língua Portuguesa avaliados pelo PNLD/2005 e destinados às

últimas séries do Ensino Fundamental (5ª a 8ª séries).

140

[...] o critério de diversidade estabelecido pela Avaliação parece ser atestado

pelo número de gêneros contemplados, ou seja, a diversidade atestada

baseia-se na simples existência, na multiplicidade e não no número de

propostas de produção de textos considerado para cada um dos gêneros

contemplados. Pode-se inferir, portanto, que o critério de diversidade

estabelecido pela Avaliação se dá em função da quantidade de gêneros

contemplados e não em função do número de ocorrências reservado para

cada um destes. (PEDROSA, 2006, p. 120).

Em acordo com essa colocação, o possível critério de diversidade adotado pela

avaliação do PNLD 2010 parece não ser justificável. No grupo de 8 coleções didáticas, o que

totaliza 40 livros, nota-se que há uma nítida discrepância entre o número de gêneros

contemplados e a quantidade de vezes em que são sugeridos. Aliás, através do Quadro 13, é

possível perceber que há diversidade apenas para alguns dos gêneros que são trabalhados nas

produções escritas. Porém, como destacado por Pedrosa:

[...] cabe indagar se deveria haver e qual seria o número mínimo de

ocorrências em relação ao número de gêneros contemplados para ser

possível endossar a existência de diversidade em uma determinada coleção

ou grupo de coleções [...] cabe indagar também se isso ocorre devido à

consideração de propostas que visem uma progressão de abordagem ou se

apenas esteja em jogo uma prática pautada na repetição de atividades para o

estabelecimento de um determinado conhecimento. (PEDROSA, 2006, p.

121).

Assim, além de constatar-se uma diversidade baseada no volume de gêneros

selecionados para as propostas de escrita, em detrimento do volume de atividades relativo a

cada um desses gêneros, nota-se a presença da tradição escolar entre os cinco gêneros mais

priorizados.

Os tipos textuais, os chamados gêneros escolares, como narração (em 1º lugar) e

descrição (em 4º lugar), por exemplo, são tomados como modelos de referência para as

propostas de escrita. Nesse caso, tais tipos textuais, calcados nas práticas cristalizadas pelo

ensino da língua materna, ainda são tratados como objetos privilegiados de estudo.

Tendo a narração como proposta privilegiada na produção escrita, a mesma é

trabalhada sob várias abordagens: narrar em 1ª e em 3ª pessoa; narrar a partir de um banco de

palavras, de sequência de imagens, etc.; transformar narração em 1ª pessoa em 3ª pessoa;

transformar HQ e poema em narrativa em prosa; criar a continuação de uma narrativa a partir

141

da introdução apresentada; criar uma narrativa mediante ideias sugeridas pelo contexto; dentre

outras solicitações. A descrição, por sua vez, é utilizada para caracterizar personagens

inventados, pessoas, ruas, cômodos, animais, etc., de forma a representar características

conceituais, físicas e/ou psicológicas do objeto descrito.

Vejamos, a seguir, alguns trechos de atividades que visam a concretizar a aplicação

dessas estruturas tipológicas.

Figura 4: Narração a partir de uma sequência de imagens

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 5, p. 17

142

Figura 5: Narração a partir de uma temática

Fonte: Coleção A Escola é Nossa, v. 4, p. 125

Figura 6: Narração a partir da reprodução de telas

Fonte: Coleção Hoje é Dia de Português, v. 4, p. 53-54

143

Figura 7: Narração a partir de uma introdução apresentada

Fonte: Coleção A Escola é Nossa, v. 5, p. 205

Figura 8: Descrição de um ser folclórico

Fonte: Coleção Conhecer e Crescer, v.1, p. 178

144

Figura 9: Descrição do cômodo de uma residência

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 4, p. 30

Figura 10: Descrição de uma rua

Fonte: Coleção Conhecer e Crescer, v. 3, p. 37

145

Com base nos exemplos apresentados, pode-se afirmar que ainda há, dentre as

coleções didáticas analisadas, um ensino que remonta aos tipos textuais canônicos e

hegemônicos, herdeiros de uma prática de escrita que ocorreu com mais ênfase até os anos 80

do século passado. Como já visto no capítulo 2, trata-se dos “[...] autênticos produtos

culturais da escola, elaborados como instrumentos para desenvolver e avaliar, progressiva e

sistematicamente, as capacidades de escrita dos alunos.” (SCHENEUWLY; DOLZ, 2011

[1997], p. 66).

Por essa perspectiva, a abordagem da tipologia clássica da redação - narração e

descrição - permanece vinculada às propostas de escrita que compõem o cenário global da

Amostra. Parece, portanto, que um dos objetivos da escrita visa a desenvolver e a apropriar-se

das estruturas textuais meramente escolares, descaracterizadas de seus propósitos

enunciativos mais amplos.

Não se pode negar, por outro lado, que o ensino-aprendizagem de cada tipo textual é

fundamental para a apropriação do aluno no que tange às diferentes configurações de escrita.

Contudo, acreditamos que tal importância revela-se, intrinsecamente, nas situações de escrita

em que os tipos de textos são materializados nos gêneros do discurso.

Entretanto, nos exemplos de atividades aqui mostrados, percebe-se que as condições

de produção impostas pelos tipos textuais escolares limitam a relação interlocutiva que se

poderia estabelecer entre o educando e os textos produzidos na e pela sociedade. Em outras

palavras, dentre os gêneros mais frequentemente contemplados no conjunto da Amostra,

verifica-se uma prática cuja orientação didática se dimensiona em limites exatos, perdendo-se

a plasticidade própria da linguagem e, consequentemente, a amplitude da relação dialógica da

escrita.

Com base nisso, é possível identificar a presença de uma prática que remonta o caráter

antidialógico da educação, ao pautar-se em propostas alheias à experiência existencial dos

educandos (Freire, 2011a). Ou seja, a presença de atividades que não favorecem a produção

do conhecimento e o encontro dialógico com as experiências vividas, negando o direito à voz

que tem o aluno, de pronunciar o seu pensar crítico.

De modo geral, as práticas de produção referentes aos chamados gêneros escolares

minimizam a complexidade dos usos, funções e valores que os tipos textuais podem

desempenhar nos mais variados gêneros do discurso. Tais práticas centram-se na temática e

146

no plano estrutural do texto (o “como escrever”), nos quais o “para quê” e o “para quem”

assumem funções e sentidos somente nas relações estabelecidas no contexto escolar.

Lembremos que a dissertação, igualmente identificada como autêntico produto da

tradição escolar, apresenta um número de ocorrências (2) absolutamente inferior ao número

de incidências destinado à narração (63) e à descrição (28). Porém, é válido destacar que esse

ínfimo dado quantitativo para com a dissertação pode ser, porventura, decorrente de diferentes

vertentes tipológicas a quem os autores das coleções se alinham. Seguem, abaixo, alguns

exemplos de teóricos que propuseram as referentes tipologias:

a) Werlich (1976)32

: descrição, narração, exposição, argumentação e instrução.

b) Adam (2008): narração, descrição, explicação, argumentação e diálogo.

c) Koch e Fávero (1987): tipo narrativo, descritivo, expositivo ou explicativo, argumentativo

stricto sensu, preditivo e injuntivo ou diretivo.

d) Marcuschi (2008): narração, argumentação, exposição, descrição e injunção.

Possivelmente, o texto dissertativo pode ter sido nomeado e focalizado, em algumas

coleções, como um texto expositivo/explicativo, expondo ideias e pontos de vista sobre

determinado tema, bem como um texto argumentativo, de caráter mais persuasivo, no intuito

de convencer o leitor sobre determinada ideia exposta. Tal discussão, porém, não se constitui

como objetivo da coleta de dados aqui realizada.

Tratemos agora do conto e do poema, gêneros literários posicionados,

respectivamente, em 2º e em 3º lugar, com 33 e 31 recorrências.

Os autores de algumas coleções didáticas, ao proporem a produção escrita do conto,

destacam a relevância desse gênero para o processo de ensino-aprendizagem. Na próxima

página, seguem algumas justificativas.

32 Werlich, 1976, apud BONINI, Adair. A noção de seqüência textual na análise pragmático-textual de Jean-

Michel Adam. In: MEURER, J.L.; BONINI, Adair; MOTTA-ROTH, Désirée (Orgs.). Gêneros: teorias,

métodos, debates. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.

147

Quadro 14: O que os autores dizem sobre o conto

Coleção didática Autor(es) Citação/Objetivo

Conhecer e Crescer

(Manual do Professor)

2º ano

- Cristiane Buranello

“Por gerações e gerações, o

mundo dos contos de origem

popular tem povoado o

imaginário de adultos e crianças.

Por despertar o interesse das

crianças é que esse tema pode ser

bastante produtivo para o

trabalho em sala de aula.” (p.

257).

“[...] os contos de fadas não

perdem a atualidade e a magia

porque tratam de conflitos

humanos de socialização e

trazem mensagens essenciais ao

desenvolvimento da criança.”

(BIZ, 2007, apud BURANELLO,

2008, p. 47-48).

Conhecer e Crescer

(Manual do Professor)

3º ano

“O título dessa unidade faz

referência aos contos de fadas,

histórias que surgiram há

centenas de anos e que, ainda

hoje, encantam crianças e

adultos. Escolhemos esse tema

para a unidade porque ele faz

parte do universo infantil, o que

pode tornar o trabalho atraente e

motivador.” (p. 48).

Aprendendo Sempre

(Manual do Professor)

3º ano

- Cláudia Miranda

- Vera Lúcia Rodrigues

“Objetivo: Estimular o

imaginário [..].” (p. 107).

A Escola é Nossa

(Manual do Professor)

3º ano

- Márcia Aparecida Paganini

Cavéquia

“Contos de fadas [...] fascinam

pessoas das mais diversas faixas

de idade, especialmente as

crianças. Instiga a imaginação e a

criatividade infantil.” (p. 46).

Ao ser afirmado que o conto provoca o imaginário, o interesse das crianças, a magia,

a criatividade infantil e um trabalho atraente e motivador, tais elementos fazem-nos resgatar

os estudos de alguns teóricos que tratam sobre a relevância do conto para o desenvolvimento

da criança.

148

Como menciona Bettelheim (2008), o conto procede do mesmo modo que a mente

infantil, ou seja, pela fantasia, uma vez que essa narrativa envolve histórias com uma situação

real, mas que se resolve no jogo mágico a partir do estímulo à imaginação. Para Held (1985,

p. 46), por sua vez, a “[...] imaginação, como a inteligência ou a sensibilidade, ou é cultivada ,

ou se atrofia. Pensamos que a imaginação de uma criança deve ser alimentada [...]”.

Vê-se, então, que o segundo gênero mais contemplado no conjunto da Amostra é visto

como um importante objeto de ensino para auxiliar na construção do imaginário da criança,

dada a possibilidade de fomentar o desenvolvimento da linguagem simbólica. Ou seja,

aproximar a concepção que a criança faz do mundo real acionado ao mundo mágico,

estimulando sua capacidade imaginativa e crítica. Cabe ressaltar, contudo, que esse

tratamento dado ao conto só será possível de ser confirmado, mediante a análise qualitativa a

ser feita na próxima seção.

Focando-se agora no gênero poema, é possível preconizar que, se os textos narrativo e

descritivo indicam a prática da tradição escolar, o mesmo pode ser dito do poema, cuja origem

remonta à tradição da Poética, conforme evidenciado no capítulo 2. No contexto histórico

brasileiro, destaca-se o século XVIII, quando a língua portuguesa começou a ser inserida no

ensino secundário através das aulas de Gramática, Retórica e Poética; e o século XIX, no

então criado Colégio Dom Pedro II, ao incluir o estudo da Língua Portuguesa no currículo,

inicialmente, sob a forma das disciplinas Retórica e Poética.

De acordo com Domingues (2008), o contato da criança com os gêneros poéticos,

dentre eles, o poema, aprimora não somente a leitura e a oralidade, mas também a escrita. Tal

aperfeiçoamento é, para a autora, ocasionado pela riqueza da linguagem que auxilia a criança

a sentir e a experimentar as vivências ludicamente, por um jogo de palavras que fazem sentido

ao mundo infantil. Em consonância com Domingues, Klauck (2009) destaca que o poema

cultiva o pensamento infantil, por propor combinações que exploram a criatividade e a

curiosidade, através de um arranjo de palavras que abre possibilidades e olhares diferentes

para o mundo real.

A respeito dessa relevância, evidencia-se a preocupação de alguns autores das

coleções, ao tentarem trazer a dinamicidade poética para a construção escrita dos educandos.

Vejamos o que esses autores asseveram sobre o trabalho com o gênero poema.

149

Quadro 15: O que os autores dizem sobre o poema

Coleção didática Autor(es) Citação/Objetivo

Infância Feliz

(Manual do Professor)

4º ano

- Albanize Aparecida Arêdes

Neves

- Ângelo Alexandref Stefanovits

- Míriam dos Santos Grilo

“Objetivo da produção:

sensibilizar os alunos para a

linguagem poética, estimulá-los a

perceber as sensações produzidas

no leitor pelas imagens, pela

sonoridade e pelo ritmo criados

no poema [...].” (p. 51).

Português: Linguagens

(Livro do Aluno)

3º ano

- Thereza Cochar Magalhães

- William Roberto Cereja

“As palavras não existem soltas.

Elas se combinam, formando

frases e textos. Às vezes, elas são

organizadas de um jeito especial

para mexer com nossos

sentimentos e para levar nossos

pensamentos para lugares

distantes. É o que acontece nos

poemas. [...] No poema, há som e

ritmo e as palavras são escolhidas

para transmitir emoções, como,

por exemplo, alegria, tristeza,

amor, saudade, humor.” (p. 80).

A Escola é Nossa

(Manual do Professor)

4º ano

- Márcia Aparecida Paganini

Cavéquia

“Quando a palavra é tocada pela

poesia ela se potencializa e cria a

vida nova. As nomeações

simbólicas têm o poder de

subverter a ordem linear fixadora

de sentidos. Liberta dos elos

opressivos das convenções da

lógica racional, a palavra

reconquista a face mágica, o

vigor mítico das origens e

mostra-se em plenitude.”

(BOCHECHO, 2002, apud

CAVÉQUIA, 2008, p. 31).

Aprendendo Sempre

(Manual do Professor)

4º ano

- Cláudia Miranda

- Vera Lúcia Rodrigues

“Objetivo: Estimular a

criatividade e a sensibilidade dos

alunos. [...] Por se tratar de uma

produção poética, nesta unidade

não está sendo enfatizada uma

revisão mais formal, dando-se

maior destaque à estrutura

discursiva proposta. É importante

que os alunos se sintam à vontade

para expressar sua sensibilidade e

criatividade.” (p. 46).

150

Percebe-se, assim, o interesse em propor produções que contemplem a linguagem

poética a partir de poemas que suscitem sonoridade, ritmo, emoção, sensibilidade,

criatividade, etc. Porém, tal suposição só será possível de ser (in)validada através de uma

análise qualitativa.

Quanto ao gênero lista, posicionado em 5º lugar, com 25 recorrências, os alunos são

solicitados a produzir uma listagem de palavras de mesmo valor semântico, como: lista de

compras, de convidados para uma festa, de brinquedos e brincadeiras, de filmes preferidos

pela turma, de frutas para fazer uma salada, dentre outras. Todavia, não encontramos nas

orientações didáticas, justificativas que legitimem a presença da lista nas propostas de

produção escrita.

Acreditamos, porém, que a produção da lista vai de encontro ao que é preconizado por

Cavéquia, no Manual do Professor A Escola é Nossa, do 1º ano. Para a autora, o processo de

aquisição da língua escrita passou a “[...] designar não só a capacidade de codificar e

decodificar, mas também o domínio de outros conhecimentos que possibilitam o uso da

escrita em práticas sociais.” (CAVÉQUIA, 2008, p. 7).

Assim, ao constituir-se por uma estrutura simples e muito presente no dia a dia, é

possível que os autores concebam a lista como um gênero que favorece o ensino sistemático

da base alfabética da língua, aliado ao uso da escrita que circula socialmente.

Analisemos, agora, os dados quantitativos referentes às esferas sociais contempladas

ao longo dos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Quadro 16: Recorrência das esferas sociais ao longo dos anos iniciais do EF

Esfera Recorrência %

Cotidiana 146 24,75%

Escolar 140 23,73%

Literária 99 16,78%

Jornalística 79 13,39%

Publicitária 49 8,31%

Da tradição oral 41 6,95%

Científica 21 3,56%

Artística 4 0,68%

Dos negócios 3 0,51%

Digital 3 0,51%

Jurídica 2 0,34%

Burocrática 2 0,34%

Da saúde 1 0,17%

Total: 13 Total: 590 Total: 100%

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

151

Dos 114 gêneros propostos para a produção escrita, identifica-se a presença de 13

esferas sociais correspondentes a cada um desses gêneros:

a) cotidiana: lista, relato, bilhete, convite, receita, carta pessoal, instruções de brincadeira ou

jogo, instruções de montagem, cartão-postal, diário, diálogo, placas de sinalização, carta-

resposta, dicas, calendário, recado, aviso, lista telefônica, faixa de segurança, cartão-

resposta, cartão, carta de reclamação, instruções de localização, cartão-convite, cartilha de

brincadeiras, quadro de instruções e telegrama;

b) escolar: narração, descrição, texto informativo, texto expositivo, regras de convivência,

argumentação, resumo, comentário opinativo, redação, texto opinativo, tomada de notas,

dissertação, ficha de identificação, quadro-resumo e fichamento;

c) literária: conto, poema, fábula, biografia, texto teatral, verbete literário, paródia de conto,

poema visual, acróstico, apólogo, haicai, autobiografia, narrativa de viagem e crônica

literária;

d) jornalística: história em quadrinho(s), entrevista, artigo de opinião, notícia, foto-legenda,

resenha, reportagem, manchete, artigo informativo, charge, índice, cruzadinha, carta à

redação e caderno de jornal;

e) publicitária: cartaz, anúncio, anúncio classificado, folheto, capa, slogan, pesquisa de

opinião, rótulo, embalagem, crônica e logomarca;

f) da tradição oral: cantiga, parlenda, lenda, anedota, adivinha, paródia de cantiga de roda,

trava-língua, quadrinha, piada, narrativa mitológica, cordel, ditado popular e trocadilho;

g) científica: ficha técnica, gráfico, diagrama, quadro, verbete de enciclopédia, enquete e

tabela;

h) artística: música, programação televisiva, filme e paródia de música popular;

i) dos negócios: cardápio, ingresso e carta comercial;

j) digital: e-mail e perfil;

k) jurídica: declaração;

l) burocrática: certidão de nascimento e carteira de identidade;

m) da saúde: ficha individual de saúde.

152

Para uma melhor visualização, é apresentado o Gráfico 4. Ele reproduz o percentual de

participação de cada uma das esferas contempladas pelo conjunto dos 40 livros didáticos que

compõem a Amostra desta pesquisa.

Gráfico 4: Esferas contempladas / Percentual de participação

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

De acordo com os indicadores esboçados no Quadro 16 e no Gráfico 4, evidencia-se

que, nas atividades de produção escrita, as três esferas mais comumente priorizadas são:

cotidiana, em primeiro lugar, com 146 recorrências (24,75%); escolar, em segundo lugar,

com resultado bastante próximo ao da esfera cotidiana, com 140 recorrências (23,73%); e a

literária, em terceiro lugar, com 99 recorrências (16,78%).

153

Posteriormente, as esferas jornalística e publicitária apresentam-se na sequência,

respectivamente, em quarto e em quinto lugar: a jornalística, com 79 recorrências, o

equivalente a 13,39% das propostas; e a publicitária, com 49 recorrências, o correspondente a

8,31%, tendo um percentual de participação que representa quase a metade da anterior. Em

sexto lugar, situa-se a esfera da tradição oral, com 41 recorrências (6,95%) e em sétimo

lugar, a esfera científica, com 21 recorrências (3,56%). As demais esferas (artística, dos

negócios, digital, jurídica, burocrática e da saúde), por sua vez, indicam índices de

participação inexpressivos, o que reforça o questionamento aqui suscitado - viabilidade dos

critérios fixados pela Avaliação do PNLD, no que diz respeito à diversidade de gêneros nas

atividades de produção escrita.

A fim de reforçar a discrepância de participação entre as esferas, observemos o gráfico

abaixo:

Gráfico 5: Somatório de recorrências das esferas / Dados comparativos

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Por esse gráfico, observa-se que a soma de recorrências (385) das três primeiras

esferas mais contempladas (1º grupo) - cotidiana, escolar e literária - corresponde a um

percentual de 65,25% das propostas de produção escrita. Tal resultado revela um índice de

154

participação bastante expressivo, indicando um valor que representa mais da metade do total

de propostas da Amostra.

Levando-se em conta as dez esferas restantes do Quadro 16 (grupo 2), percebe-se que

a soma de suas recorrências (205) respondem apenas a 34,74% do total de propostas. Isso

significa que, a quantidade numérica de esferas unidas entre os grupos comparativos 2 e 1 (10

esferas > 3 esferas) não atende igualmente à mesma razão de proporção (205 propostas < 385

propostas), isto é, o grupo 2 não apresenta um resultado superior ao número de recorrências

verificadas para as três primeiras esferas.

Ressaltando essa discrepância, examinemos outros dados do Gráfico 5. Se tomarmos

para análise as esferas jornalística e publicitária (grupo 3), a soma de suas recorrências (128)

equivale a um percentual de 21,69% de participação nas propostas analisadas. As esferas

restantes do grupo 4 (da tradição oral, científica, artística, dos negócios, digital, jurídica,

burocrática e da saúde) revelam uma participação bem menor - no somatório das mesmas, são

reservadas 77 recorrências, o equivalente a 13,05% das propostas de produção.

A partir dos resultados aqui apontados, é cabível fazermos algumas reflexões.

O lugar que a esfera cotidiana ocupa no conjunto das coleções analisadas aponta um

elevado índice de participação, destacadamente privilegiada em 1º lugar. Tal preferência,

certamente, é consequência das mudanças ocasionadas no encaminhamento das propostas

para o ensino de língua materna, firmadas, sobretudo, nos anos 90 pelos PCN e assumidas

pelo processo avaliativo do PNLD.

Desde os anos 90 até recentemente, com a divulgação dos estudos da

Lingüística Textual e da Lingüística da Enunciação, principalmente de linha

bakhtiniana, e a propagação desses estudos nos Parâmetros Curriculares

Nacionais de Ensino Fundamental e Médio, encontramos uma “nova”

abordagem em relação ao ensino de línguas. O texto continuou sendo visto

como unidade de ensino, mas os gêneros do discurso apareceram como

objetos de ensino (Rojo, 2000). Essa “nova” abordagem abriu espaço para a

discussão de que não é qualquer texto ou qualquer seqüência didática que vai

permitir ao aluno desenvolver diversas habilidades de leitura e escrita e

produzir textos orais e escritos. Ao mesmo tempo, trouxe também outras

preocupações que ainda precisam ser repensadas como a própria noção de

gênero e sua relação com as práticas de letramento escolar. (BUNZEN,

2007, p. 10, grifo do autor).

155

Pode-se dizer, portanto, que o índice de participação dos gêneros da esfera cotidiana é

uma resposta às exigências e às necessidades situadas por um contexto histórico-social, o qual

demanda novas funções à escola e aos livros didáticos, como também por pressupostos

teórico-metodológicos, ao enfatizar a importância dos gêneros para uma melhor participação

dos alunos frente às atividades humanas.

Desse modo, se os gêneros como lista, relato, bilhete, convite e receita configuram-se

nas atividades de produção escrita, isso vem a refletir a preocupação dos autores das coleções

em não mais limitar o processo de ensino-aprendizagem com base apenas nos gêneros das

esferas escolar e literária. É, pois, ampliar a comunicação discursiva dos educandos em

situações que ora os aproxima de suas vivências.

Por outro lado, como preconizam Marcuschi e Leal:

[...] as práticas pedagógicas de escrita daí resultantes não configuram

rupturas completas nem devem ser vistas como estanques ou dicotômicas.

Na verdade, como todo percurso histórico, durante algum tempo as novas

práticas convivem com as tradicionais, ainda que ora uma ora outra possa

sobressair. (MARCUSCHI; LEAL, 2009, p. 127).

Ao chamar a atenção para isso, identificamos que as coleções que compõem a

Amostra estão imbricadas de orientações didáticas envolvendo mudanças, relativa

estabilidade, rupturas, avanços e recuos, não se caracterizando como estanques e dicotômicas

diante das “velhas” práticas pedagógicas. Isso é possível de ser identificado através de

atividades que solicitam, frequentemente, a produção da narração e descrição, objetos de

ensino construídos como autênticos produtos da cultura escolar.

Por isso, se de um lado há o esforço empreendido em propor o ensino de gêneros

produzidos na esfera cotidiana, há, em contrapartida, uma prática que não abandonou

completamente o ensino baseado nos gêneros escolares típicos.

No que diz respeito à esfera literária, a terceira mais contemplada no conjunto da

Amostra, lembremos que, os gêneros da literatura, ao lado dos escolares, constituíam-se como

um dos principais instrumentos de ensino ao longo do contexto educacional brasileiro.

Para teóricos como Cafiero e Corrêa (2009), os muitos textos que circulavam nos

livros didáticos, assim como os selecionados pelos professores, até meados dos anos 70, eram

os de caráter literário. Nesse mesmo contexto, Duarte (2004) afirma que a utilização dos

156

textos literários caracterizava-se como pretexto para o ensinamento de preceitos pedagógicos

e/ou morais, sendo esses textos valorizados enquanto instrumentos de normatização. Para a

autora, no entanto, é ainda nessa época, especialmente, na segunda metade dos anos 70, que

os gêneros literários em seu teor estético começam a ganhar sua legitimação, conquistando

espaço de reflexão nos meios acadêmicos.

Isso remete-nos ao que, de fato, foi vivenciado em meados dos anos 70 - a tentativa de

reproduzir mudanças no processo de ensino-aprendizagem, em vista de desenvolver o uso da

língua materna, não somente ao estudo no saber da língua/sobre a língua. Vê-se, com isso,

uma vertente que configura a linguagem literária em sua fruição estética, motivando um

ensino que favoreça o caráter lúdico e o entrelaçamento do leitor com o texto produzido, de

forma a não limitar-se meramente às suas qualidades pedagógicas.

Assim, os dados da Amostra apontam para um importante resultado. A esfera literária

não perdeu seu prestígio no ensino da língua materna, sendo um dos objetos de ensino mais

privilegiados nas atividades de produção escrita. Porém, não é mais concebido como objeto

por excelência no conjunto das obras analisadas, assim como acontecia nos livros didáticos

utilizados em décadas anteriores.

O cenário atual, influenciado pelos documentos oficiais, pressupostos teórico-

metodológicos, etc., estimulam a aclamação de um ensino de escrita baseado em diferentes

esferas de circulação, o que inclui a esfera literária.

Concernente às esferas jornalística e publicitária, em 3º e em 4º lugar,

respectivamente, é possível fazermos alusão, novamente, aos anos 70, em decorrência da

reforma curricular ocasionada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº

5.692/71. Tal reforma, baseada na concepção de língua como instrumento de comunicação,

abriu caminhos para um ensino mais preocupado com a diversificação textual que circularia

nas práticas escolares. Como já mencionado no capítulo 2, “[...] o que aconteceu foi a

ampliação dos textos incluídos nas escolas, pois adentraram nos livros didáticos, histórias em

quadrinhos e textos de natureza jornalística, publicitária e humorística, por exemplo.” (p.39).

Decerto, é com a publicação dos PCN de Língua Portuguesa que a presença dessas

esferas tornou-se mais efetiva nos livros didáticos, ao trazer em suas orientações, sugestões de

gêneros para o trabalho com a linguagem escrita, como notícias, quadrinhos e textos de

jornais, revistas e suplementos infantis, caracterizando a esfera jornalística, como também os

classificados, anúncios, slogans e folhetos, da esfera publicitária.

157

Para Bonini (2011), o estudo dos gêneros jornalísticos apresenta uma grande

relevância social, contribuindo na formação de um cidadão crítico e habilidoso diante do

manejo às manifestações da comunicação de massa. Para Costa (2008), por sua vez, os

assuntos que podem ser abordados nos gêneros da esfera publicitária/da propaganda

possibilitam importantes reflexões e debates em sala de aula, por levarem os alunos a

compreender e a lidar com os símbolos sociais intrínsecos aos modos de

organização/produção da referente esfera.

É inegável, pois, que as coleções didáticas precisam comprometer-se com uma

proposta educacional que crie condições para a efetivação da linguagem jornalística e

publicitária nas produções escritas, uma vez que elas falam da sociedade e para a sociedade, o

que expressa a relevância sócio-discursiva de cada uma para a formação do aluno-cidadão.

A esfera da tradição oral, por sua vez, marcada pela presença de gêneros como

cantiga de roda e parlenda, encontra-se posicionada em 6º lugar, com 41 recorrências. Propor

produções de texto com base nos gêneros da tradição oral é ir ao encontro das orientações dos

documentos oficiais, como os PCN e o Guia do PNLD.

Conforme proposto pelo Guia (2010, p.160), é preciso que as coleções didáticas

contribuam para “[...] a construção de uma ética plural e democrática, por meio da

representação da diversidade étnica, regional e cultural brasileira.”. Os PCN (BRASIL, 1997,

p. 5) também destacam a necessidade de levar o aluno a conhecer e valorizar “[...] a

pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, bem como aspectos socioculturais de

outros povos e nações, posicionando-se contra qualquer discriminação baseada em diferenças

culturais [...]”.

Acreditamos que o trabalho com os gêneros da tradição oral responde, em parte, aos

anseios dos referentes documentos, por favorecer a apreciação e a valorização da diversidade

cultural, da memória coletiva de um grupo e do imaginário popular. Como diz Padilha (2005),

a utilidade desses gêneros significa, em primeira instância, a rememoração e a preservação de

um patrimônio cultural.

No entanto, a esfera da tradição oral é abordada apenas em 41 atividades de produção

escrita, o correspondente a 6,95% do total de propostas da Amostra. Inclusive, a esfera

artística, também representativa das culturas locais, demonstra um baixíssimo índice de

participação - 4 recorrências, o equivalente a 0,68% das propostas solicitadas.

158

Em outras palavras, no conjunto das coleções analisadas pela pesquisa, os gêneros da

esfera artística e da tradição oral ainda precisam obter um melhor reconhecimento enquanto

parte do processo de valorização à diversidade cultural. Ao contrário, é possível verificar a

nítida preferência pelas esferas que mais se aproximam da língua padrão culta,

predominantemente valorizada pela sociedade.

Por essas observações, vê-se que a necessidade de ampliar o uso dos gêneros

condizentes às variedades linguísticas remete-nos ao seguinte questionamento “Como ensinar,

como formar sem estar aberto ao contorno geográfico, social, dos educandos?”. (FREIRE,

2011a, p. 134).

Decerto, o questionamento de Freire ajuda-nos a pensar numa importante função do

processo educacional: estar aberta às experiências provenientes do universo cultural dos

educandos. Isto é, não absolutizar determinada cultura como único parâmetro de apropriação

da produção escrita, nem desconsiderar a necessidade de integração e de preservação das

diferenças, em vista do reconhecimento da própria complexidade humana em seus diferentes

diálogos.

Cabe fazer uma ressalva também quanto à ínfima presença da esfera digital. Dentre as

590 atividades analisadas, tal esfera é abordada somente em três propostas de produção

escrita, o que revela a sua inexpressividade no panorama global da Amostra.

Isso é um resultado preocupante, pois, se vivemos em uma sociedade digital que se

fortalece a cada dia, cabe aos autores dos livros didáticos procurar compatibilizar as

exigências sociais da contemporaneidade - preparar os alunos a se relacionarem com as novas

formas de socialização. Porém, o que se vê é a elaboração de obras que se encontram off-line

diante de um universo social cada vez mais on-line.

Mesmo em escolas onde não haja laboratórios de informática com

computadores conectados à internet, é preciso que se inicie um processo de

letramento digital, e o LD pode contribuir para isso. Saber que há uma

“coisa” chamada e-mail, que se parece com uma carta, mas que não é carta,

que tem formulário próprio com alguns dados muito parecidos com os da

carta, que e é transmitida on-line, que as pessoas recebem assim que se

conectam a uma máquina, em um lugar qualquer, que pode vir com anexos;

saber que há a possibilidade de se bater um bom papo na internet, oralmente

ou por escrito, sem ter de se preocupar muito com as normas gramaticais,

porque esse gênero tem regras próprias de uso da língua; saber como

navegar, que ícones clicar para se alcançar um determinado objetivo,

reconhecer um emoticon e sua carga semântica na produção do sentido; [...]

ensinar o aluno as marcas textuais importantes para a leitura e produção de

159

diferentes gêneros digitais, são papéis que a escola pode cumprir, recebendo

para isso o apoio do LD. (COSCARELLI; SANTOS, 2009, p. 188).

Por isso, em uma sociedade altamente informatizada, faz-se necessário que os alunos

aprendam a escrever nas linguagens que as diferentes tecnologias de comunicação e

informação apresentam. Isso, inclusive, vai ao encontro ao que é preconizado pelos PCN

(BRASIL, 1997, p. 9) quanto aos objetivos do Ensino Fundamental - “[...] saber utilizar

diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos para adquirir e construir

conhecimentos [...].”. É preciso, pois, que os autores das coleções concebam os gêneros da

esfera digital como objetos de estudo em sala de aula, de forma a orientar os alunos na

apropriação de conhecimentos desse contexto de produção e circulação.

Em geral, à luz dos dados quantificados e analisados, observa-se que as obras

apresentam alterações positivas em alguns aspectos, como, por exemplo, a solicitação de

produções escritas com base em gêneros do discurso que circulam socialmente, assim como a

inserção de contextos que vão além da esfera escolar e literária, como a cotidiana, a

jornalística e a publicitária. Isso reflete um esforço dos autores no sentido de introduzir os

diferentes gêneros escolarizados, enquanto instâncias sociais que devem ser perpassadas na

prática pedagógica.

Por outro lado, evidencia-se que os autores procuraram mesclar a produção de gêneros

escolarizados - cotidiana (lista, relato, bilhete), literária (conto, poema, fábula), jornalística

(HQ, entrevista, artigo de opinião), publicitária (cartaz, anúncio, anúncio classificado) - com

os tradicionais modelos concebidos como referência para o ensino da escrita (narração e

descrição).

Conforme preconizado por Schneuwly e Dolz (2011 [1996]), as tipologias textuais

foram consideradas, durante certo tempo, como uma saída promissora para o ensino, trazendo

importantes conhecimentos sobre o funcionamento da linguagem. Porém, para os teóricos

genebrinos, essas tipologias sofrem de duas limitações consideráveis:

a) seu objeto não é o texto, e ainda menos o gênero do qual todo texto é

um exemplar, mas operações de linguagem constitutivas do texto, tais como

a ancoragem enunciativa e a escolha de um modo de apresentação ou de

tipos de sequencialidades;

b) por isso mesmo, a análise se exerce sobre subconjuntos particulares de

unidades linguísticas que formam configurações, traduzindo as operações de

linguagem postuladas. (SCHENEUWLY; DOLZ, 2011 [1996], p. 49).

160

Levando em conta o exposto, verifica-se que a produção escrita sob a perspectiva dos

tipos de textos tem se manifestado, no contexto didático atual, inadequada para estimular as

capacidades comunicativas do aluno. Como formas exclusivamente escolares, tais tipologias

não levam em conta uma proposta de escrita baseada em outras esferas de circulação textual,

para além do âmbito escolar.

Entende-se, portanto, que o texto sob o enquadre de um gênero traz em sua

configuração vários tipos textuais, uma vez que estes caracterizam o funcionamento da

constituição estrutural do texto, sendo efetivados por operações textualmente discursivas.

Desse modo, se os tipos remetem à estrutura interna da configuração textual, pode-se afirmar

que eles só adquirem formas e funções específicas em razão do gênero a que o texto se

vincula. (SILVA, 1999).

Em alguns romances, epopéias, histórias de ficção científica, a descrição,

geralmente a serviço da ação narrativa, cumprindo funções de natureza

ornamental ou estética, entre outras, suspende o fluxo narrativo para

focalizar detalhadamente os personagens, as ações destas, o cenário, etc.; já

nas bulas de remédio, nos verbetes de enciclopédias, modaliza-se a

descrição, didaticamente, para definir, caracterizar, enumerar de modo

objetivo os elementos ou aspectos que compõem o objeto descrito. (SILVA,

1999, p. 101).

Por esse raciocínio, vê-se que, embora possamos classificar os textos como sendo

narrativos e/ou descritivos, é preciso que haja nas coleções uma relação de entrecruzamento

entre os tipos textuais e os gêneros do discurso. Não há tanta eficácia em ensinar a narração e

a descrição em geral, uma vez que essas classificações tipológicas muito genéricas podem

induzir o aluno a pensar que os textos se apresentam de forma pura e homogênea.

Dificilmente, encontraremos textos somente em sua forma narrativa e descritiva, pois à luz do

projeto discursivo do locutor, sabe-se que os textos, pertencentes aos diferentes gêneros,

podem exprimir diferenças específicas em sua configuração.

É cabível fazermos também uma reflexão sobre a esfera cotidiana, tomada como

excelência no conjunto da Amostra da pesquisa. Sem negar sua importância, enquanto esfera

que se aproxima das vivências privadas das crianças, é preciso que haja, nas coleções

didáticas, um trabalho que melhor enfatize os gêneros da instância pública da linguagem.

161

Como preconizado por Bakhtin (2011), embora muitos indivíduos dominem

magnificamente a língua em determinados gêneros, sentem-se impotentes em situações de

comunicação de algumas esferas, justamente por não dominarem os gêneros na prática.

Nas relações humanas, sabemos que as crianças, em boa medida, aproximam-se dos

gêneros primários - ligados às esferas sociais cotidianas. Precisam, no caso, contatar-se com

as situações comunicativas mais elaboradas da linguagem, as quais são requeridas pelos

gêneros secundários do discurso e que precisam, pois, ser ensinados. Julgamos que isso,

inclusive, constitui-se como uma das funções dos materiais didáticos - divulgar o saber

diferenciado, face às situações reais que a vida pública coloca e às quais os educandos têm

menos acesso.

Outro resultado a ser reiterado é que, a indicação de gêneros nas propostas de

produção ainda não minimizou a centralização na norma padrão escrita tomada como

excelência pela sociedade. Por mais que se tenha a ampla presença dos gêneros da esfera

cotidiana, ainda se vê um descaso em propor os registros linguísticos diferenciados, o que

demonstra que a diversificação de gêneros, na verdade, não revela propostas relativamente

diversificadas quanto às variedades linguísticas.

Além disso, por mais que tenhamos identificado a presença de gêneros que circulam

no âmbito extraescolar, encontramos também a “didática da visitação” que, segundo Rojo

(2003, apud Barros-Mendes, 2005)33

, é caracterizada quando os livros didáticos apresentam

um número enorme de gêneros, com uma repetição exaustiva de alguns, sem que ocorra o

tratamento efetivo de nenhum.

Por essa acepção, pode-se afirmar que a diversidade de gêneros no conjunto da

Amostra desta pesquisa vai ao encontro da “didática da visitação”, uma vez que o critério de

diversidade tomado pela Avaliação do PNLD parece basear-se na quantidade de gêneros

solicitados nas propostas de produção. Como já dito no decorrer deste texto, verifica-se, por

exemplo, que a soma de recorrências das três primeiras esferas mais contempladas (cotidiana,

escolar e literária) revela um valor que representa mais da metade do total de propostas da

Amostra, demonstrando que os vários gêneros de outras esferas atuam apenas como os

33 De acordo com Barros-Mendes (2005), a “didática da visitação” foi citada por Rojo, através de uma

comunicação pessoal na disciplina Aprendizagem de Língua Materna, ministrada na Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, em 2003.

162

“gêneros da visitação”, sem haver uma sistematização mais aprofundada que favoreça o

conhecimento dos mesmos.

Porém, como os dados quantitativos aqui obtidos não são suficientes para revelar o

tratamento dado aos gêneros do discurso, recorremos também à análise de natureza qualitativa

da pesquisa, a fim de (in)validarmos o que tem sido verificado - que no conjunto da Amostra,

as coleções didáticas não abordam a diversidade dos gêneros em toda a sua dimensão.

5.2 Os elementos constitutivos da situação de produção escrita

Como apontado na seção precedente, em um primeiro momento de análise, visamos

obter indícios quantitativos sobre a diversidade dos gêneros do discurso nas propostas de

produção escrita, a partir da recorrência de cada gênero e de cada esfera contemplados no

conjunto das oito coleções didáticas.

Para esse segundo momento de análise, fizemos o recorte do corpus da pesquisa para

responder ao seguinte questionamento: Como é abordada a situação de produção em o que

o texto escrito deverá ser produzido? No caso, para esse recorte, foram selecionadas duas

coleções trabalhadas a nível de 1º a 5º ano - A Aventura da Linguagem e Aprendendo Sempre

- o que totaliza 10 livros didáticos.

Então, para conhecermos melhor as duas coleções que compõem a natureza qualitativa

da pesquisa, pretendemos descrever sucintamente o perfil geral de cada obra, destacando seu

modo de organização, bem como os pressupostos teóricos adotados pelos autores.

A partir disso, é dada atenção aos elementos constitutivos da situação de produção

(destinatário, finalidade comunicativa, conteúdo temático, estrutura composicional, dentre

outros), de forma a ampliar nossas reflexões acerca do tratamento dado aos gêneros do

discurso como objetos de ensino-aprendizagem. No entanto, para um melhor conhecimento,

também delinearemos um perfil quantitativo das duas coleções selecionadas, traçando a

incidência dos gêneros e das esferas contemplados nas propostas de produção escrita.

163

5.2.1 A Aventura da Linguagem: um breve perfil da obra

No volume do 1º ano, a obra A Aventura da Linguagem é de autoria de Maria Luisa

Campos Madeira de Ley Aroeira, Silvana Aparecida Costa e Zélia Almeida Gusmão de

Andrade. Nos volumes do 2º ao 5º, além da participação dessas duas últimas autoras, há

também a colaboração de Luiz Carlos Travaglia. A seguir, segue a formação de cada um,

informada na própria coleção.

Ley Aroeira: licenciada em Pedagogia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras

(FAFI-BH), consultora em projetos pedagógicos e docente em cursos de especialização

para professores de Educação Infantil e Ensino Fundamental.

Costa: licenciada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, com

especialização em leitura e produção de texto.

Andrade: licenciada em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais,

e em Letras, pela Universidade Federal de Minas Gerais.

Travaglia: mestre em Letras (Língua Portuguesa) pela PUC-RJ, doutor em Ciências

(Linguística) pela UNICAMP e Pós-Doutorado em Linguística pela UFRJ. Professor de

Língua Portuguesa e Linguística do Instituto de Letras e Linguística da Universidade

Federal de Uberlândia.

Nos volumes do 1º e 2º ano, a coleção é estruturada em quatro unidades, cada uma,

apresentando cinco capítulos com um texto principal. Tais capítulos são formados pelas

seguintes seções:

Dialogando com o texto, que propõe atividades de interpretação.

Construindo com palavras, que visa à produção de um texto, seja na forma oral, escrita

e/ou pela representação plástica. Essa seção é, prioritariamente, o foco de nossa análise.

Dialogando com outro texto, que tem por finalidade propor a interlocução do texto

principal com outros textos.

A palavra é sua, que apresenta atividades para o desenvolvimento da linguagem oral e,

sobretudo, das habilidades em argumentar.

164

Brincando com letras e palavras, composta por atividades que visam à formação e à

consolidação da consciência fonológica.

Para o ensino-aprendizagem da alfabetização e letramento, é destacado que as

atividades dos dois primeiros volumes são construídas para o aluno:

[...] desenvolver a capacidade de comparar, estabelecer relações, refletir,

inferir, processar e compreender informações, visando à construção do

conhecimento, a partir da elaboração de hipóteses sobre o funcionamento e

as regras do sistema alfabético de escrita. (TRAVAGLIA; COSTA;

ANDRADE; 2008, manual do professor, v. 2, p. 2).

Visando, pois, não somente à aquisição da língua, mas também ao desenvolvimento da

língua, os autores de ambos os volumes enfatizam a importância de trabalhar o sistema

alfabético de escrita, por meio da produção de textos que se efetivam com os mais variados

tipos e gêneros textuais34

.

Por conseguinte, os volumes do 3º ao 5º ano são estruturados a partir de quatro

unidades da mesma temática: Histórias, personagens e cenários; Cartas e outros escritos; No

palco, na tela e na vida; Fatos e fotos. Os quatro capítulos que compõem cada uma dessas

unidades apresentam, por sua vez, as seguintes seções:

Pré-texto, que tem a finalidade de resgatar o conhecimento prévio dos alunos sobre o tema

a ser trabalhado, despertando seu interesse pela leitura do texto e pelas demais atividades

do capítulo.

Dialogando com o texto, que apresenta questões sobre a estrutura textual, vocabulário e,

sobretudo, interpretação.

Dialogando com outros textos, que propõe a interlocução do texto principal com outros

textos, a fim de que os alunos percebam que um mesmo tema pode ser trabalhado com

abordagens distintas.

Opinião e Discussão, que apresenta atividades para o desenvolvimento da oralidade,

especialmente, para a habilidade de argumentar.

34

Nomeação usada pelos autores da referente coleção didática.

165

Produção de texto, que propõe situações para a elaboração de um texto escrito ou oral,

com base em atividades já trabalhadas anteriormente. Decerto, essa seção que aparece pelo

menos uma vez em cada capítulo, interessa-nos sobremaneira.

A construção do texto na fala e na escrita, que busca orientar os alunos no que diz respeito

aos recursos da língua, chamando a atenção para a existência e o modo de funcionamento

desses recursos.

Vê-se, assim, que antes de o educando ser solicitado a produzir um texto escrito, ele

realiza atividades que objetivam suscitar: o contato com a temática destacada no capítulo; a

ampliação e o enriquecimento do vocabulário; o conhecimento sobre a composição do texto; o

estímulo a fazer inferências; a exposição de opiniões e o acolhimento ao argumento contrário;

etc. Tais elementos, se de fato trabalhados e se bem orientados, podem subsidiar o aluno na

produção escrita de seu texto.

A respeito dos pressupostos teóricos adotados na coleção, os autores ressaltam que:

A concepção de linguagem adotada foi a de linguagem como forma de

interação, e a meta prioritária é a de desenvolver a competência

comunicativa, o que inclui também ensinar a modalidade escrita e a norma

culta da língua, mas não só, pois a utilização adequada da língua vai muito

além de saber usar a norma culta e a variedade escrita da língua.

(TRAVAGLIA; COSTA; ANDRADE; 2008, manual do professor, v. 5, p.

55).

Nesse sentido, as atividades propostas são, para os autores, desenvolvidas com base na

concepção interacionista da linguagem, por julgarem que seu uso é tratado na obra como

forma de ação social entre interlocutores.

Baseando-se, pois, em referenciais teóricos como Wanderley Geraldi, Ingedore Koch,

Lívia Suassuna e Luiz Travaglia, há uma ênfase nos Manuais do Professor sobre a

importância de os alunos descobrirem a função e a especificidade dos mais diferentes tipos e

gêneros de textos, em vista de se adequarem às situações específicas e concretas de

comunicação.

166

5.2.1.1 O lugar dos gêneros e das esferas: análise quantitativa

Na coleção A Aventura da Linguagem, os dados obtidos demostram que, para as 93

propostas de produção escrita, são solicitados 45 gêneros diferentes, distribuídos em nove

esferas sociais.

No quadro abaixo, são apresentados os gêneros e as esferas de origem, coletados a

partir da análise feita com os cinco volumes da coleção - 1º ao 5º ano.

Quadro 17: Gêneros do discurso contemplados ao longo dos anos iniciais x AADL35

Gênero Recorrência Esfera

1º 2º 3º 4º 5º Total

Lista 6 2 - 3 1 12 Cotidiana

Narração - 3 1 2 4 10 Escolar

Entrevista - 1 1 2 1 5 Jornalística

Descrição 1 - 2 2 - 5 Escolar

Bilhete 1 2 2 - - 5 Cotidiana

Texto expositivo 2 1 1 - - 4 Escolar

Anúncio classificado - - 1 2 - 3 Publicitária

Convite - 2 1 - - 3 Cotidiana

Resenha (de filme) - - - 1 1 2 Jornalística

Charge - - - 1 1 2 Jornalística

Regras de convivência - 1 - 1 - 2 Escolar

Notícia - - 1 1 - 2 Jornalística

Slogan - 1 - 1 - 2 Publicitária

Calendário 1 - - - 1 2 Cotidiana

Ficha técnica 1 - - - 1 2 Científica

Anúncio - - 1 - 1 2 Publicitária

Manchete - 1 1 - - 2 Jornalística

Carta comercial - - - 1 - 1 Dos negócios

Carta de reclamação - - - 1 - 1 Cotidiana

Instruções de localização - - - 1 - 1 Cotidiana

Carta à redação - - - 1 - 1 Jornalística

Cartão-convite - - - 1 - 1 Cotidiana

Carta-resposta - - - - 1 1 Cotidiana

Resumo - - - - 1 1 Escolar

Poema visual - - - - 1 1 Literária

E-mail - - - - 1 1 Digital

Quadro de instruções - - - - 1 1 Cotidiana

Cartão-postal - - - - 1 1 Cotidiana

Piada 1 - - - - 1 Da tradição oral

Dicas 1 - - - - 1 Cotidiana

35

Em alguns momentos, a identificação da coleção A Aventura da Linguagem será substituída pela sigla AADL.

167

Poema 1 - - - - 1 Literária

Recado 1 - - - - 1 Cotidiana

Comentário opinativo - 1 - - - 1 Escolar

Faixa de segurança - 1 - - - 1 Cotidiana

Anedota - 1 - - - 1 Da tradição oral

Instruções de montagem - 1 - - - 1 Cotidiana

Receita - 1 - - - 1 Cotidiana

Foto-legenda - 1 - - - 1 Jornalística

Quadro-resumo - 1 - - - 1 Escolar

Fábula - - 1 - - 1 Literária

Cartão-resposta - - 1 - - 1 Cotidiana

Carta pessoal - - 1 - - 1 Cotidiana

Relato - - 1 - - 1 Cotidiana

Folheto - - 1 - - 1 Publicitária

Perfil - - 1 - - 1 Digital

Total: 45

Não identificado: 5

Sem produção escrita: 3

16 21 18 21 17 93

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Os dados apontados revelam que, dentre os gêneros contemplados pelo conjunto de

volumes da coleção, há uma forte presença dos gêneros das esferas cotidiana e escolar.

Em primeiro lugar, está a lista, com 12 recorrências; em segundo lugar, a narração,

com 10 recorrências; e ocupando o terceiro lugar, encontram-se a entrevista, a descrição e o

bilhete, cada um, com 5 recorrências. Sendo assim, a soma de recorrências de cada um desses

gêneros corresponde a 37 propostas de produção escrita, o equivalente a 39,78% do total de

participação no conjunto da referente Amostra.

Observa-se, pois, que dos cinco gêneros mais priorizados, quatro condizem com as

esferas cotidiana e escolar: lista e bilhete, da cotidiana; narração e descrição, da escolar.

Considerando-se o dobro de gêneros desse primeiro grupo, isto é, os dez gêneros

seguintes - texto expositivo (4 recorrências), anúncio classificado (3 recorrências), convite

(3 recorrências), resenha de filme (2 recorrências), charge (2 recorrências), regras de

convivência (2 recorrências), notícia (2 recorrências), slogan (2 recorrências), calendário (2

recorrências) e ficha técnica (2 recorrências) - percebe-se que a soma de suas recorrências

equivale a 24 propostas de produção, o que condiz a um percentual de 25,80% de

participação.

168

Gráfico 6: Gêneros contemplados / Recorrências

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Isso significa que, o dobro dos cinco gêneros mais priorizados apresenta uma soma de

recorrências que não atende à mesma razão de proporção - o dobro de gêneros não representa,

igualmente, o dobro de recorrências reservados para com o somatório de propostas do 1º

grupo. A propósito disso, para obter o percentual esboçado pelo grupo dos 5 primeiros

gêneros, seria necessário levar em conta não só os 10 gêneros seguintes, mas também os 11

gêneros indicados a posterior, ou seja, 21 gêneros ao todo. Para uma melhor compreensão,

vejamos o Gráfico 7.

169

Gráfico 7: Somatório de recorrências dos gêneros / Dados comparativos

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Com os apontamentos feitos, é possível verificar que os dados refletem similar

desproporção encontrada na Amostra Global da pesquisa - nítida discrepância entre o número

de gêneros contemplados e a quantidade de vezes em que se repetem.

Vale ressaltar, inclusive, que mais da metade dos 45 gêneros contemplados pela

coleção, ou seja, 28 deles, aparece uma única vez no conjunto das propostas de produção.

Parecem ser solicitados, portanto, com o propósito de atender ao critério de diversidade

adotado pela Avaliação do PNLD que, segundo Pedrosa (2006), parece ser atestado pela

simples existência numérica de gêneros contemplados.

De acordo com Schneuwly e Dolz (2011[1996]), a retomada dos mesmos gêneros ao

longo dos anos, pode se constituir como um ensino a longo prazo, ao assegurar um nível

maior de aprofundamento por parte dos alunos, tendo em vista que a complexidade do

aprendizado exige tempo.

Pensamos, pois, que nas propostas de escrita dessa coleção, precisaria haver uma

retomada mais equilibrada dos gêneros solicitados, em vista de promover níveis mais

crescentes de complexidade para com o desenvolvimento das produções.

170

No que diz respeito às esferas sociais, são apresentados, a seguir, os dados

quantitativos obtidos pela pesquisa. Tais dados estão representados através do Quadro 18, o

qual indica as esferas com suas respectivas recorrências e percentual de participação, bem

como do Gráfico 8, para ajudar em uma melhor visualização.

Quadro 18: Esferas sociais contempladas x AADL

Esfera Recorrência %

Cotidiana 36 38,70%

Escolar 24 25,80%

Jornalística 15 16,12%

Publicitária 8 8,60%

Literária 3 3,22%

Científica 2 2,15%

Da tradição oral 2 2,15%

Digital 2 2,15%

Dos negócios 1 1,07%

Total: 9 Total: 93 Total: 100%

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Gráfico 8: Esferas contempladas / Percentual de participação

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

171

Mediante os dados quantitativos reproduzidos, evidencia-se que, em primeiro lugar, a

esfera mais frequentemente contemplada é a cotidiana, com 36 recorrências e com um índice

de participação que condiz a 38,70% do total de propostas. Já o segundo lugar é ocupado pela

esfera escolar, com 24 recorrências e com um percentual de 25,80%. Esse posicionamento

revela um resultado semelhante ao delineado pelo panorama da Amostra Global da pesquisa,

pois no conjunto das oito coleções que compõem o primeiro momento de análise, as duas

esferas mais comumente priorizadas são, respectivamente, a cotidiana e a escolar.

Um aspecto que consideramos interessante de ser enfatizado encontra-se no quadro

abaixo.

Quadro 19: Esferas priorizadas em cada volume x AADL

v. 1 v. 2 v. 3

Esfera Recorrência Esfera Recorrência Esfera Recorrência

Cotidiana 10 Cotidiana 9 Cotidiana 6

Escolar 3 Escolar 7 Escolar 4

Da tradição

oral

1 Jornalística 3 Jornalística 3

Literária 1 Da tradição

oral

1 Publicitária 3

Científica 1 Publicitária 1 Literária 1

Digital 1

v. 4 v. 5

Esfera Recorrência Esfera Recorrência

Cotidiana 6 Cotidiana 5

Jornalística 6 Escolar 5

Escolar 5 Jornalística 3

Publicitária 3 Literária 1

Dos negócios 1 Digital 1

Científica 1

Publicitária 1

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Pelo exposto, vê-se que as esferas cotidiana e escolar estão entre as mais priorizadas

em ambos os volumes da coleção, não havendo resultados muito divergentes para as esferas

que compõem os primeiros lugares.

Levando-se em conta novamente as informações obtidas através do Quadro 18 e do

Gráfico 8, pode-se dizer que, em terceiro lugar, aparece a esfera jornalística, com um índice

de participação correspondente a menos da metade do índice obtido pela esfera cotidiana - 15

172

recorrências, o que representa um percentual de 16,12%. Em seguida, nota-se a presença das

esferas publicitária e literária, posicionadas, respectivamente, em quarto e em quinto lugar:

a publicitária, com 8 recorrências, o equivalente a 8,60% das propostas; e a literária, com

somente três recorrências, o correspondente a 3,22%, tendo um percentual de participação que

representa menos da metade da esfera anterior. O sexto lugar é, por sua vez, dividido pelas

esferas científica, da tradição oral e digital, cada uma, com duas recorrências e com um

percentual de 2,15% em participação. Em sétimo e em último lugar, aparece a esfera dos

negócios, com apenas uma recorrência (1,07%), cuja presença parece ser constada apenas

para o preenchimento do critério de diversidade endossado pelo processo avaliativo do PNLD.

Para acentuar a dessimetria de participação entre cada uma das esferas contempladas,

observemos o gráfico seguinte.

Gráfico 9: Somatório de recorrências das esferas / Dados comparativos

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

De acordo com o Gráfico 9, a soma de recorrências das duas primeiras esferas mais

priorizadas (1º grupo) - cotidiana e escolar - equivale a 60 propostas de produção escrita, o

que condiz com um percentual de 64,51%. Em outros termos, a quantidade de recorrências

173

obtidas no 1º grupo revela um índice de participação bastante expressivo, visto que indica um

resultado que representa mais da metade do total de propostas da coleção analisada.

Considerando as sete esferas restantes (grupo 2) do Quadro 18, verifica-se que a soma

de suas recorrências é responsável por menos da metade do total de propostas quantificadas -

33 recorrências, o correspondente a 35,48% do total de produções escritas. Esses dados

revelam, portanto, o nível de desproporção encontrado no perfil da coleção - mesmo que o

grupo 2 conte com a participação de uma maior quantidades de esferas (7), ele não apresenta

um resultado superior ao número de propostas reservadas paras as duas esferas do grupo 1.

A partir da apresentação dos dados obtidos, podemos delinear algumas características

que compõem o perfil da coleção A Aventura da Linguagem.

Tal como se verifica no perfil da Amostra Global, os chamados gêneros escolares,

cristalizados pela tradição escolar, estão essencialmente entre os gêneros mais contemplados.

Assim, a narração e a descrição são tomadas como referência para o ensino da produção

escrita, revelando uma prática sedimentada nas estruturas tipológicas.

A lista, assim como na Amostra Global, também se encontra entre os gêneros mais

priorizados. Aliás, dentre os cinco volumes da coleção, a sua recorrência fez-se mais presente

no 1º ano. Isso remete-nos, portanto, à afirmação feita na subseção 5.1 - de que a lista pode

ser concebida pelos autores como o gênero que facilita a aquisição do sistema alfabético da

língua escrita, aliado ao seu uso social.

Em síntese, vê-se que os autores dessa coleção parecem considerar os gêneros das

esferas cotidiana e escolar como os mais produtivos e necessários à formação dos alunos que

estão nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

Outro aspecto a ser ressaltado é que a ausência da esfera artística e da ínfima

expressividade da tradição oral nas propostas de produção mostra a falta de reconhecimento

aos gêneros representativos das culturas locais. Em decorrência disso, parece que, nas

produções escritas solicitadas, há uma ênfase, sobremaneira, na norma culta da língua, bem

como na cultura valorizada, em detrimento das variedades linguísticas e da diversidade

cultural.

Merece ser também destacada a presença das esferas publicitária e jornalística, que

tem, inclusive, a entrevista dentre os cinco gêneros mais priorizados. Apesar delas não

obterem similar participação concedida às esferas cotidiana e escolar, é possível afirmar que

suas participações refletem um aspecto positivo da coleção, por trazer outros gêneros

174

escolarizados para as atividades de produção, não se limitando somente aos gêneros do

cotidiano. O mesmo pode ser dito da esfera digital, que mesmo sendo convocada em apenas

duas propostas é, pelo menos, levada em conta na coleção analisada, ao contrário das demais

coleções que compõem a Amostra Global.

À luz dessas considerações, pode-se preconizar que, assim como visto nos resultados

obtidos pela Amostra Global, a diversidade de gêneros esboçada na referente coleção pauta-se

também na didática da visitação, uma vez que encontramos uma grande quantidade de

gêneros, com uma repetição exaustiva de alguns e consoante inexpressividade de outros

tantos.

Os resultados obtidos para com a análise dos dados divergem, portanto, da afirmação

feita pelos autores da coleção.

Para chegar ao domínio das diferentes variedades linguísticas, a estratégia

básica e fundamental é possibilitar o contato com essas variedades e seu uso

pelo aluno. Este deve conviver com os mais diversos tipos e gêneros de

textos para descobrir a função e a especificidade de cada um. Nesta coleção,

trabalhamos com essa diversidade de tipos e gêneros de textos.

(TRAVAGLIA; COSTA; ANDRADE; 2008, manual do professor, v. 4, p. 6-

7, grifo nosso).

Em consonância com o pensamento desses autores, os pareceristas do Guia do PNLD

2010 também asseveram que as propostas de escrita da coleção trabalham com gêneros de

diversas áreas culturais.

Porém, conforme já mencionado na subseção 5.1, conceber a diversidade somente pela

existência numérica dos gêneros solicitados parece ser um critério inconsistente e passível de

ser controverso. No caso da coleção analisada, apenas há diversidade para os gêneros de

algumas esferas, não tendo uma distribuição equilibrada de recorrências. Tal diversidade não

expressa, assim, a dinamicidade das situações de interlocução, por haver um demasiado

privilégio de algumas, em detrimento de outras.

No entanto, mesmo com os dados quantitativos aqui expostos, é válido delinear a

análise de natureza qualitativa das propostas dessa coleção, a fim de atestarmos a eficácia das

orientações condizentes com as produções escritas.

175

5.2.1.2 Situação de produção: análise qualitativa

Na coleção A Aventura da Linguagem, as propostas de produção escrita baseiam-se

em temáticas adequadas à faixa etária dos alunos que estão nas séries iniciais do Ensino

Fundamental. No volume 1, por exemplo, há produções envolvendo histórias engraçadas,

personagens do folclore, animal preferido e desperdício de água; no volume 2, brincadeiras

preferidas, segurança ao pedestre, lixo e aproveitamento de sobras de materiais ou alimentos;

no volume 3, profissão, aventuras, divulgação de peça e animal de estimação; no volume 4,

convivência, fatos vividos, direitos do consumidor e proteção ao planeta; e no 5,

superpoderes, acampamento de férias, rotina de atividades e apreciação de filme assistido.

Quanto à construção temática, verifica-se que a quase totalidade das atividades

examinadas auxilia o educando com alguma sugestão sobre o que escrever. Por isso, em

muitos casos, as propostas não se limitam a apresentar somente o tema, mas também a

oferecer algum tipo de orientação sobre o que pode ser escrito.

Figura 11: Construção temática a partir de tópicos sugestivos

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 3, p. 68, carta pessoal

176

Figura 12: Construção temática a partir de questionamentos

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 5, p. 28-29, narração

Figura 13: Construção temática a partir dos textos trabalhados na seção de leitura

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 1, p. 169, ficha técnica

Tendo em vista que os autores da coleção investem nos possíveis desdobramentos do

tema a ser abordado, a apresentação de subsídios para a construção temática pode favorecer,

inclusive, as crianças que com frequência reclamam sobre a falta de ideias do que dizer.

Em alguns poucos casos, vê-se mais a presença de sugestões temáticas do que

propriamente contribuições para a elaboração temática. No volume 4 (p. 57-59), é solicitada,

por exemplo, a produção de uma carta de reclamação, a fim de que a fictícia consumidora

reivindique seus “direitos de consumidor”. Porém não há, nesse volume nem nos anteriores a

177

ele, atividades que esclareçam o que significa “direitos do consumidor”, o porquê de o

consumidor ter direitos e quais são esses direitos. Similar falta de orientação pode ser vista no

volume 1 (p. 73), ao ser solicitado que o aluno dê dicas de segurança para quem solta uma

pipa. Contudo, nas seções anteriores à produção de texto, não há uma discussão que enfatize

os riscos que se tem ao soltar uma pipa; é informado apenas o que é esse brinquedo e quais os

outros nomes dados a ele. Uma criança, então, sem experiência em soltar pipa e que não sabe,

ao menos, dos seus riscos, provavelmente, terá dificuldades em pensar nas dicas de segurança.

No que diz respeito à estrutura composicional, nota-se que, em ambos os volumes da

coleção, não há menção sobre esse referente elemento. Apenas nas produções textuais

baseadas no bilhete e na carta (pessoal, comercial e de reclamação), há uma preocupação em

orientar as formas relativamente estáveis desses gêneros. Para o bilhete, os autores destacam a

presença do destinatário, mensagem, despedida e assinatura e, para a carta, o local e data,

saudação seguida do nome do destinatário, assunto ou finalidade da correspondência,

despedida e assinatura.

É válido ressaltar que, nas próprias situações em que o gênero solicitado é o mesmo

trabalhado em outras seções, não se encontram orientações sobre a construção composicional,

uma vez que tais seções não focam o gênero como objeto de ensino-aprendizagem, mas como

instrumento para trabalhar, sobretudo, a interpretação textual. Ou seja, o foco não é o gênero e

sim, o texto a ele vinculado.

Embora não concebamos os gêneros do discurso como formas estáticas, lembremos

que, para Bakhtin (2011), os gêneros apresentam relativas regularidades composicionais,

possibilitando a sua identificação nas esferas sociais. Por isso, entendemos a necessidade de

serem apresentadas, na coleção, orientações consonantes à relativa padronização da

estruturação composicional, a fim de que os educandos distingam um gênero em meio a

outros existentes.

Quanto à contribuição para o estilo da linguagem, observa-se que não há o

desenvolvimento de propostas que orientem, com precisão, a estilística do gênero solicitado.

Inclusive, nas outras seções que compõem a coleção, não existe um estudo que ampare o

aluno a perceber a relação desse elemento com o gênero do discurso.

Na verdade, os autores tendem a promover uma exploração mais genérica, do tipo:

colocar título, usar paragrafação e letra legível, pontuar corretamente, lembrar-se das letras

maiúsculas em nomes próprios e início de frases, separar corretamente as palavras nos finais

178

de linhas, fazer o espaçamento entre as palavras, etc. Seguem, abaixo, alguns trechos das

atividades para corroborar a afirmação.

Figura 14: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 3, p. 12, fábula

Figura 15: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 4, p. 23, narração

179

Desse modo, não aparecem orientações para chamar a atenção do aluno ao fato de que

certos gêneros possuem um estilo característico, já que, conforme Bakhtin:

[...] os estilos de linguagem ou funcionais não são outra coisa senão estilos

de gênero de determinadas esferas da atividade humana e da comunicação.

[...] é a esses gêneros que correspondem determinados estilos. [...] O estilo é

indissociável de determinadas unidades temáticas e - o que é de especial

importância - de determinadas unidades composicionais: de determinados

tipos de construção do conjunto, de tipos do seu acabamento, de tipos de

relação do falante com outros participantes da comunicação discursiva - com

os ouvintes, os leitores, os parceiros, o discurso do outro, etc. (BAKTIN,

2011, p. 266).

Na coleção analisada, portanto, o vínculo entre estilo e gênero não é levado em conta

nas propostas de produção escrita. No caso, os aspectos linguísticos não são pensados

conjuntamente como elo da dimensão interlocutiva dos gêneros.

Vê-se também a tendência de não explicitar outros parâmetros constitutivos da

situação de produção, como: para quem, para quê, para que contexto de circulação e para que

suporte deverá escrever.

Em ambos os livros didáticos da coleção, é recorrente a ausência de indicações sobre o

destinatário para o texto do educando (sobretudo, nos volumes 1 e 2), de forma que este não

saberá para quem escrever, sendo impossibilitado de tomar decisões quanto ao que deve ser

dito. Decerto, o autor do texto mudaria o estilo da linguagem se escrevesse para um amigo ou

uma autoridade, para um conhecido ou um desconhecido.

Negar ao aluno indicações a respeito do seu interlocutor faz-nos pressupor que o leitor

preferencial do que está sendo escrito em sala de aula é o professor, o qual avalia e julga as

escritas produzidas. Isso, provavelmente, pode induzir o educando a tomar a escrita do

educador como única ou quase exclusiva referência de qualidade para uma produção textual.

Tal possível consequência diverge do que é preconizado na coleção:

O produtor do texto [..] precisa assumir-se como locutor, isto é, como aquele

que diz (ou fala) alguma coisa. Em outras palavras, ao assumir-se como

aquele que diz (falando ou escrevendo), o(a) aluno(a) evita a reprodução, a

repetição, a cópia. Evita fazer o texto para a escola, para agradar ao

professor, pensando no que o professor gostaria de ouvir ou ler naquele

texto que ele está produzindo. (TRAVAGLIA; COSTA; ANDRADE; 2008,

manual do professor, v. 2, p. 21, grifo nosso).

180

Além do professor como leitor preferencial, muitas vezes, também, o destinatário

limita-se aos demais alunos da turma, com o intuito de que estes apreciem a produção feita e/

ou avaliem a produção do colega, dando opiniões sobre o que precisa ser melhorado.

Figura 16: Destinatário da produção

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 3, p. 130, notícia, grifo nosso

Figura 17: Destinatário da produção

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 4, p. 30, descrição, grifo nosso

Figura 18: Destinatário da produção

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 5, p. 124, quadro de instruções, grifo nosso

Figura 19: Destinatário da produção

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 5, p. 141, charge, grifo nosso

Em poucos casos, encontra-se a indicação de outros destinatários, sejam eles fictícios,

sejam reais: fictícios - cão e peixinho (v. 2, p. 173, convite), Ana (v. 3, p. 43, bilhete), Tânia

(v. 3, p. 51, cartão-resposta), livraria (v. 4, p. 51, carta comercial), gerente da loja (v. 4, p. 58,

carta de reclamação), Tomé (v. 5, p. 38, carta-resposta), amigo (v. 5, p. 79, e-mail) e

entrevistador (v. 5, p. 107, entrevista); reais - pessoa de sua família (v. 2, p. 124, bilhete),

181

colega de outra cidade (v. 3, p. 68, carta pessoal) e outras turmas (v. 4, p. 137, cartão-

convite).

No entanto, corroboramos com Costa Val, ao afirmar que:

Se não é freqüente que propostas explicitem a quem se dirige o texto, é

menos frequente ainda [...] que as atividades de escrita criem para o aluno

oportunidades de trabalhar deliberadamente na construção de uma imagem

adequada do leitor, num processo efetivamente dialógico. (COSTA VAL,

2008, p. 133).

Com base nos aspectos apontados, é possível verificar que não há, na coleção

analisada, orientações que incluam uma reflexão sobre o leitor dos textos produzidos pela

criança. Ou seja, não é oportunizado ao aluno perceber as implicações que o perfil do leitor

ocupa diante das decisões a serem tomadas - definição sobre a forma de tratamento, escolha

do tom apropriado ao texto (formal, informal, irônico, humorístico, etc.), uso da norma culta

da língua ou de outra variedade linguística, etc. Tal ausência é um reflexo da ineficácia de

tratamento dado ao estilo da linguagem, já comentado neste texto.

Por essa perspectiva, vê-se a divergência entre o que é defendido no Manual do

Professor e o que é encontrado no Livro do Aluno. Conforme delineado pelos autores da

coleção, para se produzir um texto, é preciso escolher “[...] estratégias adequadas para dizer o

que tem a dizer para um interlocutor (um leitor) determinado. Estratégias são os modos ou

maneiras escolhidas para construir o texto: o estilo, o tom, a linguagem, etc.” (TRAVAGLIA;

COSTA; ANDRADE; 2008, manual do professor, v. 2, p. 21).

Portanto, é cabível lembrar que, não basta somente indicar o destinatário, faz-se

necessário mostrar também que, em razão do perfil do futuro leitor, as características

relativamente estáveis do gênero sofrem alterações.

Como forma de exemplificar o que acontece na coleção, observemos a proposta de

produção escrita presente no volume 4. Essa proposta é iniciada através da apresentação de

uma carta direcionada ao Papai Noel, escrita por uma criança chamada Olavo, a qual deseja

ganhar uma bicicleta. Sua mãe, na posição de Papai Noel, compra o presente desejado. Segue,

na próxima página, um trecho da atividade.

182

Figura 20: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 4, p. 58, carta de reclamação

A proposta apresentada, ainda que baseada em um destinatário fictício, poderia ter

sido constituída com informações sobre a caracterização do gerente da loja, encaminhando

reflexões acerca da construção do texto mais adequada para o interlocutor a que se dirige.

Sem chamar a atenção para isso, o educando não reflete sobre a importância de direcionar a

escrita ao seu interlocutor previsto.

Compreende-se, assim, que as propostas de produção escrita não se aproximam da

concepção de destinatário entretecida pelas teorias bakhtinianas.

Recordemos que, para Bakhtin (2011), o autor molda a sua fala/escrita mediante a

percepção que faz de seu destinatário, esperando uma possível reação-resposta do mesmo.

Porém, parece que na coleção em questão, o destinatário não é concebido como um

importante participante da comunicação discursiva, mas sim, um mero interlocutor que

somente lê, sem uma posição responsiva.

Considerando a finalidade comunicativa de cada produção, vê-se a existência de

orientações superficiais, tais como: contar pequenas histórias engraçadas (v. 1, p. 51), Agora

é a sua vez de encontrar a rima (v. 1, p. 151), Reconte a história, como se você fosse o garoto

do tombo (v. 2, p. 117), preencha o quadro seguinte (v. 2, p. 192), criar um final feliz para a

Cigarra (v. 3, p. 12), produza um texto com o título: SALADA DE PAIS (v. 3, p. 31), compor

uma história, contando as aventuras de Ramiro na cidade (v. 3, p. 58), Imagine como seria

passar o dia com seu “outro” e conte sua história (v. 4, p. 37), Agora você vai escolher um

tema para fazer um poema desse tipo (v. 5, p. 62). Pelos exemplos citados, a indicação de

183

produções, sejam estas baseadas nos gêneros escolares ou escolarizados, estão desprovidas de

objetivos concretos.

Por outro lado, veem-se também, ainda que em menor recorrência, propostas que

atendem a uma finalidade mais clara, como:

escolher um brinquedo que gostaria de ganhar para, em seguida, escrever um bilhete,

pedindo o presente desejado a uma pessoa da família (v. 2, p. 124);

elaborar regras para tornar o ambiente da escola e da rua mais limpo (v. 2, p. 132);

criar uma receita para o aproveitamento de sobras de materiais ou alimentos (v. 2, p. 132);

criar um anúncio para o jornal da escola, oferecendo uma bicicleta e dizendo o que quer

em troca, de forma a convencer os interessados de que a troca vale a pena. (v. 3, p. 24-25);

escrever uma lista e afixar no cartaz, a fim de fazer uma campanha pela preservação da

água (v. 4, p. 112);

produzir uma lista dos 4Rs (recolher, reutilizar, reduzir e reciclar), para realizar uma

campanha de proteção ao planeta (v. 4, p. 127).

Exemplificar essas propostas ajudam a mostrar o quanto as informações sobre os

objetivos são necessárias para uma boa produção escrita, uma vez que melhor orientam os

educandos a entender a pertinência sobre o que está sendo escrito e as metas que precisam ser

alcançadas.

A respeito do suporte e do efetivo contexto social de circulação, tais elementos, na

maioria das propostas, não são mencionados. Quando citados, o suporte é o mural da sala de

aula ou da escola, o caderno do aluno, a folha avulsa, o cartaz e o jornal da escola, sendo este,

indicado duas vezes. O contexto de circulação é, predominantemente, a escola. Em algumas

poucas situações, evidencia-se a circulação dos gêneros no contexto extraescolar: enviar um

bilhete pra uma pessoa da família e distribuir cartazes de conscientização (preservação da

água e proteção ao planeta) por lugares de grande frequência da cidade ou do bairro.

É válido destacar também que indicar o jornal da escola para a circulação do gênero

seria um aspecto positivo da coleção. Porém, tal indicação não reflete uma proposta que

explora a adequação da produção ao suporte que o veicula. Aliás, como não há orientações

que estimulam a construção do texto em sua relação com o jornal da escola, provavelmente,

as propostas ocorrem apenas pelo “mundo da imaginação”.

184

Inclusive, em consequência da quantidade de propostas restritas à natureza escolar, a

posição enunciativa não é um elemento explorado na coleção. Ou seja, o educando não é

incentivado a representar outros papéis sociais que ele pode desempenhar em sua escrita (de

filho, de cidadão, de jornalista, etc.). Em alguns poucos casos, há informações que ele

escreverá enquanto pesquisador, compradora, editor de um jornal, mas sem haver a devida

orientação didática.

Essas considerações apontam, mais uma vez, para a divergência existente entre o que é

lido no Manual do Professor e o que é elaborado no Livro do Aluno.

Nunca se deve pedir ao aluno para produzir um texto dando simplesmente

um título, tema ou assunto. É preciso estabelecer minimamente uma

situação: para quem se produz o texto? com que objetivo? quando? onde?

Para ser veiculado como, em que suporte? Esse procedimento terá

consequências, na avaliação da qualidade do texto. Só podemos avaliar sua

qualidade se todos esses aspectos estiverem claros [...] O texto tem que ser

adequado à situação de interação comunicativa nos diversos sentidos [...].

(TRAVAGLIA; COSTA; ANDRADE; 2008, manual do professor, v. 5, p.

32).

Na verdade, o que se verifica, em geral, é que os elementos constitutivos da situação

de produção são tratados de maneira lacunar na coleção A Aventura da Linguagem. Logo, no

contexto linguístico-discursivo, apesar do bom trabalho com a construção temática, as

dimensões como estrutura composicional e estilo da linguagem praticamente não são

indicados; no contexto funcional, o destinatário e a finalidade comunicativa, na maior parte

das propostas, perdem o seu caráter social e dialógico para com o gênero contemplado; e no

contexto histórico-social, a esfera e o suporte de circulação, quando citados, são

caracterizados, predominantemente, pela natureza escolar. Vejamos, a seguir, exemplos de

propostas na íntegra.36

36 Inicialmente, tínhamos o intuito de apresentar exemplos dos cinco gêneros mais priorizados pela Amostra

Global da pesquisa (narração, conto, poema, descrição e lista). Porém, o conto não é trabalhado nas propostas de

produção escrita. Somado a isso, na análise quantitativa da Amostra Global, ao refletir-se sobre o tratamento

dado à narração e à descrição, utilizamos como exemplos, propostas da coleção em questão, o que se tornaria

repetitivo se falássemos novamente sobre esses dois gêneros escolares. Assim, decidimos escolher propostas que

se aproximassem do perfil predominante da obra analisada.

185

a) Gênero lista

Figura 21: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 1, p. 60, lista

Figura 22: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 2, p. 88, lista

No caso dessas orientações, evidencia-se que o gênero lista, posicionado em 1º lugar

na coleção analisada, com 12 recorrências, perde a viabilidade quanto ao seu uso nas práticas

sociais de escrita. Parece ser solicitado, então, apenas com o intuito de exercitar a escrita, em

vista de favorecer a aquisição do sistema alfabético da língua.

186

b) Gênero resumo

Figura 23: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 5, p. 47, resumo

Para essa produção textual, evidencia-se a priorização pela construção temática,

amparando o aluno sobre o que escrever. Mesmo fazendo uma simplória conceituação acerca

do resumo, a nosso ver, o aspecto dialógico da linguagem é ignorado, perdendo-se a

oportunidade de criar efetivas situações de interlocução. Parece, pois, que tal proposta

objetiva somente exercitar a escrita do aluno, bem como sistematizar a sua capacidade

interpretativa para com a leitura do texto Ícaro, trabalhado em uma seção anterior.

187

c) Convite

Figura 24: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 2, p. 88, convite

188

Figura 25: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção A Aventura da Linguagem, v. 3, p. 17, convite

Em ambas as propostas, baseadas na ficcionalização, as produções remetem a uma

situação inverossímil e demasiadamente abstrata (na primeira, os destinatários são um cão e

um peixinho; e na segunda, o autor é um brinquedo velho), não dando o devido cuidado aos

elementos constitutivos da situação de produção. Mesmo sob o enfoque do gênero convite,

percebe-se uma prática que prioriza o que dizer, desprovida, pois, de um contexto coerente e

mimeticamente real. É válido destacar também, a falta de progressão entre ambas, não

sofrendo alterações de encaminhamentos mais significativos.

Portanto, a partir da análise feita, é possível constatar que as propostas de produção

escrita, em geral, estão focadas em sugestões de temas e, por vezes, ao uso de alguns

conhecimentos linguísticos. Não há o devido enfoque aos elementos que compõem a situação

de produção na perspectiva do gênero do discurso. Por isso, corroboramos com as afirmações

189

feitas no Guia do PNLD 2010 sobre a referente coleção, no que diz respeito, respectivamente,

aos volumes 1 e 2 e aos volumes 3, 4 e 5.

[...] é importante promover melhor investigação acerca dos gêneros textuais

e de seus contextos de circulação, para que a criança perceba o

funcionamento social dos textos em seus contextos reais de uso. Cabe, ainda,

discutir as relações que se estabelecem entre o conteúdo e a organização dos

textos, do ponto de vista de suas funções sociais e dos interlocutores

previstos. [...] As propostas de produção de texto [...] carecem de reflexão

sobre a forma composicional do gênero a ser produzido e de suas condições

de produção. Essa lacuna pede que se encaminhe melhor o planejamento dos

gêneros a serem produzidos, explicitando-se os objetivos em jogo, os

destinatários visados e as formas de circulação previstas. (BRASIL, 2010, p.

43).

As propostas investem essencialmente na apresentação de subsídios para a

construção temática, algumas vezes a partir de referências ou modelos.

Embora com pouca frequência, encontram-se também alguns exemplos de

orientações sobre a estrutura dos gêneros propostos. [...] As atividades de

produção de textos escritos colaboram apenas parcialmente para a formação

do produtor de textos, porque nem sempre explicitam os objetivos do texto a

ser escrito e para quem ele se destina. Essas definições são mais bem

contempladas no gênero carta. É necessário, portanto, que o professor esteja

atento para completar essas lacunas e também para possibilitar a socialização

dos textos para além do contexto escolar. (BRASIL, 2010, p. 190-192).

À luz das considerações aqui delineadas, pode-se preconizar que, os gêneros

contemplados nas propostas de produção não são tratados como objetos a serem ensinados,

uma vez que não há uma efetiva abordagem didática sobre isso. Em outras palavras, as

orientações sobre as características relativamente estáveis dos gêneros, quando aparecem, são

restritas e reduzidas, dando a entender que a aprendizagem acontece simplesmente por uma

interiorização instantânea.

Pelo modo como as propostas são apresentadas, faz-nos remeter ao estudo de Pedrosa

(2006), ao declarar que os gêneros, em algumas coleções didáticas, são concebidos sob o

enfoque metodológico da imersão e do método transmissivo. A primeira, voltada para o

“aprender fazendo” e a segunda, a conteúdos e conceitos que são transmitidos, sem uma

oportunidade de reflexão.

Por essa acepção, parece que as ideias que embasam as propostas analisadas baseiam-

se em ambos os enfoques citados por Pedrosa. Ora se constata uma prática em que se deduz

190

que a criança aprende a fazer fazendo, por um processo de “osmose”, uma vez que é

solicitada a produzir um texto, sem quaisquer ações de ensino, ora se constata uma prática em

que se apresenta o gênero com algumas de suas características e, subitamente, pede-se que a

criança produza o texto com base nesse gênero, acreditando que tais informações transmitidas

são suficientes para sua compreensão.

Tal enfoque transmissivo faz-nos lembrar da chamada educação bancária, conforme

intitulada e criticada por Freire (2011b). No caso, se há orientações didáticas que se

assemelham a educação bancária, podemos afirmar que há, na coleção analisada, um ensino

concebido como a transmissão do saber acumulado e o aprendizado, por sua vez, como a

recepção do conteúdo transferido.

Essa perspectiva implica, consequentemente, numa prática de produção escrita que

não leva em consideração o pensar crítico do aluno, enquanto sujeito participante da

construção e da reconstrução do objeto cognoscível. Aos educandos cabem, então, ser

educados, disciplinados, seguidores e consumidores da prescrição, de forma a incorporarem

docilmente o que é legitimado no material didático.

Essas considerações apontam, de fato, para um importante aspecto - na coleção

analisada, o gênero é muito mais concebido como um instrumento de apoio na organização da

produção do texto escrito, do que como objeto de ensino-aprendizagem. Por não ser tomado

como objeto a ser ensinado, funciona, assim, como meio para o exercício da escrita e,

sobretudo, para a temática do texto a ser desenvolvida.

Por outro lado, como já evidenciado no decorrer deste texto, se há uma prática baseada

por esses enfoques metodológicos, observa-se, em contrapartida, um Manual do Professor

com orientações que reconhecem a importância do processo interlocutivo da produção escrita.

Assim, tal conflito existente entre a teoria e a prática, remete ao pensamento de

Bunzen, ao dizer que:

[...] os objetos de ensino estão, muitas vezes, em disputa epistemológica e

que tais disputas têm conseqüências na forma como os professores e autores

de LDPs entram em contato com tais discussões. Não podemos esquecer que

os livros didáticos [...] são fruto justamente de um momento de tensão (e

disputa) entre várias concepções sobre o ensino de língua materna. [...] Tudo

isso impulsionou um “amálgama” teórico que, em constante movimento, nos

impossibilita, muitas vezes, até de delimitar suas fronteiras quando

procuramos analisar o que está realmente acontecendo nas salas de aula ou

nos livros didáticos de língua portuguesa. (BUNZEN, 2005, p. 73).

191

Por isso, entendemos que, para os autores de uma coleção didática, selecionar os

objetivos de ensino não é uma tarefa fácil, fundamentada somente na transposição de

concepções teóricas para a elaboração de livros didáticos. No caso da coleção aqui analisada,

compreendemos que, se as propostas ora se baseiam em “velhas práticas”, ora levam em conta

“novos conceitos”, isso vem a retratar a própria natureza da coleção que, inserida em um

contexto histórico-social, é passível de experimentar novas mudanças, em um fluxo contínuo

de (re)organização dos seus objetos de ensino.

5.2.2 Aprendendo Sempre: um breve perfil da obra

Para a elaboração da obra Aprendendo Sempre, contou-se com a participação das

autoras Cláudia Miranda e Vera Lúcia Rodrigues. A seguir, seguem algumas informações

sobre a formação de cada uma, disponibilizadas na própria coleção.

Cláudia Miranda: licenciada em Letras, com pós-graduação em Literatura Comparada e em

Teoria da Literatura pela UFJF, MG; mestre em educação pela Universidade Católica de

Petrópolis, RJ; professora de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira desde 1979;

professora de cursos de formação continuada de professores desde 1989; e autora de livros

didáticos, paradidáticos e de literatura infantil.

Vera Lúcia Rodrigues: formada em Letras com pós-graduação em Linguística Aplicada ao

Ensino da Língua Materna pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ); mestre

em educação pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ); ex-professora da rede

municipal do Rio de Janeiro e membro da Equipe Central de Língua Portuguesa, Diretoria

de Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro; trabalha

com Assessoria Pedagógica na área de Educação e Língua Portuguesa; e autora de livros

didáticos.

Em todos os volumes da coleção, são apresentadas algumas seções que,

provavelmente, podem nos ajudar a melhor analisar as propostas de produção escrita. Então,

além da seção Produzindo texto escrito, interesse maior desta pesquisa, destacamos outras, as

quais consideramos pertinentes:

192

Para ler e conversar, na qual se objetiva estimular a observação e a discussão sobre o tema

e o gênero discursivo37

a ser estudado, a partir do conhecimento prévio dos alunos;

Antes de ler, que desafia os alunos a anteciparem ideias e informações contidas na leitura,

como também a resgatarem conhecimentos sobre o gênero discursivo;

Texto 1, Texto 2, que estimula a prática da leitura mediante os gêneros que circulam

socialmente;

Pensando sobre o gênero, formada por atividades que levam o aluno a identificar as

particularidades dos gêneros discursivos38

;

Comparação de gêneros, que aparece em algumas unidades, com o intuito de levar o aluno

a comparar os gêneros já estudados, estabelecendo semelhanças e diferenças entre eles39

;

Língua: reflexão e uso, a qual, em alguns momentos, relaciona-se com os estudos

promovidos na seção Pensando sobre o gênero.

Com base nessas seções, é possível inferir que o trabalho com os gêneros constitui-se

como um dos elementos organizadores de cada unidade da coleção. Por isso, hipoteticamente,

acreditamos que a coleção explora os gêneros do discurso como objeto a ser descrito e

ensinado.

Influenciadas por referenciais teóricos como Bakhtin, Brandão, Freire e Geraldi,

vejamos o que as autoras defendem no Manual do Professor.

A escola tem a responsabilidade de garantir aos alunos o domínio da língua

oral e escrita, pois é ela o instrumento que lhe dá acesso a uma vida social

plena. A língua é uma forma de comunicação necessária para o exercício da

cidadania, pois amplia as possibilidades de partilha de informação e

conhecimento. [...] Portanto, a proposta deste material didático centra-se no

desenvolvimento de habilidades de usos da linguagem [...] geradas pelos

mais diferentes tipos de textos, viabilizando o acesso do aluno ao universo

dos gêneros discursivos que circulam socialmente. (MIRANDA;

RODRIGUES, manual do professor, v. 4, p. 5).

37 Nomeação adotada pelas autoras da coleção didática.

38 Essa seção só aparece nos volumes 2, 3, 4 e 5.

39 Idem.

193

Concebendo a linguagem em sua relação com as práticas sociais e, o gênero do

discurso, como importante elemento para o exercício da cidadania, espera-se que na coleção

Aprendendo Sempre possamos, de fato, encontrar propostas que criem condições o mais

próximo possível das situações em que socialmente os gêneros são produzidos.

5.2.2.1 O lugar dos gêneros e das esferas: análise quantitativa

A partir dos dados quantitativos reproduzidos no Quadro 20, verifica-se que a coleção

Aprendendo Sempre é formada por 45 propostas de produção escrita, distribuídas em 29

gêneros e em 6 esferas correspondentes.

Quadro 20: Gêneros do discurso contemplados ao longo dos anos iniciais x AS40

Gênero Recorrência Esfera

1º 2º 3º 4º 5º Total

Narração 2 1 - 2 1 6 Escolar

Conto - 1 1 1 1 4 Literária

Poema - - 1 1 1 3 Literária

Relato 1 1 - - - 2 Cotidiana

HQ - 1 1 - - 2 Jornalística

Texto informativo - 1 1 - - 2 Escolar

Instruções de montagem - - 1 - 1 2 Cotidiana

Artigo de opinião - - - 1 1 2 Jornalística

Paródia de um conto - - - 1 1 2 Literária

Diálogo 1 - - - - 1 Cotidiana

Receita 1 - - - - 1 Cotidiana

Bilhete 1 - - - - 1 Cotidiana

Lista telefônica - 1 - - - 1 Cotidiana

Placas de sinalização - 1 - - - 1 Cotidiana

Instruções de jogo - 1 - - - 1 Cotidiana

Fábula - 1 - - - 1 Literária

Paródia de cantiga

de roda

- 1 - - - 1 Da tradição oral

Regras de convivência - - 1 - - 1 Escolar

Carta pessoal - - 1 - - 1 Cotidiana

Redação - - 1 - - 1 Escolar

Biografia - - 1 - - 1 Literária

Descrição - - 1 - - 1 Escolar

Cartão-postal - - - 1 - 1 Cotidiana

Resenha de filme - - - 1 - 1 Jornalística

40

Em alguns momentos, a identificação da coleção Aprendendo Sempre será substituída pela sigla AS.

194

Folheto - - - 1 - 1 Publicitária

Texto teatral - - - 1 - 1 Literária

Reportagem - - - - 1 1 Jornalística

Cordel - - - - 1 1 Da tradição oral

Entrevista - - - - 1 1 Jornalística

Total: 29

Não identificado: 1

Sem produção escrita: 4

6 10 10 10 9 45

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Chama-nos a atenção a quantidade de propostas reservadas para cada ano de ensino,

sobretudo, ao que é indicado no volume 1. Para o 1º ano, são trabalhadas somente 6 propostas

de produção escrita, o que significa que, em alguns dos meses letivos, o aluno não tem contato

com esse importante objeto de ensino, cabendo ao professor, solicitar outras produções. Para

os demais anos iniciais de ensino, infere-se que há somente uma produção a cada mês letivo

(no caso do 5º ano, um mês, pelo menos, sem essa prática).

Mediante a Amostra da coleção, os três gêneros mais explorados na seção de produção

textual são: a narração, em 1º lugar, com 6 recorrências; o conto, em 2º lugar, com 4

recorrências; e o poema, em 3º lugar, com 3 recorrências. Vale lembrar que, no panorama da

Amostra Global da pesquisa, a narração, o conto e o poema também aparecem entre os três

gêneros mais contemplados.

Os seis gêneros que seguem a sequência do Quadro 20 (relato, HQ, texto

informativo, instruções de montagem, artigo de opinião e paródia de um conto),

aparecem, cada um, com 2 recorrências. Nota-se que, esses seis gêneros juntos correspondem

ao dobro de gêneros do 1º grupo (narração, conto e poema). Vejamos, no gráfico seguinte, a

quantidade e o percentual de propostas reservados para cada grupo.

195

Gráfico 10: Somatório de recorrências dos gêneros / Dados comparativos

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Conforme os dados esboçados, a soma de recorrências do 1º grupo equivale a 13

produções, o que condiz a um percentual de 28,88%. Para o 2º grupo, por sua vez, são

reservadas 12 produções, ou seja, o correspondente a 26,66% de participação.

Se compararmos esses resultados com os das amostras apresentadas anteriormente -

Amostra Global e Amostra da coleção AADL - vê-se que, na coleção AS, já não há uma

distribuição tão desproporcional para a quantidade de recorrências destinadas aos primeiros

gêneros mais priorizados. Nas amostras anteriores, há uma nítida desproporção, tendo um

predomínio superior dos gêneros mais contemplados, em detrimento de tantos outros

solicitados.

Falemos agora dos outros 20 gêneros que aparecem na sequência do Quadro 20, com

somente uma recorrência cada um. Esses gêneros juntos são responsáveis por 44,44% do total

de propostas, parecendo, pois, estar presentes somente para atenderem ao critério de

diversidade endossado pelo processo avaliativo do PNLD. Isso, certamente, será mais bem

interpretado, com os dados obtidos pela recorrência das esferas.

A seguir, são esboçados o Quadro 21, a fim de destacar as esferas contempladas, com

suas respectivas recorrências e índice percentual de participação, assim como o Gráfico 11,

para ajudar em uma melhor interpretação.

196

Quadro 21: Esferas sociais contempladas x AS

Esfera Recorrência %

Cotidiana 12 26,66

Literária 12 26,66

Escolar 11 24,44

Jornalística 7 15,55

Da tradição oral 2 4,44

Publicitária 1 2,22

Total: 6 Total: 45 Total: 100%

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

Gráfico 11: Esferas contempladas / Percentual de participação

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

197

Os dados reproduzidos no Quadro 21 e no Gráfico 11 demonstram que, as três esferas

mais exploradas são: a cotidiana e a literária, em 1º lugar, cada uma, com 12 recorrências

(26,66% de participação); e a escolar, em 2º lugar, com 11 recorrências (24,44% de

participação), tendo um resultado bastante próximo ao das anteriores. Na Amostra Global da

pesquisa, dentre as três esferas mais priorizadas, estão também a cotidiana, a literária e a

escolar, mudando apenas a ordem de prioridade.

Posteriormente, em 4º lugar, situa-se a esfera jornalística, com 7 recorrências, o que

condiz a 15,55% do total de propostas, tendo um índice que representa quase a metade de

propostas reservadas para as esferas cotidiana e literária. Por fim, as esferas da tradição oral

e a publicitária que ocupam na sequência, o 5º e o 6º lugar, com índices de participação

inexpressivos. Da tradição oral, com 2 recorrências, o equivalente a um percentual de 4,44%;

e a publicitária, com 1 recorrência, o correspondente a 2,22% das propostas que compõe a

Amostra.

Com o propósito de reforçar a discrepância de participação entre as esferas

contempladas, analisemos o gráfico seguinte.

Gráfico 12: Somatório de recorrências das esferas / Dados comparativos

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45

Grupo 2

Grupo 1

Total

Cotidiana Literária Escolar Jornalística Da tradição oral Publicitária

Fonte: Dados extraídos da pesquisa

198

Por esse gráfico, é possível evidenciar que a soma de recorrências das três primeiras

esferas mais contempladas (1º grupo) - cotidiana, literária e escolar - corresponde a 35

propostas de produção, ou seja, a 77,77% do total de propostas da Amostra. Em outras

palavras, o 1º grupo é responsável por quase todas as produções escritas solicitadas na

coleção, restando 10 recorrências para o 2º grupo.

Por essa perspectiva, dentre as 45 recorrências quantificadas no conjunto da Amostra,

o 2º grupo, representado pelas esferas jornalística, da tradição oral e publicitária, é

responsável apenas por 22,22% do total de propostas.

Os resultados apresentados revelam o nível de desproporção encontrado na coleção - o

privilégio, predominante, por três esferas, ao revelarem índices expressivos de participação.

As demais, principalmente, a publicitária e da tradição oral, diríamos, então, que são as

chamadas esferas da visitação, devido à nítida inexpressividade de ambas nas propostas de

produção escrita.

Por outro lado, no Manual do Professor da coleção, é ressaltado que:

O ensino de língua portuguesa, que tem a língua materna por objeto de

estudo, deve ser repensado com o intuito de voltar seu olhar para o texto e

para a diversidade de gêneros em que se materializa. Assim, é fundamental

o aluno conviver com bons modelos de textos verbais (além dos não-

verbais), ser exposto aos mais diferentes gêneros discursivos, para que possa

refletir sobre suas características específicas e se apropriar delas para a

produção de seus próprios textos. Por isso, com esta coleção, os alunos

vivenciarão a leitura e a produção dos mais diversos gêneros discursivos

orais e escritos [...]. Dessa forma, são levados a perceber a função social da

escrita. (MIRANDA; RODRIGUES, manual do professor, v. 3, p. 10, grifo

nosso).

Pelos dados obtidos, parece que os alunos não conseguirão vivenciar a produção dos

mais diversos gêneros discursivos, como mencionado no Manual do Professor.

Assim, considerar a diversidade baseada somente na quantidade de gêneros

contemplados, faz-nos novamente questionar a pertinência desse critério. Na coleção

Aprendendo Sempre, tal diversidade de gêneros parece inconsistente.

Isso é possível de ser dito, tendo em vista que as propostas de produção estão

pautadas, na coleção, pela predominância dos gêneros das esferas cotidiana, literária e escolar.

Fora os índices bastante inexpressivos para com os gêneros das esferas publicitária e da

199

tradição oral, outros gêneros similarmente importantes, como os da divulgação científica,

digital e artística, nem sequer são explorados.

Em decorrência disso, provavelmente, alguns usos públicos e contemporâneos da

linguagem, bem como a representatividade das culturas locais e das variedades da língua, não

são explorados suficientemente no ensino do texto escrito.

Com essas reflexões, corroboramos com as autoras da coleção, ao preconizarem que:

[...] o trabalho de produção de textos orais e escritos deve evidenciar o

uso da escrita em situações diversas. Assim, acreditamos que os alunos

venham a ter condições reais de desenvolver seu potencial crítico-reflexivo,

apropriando-se de novas formas de expressão, com base na análise das

características dos diferentes gêneros discursivos [...]. (MIRANDA;

RODRIGUES, manual do professor, v. 5, p. 7, grifo nosso).

Nesse sentido, entendemos que trabalhar sob o enfoque quase que predominante dos

gêneros das esferas cotidiana, literária e escolar não é suficiente para dar conta das várias

exigências requeridas pelo uso da escrita em situações diversas. Decerto, esse tratamento

pouco estimula a construção das diferentes capacidades de linguagem que os educandos

precisam adquirir no que diz respeito ao ensino-aprendizagem da linguagem escrita. É

preciso, pois, ampliar as propostas a outras instâncias sociais de comunicação, estendendo os

saberes ensinados a outras situações de interlocução que a vida exige.

Por isso, faz-se necessário proceder a uma análise de natureza qualitativa, com o

intuito de verificarmos o modo pelo qual os gêneros são, de fato, concebidos e abordados na

coleção.

5.2.2.2 Situação de produção: análise qualitativa

Na coleção Aprendendo Sempre, as produções escritas são realizadas com base no

trabalho individual, em dupla ou em grupos. Certamente, o trabalho coletivo é importante, ao

estimular atitudes de cooperação e respeito aos diferentes pontos de vista, porém, na coleção,

é preciso que haja um maior incentivo à autonomia da criança, tendo em vista que dentre as

45 propostas solicitadas, apenas 18 se referem à escrita individual.

200

Quanto às temáticas, percebe-se que as mesmas são pertinentes ao universo infantil e,

geralmente, estão articuladas com os assuntos estudados em textos já lidos. Dentre as

temáticas exploradas, encontram-se, por exemplo: história do nome e da família, telefones

úteis, placas educativas e de advertência, convivência, personagens do folclore, animal em

extinção, vivências escolares, alimentação saudável, manifestações culturais, brinquedo de

sucata, trabalho infantil e preservação ambiental.

Há, com isso, orientações que subsidiam a construção temática, como se nota nos

exemplos a seguir.

Figura 26: Construção temática a partir de tópicos sugestivos

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 4, p. 178, resenha de filme

Figura 27: Construção temática a partir de questionamentos

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 2, p. 246, relato

201

Figura 28: Construção temática a partir de textos lidos e estudados

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 5, p. 190, entrevista

202

Dessa forma, os alunos recebem indicações acerca do que pode ser dito

explicitamente, possibilitando-lhes reunir mais condições sobre o que escrever. É cabível

destacar que, na seção Pensando sobre o gênero e a retomada desse mesmo gênero na seção

Produzindo texto escrito, o aluno é amparado a conhecer os temas relativamente previsíveis

de alguns gêneros e, algumas vezes, o tratamento conferido a eles.

Quadro 22: Tema dos gêneros

Gênero Temas relativamente

recorrentes

Tratamento Volume

da coleção

Paródia Recriação de uma obra que já

existe (conto, romance, filme,

etc.)

Cômico, irônico, crítico v. 2

v. 4

Fábula Animais que agem como seres

humanos

Ficcional, moralizante v. 2

Instruções de

montagem

Instruções ao leitor de como

fazer/confeccionar algo

- v. 3

v.5

Carta Assuntos pessoais,

profissionais, comerciais, etc.

- v. 3

Biografia Informações sobre a vida de

alguém, como profissão, talento

e obra do biografado

Formal, informativo v. 3

Poema Manifestação de sentimentos,

emoções e visão pessoal do

mundo

Metafórico, pessoal,

subjetivo, simbólico

v. 4

v. 5

Conto infantil Ações das personagens e

acontecimentos vivenciados

por elas

- v. 4

Resenha Avaliação de um

acontecimento ou de uma

produção cultural

Informativo, opinativo v. 4

Cordel Personagens da região ou

figuras de destaque no país

- v. 5

Fonte: Dados extraídos da coleção Aprendendo Sempre

Por isso, quando o educando é solicitado a produzir o texto com base em um gênero, já

é capaz de criar alguma expectativa em relação ao que será tematizado no texto, como

também ao modo de tratamento mais adequado a ele.

Somado a isso, identifica-se o estímulo em associar o conteúdo temático à apreciação

valorativa de cada aluno, de forma a dialogar com seus leitores. No caso, as atividades que

tratam de orientações mais bem elaboradas melhor propiciam o aluno a estabelecer relações

significativas entre o texto a ser produzido e o seu posicionamento ativo-responsivo. Vejamos

alguns exemplos.

203

Incentivo ao aluno discutir sobre direitos e deveres em sala de aula, dando sugestões para

uma boa convivência. Para isso, em grupo e após a discussão, algumas regras de

convivência devem ser elaboradas e compartilhadas com os demais alunos da escola. (v. 3,

p. 47-49).

Desenvolvimento do senso crítico mediante um artigo de opinião, levando o educando a

argumentar e a defender seu ponto de vista sobre o que seja uma alimentação saudável,

com base em suas experiências pessoais e em textos já lidos e discutidos. (v. 4, p. 86-87).

Estímulo ao aluno fazer sua apreciação crítica acerca do filme assistido em sala de aula,

compartilhando com os colegas da turma a resenha por ele produzida. (v. 4, p. 176-179).

Oportunidade ao aluno de apresentar seu ponto de vista sobre as questões que envolvem a

preservação ambiental, produzindo um artigo de opinião e socializando para a comunidade

escolar. (v. 5, p. 237-238).

Com base nisso, as crianças têm a possibilidade de assumir uma atitude responsiva

com o objeto cognoscível e com seus interlocutores, de forma a desenvolverem uma postura

conscientemente crítica em sua produção escrita. Isso nos lembra os estudos de Freire, ao

preconizar sobre a leitura de mundo do educando.

Respeitar a “leitura de mundo” do educando [...], saber escutá-lo, não

significa [...] concordar com ela [...] ou a ela se acomodar, assumindo-a

como sua. Respeitar a leitura de mundo do educando não é também um jogo

tático com que o educador ou educadora procura tornar-se simpático ao

educando. É a maneira correta que tem o educador de, com o educando e não

sobre ele, tentar a superação de uma maneira mais ingênua por outra mais

crítica de inteligir o mundo. Respeitar a leitura de mundo do educando

significa tomá-la como ponto de partida para a compreensão [...] humana, de

modo especial, como um dos impulsores fundantes da produção do

conhecimento. [...] É preciso [...] que o educando vá assumindo sua

inteligência do mundo e não apenas o de recebedor da que lhe seja

transferida pelo professor. (FREIRE, 2011a, p. 120-121, grifo do autor).

Sob esse enfoque, a presença de atividades que favorecem a relação do horizonte

temático com as valorações construídas pelos participantes da interação, é um aspecto

positivo da coleção, uma vez que reconhece a importância do outro e dos seus valores no

processo educativo.

204

É com base nisso também que, é possível verificar a aproximação das propostas com a

teoria bakhtiniana. Recordemos que, para Bakhtin (2011), o enunciado é um elo na cadeia da

comunicação discursiva, não podendo ser separado dos enunciados precedentes. Sendo assim,

observemos o que há em algumas orientações didáticas.

Figura 29: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 4, p. 87, artigo de opinião, grifo nosso

Figura 30: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 5, p. 75, reportagem

Por isso, na prática da produção escrita, quando é solicitado que os alunos usem

trechos dos textos pesquisados, acreditamos que tal orientação pode promover a construção

do texto a partir das relações dialógicas com os enunciados precedentes.

Diante de orientações como essas, há, em contrapartida, a necessidade de ampliar os

destinatários, os suportes e os contextos de circulação das produções escritas, tendo em

vista que se limitam, quase que predominantemente, ao âmbito escolar.

No que diz respeito ao destinatário, destacam-se o professor, os colegas da classe, os

alunos de outras turmas e demais representantes da comunidade escolar. Em raríssimas

situações, há indicação dos familiares e da vizinhança.

205

Quanto ao suporte, além do caderno, da folha avulsa e do mural da sala de aula ou da

escola, podem ser encontrados também o Álbum de histórias (v. 2, p. 141, fábula), o Varal de

cantiga (v. 2, p. 188, paródia de cantiga), o Livro do Conto (v. 3, p. 109, conto), o Varal de

Poesia (v. 3, p. 193, poema), a Galeria de Personagens (v. 3, p. 216, descrição), o Livro de

histórias populares (v. 4, p. 133, narração), o Varal de histórias (v. 4, p. 155, paródia de

conto), a Revista Sem Preconceito! (v. 5, p. 76, reportagem), o Jornal mural (v. 5, p. 238,

artigo de opinião), etc. Inclusive, no próprio Manual do Professor, há uma ênfase a respeito

disso.

Todo o material produzido tem determinado suporte para ser apresentado e

socializado pela/para a classe e/ou pela comunidade escolar. Assim, poderá

ser exposto em um painel, um mural, um varal ou compor um recital, um

festival, um álbum, um livro, um caderno de receitas, uma galeria de

personagens, uma campanha de conscientização, etc. Parte do material

produzido pode passar a fazer parte do acervo da própria escola, podendo ser

apreciado por toda a comunidade escolar na biblioteca da sala de aula ou da

escola (MIRANDA; RODRIGUES, manual do professor, v. 5, p. 19).

De fato, encontramos iniciativas mais interessantes para os suportes, não se

restringindo aos tradicionais veículos da escola, porém, todas têm o contexto de circulação

escolar como destino final. Em algumas poucas situações, é possível observar a circulação dos

gêneros no contexto extraescolar, tais como: organizar uma lista de telefones úteis para

colocar à disposição da vizinhança (v. 2, p. 25) e produzir um folheto educativo a ser

distribuído aos redores da escola (v. 4, p. 200).

A seguir, vejamos alguns exemplos sobre os elementos aqui mencionados.

Figura 31: Destinatário / Alunos de outras turmas e vizinhança

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 2, p. 25, lista telefônica

206

Figura 32: Destinatário / Colegas da turma

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 2, p. 217, conto

Figura 33: Destinatário / Colegas da turma e comunidade escolar - Suporte final / Mural

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 3, p. 49, conto

Figura 34: Destinatário / Comunidade escolar - Suporte / Revista Sem Preconceito!41

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 5, p. 76, reportagem

É válido destacar que não negamos o aspecto diferencial encontrado em meio a esta

análise. Ainda que os textos produzidos circulem, majoritariamente, na esfera escolar, não são

submetidos meramente à avaliação do professor, mas sim à apreciação de outros

interlocutores, como os alunos de outras turmas e demais participantes da comunidade

escolar. Estes, no caso, com uma apreciação de leitura que, decerto, não é a visão pedagógica.

Porém, o que aqui se preconiza, é a necessidade de ampliar a dimensão dialógica da escrita,

para além do âmbito escolar.

41 No Manual do Professor, é informado que a revista Sem Preconceito! é compartilhada com a comunidade

escolar, sendo exposta em um lugar de destaque na escola e se possível, distribuída a partir da tiragem de várias

cópias.

207

No que concerne à finalidade comunicativa, ora se constata a existência de

propósitos superficiais, ora se constata a existência de propósitos mais claros.

Sobre as mais superficiais, destacam-se as encontradas nos gêneros escolares: invente

um diálogo entre duas personagens (v. 1, p. 104, diálogo); recontar essa história em

quadrinhos (v. 1, p. 147, narração); transformar essa ficha em um texto informativo (v. 2, p.

163, texto informativo); inventar uma personagem (v. 3, p. 215, descrição); reconte a história

em quadrinhos por escrito (v. 5, p. 216, narração).

Para as propostas com finalidades mais claras, destacam-se:

escrever um bilhete para alguém muito especial, dizendo como ela é importante ou

contando alguma coisa que lhe aconteceu, assim com fez o príncipe encantado da história

já lida, que enviou um bilhete para sua amada (v.1, p. 218-219);

organizar uma lista de telefones úteis para colocar à disposição de outras turmas da escola

e da vizinhança, como o número telefônico da farmácia, do posto-de-saúde (ou hospital),

de companhias responsáveis pela distribuição de água, luz e gás, etc. (v.2, p. 24-26);

criar placas de sinalização e distribuir para a comunidades escolar, a fim de que esta seja

conscientizada da importância em respeitar as placas educativas/de advertência (v. 2, p. 68-

71);

elaborar regras de convivência para serem divulgadas aos alunos da escola, para que todos

possam refletir sobre os direitos e deveres de cada um, em vista de uma melhor relação (v.

3, p. 47-49);

produzir um texto instrucional, com o intuito de ajudar na montagem do palco para a

apresentação do espetáculo organizado pelos próprios alunos (v. 3, p. 68-70);

criar um folheto educativo para ser distribuído pela escola, conscientizando sobre a

importância do consumo controlado de água (v. 4, p. 198-200);

ajudar a criar o desfecho final de uma peça teatral, a qual será dramatizada no final do ano

letivo (v. 4, p. 222-223);

escrever um texto instrucional, auxiliando na confecção de brinquedos que comporão a

Brinquedoteca de Sucata da escola (v. 5, p. 169-171);

fazer um artigo de opinião sobre a preservação ambiental, expondo seu ponto de vista aos

leitores (comunidade escolar) do Jornal Mural (v. 5, p. 237-238).

208

Mediante o exposto, verifica-se que o tratamento dado à finalidade comunicativa

assemelha-se à coleção anteriormente analisada - a presença de algumas propostas

desprovidas de objetivos concretos e outras, por sua vez, formadas por propósitos com nítidas

funções sociais, estas, majoritariamente vinculadas aos gêneros escolarizados.

No que diz respeito ao estilo do gênero, há propostas de produção escrita que retomam

alguns elementos estudados nas seções Pensando sobre o gênero e Língua: reflexão e uso,

tais como: adequação da linguagem, marcas da oralidade, tom apropriado ao texto e forma de

tratamento. Quando não citados explicitamente no corpo das orientações, é solicitado que o

aluno retome as seções anteriores, a fim de relembrar algumas das características do gênero

em questão.

Para a produção do texto biográfico (v. 4, p. 149-151), por exemplo, a criança é

orientada a utilizar uma linguagem formal e mais elaborada, em vista do gênero solicitado e

do tema abordado. Para a produção do cordel (v. 5, p. 118-119), mediante o retorno às seções

antecedentes, são enfatizadas as marcas da oralidade para esse tipo de gênero.

Quanto aos aspectos relativos à estrutura composicional, as orientações aparecem

sob duas formas: retomada à seção Pensando sobre o gênero e/ou apresentação de modelos

de referência. A menção de ambos aparece, geralmente, no chamado aquecimento, com o

intuito de relembrar as características relativamente estáveis dos gêneros.

209

Figura 35: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 4, p. 106-107, cartão-postal, grifo nosso

210

Figura 36: Exemplo de atividade

Fonte: Coleção Aprendendo Sempre, v. 5, p. 169-170, instruções de montagem, grifo nosso

211

À luz da análise delineada, verifica-se que, nas propostas de produção escrita, o

modelo de encaminhamento adotado na coleção baseia-se na perspectiva do gênero. Ou seja,

o gênero proposto, uma vez vinculado aos elementos constitutivos da situação de produção, é

tomado como objeto privilegiado na abordagem do texto escrito.

Por isso, mesmo diante das lacunas aqui mencionadas, não se pode negar que, o

enfoque dialógico é mais priorizado que os aspectos meramente formais e/ou linguísticos.

Sendo assim, parte das propostas solicitadas ganham uma função sócio-discursiva, que

transpõe as funções pedagógicas - escrever para aprender, escrever para exercitar a escrita,

assim como vista na coleção anterior.

Desse modo, além da indicação sistemática dos gêneros contemplados, elementos

como destinatário, suporte, contexto de circulação, apreciação valorativa, construção temática

e estrutura composicional, são levados em conta e devidamente elucidados. Tal consideração

não é explicitada somente pela exposição de conceitos, mas sim, por meio de observações e

de questionamentos que instigam o aluno a compreender as características relativamente

estáveis dos gêneros.

Isso, provavelmente, é resultado de orientações em que, ao longo dos volumes42

, “[...]

são trabalhados conteúdos referentes à prática de produção de textos, considerando o

interlocutor, a finalidade, as características de diferentes gêneros discursivos e os aspectos

comunicativos, notacionais e textuais.” (MIRANDA; RODRIGUES, manual do professor, v.

4, p. 5, grifo das autoras).

Somado a isso, por tomar o enfoque dialógico no ensino da produção escrita, a criança

é envolvida em uma posição enunciativa de autoria, ao ver que o seu texto, para além da sala

de aula, é apreciado e circulado no Recital de poesias, no Varal de cantiga, na Mostra de

Quadrinhos, na Galeria de Personagens, dentre outros. Sem falar na escrita que gera outros

resultados - formação da Brinquedoteca de Sucata e construção do palco para encenar a peça

teatral ao final do ano letivo.

Com as análises entretecidas, é possível validar a suposição levantada no decorrer da

subseção 5.2.2 - de que os gêneros são trabalhados como objeto a ser descrito e ensinado - o

que implica considerar a concepção dialógica da escrita.

42

Com exceção de um dos livros didáticos da coleção - volume 1 - cujas características do gênero não são

exploradas nas propostas de produção escrita. A própria seção Pensando sobre o gênero não é sugerida no

referente volume.

212

Em acordo com essa colocação, conforme as autoras da coleção, “[...] para formar um

escritor competente, é preciso apostar em uma proposta educativa com base no diálogo [...].

Escrever é interagir. Entendemos que interage aquele que tem o que dizer [...], a quem dizer

[...] e por que dizer e para que dizer [...]” (MIRANDA; RODRIGUES, manual do

professor, v. 2, p. 12-13, grifo das autoras).

Para tanto, tal entendimento remete, muitas vezes, à elaboração de atividades que

integram os elementos do contexto histórico-social, funcional e linguístico-discursivo,

enquanto parâmetros intrínsecos ao processo de produção escrita, possibilitando aos alunos

identificá-los e levá-los em conta.

Obviamente, não negamos a existência de lacunas encontradas na coleção, como as

destacadas abaixo:

predominância dos gêneros das esferas cotidiana, literária e escolar nas propostas de

produção escrita, assim como exposta na análise quantitativa;

predominância da escola, enquanto promotora das relações dialógicas, cujas produções

apresentam destinatários, suportes e contextos de circulação restringidos ao âmbito escolar.

No entanto, apesar da necessidade de ampliar os usos da escrita em outras práticas

sociais da comunicação discursiva, a avaliação do panorama encontrado na coleção

Aprendendo Sempre só pode ser positiva.

Decerto, relacionar a indicação do gênero com os elementos constitutivos da situação

de produção, a partir de um trabalho sistemático em torno da construção do texto escrito, é um

bom ponto de partida para a referente coleção. Torna-se, pois, referência para os professores

em sua difícil tarefa de ensinar a escrever textos, como também uma mediadora para que os

alunos desenvolvam as capacidades de escrita.

213

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quadro nenhum está acabado,

disse certo pintor;

se pode sem fim continuá-lo,

primeiro, ao além de outro quadro

que, feito a partir de tal forma,

tem na tela, oculta uma porta

que dá a um corredor

que leva a outra e a muitas outras.

(João Cabral de Melo Neto, A lição da pintura)

Escolher o poema A lição de pintura como epígrafe para esta dissertação funciona

como uma síntese sobre o que aqui será preconizado: que os livros didáticos, enquanto

gêneros do discurso e objetos significativos desta pesquisa, não estão jamais acabados; e se

quadro nenhum está acabado, a própria investigação pode ser constantemente reconstruída

por aqueles que dialogam com ela.

Desde o início, buscamos convergir este trabalho sob o inter-relacionamento entre o

contexto histórico, a teoria e a prática. Para isso, percebemos, inicialmente, a importância de

fazer um percurso histórico sobre o ensino de língua portuguesa, a fim de que entendêssemos

como alguns dos elementos (produção escrita, livros didáticos, gêneros como objeto de

ensino-aprendizagem, etc.) a ele relacionados foram produzidos historicamente. Em seguida,

compreender o pensamento de Bakhtin sobre a concepção de linguagem, para que

pudéssemos fundamentar o nosso enfoque teórico-metodológico acerca dos gêneros do

discurso, em decorrência das necessidades requeridas pelo objeto de estudo. Posteriormente,

iniciar a investigação sobre o tratamento dado aos gêneros e às situações de produção no

ensino do texto escrito, a partir das coleções de língua portuguesa adotadas nos anos iniciais

do EF.

Nossas questões de pesquisa - a) No ensino de produção escrita, a diversidade dos

gêneros do discurso é efetivamente trabalhada nas coleções didáticas? b) Quais são os gêneros

do discurso e as esferas sociais priorizados no ensino de produção escrita? c) Como é

abordada a situação de produção em o que o texto escrito deverá ser produzido? - permitiram-

nos analisar um dos aspectos cruciais dos livros didáticos: a produção escrita.

Para melhor compreender os elementos constitutivos da produção escrita, o

levantamento realizado sobre os gêneros contemplados em oito coleções correspondentes a

214

cada volume do 1º ao 5º ano, visou apresentar uma cartografia específica do ensino da escrita.

Consideramos, então, que o levantamento feito é um dos raros trabalhos dessa natureza

existente na literatura da área. Sua organização, por si, embora não responda sozinha pela

compreensão acerca de como a produção textual é orientada nos livros didáticos, constitui-se

num material importante para analisarmos os gêneros prestigiados e omitidos no ensino de

língua portuguesa fomentado oficialmente. Além disso, a divulgação desta pesquisa poderá

ajudar na melhoria dos elementos indutores da produção dos livros didáticos, presentes nos

editais de seleção e mesmo nos critérios de avaliação desses materiais.

Nesse sentido, observamos que a diversidade de gêneros presentes na Amostra Global

parece estar fundamentada, meramente, na existência numérica de gêneros contemplados nas

propostas de produção. Retratando tal resultado, as coleções A Aventura da Linguagem e

Aprendendo Sempre, vieram a corroborar com essa premissa.

Sob esse enfoque, a diversidade figurada pela avaliação do PNLD e pelos autores das

coleções reproduz a dissonância e a distribuição não equilibrada entre os gêneros

contemplados e a quantidade de vezes em que se repetem.

Assim como visto por Pedrosa (2006), em seus estudos, também verificamos que a

diversidade é simbolizada, na verdade, pela presença de alguns gêneros em detrimento de

tantos outros sugeridos. Ou seja, a nítida repetição exaustiva de alguns e a pouquíssima

retomada de outros, geralmente, com uma só recorrência.

Frente ao exposto, pudemos verificar que, no panorama da Amostra Global, os

gêneros mais priorizados representam, por sua vez, as esferas mais priorizadas. A narração e a

descrição, da esfera escolar; o conto e o poema, da literária; e a lista, da cotidiana. No caso,

mesmo com as mudanças ocorridas no processo de ensino-aprendizagem, evidenciou-se que

alguns desses gêneros, herdeiros da Retórica e da Poética, ainda estão entre os mais

explorados.

Um aspecto que merece atenção é a nítida predominância por um trabalho pautado na

narração, representativo de uma prática de escrita que remonta a tradição escolar. Só ela,

responde a 63 propostas, e as demais, a metade ou menos da metade de sua recorrência. Nessa

perspectiva, mesmo com a inserção dos gêneros escolarizados nas propostas de produção, um

dos tipos textuais canônicos e hegemônicos ainda é adotado como modelo de referência para a

escrita dos alunos.

215

Por outro lado, não se pode negar a tentativa, por parte de alguns autores das coleções,

de propor produções mais comprometidas com as mudanças geradas nas práticas de interação

da contemporaneidade. Dessa maneira, foi possível identificar a presença de gêneros

(entrevista, artigo de opinião, anúncio, parlenda, ficha técnica, dentre outros), cujas esferas de

origem vão além da escolar.

Por esse viés, gêneros das esferas jornalística, publicitária, da tradição oral e científica,

por exemplo, fazem-se presentes no panorama global da Amostra. Sem dúvida, com um

índice de participação bastante inferior, se comparado às esferas mais priorizadas - cotidiana,

escolar e literária, respectivamente.

Certamente, a entrada dos gêneros de algumas esferas extraescolares é uma resposta às

exigências requeridas pelo PNLD e PCN, ao proporem o acesso à diversidade de textos e de

gêneros como fonte para reflexão da linguagem e produção de novos usos da escrita. No

entanto, apesar dos esforços empreendidos em dar visibilidade aos gêneros das esferas

extraescolares, ainda há, no conjunto das coleções analisadas, uma grande demanda de

produções que desconsideram a complexidade social da linguagem escrita.

Em decorrência disso, com a priorização de gêneros como narração, conto, poema,

descrição e lista, bem como da predominância exaustiva das esferas cotidiana, escolar e

literária, foi possível verificar que a diversidade de gêneros aqui mencionada baseia-se na

didática da visitação. Em outros termos, a diversidade que compõe as propostas de produção

escrita constitui-se pelos gêneros e esferas da visitação, tendo em vista que não há uma prática

que aprofunde o conhecimento sistemático e progressivo dos mesmos.

No âmbito dessas observações, foi possível identificar que a chamada didática da

visitação resultou na escassa diversificação dos gêneros, gerando, consequentemente: a nítida

valorização dos gêneros da tradição escolar como um dos objetos privilegiados de estudo; a

centralização na norma padrão culta da língua e a minimização de propostas que

considerassem os gêneros representativos da diversidade cultural; a ausência de produções

que remontam a linguagem escrita das diferentes tecnologias de comunicação e informação; a

pouca exploração com os gêneros da instância pública da linguagem; e a limitação entre a

relação interlocutiva do educando com os textos produzidos na e pela sociedade.

Compreendemos, pois, que a diversidade não deve contemplar apenas a seleção

quantitativa de gêneros, deve contemplar, também, a variabilidade que os acompanha ao

serem submetidos nas práticas sociais de escrita. Portanto, é necessário que o trabalho com a

216

diversidade possibilite destacar a dinâmica e complexa natureza da linguagem, já que as

especificidades dos gêneros das várias esferas sociais precisam fazer parte do universo de

escrita dos alunos.

Como delineado pelos PCN (BRASIL, 1997, p. 39), “Atualmente exigem-se níveis de

leitura e de escrita diferentes e muito superiores aos que satisfizeram as demandas sociais até

bem pouco tempo atrás - e tudo indica que essa exigência tende a ser crescente.”.

Considerando a vida social contemporânea do século XXI, é preciso que as coleções

estejam comprometidas com as novas demandas requeridas, o que inclui, por exemplo, o

trabalho com os gêneros da esfera digital, cuja participação na Amostra Global ocorreu

inexpressivamente. Faz-se necessário, pois, que os alunos tenham a oportunidade de transitar

pelas práticas sociais de forma crítica e consciente.

Falemos agora da terceira questão de pesquisa, consonante a situação de produção. Tal

análise restringiu-se à duas coleções didáticas - A Aventura da Linguagem e Aprendendo

Sempre - com os volumes respectivos do 1º ao 5º ano, totalizando dez livros didáticos.

Na AADL, os elementos constitutivos da situação de produção são tratados

casualmente e, quando citados, abordados de maneira lacunar, com propostas centradas no

aspecto ortográfico e, sobretudo, no aspecto conteudístico. Por essa razão, mesmo quando os

gêneros são indicados, certos traços do seu funcionamento não são levados em conta e,

quando são, restringem-se ao âmbito escolar.

Assim, quanto ao contexto linguístico-discursivo, a estrutura composicional e a

estilística do gênero não são praticamente indicadas e, no caso do conteúdo temático, há, na

verdade, uma nítida ênfase sobre o assunto em si e o que dizer, porém, sem levar o aluno a

compreender que o assunto de um gênero recebe um tratamento temático relativamente

previsível.

Sobre o contexto funcional, elementos como destinatário, finalidade comunicativa e

posição enunciativa também ganham espaço pouco significativo. O destinatário, quando

indicado, limita-se ao professor e aos alunos da turma, com o intuito de que estes avaliem a

produção do colega; a finalidade comunicativa, em sua maioria, esboçada mediante

orientações desprovidas de objetivos concretos, as quais não encorajam os educandos a

compreender as funções sociais recorrentemente associadas a determinados gêneros; e a

posição enunciativa, nem sequer explorada.

217

O aspecto histórico-social, por sua vez, se citado, reflete uma situação imediata em

que os textos são produzidos, predominantemente, a partir de um suporte e de um contexto de

circulação restritos à natureza escolar.

Logo, a situação de produção na coleção em questão é abordada sob a perspectiva da

imersão e da transmissão. Pela imersão, os seus elementos constituintes são explorados sem

uma ação de ensino; pela transmissão, alguns saberes necessários para o uso dos gêneros são

desenvolvidos, porém, de forma esporádica e lacunar.

Tendo em vista que concebemos tais elementos como regularidades genéricas

indissociáveis das especificidades sociais de cada gênero, entendemos, então, que os gêneros

do discurso não são tomados como objetos de ensino-aprendizagem nas propostas de

produção da coleção AADL.

Em face disso, os gêneros e as situações de produção a eles correspondentes, enquanto

elementos intrínsecos ao ensino do texto escrito, necessitam ser abordados de forma mais

sistematizada, a fim de proverem uma situação de comunicação mimeticamente autêntica.

Isso é importante, uma vez que não há como pensar no gênero sem levar em conta sua

mobilidade e, ao mesmo tempo, certos traços relativamente estáveis do seu funcionamento

social e verbal.

No que tange à coleção AS, em função de uma abordagem baseada na perspectiva do

gênero como objeto de reflexão, constatou-se uma orientação didática diferenciada para com a

situação de produção. Por esse direcionamento, parte das propostas solicitadas fundamenta-se

no enfoque dialógico da linguagem, cujos elementos da situação de produção não são apenas

indicados, como também devidamente encaminhados.

Quanto ao contexto linguístico-discursivo, em diferentes momentos, o aluno é

conduzido a se apropriar do conteúdo temático, da estrutura composicional e do estilo da

linguagem, a partir de duas orientações. Estas apoiadas na retomada de seções que elucidam

as características relativamente estáveis dos gêneros e/ou nos modelos de referência, os quais

instigam o educando a compreender tais elementos, mediante observações e questionamentos.

Sobre o contexto funcional, apesar dos destinatários se restringirem,

preponderantemente, ao professor, colegas de classe, alunos de outras turmas e demais

participantes da comunidade escolar, evidenciou-se uma relação de interlocução entre a

criança, em sua posição de autoria, e os seus leitores/ouvintes. Tal aspecto é beneficiado pelos

218

próprios objetivos da produção escrita, que, quando baseados nos gêneros escolarizados,

melhor favorecem aos propósitos mais recorrentes dos gêneros.

Como os destinatários se baseiam em interlocutores do próprio âmbito escolar, o

suporte e a esfera de circulação do texto escrito, os quais compõem o contexto histórico-

social, acabam refletindo também a natureza escolar. Porém, as produções compartilhadas não

são apreciadas meramente por uma visão pedagógica, mas, certamente, por uma apreciação

que transcenderá as correções.

Para tanto, tais apontamentos remetem, muitas vezes, à elaboração de atividades que

integram os elementos do contexto histórico-social, funcional e linguístico-discursivo,

enquanto parâmetros intrínsecos ao processo de produção escrita com base em um gênero,

possibilitando aos alunos identificá-los e levá-los em conta.

A análise aqui feita, portanto, demonstra que a coleção que trata os gêneros como

objeto de ensino pôde melhor qualificar as propostas de produção escrita ao lidar com os

elementos recorrentes e constituintes das necessidades comunicativas. Convém acrescentar,

também, a nossa percepção de que tal abordagem concedeu mais credibilidade ao aluno para

assumir a palavra e dizer o que diz, oportunizando-o enunciar-se com posições discursivas já

ditas em outras situações de interação.

Entretecer essas reflexões faz-nos remeter novamente ao critério de diversificação dos

gêneros.

Se, de um lado, a coleção AS apresentou lacunas na distribuição de recorrências das

esferas de origem dos gêneros contemplados, por outro lado, demonstrou a importância da

relação entre o gênero e a situação de produção para com o texto a ser construído. Porém,

nessa relação, priorizou-se um conjunto de elementos que emanam da natureza escolar.

Por isso, deixamos claro que não defendemos que os autores diversifiquem

excessivamente os gêneros nas coleções didáticas, até porque isso poderia levar ao risco de

um tratamento superficial. Mas que tal diversificação reflita a própria diversidade para com os

modos de abordar o texto com base em um gênero - alterações no enfoque dos propósitos

comunicativos, dos destinatários, dos contextos de circulação, etc.

Portanto, as lacunas evidenciadas denunciam duas urgências a serem (re)pensadas: o

critério avaliativo do PNLD, no que diz respeito ao que seja “diversidade de gêneros”, uma

vez que tal critério se mostra inconsistente; e a publicação de estudos que implementem

219

orientações didáticas sobre tal diversidade, em vista de uma prática mais equilibrada para com

as situações comunicativas existentes.

Somado a isso, emana-se também a importância da atuação do professor, não como

um consumidor e tradutor passivo do que é legitimado nas coleções, mas como um

interlocutor de uma discussão ativa que refuta, confirma, procura apoio, antecipa respostas e

objeções. (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012).

Obviamente, não podemos negar a importante influência das políticas públicas

federais na elaboração dos livros didáticos, que repercute na tentativa dos autores em

acompanhar a renovação das práticas de ensino, atendendo aos diferentes interesses de ordem

histórica, social, educacional, científica, etc.

Em contrapartida, não podemos supor que uma coleção bem avaliada mudará, sozinha,

os novos saberes a serem tratados em sala de aula. Se o professor não souber lidar com esses

objetos de ensino, uma obra de excelência, provavelmente, não conseguirá ecoar os

conhecimentos legitimados e prescritos em documentos oficiais, em pesquisas acadêmicas,

dentre outros. Tal acepção pôde ser constatada a partir de nossa participação no 7º Seminário

Educação e Leitura, realizado em Natal/RN, entre os dias 11 a 14 de novembro de 2013, que

contou com a presença de vários professores da rede pública de ensino.

Por meio da comunicação oral, divulgamos alguns dados parciais obtidos por esta

pesquisa, fazendo as devidas reflexões. Na abertura ao debate, chamaram-nos a atenção as

falas43

de algumas educadoras, como as que seguem abaixo.

Trabalho com os gêneros. Ensino pros meus alunos do 4º ano. Mas não

tenho conhecimento, conhecimento... Nem sabia dessa história de esfera,

posição enunciativa. E isso da diversidade? Gente é muita coisa! Por que

vocês não dão um curso? (Professora da rede pública municipal de Natal, 4º

ano do EF).

Concordo com minha colega. Vocês precisam dar um curso pra gente. Como

posso preencher as lacunas do livro, se nem sei ver o que são? Vocês sabem

porque vocês estudam... (Professora da rede pública municipal de Natal, 2º

ano do EF).

43

Falas transcritas a partir da gravação de áudio. A utilização do gravador havia sido feita, inicialmente, em

nossa apresentação. Com o interesse demonstrado pelos participantes ouvintes durante o debate, percebemos que

tais falas poderiam enriquecer a nossa pesquisa e, sobretudo, a nossa reflexão. Assim, pedimos autorização dos

participantes para que tal debate pudesse ser gravado, a fim de melhor contribuir para a dissertação de Mestrado.

220

E esse Grupo CONTAR só trabalha com professores do município? Mas eu

também tô interessada. Se vocês derem o curso, será aberto pro estado?

Oh... Quem é do estado aqui levante a mão! Tá vendo, quem é do estado vai

querer também! (Coordenadora de uma escola da rede pública estadual do

RN/Natal, anos iniciais).

Cada uma dessas falas aponta para dois importantes aspectos. Primeiramente, o desejo

deliberado pelas educadoras por uma formação, como forma de apoio ao processo de ensino e

de aprendizado subjacente ao elo dos livros didáticos, gêneros e situações de produção.

Posteriormente, essas falas, mais enraizadas no questionamento “Como posso preencher as

lacunas do livro, se nem sei ver o que são?, revelam o que já havíamos aqui mencionado -

não adianta um material de qualidade, se o professor se posicionar meramente como tradutor

dos conhecimentos.

Então, apesar de este trabalho não ter focado a temática da formação inicial e

continuada do professor, defendeu-se, aqui, um educador criador, instigador, inquieto,

rigorosamente curioso, humilde e persistente (FREIRE, 2011a). E essas três educadoras,

inquietas, instigadoras e curiosas, mostraram a vontade de construir o conhecimento, no

sentido de emitir um movimento dialógico entre teoria e prática.

Pelos diálogos entretecidos no Seminário e pelas contribuições notáveis do PNLD na

elaboração dos livros, acreditamos nos caminhos de mudança. Por isso, pesquisas como esta

que, ao evidenciar, sinalizar e questionar a existência de lacunas, instiga pela busca de

sucessivas ações, de continuadas mudanças, em prol do aprimoramento da prática pedagógica.

E, se consideramos os livros didáticos como gêneros do discurso, acreditamos em sua

capacidade de renovar-se continuamente, atendendo as necessidades que acompanham a

variabilidade de cada porvir.

Nesse sentido, os apontamentos aqui realizados sinalizam que esta pesquisa descortina

um campo de investigação, de qualificação profissional e de possibilidades de melhoria das

políticas públicas para o ensino de língua portuguesa na educação básica. Especialmente, no

que concerne ao aprofundamento dos estudos sobre a diversidade de gêneros, a fim de:

elaborar orientações quanto aos possíveis critérios avaliativos de diversidade; propor

sequências didáticas revestidas por essa diversidade; e iniciar uma discussão sobre os gêneros

do discurso em outras áreas de conhecimento, sobretudo, no que condiz aos livros didáticos.

Certamente, esses são alguns aspectos temáticos relevantes apontados por esta

dissertação e que podem ser aprofundados em outras pesquisas. Consideramos que essas

221

temáticas, passíveis de maiores investigações, são uma importante contribuição dada por nós

através desta pesquisa.

222

REFERÊNCIAS

ADAM, J.M. A linguística textual: introdução à análise textual dos discursos. São Paulo:

Cortez, 2008.

ALVES, Maria da Penha Casado. O cronotopo da sala de aula e os gêneros discursivos. In:

Revista Signótica. Goiânia, v. 24, n. 2, p. 305-322, jul./dez. 2012. Disponível em

<http//www.revistas.ufg.br> Acesso em: 03 abr. 2013.

ALVES FILHO, Francisco. Gêneros jornalísticos: notícias e cartas de leitor no ensino

fundamental. São Paulo: Cortez, 2011.

ARAÚJO, M.M. Educação clássica da elite no século XIX. O ilustrado Seminário-Colégio de

Olinda e a Escola de Gramática Latina de Caicó. In: ARAÚJO, M.M. (Org.). História(s)

Comparada(s) da Educação. 1. ed. Brasília: Liber Livro, 2009, p. 345-386.

BAKHTIN, Mikhail. (VOLOCHÍNOV, V. N.). Marxismo e filosofia da linguagem.

Tradução Michel Lahud e Yara Frateschi. 13. ed. São Paulo: Hucitec, 2012.

______. Estética da criação verbal. Tradução Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: WMF

Martins Fontes, 2011.

______. Problemas da poética de Dostoievski. Tradução Paulo Bezerra. 4. ed. Rio de

Janeiro: Forense Universitária, 2008.

______. Questões de literatura e de estética: a teoria do romance. Tradução Aurora F.

Bernadini. 5. ed. São Paulo: UNESP/Hucitec, 2002.

BARBOSA, Jacqueline Peixoto. Do professor suposto pelos PCNs ao professor real de língua

portuguesa: são os PCNs praticáveis?. In: ROJO, Roxane (Org.). A prática de linguagem em

sala de aula: praticando os PCNs. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2008. p. 149-181.

______. Trabalhando com os gêneros do discurso: Uma perspectiva enunciativa para o

ensino de Língua Portuguesa. São Paulo: Puc/LAEL, 2001. Tese (Doutorado). Disponível em

< http//www.biblioteca.universis.net> Acesso em: 24 nov. 2009.

BARBOSA, T. M. N. Travessias. In: BARBOSA, T. M. N; PASSEGGI, M. C. (Orgs.).

Memorial Acadêmico: Gênero, injunção institucional, sedução autobiográfica. 1. ed. Natal:

EDUFRN, 2011.

BARBOSA, T. M. N.; NORONHA, Claudianny Amorim. Leitura e escrita: recortes inter e

multidisciplinares no ensino de matemática e português. Projeto de pesquisa. Natal, RN,

2010: UFRN/CAPES/INEP/OBEDUC. (mimeo).

BARROS-MENDES, A.N.N. A Linguagem Oral nos Livros Didáticos de Língua

Portuguesa do Ensino Fundamental - 3º e 4º ciclos: Algumas reflexões. Pontifícia

223

Universidade Católica de São Paulo, 2005. Tese (Doutorado). Disponível em

<http://www.sapientia.pucsp.br> Acesso em: 21 ago. 2013.

BATISTA, Antônio Augusto Gomes. A avaliação dos livros didáticos: para entender o

Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). In: ROJO, Roxane; BATISTA, Antônio

Augusto Gomes (Orgs.). Livro didático de língua portuguesa, letramento e cultura da

escrita. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2008, p. 25-67.

BATISTA, Luiz Eduardo Mendes. Os gêneros escritos do argumentar no espaço didático.

Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2008. Dissertação (Mestrado em

Linguística). Disponível em < http://repositorio.ufu.br> Acesso em: 03 abr. 2013.

BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. 22. ed. São Paulo: Paz e Terra,

2008.

BITTENCOURT, C. M. F. Autores e editores de compêndios e livros de leitura (1810-1910).

In: Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 30, n. 3, p. 475-491, set./dez. 2004.

Disponível em < http://www.scielo.br> Acesso em 08 maio 2013.

BONINI, Adair. Os gêneros do jornal: questões de pesquisa e ensino. In: KARWOSKI, Acir

Mário; GAYDECZKA, Beatriz; BRITO, Karim Siebeneicher (Orgs.). Gêneros textuais:

reflexões e ensino. 4. ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2011. p. 53-68.

BRAIT, Beth (Org.). Bakhtin: conceitos-chave. 5. ed. São Paulo: Contexto, 2012.

______. Bakhtin, dialogismo e construção do sentido. 2. ed. Campinas, SP: Editora da

Unicamp, 2011.

______. Bakhtin: outros conceitos-chave. 1. ed. São Paulo: Contexto, 2010.

______. PCNs, gêneros e ensino de língua: faces discursivas da textualidade. In: ROJO,

Roxane (Org.). A prática de linguagem em sala de aula: praticando os PCNs. Campinas,

SP: Mercado de Letras, 2008. p. 15-25.

BRANDÃO, Helena Nagamine. Texto, gêneros do discurso e ensino. In: BRANDÃO, Helena

Nagamine. Gêneros do discurso na escola: mito, conto, cordel, discurso político, divulgação

científica. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Guia do livro didático 2010: Língua Portuguesa:

séries/anos iniciais do ensino fundamental / Secretaria de Educação Básica - Brasília:

Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros

Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa. Brasília: A Secretaria, 1997.

______. Decreto nº 91.542, de 19 de agosto de 1985. Institui o Programa Nacional do Livro

Didático, dispõe sobre sua execução e dá outras providências. Disponível em

<http://www2.camara.leg.br> Acesso em 08 maio 2013.

224

______. Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º

graus, e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br> Acesso em 08

maio 2013.

______. Decreto nº 8.529, de 02 de janeiro de 1946. Lei Orgânica do Ensino Primário.

Disponível em <http://www2.camara.leg.br> Acesso em 08 maio 2013.

______. Lei de 15 de outubro de 1827. Manda criar escolas de primeiras letras em todas as

cidades, vilas e lugares mais populosos do império. Revista Educação em Questão, Natal, v.

36, n. 22, p. 240-242, set./dez. 2009.

BUNZEN, C.S. A fabricação da disciplina escolar Português. In: Revista Diálogo

Educacional, Curitiba, v. 11, n. 34, p. 885-911, set./dez. 2011. Disponível em <

http://www2.pucpr.br> Acesso em: 08 maio 2013.

______. Dinâmicas discursivas na aula de Português: os usos do livro didático e projetos

didáticos autorais. Campinas, SP, 2009: Unicamp/IEL. Tese (Doutorado). Disponível em

<http://www.letramento.iel.unicamp.br> Acesso em 08 maio 2013.

______. Um olhar sobre os gêneros interpessoais nos manuais escolares de Ensino Médio.

Letras & Letras, Uberlândia, v. 23, 2007, p. 7-25. Disponível em <

www.letraseletras.ileel.ufu.br> Acesso em: 21 ago. 2013.

______. Livro didático de Língua Portuguesa: um gênero do discurso. Campinas, SP, 2005:

Unicamp/IEL. Dissertação (Mestrado). Disponível em <http:www.bibliotecadigital.

unicamp.br> Acesso em 08 maio 2013.

BUNZEN, C.S; ROJO, Roxane. Livro didático de língua portuguesa como gênero do

discurso: autoria e estilo. In: COSTA VAL, M. Graça; MARCUSCHI, Beth. (Orgs.). Livros

didáticos de língua portuguesa: letramento e cidadania. 1. ed. Belo Horizonte: Ceale,

Autêntica, 2008. p. 73-117.

CAFIERO, Delaine; CORRÊA, Hércules Tolêdo. A abordagem de textos literários em livros

didáticos de língua portuguesa de 5ª a 8ª séries. In. COSTA VAL, M. Graça (Org.).

Alfabetização e língua portuguesa: livros didáticos e práticas pedagógicas. Belo Horizonte:

Autêntica Editora, Ceale/FaE/UFMG, 2009. p. 151-170.

CEREJA, William. Significação e tema. In: BRAIT, Beth (Org.). Bakhtin: conceitos-chave.

5. ed. São Paulo: Contexto, 2012. p. 201-220.

CHIZZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 11. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

CLARE, N. A. V. 50 anos de ensino de língua portuguesa. (1950-2000). In: Anais do VI

Congresso Nacional de Linguística e Filologia, Cadernos do CNLF, Série VI: Leitura e

Ensino de Línguas, s.p. Disponível em < www.filologia.org.br> Acesso em: 08 maio 2013.

COSCARELLI, Carla Viana; SANTOS, E.M. O livro didático como agente de letramento

digital. In. COSTA VAL, M. Graça (Org.). Alfabetização e língua portuguesa: livros

225

didáticos e práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica Editora, Ceale/FaE/UFMG, 2009.

p. 171-188.

COSTA VAL, M. Graça. Atividades de produção de textos escritos em livros didáticos de 5ª a

8ª séries do ensino fundamental. In: ROJO, Roxane; BATISTA, Antônio Augusto Gomes

(Orgs.). Livro didático de língua portuguesa, letramento e cultura da escrita. Campinas,

SP: Mercado de Letras, 2008.

DA COSTA, S. A presença de gêneros da esfera da propaganda no livro didático de

língua portuguesa. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2008. Tese (Doutorado).

Disponível em <http://www.dominiopublico.gov.br> Acesso em: 21 ago. 2013.

DOMINGUES, C.L.K. A magia da poesia: aprendizado da leitura e da escrita. Pontifícia

Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2008. Dissertação (Mestrado). Disponível em

<http://repositorio.pucrs.br> Acesso em: 21 ago. 2013.

DUARTE, L.C. A literatura infantil no Brasil: origem, tendências e ensino. 2004.

Disponível em <http://www.litteratu.com.br> Acesso em: 21 ago. 2013.

FARACO, Carlos Alberto. Linguagem e diálogo: as ideias linguísticas do círculo de Bakhtin.

São Paulo: Parábola Editorial, 2009.

FARACO, Carlos Alberto; TEZZA, Cristovão; CASTRO, Gilberto (Orgs.). Diálogos com

Bakhtin. 4. ed. Curitiba: Editora UFPR, 2007.

FARACO, Carlos Alberto; CASTRO, Gilberto. Por uma teoria lingüística que fundamente o

ensino de língua materna. Educar em Revista, Curitiba, v. 15, p. 179-194, 2000. Disponível

em <http://www.educaremrevista.ufpr.br> Acesso em 08 jan. 2013.

FARIA FILHO, L.M. Escolarização, cultura e práticas escolares no Brasil: elementos teórico-

metodológicos de um programa de pesquisa. In: LOPES, Alice Casimiro; MACEDO,

Elizabeth (Orgs.). Disciplina e integração curricular: história e políticas. Rio de Janeiro:

DP&A, 2002, p. 13-35.

FIORI, Ernani Maria. Prefácio: aprender a dizer a sua palavra. In: FREIRE, Paulo. Pedagogia

do oprimido. 50. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.

FREIRE, Paulo. Professora, sim; tia, não: cartas a quem ousa ensinar. 23. ed. Rio de Janeiro:

Civilização Brasileira, 2012.

______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à pratica educativa. São Paulo: Paz e

Terra, 2011a.

______. Pedagogia do oprimido. 50. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011b.

______. Pedagogia da esperança: um encontro com a pedagogia do oprimido. 15. ed. Rio de

Janeiro: Paz e Terra, 2008.

226

______. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 47. ed. São Paulo:

Cortez, 2006.

FREITAS, Maria Teresa de Assunção. Bakhtin e psicologia. In: FARACO, Carlos Alberto.

TEZZA, Cristovão. CASTRO, Gilberto (Orgs.). Diálogos com Bakhtin. 4. ed. Curitiba:

Editora UFPR, 2007. p. 141-159.

GARCIA, Diogo Basei. Por uma pedagogia da autonomia: Bakhtin, Paulo Freire e a

formação de leitores autorais. São Paulo: Faculdade de Educação da Universidade de São

Paulo, 2012. Dissertação (Mestrado em Educação). Disponível em <http://www.teses.usp.br>

Acesso em: 18 nov. 2012.

GERALDI, João Wanderley. O texto na sala de aula. 4. ed. São Paulo: Ática, 2008.

______. A linguagem em Paulo Freire. In: Educação, Sociedade & Culturas, n. 23, 2005, p.

7-20. Disponível em <http://www.fpce.up.pt> Acesso em: 09 out. 2012.

______. Da redação à produção de textos. In: CHIAPPINI, Ligia (Coord. Geral). Aprender e

ensinar com textos. 6 . ed. São Paulo: Cortez, 2004.

______. Paulo Freire e Bakhtin: o encontro que não houve. In: Diálogos através de Paulo

Freire. Instituto Paulo Freire de Portugal; Centro de Recursos Paulo Freire da FPCE: 2004, p.

37-52. (Coleção Querer Saber). Disponível em <http://www.ipfp.pt/publicacoes> Acesso em:

09 out. 2012.

______. Portos de passagem. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.

Disponível em <http://pt.scribd.com> Acesso em: 12 jul. 2013.

HELD, Jacqueline. Imaginário no poder: as crianças e a literatura fantástica. Tradução

Carlos Rizzi. 3 ed. São Paulo: Summus, 1985.

HISSA, Cássio Eduardo Vianna. Entrenotas: compreensões de pesquisa. Belo Horizonte:

Editora UFMG, 2013.

INÁCIO, M. S. O processo de escolarização e o ensino de primeiras letras em Minas

Gerais (1825-1852). Belo Horizonte, MG, 2003: UFMG. Dissertação (Mestrado). Disponível

em <http://www.bibliotecadigital.ufmg.br> Acesso em 08 maio 2013.

JOBIM & SOUZA, Solange. Infância e linguagem: Bakhtin, Vygotsky e Benjamin. 11. ed.

Campinas, SP: Papirus, 2008.

KLAUCK, A.P. A poesia fala com a criança: uma reflexão sobre as características da poesia

infantil e sua relação com o leitor. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul,

2009. Dissertação (Mestrado). Disponível em <http://repositorio.pucrs.br> Acesso em: 21

ago. 2013.

227

KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça; FÁVERO, Leonor Lopes. Contribuição a uma tipologia

textual. Letras & Letras, Uberlândia, MG: EDUFU, v. 3, n.1, p. 3-10, 1987.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos da metodologia

científica. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

MARCUSCHI, L.A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. 2. ed. São

Paulo: Parábola Editorial, 2008.

______. A questão do suporte dos gêneros textuais. Departamento de Letras do Centro de

Comunicação e Artes da UFPE, 2003. Disponível em <http://www.sme.pmmc.com.br>

Acesso em: 24 nov. 2009.

MARCUSCHI, Beth; LEAL, T.F. Produção de textos escritos: o que nos ensinam os livros

didáticos do PNLD 2007. COSTA VAL, M. Graça (Org.). Alfabetização e língua

portuguesa: livros didáticos e práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica Editora,

Ceale/FaE/UFMG, 2009. p. 127-150.

MELLO, João de. Carta. In: NAVARRO, Azpilcueta. Outros. Cartas avulsas: 1550-1585.

Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1988. (Cartas Jesuíticas, v. 2).

MICHELETTI, Guaraciaba (Org.). Enunciação e Gêneros Discursivos. São Paulo: Cortez,

2008.

MOITA LOPES, Luiz Paulo da. O novo ethos dos letramentos digitais. Modos de construir

sentido, revolução das relações e performances identitárias fluidas. In: SIGNORINI, Inês;

FIAD, R.S. (Orgs.) Ensino de língua: das reformas, das inquietações e dos desafios. Belo

Horizonte: Editora UFMG, 2012, p. 204-229.

MOURA, Edite Marques de. Leitura em Bakhtin e Paulo Freire: palavras e mundos. São

Carlos: Pedro & João Editores, 2012.

OLIVEIRA, Livio Lima de. Breve histórico das práticas de aquisição de livros no Brasil.

In: XXXI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2008, Natal/RN. Anais do

XXXI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2008, Natal/RN. Disponível em

<http://www.intercom.org.br> Acesso em 08 maio 2013.

OLIVEIRA, Luciano Amaral. Coisas que todo professor de português precisa saber: a

teoria na prática. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.

PADILHA, S.J. Agrupamento de gêneros poéticos: novas possibilidades de agrupamento com

base nas contribuições de M. Bakhtin. In: Anais do VI Simpósio Internacional de Estudos

de Gêneros Textuais - VI SIGET, Natal/RN, 2011. Disponível em <

http://www.cchla.ufrn.br> Acesso em: 03 abr. 2013.

______. Os gêneros poéticos em livros didáticos de língua portuguesa do ensino

fundamental: uma abordagem enunciativo-discursiva. Pontifícia Universidade Católica de

228

São Paulo, 2005. Tese (Doutorado). Disponível em <http://www.sapientia.pucsp.br> Acesso

em: 12 jul. 2013.

PADILHA, S.J.; BARROS-MENDES, A.N.N. Metodologia de análise de livros didáticos de

língua portuguesa: desafios e possibilidades. In: MARCUSCHI, Beth; COSTA VAL, M.

Graça (Orgs.). Livros didáticos de língua portuguesa: letramento, inclusão e cidadania.

Belo Horizonte: Ceale, Autêntica, 2008. p. 119-145.

PASSARELLI, Lílian Ghiuro. Ensino e correção na produção de textos escolares. São

Paulo: Cortez, 2012.

PEDROSA, M.C.N.S. As atividades de produção textual escrita em livros didáticos de

Português: caminhos e descaminhos na formação de produtores de textos. Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, 2006. Dissertação (Mestrado). Disponível em

<http://www.sapientia.pucsp.br> Acesso em: 21 ago. 2013.

PEREIRA, Rodrigo Acosta. O gênero jornalístico notícia: dialogismo e valoração.

Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2008. Dissertação (Mestrado).

Disponível em <http://www.ufsc.br> Acesso em: 07 jan. 2013.

RODRIGUES, Rosângela Hammes. O artigo jornalístico e o ensino da produção escrita. In:

ROJO, Roxane (Org.). A prática de linguagem em sala de aula: praticando os PCNs.

Campinas, SP: Mercado de Letras, 2008. p. 207-220.

______. Os gêneros do discurso na perspectiva dialógica da linguagem: a abordagem de

Bakhtin. In: MEURER, J.L.; BONINI, Adair; MOTTA-ROTH, Désirée (Orgs.). Gêneros:

teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.

______. A constituição e o funcionamento do gênero jornalístico artigo: cronotopo e dialogismo. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2001. Tese

(Doutorado). Disponível em <http://www.uff.br> Acesso em: 07 jan. 2013.

______. As diferentes esferas sócio-discursivas como critérios para a elaboração de

currículos. In: Intercâmbio (PUCSP). São Paulo: LAEL/PUC-SP, v. VIII, p. 93-100, 1999.

Disponível em < http://revistas.pucsp.br> Acesso em: 03 abr. 2013.

ROJO, Roxane. Gêneros de discurso/texto como objeto de ensino de línguas: um retorno ao

trivium?. In: SIGNORINI, Inês (Org.). [Re] discutir texto, gênero e discurso. São Paulo:

Parábola Editorial, 2010, p. 73-108.

______. (Org.). A prática de linguagem em sala de aula: praticando os PCNs. Campinas,

SP: Mercado de Letras, 2008.

______. Modos de transposição dos PCNs às práticas de sala de aula: progressão curricular e

projetos. In: ROJO, Roxane (Org.). A prática de linguagem em sala de aula: praticando os

PCNs. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2008. p. 27-38.

229

______. Letramento e diversidade textual. In: CARVALHO, Maria Angélica Freire de;

MENDONÇA, Rosa Helena. Práticas de leitura e escrita. Brasília: Ministério da Educação,

2006. p. 24-29.

______. O texto como unidade e o gênero como objeto de ensino de Língua Portuguesa. In:

TRAVAGLIA, Luiz Carlos (Org.). Encontro na linguagem: estudos lingüísticos e literários.

Uberlândia: EDUFU, 2006, p. 51-80.

______. Interação em sala de aula e gêneros escolares do discurso: um enfoque enunciativo.

In: Anais do II Congresso Nacional da Abralin. Florianópolis, SC: UFSC/ABRALIN,

2000. Disponível em <http://www.leffa.pro.br> Acesso em: 03 abr. 2013.

______. Elaborando uma progressão didática de gêneros - aspectos lingüístico-enunciativos

envolvidos no agrupamento de gêneros “relatar”. In: Intercâmbio (PUCSP). São Paulo:

LAEL/PUC-SP, v. VIII, p. 101-118, 1999. Disponível em < http://revistas.pucsp.br> Acesso

em: 03 abr. 2013.

ROJO, Roxane; BATISTA, Antônio Augusto Gomes (Orgs.). Livro didático de língua

portuguesa, letramento e cultura da escrita. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2008.

SÁNCHEZ GAMBOA, S. Quantidade-qualidade: para além de um dualismo técnico e de uma

dicotomia epistemológica. In: SANTOS FILHO, J.C.; SÁNCHEZ GAMBOA, S. Pesquisa

educacional: quantidade-qualidade. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2013. p. 83-108.

SANTOS FILHO, J.C. Pesquisa quantitativa versus pesquisa qualitativa: o desafio

paradigmático. In: SANTOS FILHO, J.C.; SÁNCHEZ GAMBOA, S. Pesquisa educacional:

quantidade-qualidade. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2013. p. 13-58.

SANTOS FILHO, J.C.; SÁNCHEZ GAMBOA, S. Pesquisa educacional: quantidade-qualidade. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2013.

SCHNEUWLY, Bernard. (1994). Gêneros e tipos de discurso. Considerações psicológicas e

ontogenéticas. SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Gêneros orais e escritos na

escola. Tradução Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. 3. ed. Campinas, SP: Mercado de

Letras, 2011. p. 19-34.

SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. (1998). O oral como texto: como construir um

objeto de ensino. In: SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Gêneros orais e escritos na

escola. Tradução Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. 3. ed. Campinas, SP: Mercado de

Letras, 2011. p. 125-155.

______. (1997). Os gêneros escolares - das práticas de linguagem aos objetos de ensino. In:

SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução

Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. 3. ed. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2011. p. 61-77.

______. (1996). Gêneros e progressão em expressão oral e escrita - elementos para reflexões

sobre uma experiência suíça (francófona). In: SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim.

230

Gêneros orais e escritos na escola. Tradução Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. 3. ed.

Campinas, SP: Mercado de Letras, 2011. p. 35-60.

SILVA, Danitza Dianderas da. Bakhtin e Paulo Freire: a relação do eu e do outro e as

relações dialógicas para a prática da liberdade. São Carlos: UFSCar, 2012. Tese (Doutorado).

Disponível em <http://www.bdtd.ufscar.br> Acesso em: 07 jan. 2013.

SILVA, Jane Quintiliano Guimarães. Gênero discursivo e tipo textual. Revista Scripta, Belo

Horizonte: Editora PucMinas, v. 2, n. 2, 1999, p. 87-106. Disponível em

<http://www.pucminas.br> Acesso em: 21 ago. 2013.

SOARES, Magda. Português na escola: história de uma disciplina curricular. In: Bagno,

Marcos (Org.). Lingüística da norma. 2. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2004, p. 155-177.

TOMAZONI, Tayana Moritz. Produção, correção e avaliação de textos a partir dos

gêneros do discurso. Universidade Federal de Santa Catarina, 2005. Dissertação (Mestrado).

Disponível em <http://www.ufsc.br> Acesso em: 07 jan. 2013.

ZOTTI, S.A. Organização do ensino primário no Brasil: uma leitura da história do currículo

oficial. In: VII Seminário Nacional de Estudos e Pesquisas: História, Sociedade e Educação

no Brasil. HISTEDBR, 2006, Campinas/SP. Disponível em

<http://www.histedbr.fae.unicamp.br> Acesso em 08 maio 2013.

COLEÇÕES DIDÁTICAS ANALISADAS

AROEIRA, Maria Luisa Campos; COSTA, Silvana; ALMEIDA, Zélia. A Aventura da

Linguagem: Letramento e Alfabetização Linguística. (1º ano, ensino fundamental). 1. ed. Belo Horizonte: Dimensão, 2008.

BURANELLO, Cristiane. Conhecer e Crescer: Letramento e Alfabetização Linguística. (1º e

2º ano, ensino fundamental). 2. ed. São Paulo: Escala Educacional, 2008.

______. Conhecer e Crescer: Língua Portuguesa. (3º ao 5º ano, ensino fundamental). 2. ed.

São Paulo: Escala Educacional, 2008.

CAMPEDELLI, Samira. Hoje é Dia de Português: Letramento e Alfabetização Linguística.

(1º e 2º ano, ensino fundamental). 1. ed. Curitiba: Positivo, 2007.

______. Hoje é Dia de Português: Língua Portuguesa. (3º ao 5º ano, ensino fundamental). 1.

ed. Curitiba: Positivo, 2007.

CAVÉQUIA, M.A.P. A Escola é Nossa: Língua Portuguesa, Letramento e Alfabetização

Linguística. (1º e 2º ano, ensino fundamental). São Paulo: Scipione, 2008.

______. A Escola é Nossa: Língua Portuguesa. (3º ao 5º ano, ensino fundamental). 3. ed. São

Paulo: Scipione, 2008.

231

CEREJA, W.R.; MAGALHÃES, T.C. Português: Linguagens: Alfabetização e Letramento.

(1º e 2º ano, ensino fundamental). 2. ed. São Paulo: Atual, 2008.

______. Português: Linguagens: Língua Portuguesa. (3º ao 5º ano, ensino fundamental). 2.

ed. São Paulo: Atual, 2008.

MIRANDA, Cláudia; RODRIGUES, Vera Lúcia. Aprendendo Sempre: Letramento e

Alfabetização Linguística. (1º e 2º ano, ensino fundamental). 1. ed. São Paulo: Ática, 2008.

______. Aprendendo Sempre: Língua Portuguesa. (3º ao 5º ano, ensino fundamental). 1. ed.

São Paulo: Ática, 2008.

NEVES, Albanize Aparecida Arêdes; STEFANOVITS, Ângelo Alexandref; GRILO, Míriam

dos Santos. Infância Feliz: Letramento e Alfabetização Linguística. (1º e 2º ano, ensino

fundamental). São Paulo: Escala Educacional, 2008.

______. Infância Feliz: Língua Portuguesa. (3º ao 5º ano, ensino fundamental). 2. ed. São

Paulo: Escala Educacional, 2008.

SILVA, M.R.C.; ANSON, V.R.L. A Grande Aventura: Letramento e Alfabetização

Linguística. (1º e 2º ano, ensino fundamental). 1 ed. São Paulo: FTD, 2008.

______. A Grande Aventura: Língua Portuguesa. (3º ao 5º ano, ensino fundamental). 1 ed.

São Paulo: FTD, 2008.

TRAVAGLIA, Luiz Carlos; COSTA, Silvana; ALMEIDA, Zélia. A Aventura da

Linguagem. (2º ano, ensino fundamental). 1. ed. Belo Horizonte: Dimensão, 2008.

______. A Aventura da Linguagem. (3º ao 5º ano, ensino fundamental). 2. ed. Belo

Horizonte: Dimensão, 2008.

232

APÊNDICES

APÊNDICE A - COLEÇÃO CONHECER E CRESCER

Conhecer e Crescer x 1º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Placas de sinalização Cotidiana 15

2 Não identificado - 35

3 Adivinha Da tradição oral 58

4 Lista Cotidiana 69

5 Texto instrucional

(instruções de jogo)

Cotidiana 86 e 87

6 Ficha técnica Científica 98 e 99

7 Texto opinativo Escolar 115

8 Folheto Publicitária 125

9 Cartaz Publicitária 137

10 Narração Escolar 151

11 Entrevista Jornalística 167

12 Descrição Escolar 177 e 178

Conhecer e Crescer x 2º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Cantiga de roda Da tradição oral 18

Parlenda Da tradição oral 22 e 23

2 Entrevista Jornalística 41 e 42

3 Bilhete Cotidiana 61

4 Narração Escolar 80 e 81

5 Conto Literária 102

6 Fábula Literária 123

7 Receita Cotidiana 137 e 138

Anúncio Publicitária 141

8 Embalagem Publicitária 159

9 Texto instrucional

(instruções de montagem)

Cotidiana 177 e 178

10 Resenha de livro Jornalística 197

233

Conhecer e Crescer x 3º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Poema Literária 20

2 Descrição Escolar 37

3 Carta pessoal Cotidiana 56 e 57

4 História em quadrinhos Jornalística 72 e 73

5 Quadrinha Da tradição oral 96 e 97

6 Conto Literária 118

7 Anúncio classificado Publicitária 135

8 Conto de fadas Literária 151 e 152

9 Ficha técnica Científica 167

10 Narração Escolar 184 e 185

Convite Cotidiana 188 e 189

Conhecer e Crescer x 4º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Regras de convivência Escolar 19

2 Resumo Escolar 31 e 32

3 Descrição Escolar 50

Narração Escolar 62

4 Fábula Literária 79

5 Cartaz Publicitária 89

6 Artigo informativo Jornalística 110

Cartão-postal Cotidiana 113 e 114

7 Narração Escolar 128

8 Texto opinativo Escolar 151

9 Poema Literária 167 e 168

10 Opcional:

Biografia ou autobiografia

Literária/Literária

187 e 188

Conhecer e Crescer x 5º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Narração Escolar 17 a 19

2 Notícia Jornalística 41

Foto-legenda Jornalística 46

3 Artigo informativo Jornalística 64 e 65

4 Narração Escolar 91

5 Crônica Jornalística 121 a 123

6 Dissertação Escolar 137

7 Anúncio Publicitária 151 e 152

8 Narrativa mitológica Da tradição oral 176 a 178

9 Diário Cotidiana 197 e 198

234

APÊNDICE B - COLEÇÃO INFÂNCIA FELIZ

Infância Feliz x 1º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Texto instrucional

(instruções de brincadeira)

Cotidiana 12

2 Narração Escolar 30

3 Relato Cotidiana 53

2

4 Conto Literária 75

5 Conto Literária 90

6 Conto Literária 105

3

7 Paródia de uma cantiga de roda Da tradição oral 114 e 115

8 Conto Literária 133

9 Conto Literária 150 e 151

Capítulo

final

Carta-resposta Cotidiana 171 e 172

Infância Feliz x 2º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Lista Cotidiana 16 e 17

2 Bilhete Cotidiana 38 a 40

Bilhete Cotidiana 40 e 41

3 Narração Escolar 60 a 62

2

4 Conto infantil Literária 86 e 87

5 História em quadrinhos Jornalística 106 e 107

6 Ficha técnica Científica 123 a 125

Texto informativo Escolar 123 a 125

3

7 Lenda Da tradição oral 145 e 146

8 Convite Cotidiana 170 e 171

Convite Cotidiana 171 e 172

9 Conto infantil Literária 196 e 197

4

10 Quadro Científica 217 a 219

Texto informativo Escolar 219 e 220

11 Narração Escolar 238 a 240

12 Narração Escolar 256 e 257

235

Infância Feliz x 3º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 História em quadrinhos Jornalística 17 e 18

2 Narração Escolar 35 e 36

3 Diálogo Cotidiana 52

2

4 Fábula Literária 67 e 68

5 Legenda de foto

(foto-legenda)

Jornalística 82 e 83

6 Poema Literária 100 e 101

3

7 Definição

(descrição)

Escolar 118

8 Carta pessoal Cotidiana 135 e 136

9 Conto de fadas Literária 154 e 155

4

10 Ficha técnica Científica 174 a 176

11 Texto informativo Escolar 190 a 192

12 Dicas Cotidiana 207

Infância Feliz x 4º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Pesquisa de opinião Publicitária 17 e 18

2 Conto Literária 34 e 35

3 Poema Literária 51 a 53

2

4 Receita Cotidiana 77 e 78

5 Notícia Jornalística 97 e 98

6 Cartaz Publicitária 116 e 117

3

7 Adivinha Da tradição oral 139 e 140

Ditado popular Da tradição oral 139 e 140

8 Diário Cotidiana 162 e 163

9 Narração Escolar 186 a 188

4

10 Relato Cotidiana 218 e 219

11 Entrevista Jornalística 239

12 Conto Literária 260

236

Infância Feliz x 5º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Texto informativo Escolar 16 e 17

2 Resumo Escolar 32 e 33

3 Lista Cotidiana 49 e 50

Texto instrucional

(instruções de brincadeira ou jogo)

Cotidiana 49 e 50

2

4 Texto opinativo Escolar 76

5 Anúncio classificado Publicitária 90 e 91

6 Argumentação Escolar 108

3

7 Reportagem Jornalística 134 e 135

8 Cartão-postal Cotidiana 149

9 Lenda Da tradição oral 168

4

10 Opcional:

Paródia de uma cantiga de roda

Paródia de uma música popular

Da tradição oral

Artística

188

11 Opcional:

Narração ou poema

Escolar/Literária

203 a 205

12 Narração Escolar 222 e 223

APÊNDICE C - COLEÇÃO A GRANDE AVENTURA

A Grande Aventura x 1º ano

Unidade Lição Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Não identificado - 18

2 Não identificado - 28

3 Não identificado - 38 e 39

4 Bilhete Cotidiana 47

2

1 Anúncio Publicitária 60 e 61

2 Texto informativo Escolar 69

3 Narração Escolar 78

4 Cantiga de roda Da tradição oral 90 e 91

3

1 Receita Cotidiana 101

2 Cardápio Dos negócios 110 e 111

3 Capa de livro Publicitária 120

Índice Jornalística 120

4

1 Descrição Escolar 133

2 Descrição Escolar 142

3 Narração Escolar 153

237

A Grande Aventura x 2º ano

Unidade Lição Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Relato Cotidiana 20

2 Quadrinho

(história em quadrinho)

Jornalística 36

3 Ficha de identificação Escolar 48 e 49

Relato Cotidiana 48 e 49

4 Diário Cotidiana 65

2

1 Não identificado - 82

2 Letra de música (cantiga de roda

ou outro tipo de música)

Da tradição oral

Artística

94

3

1 Conto engraçado Literária 109 e 110

2 Descrição Escolar 128

3 Narração Escolar 144

4 Narração Escolar 156 e 157

4

1 Conto Literária 171 e 172

2 Texto informativo Escolar 190 e 191

3 Descrição Escolar 208 e 209

A Grande Aventura x 3º ano

Unidade Lição Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Narração Escolar 19 e 20

2 Relato Cotidiana 30

3 Cartaz Publicitária 43 e 44

2

1 Narração Escolar 61 e 62

2 Receita Cotidiana 75

3 Convite Cotidiana 87

3

1 Descrição Escolar 102 e 103

2 Descrição Escolar 117

3 Descrição Escolar 132

4 Conto de fadas Literária 145 e 146

4

1 Narração Escolar 161 e 162

2 Opcional:

Bilhete ou e-mail

Cotidiana/Digital

175 e 176

3 Carta

(carta pessoal)

Cotidiana 189 e 190

4 Filme Artística 201 e 202

238

A Grande Aventura x 4º ano

Unidade Lição Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Folheto Publicitária 19 e 20

2 Narração Escolar 33 e 34

3 Piada Da tradição oral 47

2

1 Folheto Publicitária 62 a 64

2 Entrevista Jornalística 80 e 81

3 Reportagem Jornalística 98 e 99

3

1 Texto informativo Escolar 112

2 Narração Escolar 125 e 126

3 Cartaz Publicitária 140

4

1 Conto de aventura Literária 155 a 157

2 Lenda Da tradição oral 170

3 Conto de aventura Literária 184 e 185

A Grande Aventura x 5º ano

Unidade Lição Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Descrição Escolar 17 e 18

2 Diálogo Cotidiana 31 e 32

3 Cordel Da tradição oral 47 e 48

2

1 Biografia Literária 61 e 62

2 Narração Escolar 78 e 79

3 Cartilha de brincadeiras Cotidiana 97 a 99

3

1 Relato Cotidiana 115 e 116

2 Narração Escolar 129 e 130

3 Relato Cotidiana 142 e 143

4

1 Crônica literária Literária 156 a 158

2 Narração Escolar 171 e 172

3 Fábula Literária 185 a 187

239

APÊNDICE D - COLEÇÃO APRENDENDO SEMPRE

Aprendendo Sempre x 1º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 s.pe.44

- -

2 s.pe. - -

3 Não identificado - 73 e 74

4 s.pe. - -

5 Diálogo Cotidiana 103 e 104

6 Narração Escolar 125 e 126

7 Narração Escolar 147 e 148

8 Receita Cotidiana 179 e 180

9 Relato Cotidiana 201 e 202

10 Bilhete Cotidiana 218 e 219

Aprendendo Sempre x 2º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Lista telefônica Cotidiana 24 a 26

2 História em quadrinhos Jornalística 47 a 49

3 Placas de sinalização Cotidiana 68 a 71

4 Texto instrucional

(instruções de jogo)

Cotidiana 94 a 96

5 Narração Escolar 115 a 117

6 Fábula Literária 140 e 141

7 Texto informativo Escolar 162 a 164

8 Paródia de uma cantiga de roda Da tradição oral 186 a 188

9 Conto infantil Literária 214 a 217

10 Relato Cotidiana 244 a 247

44

s.pe. significa “sem produção escrita”.

240

Aprendendo Sempre x 3º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 História em quadrinhos Jornalística 25 e 26

2 Regras de convivência Escolar 47 a 49

3 Texto instrucional

(instruções de montagem)

Cotidiana 68 a 70

4 Carta

(carta pessoal)

Cotidiana 86 a 88

5 Conto Literária 107 a 109

6 Redação Escolar 127 e 128

7 Biografia Literária 149 a 151

8 Texto informativo Escolar 169 a 171

9 Poesia

(poema)

Literária 190 a 193

10 Descrição Escolar 215 e 216

Aprendendo Sempre x 4º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Narração Escolar 25 e 26

2 Poesia

(poema)

Literária 46 e 47

3 Conto Literária 65 e 66

4 Artigo de opinião Jornalística 86 e 87

5 Cartão-postal Cotidiana 106 e 107

6 Narração Escolar 132 e 133

7 Paródia de um conto Literária 153 a 155

8 Resenha de filme Jornalística 176 a 179

9 Folheto Publicitária 198 a 200

10 Texto teatral Literária 222 e 223

Aprendendo Sempre x 5º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 s.pe. - -

2 Conto Literária 52 a 54

3 Reportagem Jornalística 74 a 76

4 Poesia

(poema)

Literária 94 e 95

5 Cordel Da tradição oral 118 e 119

6 Paródia de um conto Literária 143 a 146

7 Texto instrucional

(instruções de montagem)

Cotidiana 169 a 171

8 Entrevista Jornalística 189 a 192

9 Narração Escolar 216 e 217

10 Artigo de opinião Jornalística 237 e 238

241

APÊNDICE E - COLEÇÃO A ESCOLA É NOSSA

A Escola é Nossa x 1º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Não identificado - 37

2 Lista Cotidiana 41

3 Narração Escolar 47

4 Lista Cotidiana 51

5 Diálogo Cotidiana 57

6 Poema Literária 61

7 História em quadrinhos Jornalística 67

8 Cartão-postal Cotidiana 71

9 Foto-legenda Jornalística 77

10 Relato Cotidiana 81

11 Redação Escolar 87

12 Capa de livro Publicitária 91

13 Narração Escolar 99

14 Cantiga de roda Da tradição oral 103

15 Narração Escolar 109

16 Poema Literária 113

17 Descrição Escolar 119

18 Não identificado - 125

19 Rótulo Publicitária 129

20 Capa de filme Publicitária 133

21 Não identificado - 137

22 Declaração Jurídica 141

23 Convite Cotidiana 145

24 s.pe. - -

25 s.pe. - -

26 Notícia Jornalística 159

27 s.pe. - -

28 Cartaz Publicitária 167

29 Entrevista Jornalística 173

30 Bilhete Cotidiana 177

31 Foto-legenda Jornalística 185

32 Comentário opinativo Escolar 191

33 Ficha técnica Científica 195

34 Não identificado - 201

35 Lista Cotidiana 205

36 Anúncio classificado Publicitária 209

242

A Escola é Nossa x 2º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Aviso Cotidiana 18 e 19

2 Cantiga de roda Da tradição oral 38

Parlenda Da tradição oral 41

3 História em quadrinhos Jornalística 55 e 56

Capa de livro Publicitária 59 e 60

4 Narração Escolar 72 e 73

Lista Cotidiana 76

Convite Cotidiana 76

5 Texto instrucional

(instruções de montagem)

Cotidiana 94 e 95

6 Bilhete Cotidiana 116

7 Biografia Literária 131 e 132

8 Cartão-postal Cotidiana 143 e 144

9 Receita Cotidiana 157 e 158

10 Lista Cotidiana 173

Ficha técnica Científica 176 e 177

11 Narração Escolar 188 e 189

Descrição Escolar 194 e 195

A Escola é Nossa x 3º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Acróstico Literária 12

Verbete literário Literária 16

2 Conto popular Literária 30

3 Poema Literária 43

Anúncio classificado Publicitária 47

4 Notícia Jornalística 59 e 60

Anedota Da tradição oral 63

5 Ingresso Dos negócios 78

6 Quadrinha Da tradição oral 99 e 100

7 História em quadrinhos Jornalística 123 e 124

8 Argumentação Escolar 138 e 139

Texto instrucional

(instruções de brincadeira ou jogo)

Cotidiana 143 e 144

9 Argumentação Escolar 153 e 154

Texto-legenda

(foto-legenda)

Jornalística 157

10 Conto de fadas Literária 173 e 174

11 Lista Cotidiana 189

Programação televisiva Artística 193

12 Narração Escolar 205

Descrição Escolar 207

243

A Escola é Nossa x 4º ano

A Escola é Nossa x 5º ano

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Ficha técnica Científica 15

Resumo Escolar 15

Resenha de livro Jornalística 21 a 23

2 Entrevista Jornalística 40 e 41

Carta

(tipo de carta não especificada) - 45 a 47

3 Lenda Da tradição oral 61

4 Poema Literária 75 e 76

5 Texto de opinião

(artigo de opinião)

Jornalística 92 a 94

6 Cartaz Publicitária 114 e 115

7 Narração Escolar 125

8 Descrição Escolar 142 e 143

9 Notícia Jornalística 159 e 160

10 Conto de fadas Literária 180

11 Resumo Escolar 196 a 198

12 Narração Escolar 216 e 217

Unidade Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 Regras de convivência Escolar 14

2 Biografia Literária 26 e 27

Argumentação Escolar 32 e 33

Verbete literário Literária 36

3 Texto teatral Literária 59 a 61

4 Diário Cotidiana 75 e 76

5 Poema visual Literária 96 e 97

Narração Escolar 104

6 Fábula Literária 119

7 Redação Escolar 130 e 131

Entrevista Jornalística 137

Relato Cotidiana 137

8 Dissertação Escolar 156 e 157

Poema Literária 161 e 162

9 Texto de opinião

(artigo de opinião)

Jornalística 177

10 Narração Escolar 189

Narrativa mitológica Da tradição oral 197

11 Lista Cotidiana 213

Texto de opinião

(artigo de opinião)

Jornalística 213

12 Poema Literária 228 e 229

244

APÊNDICE F - COLEÇÃO A AVENTURA DA LINGUAGEM

A Aventura da Linguagem x 1º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Não identificado - 13

2 Lista Cotidiana 31

3 Calendário Cotidiana 34

4 Lista Cotidiana 45

5 Piada Da tradição oral 51

2

1 Lista Cotidiana 60

2 Dicas Cotidiana 73

3 Não identificado - 84 e 85

4 Bilhete Cotidiana 90

5 Lista Cotidiana 103

3

1 Descrição Escolar 112 e 113

2 Não identificado - 122

3 Texto expositivo Escolar 131

4 Lista Cotidiana 145

5 Poema Literária 151

4

1 Lista Cotidiana 158 e 159

2 Ficha técnica Científica 169

3 Texto expositivo Escolar 177

4 Recado Cotidiana 184

5 Não identificado - 195

A Aventura da Linguagem x 2º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Não identificado - 12 e 13

2 Comentário

(comentário opinativo)

Escolar 24

3 Bilhete Cotidiana 32

4 Faixa de segurança Cotidiana 43

5 Lista Cotidiana 54

2

1 s.pe. - -

2 Lista Cotidiana 70 e 71

3 Anedota Da tradição oral 80

4 Instruções de montagem Cotidiana 88

5 Manchete Jornalística 97

3

1 Narração Escolar 117

2 Bilhete Cotidiana 124

3 Opcional:

Regras de convivência

Receita

Slogan

Escolar

Cotidiana

Publicitária

132

4 Narração Escolar 139

5 Narração Escolar 145 e 146

245

4

1 Opcional:

Legenda para foto

(foto-legenda)

Texto expositivo

Jornalística

Escolar

158 e 159

2 Convite Cotidiana 173

Convite Cotidiana 173

3 s.pe. - -

4 Quadro-resumo Escolar 191 e 192

5 Entrevista Jornalística 203 e 204

A Aventura da Linguagem x 3º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Fábula Literária 12

2 Convite Cotidiana 17

3 Anúncio Publicitária 24 e 25

4 Descrição Escolar 31 e 32

2

1 Bilhete Cotidiana 42 e 43

Bilhete Cotidiana 43

2 Cartão resposta Cotidiana 51 e 52

3 Narração Escolar 58 a 60

4 Carta

(carta pessoal)

Cotidiana 68

3

1 Entrevista Jornalística 77

Texto expositivo Escolar 77

2 Relato Cotidiana 82 e 83

3 Folheto Publicitária 89

4 Descrição Escolar 99 e 100

4

1 Perfil Digital 110

2 Anúncio classificado Publicitária 115 e 116

3 Manchete Jornalística 123 e 124

4 Notícia Jornalística 130

246

A Aventura da Linguagem x 4º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Regras de convivência Escolar 14 e 15

2 Narração Escolar 23

3 Descrição Escolar 30

4 Narração Escolar 37

2

1 Entrevista Jornalística 43

2 Carta comercial Dos negócios 51

3 Carta de reclamação Cotidiana 57 a 59

4 Instruções de localização Cotidiana 67

3

1 s.pe. - -

2 Resenha de filme Jornalística 86

3 Descrição Escolar 94

4 Anúncio classificado Publicitária 101 e 102

4

1 Lista Cotidiana 111 e 112

Lista Cotidiana 111 e 112

2 Opcional:

Carta à redação

Charge

Anúncio classificado

Entrevista

Notícia

Jornalística

Jornalística

Publicitária

Jornalística

Jornalística

117

3 Lista Cotidiana 126 e 127

Slogan Publicitária 126 e 127

4 Cartão-convite Cotidiana 135 a 137

A Aventura da Linguagem x 5º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Narração Escolar 17

2 Narração Escolar 28 e 29

3 Carta-resposta Cotidiana 37 e 38

4 Resumo Escolar 47

2

1 Narração Escolar 56

2 Poema

(poema visual)

Literária 61 e 62

3 Calendário Cotidiana 71 e 72

4 E-mail Digital 78 e 79

3

1 Ficha técnica Científica 91

2 Resenha de filme Jornalística 98

Lista Cotidiana 99

3 Entrevista Jornalística 107 e 108

4 Anúncio Publicitária 116

4

1 Quadro de instruções Cotidiana 124

2 Narração Escolar 133

3 Charge Jornalística 141

4 Cartão-postal Cotidiana 149

247

APÊNDICE G - COLEÇÃO PORTUGUÊS: LINGUAGENS

Português: Linguagens x 1º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 s.pe. - -

2 s.pe. - -

3 Não identificado - 31

2

1 s.pe. - -

2 Não identificado - 55

Não identificado - 55

3 Descrição Escolar 70 e 71

3

1 s.pe. - -

2 Poema Literária 97 e 98

3 Fábula Literária 113 e 114

4

1 s.pe. - -

2 Diálogo Cotidiana 142 e 143

3 História em quadrinhos Jornalística 159

Português: Linguagens x 2º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 s.pe. - -

2 Parlenda Da tradição oral 20 e 21

Parlenda Da tradição oral 21

3 Poema Literária 39

Poema Literária 40

2

1 s.pe. - -

2 Regras de brincadeira

(instruções de brincadeira)

Cotidiana 69

3 Instruções de montagem Cotidiana 87

3

1 s.pe. - -

2 Conto maravilhoso Literária 113

Conto maravilhoso Literária 114

3 Conto Literária 128

4

1 s.pe. - -

2 Ficha técnica Científica 158

Ficha técnica Científica 159

3 Verbete de enciclopédia Científica 175 e 176

248

Português: Linguagens x 3º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 s.pe. - -

2 Carta pessoal Cotidiana 25 e 26

Declaração Jurídica 30

3 Diário Cotidiana 49

Narração Escolar 51 e 52

2

1 s.pe. - -

2 Poema Literária 83 e 84

Poema Literária 84 e 85

Poema Literária 85 e 86

Poema Literária 87

3 Receita Cotidiana 105 e 106

Receita Cotidiana 106 a 108

Ficha individual de saúde Da saúde 112

3

1 s.pe. - -

2 Fábula Literária 138

Fábula Literária 139 e 140

3 História em quadrinhos Jornalística 155 a 157

4

1 s.pe. - -

2 Cartaz Publicitária 187 e 188

Cartaz Publicitária 188 e 189

3 Tomada de notas Escolar 205

Tomada de notas Escolar 208 e 209

Cartaz Publicitária 208 a 210

Português: Linguagens x 4º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 s.pe. - -

2 Narrativa de viagem Literária 22

Lista Cotidiana 24

3 Diário Cotidiana 41

2

1 s.pe. - -

2 Texto de opinião

(artigo de opinião)

Jornalística 70 e 71

3 Texto de opinião

(artigo de opinião)

Jornalística 89 e 90

Texto de opinião

(artigo de opinião)

Jornalística 90 e 91

3

1 s.pe. - -

2 Notícia Jornalística 122

Notícia Jornalística 122 e 123

3 Entrevista Jornalística 144 e 145

Relato Cotidiana 147 e 148

4

1 s.pe. - -

2 Anúncio Publicitária 172

Anúncio Publicitária 172 e 173

249

3 Anúncio Publicitária 192

Anúncio Publicitária 192 e 193

Anúncio classificado Publicitária 193

Português: Linguagens x 5º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 s.pe. - -

2 Relato Cotidiana 25

Relato Cotidiana 25 e 26

3 Relato Cotidiana 45 e 46

Poema Literária 49

2

1 s.pe. - -

2 Texto teatral Literária 77

Texto teatral Literária 78

3 Texto teatral Literária 96 e 97

Poema Literária 99

3

1 s.pe. - -

2 Texto de opinião

(artigo de opinião)

Jornalística 126 e 127

Pesquisa de opinião Publicitária 131

Gráfico Científica 131

3 Texto de opinião

(artigo de opinião)

Jornalística 147 e 148

4

1 s.pe. - -

2 Reportagem Jornalística 179 e 180

3 Reportagem Jornalística 204 a 206

Gênero a critério do aluno - 206 e 207

250

APÊNDICE H - COLEÇÃO HOJE É DIA DE PORTUGUÊS

Hoje é Dia de Português x 1º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 1 Placas de sinalização Cotidiana 16

2 Não identificado - 32

2

1 Capa de livro Publicitária 39

2 Parlenda Da tradição oral 49

Poema Literária 54

Diagrama Científica 58

3 Cantiga infantil Da tradição oral 82

3 1 s.pe. - -

2 s.pe. - -

4 1 s.pe. - -

2 s.pe. - -

5

1 s.pe. - -

2 Canção de ninar

(cantiga de ninar)

Da tradição oral 150

3 Poema Literária 155 e 156

4 s.pe. - -

Hoje é Dia de Português x 2º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Comentário opinativo Escolar 15

2 Placas de sinalização Cotidiana 18 a 22

Não identificado - 28

3 Não identificado - 41 e 42

2

1 Poema Literária 54 a 56

2 Certidão de nascimento Burocrática 61 e 62

Carteira de identidade Burocrática 66

3 Descrição Escolar 69

3

1 Poema Literária 79 a 81

Poema Literária 85

2 Parlenda Da tradição oral 94

3 Adivinha Da tradição oral 106

4

1 Trava-língua Da tradição oral 111 e 112

Trava-língua Da tradição oral 116

2 Parlenda Da tradição oral 126

3 Não identificado - 136

5

1 Ficha técnica Científica 145 e 146

Legenda

(foto-legenda)

Jornalística 147

2 Receita Cotidiana 156 a 158

3 Narração Escolar 163

Carta-resposta Cotidiana 167 a 169

251

Hoje é Dia de Português x 3º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 Descrição Escolar 14

Narração Escolar 22 e 23

2 Não identificado - 28 a 33

Texto expositivo Escolar 39

3 Narração Escolar 46 e 47

Conto Literária 53 e 54

2

1 Apólogo Literária 59

Bilhete Cotidiana 63

2 Ficha técnica Científica 67 e 68

Haicai Literária 74

3

1 Comentário opinativo Escolar 80

Fábula Literária 84

2 Fábula Literária 94

4

1 Lista Cotidiana 107

Convite Cotidiana 107

2 Texto expositivo Escolar 116 e 117

3 Lenda Da tradição oral 127 e 128

5

1 s.pe. - -

2 Texto instrucional

(instruções de brincadeira)

Cotidiana 149 a 152

3 Texto instrucional

(instruções de montagem)

Cotidiana 158 a 160

6

1 Não identificado - 164 e 165

Cartaz Publicitária 167

Cartaz Publicitária 167

2 Cruzadinha Jornalística 174

3 Carta

(carta pessoal)

Cotidiana 185 e 186

7

1 Cartão-postal Cotidiana 194

2 Cartão Cotidiana 200 e 201

3 s.pe. - -

Hoje é Dia de Português x 4º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1 1 Conto Literária 20 e 21

2 Opcional:

Relato ou narração

Cotidiana/Escolar

33 e 34

2

1 Fábula Literária 43 e 44

2 Narração Escolar 53 e 54

3 Conto indígena Literária 64

3

1 Lista Cotidiana 74 e 75

Gênero a critério do aluno - 74 e 75

2 Fichamento Escolar 79 e 80

Texto expositivo Escolar 85

252

3 Argumentação Escolar 92 e 93

Narração Escolar 96

4

1 Narração Escolar 108 e 109

2 Descrição Escolar 119 e 120

Entrevista Jornalística 119 e 120

5

6

1 Trocadilho Da tradição oral 129

Anedota Da tradição oral 130

2 Narração Escolar 136

Anedota Da tradição oral 137

Cartaz Publicitária 140

1 História em quadrinhos Jornalística 150 e 151

História em quadrinhos Jornalística 151

2 História em quadrinhos Jornalística 158 e 159

7

1 Texto expositivo Escolar 171 a 173

2 Narração Escolar 183

Convite Cotidiana 183

Hoje é Dia de Português x 5º ano

Unidade Capítulo Gênero do discurso Esfera Página(s)

1

1 História em quadrinhos Jornalística 16

2 Bilhete Cotidiana 24

3 Bilhete Cotidiana 30

Bilhete Cotidiana 30

Bilhete Cotidiana 30

Telegrama Cotidiana 38

2

1 Slogan Publicitária 46

Logomarca Publicitária 46

Folheto Publicitária 46 a 49

2 Legenda

(foto-legenda)

Jornalística 58 a 60

3 Enquete Científica 69 e 70

Gráfico Científica 69 e 70

Tabela Científica 69 e 70

3

1 Descrição Escolar 80

Descrição Escolar 80

2 Relato Cotidiana 89 e 90

3 Relato Cotidiana 98

4 1 Poema Literária 108 a 110

2 Poema Literária 118

5

1 Ficha técnica Científica 130

2 Carta-resposta Cotidiana 137 e 138

6 1 Conto Literária 147 e 148

2 Conto Literária 156

7 1 Manchete Jornalística 164

2 Caderno de jornal Jornalística 170

253

APÊNDICE I - COLETA DE DADOS DO 1º ANO

Gêneros do discurso contemplados x 1º ano

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Lista 10 Cotidiana

Narração 9 Escolar

Poema 6 Literária

Descrição 6 Escolar

Conto45

5 Literária

Cantiga (infantil, de roda, de ninar) 4 Da tradição oral

Bilhete 4 Cotidiana

Capa (de livro, de filme) 4 Publicitária

Relato 3 Cotidiana

Diálogo 3 Cotidiana

Ficha técnica 3 Científica

Receita 2 Cotidiana

Foto-legenda 2 Jornalística

História em quadrinhos 2 Jornalística

Cartaz 2 Publicitária

Entrevista 2 Jornalística

Placas de sinalização 2 Cotidiana

Instruções de brincadeira ou jogo 2 Cotidiana

Texto expositivo 2 Escolar

Cartão postal 1 Cotidiana

Redação 1 Escolar

Rótulo 1 Publicitária

Declaração 1 Jurídica

Convite 1 Cotidiana

Notícia 1 Jornalística

Comentário opinativo 1 Escolar

Anúncio classificado 1 Publicitária

Adivinha 1 Da tradição oral

Folheto 1 Publicitária

Paródia de uma cantiga de roda 1 Da tradição oral

Carta-resposta 1 Cotidiana

Anúncio 1 Publicitária

Cardápio 1 Dos negócios

Calendário 1 Cotidiana

Piada 1 Da tradição oral

Dicas 1 Cotidiana

Recado 1 Cotidiana

Fábula 1 Literária

Parlenda 1 Da tradição oral

Diagrama 1 Científica

Texto informativo 1 Escolar

45

Gênero do discurso presente apenas no livro didático Infância Feliz - 1º ano.

254

Índice 1 Jornalística

Texto opinativo 1 Escolar

Total de gêneros: 43

Não identificado: 17

Sem produção escrita: 17

Total: 97

Esferas sociais contempladas x 1º ano

Esfera Recorrência

Cotidiana 32

Escolar 21

Literária 12

Publicitária 10

Da tradição oral 8

Jornalística 8

Científica 4

Jurídica 1

Dos negócios 1

Total: 9 Total: 97

APÊNDICE J - COLETA DE DADOS DO 2º ANO

Gêneros do discurso contemplados x 2º ano

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 13 Escolar

Conto; conto (infantil, engraçado,

maravilhoso)

9 Literária

Parlenda 6 Da tradição oral

Bilhete 6 Cotidiana

Lista 5 Cotidiana

Convite 5 Cotidiana

Ficha técnica 5 Científica

Poema 5 Literária

História em quadrinho (s) 4 Jornalística

Instruções de montagem 4 Cotidiana

Receita 4 Cotidiana

Descrição 4 Escolar

Texto informativo 4 Escolar

Cantiga de roda 3 Da tradição oral

Relato 3 Cotidiana

Instruções de brincadeira ou jogo 2 Cotidiana

Placas de sinalização 2 Cotidiana

Fábula 2 Literária

Entrevista 2 Jornalística

Foto-legenda 2 Jornalística

Comentário opinativo 2 Escolar

255

Trava-língua 2 Da tradição oral

Aviso 1 Cotidiana

Capa (de livro) 1 Publicitária

Biografia 1 Literária

Cartão-postal 1 Cotidiana

Lista telefônica 1 Cotidiana

Paródia de uma cantiga de roda 1 Da tradição oral

Anúncio 1 Publicitária

Embalagem 1 Publicitária

Resenha de livro 1 Jornalística

Lenda 1 Da tradição oral

Quadro 1 Científica

Ficha de identificação 1 Escolar

Diário 1 Cotidiana

Faixa de segurança 1 Cotidiana

Quadro-resumo 1 Escolar

Verbete de enciclopédia 1 Científica

Carta-resposta 1 Cotidiana

Certidão de nascimento 1 Burocrática

Carteira de identidade 1 Burocrática

Texto expositivo 1 Escolar

Slogan 1 Publicitária

Manchete 1 Jornalística

Regras de convivência 1 Escolar

Anedota 1 Da tradição oral

Adivinha 1 Da tradição oral

Música 1 Artística

Total: 48

Não identificado: 5

Sem produção escrita: 6

Total: 120

Esferas sociais contempladas x 2º ano

Esfera Recorrência

Cotidiana 37

Escolar 27

Literária 17

Da tradição oral 15

Jornalística 10

Científica 7

Publicitária 4

Burocrática 2

Artística 1

Total: 9 Total: 120

256

APÊNDICE K - COLETA DE DADOS DO 3º ANO

Gêneros do discurso contemplados x 3º ano

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 10 Escolar

Descrição 10 Escolar

Conto; conto (popular, de fadas) 8 Literária

Poema 8 Literária

Carta pessoal 7 Cotidiana

Fábula 6 Literária

Cartaz 6 Publicitária

História em quadrinhos 5 Jornalística

Convite 4 Cotidiana

Bilhete 4 Cotidiana

Anúncio classificado 3 Publicitária

Ficha técnica 3 Científica

Receita 3 Cotidiana

Texto expositivo 3 Escolar

Notícia 2 Jornalística

Quadrinha 2 Da tradição oral

Argumentação 2 Escolar

Instruções de brincadeira ou jogo 2 Cotidiana

Foto-legenda 2 Jornalística

Lista 2 Cotidiana

Instruções de montagem 2 Cotidiana

Texto informativo 2 Escolar

Relato 2 Cotidiana

Tomada de notas 2 Escolar

Acróstico 1 Literária

Verbete literário 1 Literária

Anedota 1 Da tradição oral

Ingresso 1 Dos negócios

Programação televisiva 1 Artística

Regras de convivência 1 Escolar

Redação 1 Escolar

Biografia 1 Literária

Diálogo 1 Cotidiana

Perfil 1 Digital

Dicas 1 Cotidiana

E-mail 1 Digital

Filme 1 Artística

Anúncio 1 Publicitária

Entrevista 1 Jornalística

Ficha individual de saúde 1 Da saúde

Folheto 1 Publicitária

Manchete 1 Jornalística

Apólogo 1 Literária

257

Diário 1 Cotidiana

Cruzadinha 1 Jornalística

Declaração 1 Jurídica

Cartão-postal 1 Cotidiana

Lenda 1 Da tradição oral

Comentário opinativo 1 Escolar

Haicai 1 Literária

Cartão-resposta 1 Cotidiana

Cartão 1 Cotidiana

Total: 52

Não identificado: 2

Sem produção escrita: 6

Total: 128

Esferas sociais contempladas x 3º ano

Esfera Recorrência

Cotidiana 32

Escolar 32

Literária 27

Jornalística 12

Publicitária 11

Da tradição oral 4

Científica 3

Artística 2

Digital 2

Dos negócios 1

Da saúde 1

Jurídica 1

Total: 12 Total: 128

258

APÊNDICE L - COLETA DE DADOS DO 1º CICLO DO EF

Gêneros do discurso contemplados x 1º ciclo

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 32 Escolar

Conto; conto (infantil, engraçado,

maravilhoso, popular, de fadas)

22 Literária

Descrição 20 Escolar

Poema 19 Literária

Lista 17 Cotidiana

Bilhete 14 Cotidiana

Ficha técnica 11 Científica

História em quadrinho(s) 11 Jornalística

Convite 10 Cotidiana

Receita 9 Cotidiana

Fábula 9 Literária

Cartaz 8 Publicitária

Relato 8 Cotidiana

Carta pessoal 7 Cotidiana

Cantiga (infantil, de roda, de ninar) 7 Da tradição oral

Parlenda 7 Da tradição oral

Texto informativo 7 Escolar

Foto-legenda 6 Jornalística

Instruções de brincadeira ou jogo 6 Cotidiana

Texto expositivo 6 Escolar

Instruções de montagem 6 Cotidiana

Capa (de livro, de filme) 5 Publicitária

Entrevista 5 Jornalística

Diálogo 4 Cotidiana

Placas de sinalização 4 Cotidiana

Comentário opinativo 4 Escolar

Anúncio classificado 4 Publicitária

Cartão-postal 3 Cotidiana

Notícia 3 Jornalística

Anúncio 3 Publicitária

Redação 2 Escolar

Declaração 2 Jurídica

Adivinha 2 Da tradição oral

Folheto 2 Publicitária

Paródia de uma cantiga de roda 2 Da tradição oral

Carta-resposta 2 Cotidiana

Dicas 2 Cotidiana

Trava-língua 2 Da tradição oral

Biografia 2 Literária

Lenda 2 Da tradição oral

259

Diário 2 Cotidiana

Manchete 2 Jornalística

Regras de convivência 2 Escolar

Anedota 2 Da tradição oral

Quadrinha 2 Da tradição oral

Argumentação 2 Escolar

Tomada de notas 2 Escolar

Rótulo 1 Publicitária

Cardápio 1 Dos negócios

Calendário 1 Cotidiana

Piada 1 Da tradição oral

Recado 1 Cotidiana

Diagrama 1 Científica

Índice 1 Jornalística

Texto opinativo 1 Escolar

Aviso 1 Cotidiana

Lista telefônica 1 Cotidiana

Embalagem 1 Publicitária

Resenha de livro 1 Jornalística

Quadro 1 Científica

Ficha de identificação 1 Escolar

Faixa de segurança 1 Cotidiana

Quadro-resumo 1 Escolar

Verbete de enciclopédia 1 Científica

Certidão de nascimento 1 Burocrática

Carteira de identidade 1 Burocrática

Slogan 1 Publicitária

Música 1 Artística

Acróstico 1 Literária

Perfil 1 Digital

Verbete literário 1 Literária

Ingresso 1 Dos negócios

Programação televisiva 1 Artística

E-mail 1 Digital

Filme 1 Artística

Ficha individual de saúde 1 Da saúde

Apólogo 1 Literária

Cruzadinha 1 Jornalística

Haicai 1 Literária

Cartão-resposta 1 Cotidiana

Cartão 1 Cotidiana

Total: 81

Não identificado: 24

Sem produção escrita: 29

Total: 345

260

Esferas sociais contempladas x 1º ciclo

Esfera Recorrência

Cotidiana 101

Escolar 80

Literária 56

Jornalística 30

Da tradição oral 27

Publicitária 25

Científica 14

Artística 3

Jurídica 2

Dos negócios 2

Burocrática 2

Digital 2

Da saúde 1

Total: 13 Total: 345

APÊNDICE M - COLETA DE DADOS DO 4º ANO

Gêneros do discurso contemplados x 4º ano

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 17 Escolar

Conto; conto (indígena, de fadas, de

aventura)

8 Literária

Entrevista 7 Jornalística

Artigo de opinião 5 Jornalística

Cartaz 5 Publicitária

Descrição 5 Escolar

Notícia 5 Jornalística

Lista 5 Cotidiana

Poema 4 Literária

Anúncio 4 Publicitária

Resumo 3 Escolar

Resenha (de livro, de filme) 3 Jornalística

Folheto 3 Publicitária

Relato 3 Cotidiana

Anúncio classificado 3 Publicitária

História em quadrinhos 3 Jornalística

Lenda 2 Da tradição oral

Cartão-postal 2 Cotidiana

Regras de convivência 2 Escolar

Fábula 2 Literária

Diário 2 Cotidiana

Texto expositivo 2 Escolar

Anedota 2 Da tradição oral

Ficha técnica 1 Científica

261

Paródia de um conto 1 Literária

Texto teatral 1 Literária

Artigo informativo 1 Jornalística

Texto opinativo 1 Escolar

Biografia 1 Literária

Autobiografia 1 Literária

Pesquisa de opinião 1 Publicitária

Receita 1 Cotidiana

Adivinha 1 Da tradição oral

Ditado popular 1 Da tradição oral

Piada 1 Da tradição oral

Reportagem 1 Jornalística

Texto informativo 1 Escolar

Carta comercial 1 Dos negócios

Carta de reclamação 1 Cotidiana

Instruções de localização 1 Cotidiana

Carta à redação 1 Jornalística

Charge 1 Jornalística

Slogan 1 Publicitária

Fichamento 1 Escolar

Argumentação 1 Escolar

Trocadilho 1 Da tradição oral

Narrativa de viagem 1 Literária

Cartão-convite 1 Cotidiana

Convite 1 Cotidiana

Total de gêneros: 49

Não identificado: 0

Sem produção escrita: 5

Total: 123

Esferas sociais contempladas x 4º ano

Esfera Recorrência

Escolar 33

Jornalística 27

Literária 19

Cotidiana 17

Publicitária 17

Da tradição oral 8

Dos negócios 1

Científica 1

Total: 8 Total: 123

262

APÊNDICE N - COLETA DE DADOS DO 5º ANO

Gêneros do discurso contemplados x 5º ano

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 14 Escolar

Relato 8 Cotidiana

Poema 8 Literária

Artigo de opinião 5 Jornalística

Texto teatral 4 Literária

Reportagem 4 Jornalística

Bilhete 4 Cotidiana

Entrevista 3 Jornalística

Lista 3 Cotidiana

Conto 3 Literária

Descrição 3 Escolar

Biografia 2 Literária

Argumentação 2 Escolar

Diário 2 Cotidiana

Poema visual 2 Literária

Fábula 2 Literária

Dissertação 2 Escolar

Narrativa mitológica 2 Da tradição oral

Cordel 2 Da tradição oral

Foto-legenda 2 Jornalística

Anúncio 2 Publicitária

Resumo 2 Escolar

Cartão-postal 2 Cotidiana

Carta-resposta 2 Cotidiana

Gráfico 2 Científica

Ficha técnica 2 Científica

Verbete literário 1 Literária

Regras convivência 1 Escolar

Paródia de um conto 1 Literária

Instruções de montagem 1 Cotidiana

Notícia 1 Jornalística

Redação 1 Escolar

Artigo informativo 1 Jornalística

Crônica 1 Jornalística

Texto informativo 1 Escolar

Instruções de brincadeira ou jogo 1 Cotidiana

Texto opinativo 1 Escolar

Anúncio classificado 1 Publicitária

Lenda 1 Da tradição oral

Paródia de uma cantiga de roda 1 Da tradição oral

Paródia de uma música popular 1 Artística

Diálogo 1 Cotidiana

Cartilha de brincadeiras 1 Cotidiana

263

Crônica literária 1 Literária

Calendário 1 Cotidiana

E-mail 1 Digital

Resenha de filme 1 Jornalística

Quadro de instruções 1 Cotidiana

Charge 1 Jornalística

História em quadrinhos 1 Jornalística

Telegrama 1 Cotidiana

Slogan 1 Publicitária

Logomarca 1 Publicitária

Folheto 1 Publicitária

Enquete 1 Científica

Tabela 1 Científica

Manchete 1 Jornalística

Caderno de jornal 1 Jornalística

Pesquisa de opinião 1 Publicitária

Total de gêneros: 59

Não identificado: 0

Sem produção escrita: 5

Total: 122

Esferas sociais contempladas x 5º ano

Esfera Recorrência

Cotidiana 28

Escolar 27

Literária 24

Jornalística 22

Publicitária 7

Da tradição oral 6

Científica 6

Digital 1

Artística 1

Total: 9 Total: 122

264

APÊNDICE O - COLETA DE DADOS DO 2º CICLO DO EF

Gêneros do discurso contemplados x 2º ciclo

Gênero do discurso Recorrência Esfera

Narração 31 Escolar

Poema 12 Literária

Conto; conto (indígena de fadas, de

aventura)

11 Literária

Relato 11 Cotidiana

Entrevista 10 Jornalística

Artigo de opinião 10 Jornalística

Descrição 8 Escolar

Lista 8 Cotidiana

Notícia 6 Jornalística

Anúncio 6 Publicitária

Cartaz 5 Publicitária

Resumo 5 Escolar

Texto teatral 5 Literária

Reportagem 5 Jornalística

Resenha (de livro, de filme) 4 Jornalística

Folheto 4 Publicitária

Anúncio classificado 4 Publicitária

História em quadrinhos 4 Jornalística

Cartão-postal 4 Cotidiana

Fábula 4 Literária

Diário 4 Cotidiana

Bilhete 4 Cotidiana

Lenda 3 Da tradição oral

Regras de convivência 3 Escolar

Biografia 3 Literária

Argumentação 3 Escolar

Ficha técnica 3 Científica

Texto expositivo 2 Escolar

Anedota 2 Da tradição oral

Paródia de um conto 2 Literária

Artigo informativo 2 Jornalística

Texto opinativo 2 Escolar

Texto informativo 2 Escolar

Charge 2 Jornalística

Pesquisa de opinião 2 Publicitária

Slogan 2 Publicitária

Poema visual 2 Literária

Dissertação 2 Escolar

Narrativa mitológica 2 Da tradição oral

Cordel 2 Da tradição oral

Foto-legenda 2 Jornalística

Carta-resposta 2 Cotidiana

265

Gráfico 2 Científica

Receita 1 Cotidiana

Adivinha 1 Da tradição oral

Ditado popular 1 Da tradição oral

Piada 1 Da tradição oral

Carta comercial 1 Dos negócios

Carta de reclamação 1 Cotidiana

Instruções de localização 1 Cotidiana

Carta à redação 1 Jornalística

Fichamento 1 Escolar

Autobiografia 1 Literária

Trocadilho 1 Da tradição oral

Narrativa de viagem 1 Literária

Cartão-convite 1 Cotidiana

Convite 1 Cotidiana

Verbete literário 1 Literária

Instruções de montagem 1 Cotidiana

Redação 1 Escolar

Crônica 1 Jornalística

Instruções de brincadeira ou jogo 1 Cotidiana

Paródia de uma cantiga de roda 1 Da tradição oral

Paródia de uma música popular 1 Artística

Diálogo 1 Cotidiana

Cartilha de brincadeiras 1 Cotidiana

Crônica literária 1 Literária

Calendário 1 Cotidiana

E-mail 1 Digital

Quadro de instruções 1 Cotidiana

Telegrama 1 Cotidiana

Logomarca 1 Publicitária

Enquete 1 Científica

Tabela 1 Científica

Manchete 1 Jornalística

Caderno de jornal 1 Jornalística

Total de gêneros: 76

Não identificado: 0

Sem produção escrita: 10

Total: 245

266

Esferas sociais contempladas x 2º ciclo

Esfera Recorrência

Escolar 60

Jornalística 49

Cotidiana 45

Literária 43

Publicitária 24

Da tradição oral 14

Científica 7

Dos negócios 1

Artística 1

Digital 1

Total: 10 Total: 245