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Criação do Sistema Nacional de Avaliaçao Institucional do Ensino Superior em Cabo Verde
Resumo O artigo enquadra‐se na criação do Sistema Nacional da Avaliação Institucional do Ensino Superior em Cabo Verde (em processo) e, em particular, verificar em que medida a criação dessa agência reguladora induzirá a promoção de um Ensino Superior de qualidade nas Instituições do Ensino Superior endógenas, em consonância com os princípios orientadores dos principais organismos supranacionais, isto é, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e Banco Mundial. Para a construção desse artigo baseou‐se fundamentalmente na pesquisa documental, entre os quais se destacam o Projeto de Cooperação entre Brasil e Cabo Verde (BRA 04/044), intitulado, Qualidade da Educação Superior: Criação do Sistema de Avaliação em Cabo Verde, bem como, bibliografias especializadas da área de avaliação. Partimos do pressuposto de que a criação da supracitada agência é condição necessária para a prestação de um ensino de qualidade, indutora de significativas melhorias nas IES, ainda que insuficiente, na medida em que, tal modalidade de avaliação tem limites e potencialidades. Palavras‐chave: Palavra‐chave: Sistema Nacional de Avaliação Institucional do Ensino Superior, Qualidade, Cabo Verd
António Pedro Barbosa Cardoso Ponticia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul tonycardoso1978@hotmail.com
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A centralidade da Avaliação Institucional na definição das políticas públicas em Educação
Por que a avaliação institucional ganhou tanto protagonismo na definição das
políticas públicas, como instrumento de regulação das IES? Por que está no centro das
discussões na atualidade, sobretudo por que é que “um conceito que é patrimônio da
escola”, segundo Dias Sobrinho (2002, p. 14) ultrapassa os muros da sua existência e
instala‐se decisivamente no centro do poder dos Estados de todo o mundo e espalha os
seus efeitos a toda a sociedade, isto é, na política, na economia, e torna‐se um
instrumento reformador das IES, mas também do próprio poder central das nações?
Ao longo das últimas décadas são muitos os autores que têm discorrido sobre a
avaliação, mas sobretudo, acerca de uma das suas modalidades, isto é, a avaliação
institucional, se partirmos do pressuposto que tal avaliação pode subdividir‐se em outros
domínios, concretamente, a avaliação pedagógica de aprendizagens, avaliação do
desempenho docente, avaliação das políticas e programas, avaliação institucional e
avaliação de qualidade. Todos estes domínios estão na ordem das discussões, mas nas
bibliografias acerca da avaliação educacional destacam‐se sobretudo, a avaliação
institucional das IES e igualmente a avaliação da qualidade dessas instituições.
É fundamental fazermos o devido enquadramento conceitual, para delimitarmos o
nosso objeto de estudo respeitando toda sua polissemia, densidade, abrangência e
complexidade. Porque o objeto de estudo central da nossa investigação é a avaliação
institucional, e é sobre essa modalidade que vamos, a partir de agora, enquadrar,
conceitualizar, projetar e analisar a sua centralidade na agenda dos grandes debates
sobre questões educacionais, convocando para o efeito, diferentes perspectivas teóricas
suportadas pelos respectivos autores, com vista a problematizá‐la e desmistificar os
sentidos explícitos e ocultos que lhe estão subjacentes.
De outra forma, esse enquadramento conceitual da avaliação institucional, só será
plausível se integrado ou ancorado no pressuposto de que as IES constituem
organizações complexas, onde há uma série de relações, desde a negociação, o conflito,
os interesses, os diferentes objetivos e até níveis diferenciados de poder, resultantes da
posição hierárquica de cada um dos seus elementos em interação. Ainda, como afirma
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Lima (2002, p. 17), “a avaliação educacional de alunos, escolas, ou departamentos, entre
outros elementos, realiza‐se necessariamente por referência implícita ou explicita a
concepções, imagens ou representações de organização escolar”. Daí que Sá (2009, p. 91)
afirme:
Os vários modelos de avaliação transportam consigo formas distintas de entender o significado das estruturas organizacionais, de pensar os objetivos, de problematizar as tecnologias, de equacionar as relações de poder, de reconhecer a interação ambiental e de interpretar o sentido de liderança.
Complementando Moreira (2005, p. 20) refere que “a avaliação não se constitui
como um ato neutro, ou seja, a avaliação coloca‐se como uma questão eminentemente
política, como uma amálgama de valores políticos, técnico‐científicos, atitudinais, éticos e
pedagógicos”. Por isso, Sobrinho (1995, p. 68) afirma: “a avaliação toma partidos,
reafirma os valores considerados positivos, denega o que julga negativo, interfere nas
relações sociais de trabalho e intervém em todas as dimensões da vida académica e
institucional”.
Nesta ótica Sá (2009, p. 92), chama a atenção para que as “diferentes concepções
e imagens organizacionais subsumidas nos modelos de avaliação sejam explicitadas”,
pois como refere ainda o mesmo autor “esta démarche poderá constituir a via que
permitirá desvelar e denunciar as potenciais incongruências entre os valores
efetivamente promovidos por determinados dispositivos de avaliação e aqueles que são
invocados no âmbito da retórica discursiva que os sustentam” (ibidem). Lima (2002),
corrobora com esta ideia, de que a avaliação de escolas têm referência a imagens e
representações de escola, ao afirmar que “uma análise das políticas e práticas de
avaliação educacional em contexto escolar beneficiará muito de um exercício de
hermenêutica organizacional, através do qual se processará ao inventário crítico e
respectiva interpretação de concepções organizacionais de escolas, implícitas ou
explícitas” (p. 17).
Para que esta avaliação seja feita com rigor, como refere Santos Guerra, implica o
seguinte:
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Avaliar as escolas com rigor implica conhecer a especial natureza e configuração que elas têm, enquanto instituições enraizadas numa determinada sociedade: a sua heteronímia, as suas componentes nomotéticas, os seus fins ambíguos, a sua débil articulação, a sua problemática tecnologia… Por outro lado é imprescindível ter em conta o caráter único irrepetível, dinâmico, cheio de valores e imprescindível de cada escola. (Santos Guerra 2002, p.1)
É em torno do futuro das IES, no que se refere à sua natureza, os seus fins, a sua
missão, o ensino, a pesquisa e a extensão no consequente desenvolvimento da
sociedade, que a avaliação institucional ganha maior relevo e instaura‐se com toda sua
força nas discussões atuais, conforme salienta Dias Sobrinho (2000, p. 89), quando refere
que “a avaliação institucional tem grande força instrumental e uma considerável
densidade política, ainda que seja uma questão técnica, muito mais importantes são a sua
ação e o seu significado políticos”.
A justificação da dimensão política dessa modalidade da avaliação é ainda mais
perceptível na ótica desse autor ao considerar que a mesma
é um campo de disputas que ultrapassam questões mais aparentes e formais da organização e do gerenciamento das instituições educativas. É um campo de lutas em que estão em jogo questões de fundo, pois se reconhece, ainda que nem sempre se declare, a força da avaliação institucional como ação de grande impacto na transformação da universidade. (Ibidem, 2000, p. 89‐90)
A Avaliação
A avaliação é um conceito polissêmico que ao longo das últimas décadas tem tido
os mais variados significados. Nessa retrospectiva histórica, facilmente poderemos
percepcionar que ao longo dos tempos, vários autores, de acordo com os seus contextos
e os seus referenciais, conceitualizaram a avaliação em diferentes perspectivas: avaliação
como produto, como verificação de objectivos, medição de performances de alunos,
comparação, interpretação de informaçoes para a atribuição de classificações, elucidação
que o aluno deve fazer sobre a sua aprendizagem, fornecimento de informaçoes aos pais,
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autoridades e muitas outras tantas construções, todavia, são construções reducionistas,
imparciais e pouco dialógicas do conceito de avaliação.
O conceito de avaliação que assumimos é o de Stufflebeam(1980), pela sua
completitude, pela sua complexidade e pela sua visão holística, isto é, “a avaliação como
um processo do qual se obtém, delimitam e fornecem informações úteis com vista à
tomada de decisões”.
Porquanto, esse concebe a avaliação como um processo e não um produto,
porque está integrado no próprio currículo. Por isso, não se processa de qualquer forma.
Nem tudo pode ser avaliado num determinado contexto; há que fazer uma delimitação.
Tal postura, determinará quais as informações a obter e de quem as obter: de todos os
elementos da comunidade educativa: alunos, professores, pais e ou encarregados de
educação, ou será da sociedade civil? Tal informação precisa ser tratada e organizada e
identificar os instrumentos para avaliar os diferentes momentos, para se poder passar à
fase seguinte que é a prestação de contas.
Consideramos, igualmente que está fase de prestação de contas é recíproca, na
medida em que se fornece informações aos que a tinham produzido. Está implícito na
perspectiva de Stufflebeam que esta informação dos diferentes intervenientes pressupõe
questões fundamentais como: a justiça, a equidade e a eficácia. Justiça no concernente às
pedagogias utilizadas, aos referenciais a que sustentaram a avaliação e sobretudo nos
diferentes pontos de partida dos avaliados. Quanto à equidade, respeita o princípio,
todos diferentes mas todos iguais na diferença? Evidenciando esta complexidade da
avaliação na perspectiva de Stufflebeam em suma diríamos que a tomada de decisão que
deve ser a finalidade deste processo evidenciado, será sustentada, ancorada em
princípios justos, equitativos e eficazes, para que esta tomada de decisão possa orientar
para um conjunto enorme de tomadas de decisão que não necessariamente a
classificação e ou produção de rankings toutcourt.
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A Avaliação Institucional
Com relação ao conceito de avaliação institucional, também não há unamidade na
comunidade acadêmica. Carateriza‐se igualmente polissêmico, complexo, contraditório
muitas vezes e marcado por alguma porosidade. Entretanto, reúne algum consenso, uma
vez que terá de ser, necessariamente, holística e integradora. O primeiro requisito põe
em evidência as IES enquanto totalidade que é o objeto de avaliação; o segundo requisito
complementa o primeiro conferindo agora destaque à necessidade de articulação das
várias démarches avaliativas e à sua subordinação ao documento que é suposto conferir
foco e identidade à escola ‐ o seu Projeto Educativo. Por isso, assumimos e adotamos a
conceitualização da Avaliação Institucional segundo Dias Sobrinho (2000, p.103),
a avaliação institucional é uma construção colectiva de questionamentos, é uma resposta ao desejo de ruptura das inércias, é um pôr em movimento um conjunto articulado de estudos, análises, reflexões e juízos de valor que tenham alguma força de transformação qualitativa da instituição e do seu contexto, através da melhora dos seus processos e das relações psicossociais.
Está definição da avaliação institucional é holística e integradora, na medida em
que, procura superar as visões simplistas e desconectadas dos processos avaliativos,
refletindo na definição a complexidade das instituições educativas. Na nossa perspectiva,
a definição supracitada de Dias Sobrinho desloca‐se do foco da avaliação quantitativa ou
como dizem Boniol e Vial (2001, p.100) “avaliação como medida para a produção de
reflexões qualitativas, numa dimensão de natureza política do processo de avaliar”, pois,
subordina a agenda avaliativa às preocupações com a melhoria dos processos e o próprio
acompanhamento e regulação da avaliação num enfoque formativo. Este autor
desvincula ainda a avaliação institucional da distribuição de “punições e recompensas”,
pois segundo Santos Guerra (citado por Azevedo, 2007), uma avaliação institucional deve
ser assumida pelos atores educativos para se evitar as resistências, as teatralizações e as
imagens retorcidas que se revelam inúteis. Porque segundo o mesmo autor, quando os
professores jogam à defesa artificializam o comportamento, negam a evidencia, então a
avaliação será uma perda de tempo.
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Dias Sobrinho (2000, p. 103‐104) reforça essa perspectiva ao considerar que “ela é
movida pela vontade política e pela prática concreta dos agentes da instituição e porque
se realiza institucionalmente ou seja, na forma de democracia vivida na instituição”. Tal
como se refere o conceito anteriormente citado, é a instituição (IES), no seu todo e de
forma articulada, com as ênfases e prioridades coletivamente estabelecidas, que constitui
objeto de avaliação.
Se, por um lado, uma das caraterísticas essenciais da avaliação institucional seja a
sua visão global sobre a instituição em toda a sua complexidade, por outro, é
fundamental a análise de aspetos parciais, por que tal como advoga Dias Sobrinho
(ibidem, p. 104),
se ficarmos só com o enfoque global, embora ganhemos em amplitude e compreensão de conjunto, acabamos perdendo a riqueza de alguns aspetos importantes [...] porque a avaliação institucional deve contribuir para o desenvolvimento da pedagogia da integração da universidade
Isto é, esse caráter pedagógico da avaliação institucional, que privilegia o processo
das atuações que deverão produzir resultados em função desse processo, é formativo,
uma vez que, produz uma visão de conjunto da instituição e procura os melhores meios
para a articulação de funções, dos fins e das estruturas organizacionais, cientificas e
pedagógicas, (cf. Dias Sobrinho, 2000). Tal como adverte esse mesmo autor (ibidem, p.
106), “ela busca para conhecer não para execrar o passado, punir o presente e condenar
o futuro, mas para compreender as dificuldades e equívocos e potencializar as condições
de construir com melhor qualidade os agentes, a instituição e os contextos”.
A avaliação do Ensino Superior em Cabo Verde: surgimento e evolução
A experiência do Ensino Superior endógeno em Cabo Verde surgiu nos finais dos
anos de 1970, especificamente em 1979. Esta década é referência crucial para o nosso
país, pois, justificou a implementação deste subsistema de ensino, na medida em que,
tornáramos independes de Portugal, após 500 anos de colonização. Os dirigentes de
então apostaram na educação como um dos principais fatores de desenvolvimento,
porquanto, trata‐se de um país carente de quase todos os tradicionais recursos (minerais
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e outros). A situação foi tão dramática que este pequeno país insular do Atlântico teria
sido considerado inviável como senhor do seu destino.
O período pós‐colonialismo coincidiu com uma forte aposta numa luta contra o
analfabetismo; foi implementado uma política pública de massificação do ensino básico
de quatro anos, logo nos primeiros anos de independência em 1975. Tal massificação
intensificou a taxa de escolarização nos níveis subsequentes, tendo como consequência
imediata a premente necessidade de professores minimamente qualificados para a
materialização do ensino secundário.
Como corolário deste problema, o governo mobilizou‐se à criação de condições
para o funcionamento do Ensino Superior, especificamente, a formação de professores
do ensino secundário local, através do Decreto – Lei nº 70/79 de 28 de Julho,
regulamentado pela portaria 76/80, de 23 de Agosto. Seriam assim instituídos
primeiramente os cursos de matemática, física/química, desenho, ciências (biologia e
geologia, história, geografia e língua portuguesa. Pouco tempo depois, foram ministrados
os cursos de línguas estrangeiras (inglês e francês).
Este núcleo de cursos de formação de professores transformar‐se‐ia em curso de
formação de professores do ensino secundário, que por sua vez materializar‐se‐ia no
Instituto Superior de Educação (ISE), pelo decreto – Lei nº 8/95 de 27 de agosto, dotando
a instituição de autonomia cientifica, pedagógica, administrativa, educativa, econômica,
financeira e disciplinar num contexto político marcado pela instauração do
multipartidarismo, isto é, em pleno regime democrático.
Com a complexificação da organização social, política, administrativa, educativa,
econômica, entre outras, assiste‐se uma grande demanda da procura da formação em
todos os domínios do conhecimento, sobretudo, porque a Administração Pública e a
própria sociedade civil, assim o exigia. Tais respostas advieram da adaptação e ou
reorganização das instituições públicas em unidades vocacionadas a determinados
setores, por exemplo, a transformação do Instituto Nacional de Investigação Agraria em
INIDA (Instituto Nacional de Investigação e desenvolvimento Agrário), Centro de
Formação Náutica em ISECMAR (Instituto Superior de Engenharias e Ciências do Mar), do
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curso de Contabilidade e Secretariado em ISCEE (Instituto Superior de Ciências
Econômicas e Empresariais).
Nos finais da década de noventa e início dos anos dois mil, há uma enorme procura
do Ensino Superior, a oferta pública só dá cobertura a 20% das solicitações,
consequentemente os restantes 80%, procuram as opções externas, sobretudo através
das bolsas de estudos financiados pelo governo e oferecidos pelos países com os quais
Cabo Verde tem cooperação (cf. Cosmo, 2011). Todavia, nessa altura assiste‐se uma
drástica redução no financiamento às bolsas, quer pelo estado de Cabo Verde, quer pelos
parceiros externos. Para minimizar está problemática, a solução encontrada, foi por um
lado, atender às várias solicitações feitas pelos privados para a criação de universidades
privadas.
Por outro, como forma de reduzir os custos tanto ao Estado (principal
financiadora do ensino público), e também o custo das famílias, optou‐se pela criação da
universidade pública cabo‐verdiana através da resolução nº 53/2000, de 28 de Agosto,
implementando assim a Comissão Nacional para a criação da 1ª universidade pública do
nosso país (cf. Varela, 2011). A criação desse empreendimento público surgiu
formalmente através do Decreto – Lei nº 31/2004, de 26 de Julho que determinou a
criação da comissão instaladora, tendo como objetivo a instalação da universidade
pública de Cabo Verde em dois anos prorrogáveis, acontecimento que se materializaria
nos finais do ano 2006.
Para o objeto de estudo em análise, avaliação institucional, este marco histórico é
de uma importância extraordinária, uma vez que se realizara o que consensualmente se
pode denominar, como uma primeira experiência da realização da avaliação externa aos
institutos supramencionados com o objetivo de analisar que condições reúnem para a
estrutura da universidade pública que estava em construção.
Entretanto, a primeira universidade criada em Cabo Verde teria sido, Jean Piaget,
que é privada, está em funcionamento desde 2001. Nesse momento, em 2014, estão em
funcionamento nove IES, no país.
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As pressões internas (endógena) e as pressões externas (dos organismos supranacionais: OCDE e Banco Mundial)
As Instituições do Ensino Superior (IES) de Cabo Verde, tal como as demais
espalhadas pelo mundo, também estão sujeitas às pressões da promoção de um ensino
de qualidade, de um Ensino Superior (ES) que dê respostas às necessidades do mercado,
às políticas públicas traçadas pelos governos no que concerne ao desenvolvimento e às
demandas da sociedade civil. Os próprios dirigentes de cada uma das IES estão
conscientes de que a avaliação sistemática e periódica das suas atividades é uma
condição imperativa para a sua subsistência e sustentabilidade. Porquanto, para além da
pressão veiculada pelos agentes internos, há igualmente pressões dos organismos
supranacionais como o Banco Mundial, a OCDE, o Banco do desenvolvimento Africano,
que elegeram a avaliação institucional como um dos requisitos indispensáveis para a
demanda da solução dos problemas sociais, econômicos, políticos, culturais com
qualidade e excelência acadêmica. Em seguida, apresentaremos resumidamente alguns
dos fatores endógenos e exógenos que tiveram alguma preponderância nesse processo
para a institucionalização da avaliação do ES em Cabo Verde.
Um dos fatores de índole interna que consideramos relevante, no que diz respeito
à criação/implementação de um sistema de avaliação do ES, prende‐se com o
funcionamento de mais de uma década desse tipo de sistema de ensino, marcado por
uma forte procura devido à massificação/consolidação do Ensino Secundário e por outro,
porque já há um número considerável de formados (graduados) nessas instituições. Se há
uns anos não se colocava o problema da qualidade da formação desses graduados,
todavia, devido às inúmeras pressões, tanto das autoridades centrais, da sociedade civil,
de entre esses destacamos empresariado nacional, que muitas vezes tem questionado a
qualidade desses egressos.Portanto, havendo um numero considerável de IES em
exercício de funções, há que se regulamentar o seu funcionamento à luz dos diplomas
legais
Os próprios dirigentes de cada uma das IES cabo‐verdianas, estão conscientes da
necessidade para a efetiva implementação da avaliação institucional, porque reconhecem
na avaliação, um poderoso instrumento estratégico de melhoria do desempenho dos
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estabelecimentos de ensino, isto é, maior eficiência e eficácia nos mecanismos de gestão
ao serviço do desenvolvimento organizacional das suas instituições, (cf. Cardoso, 2011, p.
29). Posição reforçada por Santos Guerra (2002) e Azevedo (2007) uma vez que
entendem que a avaliação poderá servir como uma ferramenta de recuperação do credito
perdido, sobretudo das escolas públicas.
É igualmente importante criar o sistema de avaliação do ES em Cabo Verde porque
a sua criação permitirá às universidades cabo‐verdianas aderirem às plataformas que
regem o conjunto das demais IES do mundo, na medida em que passarão a ter uma
plataforma legal partilhada a partir do momento em que os diplomas (legislação) dos
organismos supranacionais, como por exemplo, a UNESCO e a OCDE são ratificadas pelo
Estado. Farão assim, com que os diplomados de Cabo Verde das IES local, passem a ser
reconhecidos no mundo, uma vez que irão figurar no Registro Europeu de Garantia de
Qualidade (EQAR), onde estão filiadas e registradas as agências de avaliação, bem como
as agências ou órgãos de garantia da qualidade que reconhecem os títulos e os cursos
realizados no exterior.
Segundo Morosini (2008), é uma lista de cursos e títulos que permite as agências
ou órgãos de garantia da qualidade reconhecer os títulos e cursos realizados no exterior.
Esta lista inclui não somente a área do processo de Bolonha, mas está aberto a todo o
mundo. A EQAR representa um aumento de controlo sobre o processo de alguma
convergência ao sistema de garantia de qualidade desde que as agências de garantia de
qualidade legitimem os padrões comuns integrantes do registro, (Morosini, 2008, p. 256 e
257).
Para além dos fatores de pressão endógena, o nosso diagnóstico ficaria
incompleto se não analisássemos os fatores externos. Indiscutivelmente, todos os países
do mundo hodiernamente estão expostos aos fenômenos da globalização, isto é,
exigências para um agir em conformidade com os ditames das organizações
supranacionais. A situação de um Estado insular, marcado pela frágil situação
socioeconômica, como é Cabo Verde, dependendo quase que exclusivamente do
financiamento dessas organizações externas ainda é maior. Tanto assim é que, mesmo
não tendo implementado um sistema nacional de avaliação do ES e de ainda não ter sido
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feita nenhuma avaliação institucional sistemática a todas as IES cabo‐verdianas em
simultâneo, as mesmas têm sido alvos de avaliações feitas por tais organizações
supranacionais e posicionadas nos rankings de avaliação de universidades. A título de
exemplo, assinalamos o último ranking das IES no mundo e na África1.
É fundamental salientar que a adesão de Cabo Verde à Organização Mundial do
Comercio (OMC) na nossa ótica, também faz parte desse pacote de pressão para a
criação do supracitado sistema, na medida em que, estamos perante uma visão
econômica da educação, porque são as instituições econômicas e financeiras que
determinam as regras para o funcionamento das instituições, principalmente nos países
em desenvolvimento. Isto é, na acepção de Amaral (2008, p. 255), “é a utilização do
mercado como instrumento de política pública”.
Considera‐se que a exigência à adesão aos parâmetros da avaliação da OCDE é
maior para o Estado cabo‐verdiano, por um lado como forma de justificar os empréstimos
bonificados dessas instituições, mas por outro, como forma de prestação de contas às
mesmas. Segundo Akkari (2011, p. 29),
a questão do financiamento diz respeito principalmente aos países em desenvolvimento. Todavia, estes não ocorrem sem consequências políticas, pois o fato de financiar o setor educacional permite ao mesmo tempo o exercício de uma pressão sobre estes países para que apliquem as orientações desejadas.
Tendo subjacente a problemática supracitada, o Estado cabo‐verdiano através do
seu governo em exercício de funções, delimita como prioridade no seu Programa de
Governo para a VIII Legislatura (2011 – 2016) o reconhecimento da necessidade de
aprimoramento da qualidade da educação (ensino) ministrada no país, dando um realce
prioritário ao ES. Em consonância com esses princípios evocados, o referido governo
elege a avaliação educacional (institucional) com a finalidade de promover o devido
desenvolvimento organizacional, colocando a criação de um sistema nacional de
avaliação do ES, como fator indispensável para a materialização da sua política de
1 ‐ De acordo com a avaliação do site norte‐americano www.webometrics.info/en, no Ranking of
Universities, a UniPiaget Cabo Verde ocupa a posição 72ª em África e a nível mundial a posição 6809ª, ano 2013
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competitividade como estratégia de melhoria das IES, como garantia de qualidade que
quer implementar e materializar.
Que modelo de Avaliação Institucional do Ensino Superior a adotar em Cabo Verde?
Razões que fundamentam a cooperação do INEP como consultora (parceira) na criação do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior
A construção desse artigo tem como propósito fundamental a analise e a reflexão
sobre a criação do Sistema Nacional de Avaliação Institucional do ES em Cabo Verde. Tal
demanda está em construção, isto é, o primeiro encontro formal que reuniu as
autoridades2 cabo‐verdianas e brasileiras aconteceu de 15 a 19 de Fevereiro de 2013.
Sendo um sistema em construção, apraz‐nos questionar que modelo se vai adotar? Pela
analise do projeto BRA/04/044, pode‐se inferir que o Sistema Nacional da Avaliação do
Ensino Superior a ser criado, poderá incorporar muitos aspectos da experiência brasileira
no que diz respeito à estrutura do referido sistema. A justificação para tal opção está
plasmada no referido projeto,
partindo do princípio que a educação se constitui como um instrumento econômico, social e cultural indissociável de seu contexto histórico‐político, o Governo brasileiro desenvolveu um sistema próprio de avaliação da educação superior, cuja experiência poderá contribuir para que o Governo de Cabo Verde reflita e oriente sua tomada de decisão sobre o desenvolvimento do ensino superior, modificando a formação de profissionais, de conceitos, de tecnologias, bem como a criação de Políticas do Estado (BRA04/044, p. 7)
Ainda o mesmo documento supracitado, diz que nessa fase é imprescindível a
mobilização de conhecimentos e experiências externas. Razão por que se fez a escolha 2 ‐ De 15 a 19 de Fevereiro reuniu‐se na Praia, cidade capital de cabo Verde, as autoridades cabo‐verdianas
(Ministro do Ensino Superior Ciência e Inovação, Diretor Geral do ES, Reitores e ou seus representantes de todas as IES do país, coordenadores dos cursos e técnicos do MESCI para a criação do Sistema Nacional de Avaliação Institucional do Ensino Superior em parceria com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), representado pela Diretora Geral do SINAES e outros consultores do projeto do Brasil, de entre os quais, a Diretora da Avaliação da PUCRS.
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do Brasil pelo Estado de Cabo Verde: “está‐se numa fase embrionária de estruturação de
mecanismos de avaliação da qualidade do ensino superior cabo‐verdiano. Impõe‐se, por
conseguinte, conhecimento e mobilização de experiências externas, neste caso,
brasileira, pelo valor que representa e pelos aportes que poderão trazer” (ibdem. P. 5).
Avaliação Interna (auto‐avaliação)
Já nos posicionamos quanto ao conceito de avaliação institucional que assumimos,
bem como as suas modalidades, avaliação interna (auto‐avaliação) e avaliação externa.
Para um melhor enquadramento, há que conceitualizar esses conceitos.
Segundo Alaiz et al (2003, p. 16), a avaliação interna (auto‐avaliação), é
Aquela em que o processo é conduzido e realizado exclusivamente (ou quase) por membros da comunidade educativa da escola. Pode ser definida como uma análise sistemática de uma escola, realizada pelos membros de uma comunidade escolar com vista a identificar os seus pontos fortes e fracos e a possibilitar a elaboração de planos de melhoria.
Este conceito em análise é definido pelo SINAES no documento Diretrizes para a
Avaliação IES (2004, p. 13), nos seguintes termos:
a auto‐avaliação constitui um processo por meio do qual um curso ou instituição analisa internamente o que é e o que deseja ser, o que de fato realiza, como se organiza, administra e age, buscando sistematizar informações para analisá‐las e interpretá‐las com vista à identificação de práticas exitosas, bem como a percepção de omissões e equívocos, a fim de evitá‐los no futuro.
Para a concretização desse tipo de avaliação, o SINAES (2004, p. 13), propõe dois
objetivos:
(I)“avaliar a instituição como uma totalidade integrada que permite a auto‐analise valorativa da coerência entre a missão e as políticas institucionais efetivamente realizadas, visando a melhoria da qualidade acadêmica e o desenvolvimento institucional”. (II) “privilegiar o conceito da auto‐avaliação e a sua prática educativa para gerar, nos membros da comunidade acadêmica, autoconsciência de suas qualidades, problemas
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e desafios para o presente e o futuro, estabelecendo mecanismos institucionalizados e participativos para a sua realização”.
Nós consideramos que se essa modalidade da avaliação for assumida, conforme os
dois conceitos supracitados, poder‐se‐á pensar na possibilidade de tornar‐se naquela
avaliação que faz com que as escolas se transformem em autênticas comunidades
aprendentes, uma vez que a iniciativa seja dos elementos da comunidade educativa, se
empenham mais, e desejarão de fato identificar os problemas e adotar estratégias para a
sua resolução. Daí tornar‐se mais pragmática, não somente por causa da interação com os
facilitadores externos, que normalmente são especialistas em avaliação e têm um
conhecimento aprofundado da matéria, mas também porque desta experiência resultam
atividades contextualizadas, com problemas concretos que afetam o cotidiano dos
elementos da comunidade educativa. Assim o processo de avaliação interna, poderá
transformar‐se numa atividade natural, em que os avaliados não se sentirão coagidos,
nem ameaçados, não tendo, portanto, a necessidade de artificializar e nem representar
para ficar bem na fotografia (Cardoso, 2011, p. 25).
Outro autor que discorre sobre a importância da avaliação interna (auto‐avaliação)
nas instituições educativas é Natércio Afonso (2000), apresentando pelo menos três
motivações para prosseguir na sua realização: permite às escolas melhorar o seu
desempenho, partindo da identificação de áreas problemáticas e da procura de soluções
para os problemas detectados, o que poderá permitir aos atores educativos resolver mais
facilmente os problemas com que se deparam; pode constituir‐se como um instrumento
de marketing escolar, a revelação dos resultados junto da comunidade escolar (pais e
encarregados de educação, autoridades locais e organismos de tutela) permite dar relevo
aos pontos fortes do desempenho organizacional, o que origina credibilidade e, portanto
mais apoios e mais recursos; e, por fim, permite gerir a pressão desencadeada pela
avaliação externa institucional, na medida em que, identificados os pontos fracos, é
possível delinear estratégias de desenvolvimento adequadas ou preparar uma
argumentação fundamentada em relação às fragilidades detectadas pelos serviços de
avaliação externa (Afonso, 2000, p. 214).
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Subscrevemos tanto o conceito do Alaiz et al (2003), SINAES (2004) relativamente
à avaliação interna, bem como as potencialidades avançadas por Afonso (2000). Para tal,
apresentamos igualmente outras vantagens decorrentes do nosso ponto de vista: ajuda a
escola a prestar um serviço educativo de qualidade, preparando os alunos para o
mercado cada vez mais competitivo; consolida a democracia, baseada na participação da
comunidade educativa, e partilha de responsabilidades; exige da parte dos dirigentes
escolares maiores responsabilidades e transparência na prestação de contas; permite a
rentabilização dos recursos, sempre limitados da sociedade e permite introduzir
mudanças e melhorias no eixo pedagógico, para aumentar o nível de sucesso dos alunos
(Cardoso, 2011).
Todavia, este processo não é tão linear como foi anteriormente apresentado, na
medida em que, essa modalidade de avaliação também apresenta as suas limitações,
decorrentes da própria natureza complexa das instituições educativas enquanto
organizações.
É nessa perspectiva que Costa e Ventura (2005) advertem o seguinte: “as
organizações, em geral não primam pela introspetividade e desenvolvem esforços para
evitarem ser avaliados”. E continua dizendo Pfeffer (1994, p. 297), citado por Costa e
Ventura (2005, p. 1), “sabemos também que as escolas, em particular, evitam olhar para
traz […] e muitas vezes até se eximem de olhar para frente”, daí que identificamos as
seguintes dificuldades para a auto‐avaliação de escolas: falta de tradição de auto‐
avaliação, que a torna geradora de incerteza, pois põe a “nu” a falta de exemplos a
seguir, encontrando‐se desta forma grandes barreiras na sua aceitabilidade; falta de
motivação dos participantes para realizarem uma tarefa não remunerada; implica custos
e leva tempo, que é outro fator que está cada vez menos disponível e às escolas foram
sempre atribuídas capacidades para avaliarem o normal (desempenho dos alunos; as
atividades pedagógicas dos professores), mas não o que se revela excepcional (sua
característica organizacional) daí certa resistência como evidenciamos anteriormente.
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Avaliação Externa
Por sua vez a avaliação externa é definida pelo SINAES (2004, p. 14)
é um importante instrumento cognitivo, crítico e organizador das ações
da instituição e do Ministério de Educação e Cultura 3. Ela exige a organização, a sistematização e o inter‐relacionamento do conjunto de informações qualitativas e quantitativas, além de juízos de valor sobre a qualidade das práticas e da produção teórica de toda a instituição.
Alaiz et al (2003, p.16), definem a avaliação externa como “aquela em que o
processo é realizado por agentes externos à escola (pertencentes às agências de
avaliação públicas ou privadas), ainda que com a colaboração indispensável de membros
da escola avaliada”.
Essas conceitualizações remetem‐nos para a modalidade de avaliação que se
caracteriza pelo fato de ser realizada por agentes externos às instituições educativas,
embora prevendo uma mínima participação de alguns membros da própria comunidade
educativa avaliada. É o caso, da avaliação, realizada pelo Sistema de Avaliação do Ensino
Superior (SINAES), em que a iniciativa pode partir do MEC. Segundo Santos Guerra
(2002), quando a avaliação externa tem um carácter de imposição, isto é, o seu resultado
não tenha partido de uma solicitação ou iniciativa voluntária da instituição educativa,
estamos perante uma avaliação com carácter de imposição que nos coloca perante um
modelo de avaliação que está associado à prestação de contas ou accountability, e que se
depreende dali, reduzidas possibilidades de transformação, na medida em que, os
protagonistas não são implicados no processo, cria resistências e as possíveis mudanças
partem de recomendações dos agentes externos.
O mesmo autor considera que esta tipologia de avaliação não pode ser encarada
como uma iniciativa proporcionadora de mudanças significativas, como um exercício de
participação ou como uma actividade de aprendizagem. Por outro lado, tal modalidade
de avaliação poderá ser considerada como uma ameaça e aí resulta o desejo de “ficar
bem na foto” perante os avaliadores, o que leva ao enviesamento e distorção da
realidade observada. Corroborada Sá (2009, p. 89), quando diz que “o processo de
3 ‐ MEC – Ministério da Educação e Cultura (Brasil)
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avaliação transforma‐se num jogo de gato e de rato, onde por cada tentativa de controle,
se podem mobilizar inúmeros dispositivos de oposição, subversão ou de fuga”. Santos
Guerra complementa esta idéia, dizendo que a avaliação imposta à escola é vista pelos
avaliados como uma atividade de controlo que pode desencadear por parte dos mesmos,
mecanismos de defesa que conduzem a uma imagem distorcida da realidade observada
(Santos Guerra, 2002).
Complementaridade de perspectivas: Avaliação interna (auto‐avaliação) e avaliação externa
Neste cenário, o grande desafio passa por apontar os possíveis caminhos
para que a avaliação interna (auto‐avaliação) e a avaliação externa se constituam como
instrumentos estratégicos úteis para as IES e possam ser utilizados por estas na
construção ou aperfeiçoamento de planos de melhoria e de desenvolvimento da mesma.
Nossa posição está ancorada nos princípios defendidos nos documentos legais de
regularização da avaliação institucional, a título exemplificativo, o SINAES (2004, p.14),
através das diretrizes para a avaliação das IES que explicita que “as ações de avaliação
interna e externa devem ser realizadas de forma combinada e complementar, havendo
em ambas plena liberdade de expressão e busca de rigor e de justiça”. O mesmo
documento salienta (ibidem) que
a integração da avaliação interna e externa faz parte de um importante processo de discussão e reflexão relativo aos grandes temas de política pedagógica, cientifica e tecnológica, bem como as tomadas de decisão buscando o fortalecimento ou redirecionamento de ações e de políticas.
Igualmente, outros autores defendem essa perspectiva de complementaridade
entre estas duas modalidades de avaliação institucional, nomeadamente, Dias Sobrinho
(2000, p.106) que sustenta, não obstante as funções específicas de cada uma dessas
modalidades, é “na articulação entre elas que reside a sua força maior”, pelo que estas
duas faces da avaliação têm toda a vantagem em serem combinadas entre si. Na verdade,
os processos de auto‐avaliação podem ser “completados e cruzados com olhares
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externos” (Sá, 2009, p.97), que meta‐avaliam e emitem feedbacks sobre os
procedimentos internos.
Algumas considerações finais
É inquestionavel as mais valias que a criação do Sistema Nacional de Avaliação do
Ensino Superior proporciona à qualidade do ensino no arquipélago, porquanto permitirá
as IES a posicionarem e definirem o seu plano estratégico de desenvolvimento em função
de um instrumento regulador e definidor da política do Estado para esse subsistema de
ensino.
Salientamos, também, a abertura das autoridades caboverdianas às experiências
de outros sistemas de avaliação consolidados do exterior. Em nossa perspectiva revela‐se
estratégico, não só por causa da globalização, adesão a Organização Mundial do
Comercio, às determinações legais da OCDE e do Banco Mundial ou ainda à plataforma do
EQAR, na medida em que se pode incorporar os pontos fortes e adotá‐los e evitar as
possíveis fraquezas. De entre os quais, salientavamos, por exemplo, a exortação de Dias
Sobrinho (2000), a transposição das políticas mercadológicos para as instituiçoes
educativas. Daí que o sistema em germinação poderá concialiar o melhor possível as
orientações empresariais para a gestão universitária, isto é, superar o conceito de
educação como um serviço, política pública ditada em função do Estado mínimo, do
Estado avaliador, do quasi‐mercado ou ainda da terceira via e encarar a visão humanista
da educação, incorporando assim, uma das missões essenciais das IES que é a formação
do sujeito na sua integralidade, explicitando a formação cidadã, o aprofundamento dos
valores democráticos, éticos; uma avaliação capaz de promover a solidariedade, o
cumprometimento, a cooperação e nunca competitividade e o sucesso individual.
Igualmente, a complementaridade entre as modalidades da avaliação institucional
(auto‐avaliação e avaliação externa) é condição indispensável para a materialização da
politica pública educacional, principio defendido pelo SINAES (2004, p. 5),
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os processos avaliativos internos e externos são concebidos como subsídeos fundamentais para a formulação de diretrizes para as politicas públicas de educação superior e, também, para a gestão das instituições, visando a melhoria da qualidade da formação, da produção do conhecimento e da extensão.
Essa interação permite a avaliação institucional cumprir com a sua missão
formativa, porque diagnostica as fragilidades e emite feedback para a sua superação.
Enfim, a avaliação institucional permite a sua própria meta‐avaliação.
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