Post on 28-Dec-2018
Sumário
1 Carta aos Delegados 3
Seção I 5
2 Contexto Político Pré-Independências 5
2.1 O Vice-Reino do Rio da Prata 5
2.2 O Brasil colônia e posterior Reino Unido de Portugal, Brasil e
Algarves 6
3 Contexto Político das Províncias Unidas do Rio da Prata 8
4 Contexto Político Brasileiro 11
5 Contexto Político da Província da Cisplatina 14
5.1 A disputa entre Portugal e Espanha e os muitos tratados 14
6 A Guerra 15
6.1 O pré-guerra 15
6.2 A influência de potências internacionais 17
6.3 O decorrer e a situação atual 18
6.4 A Convenção Preliminar de Paz 20
7 Introdução 23
1
8 A Organização do Gabinete 24
8.1 A Sala de Guerra 24
8.1.1 Arbitragem 24
8.1.2 Grupo de Controle 25
8.2 Gabinetes de Guerra 25
8.3 Os Gabinetes de Crise: atribuições e influência 26
8.4 Comunicação 28
8.4.1 Ordens 28
8.4.2 Cartas 29
9 Forças Terrestres 29
9.1 A divisão das forças 29
10 Forças Navais 31
10.1 Tipos de embarcações (ad hoc) 31
10.2 Organização das forças 33
10.3 Marinhas 34
10.3.1 Marinha Brasileira 34
10.3.2 Marinha Argentina 35
10.3.3 O Corso 35
10.3.4 Forças das Marinhas Brasileira e Argentina 36
11 Táticas e Formações de Engajamento 37
11.1 Forças Terrestres 37
2
12 A Arte da Guerra 39
12.1 Introdução 39
12.2 O pensamento de Clausewitz acerca da guerra 40
12.3 Os níveis da estratégia 41
12.3.1 Nível Tático 41
12.3.2 Nível Operacional 41
13 Teatro de Operações em Terra 42
13.1 A função do general 42
13.2 Movimentação de exércitos 43
13.3 O uso de ferramentas de reconhecimento 44
14 As Operações Navais 44
14.1 A função do almirante e vice-almirante 44
15 Bibliografia 45
15.1 Seção I 45
15.2 Seção II 46
3
1 Carta aos Delegados
Olá, senhores(as) delegados(as)!
Gostaríamos, primeiramente, de agradecer pela confiança em escolher esse
comitê para essa edição mais que especial do XV MIRIN! Estamos todos
muitíssimos animados para esses cinco dias e esperamos que os senhores também
o estejam. Disponibilizamo-nos inteiramente para desde antes do evento ajudar no
preparo acadêmico e claro, durante, para atender qualquer necessidade dentro de
nosso alcance.
Dito isso, é importante deixar claro que comitês em um estilo gabinete por
vezes não são dos mais simples, por não ser um exemplo de comitê comum, o que
pode gerar estranheza no mais experiente dos delegados. Por este motivo, é
essencial que os senhores se engajem na temática de modo que a experiência possa
ser das mais prazerosas possíveis.
O presente Guia se dividirá em duas seções: a primeira consistirá numa
explicação temática da Guerra da Cisplatina, a segunda, por sua vez, numa parte
mais técnica, que explicará a dinâmica de um gabinete em simulações e que dará o
arcabouço técnico para que todos possam desfrutar o máximo desta experiência.
Estas duas seções juntas formam este Guia de Estudos, cuja leitura é imprescindível.
Alertamos, nada obstante, que a leitura é apenas o primeiro passo; instigamos a todo
que busquem – seja por meio da bibliografia ou por outros recursos – por mais
informação e conhecimento a respeito do tema. O preparo é, sem dúvida, uma das
partes mais importantes.
Por fim, o MIRIN é uma experiência tanto acadêmica e pedagógica quanto
social. Divirtam-se durante esta semana e tentem aproveitar o máximo do evento,
que é preparado com tanto cuidado para os senhores por muitas pessoas e durante
um longo ano. Aproveitem.
Aguardando ansiosamente pelo início de nossas atividades,
Alexander Pires Jr.
Felipe Barata
Karollina Kaiser
5
Seção I
2 Contexto Político Pré-Independências
2.1 O Vice-Reino do Rio da Prata
Assim como Buenos Aires viria a ser a capital das Províncias Unidas do Rio
da Prata, a se formar após a independência da metrópole espanhola, em 1816,
também era o centro das antigas posses coloniais espanholas. A província atraía a
maioria da produção dos arredores, inclusive para seu próprio abastecimento, que
logo se viu devido ao desenvolvimento comercial da região. Todos os produtos do
Paraguai e do que viria a ser o Uruguai eram para lá destinados para que, então,
fossem mandados à exportação. Com esse caráter intercambista, Buenos Aires
firmara-se como uma forte fonte de riqueza.
O primeiro abalo na região, que contribuiu para o enfraquecimento dos
espanhóis e para a ascensão de ares revoltosos na colônia, veio em 1806, com a
primeira invasão da capital pelos britânicos. Pelo Tratado de Badajoz, firmado em
1801 entre Portugal, França e Espanha, aqueles deveriam se manter neutros frente
ao conflito entre Napoleão e a Grã-Bretanha que estava se seguindo, o que por si só
acarretava problemas bilaterais entre eles e os britânicos. Somado a isso, a cobiça
sempre presente dos ingleses em relação às riquezas do Vice-Reino espanhol falara
sempre alto, e o progresso de Buenos Aires, juntamente com o conhecimento inglês
de que a região era precariamente defendida, culminou numa expedição inglesa para
a conquista da capital em 1806.
A invasão, contudo, não foi vitoriosa, mas em contrapartida abalou todo o
Prata e veio a preparar o cenário ao surto de acontecimentos que levariam à
separação, juntamente com a situação espanhola frente à Europa. A organização do
regime colonial já vinha caminhando às ruínas há muito: apesar dos diferentes
povos terem se misturado, não formavam um povo homogêneo, mas eram análogos.
A administração, com profundas discordâncias com o exército e com o clero,
também era subjugada a um despotismo advindo da mãe-pátria, amparado pela
força militar. A disposição destas mesmas forças de defesa na região, no entanto,
era precária e não se manteria diante de um levante.
6
Outrossim, o desagrado frente às leis coloniais restritivas que a metrópole
vinha impondo teve um papel de grande destaque. Leis que asseguravam a não
concorrência da colônia com a metrópole, que exacerbavam as divisões; tornavam
os funcionários do administrativo, diga-se de passagem, corrupto, mais ricos e as
classes pobres mais miseráveis.
Com os alicerces do Vice-Reino já fracos, o enfraquecimento da Espanha
durante a Guerra Peninsular e a sucessão do trono espanhol, em 1808, resultante do
domínio napoleônico, foram golpes certeiros. A sucessão foi o estopim para a
insurreição que teve início em Buenos Aires, e que se espalhou pelas outras
províncias do Vice-Reino do Prata. Em Buenos Aires, reúne-se, então, um
congresso com deputados das províncias, a salvo do Paraguai, que já se encontrava
sob uma ditadura. O congresso declarou as Províncias Unidas do Rio da Prata
independentes da Espanha, além de afirmar a concessão de direitos iguais a todos
seus cidadãos, sem distinção de descendência ou cor. Afirmou também medidas
como o fim dos tributos que eram aplicados aos índios e aboliu a escravidão dos
negros.
2.2 O Brasil colônia e posterior Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves
A invasão francesa de Portugal obrigou a Corte Portuguesa a fugir para o
Brasil, sua principal colônia. Sob a proteção de navios de guerra ingleses, a esta
saiu de Lisboa em novembro de 1807 e chegou ao Brasil em 1808. Localizada na
colônia, precisava a toda forma manter seus lucros e, por este motivo, declarou o
fim do monopólio colonial. Apesar de tal medida ter sido resultado unicamente da
mudança da Corte, ela acabou também por beneficiar os ingleses que poderiam, a
partir de então, estabelecer uma rede de comércio diretamente com o Brasil. A Carta
Régia1 foi estabelecida em uma das primeiras iniciativas de Dom João, após sua
mudança para o Rio de Janeiro e com a assinatura do documento, em janeiro de
1808, os portos brasileiros abriram-se para importação de produtos estrangeiros e
para a exportação para países amigos de Portugal.2
1 Documento histórico assinado por monarcas e instrumento legal da Coroa Portuguesa. 2 Laurenzano, 2008.
7
A vinda da família real permitiu que o Príncipe Regente mantivesse o
controle do Brasil, até mesmo quando o território que há pouco era uma colônia foi
elevado a Reino Unido de Portugal e Algarves, em 1815, com sede no Rio de
Janeiro. Dentre as muitas consequências disso, o retardamento da independência do
país foi uma delas. Outra foi o início de uma nova política em relação ao Rio da
Prata, esta sintetizada por uma maior busca de D. João a aproximar discussões, com
o intuito de obter maior espaço em questões de comércio, navegação e política.
Assim sendo, a fuga de Portugal acabou por se transformar aos poucos em um
projeto de expansão do império português.3
D. João anexou a Banda Oriental4 como mais uma província da Cisplatina
ao Reino Unido de Portugal, Algarves e Brasil em 1821. No ano seguinte, com a
declaração de independência do Brasil, tornou-se província do Império do Brasil.
As tropas portuguesas, todavia, continuaram na cidade até que, em 1824, cercadas
por forças de Pedro I, retiraram-se para Lisboa. Em 1823, Buenos Aires pediu para
que as tropas brasileiras se retirassem da Banda Oriental, mas Pedro I recusou o
pedido.5
Segundo a professora da Faculdade de Direito da Universidade Nova de
Lisboa, este foi um momento em que
[...] a representação política do ultramar se afirmou, pela primeira vez, como o instrumento de recriação, em termos igualitários, desse conjunto, territorialmente disperso (pela América, pela África e pela Ásia) mas, politicamente unido, que era o Império português (SILVA, 2009, p.71)6.
Isso porque um discurso igualitário foi criado com a finalidade de distanciar
as outras formas de relacionamento entre a metrópole portuguesa com os territórios
ultramarinos, de modo que estes tivessem maior autonomia política. Sendo assim,
o modelo passou a ser chamado de organização político-territorial unitário e
centralizado e se tornou o principal argumento frente à maior participação de
3 Ibid. 4 Região que pertencia ao império colonial espanhol, a leste do Rio Uruguai. Abarca a área que tem forma aproximada ao atual Uruguai. 5 Doratioto, 2014. 6 Silva, 2009.
8
colonos e elites “crioulas” e/ou nativas de África e da Ásia, depois da independência
da colônia americana.7
3 Contexto Político das Províncias Unidas do Rio da Prata
A presença portuguesa no Rio da Prata foi resultado da criação da Colônia do
Sacramento em 1680. Era descrita como uma base para o acesso português no
interior da América do Sul, pela navegação dos rios Paraná e Uruguai, em uma
península de fácil defesa militar e com um porto natural. Além disso, continha a
utilidade de desviar o contrabando de mercadorias da Bolívia, como prata. Depois
de inúmeras disputas diplomáticas e militares entre Espanha e Portugal, a colônia
passou a ser espanhola com o Tratado de Badajoz de 1801.8
O Brasil e as Províncias Unidas do Rio da Prata se encaminharam para a
guerra de 1825 com distintas tradições diplomáticas. A independência nas
Províncias Unidas do Rio da Prata, capitaneada por Buenos Aires, foi um tanto
quanto conturbada, revelando a disparidade de ideias entre seus agentes. Embora
houvesse o desejo de se libertar do domínio espanhol, o sentimento predominante
se opunha às pretensões de Buenos Aires, que tentava regular o comércio local e
adotava posturas semelhantes a de uma metrópole.9
José Artigas, um importante político e militar uruguaio, defendia uma forma
republicana de governo e, em 1816, as Províncias Unidas do Rio da Prata
declararam sua independência e adotaram o sistema político. Buenos Aires, por sua
vez, buscava a integração da parte oriental aos territórios das Províncias Unidas,
além de tentar afirmar uma posição de liderança na região platina. Diante disso,
uma invasão militar de tropas luso-brasileiras foi feita de maneira a tentar impedir
uma possível reunificação dos antigos territórios do vice-reinado do Prata, sob a
liderança de Buenos Aires, bem como o fechamento do estuário à navegação, ao
contrabando e ao comércio do reino luso-brasileiro.10
7 Ibid. 8 Doratioto, op. cit. 9 Ibid. 10 Laurenzano, op. cit.
9
Nesse contexto, Artigas liderava um movimento pela constituição de uma
república federal que respeitasse a autonomia e a igualdade de todas as Províncias
do Rio da Prata, e que era bastante popular principalmente entre as camadas mais
baixas da população. Por ser conduzido pelos próprios homens do campo, chegou
a ser definido como uma insurreição rural. Inicialmente, o movimento foi apoiado
por Buenos Aires, que via nele uma maneira de enfraquecer o governo de
Montevidéu e forçasse o mesmo a aderir ao movimento revolucionário. O
artiguismo cresceu, especialmente após a saída das tropas luso-brasileiras da Banda
Oriental, e Artigas conquistou as províncias litorâneas do Prata em sua maioria, não
se restringindo ao território oriental. O apoio político adquirido por Artigas permitiu
que o político rompesse as relações com a cidade de Buenos. Já no mês seguinte,
no entanto, estabeleceu-se um acordo de paz com Buenos Aires, que representava
o reconhecimento portenho da autoridade de Artigas.
Artigas enviou, em nome da Província Oriental, deputados à cidade portenha,
a fim de que esses tomassem parte na Assembleia Constituinte que ocorreria em
1813, em Buenos Aires. Os deputados, todavia, não foram aceitos para participar
da assembleia, o que causou mais uma vez ressentimentos na relação entre
portenhos e Artigas. No início do ano seguinte, o político voltou a romper relações
com Buenos Aires, abandonando novamente o cerco de Montevidéu. Em 20 de
janeiro de 1814, o líder uruguaio retirou suas tropas e, em contrapartida, o
governador portenho, Posadas, declarou, em 11 de fevereiro de 1814, José Gervásio
Artigas como “traidor da Pátria”. 11
Como resposta a Posadas, e também como demonstração do alcance de seu
poder e influência, o líder oriental sublevou as Províncias de Santa Fé, Corrientes,
Entre Rios e Córdoba. Internamente, as futuras Províncias Unidas do Rio da Prata
defendiam o federalismo, e Buenos Aires buscava centralizar as atividades no Prata
em torno de si, política que ficou conhecida como unitarismo. O que José Artigas
fez foi fomentar as rivalidades entre os “federalistas” e “unitaristas”, na tentativa
de enfraquecer o governo portenho e suas forças. Em 1813, o governo portenho
percebeu que não conseguiria vencer a resistência espanhola enquanto não
obtivesse o controle das águas platinas. O domínio das águas do Rio da Prata foi 11 Ibid.
10
visto como fundamental para que Buenos Aires pudesse derrotar a resistência
espanhola e tomar a cidade de Montevidéu, que capitulou em 20 de junho de 1814.12
Artigas propunha um Sistema de los Pueblos Libres, que apesar de não chegar
a ser uma confederação, previa a adoção de medidas comerciais que tendiam à
igualdade. Esse sistema estabelecia que as províncias deveriam se conectar por
alianças ofensivo-defensivas, cada uma preservando seu poder e sua jurisdição. Isso
contrariava o que propunha Buenos Aires, que buscava que essas províncias
delegassem seus poderes e jurisdição à liderança portenha, não tendo direito a sua
própria Constituição, governo ou exércitos próprios, e não legislando sobre seus
aspectos econômicos ou comerciais. A proposta artiguista quebrava os planos
monopolistas da cidade portenha. José Gervásio Artigas ficou conhecido como o
protetor dessa liga federal ou Sistema de los Pueblos Libres. 13
Do ponto de vista comercial, esses laços significavam o livre tráfego de
mercadorias entre as províncias da liga, com a abertura dos portos e um único
imposto de entrada e saída. Além disso, habilitava todos os portos para o comércio
internacional, diferentemente do que postulava Buenos Aires, que tentava
centralizar estas atividades em seu porto. As províncias que não fizessem parte da
liga seriam consideradas estrangeiras, devendo pagar uma taxa geral de direitos
maior, principalmente se o produto fosse produzido por algum membro do sistema
de povos. Outros pontos previstos eram: as restrições às atividades de comerciantes
estrangeiros e a proibição de comercializar com povos com que os artiguistas
estivessem em guerra (Buenos Aires e luso-brasileiros) – porém a necessidade de
reposição de armamentos fez com que esta última definição fosse anulada. 14
As disputas em torno da região do Prata aceleram o processo de redefinições
territoriais; alguns limites foram estabelecidos por meio de marcos “naturais”,
outros foram referidos por serem próximos à “linha divisória com os Domínios
portugueses”15. O fato é que Brasil e Buenos Aires, quando se lançaram ao conflito,
já se encontravam em uma situação política e econômica desgastante pela própria
12 Ibid. 13 Ibid. 14 Ibid. 15 Ibid.
11
trajetória vivida pelos Estados em busca da consolidação de sua autonomia política.
Ambos obtiveram, ao longo da disputa, alguns êxitos táticos, embora não seja
possível afirmar que tenham alcançado grandes vantagens estratégicas. Seja por
mar ou por terra, o desempenho de brasileiros e de orientais foi muito parecido ao
longo do conflito, pois oscilaram em relação aos resultados durantes as batalhas.16
4 Contexto Político Brasileiro Com a vinda da família Real Portuguesa para o Brasil, deu-se início ao
Período Joanino (1808-1821), essencial para o processo de autonomia brasileira.
Nesse momento, a instalação de unidades fabris e o desenvolvimento da indústria
foram permitidos na colônia e, com isso, um desenvolvimento maior da região –
majoritariamente agrária – se estabeleceu. Além disso, a criação do Banco do Brasil
e da Imprensa Régia foram de grande importância para que o governo brasileiro se
tornasse cada vez mais autônomo e caminhasse, dessa forma, ao seu processo de
independência. Ao fim desse período e conquistada a independência em 7 de
setembro de 1822, os seis anos seguintes seriam de maior crescimento das relações
internacionais brasileiras, já que foi nesse momento que começava a se formar o
corpo diplomático do país, necessário para a manutenção de sua autonomia e
soberania.17
Ainda nesta questão, faz-se importante notar que soberania é um conceito
muito importante ao se abordar o contexto político do Brasil e da Bacia da Prata no
pré-guerra. A soberania se embasa em uma autoridade concedida ao governante por
meio de um “contrato” com os cidadãos, que respalda, ao mesmo tempo em que
freia, a ação do primeiro. Nos anos iniciais do Primeiro Reinado, tal soberania se
mostrava inteiramente na figura do Imperador, que personificava o conceito. Nesse
momento, no Brasil, havia uma contradição entre duas formas pelas quais o
conceito se exprimia, visto que a figura do governante não mudara, apenas trocara
de título. A primeira, orientada de forma semelhante ao entendimento do Antigo
Regime, tinha o monarca como principal engrenagem do sistema político - ou seja,
como autoridade máxima. A segunda, por sua vez, tinha o Imperador como uma
16 Ibid. 17 Pinto Pereira, 2007
12
figura mais acessível, e não como o personagem quase mitológico e detentor de
toda autoridade.18
Todas essas noções de soberania e legitimidade foram muito importantes para
alicerçar o novo Império Brasileiro e são importantes para entender o desenrolar da
guerra. Assim que a autonomia política do Brasil foi garantida em 1825, Dom Pedro
se lançou à Guerra da Cisplatina, pode-se inferir que sob um viés oculto de cumprir
seu dever de manter o Estado forte e coeso. Essa guerra e diversas outras similares
colocam em evidência uma tendência dos governos a criarem uma imagem de um
inimigo externo para que uma coesão interna seja formulada: um inimigo que tem
de ser derrotado por uma pátria que tem de se manter unida. A guerra se mostra de
excepcional importância nesse sentido, visto que coesão, a essa época, era algo do
qual o Brasil carecia naquele momento pós-independência.19
Assim como o Brasil, as Províncias Unidas do Rio da Prata passaram por um
desgaste do colonialismo frente às ideias de libertação nacional. Apesar da
similaridade de contexto entre Brasil e as províncias, a rivalidade também era
alimentada. Nesse mesmo momento, Dom Pedro declarava a autonomia da região
da Bacia do Prata e mostrava não ter intenções de recuar. Um dos momentos mais
importantes no conflito foi a declaração de autonomia da região da Bacia do Prata
por Dom Pedro, que não demonstrava nenhuma intenção de recuar da região.
Iniciou-se, por esse motivo, uma guerra entre Brasil e Buenos Aires; guerra essa
que não foi bem aceita pela população brasileira. Como a essa altura não havia uma
ideia de nação bem definida em nenhum dos dois territórios, têm-se a ideia, hoje,
de que uma das maiores motivações para esse conflito ter se iniciado foi justamente
a vontade da província de criar uma imagem do conflito dentro de um contexto de
libertação, fazendo frente um novo conquistador que era visto como a “Nova
Metrópole” exploradora das liberdades do povo e, assim, moldar a ideia de uma
identidade nacional. 20
Em 1826, D. João VI faleceu e deixou como herdeiro D. Pedro I, que era ao
mesmo tempo também herdeiro do trono português, mas que abdicou do último em
18 Ibid. 19 Ibid. 20 Ibid.
13
favor de sua filha Maria II, permanecendo em solo e em posto brasileiro. No dia 20
de fevereiro do mesmo ano, ocorre, entre tropas brasileiras e tropas das Províncias
da Prata, a batalha do Passo do Rosário ou Ituzaingó. Ambas lidavam com diversos
problemas, como falta de recursos financeiros e corpos militares, além dos
problemas trazidos com o recrutamento forçado, que resultava na falta de um
sentimento de batalha.21
O general Carlos María de Alvear comandava as tropas das Províncias Unidas
do Rio da Prata, que concentravam seu exército na cidade de Durazno, constituída
de orientais e argentinos e onde se iniciara uma revolta. Já o Império do Brasil, de
início, deu pouca atenção a esse conflito, dado que se encontrava face a outras
questões internas que se registravam em províncias consideradas mais importantes
ou estratégicas, como a do Maranhão, a do Pará, a de Pernambuco, a da Bahia e na
própria capital, a cidade do Rio de Janeiro. A revolta, contudo, rapidamente teve o
apoio da população uruguaia, tendo apenas as pequenas guarnições de Montevidéu
e da cidade de Colônia para enfrentá-la. Assim, D. Pedro I teve que recrutar o mais
rápido possível uma força de combate e enviá-la para o sul. Enquanto o Brasil teve
que improvisar seu exército, comandado pelo Marquês de Barbacena, Alvear
possuía um exército organizado e veterano das batalhas pela independência na bacia
do Prata.22
O confronto ocorreu sob condições muito difíceis, tanto que diversos
combatentes a deixaram antes de seu fim, motivados pela falta de medicamentos,
ausência de alimentação, alta rigidez militar e falta de fardamento, por exemplo.
Além disso, as deserções dos inimigos também muito incentivadas com o
oferecimento de recompensas. Em 1825, o lema brasileiro passou a ditar que
quando a Pátria estivesse em perigo, não deveria haver dispensas militares. Esse
ditado, entretanto, era incompatível com a lei de 1822, que procurava não prejudicar
a produção agropecuária, poupando, dessa forma, categorias selecionadas de
indivíduos do recrutamento militar. Mesmo com todo esse movimento, o apoio à
Causa da Cisplatina foi pouco e, por este motivo, o Imperador começou a fazer
21 Ibid. 22 Ibid.
14
apelos, em que deixava clara a extrema importância de honrar a Nação e ele
mesmo.23
5 Contexto Político da Província da Cisplatina
5.1 A disputa entre Portugal e Espanha e os muitos tratados
No início da colonização, enquanto o Brasil era o foco da política portuguesa
na América, o mesmo não acontecia na América hispânica. Lá era priorizada a
chamada vertente do Pacífico, que acaba por fazer com que fosse relegada à região
platina a uma posição secundária nos interesses imperiais da Espanha. A diplomacia
lusitana, com isso, além de saber como anular vantagens espanholas obtidas pelas
armas, depois da revelação científica dos avanços portugueses além-Tordesilhas,
conseguiu o seu maior triunfo: apagar de vez o meridiano no Tratado de Madri.24
Com a longa permanência da Corte portuguesa no Rio de Janeiro, depois da
partida de Dom João, a diplomacia brasileira herdou uma visão geopolítica que lhe
permitiu estabelecer e perseguir objetivos consistentes, muitas vezes não
percebidos pelos seus oponentes. Na região do Prata, seu grande objetivo da era
assegurar os limites do Tratado de Madri. Esse tratado foi assinado em 13 de janeiro
de 1750, entre os reis João V de Portugal e Fernando VI da Espanha. Nele, as
vontades políticas manifestadas tinham o sentido de delimitar de fato o território,
baseado em sua ocupação, consumada muitas vezes pelas armas. Dessa forma,
seriam encaminhados comissários de ambos os reinos para cada parte da América
do Sul e, assim, demarcar-se-ia os limites territoriais.25
O artigo XIV do tratado sintetiza a divisão de territórios entre as coroas. Dos
artigos IV a X47 é feito um detalhamento dos marcos e limites de cada reino em
cada parte da América do Sul. Com isto, Portugal consolidou seu domínio sobre a
23 Ibid. 24 Muniz Costa, 2012. 25 Laurenzano, op. cit.
15
região amazônica e sobre Santa Catarina e Rio Grande, territórios que pelo Tratado
de Tordesilhas seriam espanhóis, mas que foram ocupados por portugueses.26
A Região da Cisplatina, por sua vez, possuía seus próprios motivos para se
engajar nesse conflito, visto que já havia sido disputada durante muito tempo entre
Espanha e Portugal, o que acarretou na dominação espanhola sobre o território
durante algum tempo. Em 1816, no entanto, a região foi tomada pela coroa
portuguesa e posteriormente anexada ao território de Portugal. Esta anexação,
porém, não foi reconhecida pela população, já que essa não desejava mais um
domínio encabeçado pela metrópole, além de não reconhecer a Independência do
Brasil, que declarou autonomia sob essa região logo após sua libertação das amaras
coloniais. O general Juan Antonio Lavalleja, com o apoio do governo argentino,
deu início, então, ao processo de independência da região da Cisplatina, desta forma
negando a autonomia do Brasil sobre o território.27
6 A Guerra
6.1 O pré-guerra
Várias guerras antecederam a de 1825 na região do Prata. A Guerra da
Sucessão Espanhola (1701-1713), por exemplo, ficou centrada na Colônia do
Sacramento, que foi atacada novamente em 1735, resultante do confronto entre os
Bourbons e os Habsburgos pelo trono da Espanha, devido à falta de um herdeiro
direto para o trono espanhol – Carlos II, depois de examinar várias possibilidades
de sucessão, deixou a Coroa em testamento a Filipe de Bourbon, duque de Anjou,
neto de Luís XIV, que era também herdeiro da coroa francesa. Em janeiro de 1701,
as cortes espanholas reconheceram o duque como seu novo rei, nomeando Filipe
V.28
Preocupados com uma possível união franco-espanhola, Áustria, Inglaterra,
Holanda, Suécia, Dinamarca e diversos principados alemães estabeleceram, no
26 Ibid. 27 Ibid. 28 Ibid.
16
Tratado de Haia, em setembro desse mesmo ano, a Grande Aliança. O aumento da
tensão entre as partes deflagrou a guerra que se iniciou pelo norte da Itália e, nos 11
anos seguintes, alastrou-se pelos principados alemães, Países Baixos, norte da
França e Península Ibérica, envolvendo quase todas as nações do continente.29
Em dezembro de 1703, para reforçar a aliança anglo-portuguesa, foi assinado
um acordo de comércio, que acabou conhecido sob o nome do embaixador inglês,
John Methuen, o Tratado de Methuen. Esse tratado, também conhecido como
Tratado de Panos e Vinhos, recebeu esse nome em homenagem ao embaixador, que
mediou as negociações entre os dois países envolvidos: Portugal e Grã-Bretanha. O
acordo, firmado em 1703 e com duração de 133 anos, contava com a abertura da
economia de Portugal a produtos importados britânicos que, em contrapartida,
abriam as portas para a importação de vinhos portugueses. O Tratado, de forma
geral, não foi favorável para a economia portuguesa devido a diversos fatores. Em
termos de balança comercial, por exemplo, o acordo tendeu consideravelmente ao
lado inglês, principalmente por ter favorecido a economia britânica ao acelerar seu
processo na Revolução Industrial e prejudicar Portugal na medida em que aumentou
sua dependência financeira frente à potência inglesa.
Além dessa, em 1753 ocorreu a Guaranítica, que refletiu a confluência das
metrópoles e a voga anti-jesuítica, voltada contra as reduções nas Missões. A guerra
colocou em enfrentamento os exércitos de índios guaranis, que viviam sob a tutela
da Companhia de Jesus na Província Jesuítica do Paraguai, e os exércitos coligados
de Espanha e Portugal. No ano de 1756, o resultado foi o aniquilamento de forma
brutal dos exércitos guaranis até o ponto de sua rendição incondicional. Isso
significou igualmente a ocupação irrestrita, pelos portugueses, dos territórios
conquistados e compreendeu, sobretudo, um decisivo passo para a desarticulação
do projeto jesuítico que vigorou na América do Sul nos séculos dezessete e
dezoito.30
Já em 1762 um reflexo regional da Guerra dos Sete Anos (1756-1763) –
conflito travado em torno do controle de regiões de exploração colonial – foi a
29 Ibid. 30 Muniz Costa, op. cit.
17
expansão do domínio espanhol até Rio Grande e o Jacuí. Em 1961, durante a guerra,
Espanha e França estabeleceram o Pacto de Família para enfrentar o poderio inglês
e intimaram Portugal, aliado à Inglaterra, a participar. Contudo, com a recusa
portuguesa, o país passou a ser considerado um inimigo, juntando-se à Inglaterra.31
As consequências políticas e comerciais do final do confronto foram enormes
para Portugal, o que fortaleceu sua aliança com os ingleses e firmou um fator de
questionamento acerca dos esforços iniciais de separação do comércio português
do controle britânico. Ao mesmo tempo, as relações comerciais entre esses dois
países ameaçavam os setores exportadores tradicionais da economia colonial e
interna do império português. Nesse sentido, a estratégia que consistia em reduzir
o preço dos produtos brasileiros por meio de bônus e, consequentemente, a
concorrência parecia mais adaptada à situação portuguesa.32
6.2 A influência de potências internacionais
A influência internacional na Guerra da Cisplatina se mostrou muito clara
com o pedido de Bernardino Rivadavia, presidente argentino, que possuía uma
grande desconfiança frente ao Imperador Brasileiro, Dom Pedro I, por intervenção
britânica no contexto do fim da guerra e das negociações de paz. Rivadavia
afirmava que apenas uma intervenção britânica seria capaz de gerar resultados para
com a resolução do conflito. No entanto, logo que o conflito se iniciou, a postura
da Grã-Bretanha foi de não envolvimento, postura essa que se estendeu durante o
primeiro ano do conflito. 33
O silêncio britânico fez o presidente argentino procurar apoio em outros
meios, escorando-se na Doutrina Monroe para conquistar o suporte norte-
americano e apontando o Brasil como culpado por uma possível interferência
inglesa na América. Enquanto o representante argentino procurava tal aproximação,
o Brasil procurava cada vez mais o apoio das monarquias europeias. Para a
decepção de Rivadavia, os Estados Unidos, assim como a Coroa Britânica,
31 Oberacker, 2015. 32 Muniz Costa, op. cit. 33 Pinto Pereira, op. cit.
18
resolveram não tomar parte no conflito da Cisplatina. Os americanos, não
enxergando na guerra um âmago de interesses europeus e decidindo por se
manterem distantes do embate, acabaram por frustrar, assim, os planos de governo
argentino.34
Foi apenas em 1826, devido ao bloqueio imposto pelo Brasil ao fluxo
comercial na região, que a Grã-Bretanha resolveu se posicionar diante do conflito
e começar as discussões sobre possíveis processos de paz. O envolvimento britânico
só ocorreu, dessa maneira, porque o bloqueio brasileiro estava lhe causando
prejuízos, bem como aos norte-americanos e aos franceses, e dificultando o fluxo
naval nos portos de Buenos Aires e Montevidéu. Por conseguinte, surgiu, tempos
depois, uma Convenção Preliminar para o caso.35
6.3 O decorrer e a situação atual
Os conflitos na província reiniciaram-se no começo de 1825, mas foram
fomentados essencialmente no final desse mesmo ano. As Províncias Unidas
apontaram mais uma vez, após o fim das campanhas contra os espanhóis, seus
recursos e homens para o novo ciclo de conflitos. Inicialmente apoiaram a
insurreição na província e depois entraram em guerra contra o Império do Brasil
por mar e terra.36
O primeiro embate naval entre os dois países foi o Combate dos Corales, em
9 de fevereiro de 1826. As forças brasileiras avistaram a esquadra das Províncias
Unidas deixando o ancoradouro de Los Pozos, próximo a Buenos Aires, e iniciaram
o combate. Os navios das Províncias Unidas tentaram retornar ao porto de Buenos
Aires, porém foram perseguidos pelos navios brasileiros até a entrada do mesmo.
Após este combate, o comandante Lobo dividiu parte das forças do bloqueio
enviando navios a Sacramento e a flotilha do Uruguai.37
34 Ibid. 35 Ibid. 36 Laurenzano, op. cit. 37 Ibid.
19
Ainda em fevereiro aconteceu o ataque à Colônia do Sacramento, nos dias 26
e 27. A esquadra das Províncias Unidas, composta da corveta 25 de Mayo, dos
brigues Congresso, Belgrano, República, e Balcarte e a escuna Sarandi, saíram de
Buenos Aires rumando a Sacramento. Lá chegando, iniciou-se a luta em que os 5
navios portenhos lutaram contra o brigue Real Pedro, o brigue-escuna Pará e as
escunas Liberdade do Sul e Conceição. O conflito durou dois dias, a esquadra do
Almirante Guillermo Brown voltou a Buenos Aires e, após o ataque, o governo
brasileiro enviou para reforço ao Prata as fragatas Niterói e Dona Paula, o lugar
Imperial e as escunas Providência, Maria da Glória e Maria Teresa.38
Na manhã do dia 20 de fevereiro de 1827, o General Carlos Alvear invadiu o
Brasil, dando início a Batalha do Passo do Rosário. Na noite de 19 para 20, os dois
exércitos se deslocaram sobre o Passo do Rosário, sem que um soubesse do
movimento do outro. O exército Republicano Oriental, comandado pelo General
Carlos María de Alvear, convocou um Conselho de Guerra. José Antônio Lavalleja
sugeriu imediato ataque ao Exército do Sul, mas Alvear não o tomou em
consideração e o ameaçou de fuzilamento. Assim, ficou determinado que suas
forças deveriam se preparar para o combate e que os comandantes só poderiam
receber ordens diretamente dele e por escrito.39
Já o exército Imperial do Sul, comandado pelo General Felisberto Caldeira e
pelo Marquês de Barbacena, encontraram dois brasileiros que, antes prisioneiros
dos orientais, conseguiram fugir, passando a informação que Alvear havia ordenado
uma ocupação das coxilhas em frente ao Passo do Rosário para aguardar Barbacena.
Com as informações confirmadas e o exército tendo seguido em frente, foi
constatado que Alvear estava ocupando elevações a 1.500 metros das suas próprias
posições e, por este motivo, resolveram atacar. Os dois exércitos se encontraram:
9.000 platinos contra 6.200 imperiais, uma diferença de 1.800 combatentes a favor
de Alvear. A batalha, entretanto, não foi planejada, tendo configurado, assim, um
embate de encontro. Barbacena observara o posicionamento dos orientais:
38 Ibid. 39 AHIMTB/RS; IHTRGS, 2013.
20
infantaria ao centro e cavalaria nas alas – e logo constatou sua superioridade nos
efetivos.
O almirante Brown, comandante da Armada Argentina, apesar dos desafios
encontrados, capturou uma importante frota naval que comandava a marinha
brasileira. Contudo, Buenos Aires não detinha mais recursos para continuar a guerra
e ordenou que sua esquadra forçasse o bloqueio brasileiro no Prata, junto aos
corsários da Patagônia – local em que o Brasil perderia sua esquadra –, levando a
guerra ao litoral do Brasil. Alvear mandou cessar a perseguição, reorganizando-se
e iniciando o deslocamento para São Gabriel, onde chegou no dia 25. Sem encontrar
os recursos que necessitava, ele retornou à Banda Oriental, iniciando sua marcha
no dia 28 e chegando a Los Corrales no dia 19 de março.40
A Batalha dos Corrrales ou do Pehuajó, travada em 31 de janeiro de 1866, foi
a última ocorrida em território Argentino. Bartolomeu Mitre enviara a divisão de
Buenos Aires, comandada pelo General Conesa, com cerca de 1.600 homens e,
assim, o tenente paraguaio Celestino Prieto começou a retirada. Conesa, ainda
assim, lançou uma ofensiva diretamente sobre Prieto e suas tropas. Os paraguaios
se viram obrigados a se esconderem na mata, tomando uma posição defensiva, da
qual disparam por quatro horas seguidas contra as tropas argentinas. Nesse
momento, tropas de reforços foram enviadas do Paraguai, enquanto que o General
Mitre não enviara nenhum tipo de amparo a mais. A batalha causou em média 900
baixas nas tropas argentinas contra 170 do Paraguai, que teve o resultado a seu
favor. Apesar da vitória, as tropas paraguaias não repetiriam mais essas ações em
território argentino.41
6.4 A Convenção Preliminar de Paz
Não havia perspectivas exatas para o final da guerra, uma vez que nenhum
dos dois países possuía recursos necessários para concluí-la. Esse cenário de
incerteza piorava ainda mais o comércio, que já vinha sendo intensamente
40 AHIMTB/RS; IHTRGS, 2013, Ibid. 41 Borga, 2010.
21
prejudicado pelo conflito. A Inglaterra, então, interviu diplomaticamente para
impor a paz às partes envolvidas no conflito e, assim, o Império e as Províncias
Unidas aceitaram a independência da Banda Oriental.42
Em 27 de agosto de 1828, pela Convenção Preliminar de Paz, surgiu a
República Oriental do Uruguai, cuja existência foi garantida perpetuamente por
Inglaterra, Brasil e Províncias Unidas, com o intuito de promover uma paz honrosa
para as partes.43 Na corte foram ditadas recomendações, com as quais o embaixador
Manoel Garcia chegara ao Brasil, e assinadas pelo Marquês de Queluz, pelo
Visconde de São Leopoldo, pelo Marquês de Maçaio e pelo agente diplomático
investido de plenos poderes da Argentina.44
De acordo com o primeiro artigo da Convenção, as Províncias Unidas do Rio
da Prata reconheceriam a independência do Império do Brasil, renunciando todos
os direitos ao território da Província Cisplatina, enquanto o imperador brasileiro
faria o mesmo. O artigo terceiro da convenção de paz fez do Brasil e das Províncias
Unidas os garantes da nova nação, tornando o território disputado em neutro.45
O artigo quarto, por sua vez, dizia que a ilha de Martim Garcia deveria estar
como se encontrava antes do início da guerra – isto é, ser desmilitarizada. Ainda
nesse artigo, as Províncias Unidas comprometeram-se em indenizar o Império por
ter lançado mão de corsários na guerra. Para isso, seria criada uma Comissão Mista
para a liquidação das reclamações, o que é garantido pelo artigo sexto. Ademais, o
tratado preliminar garantiu a liberdade para os prisioneiros em mar e terra,
conforme o artigo sétimo. De acordo com o artigo oitavo, os governos deveriam se
comprometer em garantir a livre navegação no Rio da Prata durante quinze anos. A
comunicação e o comércio feito pelas populações dos Estados deveria ser indicada
em um tratado de comércio e navegação, garantida pelo artigo nono. Por fim, o
último artigo colocava que o tratado deveria ser ratificado por ambas as partes, em
Montevidéu e em até cinquenta dias, com a presença de seus agentes diplomáticos
42 Doratioto, op. cit. 43 Ibid. 44 Pereira, 2007. 45 Ibid.
22
investidos de plenos poderes, que deveriam auxiliar na conclusão do tratado
definitivo de paz.46
A convenção, no entanto, não trouxe uma estabilidade contínua e ares
conflituosos entre as partes prosseguiram ao longo da maior parte do século XIX,
fazendo com que o agora Uruguai fosse foco de crises regionais. Somente em 1970,
com a vitória do Brasil, extinguiu-se realmente a Guerra no Prata. Apesar disso, a
convenção foi importante para a vitória decisiva do Brasil que, além de garantir
limites territoriais e proporcionar uma base formal para sua atuação na margem
oriental do Rio da Prata, assegurava uma área significativa para a fronteira sul e
para a navegação interior de interesse brasileiro.47
Essa convenção foi a base preliminar para uma posterior, firmada no Rio de
Janeiro, também motivo para que Manoel Garcia tenha sido recebido como traidor
da causa republicana e acusado de deixar que a Argentina assumisse um papel de
coadjuvante na negociação. A opinião pública da Argentina, de tal forma, afirmava
que o principal motivo da guerra – a posse da Província Cisplatina – fora deixado
de lado, e afirmava ainda que a província fora cedida ao Brasil sem grandes
esforços. Além disso, com o documento, restava a impressão de que o território
seria devolvido por meio de uma concessão do governo brasileiro.48
46 Ibid. 47 Doratioto, op. cit. 48 Pereira, op. cit.
23
Seção II
7 Introdução A simulação de um Gabinete Duplo de Guerra possui como objetivo recriar
o processo de tomada de decisão de uma guerra histórica da forma mais realista
possível, levando em conta determinados níveis estratégicos e/ou políticos a partir
de dois lados beligerantes opostos. Neste caso, cada sala constitui o centro de
operações – político ou militar – de uma parte do conflito. Esta parte, por sua vez,
é formada por militares ou figuras políticas mais importantes da facção em questão.
Cada um destes indivíduos é uma personagem histórica, com características e
pensamentos próprios acerca das estratégias e/ou táticas a serem seguidas visando
a vitória no conflito. Ao mesmo tempo, estas personagens estarão inseridas em
gabinetes – de crise ou guerra – que, por sua vez, delimitarão o escopo de suas ações
em seus respectivos campos de atuação, o que será visto mais detalhadamente em
tópicos posteriores deste guia.
Os gabinetes funcionarão de maneira independente, porém complementar.
Em um conflito armado, os campos políticos e militares estão interligados, de
maneira a atuarem visando a vitória em seus respectivos espectros, o que, por
consequência, levará a um desfecho favorável (ou não) na guerra em questão. Cada
sala exercerá seu poder através do envio de ordens ao grupo de controle (GruCon),
que as executará e informará o resultado aos remetentes o quanto antes. Estas ações
influenciarão no andamento da disputa, podendo ser bem-sucedidas ou não.
Enquanto tais ordens são enviadas e executadas, ocorre o progresso temporal, isto
é, mudança de data a ser informada periodicamente pelos diretores conforme o
andamento do conflito.
Desta forma, o Gabinete Duplo da Guerra da Cisplatina (1826-1828) do XV
MIRIN será composto por cinco salas: (um) Gabinete Imperial de Crise Brasileiro,
(dois) Gabinete Imperial de Guerra Brasileiro, (três) Gabinete Integrado de Crise
das Províncias Unidas e Banda Oriental, (quatro) Gabinete Integrado de Guerra das
Províncias Unidas e Banda Oriental e (cinco) Grupo de Controle (GruCon). É
importante ressaltar que o acesso por parte de delegados ao Grucon é
24
terminantemente proibido e a entrada aos demais gabinetes que não sejam o original
do(a) delegado(a), restrito.
8 A Organização do Gabinete
8.1 A Sala de Guerra
A sala de guerra funciona como um local de reunião entre representantes de
um mesmo lado, que se encontram para debater estratégias e planejamentos de
ações, de modo a alcançarem o objetivo que possuem em comum – ganhar a guerra
em questão. Estando em um mesmo ambiente, é possibilitada uma participação
conjunta de todas as cabeças envolvidas na tomada de decisões estratégicas, de
forma que todos podem engajar-se na campanha de guerra.
Existem dois grupos que incidem sobre a sala de guerra: a Arbitragem e o
Grupo de Controle (GruCon). No caso da presente simulação, todos os diretores
pertencentes à sala de guerra agem em ambos os âmbitos.
8.1.1 Arbitragem
A arbitragem consiste nas decisões tomadas pelos diretores que estão no
Grupo Controle acerca das medidas decididas pelos delegados nas salas. As
deliberações do GruCon serão as mais verossímeis possível, levando em
consideração a conjuntura analisada juntamente com a ordem enviada ao mesmo.
Dessa forma, torna-se necessário o detalhamento e precisão das ordens enviadas,
uma vez que apenas o conteúdo escrito será considerado pela arbitragem. Um
exemplo de arbitragem se dá quando os dois gabinetes enviam o mesmo número de
tropas para uma região, porém com posicionamentos de tipo de tropas diferentes.
Neste caso, caberá aos diretores analisar qual dos dois lados sairia vencedor,
julgando formação, vantagens locacionais e regionais, entre outros fatores
específicos a cada caso.
25
8.1.2 Grupo de Controle
O Grupo de Controle é responsável por estabelecer o cenário de guerra,
realizar o controle do tempo de “jogo”, calcular o resultado dos combates e
estabelecer a posição das tropas, armamentos e suprimentos presentes no teatro de
operações. Todos os indicadores relevantes a essas funções são considerados pelo
GruCon, além disso cabe a ele alertar caso chegue novas tropas e mantimentos.
Cabe também ao Grupo de Controle responder hipotéticas cartas que sejam
enviadas a membros que não estejam presentes em delegações do comitê.
A sala do GruCon é aquela na qual se processa todas as ordens e cartas
enviadas, além de seus resultados. Portanto, o GruCon, na sessão inicial, designará
todas as tropas disponíveis para cada lado, tais quais suas localizações. Após esse
momento introdutório, o trabalho do GruCon assumira uma posição
majoritariamente reativa, ao responder as ordens e cartas enviadas a ele - mas ainda
havendo atribuições ativas para este agente, como a atualização do envio de novas
tropas, por exemplo.
Exemplifica-se a ação do Grupo de Controle com a seguinte situação
hipotética:
O gabinete X enviou 5000 tropas de infantaria andando para a cidade Y por
meio de uma ordem. Nesse momento, o GruCon avaliará a ordem submetida e
responderá quanto tempo irá demorar para esse remanejamento ocorrer e, caso haja
inimigos por perto, avisará que é possível iniciar um engajamento ou que as tropas
sofrerão um ataque.
Desse modo, verifica-se a dinamicidade do Grupo de Controle e a
crucialidade em enviar ordens corretas e sem desvios para que se obtenha o melhor
resultado tanto para o remetente quanto para o destinatário.
8.2 Gabinetes de Guerra
Os gabinetes de guerra devem ser compreendidos como uma situação de
emergência, na qual as principais lideranças militares se reúnem frente a um
26
conflito bélico ativo. Com isso, deve-se se compreender uma gama de especialistas
e militares aptos a realizar a melhor estratégia possível a fim de vencer o combate
em questão. Contudo, não apenas é constituído por altos militares, podendo haver
políticos e demais ministros. Afinal, os interesses de uma guerra não são meramente
militares.
Destaca-se que nesses espaços são traçadas as principais estratégias para
vencer o embate. Porém, por ser algo tão volátil, torna-se crucial um ambiente
harmonioso. Com isso, aspira-se que as decisões sejam mais acertadas, visto que
assim diminui-se a margem para erros, posto que haverá um comportamento mais
probabilístico. Logo, por mais estressante que uma guerra possa ser, cabe aos
membros desses gabinetes estarem plácidos frente aos desafios que se dispõem a
sua frente.
Ademais, ressalta-se que um gabinete de guerra possui a maior das
confidencialidades dos países beligerantes. Portanto, todas as ações que ocorrem
nele devem ser secretas à mídia e sociedade civil, visando, dessa forma, não
promover alterações no ânimo nacional e impedir o acesso a informações pelos
adversários.
8.3 Os Gabinetes de Crise: atribuições e influência
Os gabinetes possuem caráter supramilitar, tendo em vista a subordinação das
forças militares frente aos interesses políticos e o fato de os chefes de governo e/ou
Estado serem, na maioria dos casos, comandantes-em-chefe de tais forças dos seus
respectivos países, tendo assim autoridade frente às maiores questões estratégico-
militares. Contudo, estas personalidades raramente são militares e/ou possuem o
conhecimento e disponibilidade necessários para realizarem, em conjunto com seu
Estado-Maior das forças armadas, manobras, movimentações e batalhas que
requerem tais atributos e condições. Além disso, é necessária a administração das
mais diversas vicissitudes provenientes do conturbado período de um conflito
armado envolvendo um país. Logo, apesar de serem os comandantes supremos,
estes líderes e seus respectivos gabinetes se restringem na prática a tomar decisões
políticas e supervisionar os gabinetes militares, sendo estes últimos que tomam
efetivamente todas as decisões militares em nível tático e estratégico.
27
Tendo em vista seu escopo, os gabinetes de crise são formados por ministros
de Estado, presidentes de câmaras legislativas e figuras de grande influência
política, que devem debater questões de importância vital para o sucesso de seus
respectivos lados no conflito. Tais questões incluem, por exemplo, a formulação de
medidas que ajudem seus exércitos tanto dentro quanto fora do teatro de operações,
debate sobre a situação econômica de cada país (e suas economias de guerra), temas
sociais gerais (que podem ocasionar revoltas se mal geridas em certos casos),
reformas políticas, relações diplomáticas, o já citado acompanhamento das ações
dos gabinetes militares no andamento do front e outros, sendo todos estes fatores
influenciadores diretos do resultado das hostilidades.
Em relação à supervisão aos gabinetes militares, faz-se necessário estabelecer
os limites de ação entre esses e os de crise. No tópico anterior, foram delimitadas
as atribuições dos militares, que são, em suma, funções específicas à coordenação
de movimentações beligerantes no teatro de operações em questão e o
gerenciamento das batalhas e matérias bélicas diversas. Neste sentido, além das
atribuições citadas no parágrafo anterior, os gabinetes de crise devem, se necessário,
estabelecer metas e objetivos aos militares que sejam importantes no âmbito
político do conflito. O comitê de crise também delibera todas as questões bélicas
fora do teatro de operações, incluindo movimentações, reforços ao front,
engajamento, entre outras, emitindo ordens para a execução das mesmas.
Portanto, os gabinetes de crise exercem um amplo aparato de funções, desde
políticas, sociais e econômicas até militares (desde que fora do teatro de operações).
Tal fato expressa sua enorme importância dentro do Gabinete Duplo de Guerra, que
sobrepõe o gabinete de crise frente ao militar; sendo o escopo do último reduzido
em relação ao do primeiro. Apesar disso, é elementar e imperativa a necessidade de
cooperação entre ambos os gabinetes, tendo em vista que para se ganhar o conflito,
é necessária uma integração harmônica no funcionamento de ambos os comitês,
considerando que estes são complementares em suas atribuições.
28
8.4 Comunicação
Existem apenas dois tipos de documento oficial na simulação dos gabinetes:
ordens e cartas. O primeiro serve como meio de comunicação entre o gabinete e a
sala de guerra. Já o segundo como comunicação do gabinete com pessoas ou
Estados que não estão no neste e precisam ser consultados acerca de alguma questão
relevante.
8.4.1 Ordens
Uma ordem pode ser escrita por qualquer delegado dentro de um gabinete.
Todas as ordens contêm informações que não possuem caráter confidencial para o
restante dos delegados aliados, a situação não se verificando quando se trata de
delegados adversários. Exemplos de ordens nos gabinetes militares são comandos
de movimentação de tropas, enviadas ao GruCon para que a posição de um
contingente específico seja avaliada e atualizada.
As ordens executivas escritas por um delegado devem ser entregues ao
comandante em chefe. O comandante em chefe, por sua vez, irá entregar todas as
ordens recebidas para o diretor responsável pelo seu gabinete. Já este diretor irá
organizar todas as ordens escritas e entregará ao staff do comitê, que transportará,
por fim, a ordem de volta à sala de guerra.
É importante ressaltar que, embora o conteúdo das ordens não seja um
segredo para os delegados restantes do gabinete onde ela foi escrita, todas são
documentos confidenciais e, portanto, seu conteúdo não deve ser compartilhado
com qualquer pessoa que não pertença ao gabinete de origem e/ou represente um
aliado no conflito. Elas possuem informações cruciais à estratégia de guerra em
curso que, nas mãos do adversário, podem criar uma desvantagem no conflito. Um
exemplo claro são ordens de movimentações de tropas, cujo conteúdo entregaria ao
inimigo a posição no mapa de parte do exército aliado, tornando estas posições
suscetíveis um ataque.
29
8.4.2 Cartas
Outra forma de comunicação dos gabinetes com o “mundo externo” se dá por
meio de cartas. Estas podem ser usadas quando a finalidade da comunicação é
enviar alguma mensagem para uma figura importante da época em questão que seja
relevante ao conflito. Caso a carta seja endereçada a um indivíduo que não esteja
sendo representado por um delegado, o Grupo de Controle estará encarregado de
simular o destinatário e entregar uma resposta para o remetente.
Não obstante o caráter pessoal desse tipo de comunicação, todas as cartas,
assim como as ordens, devem ser entregues ao Grupo de Controle para
processamento. Este, por sua vez, será responsável por entregar a carta ao destino
correto, bem como avisar suas consequências.
9 Forças Terrestres
9.1 A divisão das forças
• Esquadra
Entre as forças terrestres é a menor das organizações militares. Sua
quantidade de membros pode variar de 4 a 11 que são comandados por um sargento.
• Pelotão
O pelotão é uma força terrestre que possui de 16 a 44 membros. Sua
composição tem de 3 a 4 esquadras juntas e são comandadas um tenente.
• Companhia
Companhias possuem de 130 a 150 unidades e normalmente são lideradas por
capitães. Consistem, basicamente, em 4 pelotões e tropas de apoio logístico com
suprimentos e munição. Elas, por sua vez, são propriedades básicas de um batalhão
e suprem as especificidades do mesmo.
• Batalhão
30
Um batalhão é composto com aproximadamente de 600 a 800 membros,
englobando 3 companhias. Os batalhões são especializados, como batalhões de
artilharia e de infantaria, por exemplo. Um batalhão tem como especialidade iniciar
um ataque em uma pequena área terrestre onde consiga visualizar o inimigo.
• Regimento
Possuem de 3 a 5 batalhões em sua formação, assim, podem chegar até a 3.000
homens. É, normalmente, comandado por um coronel.
• Divisão
Possuem de 10 a 20 mil homens. Essa força é crucial para grandes operações
táticas e, por isso, podem ter diversas formações de forças menores.
• Corpo de Exército
O corpo de exército tem uma função logística importantíssima em qualquer
guerra. Ele é o responsável em traduzir os objetivos de uma guerra em estratégia
tática para como alcançá-lo. Normalmente possui de duas a cinco divisões.
• Exército de Campo
Uma das forças mais importantes dentro de um exército, possui normalmente
dois Corps. e tropas adjacentes. Atua independentemente e diretamente com os
quartéis generais.
• Grupos de Exército
O maior dos agrupamentos possíveis. Normalmente é comandado por um
marechal e seu efetivo pode variar de 250 mil homens até 1,2 milhão. O grupo de
exército é convocado quando há necessidade de uma grande operação militar em
certa região estratégica. Como é extremamente vultuoso, seus custos logísticos e
monetários são grandes, portanto, é necessária cautela para formá-lo.
• Teatros
31
Existem dois significados para o termo “teatro” dentro de uma temática
militar: teatro de operações e teatro de guerra. O primeiro refere-se a uma forma
fixa, o segundo demonstra um lado mais volátil.
O termo teatro de operações resume a organização de todos os
acontecimentos logísticos e bélicos de uma frente de guerra, isto é, questões de
movimentações de tropas, de suprimentos e de reforços são de sua competência.
Além disso, em uma guerra pode existir mais de um teatro, uma vez que é possível
que exista mais de uma frente de batalha, sendo assim necessária à sua presença.
Por outro lado, teatro de guerra é um termo designado por Carl Von
Clausewitz que define a região em que estão sendo realizados os combates de uma
guerra, isto é, as frentes de batalha. Como se trata de uma área que, ao decorrer do
tempo, vai sofrendo alterações, um teatro de guerra nunca será fixo e vai sendo
definido com as vitórias e derrotas dos beligerantes. Assim como o teatro de
operações, o de guerra também pode ser múltiplo, uma vez que gerar-se-ão diversos
teatros com diversos fronts.
10 Forças Navais
10.1 Tipos de embarcações (ad hoc)
• Naus
Destinada a proteger o comércio marítimo e fazer a guerra no mar, armada
com 60 a 120 peças de artilharia, podendo ser de 1ª classe (mais de 100 canhões),
de 2ª classe (90 a 100 canhões) ou de 3ª (40 a 80 canhões).
• Fragatas
Navio de guerra semelhante à nau, menor e mais armado que ela, com três
mastros, sem acastelamentos, armado apenas com uma bateria de canhões, coberta
ou descoberta, porém mais veloz. Apareceu em fins do século XVIII para substituir
a fragata e o brigue em missões de reconhecimento ofensivo, para o qual este era
32
demasiado fraco e aquela forte demais, e desempenhava missões de aviso, de
transporte e de munição.
• Corvetas / Bergantim
Antiga embarcação à vela e remo, esguia e veloz, de convés corrido, com um
ou dois mastros de galé e oito a dez bancos para remadores. Posteriormente, navio
a vela de dois mastros, cada um espigando dois mastaréus (mastro suplementar
preso ao mastro real) e envergando pano redondo, com velas no entremastro e
gurupés, armado com 10 a 20 peças de artilharia.
• Brigues
Navio a vela, com dois mastros espigando mastaréus e envergando pano
redondo, com velas de entremastro e gurupés e um latino quadrangular no mastro
da mezena. Notabilizou-se nas Guerras da Independência dos Estados Unidos da
América do Norte, tendo em média de seis a dez canhões. Os brigues eram
classificados segundo as suas características militares em "brigues do tipo fragata",
os maiores, e "do tipo corveta", os menores. Em qualquer caso, dado seu menor
porte, o brigue dispunha usualmente de uma vantagem de velocidade face aos
navios de linha e até face às fragatas inglesas, o que lhe conferia a vantagem da
iniciativa. No entanto, sobretudo com mar agitado, poderia ser mais lento que as
fragatas longas, como as norte-americanas ou as francesas, o que limitava o seu
emprego como corsário.
• Escunas
Uma escuna é um tipo de “veleiro” caracterizado por usar velas de popa à
proa em dois ou mais mastros. O que as distingue é o fato do mastro de ré, ou
mezena, ser maior e mais alto que os demais.
• Canhoneiras
Embarcação pequena, armada com um ou dois canhões na proa. Quando não
há vento, movido por remo, para o qual ela tem uma tripulação significativa (entre
25 a 50 homens).
33
• Lanchas/Iate
Pequenos navios, podendo ser armados ou não. Podem ser usados para fins
científicos, militares ou comerciais. Armados muito levemente, parecidos com as
canhoneiras, mas ainda menores.
10.2 Organização das forças
Em meados do século XVII, as armas dispostas ao longo dos lados dos navios
de combate eram a arma decisiva, e começaram a mudar a forma como as batalhas
eram feitas. Eram mais centradas no poder de fogo do canhão, que necessitavam de
um navio mais robusto, e portanto, menos manobrável. Isso representou uma
mudança na essencialidade das manobras nas batalhas navais, em favor do poder
de fogo. Com isso, o navio dependia mais do vento. Isso forçava as manobras a
serem mais simples, pois ir contra o vento requereria uma tripulação experiente.
A tática padrão era formar uma fila e disparar contra o inimigo, já que o poder
de fogo se concentrava nos lados. Os ingleses, entretanto, formularam uma técnica
diferente. Em vez de atirarem nos lados, ele se botavam em posição para formar o
que ficou conhecido como raking shot, que em vez de atirar no lado do navio
inimigo, atirar em toda o navio de maneira horizontal.
O refinamento mais eficaz veio através do corte da linha. Uma ou duas
colunas de navios navegariam diretamente através de um ponto intermediário da
linha do inimigo. Os navios inimigos com o vento contrário lutariam para conseguir
voltar e ajudar seus companheiros, e os britânicos concentrariam uma sucessão de
seus navios em apenas dois pontos da linha do inimigo. Trafalgar (1805) é o
principal exemplo deste estratagema.
Entretanto, todas essas táticas devem levar em conta o padrão hidrográfico de
onde essas batalhas vão ocorrer. Navios grandes podem encalhar e não se mostrar
tão úteis em rios e batalhas longe do mar, ou mesmo serem abatidas pelo acaso caso
sejam mal posicionados.
34
10.3 Marinhas
10.3.1 Marinha Brasileira
A formação da Marinha Imperial Brasileira se dá no início do século XIX, no
contexto das guerras napoleônicas, e na vinda da corte portuguesa para o Brasil.
Dessa maneira, se criam e aumentam estruturas físicas e também burocráticas para
o desenvolvimento da armada no território brasileiro. Nessa época, a marinha
desempenha papel importantíssimo nos dois principais atos de política externa de
Dom João VI: a anexação da Banda Oriental, território contido dentro da bacia do
Prata que vai ter papel fundamental na nossa história; além da tomada de Caiena,
na Guiana Francesa, como resposta ao avanço napoleônico.49
Para além disso, pode-se destacar o papel mais que fundamental que a
marinha teve no processo de independência brasileiro. Por mais que seja diversas
vezes repetido que o processo brasileiro tenha sido pacífico ou de maneira muito
facilitada, isso não é verdade. Caso a recém-formada brasileira não tivesse sido
eficiente, esse processo poderia ter durado muito mais tempo. Deixado uma lacuna
nas forças militares profissionais brasileiras, que contavam com maioria de
portugueses entre suas fileiras, os portugueses que aderiram a causa brasileira, além
da contratação de estrangeiros foi o mecanismo usado. Muitos ingleses, incluindo
Thomas Cochrane, convidado por José Bonifácio para assumir o comando da
marinha brasileira, tornando-o comandante-em-chefe da esquadra brasileira.50
Para além do processo de independência, impedindo a chegada de reforços e
suprimentos de Portugal e sufocando as dissidências internas portuguesas,
consolidando o reinado brasileiro de Dom Pedro I, a força naval foi essencial na
supressão dos revoltosos da Confederação do Equador em 1824, que ocorreram no
país com um viés separatista. Com um severo bloqueio naval em Recife, além da
atuação conjunta do exército, permitiram a vitória. Cabe ressaltar aqui que na
independência do Brasil, a marinha imperial atuou em São Luís, Belém, Salvador e
49 Marinha do Brasil, 2006, p. 68-72. 50 Ibid., p. 75-78.
35
também na Banda Oriental, aqui inserida no Império como Província Cisplatina,
com capital em Montevidéu.51
10.3.2 Marinha Argentina
A marinha das Províncias Unidas era muito diferente da brasileira, que herdou
boa parte do seu aparato naval, tecnológico e marujos de um poder colonial que
dava grande importância ao desenvolvimento naval. Pelo contrário, as forças navais
provincianas foram formadas as pressas. O governo começou a construção de
navios, compra de novas embarcações, mas tinha o corso como principal atividade
para contrabalançar as ações. O recrutamento de mercenários e oficiais estrangeiros
também se devia ao fato da maioria dos recrutas não terem experiência no mar, e
esses navios, se não suficientes para atacar os brasileiros, pois poucos acreditavam
nessa empreitada, eram extremamente importantes para tentar defender os rios e as
cidades costeiras, como parte da campanha de sobrevivência naval.52
Todas essas coisas influem na eficácia da marinha do país, que não são tão
experientes quanto os brasileiros. Apesar disso, o conhecimento hidrográfico da
região pelos locais era muito superior, o que constituía uma vantagem em termos
muito relevante, já que conseguem evitar com maior precisão acidentes e achar
melhores rotas.
10.3.3 O Corso
Em 6 de janeiro de 1826, Carlos María de Alvelar, ministro da Guerra e da
Marinha autorizou e desencadeou o corso na costa brasileira. O corso consiste na
destruição do tráfego comercial do inimigo. Isso não quer dizer que se restringe a
isso, podendo atacar navios de guerra e regiões litorânea, mas sem dúvida essa é
sua maior utilidade. O corso se diferencia da pirataria pois ela é feita sob uma
bandeira, no caso, das Províncias Unidas do Rio da Prata, sendo expressamente
autorizados por estes, se comprometendo a seguir um conjunto de regras pré-
51 Ibid. 52 Izarra; Spinelli; Vilar, 2014, p. 101.
36
determinadas por essa nação que dá o direito de corso.53 A seguir, algumas das
fundamentações do corso:
Em geral, ele é financiado por comerciantes que podem controlar mais de um
navio corsário simultaneamente. São dadas patentes de corso, vendidas por um alto
valor. O corsário não recebe nenhuma compensação, como um marinheiro ganharia,
mas o corso, ao longo da história, se mostrou extremamente rentável, e um risco
aceitável para muitos marinheiros. No geral, e no caso específico, os corsários eram
em sua maioria estrangeiros, procurando recompensas. Muitos oficiais assim como
marinheiros rasos alternavam ou desertavam para se juntar ao corso, mesmo
mediante os perigos associados com ele, pois sua rentabilidade era muito alta.54
Normalmente, os navios corsários são de pequeno porte, resistentes e
manobráveis. Com cerca de 8 a 10 canhões, podem ser usadas, como já dito, em
situações estritamente militares, apesar de isso não ser comum. Geralmente navios
mercantes com pouca capacidade defensiva eram os alvos preferenciais, gerando
grande impacto econômico na economia do inimigo.55
10.3.4 Forças das Marinhas Brasileira e Argentina
Forças Brasileiras em todo o território nacional:
• 2 Naus
• 8 Fragatas
• 7 Corvetas
• 16 Brigues
• 24 Escunas
• 33 Canhoneiras
• 4 Iates
Forças bloqueadoras brasileiras em Montevidéu:
53 Martins, 2001, p. 81-82. 54 Ibid., p. 82-83. 55 Ibid.
37
• 3 corvetas (2 com 22 canhões e 1 com 18)
• 5 brigues (3 com 18 canhões, 1 com 14 e 1 com 10)
• 1 brigue-escuna (8 canhões)
• 1 barca-canhoneira (6 canhões)
• 8 escunas (cada uma com um canhão)
• 4 iates
Forças Argentinas:
• 1 Corveta (28 canhões)
• 4 Brigues (2 com 18 canhões e 2 com 16 canhões)
• 12 Barcas canhoneiras (1 canhão cada)
• 2 escunas (3 canhões cada)
11 Táticas e Formações de Engajamento
11.1 Forças Terrestres
As formações e estratégias de forças terrestres em guerras sempre foram
utilizadas, por mais rudimentares que outrora fossem. Contudo, elas são cruciais
para existir uma organização e promover uma maior efetividade no campo de
batalha. Dentre as diversas táticas possíveis para uma guerra, algumas são famosas
e merecem ser comentadas. Cabe destacar que todas elas foram criadas em uma
situação e para um fim específico, podendo ser efetiva ou não em outros casos.
Portanto, torna-se necessário analisar a situação na qual está em frente a fim de
determinar qual se adequa melhor ao contexto e não se fechar para buscar algo novo,
criativo e que possa ser mais eficaz.
No antigo Império Romano, destacam-se duas formações muito famosas e
que foram essenciais para o sucesso dos romanos no passado: a Falange e a
Formação Tartaruga. A primeira consiste em possuir uma primeira linha de
infantaria com longas lanças e escudos, empunhados para a frente, a fim de
combater o inimigo que estivesse nessa direção. Além disso, as linhas após essa
frente ficavam com as lanças em 45 graus, a fim de evitar qualquer ataque que
38
viesse por cima, como um salto de algum membro da cavalaria. Por fim, os
membros da retaguarda possuíam dupla função: auxiliar na progressão da tropa pela
simples força bruta e, caso ocorresse alguma baixa, alguém iria ocupar o posto na
formação. A manobra de tartaruga, por sua vez, era uma opção defensiva, na qual
os membros se posicionavam com escudos nas duas laterais, acima de suas cabeças
e a frente do agrupamento. Essa manobra permitia a locomoção de tropas
diminuindo a eficiência de qualquer alvejamento que ocorresse. Contudo, por
depender de um movimento conjunto de vários homens, a tática tinha uma grande
desvantagem por ser extremamente lenta56.
Cabe também destacar uma manobra muito importante em qualquer guerra: o
Flanqueamento. Essa manobra visa atacar o exército inimigo pelo lado, focando
em sua retaguarda e artilharia, a fim de diminuir o potencial de fogo dos inimigos e
gerar uma vantagem, tanto com a diminuição da capacidade quanto com o ataque
surpresa. Contudo, por mais que seja efetiva, existem formas de minimizar o seu
dano. A ação de posicionar tropas nas alas, ao lado do centro do exército, pode
facilitar para a observação de um flanco e para contingência no caso de um ataque.
Além disso, as reações perante ao ataque, o quanto antes forem realizadas, irão
permitir uma diminuição de sua efetividade.
Ainda, cabe destacar também a presença de formação com uma linha de
atiradores e artilharia, enquanto a cavalaria e a infantaria leve buscavam um
espaço para adentrar as linhas inimigas e dispersá-los, a fim de permitir que os
atiradores estejam em uma boa posição para promover o disparo. A guerra nesse
período ficava sendo mais tática e menos corpo-a-corpo, como no passado. Assim,
evidencia-se que o uso da arma de fogo gerou uma busca por menor risco e por um
ataque mais calculado por ambas as partes. Entretanto, com a presença da baioneta
– arma de fogo com uma faca atachada em sua ponta – os combates poderiam se
dispor tanto à distância quanto mais próximos. Logo, o exército que possuísse essa
arma durante tal período garantia vantagem bélica e estratégica frente a um
adversário desprovido dela.
56 Knighton, 2016.
39
Por fim, ressalta-se que aqui existem apenas alguns exemplos de estratégias,
das mais diversas épocas e conjunturas. Cabe, portanto, o poder analítico dos
delegados de buscar a que mais se encaixa no perfil dos seus exércitos e nos seus
próprios enquanto generais. Considera-se, também, que estratégias de guerra são
criadas com senso de urgência, uma reação frente ao que o adversário executa,
levando em conta o poder decisório da forma mais eficiente. Logo, sugere-se que o
estudo de estratégias das forças terrestres seja pautado com base na tecnologia de
cada exército, no número de homens que o compõem, no relevo e clima onde está
sendo realizado a batalha, entre outros diversos fatores que podem ser
preponderantes para uma estratégia funcionar ou não.
12 A Arte da Guerra
12.1 Introdução
No século IV a.c, na China antiga, o comandante e pensador militar Sun Tzu
já refletia acerca da utilidade da sabedoria acerca do conflito armado: “A Arte da
Guerra é de importância vital para o Estado” e “(...) é uma questão de vida ou morte,
um caminho tanto para a segurança quanto para a ruína. É, portanto, um motivo de
preocupação, que sob nenhuma circunstância deve ser negligenciado”.57 Mais de
dois milênios depois, Carl von Clausewitz, um oficial do exército do Reino da
Prússia, veterano das Guerras Napoleônicas, viria a refletir sobre o fenômeno
bélico, defendendo a ideia de que esta é um duelo em grande escala, um ato de
violência derivado da política por outros meios58.
Logo, é possível perceber que a arte de se fazer guerra é alvo de debates e
pensamentos desde a Antiguidade, tendo muito sido desenvolvido em termos de
doutrina e táticas desde então. Veremos, nos próximos subtópicos, de maneira
breve, o raciocínio de Clausewitz e extensões da guerra para a estratégia em geral.
57 Tzu, 2012, p. 55. 58 Clausewitz, 1962 apud Leonard, 1988.
40
12.2 O pensamento de Clausewitz acerca da guerra
Clausewitz é um dos maiores pensadores militares da história. Sua doutrina é
famosa por uma de suas máximas, sendo esta a seguinte: “A Guerra é a continuação
da política por outros meios”59. Como já descrito em tópicos e subtópicos
anteriores, o autor acreditava piamente na relação entre guerra e política, isto é, os
dois conceitos estão relacionados, considerando-se que a guerra seria um fenômeno
derivado da política. Além disso, o oficial prussiano defendia a tese de que o
conflito armado “(...) é um ato de violência, que visa compelir o adversário a
submeter-se à nossa vontade”60.
Para submeter o inimigo à vontade do ganhador, é necessário desarmá-lo, uma
vez que o adversário seria colocado numa posição de inferioridade. Obviamente, a
guerra não pode continuar se uma das partes beligerantes não possuir meios para
tal, isto é, o armamento. Dito isto, a pior situação em que um beligerante pode se
encontrar é desarmado e, por conseguinte, o objetivo da guerra é desarmar o inimigo
para que este possa se submeter à vontade do vencedor61.
Uma vez pensados os meios e fins da guerra, o autor introduz o conceito de
fricção:
A fricção é o único conceito (...) que distingue a guerra na realidade da guerra no papel. A máquina militar, o exército e tudo que lhe diz respeito, é de fato simples e parece, sob este enfoque, fácil de lidar. Convém, no entanto refletir que nem todas as partes estão integradas, que ele é composto na totalidade por indivíduos, cada um dos quais encontra fricções em todas as direções. Teoricamente tudo se comporta muito bem: o comandante de um batalhão é responsável pela execução das ordens que foram dadas; e, embora a unidade disciplinarmente esteja coesa e o comandante seja um militar de reconhecido zelo, o conjunto, em determinada altura, gera uma pequena fricção. Mas na realidade não é assim, e tudo que é exagerado e falso neste contexto manifesta-se de imediato na guerra. O batalhão permanece com um determinado efetivo e é possível, numa determinada conjuntura que apenas um homem (e pode ser até um dos mais humildes) venha a causar retardamento e mesmo irregularidades. Os riscos que a guerra traz consigo e os esforços físicos que ela exige aumentam de tal forma este inconveniente que eles podem ser considerados como a maior causa da fricção.62
59 Ibid., p. 33. 60 Ibid. 61 Leonard, 1988. 62 Ibid., p. 68-69.
41
A fricção, seria em suma, de acordo com Clausewitz, uma conjunção entre o
desgaste e o acaso, exemplificado no trecho acima com pequenos ocorridos que
acabam por influenciar grandes unidades militares como um todo.
Por fim, o oficial prussiano apresenta e diferencia mais dois conceitos
primordiais para os fins deste Guia, sendo estes a Guerra Limitada e a Guerra Total.
A primeira utiliza força limitada para se atingir um objetivo específico, enquanto
na segunda usa-se toda a força disponível visando a total destruição do inimigo. A
Guerra Total, para Clausewitz, é impossível de ser atingida pelo Estado na prática,
existindo somente no campo teórico, diferente da primeira, em que a possibilidade
de sua execução é real. Portanto, a Guerra Total não existe no mundo real, e os
conflitos bélicos são sempre guerras limitadas63.
12.3 Os níveis da estratégia
12.3.1 Nível Tático
O nível tático é a esfera a qual fatores como o clima, relevo, disposição das
tropas no campo, sua quantidade e estado, entre outros, são levados em conta. Em
suma, é o nível das batalhas, o qual regimentos e batalhões, por exemplo, seguindo
ordens de seus comandantes em campo, movimentam-se em engajam em combate
considerando os fatores anteriormente citados64. Analogamente, no caso da Guerra
da Cisplatina, a execução de formações navais de combate visando o engajamento
de uma determinada frota com uma inimiga é uma ação de nível tático, por exemplo.
12.3.2 Nível Operacional
Muitos estudiosos definem esta camada como sendo a soma das partes táticas.
Porém, tal afirmação é incompleta, visto que o nível operacional conjuga mais do
que somente os componentes táticos. Nesta camada, encontra-se o famoso teatro de
operações, que como visto anteriormente, compõem-se, de maneira simplificada,
63 Clausewitz, 1962 apud Scalercio, 2015. 64 Luttwak, 2009.
42
das frentes de batalha e de ações diversas – como destruição de alvos estratégicos
que minam a capacidade de esforço de guerra do adversário ou até mesmo o
freamento de um avanço inimigo por meio de uma barragem de artilharia. De
maneira simples, é possível dizer que este nível conjuga o anterior e soma outros
fatores extremamente relevantes para o resultado final de uma campanha.
13 Teatro de Operações em Terra
13.1 A função do general
Nos gabinetes de guerra, a grande maioria dos delegados estarão
representando generais – alguns até marechais – isto é, militares no topo da
hierarquia. Desse modo, tais representações possuirão poder praticamente total para
deliberar ações a serem seguidas no teatro de operações com o intuito de vencer a
guerra, desde manobras em nível tático até movimentações de exércitos inteiros na
esfera operacional. É importante ressaltar ainda que os comandantes nos gabinetes
de guerra possuirão, além do controle de suas tropas, obrigações para com as
mesmas, como a manutenção de sua integridade frente a danos infligidos pelo
inimigo e outras adversidades, o cumprimento de seus objetivos bélicos e a
manutenção do diálogo com os gabinetes de crise – que, por sua vez, necessitam de
constante e ampla informação para desempenharem seu papel de maneira efetiva.
Ademais, os generais e outros comandantes devem ter em mente que, durante
a campanha, o conhecimento destes acerca dos níveis de estratégia e dos fatores que
compõe a guerra influenciarão na qualidade de seu trabalho. Em uma batalha, é
essencial, por exemplo, o comandante possuir a ciência de que um ataque direto em
uma posição inimiga fortificada em um relevo acidentado dificilmente trará a
vitória para seus homens, sendo tal resultado possível de ser uma reviravolta em
toda a campanha militar, marcando o declínio de uma certa estratégia ou período da
guerra. Portanto, a função do general, apesar de conferir poderes, também apresenta
obrigações importantes, o responsabilizando pelas derrotas e o glorificando pelas
vitórias. Ademais, é essencial conhecer as capacidades militares de suas partes, do
43
inimigo, bem como informações acerca do campo de batalha e do teatro de
operações como um todo e ter sempre em mente seu objetivo.
13.2 Movimentação de exércitos
Qualquer movimentação de tropas – desde um grupo de combate até um corpo
de exército – só será executada mediante envio de uma ordem escrita ao GruCon.
Neste documento deverão constar o(s) remetente(s) e as devidas especificações
determinadas – por exemplo, as tropas que farão o movimento e a localização exata
do destino final, assim como quaisquer outras instruções que devam ser passadas e
efetivadas. É extremamente importante ressaltar que ordens incompletas nos
quesitos anteriores não serão executadas pelo GruCon, sendo o remetente
devidamente notificado do fato. Logo, faz-se fundamental que as ordens enviadas
sejam as mais claras e completas possíveis, visando evitar contratempos que podem,
por sua vez, favorecer um inimigo que tenha emitido uma ordem de movimentação
clara e obtenha vantagem disto sob a parte que não o fez.
Nos gabinetes de guerra serão disponibilizados mapas, tanto do teatro de
operações quanto do nível tático (se for o caso), para que os delegados possam ter
total ciência da situação geográfica e do posicionamento de tropas amigas e até
inimigas (estas últimas desde que haja um reconhecimento prévio ou engajamento).
Ademais, informações de clima e adversidades serão informadas pelo Grupo de
Controle, se houver. Por fim, os generais podem, ou não, optar por terem exércitos
próprios, sob sua única e exclusiva responsabilidade. Se prosseguirem com esta
opção, o diálogo com os colegas de gabinete não se findará, uma vez que o
planejamento e a coordenação entre as forças é fundamental num conflito armado;
o que ocorrerá, portanto, será a maior autonomia de cada delegado para atingir
metas e objetivos bélicos. Por outro lado, ressalta-se que um gabinete de guerra
mais coeso permitirá maior cooperação de seus membros. Assim, ficará a cargo dos
delegados a escolha, que deverá ser informada o mais rápido possível ao GruCon.
44
13.3 O uso de ferramentas de reconhecimento
Geralmente, cada corpo de exército possui um destacamento para
reconhecimento de campo, que tem como função trazer informações acerca do
terreno e posições inimigas no campo de batalha. Tais destacamentos, também
conhecidos como batedores, são formados por um grupo de cavalaria leve e
tradutores, que por sua vez extraem informações através de conversas com civis
locais. Para que seja feito o reconhecimento, é necessário ao menos um general
emitir ordem com tal fim. Ressalta-se que não necessariamente o reconhecimento
será bem-sucedido, uma vez que o destacamento pode ser destruído por
engajamento, capturado ou simplesmente não conseguir as informações devidas.
Este fator depende sobretudo do número de unidades inimigas presentes na área e
o acaso. Ademais, os destacamentos possuem um limite de distãncia operacional,
que será definida e informada logo ao início da simulação.
14 As Operações Navais
14.1 A função do almirante e vice-almirante65
Na Marinha Argentina, o Almirante tem a decisão final sobre as decisões
táticas, estratégicas e sobre o posicionamento dos navios, mas essa decisão pode ser
revertida por instâncias superiores, caso os políticos rio-platenses julguem o
comando de seu almirante ineficiente, ou pode ser convocado um conselho de
guerra para reverter a situação. Entretanto, o almirante não pode nem comprar
navios nem dar patentes de corso, cabendo ao governo fazer isso, por meio de seu
ministro. O Almirante, em suma, é responsável pelas estratégias e posições militares
de campo.
Os oficiais da marinha brasileira de maior graduação tinham prerrogativas e
direito assegurados por carta-patente individual assinado pelo monarca, sendo
considerados os oficiais de maior status dentro da Marinha, e tinham estudo teórico
consolidado. Eram nobres e tinham o conhecimento das ciências, e por isso se
65 Associação da Turma Aspirante Conde, s/d.
45
consideravam superiores. No caso brasileiro, as esquadras já foram designadas seus
comandos, e na ocasião de junção de forças, o comando geral deve ser designado
pela maior autoridade, tanto o comandante da Marinha ou pelo Imperador. Vice-
almirantes têm controle operacional e tático das suas forças designadas.
15 Bibliografia
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