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LIDERANÇA | Por Peter Barth A escolha de um presidente (III) Sucesso versus poder: afinal, o que motiva um dirigente eficaz? 28 | T&D INTELIGÊNCIA CORPORATIVA ED. 168 / 2011 Motivação

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LIDERANÇA| Por Peter Barth

A escolha de um presidente (III)

Sucesso versus poder: afinal, o que motiva um dirigente eficaz?

28 | T&D INTELIGÊNCIA CORPORATIVA ED. 168 / 2011

Motivação

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Muitos estudiosos têm atribuído o sucesso de certos dirigentes a uma poderosa necessidade de “realização” que le-varia esses indivíduos a procurar fazer algo

melhor ou mais eficientemente do que teria sido feito até então, por outros ou por eles mesmos. Ora, a necessidade de “realização” pode tornar um individuo mais eficiente e pode levar ao seu autodesenvolvimento, mas não parece conduzir, necessariamente, a um melhor desempenho gerencial.

Pelo contrário, de um dirigente espera-se que obtenha resultados através de pessoas ao invés de realizar as tarefas por si só. Especialmente nas grandes organizações, um dirigente que se deixasse conduzir por uma forte necessidade de “realização” logo tornar-se-ia um obstáculo ao funcionamento de sua organização e um impe-dimento ao desenvolvimento de seus colabora-dores. Uma publicação de David McClelland & David Burnham (“Power is the Great Motivator”, Harvard Business Review) enseja algumas refle-xões sobre aspectos psicológicos da atuação gerencial que nos parecem úteis e provocativas.

Uma série de estudos efetuados com mais de 500 executivos pertencentes a 25 grandes organizações americanas, através da aplicação de técnicas projetivas aos executivos e da realização de entrevistas com seus colaboradores, demons-trou que os dirigentes mais eficazes (entendendo--se como eficácia a obtenção de resultados pelos órgãos por eles chefiados, determinados através de dados objetivos como volume de vendas, lucratividade, índices de produtividade, etc.) ao invés de apresentarem grande necessidade de “realização” demonstravam grande motivação por poder (entendendo-se como necessidade de poder o desejo de influenciar pessoas).

Necessidade de afiliação

Por outro lado, os dirigentes mais eficazes demonstravam baixa necessidade de afiliação (entendendo-se como afiliação o desejo de ser querido pelos colaboradores, de ser popular). Os dirigentes “afiliativos” tendiam a abrir muitas exceções para seus colaboradores e procuravam “ficar bem” com todos, o que coincidia com um baixo desempenho dos órgãos que chefiavam. Do que foi dito acima, poderíamos sentir-nos ten-tados a concluir que o dirigente eficaz é aquele que busca o poder e que não se preocupa com as pessoas, mas esta seria uma conclusão tão falsa quanto apressada.

Em primeiro lugar, a necessidade de poder que caracteriza os executivos eficazes não está voltada para o seu engrandecimento pessoal, mas para o desenvolvimento da organização a que pertencem. O dirigente eficaz procura influenciar seus colaboradores para a consecu-ção de resultados alinhados com os objetivos da organização.

Autocontrole

Outra característica identificada nesses dirigentes refere-se a um considerável grau de autocontrole e de autodisciplina que eles demonstram e que impede que o poder seja exercido impulsivamente em detrimento dos colaboradores.

Finalmente, a baixa necessidade de afiliação não implica desconsideração do dirigente para com a pessoa dos seus colaboradores, mas num relacionamento mais objetivo e imparcial em que os esforços de todos estão alinhados com os objetivos da organização.

A partir dos três componentes psicológicos que integram o perfil do dirigente eficaz, iden-tificados no transcorrer dos estudos realizados

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por McClelland & Burnham, vejamos como atuam os executivos que apresentam diferentes com-binações dessas características motivacionais.

Impacto da necessidade afiliativa

Os dirigentes para as quais a necessidade “afiliativa” predomina tendem a tomar decisões desencontradas, ao sabor do momento, levados por impulsos, despertando facilmente a impres-são de terem favoritos e de serem injustos. Desta forma, tendem a criar um ambiente instável, no qual os colaboradores sentem-se perdidos, incapazes de prever o que poderá acontecer em seguida. Sem saber o que fazer ou como relacionar-se com seu superior, os colaborado-res perdem a clareza sobre os objetivos do seu trabalho, o que determina a queda do moral da equipe e a consequente queda da produtividade.

Necessidade de poder — perfil personalista

Os dirigentes motivados pelo desejo de poder, mas com baixo grau de autocontrole ou autodisciplina (poderíamos chamá-los de “per-sonalistas”), são algo mais eficazes do que os do tipo “afiliativo”. Seus colaboradores possuem moral mais elevado e um espírito de equipe mais elevado do que os colaboradores dos dirigentes do primeiro tipo, mas a relação destes com o superior processa-se em termos essencialmente pessoais e subjetivos. Admirando a figura do chefe, ou até mesmo temendo-o, os colabora-dores aglutinam-se à sua volta dedicando-lhe a lealdade que deveriam dedicar à organização à qual ambos, chefe e colaborador, pertencem.

Esse dirigente estimula um verdadeiro “culto da personalidade”, procurando a cada passo promover seu próprio engrandecimento. O espí-rito de equipe, principalmente inspirado na pes-soa do dirigente, facilmente arrefece, e, se forem

abandonados à própria sorte, os colaboradores não saberão o que fazer, tornando-se incapazes de tomar decisões independentemente.

Necessidade do poder – perfil institucional

O terceiro tipo de dirigente é o que apresenta alto grau de motivação para o poder, associado à elevada necessidade de autocontrole e à baixa necessidade de afiliação. Esse tipo de dirigente é também chamado de “institucional”, porquanto sua atuação fortalece a organização em que atua, na qual focaliza seus esforços e os de seus colaboradores. O dirigente “insti-tucional” consegue criar um clima conducente ao trabalho produtivo. Seus colaboradores são mais responsáveis, possuem clara noção dos objetivos a serem perseguidos e elevado espírito de equipe. Sua lealdade está voltada mais para

Peter Barth, psicólogo organizacional

e Master of Science in Management, é

palestrante internacional e atua há

mais de 40 anos no desenvolvimento de

habilidades de Liderança.

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a organização e menos para o seu chefe. Se necessário, será mais fácil substituí-lo por outro dirigente porque os membros da equipe estão altamente alinhados com os objetivos e cientes da importância de seu trabalho.

O fato de um dirigente possuir grande ne-cessidade de poder não implica que, necessaria-mente, ele o exerça de maneira autoritária. Pelo contrário, os dirigentes eficazes, no estudo em pauta, faziam com que seus colaboradores se sentissem fortes e autoconfiantes, enquanto que o uso de estilos autoritários obtém, geralmente, o efeito contrário de fazer as pessoas sentirem--se fracas e impotentes. Ainda com referência ao estudo, ficou estatisticamente comprovado que os dirigentes mais eficazes (os do tipo “ins-titucional”) tendiam a exercer o poder de modo mais democrático e participativo.

Características do dirigente eficaz

Continuando sua exposição, McClelland & Burnham acrescentam à caracterização do perfil psicológico do dirigente eficaz mais alguns pon-tos fundamentais:

1) O dirigente “institucional” preocupa--se, primordialmente, com a organização e sua continuidade. Inclusive, ele tende a participar de um grande número de entidades profissionais e participa de atividades associativas, assumindo responsabilidades e contribuindo para o pro-gresso e solidez de tais entidades.

2) Ele tem prazer em trabalhar. Longe de apenas procurar ser mais eficiente com o objetivo de livrar-se do trabalho ou obter os mesmos resultados com menor esforço, o dirigente “institucional” ajusta-se bem à disciplina da or-

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Necessidade de afiliação

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Comparação entre

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LIDERANÇA

O dirigente ‘institucional’ consegue criar um

clima conducente ao trabalho produtivo. Seus colaboradores são mais responsáveis, possuem

clara noção dos objetivos a serem perseguidos e elevado espírito de

equipe

ganização, oferecendo um exemplo construtivo para seus colaboradores.

3) O dirigente “institucional” está bas-tante propenso a subordinar seus interesses particulares aos da organização. Ele demonstra disposição para fazer mais do que simplesmente seria seu dever.

4) Ele possui um apurado senso de justiça. Ao lidar com seus colaboradores, ele demonstra que uma pessoa que se empenha pelo interesse da organização deverá obter uma justa recom-pensa pelos seus esforços.

5) O dirigente “institucional” é um indivi-duo amadurecido. Ao invés de procurar manipu-lar as pessoas, ele busca ajudá-las e orientá-las para que atinjam seus objetivos. Por outro lado, não é excessivamente defensivo e não se sente ameaçado quando criticado. De certa forma, age como se sua pessoa não estivesse em jogo no seu trabalho. Essa atitude lhe permite ter uma visão mais a longo prazo e evita que se julgue insubstituível ou indispensável.

Conclusões

A esta altura, podemos resumir o perfil

psicológico do dirigente eficaz: o dirigente

eficaz não é motivado pelo desejo de “rea-

lização”, mas pela necessidade de exercer

poder. O dirigente eficaz caracteriza-se por

um grande desejo de influenciar pessoas e

por baixa necessidade de ser querido, de

ser popular.

Não obstante, a necessidade de poder do

dirigente eficaz é controlada e disciplinada de

modo a voltar-se para o progresso da organi-

zação, e não para a obtenção de vantagens

pessoais. Os eventuais benefícios pessoais

que um dirigente viesse a auferir de sua

atuação seriam efeitos colaterais de seu de-

sempenho e não o objetivo de seus esforços.

Um dirigente com estas características tende

a melhorar o moral de sua organização e a

influir positivamente no seu desenvolvimento.

Reflexões finais

A essa altura, convido os leitores a refletir

sobre as conclusões do estudo de McClelland

& Burnham e sua aplicação a dirigentes em-

presariais e a líderes políticos de grande

projeção. Qual o perfil de um dirigente de

alto nível que nos ofereceria um melhor

prognóstico de uma contribuição eficaz ao

desenvolvimento de uma grande empresa ou

até mesmo de uma nação? Seria o afiliativo,

o personalista ou o institucional?No próximo artigo, o último desta série,

focaremos uma dimensão crucial da atuação de um dirigente: servir a si mesmo ou servir às pessoas e aos objetivos mais elevados da organização? Até lá.