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Ata da aula de arrendamento urbano de dia 26 de novembro de 2014
Ana do Carmo Santos Pinto
Arrendamentos de pretérito - regime transitório (2º Grupo)
Disciplina: Arrendamento urbano
Lisboa, novembro 2014
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Ata da aula de arrendamento urbano de dia 26 de novembro de 2014
No dia 26 de novembro de 2014, pelas 15 horas, na sala 5 da Faculdade de Direito da
Universidade Nova de Lisboa, foram lecionadas a décima sétima e a décima oitava
aulas da disciplina de Arrendamento urbano pela Doutora Regina Santos Pereira. As
mesmas versaram sobre o regime transitório aplicável aos arrendamentos de pretérito
(segundo grupo).
Este regime aplica-se aos contratos de arrendamento para a habitação celebrados antes
de 1990 e aos contratos de arrendamento para fins não habitacionais celebrados antes de
1995 (artigo 27º Lei 6/2006- NRAU). Estes contratos vêm previstos nos artigos 27º a
58º da lei nº 6/2006 (NRAU) que correspondem ao capítulo II das normas transitórias.
O princípio geral, previsto no artigo 27º, é que a estes contratos será aplicado o NRAU.
No entanto, existem algumas especificidades de regime transitório que é necessário ter
em conta.
Da denúncia pelo senhorio:
Como previsto no artigo 28º, nº2 NRAU não se aplica a este grupo de contratos a
denúncia pelo senhorio. Estes contratos não são, assim, denunciávies, pelo que se
mantém a característica do vinculismo.
No entanto, existe uma exceção a este regime presente no artigo 28º,nº3 NRAU. Nos
contratos celebrados para fins não habitacionais existe denúncia pelo senhorio.
Esta denúncia deverá ter uma antecedência de 5 anos e ocorre quando estamos perante:
a) trespasse, locação do estabelecimento ou cessão do arrendamento para o exercício da
profissão liberal; b)sendo o arrendatário uma sociedade, transmissão inter vivos de
posição ou posições sociais que determine a alteração da titularidade em mais de 50%.
O trespasse (1112º CC) consiste numa transmissão definitiva, por ato inter vivos, de um
estabelecimento comercial. Ou seja, ocorre uma mudança de inquilino.
Durante vários anos, o trespasse foi utilizado pelo inquilino de forma artificial. O
inquilino transmitia a outrem o estabelecimento comercial e o senhorio não tinha poder
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Ata da aula de arrendamento urbano de dia 26 de novembro de 2014
de denúncia. O que acontecia é que este era um negócio muito rentável para estes
inquilinos que pagavam rendas muito baixas e trespassavam indefinidamente a outrem
em troca de uma renda que lhes permitia lucrar com a situação. Com o NRAU o
senhorio obteve o direito de poder denunciar o contrato com este novo inquilino (com a
antecedência de 5 anos). É errado dizer que acabaram os trespasses. O que ocorreu foi
que devido a esta possibilidade de denúncia por parte do senhorio, se tornou menos
rentável para o inquilino trespassar a outrem.
A locação de estabelecimento (1109º CC), implica uma transmissão temporária, por ato
inter vivos , de um estabelecimento comercial. Neste caso, o inquilino chama uma
terceira pessoa para a relação para explorar o seu estabelecimento comercial, mas o
inquilino não muda, mantém-se o mesmo. A locação de estabelecimento corresponde à
antiga cessão de exploração.
A cessão do arrendamento para profissão liberal (1112º CC) consiste na transmissão
definitiva por ato intervivos da posição de arrendatário para o exercício de profissão
liberal. Neste caso o inquilino muda.
Fernando de Gravato Morais exemplifica outras hipóteses que podem ser tidas em
conta, para além do trespasse e da locação de estabelecimento1, e que poderão ser à
mesma enquadráveis no antigo artigo 26, nº6, a)2, tais como: o usufruto do
estabelecimento comercial, a locação financeira de estabelecimento comercial, a
transmissão definitiva do estabelecimento comercial na sequência de fusão ou cisão de
sociedades, o penhor de estabelecimento comercial, a penhora de estabelecimento
comercial, o arresto de estabelecimento comercial, o arrolamento de esatabelecimento
comercial e a partilha do estabelecimento comercial por efeitos do divórcio. 3
1 Não é tida em conta a cessão do arrendamento para profissional liberal, pois o texto em questão é anterior à Lei 31/2012 e esta cessão surgiu com a referida Lei.
2 Este artigo é anterior à redação trazida pela Lei 21/2012, pois o texto em questão é anterior à mesma.3 Fernando de Gravato Morais, Novo regime do arrendamento comercial, 2011, pp 53-64.
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Quanto à transmissão inter vivos de posição ou posições sociais que determine a
alteração da titularidade em mais de 50%, esta é uma situação aplicável às sociedades
comerciais, mas “manifestamente difícil de aplicar no caso das sociedades anónimas”4.
O caso típico é o da cessão de quotas.
Existem vários negócios que podem ser integrados nesta transmissão. Fernando de
Gravato Morais, referindo-se ao antigo 26º, nº6, b)5, divide-os em dois grupos. O
primeiro relativo a alterações no contrato de sociedade, o segundo relativo à transmissão
de participações sociais. Quanto ao primeiro, pode estar em causa: um aumento do
capital social, uma redução do capital social, uma fusão ou cisão de sociedades, e uma
transformação de sociedades. Já quanto ao segundo, podemos estar perante uma
transmissão de quotas, uma transmissão de ações, um usufruto de participações sociais
ou um penhor de participações sociais.6
Estas várias figuras, que podem ser submetidas à transmissão inter vivos de posição ou
posições sociais que determine a alteração da titularidade em mais de 50%, são muito
importantes. Muitas foram criadas para fugir a esta terminologia, no entanto, é hoje
reconhecido que fazem parte desta transmissão inter vivos.
Cabe agora referir alguma jurisprudência importante nesta medida.
No acórdão do STJ de 11/9/2012 discutiu-se a inclusão de um negócio celebrado pelo
inquilino na transmissão inter vivos de posição ou posições sociais que determine a
alteração da titularidade em mais de 50%. Argumentou-se que se não houvesse entrada
de novos sócios na sociedade não se poderia incluir esta situação na alínea b) do artigo
28º,nº3. O Supremo entendeu que o facto de não haver novos sócios não impede a
qualificação deste negócio no âmbito do artigo referido.
O acórdão da Relação de Lisboa de 11/9/2012 prende-se com a mesma questão, relativa
à possível entrada de novos sócios.
Não nos esqueçamos que decidir pela aplicação do artigo 28º,nº3 significa permitir a
denúncia pelo senhorio. O que faz sentido, pois, sendo o arrendamento um contrato
4 Soares Machado, Regina Santos Pereira, Arrendamento urbano (NRAU), 2014, p 336.5 Este artigo é anterior à redação trazida pela Lei 21/2012, pois o texto em questão é anterior à mesma.6 Fernando de Gravato Morais, Novo regime do arrendamento comercial, 2011, pp 64-70.
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intuito personae, se há um mudança de inquilino, o senhorio deve poder denunciar o
contrato.
É também muito importante nesta matéria o acórdão de 23/2/2010 da Relação do Porto.
O 28º, nº4 refere-se à “presente lei”, sendo a Lei 6/2006 (NRAU) a que deve ser
entendida como a presente lei.
Em conclusão: em regra não há denúncia do senhorio, com a exceção dos contratos de
arrendamento não habitacional (prevista no 28º, nº3 NRAU). Deve haver uma
antecedência de 5 anos e devemos estar perante uma da situações previstas no artigo
28,nº3 NRAU.
Da denúncia para habitação:
O regime desta denúncia é igual ao regime previsto para o 1º grupo de contratos,
previsto no capítulo I das normas transitórias do NRAU.
Sendo que o regime do 1º grupo de contratos já foi tratado em aula prévia, irão apenas
ser referidos os pontos mais importantes.
Esta denúncia vem prevista no artigo 26,nº4, alínea a). Tem requisitos substantivos, que
são aplicáveis a todos os contratos de arrendamento e não só aos pretéritos, nos termos
do artigo 1102º CC. Algumas especificidades dos arrendamentos de pretérito são:
Nos termos do 26, nº4, a), continua a aplicar-se o 107º do RAU, pelo que o direito de
denúncia não pode ser exercido quando o inquilino tenha mais de 65 anos, invalidez
absoluta ou incapacidade total .
Nos termos do 1102, nº1 CC, quanto aos requisitos formais, deve ocorrer o pagamento
de uma indemnização, uma vez que não houve um incumprimento por parte do
inquilino. O valor da indemnização corresponde a um ano de renda de 1/15 do valor
patrimonial (e 26/4/a) NRAU).
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A forma de comunicação vem prevista no 1103º, nº1 CC.
Para além de tudo o que foi dito, o senhorio deve ir residir efetivamente para a
habitação em causa durante 2 anos, nos termos do 1103º, nº5 CC. Sob pena de sanção
prevista no 1103º, nº9 CC e calculada nos termos do 35/2/a) e b) NRAU.
Da denúncia justificada:
Parte do regime desta denúncia é igual ao regime previsto para o 1º grupo de contratos,
previsto no capítulo I das normas transitórias do NRAU.
Sendo que o regime do 1º grupo de contratos já foi tratado em aula prévia, irão apenas
ser referidos os pontos mais importantes.
Esta denúncia vem prevista no artigo 26º, nº4, a) NRAU.
Os requisitos substantivos vêm previstos no 1101/b) CC. Cabe aqui referir o DL nº
157/2006 de 8 de Agosto e as obras que obrigam à desocupação do locado (podendo
estas ser obras com ou sem controlo prévio).
Os requisitos formais, previstos no 1103, nº6 , nº7 e nº8 CC , implicam que o senhorio
pague uma indemnização ao inquilino ou que o realoje. O pagamento da indeminização
deve ser feito nos termos dos artigos 35/2/a) e b) e 26/4/b) NRAU quanto aos contratos
pretéritos.
Há, no entanto, uma mudança no âmbito da denúncia justificada, no que toca ao 2º
grupo de contratos (o que está em análise na presente ata): se o inquilino tiver 65 ou
mais anos ou uma incapacidade superior a 60% o realojamento é obrigatório. Isto é,
nestes casos, o senhorio é obrigado a realojar o inquilino. Este realojamento deve ser
realizado em condições análogas às que o inquilino já detinha quanto ao local, ao valor
da renda (limitações) e encargos. E deve ser celebrado um contrato de duração
indeterminada e sem poder de denúncia por parte do senhorio. Isto, nos termos do 25º,
nº1 e 9º do DL 157/2006. Este é um bom exemplo de que, apesar das intenções
legislativas presentes no NRAU, o vinculismo não acabou totalmente.
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Existem algumas precisões que são importantes:
Neste novo contrato, a renda fica dependente dos ganhos do inquilino.
A nova casa não tem de ser do antigo senhorio. Sendo que o novo senhorio tem de
aceitar um contrato de duração indeterminada.
As condições de realojamento são aferidas no momento em que a denúncia produz
efeitos.
O senhorio deve ir residir efetivamente para a habitação em causa durante 2 anos, nos
termos do 1103º, nº5 CC. Sob pena de sanção prevista no 1103º, nº9 CC e calculada nos
termos do 35/2/a) e b) NRAU.
A atualização das rendas
Esta vem prevista nos artigos 30º a 37º e 50º a 54º do NRAU. É apenas aplicável a este
2º grupo de contratos. O objetivo deste regime da atualização das rendas é diminuir o
vinculismo e o associado congelamento das rendas.
Nas palavas de Menezes Leitão, “em ordem a corrigir a grande desactualização que se
tem mantido em relação ao valor da renda nos arrendamentos habitacionais (...) e (...)
não habitacionais(...), a lei vem admitir a possibilidade de o senhorio efectuar (...) e uma
actualização da renda(...).”7
Esta é uma matéria geradora de muita discussão doutrinal e de muita jurisprudência.
Algumas ideias introdutórias:
A aplicação deste novo regime depende da iniciativa do senhorio, pelo que o regime não
é obrigatório.
7 Menezes Leitão, Arrendamento urbano, 2012, p 189.
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O valor da nova renda é vinculado a: 1/15 avos do valor patrimonial do imóvel e aos
rendimentos do agregado familiar do arrendatário. Isto significa que não há uma
negociação do valor da renda. A atualização das rendas tem um valor máximo e um
valor mínimo. Não pode ser maior que o correpondente a 1/15 avos do valor patrimonial
do imóvel. Para além disso, o valor máximo pode nem ser de 1/15 avos quando o
inquilino se encontrar numa situação de carência económica, nesse caso a renda será
atualizada em função dos seus rendimentos.
Regime e duração do contrato (ideias gerais):
O senhorio passa a ter a possibilidade de impedir a renovação automática do contrato,
de denunciar o contrato. Este passa a poder fazê-lo através daquilo que a lei chama
“transição para o NRAU”8. Agora o senhorio pode estabelecer que o contrato passa a ser
de prazo certo. Na falta de acordo quando à duração do contrato considera-se o mesmo
celebrado pelo prazo certo de 5 anos.
Existem exceções a esta “transição para o NRAU”: Nas situações em que a idade do
inquilino seja igual ou superior a 65 anos, ou em que este possua uma incapacidade
superior a 60%, o vinculismo do contrato continua a existir e o contrato não se
transforma em contrato com prazo certo.
Outra exceção, desta feita ao período de 5 anos, ocorre, nos contratos de arrendamento
para a habitação, no caso do arrendatário possuir carência económica, e, nos contratos
de arrendamento para fins não habitacionais quando estejamos perante uma micro-
entidade, uma associação privada sem fim lucrativos ou uma república de estudantes.
Nestes casos, o prazo total do contrato será de 7 anos (5+2).
O que acontece é que, depois de o senhorio escrever uma carta a manifestar a sua
intenção de terminar o contrato dentro de 5 anos, o inquilino responde afirmando que se
encontra dentro de uma das exceções previamente referidas (por exemplo, é uma
residência de estudantes). Assim, ao fim dos 5 anos, o senhorio deverá iniciar de novo o
processo, escrevendo outra carta. Nessa altura, se não houver acordo entre ambos, a lei
estabalece o novo período de 2 anos.
8 Esta denominação é criticável. Os contratos de arrendamento em causa já estão sujeitos ao NRAU, e esse é o princípio geral. O que ocorre é que estes contratos têm especificidades.
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Por fim, existe ainda outra exceção ao período de 5 anos. O princípio geral é o de que o
contrato termina dentro de 5 anos. No entanto, se o senhorio quiser antecipar essa
situação poderá fazê-lo, mediante o pagamento do valor correspondente a 5 anos de
renda.
Dos contratos de arrendamento para a habitação (secção II- artigos 30ºss):
O regime geral vem previsto no artigo 30º NRAU. O processo começa através do envio
de uma carta registada, com aviso de receção, da parte do senhorio ao inquilino (nos
termos do 9º e 30º NRAU).
A primeira carta, do senhorio, é de teor livre. Esta deve incluir uma proposta de nova
renda (esta proposta é totalmente livre); uma proposta de tipo e duração do contrato
(não têm obrigatoriamente de ser os 5 anos previamente referidos); a indicação do valor
do locado; e uma cópia da caderneta predial (artigo 30º NRAU).9
O inquilino tem 30 dias para responder (nos termos do 31º, nº 1 NRAU). Este prazo de
30 dias aplica-se a todas as cartas trocadas entre senhorio e inquilino. Se esse prazo for
ultrapassado, considera-se que aquilo que foi dito em último lugar está aceite por quem
não cumpriu o prazo. Este prazo tem muita importância pois dá segurança jurídica a esta
troca de cartas.
Existem várias situações possíveis de resposta do inquilino (“meios de defesa”, nas
palavras de António Soares da Rocha10):
“A lei define exactamente qual o sentido da resposta do arrendatário (...), não podendo
este optar por um dos sentidos previstos neste artigo e, mais tarde, não concordando
com a resposta do senhorio vir a responder noutro sentido já numa fase posterior do
processo de actualuzação de renda. (...) o arrendatário deverá reflectir antes de optar por
uma das vias que a lei lhe confere.”11
9 É importante referir que tem estado a ser discutida no parlamento uma proposta de lei que visa alterar as regras relativas ao teor desta carta. Segundo esta proposta, o teor da carta virá a ser mais exigente. A carta do senhorio terá, assim, de indicar aquilo que o inquilino pode responder. O inquilino, ao ler a carta, terá de ter logo uma noção do que pode ocorrer, consoante se cinja às hipóteses dadas pelo senhorio, ou não. 10 António Soares da Rocha, O essencial sobre o arrendamento urbano , 2013, p 103.11 Soares Machado, Regina Santos Pereira, Arrendamento urbano (NRAU), 2014, p 345.
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- Em primeiro lugar, o inquilino pode não responder. Neste caso considera-se aceite o
que o senhorio disse, tendo aplicação 90 dias (60+30) após a comunicação do senhorio
(artigo 31º, nº6 NRAU).
-Em segundo, o inquilino pode aceitar (artigo 31º, nº3, a) NRAU). Neste caso, as
propostas do senhorio aplicam-se 60 dias após a receção da resposta do arrendatário
(artigo 31º, nº7 NRAU).
-Em terceiro lugar, o inquilino pode denunciar o contrato (artigo 31,nº3, alínea d)
NRAU).12
As consequências da denúncia são: o dever de entrega da casa 90 dias após a resposta
do inquilino (artigo 34º NRAU); a não atualização da renda (artigo 34º NRAU); e a
possibilidade de haver direito a benfeitorias (29º,nº2 NRAU e 1273º a 1275º CC).
A denúncia do contrato levanta algumas questões.
Nomeadamente, quando o inquilino queira receber uma indeminização pelas obras
realizadas no imóvel durante o contrato. O regime atual prevê o direito a benfeitorias
quando as obras sejam lícitas (quer do ponto de vista da autorização do senhorio, quer
da autorização administrativa), nos termos do artigo 29º, nº1 NRAU. Isto aplica-se a
todos os tipos de benfeitorias. Este direito a benfeitorias, no caso da denúncia, é
independente das cláusulas contratuais. Isto é, mesmo que exista uma cláusula no
contrato referente à renúncia pelo inquilino das benfeitorias, o inquilino tem direito às
mesmas. Esta opção legislativa é criticável do ponto de vista do equilíbrio na relação
entre senhorio e inquilino.13
Em sentido contrário, Menezes Leitão afirma que “no caso, porém, de o contrato ser
denunciado pelo arrendatário por não aceitar a actualização da renda ao abrigo das
disposições dos arts. 31º, nº3, d) e 51º, nº3, d) NRAU, ou ser denunciado pelo senhorio
com a antecedência mínima de cinco anos nos arrendamentos não habitacionais, ao
12 Esta foi uma situação que ocorreu muito com esta lei. Por exemplo, pessoas que só mantinham o arrendamento de determinado imóvel com fim a estadias esporádicas, optaram por esta opção uma vez que se tornou demasiado oneroso manter esse imóvel. Esta situação foi benéfica para o mercado de arrendamento uma vez que foram desocupados muitos imóveis que estavam adstritos a rendas muito baixas.
13 Existe uma proposta legislativa em discussão no parlamento que prevê que este direito a benfeitorias possa ser independente, para além das cláusulas contratuais, da autorização do senhorio. Ou seja, o inquilino terá direito a benfeitorias mesmo quando o senhorio não tenha autorizado as obras. Esta é uma opção também muito criticável do ponto de vista do equilíbrio na relação entre senhorio e inquilino.
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abrigo do 28º, nº3, NRAU, o arrendatário tem direito à referida “compensação” por
obras licitamente feitas, independentemente do que tiver sido convencionado pelas
partes em relação a esta matéria (29º, nºs 2 e 3 NRAU). Apesar da violação da
autonomia privada que implica, esta solução compreende-se pois, embora o arrendatário
tivesse realizado as obras sabendo que o contrato não lhe permitia solicitar ai senhorio o
reembolso das mesmas, a verdade é que contava tirar delas o proveito resultante do
arrendamento ser vinculístico e a renda não vir a sofrer alteração significativa.
Deixando de se verificar essas circunstâncias, justifica-se que o arrendatário passe a
poder solicitar a restituição por obras licitamente feitas, independentemente do que tiver
sido convencionado.”14
-Por fim, o inquilino pode opor-se ao valor da renda (artigo 31º, nº3, b) NRAU) e
apresentar, ou não, um novo valor (artigo 33º, nº2 NRAU). Esta situação acaba por ser a
única que se assemelha a uma negociação.
Quanto às possíveis respostas do senhorio (sendo que também possui 30 dias para
responder- artigo 33º,nº1 NRAU):
-Em primeiro lugar o senhorio pode não responder. Neste caso considera-se aceite a
proposta do inquilino (artigo 33º, nº3 NRAU).
- Em segundo, pode aceitar a proposta do inquilino (artigo 33º, nº1 e nº4 NRAU). Neste
caso as propostas aplicam-se 60 dias após a receção da proposta pelo senhorio.
- Em terceiro lugar, o senhorio pode denunciar o contrato (artigo 33º,nº5, a) NRAU) se
quiser antecipar a entrega do imóvel. Para isso, deve pagar uma indemnização
correspondente a 5 anos de renda . Este valor deve ser calculado com base no valor
médio das propostas.
A indemnização pode ser agravada, nos termos do artigo 33º,nº6 NRAU. Esta situação
denota uma intenção legislativa no sentido de promover a desistência da denúncia por
parte do senhorio quando as propostas estejam próximas.
14 Menezes Leitão, Arrendamento urbano, 2012, p 200.
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Esta indemnização deve ser paga na data de entrega da casa (artigo 33º, nº9 NRAU). A
data de entrega vem prevista no artigo 33º,nº7, sendo, neste caso, de 7 meses (6+1), e no
artigo 33º,nº8, correspondendo, desta feita, a 13 meses.
Durante este período de tempo vigora a renda antiga ou a que o arrendatário propôs,
consoante a que for mais elevada (artigo 33º, nº10 NRAU).
-Por último, nos termos do artigo 33,nº5, b) NRAU, o senhorio pode atualizar a renda
para 1/15 avos do valor patrimonial, considerando-se, neste caso, que o contrato passa a
ter prazo certo de 5 anos. Os cinco anos contam-se a partir da carta enviada pelo
senhorio e a nova renda é devida 60 dias após a carta do senhorio.
Esta última hipótese de resposta do senhorio é a que lhe confere mais direitos.
Quanto ao regime excecional, este tem aplicação em várias situações:
- Em primeiro lugar, quando o inquilino alega, na sua resposta, carência económica. Isto
é, quando o seu rendimento anual bruto corrigido (RABC) seja inferior a 5 retribuições
mínimas nacionais anuais (RMNA), o que equivale a 35.350,00 Euros (artigo 31º, nº4,
a) NRAU).
Neste caso, o inquilino deve juntar à sua resposta o comprovativo do seu RABC (artigo
32º,nº1 NRAU). Se ainda não o possuir, deverá juntar o comprovativo do pedido
(artigo 32º,nº2 NRAU). Após a obtenção do documento deverá juntá-lo dentro de 15
dias (artigo 32º,nº2 NRAU).
O RABC refere-se ao rendimento do ano civil anterior (artigo 32º, nº3 NRAU). Este é
determinado nos termos do DL 158/2006 de 8 de Agosto.
O inquilino é obrigado a fazer prova anual do RABC, sob pena de não se poder
prevalecer da situação de carência económica (artigo 19º-A, nº2 do DL nº 266-C/2012
de 31 de Dezembro)15.
Quais são as consequências da aplicação do regime da carência económica?
15 Está em discussão no parlamento uma proposta de lei que implica uma possível revogação desta norma.
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Nos termos do artigo 35º, nº2, c) NRAU a renda é atualizada de acordo com o RABC do
inquilino, consoante os seguintes patamares: Até 500 Euros-10%; de 500,01 a 1500
Euros- 17%; de 1500,01 a 2945,83 Euros- 25%.
É importante referir que o teto máximo é sempre de 1/15 avos, independentemente de o
patamar em questão poder indicar um valor superior (artigo 35º, nº2 NRAU).
O valor apurado deve ser comunicado pelo senhorio e é devido dois meses depois dessa
comunicação.
A renda mantém-se inalterada durante 5 anos. Após estes 5 anos é atualizada para 1/15
avos do valor patrimonial. Por isso se intitula este regime de transitório.
O contrato só fica submetido ao NRAU no prazo de 5 anos a contar da resposta do
inquilino (artigo 35º,nº1).
Findos os 5 anos, o senhorio pode promover a transição para o NRAU (artigo 35º,nº6).
O inquilino não pode voltar a alegar carência económica , considerando-se o contrato
celebrado por 2 anos, na falta de acordo entre as partes.
“No caso do arrendatário não ter condições económicas para pagar o valor da renda
correspondente a 1/15 no fim dos cinco anos, deverá lançar mão dos mecanismos de
proteção e compensação social que, por ora, se encontram previstos nos artigos 6.º e
seguintes do Decreto-Lei 158/2006 de 8 de Agosto(...).”16
-Em segundo lugar, quando o inquilino alega e prova, na sua resposta, idade igual ou
superior a 65 anos e/ou incapacidade superior a 60% (artigo 31º, nº4, b) NRAU).
Neste caso, as consequências de aplicação deste regime são as seguintes:
O contrato só transita para o NRAU mediante acordo (artigo 36º,nº1 NRAU).
Para além disso, em relação à renda, têm aplicação o artigo 36º, nº2, nº3, nº4, nº5, sendo
que o limite máximo de atualização é de 1/15 avos do valor patrimonial (artigo 36º,nº6).
16 Soares Machado, Regina Santos Pereira, Arrendamento urbano (NRAU), 2014, p 359.
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-Em terceiro lugar, quando o inquilino alega e prova, na sua resposta, idade igual ou
superior a 65 anos e/ou incapacidade superior a 60% e situação de carência económica.
Aqui, as consequências da aplicação deste regime são uma “junção” do que foi dito
anteriormente. O contrato só transita para o NRAU mediante acordo (artigo 36º,nº1
NRAU) e a renda é atualizada segundo o RABC do inquilino (artigo 36º, nº7 NRAU).
Dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais (secção III- artigos 50ºss)
O regime geral tem semelhanças com o dos contratos para fins habitacionais, já
referido.
O senhorio pode tomar a iniciativa de transição para o NRAU, nos termos do artigo 50º.
Os requisitos deste artigo são iguais aos do artigo 30º, que já foram previamente
referidos, pelo que para lá se remete.
Quanto à resposta do inquilino, esta vem prevista no artigo 51º,nº1 e nº3 NRAU. Sendo
o regime deste artigo idêntico ao dos números 1 e 3 do artigo 31º, que já foram,
também, analisados, aqui terá apenas lugar uma breve exposição dos pontos mais
importantes:
Em primeiro lugar, este pode aceitar a proposta (artigos 51, nº3, a), 51º, nº7 e 31º, nº7)
NRAU).
Em segundo lugar pode opor-se ao valor da renda proposta, propondo novo valor
(artigos 51,nº3, b), 52º NRAU)
Em terceiro pode não responder (artigos 51,nº1 , 51º, nº7, 31º, nº6 NRAU).
Em quarto lugar pode denunciar o contrato (artigo 51,nº3, d) e 53º NRAU).
Quanto às possíveis respostas do senhorio tem de novo aplicação o artigo 33º (com
exceção do número 8) devido à remissão prevista no artigo 52º. Uma vez que o regime
do artigo 33º já foi analisado, para lá se remete.
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Em relação à atualização da renda, na falta de acordo, é aplicado o limite máximo de
1/15 avos do valor patrimonial (artigos 51º,nº 3 e 52º NRAU). Neste caso, não existe
regime de exceção relativo à situação de carência do inquilino.17
Quanto à celebração do contrato, na falta de acordo, considera-se celebrado por 5 anos
(artigos 51º,nº7 e 31º,nº7 NRAU).
Quanto ao regime excecional, este tem aplicação em várias situações:
Em primeiro lugar, quando o inquilino alega, na sua resposta que o locado funciona
como casa fruída por república de estudantes (artigo 51º,nº4, c) NRAU).
Em segundo lugar, quando existe no locado um estabelecimento comercial aberto ao
público que é uma microentidade (artigo 51,nº4, a) NRAU). Para uma empresa ser
considerada microentidade tem de cumprir dois dos requisitos previstos no artigo 51,
nº5 NRAU.
Em terceiro lugar, quando no locado se situa a sede de uma associação privada, sem fins
lucrativos, regularmente constituída, que se dedica a atividade cultural, recreativa ou
desportiva não profissional e declarada de interesse público ou de interesse nacional ou
municipal (artigo 51º, nº4, b) NRAU).
“(...) existiu da parte do legislador alguma incoerência quanto às situações previstas
nestas alíneas, que nada têm em comum e não representam um fio condutor(...).
Assim, os requisitos relativos aos casos de microentidade são tão amplos que vão
abranger um número elevadíssimo de situações que em vez de integrarem um regime de
exceção passarão a ser a regra.
Em sentido totalmente inverso a excepção relativa às casas fruídas por repúblicas de
esrudantes é tão imcompreensível quanto as escassas situações que irá abranger.”18
17 O facto de não se aplicar esta exceção teve efeitos no comércio, uma vez que não conceder aos arrendatários destes imóveis esta hipótese de influenciarem a atualização da renda, levou a que muitos abandonassem estes contratos.18 Soares Machado, Regina Santos Pereira, Arrendamento urbano (NRAU), 2014, p 385.
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Quais as consequências da aplicação deste regime excecional?
Na falta de acordo entre as partes, o contrato só transita para o NRAU no prazo de 5
anos (artigo 54º,nº1 NRAU), sendo que nestes 5 anos a atualização da renda está sujeita
ao limite dos 1/15 avos (artigo 54º, nº2 NRAU). Ou seja, “este regime de excepção tem
a consequência de impedir que o senhorio possa optar pelas seguintes soluções: a)
denunciar o contrato pagando uma indemnização correspondente a cinco anos de renda,
conforme previsto no artº 33º, n.º5, alínea a) ou; b) denunciar o contrato para o fim de
cinco anos, conforme previsto na alínea b) do referido preceito.”19
Passados estes 5 anos, o senhorio pode promover a transição, sendo que o arrendatário
não pode invocar novamente nenhuma das situações presentes no artigo 51º, nº4 e que,
na falta de acordo, o contrato se considera celebrado pelo prazo de 2 anos (artigo 54º,
nº6 NRAU). Sendo o prazo total então de 7 anos.20
Em conclusão: Esta lei tem o intuito de permitir aos senhorios acabar com os contratos
vinculísticos, sendo certo que essa situação poderá levar mais ou menos tempo.
Bibliografia
-Leitão, Menezes, Arrendamento urbano, 5ª Edição, Coimbra, Almedina, 2012.
-Machado, Soares, Pereira, Regina Santos, Arrendamento urbano (NRAU), 3ª Edição,
Lisboa, Petrony, 2014.
-Morais, Fernando de Gravato, Novo regime do arrendamento comercial, 3ª Edição,
Coimbra, Almedina, 2011.
-Soares da Rocha, António, O essencial sobre o arrendamento urbano, Porto, Vida
Económica, 2013.
19 Soares Machado, Regina Santos Pereira, Arrendamento urbano (NRAU), 2014, p 390.20 Está em discussão no parlamento uma proposta de lei que acarreta mudanças neste regime. Em relação ao aumento do segundo prazo de 2 para 3 anos e em relação a uma maior amplitude dos conceitos de associação privada e de microentidade.
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