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22 Rev. TST, Brasília, vol. 80, n o 1, jan/mar 2014 O DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO SAUDÁVEL * Ingo Wolfgang Sarlet ** I nicio saudando o ilustre Ministro Carlos Alberto Reis de Paula, Presidente desta Corte, em nome do qual agradeço aos demais Ministros aqui presentes pelo convite de participar de mais este evento e de abrir este Seminário. Também quero aproveitar a oportunidade para agradecer ao Desembargador do Trabalho Sebastião Geraldo de Oliveira, que coordena este grandioso evento, e toda equipe que evidentemente o auxilia neste processo, que está em sua se- gunda jornada no TST. Também agradeço ao Dr. Sebastião por alguns insights e informações que me auxiliaram muito a direcionar um pouco o tema da minha exposição inicial. Quero saudar as demais autoridades presentes, juízes do trabalho, advogados, profissionais e estudantes. Minha fala é novamente a fala de alguém que não atua especificamente no direito do trabalho. Sempre me sinto um pouco desconfortável como juiz de direito, juiz do Tribunal Regional Eleitoral e professor de direito constitucional, mas não do direito do trabalho, ao falar sobre um tema tão técnico como este que será debatido, nos próximos dias, por autoridades, até do exterior, como o professor de Coimbra, Dr. Duarte, e demais professores que aqui se fazem presentes e que saúdo neste momento. Por isso, minha preocupação – deixo também bem claro qual é o mote da minha fala – é tentar situar mais uma vez a problemática específica da se- gurança e da saúde no trabalho dos trabalhadores neste contexto mais amplo, que é o nosso marco constitucional brasileiro, e a abertura que esse marco tem oferecido não só para esse tema como para tantos outros que dizem respeito ao dia a dia da cidadania brasileira. Já que também estamos tratando de gestão de riscos e perigos, isso tam- bém traz consigo alguns riscos, porque a inserção do ambiente do trabalho no * Este texto constitui uma degravação de exposição oral. ** Juiz de Direito; doutor em Direito pela Ludwig-Maximilians-Universität München; pós-doutor pela Universidade de Munique; professor titular da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

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  • 22 Rev. TST, Braslia, vol. 80, no 1, jan/mar 2014

    O DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO SAUDVEL*

    Ingo Wolfgang Sarlet**

    Inicio saudando o ilustre Ministro Carlos Alberto Reis de Paula, Presidente desta Corte, em nome do qual agradeo aos demais Ministros aqui presentes pelo convite de participar de mais este evento e de abrir este Seminrio. Tambm quero aproveitar a oportunidade para agradecer ao Desembargador do Trabalho Sebastio Geraldo de Oliveira, que coordena este grandioso evento, e toda equipe que evidentemente o auxilia neste processo, que est em sua se-gunda jornada no TST. Tambm agradeo ao Dr. Sebastio por alguns insights e informaes que me auxiliaram muito a direcionar um pouco o tema da minha exposio inicial. Quero saudar as demais autoridades presentes, juzes do trabalho,advogados,profissionaiseestudantes.

    Minhafalanovamenteafaladealgumquenoatuaespecificamenteno direito do trabalho. Sempre me sinto um pouco desconfortvel como juiz de direito, juiz do Tribunal Regional Eleitoral e professor de direito constitucional, mas no do direito do trabalho, ao falar sobre um tema to tcnico como este que ser debatido, nos prximos dias, por autoridades, at do exterior, como o professor de Coimbra, Dr. Duarte, e demais professores que aqui se fazem presentes e que sado neste momento.

    Por isso, minha preocupao deixo tambm bem claro qual o mote daminhafalatentarsituarmaisumavezaproblemticaespecficadase-gurana e da sade no trabalho dos trabalhadores neste contexto mais amplo, que o nosso marco constitucional brasileiro, e a abertura que esse marco tem oferecido no s para esse tema como para tantos outros que dizem respeito ao dia a dia da cidadania brasileira.

    J que tambm estamos tratando de gesto de riscos e perigos, isso tam-bm traz consigo alguns riscos, porque a insero do ambiente do trabalho no

    * Este texto constitui uma degravao de exposio oral.** Juiz de Direito; doutor em Direito pela Ludwig-Maximilians-Universitt Mnchen; ps-doutor pela

    Universidade de Munique; professor titular da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul.

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    contexto mais amplo do Direito Ambiental, do direito fundamental e do dever fundamental com o meio ambiente vou depois tentar demonstrar isso ao longo da minha fala tem evidentemente muitas vantagens e, eventualmente, talvez tambm haja alguns riscos que precisam ser controlados de forma proporcional.

    Por isso, vou dividir minha fala em trs partes: em uma primeira parte, bem mais genrica, quero discorrer sobre a Constituio Federal de 1988 como a Constituio de um Estado Socioambiental. Evidentemente, isso tem algumas consequncias. Num segundo momento, um pouco mais rpido, quero situar ejustificaraprprianoodeumdireitofundamentalaomeioambientedotrabalho saudvel. A segurana j estaria implcita nesse meio do ambiente do trabalho saudvel. Na terceira etapa, ento, pretendo avanar com algumas consequncias jurdicas desse reconhecimento do direito fundamental ao meio ambiente do trabalho saudvel nesse contexto mais amplo do Estado socioambiental.

    Tenho um amigo de Coimbra, que o professor Joaquim Jos Gomes Canotilho, muito conhecido de todos aqui, que tem, entre tantos escritos, alguns sobre o direito ambiental, o direito constitucional do ambiente. No entanto, o professor Canotilho tambm tem um escrito muito interessante que trata do Estado adjetivado. Ele tenta demonstrar ali que, na verdade, a palavra Estado tem sido sempre acompanhada de uma srie de adjetivos: Estado Constitucional, Estado Democrtico, Estado de Direito, Estado Social e, nesta palestra, Estado Socioambiental.

    Por que inicio com esse aspecto? Eu poderia apresentar a noo de Estado Socioambiental como sinnima de tantos outros adjetivos que so utilizados em relao ao Estado: Estado Ambiental, Estado Ecolgico, Estado do Ambiente. So diversos adjetivos que autorizam o uso de forma, s vezes, indistinta e sinnima, mas tambm podemos estar referindo-nos a contedos distintos.

    Tenho partido da premissa e tambm escrito sobre isso: Estado Socio-ambiental, por vrias razes, no exatamente a mesma coisa que o Estado Ecolgico, que o Estado Ambiental ou que o Estado Social. Minha tentativa aquijustificarissonocontextodaConstituioFederalbrasileira,oquemeparece ser particularmente relevante para a incluso tambm da agenda do direito ao ambiente do trabalho e dos demais direitos sociais nesse contexto mais amplo da proteo e promoo do ambiente.

    Eu diria que no toa e no foi por coincidncia que nosso constituinte de 1988 incluiu a proteo do ambiente na ordem social junto com o direito previdncia,sade,aosdireitosculturais;enfim,aoutrasquestesquesabe-

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    mos.Poderiasercoincidncia.Nemsempresepode,realmente,afirmarquealguma coisa no projeto constitucional no tenha sido coincidncia. Parece-me que isso no foi uma coincidncia. Nossa Constituio um sistema socioam-biental, porque ela realmente, no meu sentir, aposta na proteo e na promoo integrada e harmnica das agendas social e ambiental.

    Nossa Constituio, tambm do ponto de vista histrico de sua produ-o, situa-se no rol daquelas constituies que ainda so pr-queda do muro de Berlim. No entanto, j uma Constituio posterior ao discurso cada vez mais integrativo, tambm no plano internacional da produo dos direitos humanos, entre a agenda dos direitos civis e polticos e a agenda dos chamados direitos sociais, econmicos e culturais, e agora ambientais. Ora, a noo de universali-dade e interdependncia de todos esses direitos uma noo que foi construda tambm ao longo do tempo na agenda da produo internacional dos direitos humanos. No era assim no incio. A agenda dos direitos humanos comeou partida, bifurcada, em 1966, e progressivamente foi sendo integrada. Isso me parece que tambm ocorre com a agenda ambiental em relao agenda social dos demais direitos sociais.

    O Estado Socioambiental brasileiro de 1988 segue sendo antropocn-trico. Nossa Constituio marcadamente, pelo menos em seu projeto inicial, antropocntrica e consagra a dignidade da pessoa humana no seu prtico. No entanto, hoje se fala, portanto, no antropocentrismo ecolgico, no antropo-centrismo alargado. nesse sentido que vamos evidentemente trabalhar aqui.

    Oquesignificaisso?Oquesignificaintegraraagendadosdireitossociais,econmicoseculturaisjuntoagendaambiental?Significavernoprincpioo dever de sustentabilidade e, evidentemente, no apenas um eixo. O eixo da sustentabilidade certamente no s do ambiente e da economia e tambm integra o social. Isso tremendamente complicado.

    At abrirei mo do meu protocolo. No intervalo, eu estava comentando com alguns colegas daqui o quanto difcil, hoje, implementar o discurso da sustentabilidade nas diversas agendas, especialmente nas que extrapolam do meio ambiente e da economia. Ora, no campo da sade e tambm da previdncia, isso se resulta evidente. O quanto estamos dispostos a abrir mo de aposenta-doria mxima e de prestaes, digamos assim, de contribuies, de preferncia mnimas, para assegurar s futuras geraes que tambm possam eventualmente se aposentar e, evidentemente, que no contriburam quase sobre a totalidade de seus salrios? Est muito difcil. Embutir sustentabilidade na previdncia social algo tremendamente complexo; na sade tambm.

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    O quanto as geraes presentes esto dispostas a investir em tecnologia de sade mxima para garantir o seu bem-estar e assegurar, ao mesmo tempo, para as prximas geraes os mesmos meios de proteo tambm mostra o quanto isso difcil. H quem sustente que seja insustentvel trabalhar com sustentabilidade nesses ambientes.

    Esses os pontos de vista, os crticos, dessa viso, digamos assim, alar-gada da sustentabilidade, como se fosse um metaprincpio projetado em todos os ambientes. No estou nem me situando a favor ou contra essas teses, mas apenas mostrando o quanto isso polmico.

    Tambm por parte dos ambientalistas a expresso socioambiental no bem-vinda, porque os adeptos da Deep Ecology, do egocentrismo, no concebem conciliar em paridade de condies e de hierarquia a agenda social trabalhista com a agenda ambiental. Na viso ecolgica no antropocntrica alargada, a agenda ambiental deve prevalecer sempre, em face das demais agendas. Na agenda antropocntrica social, a agenda ambiental deve ceder.

    a velha disputa que, essa, sim, como juiz cvel, j vivenciei vrias vezes, desocupao de reas de preservao ambiental repletas de moradias populares onde normalmente entram em choque a funo social da propriedade da posse e a funo ambiental da propriedade da posse. Portanto, isso apenas para tentar, num campo mais alargado, mostrar o quanto a conciliao dessa agenda social com a ambiental pode ser problemtica, embora me parea que seja a sada e o caminho proposto pelo nosso constituinte por vrias razes, uma das quais j manifestei.

    O Relatrio Brundtland, do nosso futuro comum, que de 1987, no qual foi cunhado, digamos assim, no plano supranacional a ideia de um princpio da sustentabilidade, tambm j reconheceu e enfatizou a relao entre pobreza e desigualdade social, economia e ambiente, aquela mxima que todos ns sabemos at hoje: poucos consomem e degradam muito basta olhar para os nossos irmos do norte , e muitos consomem pouco, vivem em condi-es de misria e sofrem mais o impacto ambiental. Por isso, o crescimento dos nossos refugiados ambientais. Isso pouco mudou nas ltimas dcadas. Se mudou, realmente, foi muito pouco.

    Por isso, em primeira linha, eu gostaria de vincular trs grandes princ-pios a essa questo tambm do direito fundamental ao ambiente do trabalho saudvel. O primeiro, a que j referi, o princpio e o correspondente dever de sustentabilidade necessariamente no Estado Socioambiental estruturado em trs eixos: econmico, social e ambiental, que, de algum modo, com toda sua

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    complexidadeedificuldade,devemconviverenoapenasprevalecerumsobreo outro. Portanto, a dignidade da pessoa humana e o livre desenvolvimento da personalidade , tambm no ambiente de trabalho, depende do desenvolvi-mento do progresso econmico e, ao mesmo tempo, deve garantir justia social.

    Tanto quanto possvel, depois, evidentemente, esse Seminrio tratar concretamente do assunto relacionado segurana do trabalho. O princpio dever de solidariedade entre e intrageracional tambm, evidentemente, assume aqui um papel de crescente relevncia, especialmente quando dele se deduzem deveres de cooperao entre os Estados, entre o Estado e sociedade e entre os particulares.Parece-mequeissoficoumuitobemevidenciadonasiniciativasqueoprprioTSTjtemtomado,ehojeacaboudefirmarmaisuma.

    O terceiro grande eixo a garantia e a promoo do assim chamado m-nimo existencial socioambiental. Na verdade, o princpio matriz desse Estado Socioambiental o domnio existencial socioambiental, ou seja, a projeo do mnimo existencial tambm para outras agendas a no ser as convencionais. No vou omitir o quanto pode ser concretizado. Tambm, evidentemente, um pouco mais difcil do que essa fala genrica que estou tendo com os senhores. Agora, essa agenda socioambiental, tambm na viso do professor Jos Joaquim Gomes Canotilho, ao mesmo tempo em que no pode ser agenda do Estado mnimo, tambm no pode gerar um totalitarismo, um dirigismo totalitrio socioambiental, que um dos grandes riscos que estamos correndo. Vou deixar esseespaoemabertopara,nofinal,maisumavezmeposicionarquantoqui-lo que muito difcil, nos nossos diversos ambientes, especialmente quando se fala para juzes, o quanto podemos ou devemos no ser fundamentalistas nessas questes.

    Se somos de uma agenda socioambiental, se queremos integrar o meio ambiente do trabalho ao meio ambiente em geral, no podemos trabalhar aqui com fundamentalismos, o que, fatalmente, alguma coisa equivocada vai acon-tecer. Isso, no ambiente do trabalho, emblemtico.

    Vamos agora para a segunda parte, depois dessas maiores generalidades, evamostambmtentarjustificarobvio,masnotobvioassim.Meioambiente, na Constituio brasileira, no foi consagrado como direito fun-damental.Estouafirmandoisso.OmeioambientenaConstituiobrasileirano foi consagrado, pelo menos, no expressamente, de partida, como sendo umdireito fundamental.No significaque elenoo seja.Aprevisodele,no nos arts. 5, 6 ou 7 da Constituio, mas, sim, na ordem social, no foi coincidncia, mas tambm pode ser no mais no Brasil, hoje, para alguns, e

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    no direito comparado, temos, sim, exemplos disso uma excluso da noo de um direito fundamental.

    Na Alemanha, meio ambiente no direito fundamental, no para a MagnaDoutrina,nonaprojeoconstitucional,umanormadefinidoradeumafinalidadedoEstado,aproteodasbasesnaturaisdavida,masnoumanorma de direito fundamental. Em Portugal, boa parte dos juristas o nosso professor de l sabe melhor do que eu sustenta, como Carla Amado Gomes uma das grandes autoras de Lisboa nesse assunto , que meio ambiente no um direito subjetivo. A proteo se d atravs de direito objetivo, e assim por diante. Na Alemanha, todos sabem, temos at um jurista alemo aqui que quer a incluso da proteo ambiental na Constituio, mas que, absolutamente, em nadasignificoudemelhoriadaproteodoambientenaquelepasalmdaquej havia antes da incluso dessa norma na Constituio.

    Com isso, no estou dizendo que sou contrrio noo do meio ambiente como direito fundamental, estou dizendo que no lcito que a proteo do ambiente, embora tenha status constitucional, tenha condio de um direito fundamental. No caso brasileiro, isso tem sido superado, como todos sabem, e, por isso, no vou bater mais nesse assunto, deciso do STF.

    Em geral, aceitamos essa ideia genrica de direito fundamental ao meio ambiente, embora, em concreto, nem sempre se sabe muito bem do que se est a falar. Seno, levamos para outra dimenso. O art. 225 da Constituio enuncia a proteo do ambiente: o direito do ambiente e o dever de todos a sociedade. Todavia, a partir do art. 225, temos uma srie de pargrafos que enunciam de-veres, princpios e regras em matria ambiental, com status constitucional, mas que, necessariamente, no correspondem diretamente a uma noo de direito fundamental. At que ponto todos os princpios que compem o art. 225 e re-gras so tambm normas de direitos fundamentais? No so. Esse um debate em aberto, at porque boa parte deles remete legislao infraconstitucional, como, por exemplo, a educao em matria ambiental e outras. E nem sempre se est ali diante de princpios fundamentais. Se assim fosse, toda ordem social seria uma Carta de Direitos Fundamentais e, na Constituio brasileira, no teramos mais nada a no ser direitos fundamentais, o que, evidentemente, incompatvel, mesmo com a interpretao generosa da nossa Constituio.

    Pois bem. No caso do ambiente do trabalho, talvez fosse, para alguns, mais interessante mant-lo longe da proteo ambiental como um todo, at por-que, no caso de proteo do ambiente de trabalho, no h dvida. As principais normas constitucionais brasileiras colocadas, ainda que no expressamente, mas que mencionem sempre o ambiente do trabalho, dizem respeito ao ambiente de

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    trabalho, tm, sim, status de direitos fundamentais. Todo o dispositivo do art. 7 da nossa Constituio, j da pessoa humana como princpio matriz, ali, no h dvida alguma de que se trata de normas de direitos e garantias fundamentais do trabalhador que, evidentemente, podem ser colocadas ou no num contexto mais amplo do direito fundamental ao meio ambiente, ou dever fundamental do meio ambiente com maior ou menor proveito. Mas a tese que vou sustentar no sentido de que sim: numa agenda socioambiental, o meio ambiente do trabalho, tanto na perspectiva individual quanto coletiva, deve ser, sim, inte-grado como norma de direito fundamental proteo mais ampla da agenda ambiental. S que, da condio de direito fundamental e de direito humano, na perspectiva supranacional, decorrem algumas consequncias.

    Essasconsequnciastambmnososempredefcilidentificao.Porqu? Porque, na verdade, o direito fundamental ao ambiente de trabalho seguro ou saudvel, assim como a proteo do ambiente em sentido mais amplo, no apenas um direito fundamental, isso para quem trabalha com teoria da Cons-tituio, coisa mais abstrata, mais formal, mas, pelo menos, j conhecida. Na prtica, isso nem sempre to fcil de perceber.

    Na verdade, tambm direito fundamental o meio ambiente do trabalho. Assim, para a proteo do ambiente lato sensu, na verdade, no um direito, um conjunto bastante complexo e diferenciado de direitos e de deveres, al-guns com as suas peculiaridades que, no seu conjunto, formam essa rede, essa teia normativa de direitos fundamentais que compe esse direito fundamental como um todo.

    Portanto, temos aqui tanto posies baseadas em normas expressas quanto implcitas, do ponto de vista constitucional. Os exemplos esto evidentes. O art. 225 da Constituio Federal tece, portanto, de forma alargada para incluir a proteo do ambiente, com destaque para o 1 do art. 225 da Constituio Federal. O art. 200, inciso VIII, j de citao recorrente, tambm da Justia do Trabalho, que integra a agenda do direito sade do SUS com o meio ambiente do trabalho. Depois, todos os dispositivos do art. 7, XXII, XXIII, XXIV, XXVIII e demais relacionados temtica, isso tudo compe esse direito fundamental ao meio ambiente do trabalho.

    Mas essas normas no so exatamente iguais na sua estrutura, no seu significado.Nosetrataexatamentedamesmacoisaemtodasashipteses.Isso, na perspectiva mais ampla dos direitos fundamentais, de algum modo, deve ser integrado, avaliado sistematicamente. Essas normas so completadas, integradas por legislao interna, infraconstitucional, que, por sua vez, quando essalegislao,dealgummodo,acabadeterminando,identificandooncleo

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    essencial desse direito fundamental na proteo do ambiente do trabalho, evi-dentemente, tambm deve ser incorporada essa proteo, como mais adiante veremos em concreto.

    No caso da Constituio Federal brasileira, reconhecer que temos um direito fundamental ao ambiente do trabalho saudvel seria reconhecer tambm para esses direitos fundamentais aquilo que se chama, em juridiqus, em linguagem constitucional, o regime jurdico pleno dos direitos fundamentais da Constituio Federal. Esse regime jurdico, tambm dos direitos fundamentais da nossa Constituio Federal, no um dado, um construdo.

    O regime jurdico dos direitos fundamentais da Constituio Federal brasileira hoje est muito menos expresso nela do que foi objeto de uma cons-truo da doutrina, nos ltimos 25 anos, mas especialmente da jurisprudncia brasileira, e no s do STF. Isso vale para o STJ, vale em matria trabalhista tambm ligada a esse assunto, ao TST, e vale, evidentemente, para o juiz de primeiro grau, que tem o poder de interpretar e aplicar a Constituio, e assim por diante. Um exemplo clssico disso quando a Constituio Federal brasileira dispe expressamente que as normas de direitos fundamentais, tambm essas do direito fundamental ao meio ambiente de trabalho, tm aplicao imediata, o quesignificaqueasnormasdedireitosfundamentaisteremaplicaoimediataest longe de ser bvio e resolvido no direito comparado. No direito comparado, prevalece a noo de que direitos sociais, inclusive a produo ambiental, no so normas de aplicao direta. Em Portugal assim.

    Em Portugal, a proteo do ambiente na Constituio, embora seja direito fundamental, por deciso expressa do constituinte, no norma de aplicao diretaproduodoambiente,normaqueexigeintensificaopelolegisladorinfraconstitucional. O mesmo vale para os outros direitos sociais bsicos, como sade, educao, moradia, etc.

    Na Espanha, a produo do ambiente princpio diretivo, objetivo da ordem social e econmica. O legislador no vincula diretamente o juiz, no vinculadiretamenteaAdministraoPblica,nodesafiarecursodeamparoao Tribunal Constitucional de modo direto. Portanto, tem o status jurdico completamente distinto do status de direito fundamental da nossa Constituio.

    O que a aplicabilidade imediata hoje no Brasil? Tambm para os direitos sociais e socioambientais foi construo jurisprudencial, sendo que todos esses direitos, de algum modo, submetem-se a essa regra da aplicabilidade e, portan-to, nenhum direito fundamental da nossa Constituio Federal brasileira pode

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    estar merc da inao ou da ao contrria do legislador infraconstitucional. Masissofoiafirmadoprogressivamente.Noeraassimhdez,quinzeanos.

    Todos sabem do exemplo do direito sade. Em 1999, o STJ dizia que era um direito programtico. S gera direito subjetivo na medida da lei. Isso mudou depois. Portanto, esse labor jurisprudencial que ajudou a dar conte-do a esse regime jurdico de direitos fundamentais tambm nessa esfera, em matria trabalhista.

    Sabemos o quanto difcil lidar com a aplicao direta das normas do art. 7 que remete o legislador: aviso-prvio proporcional, e assim por diante. Todos sabem disso. O que a aplicabilidade imediata nesse contexto? Isso no ocorre no ambiente do trabalho, porque as normas aqui, parece-me, so de fcil defesa na sua aplicabilidade imediata.

    Uma segunda consequncia dessa condio dos direitos fundamentais, e que no direito do trabalho mais tranquila, mas no tanto quanto no direito ao ambiente, no sentido amplo, que essas normas vinculam diretamente no s o Estado, mas tambm os particulares. Os senhores podem achar bvio que tambm os particulares esto vinculados diretamente s normas de direitos fundamentais, aos princpios constitucionais. Digo que no bvio porque, em quase todo o direito comparado, vigora outro princpio. Nos Estados Unidos, vigora o princpio de que apenas os rgos estatais esto vinculados diretamente Constituio: state action.Nosoloeuropeu,soberanaateoriadaeficciaindireta dos direitos fundamentais das relaes privadas.

    As normas trabalhistas vinculam diretamente os empregadores, mas no necessariamente as normas tiradas do direito fundamental ao meio am-biente, as normas gerais ambientais. Minha tese a de que, na medida em que sefazasomadaprofissodoambientedotrabalho,que,obviamente,temdeser direcionado, em primeira linha, aos empregadores, evidente que aqui seprecisasustentaraeficciadiretadessesdireitosfundamentaisambientaisnasesferasdasrelaesprivadas.Casocontrrio,ficainvivelaplic-lasdeforma consequente ao ambiente do trabalho. Isso uma hiptese, uma mera afirmaogenrica,masassimquefunciona.Seformoscomparar,estamosseguindo uma tradio, parece-me muito mais robusta em matria dos direitos fundamentais, inclusive ambientais.

    Reconhecer que o direito fundamental ao ambiente de trabalho um direito fundamental, no sentido prprio do termo da Constituio brasileira, reconhecer que essas normas so clusulas ptreas. Portanto, no podem ser suprimidas, pura e simplesmente, por uma emenda constitucional. reconhecer

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    tambm que elas esto, em alguma medida, submetidas clusula, proibio do retrocesso nessa esfera. Ainda que aqui eu no possa desenvolver o que significain concreto. Portanto, aqui, pelo menos, temos algumas consequncias importantes dessa condio de um direito fundamental ao meio ambiente de trabalho saudvel.

    Temos tambm a incluso da Agenda Internacional. Os autores, de certo modo, j incluem isso em seus livros. Todas as convenes, no s as da OIT, porque se integro a proteo do ambiente com a proteo do ambiente de trabalho do trabalhador, evidente que tambm tenho de considerar no s as convenes da OIT que evidentemente so as convenes especiais; o direito especial de transformar os direitos humanos em cada situao , mas tambm os tratados gerais dos direitos humanos que tratam da proteo ambiental, inclusive, quando falei de sustentabilidade, que o princpio geral do direito ambiental. Essas normas, no caso brasileiro, receberam, como todos sabem, o status de supralegalidade.

    O STF andou fazendo um upgrade nessa matria, antes deferia para dizer que legal, e, agora, defere o status de supralegalidade. Uma contradio que a doutrina em geral tem reconhecido, porque o STF, na verdade, conseguiu a proeza de reconhecer que parte dos tratados de direitos humanos tem hierarquia constitucional e boa parte no tem. Pessoalmente, sou crtico a essa opo do STF, que segue dividida no STF.

    O fato, minha gente, que o operador jurdico brasileiro, salvo excees, nem hierarquia legal d aos tratados. Essa a verdade. De acordo com a hierar-quia supralegal, ainda que no seja a opo ideal do STF, no meu sentir, hoje, qualquer juiz brasileiro do trabalho, juiz penal, assim por diante, ou at eu, no TRE, tem obrigao de fazer aquilo que a doutrina mais recente est chamando de controle de convencionalidade das leis, ou seja, interpretar a legislao in-fraconstitucional j existente, de acordo com as convenes internacionais. E se no for possvel fazer essa interpretao, rechaar a aplicao da norma interna em face da norma externa internacional que lhe superior hierarquicamente.

    A nica coisa que ainda pode ocorrer eventualmente um recurso ao STF, que poder, evidentemente, dizer: Aqui, minha gente, vai prevalecer a Cons-tituio. Essa norma da OIT pode at prevalecer sobre a CLT ou sobre outras normas internas, mas ela viola a Constituio. Enquanto isso no acontecer, prevalece a norma supralegal de matriz internacional.

    No sei como isso est acontecendo na Justia do Trabalho, mas sei que, em outras searas, continua no se fazendo o controle de convencionalidade,

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    porque, curiosamente e digo que infelizmente , a nica hiptese em que o STF, durante anos, debateu essa matria, foi a hiptese da priso civil, como se esse fosse o nico caso importante em matria de Direitos Humanos, em hierarquia interna dos direitos humanos. Esse exemplo polemizou toda a dis-cusso brasileira durante 25 anos, e, agora, quando est em causa. Cela de luxo para alguns polticos, evidentemente, entra em cena. Mas os demais direitos supranacionais, pouco no digo que no haja gente que os aplique e busque aplic-los, no isso , mas, proporcionalmente, muito pouco tem sido sequer considerados, mas fazem parte desse complexo normativo que integra esse direito fundamental no ambiente de trabalho, como os juristas j tm dito. Na prtica, pouco tem acontecido.

    Isso me leva para a ltima etapa e espero no estar me alongando de-mais.Oquesignifica,portanto,apartirdessearcabouoinicial,dessemarcosocioambiental, dessa condio de direito fundamental do meio ambiente do trabalho saudvel e seuperfil, seu regimento jurdicoposto demodomaisgenrico? Vamos avanar um pouco mais.

    Na teoria dos direitos fundamentais, temos os alexianos. Alexiano sig-nificaaquelequeleuRobertAlexy,queumautorqueficoumuitofamosonoBrasil e em outros pases, mas muito menos famoso no pas onde escreveu. Isso assim. H muita gente que faz muita fama no exterior, mas faz pouqussima fama no pas de onde ele vem. Esse o caso de Robert Alexy. Na Alemanha, Alexy no aparecia nem no ranking dos20juristas.Nosignificaquenosejaum autor importante. O que esse autor nos deixou de algo importante? Ele aposta bastante, como os demais da jurisprudncia, com sua maneira posta de que os direitos fundamentais tm uma dimenso subjetiva e objetiva. No plano subjetivo, todos sabem que direito aquilo que posso exigir de algum em juzo.Deformamuitosinttica,evidentemente,aqui,nadasofisticada.Todosos direitos individuais e coletivos. Do ponto de vista objetivo, todavia, novos direitos fundamentais se transformam em deveres essencialmente. E, enquanto deveres, tambm geram efeitos jurdicos que demandam concretizao e so muito mais ricos do que a condio de direito propriamente dita. Por que eles so mais ricos? Porque eles apostam na dimenso transindividual desses direitos e permitem, portanto, uma aplicao, uma efetivao muito mais sistemtica e produtiva do direito em seu conjunto, levadas a srio essa dimenso objetiva.

    Portanto, o primeiro aspecto que decorre dessa dimenso objetiva todos os juristas sabem que o Estado tem dever de proteo em relao aos direitos fundamentais, inclusive ao meio ambiente de trabalho, dentro do contextomaisamplodaproteoambiental.Oquesignificaissoemconcreto?

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    Que o Estado tem o dever de atuar, mediante aes fticas e normativas, para proteger e promover esse direito.

    De qualquer sorte, o fato que, em geral, a preveno est includa na precauo, que mais ampla. Mas o dever de precauo decorre de um dever de proteo do Estado em relao aos riscos para os direitos fundamentais, para sua proteo. Ento, o dever de precauo um desdobramento do dever de proteo estatal em matria de direitos fundamentais. Tanto que, na Alemanha, de l, eles deduzem o dever de precauo, da dimenso dos direitos fundamentais e dos deveres de proteo estatais.

    Muitobem.Issotambmsignifica,nadoutrinaconstitucionalcontempo-rnea, e o STF tem praticado isso em alguns momentos, j at mesmo em matria ambiental, que se o Estado tem o dever de proteo dos direitos fundamentais, essaproteonopodeficaraqumdenveismnimosdeeficcia,porqueseficaraqum,oEstadoviolaseudeverdeproteo.

    Como o Estado ou um particular, no campo trabalhista, violam dever de proteo? No fazendo nada para proteger os direitos fundamentais ou fazendo demenos.oquesechamadeproibiodeproteoinsuficiente,que,depoisda aplicao prtica, d certa dor de cabea. De qualquer sorte, um princpio que aqui tambm se aplicaria.

    Em matria de direito de trabalho, busco as sugestes que recebi de alguns amigos antes de vir falar aqui, para no falar muita bobagem. Alguns depoimentos importantes dessa matria que estamos falando: deveres de educao ambiental, que, na constitucionalidade, prev, no em matria traba-lhista,senoestouenganado,nohumaprevisoespecfica,naConstituioFederal, em matria trabalhista, mas h educao ambiental no art. 225 e na OIT. H a conveno da OIT. Esse somatrio, Conveno da OIT com o art. 225, realmente leva um dever de educao ambiental tambm para o ambiente e a vida no ambiente do trabalho. Sei que existem iniciativas nesse sentido, mas tambm evidentemente sei que esto bastante distantes de atingirem a necessria efetividade.

    Outro exemplo esse foi o professor Sebastio que me forneceu, hoje, ao meio-dia, almoo privilegiado: o que posso falar de concreto para nossos amigos? Dever de articulao da gesto e preveno do risco no processo produ-tivo. Parece-me um excelente exemplo. Esse exemplo se conecta com outro que retirei de um livro do Leonardo Wandelli, colega de trabalho, do Rio Grande do Sul, que O Dever de Organizao Saudvel no Trabalho, no qual apostamos em uma dimenso coletiva, ou seja, implica prticas de gerenciamento e direo

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    da organizao do trabalho que observe parmetros de proteo e promoo da sade, ambiente e segurana do trabalho. Ora, esse conjunto de deveres que legitima medidas jurdicas, mas tambm jurisdicionais de interveno nesses processos e mostra que a preveno e a precauo.

    Eu diria mais a preveno. Por que friso mais a preveno e menos a precauo? Precauo um princpio e dever importante, mas tambm sub-metido a uma srie de polmicas e riscos, porque lida com o incerto, e lidar com o incerto e por conta do incerto intervir em processos que, por sua vez, tambm garantem direitos fundamentais, bastante complicado. Por isso que autores como Cass Sunstein, nos Estados Unidos, que autor amigo do am-biente,diga-sedepassagem,temumaobraespecficachamadaThe Laws of Fear, ou seja, direito do medo, a qual diz que o princpio da precauo no o dapreveno,hipertrofiado,acabatendoefeitoparalisanteatsobreoutrosdireitossociaisefundamentaisrelevantes,seeleforhipertrofiado.Portanto,,no mnimo, polmica a absoluta presuno ou quase absolutizao da presuno de existncia de nexo em casos de precauo, no de preveno.

    Aqui temos um detalhe importante a ser observado. Obviamente, no problemtica, pelo contrrio, correta a inverso do nus da prova, aqui, como j tem sido praticado, no TST, com absoluta razo. A presuno do nexo em caso de risco, conhecido e devidamente atestado, uma coisa. A simples presuno do nexo em caso de diviso pode transformar at unha encravada desculpe-me a palavra em doena laboral. Claro que estou exagerando, mas para mostrar que eventual abuso nesses processos pode levar a um problema oposto, porque se quisermos integrar agenda da produo do trabalho, agenda ambiental de um modo geral, a superproteo do ambiente de trabalho no poder gerar desproteo do meio ambiente que no do trabalho.

    Assim,estcorretaaafirmaoquetambmouvidoDr.Sebastio,deque o direito ao meio ambiente acabou parando na porta da fbrica, durante um perodo, o que correto. errado que ele tenha parado, mas correta a afirmaodequeeleparou,tambmteveessecuidadoqueaproteoambientalcontinuasse fora da fbrica e dentro da fbrica de uma forma, no mnimo, sim-trica, e no desproporcional. Isso o que tem que ser cuidado nesses processos.

    Outro aspecto que me parece importante com isso, j vou terminan-do que no s o dever de eliminao dos riscos decorre dessa dimenso objetiva, mas tambm o dever de melhoria das condies, porque a proibio de retrocesso uma coisa, apenas implica que no posso voltar atrs de forma desproporcional e sem compensaes adequadas, de proteo do ambiente da sade e assim por diante, ou dos demais direitos sociais. Isso, por sua vez, no

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    basta, porque, hoje, temos nveis timos ou, pelo menos, prximos de realizao dos bens socioambientais. Isso uma situao.

    As estatsticas mostradas pelo nosso Presidente e tambm pelo Ministro mostramclaramentequeestamosaquiemumfrancodficitdeproteodomeio ambiente de trabalho. Precisamos mais do que proibio de retrocesso; precisamos, sim, dever de melhoria das condies de trabalho, de progressi-vidade aqui tambm, no apenas de regressividade. E aqui tambm me chama ateno, mas no sobre o direito do trabalho, e sim no ambiente de trabalho, ainda a tmida utilizao daquela ideia muito difundida no Brasil, do profes-sor Luiz Guilherme Marinoni, pelo menos foi o primeiro autor do processo a difundir mais essa ideia de que precisamos apostar, e tambm isso um dever constitucional, em tcnicas processuais adequadas para a tutela dos diversos direitos fundamentais. E a tutela inibitria essencial para efetivar o princpio da preveno. E a tendncia que se percebe que, ao mesmo tempo em que se faz o discurso da no monetarizao, mas simultaneamente se pratica a moneta-rizao, aposta-se muito mais em reparao do que em tutela inibitria. Portanto, proteo efetiva do ambiente do trabalho exige, por dever de coerncia, maior aposta em tcnicas inibitrias e, eventualmente, usar as reparatrias enquanto asinibitriasnoforemsuficientes,porquenovamospoderabrirmodasre-paratrias, evidentemente, mas temos de apostar mais nas inibitrias. Mas isso parece, s vezes, no interessar queles atores que tm a legitimidade processual para promover essas tutelas inibitrias, porque a Justia do Trabalho no pode agir de ofcio. Ento, ela precisa que os autores a provoquem com esses tipos de tutelas. Parece-me que so algumas dimenses que quis apresentar aqui.

    Espero que no tenha sido uma total perda de tempo, que um paraquedista do direito do trabalho vem aqui proferir uma palestra inaugural. Peo escusas naquilo que no pude ser bem compreendido ou das asneiras que eu possa ter dito e, mais uma vez, obrigado por estar aqui com vocs.

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