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www.cers.com.br OAB IX EXAME 2º FASE Direito Processual Penal Geovane Moraes e Ana Cristina Mendonça 1 PEÇAS DE LIBERDADE 1. PRIMEIRO PASSO: IDENTIFICAR QUAL A PEÇA OU INSTITUTO O CASO CONCRETO APRESENTA OU REQUER. Antes de falar propriamente do relaxamento da prisão em flagrante, da liberdade provisória ou da revogação da preventiva ou da temporária, é importante fazer uma breve análise das peças que podem ser requeridas a qualquer momento da persecução criminal e daquelas que podem ser requeridas na fase pré-processual. Assim, o primeiro passo para qualquer candidato que está se preparando para uma segunda fase da OAB é saber identificar qual a peça prática ou instituto jurídico que a questão requer. Da mesma forma, a identificação das peças possíveis e aplicáveis a determinado caso concreto dependerá, se for essa a hipótese, da identificação da espécie de prisão cautelar a que se submete o indiciado ou réu. Por tal motivo, devemos ter especial atenção ao que segue. 1.1. Peças práticas que podem ser requeridas a qualquer momento da persecução criminal I Habeas Corpus (HC) Pode ser intentado a qualquer tempo: antes ou durante o inquérito policial, durante a instrução criminal ou fase recursal ou após o trânsito em julgado da sentença penal. O limite para sua utilização será o fim da aplicação da pena privativa de liberdade. Vale ressaltar que o Habeas Corpus não é uma peça privativa de advogado, sendo esta a razão de ele não ser tão cobrado em questões práticas da OAB. Entretanto, continua sendo um tema de suma importância para as questões dissertativas, razão pela qual ele será devidamente analisado no momento oportuno. II Mandado de Segurança O mandado de segurança em matéria criminal é outra peça processual cabível em qualquer momento da persecução criminal, sendo mecanismo que visa, nos termos do art. 5º, inc. LXIX, da CF, proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. 1.2. Peças práticas que podem ser requeridas na fase pré-processual I Requerimento ao delegado de polícia É cabível quando se pretende diligências administrativas, cuja realização cabe ao delegado de polícia. Ex: Instauração de inquérito policial, arbitramento de fiança, exame de corpo de delito, realização de acareações entre outros. II Relaxamento da prisão em flagrante Cabível de prisão em flagrante ilegal. O pedido deve ser endereçado ao juiz. III Liberdade Provisória

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PEÇAS DE LIBERDADE

1. PRIMEIRO PASSO: IDENTIFICAR QUAL A PEÇA OU INSTITUTO O CASO CONCRETO

APRESENTA OU REQUER.

Antes de falar propriamente do relaxamento da prisão em flagrante, da liberdade provisória ou da revogação da preventiva ou da temporária, é importante fazer uma breve análise das peças que podem ser requeridas a qualquer momento da persecução criminal e daquelas que podem ser requeridas na fase pré-processual.

Assim, o primeiro passo para qualquer candidato que está se preparando para uma segunda fase da OAB é saber identificar qual a peça prática ou instituto jurídico que a questão requer. Da mesma forma, a identificação das peças possíveis e aplicáveis a determinado caso concreto dependerá, se for essa a hipótese, da identificação da espécie de prisão cautelar a que se submete o indiciado ou réu. Por tal motivo, devemos ter especial atenção ao que segue.

1.1. Peças práticas que podem ser requeridas a qualquer momento da persecução

criminal

I – Habeas Corpus (HC)

Pode ser intentado a qualquer tempo: antes ou durante o inquérito policial, durante a instrução criminal ou fase recursal ou após o trânsito em julgado da sentença penal. O limite para sua utilização será o fim da aplicação da pena privativa de liberdade.

Vale ressaltar que o Habeas Corpus não é uma peça privativa de advogado, sendo esta a razão de ele não ser tão cobrado em questões práticas da OAB. Entretanto, continua sendo um tema de suma importância para as questões dissertativas, razão pela qual ele será devidamente analisado no momento oportuno.

II – Mandado de Segurança

O mandado de segurança em matéria criminal é outra peça processual cabível em qualquer momento da persecução criminal, sendo mecanismo que visa, nos termos do art. 5º, inc. LXIX, da CF, proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

1.2. Peças práticas que podem ser requeridas na fase pré-processual

I – Requerimento ao delegado de polícia

É cabível quando se pretende diligências administrativas, cuja realização cabe ao delegado de polícia. Ex: Instauração de inquérito policial, arbitramento de fiança, exame de corpo de delito, realização de acareações entre outros.

II – Relaxamento da prisão em flagrante

Cabível de prisão em flagrante ilegal. O pedido deve ser endereçado ao juiz.

III – Liberdade Provisória

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Cabível de prisão em flagrante legal. O pedido deve ser endereçado ao juiz.

IV – Revogação da Preventiva

Quando o réu se encontra preso preventivamente e os pressupostos da preventiva desaparecem, é possível pleitear, junto ao juiz processante, a revogação da preventiva.

1.3. Tipos de prisões

Outro tema de suma importância, que está relacionado com o relaxamento da prisão em flagrante, bem como com os demais institutos de liberdade, são os tipos de prisões existentes no nosso ordenamento jurídico. O relaxamento de prisão, por exemplo, somente é cabível quando houver uma prisão em flagrante ilegal. Portanto, dependendo do tipo de prisão existirá uma peça específica aplicável à hipótese.

a) Prisão Pena

A prisão pena somente ocorrerá após o trânsito em julgado da sentença condenatória na qual foi aplicada uma pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos ao réu. Quando do cumprimento da pena privativa de liberdade, nos casos em que os réus estiveram presos durante o processo, em face da proibição do excesso, haverá o abatimento do tempo de prisão processual cumprido, ao que denominamos detração penal.

b) Prisão Cautelar

Existem três modalidades de prisão cautelar em nosso ordenamento jurídico. Chamamos de prisão cautelar toda e qualquer prisão que anteceda o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Sabemos que a Constituição Federal de 1988 garante, no art. 5º., inc. LVII, a presunção de inocência ou presunção de não culpabilidade, mas, o fato de ser o réu presumidamente inocente não impede seja o mesmo, quando extremamente necessário, submetido à prisão. É, portanto, prisão processual, dependendo, como em qualquer medida cautelar, da presença do fumus boni juris e do periculum in mora (no processo penal, fumus comissi delicti e periculum libertatis).

Quanto às espécies de prisão cautelar e respectivas peças cabíveis, podemos fazer a seguinte distinção:

• Prisão em flagrante – cabível tanto o pedido de RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE quanto a LIBERDADE PROVISÓRIA. O relaxamento da prisão será requerido se houver uma prisão em flagrante ilegal. Já a liberdade provisória se houver uma prisão em flagrante legal.

• Prisão Preventiva – quando uma prisão preventiva é legalmente decretada, deve-se pleitear, no caso do desaparecimento dos motivos que antes a autorizaram, a REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. Se a prisão preventiva for ilegal (por ausência de fundamentação ou por fundamentação inidônea) deve a mesma ser atacada por meio de Habeas Corpus. Entretanto, se a preventiva for legalmente decretada e, em um momento posterior, passar a se configurar como prisão ilegal, seja a título de excesso de prazo ou alteração legislativa, poderá ser relaxada pelo juiz de ofício ou a requerimento, tornando-se desnecessária, muitas vezes, a impetração do writ1. Mas, caso o juiz não a relaxe de ofício, o mesmo passa a se configurar como autoridade coatora, devendo-se impetrar Habeas Corpus no Tribunal.

• Prisão temporária – trata-se de prisão com prazo certo, somente permitida durante a fase de inquérito policial. Entretanto, somente o juiz pode decretá-la. Quando legalmente decretada, se, em momento anterior ao prazo final, desaparecerem os motivos, deve-se pedir a REVOGAÇÃO da prisão temporária. Se a prisão temporária for ilegal, deve ser atacada pela via do Habeas Corpus.

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Verifica-se do disposto acima o quão importante será conhecer o tipo de prisão cautelar para

identificar a peça processual cabível. Novamente: para um pedido de relaxamento de prisão ou de liberdade provisória faz-se necessária uma prisão em flagrante; em caso de decretação de uma prisão preventiva ou prisão temporária será requerida a revogação da preventiva ou da temporária. Relaxamento de prisão, liberdade provisória e revogação são medidas de contra cautela (cautelares de liberdade) e devem ser, sempre, endereçadas ao juízo processante.

Portanto, identificada a espécie de prisão cautelar e, em consequência, o pedido de liberdade cabível, devemos estar atentos às diferenças a seguir:

Relaxamento da Prisão em Flagrante – como só é cabível para flagrante ilegal (ilegalidade material ou formal), o que se discute é a legalidade da prisão em flagrante. Neste caso, deve-se demonstrar onde reside a ilegalidade, apontar a ilegalidade no caso concreto. A arguição é objetivo-normativa. Liberdade Provisória – Lembre-se: serve para atacar flagrantes lícitos. Quanto à legalidade do flagrante, ela é perfeita, não devendo ser discutida. O que se discute é a ausência de necessidade da manutenção da prisão e ausência dos pressupostos da preventiva. Neste caso, devem ser observados os arts. 312 e 313 do CPP, pois atualmente, seja por entendimento jurisprudencial dominante, seja em face das alterações implementadas no Código de Processo Penal pela Lei 12.403/2011, no caso de inexistirem os requisitos da prisão preventiva, consoante jurisprudência do STF e STJ, deve o juiz conceder ao preso, de ofício, a liberdade provisória, não sendo mais possível a manutenção do flagrante além da ciência formal do juiz (art. 310, CPP). A arguição, na liberdade provisória, caso haja necessidade de seu requerimento, é subjetivo-normativa, o que será objeto de um dos tópicos a seguir.

Sobre o cabimento das medidas liberatórias (relaxamento de prisão, liberdade provisória e revogação da preventiva e temporária) vejam o quadro sinótico ao final deste capítulo.

OBS. 1: Prisões cautelares NÃO ofendem a Constituição Federal, desde que elas sejam

decretadas nos estritos limites da lei, e quando estritamente necessárias.

OBS. 2: A figura da prisão decorrente de pronúncia NÃO existe mais, via de regra, a

sentença de pronúncia permite apenas que o juiz venha a decretar a prisão preventivamente caso estejam presentes os requisitos que a autorizem (art. 413, § 3o).O mesmo podemos dizer de uma prisão decretada no memento da sentença (art. 387, parágrafo único, CPP).

2. RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE

2.1. Cabimento

Como já foi dito, o relaxamento da prisão em flagrante somente é cabível nos casos em que houver a decretação de uma prisão em flagrante de forma ilegal. Logo, é de suma importância que o candidato tenha um conhecimento sobre o instituto da prisão em flagrante e das possíveis ilegalidades que podem ocorrer neste tipo de prisão.

Uma prisão em flagrante pode conter ilegalidades materiais ou formais. Ou seja, o flagrante, para ser lícito, deve observar requisitos materiais e formais, sob pena de ilegalidade da prisão em flagrante.

2.2. Ilegalidade Material.

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Ocorre ilegalidade material na prisão em flagrante quando não estão presentes os requisitos autorizadores do flagrante delito previstos nos artigos 302 e 303 do CPP. A ilegalidade de ordem material é aquela que se manifesta ANTES da lavratura do auto de prisão em flagrante.

Vale transcrever o teor dos artigos 302 e 303 do CPP:

Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:

I - está cometendo a infração penal;

II - acaba de cometê-la;

III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;

IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência.

ATENÇÃO! A doutrina entende que não seria cabível prisão em flagrante em crime

habitual, seja porque o instante do flagrante não seria compatível com a prova da habitualidade, seja porque o art. 303 do CPP fala em crimes permanentes e, como toda regra relacionada à prisão, deveria ter interpretação restritiva. Contudo, o STF entende possível o flagrante em crimes habituais, desde que no momento do flagrante sejam colhidas evidências da habitualidade. O grande exemplo é o exercício ilegal da medicina. Neste caso específico, a doutrina entende que a prisão do “falso médico” somente poderia ocorrer pela falsidade documental, ideológica ou pelo uso de documento falso.

Após ler os dispositivos supra, podemos concluir que o flagrante será materialmente ilegal quando houver, por exemplo, evidente inexistência material do fato, a conduta for flagrantemente atípica, ou, embora tendo o agente praticado um crime, já ter o mesmo saído do estado de flagrância a que aludem os arts. 302 e 303 do CPP. Também se configura ilegalidade material a hipótese de prova obtida por meio ilícito, como ocorre, por exemplo, no flagrante forjado.

Para verificar se o agente se encontra em estado de flagrância, o art. 302 do CPP traz três modalidades de flagrante delito lícitas:

Flagrante Próprio – Inciso I e II – ocorre quando alguém está cometendo, praticando ou desempenhando o delito e é preso em flagrante (Art. 302, I, CPP), a pessoa é capturada “com a mão na massa”, como se diz no dito popular. Ou ocorre quando o sujeito acaba de cometer a conduta delituosa, estando no mesmo local, nas mesmas circunstâncias indicativas da prática do delito (Art. 302, II, CPP).

Assim, está em flagrante próprio ou real quem está cometendo a infração penal ou quem acabou de cometer a infração.

Na primeira hipótese, o indivíduo está no curso do iter criminis, ou seja, está praticando os atos de execução que dele são dependentes. Na segunda hipótese, os atos de execução já haviam sido praticados, mas o indivíduo ainda é encontrado na cena do crime. No flagrante próprio ou real h á certeza visual.

Nos demais casos, a certeza visual é dispensável.

Flagrante Impróprio – Inciso III – ocorre quando o agente é perseguido, logo após a prática do crime, pela autoridade policial, pela vítima ou por qualquer pessoa, ou seja, tem que haver

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perseguição, seja pela vítima, autoridade policial ou qualquer pessoa do povo. Caso não tenha perseguição não há que se falar em flagrante impróprio.

Verificamos que a principal diferença entre o flagrante impróprio e o flagrante presumido está exatamente neste elemento volitivo, que se caracteriza pela vontade de perseguir. O CPP define perseguição no art. 290, §1º, devendo-se observar que a mesma deve ter início logo após, podendo durar o tempo que for necessário, desde que seja ininterrupta.

OBS. 1: Esta perseguição deve ser ininterrupta, não pode sofrer solução de

continuidade, caso a perseguição seja quebrada haverá a desconfiguração deste tipo de prisão em flagrante. Porém, a perseguição não precisa ser instantânea. Instantânea é uma perseguição iniciada no exato momento do delito. No flagrante impróprio está dispensada a certeza visual. Desta forma, a perseguição pode ter lapso temporal entre a prática do crime e a perseguição. O lapso temporal é casuístico e deve haver uma razoabilidade para a sua caracterização. Ex. Pessoa informa a amigos que foi assaltado há 15 minutos, os amigos se reúnem e resolvem prender o sujeito. Houve perseguição que não foi instantânea, porém, se for ininterrupta, dure o tempo que for, o indivíduo estará em flagrante.

OBS. 2: A perseguição não precisa ser realizada pela mesma pessoa. Ex. Polícia Civil de

um Estado persegue o criminoso, ao chegar em outro Estado os policiais locais dão continuidade à perseguição.

OBS. 3: Se a pessoa perseguida entra em uma residência, é possível que a autoridade

policial entre no referido domicílio ? A situação é controversa. Nos casos de flagrante delito de crimes ocorridos dentro do domicílio, é perfeitamente possível que a autoridade ou agente policial ingresse no mesmo sem maiores formalidades. Entretanto, se o crime tiver ocorrido fora do domicílio, com a perseguição do agente até que o mesmo ali ingresse, haverá as seguintes variantes:

a) se o perseguido entrar na residência alheia sem autorização do morador, o perseguidor poderá adentrar no domicílio para prendê-lo em flagrante sem problema, até porque terá ocorrido, no mínimo, o crime de violação de domicílio:

APELAÇÃO - PENAL E PROCESSUAL PENAL - ROUBO MAJORADO - CRIME CONSUMADO - RESISTÊNCIA - VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO COM EMPREGO DE VIOLÊNCIA - CONDENAÇÃO - DOSIMETRIA DA PENA - CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FIXAÇÃO - EXACERBAÇÃO - MOTIVAÇÃO - REDUÇÃO DA REPRIMENDA - PROVIMENTO PARCIAL. 1. O roubo majorado se consumou porque os agentes obrigaram a vítima a ingressar no seu próprio veículo, ocasião que perdeu a disponibilidade sobre o mesmo. O que aconteceu quando os agentes atuaram com emprego de arma de fogo, fazendo com que fossem entregues a eles as chaves do veículo. 2. Comete crime de resistência o agente que procurando evitar a sua prisão em flagrante atira contra os policiais. 3. Quem ingressa, durante perseguição policial para evitar a sua prisão em flagrante em casa alheia, fazendo uso de arma contra os moradores comete crime de violação de domicílio qualificado. 4. As circunstâncias judiciais que influenciam na fixação da pena base, dentro do poder discricionário do magistrado deverão ser claramente mencionadas com base nos elementos constantes nos autos. 5. A circunstância judicial não estando motivada não pode servir para exacerbar a pena base. Por esse motivo deve ser reduzida. (TJRJ - 0001827-78.2004.8.19.0203 (2005.050.04864) – APELACAO - DES. AZEREDO DA SILVEIRA - Julgamento: 06/12/2005 - PRIMEIRA CAMARA CRIMINAL)

b) Pergunta-se: se o perseguido adentra em casa alheia, com o consentimento do morador, que sabe que o mesmo se encontra fugindo da perseguição, o morador acabará incorrendo no crime de favorecimento pessoal (art. 348 do CP)?

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Deve-se fazer distinção entre uma prisão em cumprimento a um mandado judicial e uma prisão em flagrante na qual ocorre perseguição, da mesma forma que será importante observar se o fato (ingresso no domicílio) ocorreu durante o dia ou a noite.

Nos casos de cumprimento de mandado judicial no qual a pessoa a ser presa se encontra em domicílio alheio, o morador será intimado a entregar o preso; e em caso de descumprimento, sendo dia, o executor do mandado convocará duas testemunhas e ingressará no recinto através do arrombamento das portas, efetuando a prisão (art. 293 do CPP):

Art. 293. Se o executor do mandado verificar, com segurança, que o réu entrou ou se encontra em alguma casa, o morador será intimado a entregá-lo, à vista da ordem de prisão. Se não for obedecido imediatamente, o executor convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o executor, depois da intimação ao morador, se não for atendido, fará guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que amanheça, arrombará as portas e efetuará a prisão.

Parágrafo único. O morador que se recusar a entregar o réu oculto em sua casa será levado à presença da autoridade, para que se proceda contra ele como for de direito.

Neste caso (recusa do morador na permissão de acesso do executor do mandado em seu domicílio durante o dia), não havendo justificativa legal para a negativa, incorrerá o mesmo no crime de favorecimento supra indicado. Já na recusa durante o período noturno não há que se falar em favorecimento pessoal, entendendo a doutrina que o mesmo se encontra no exercício regular de direito.

No caso de ingresso em casa alheia durante a perseguição, com o consentimento do morador, o posicionamento majoritário é o de que o estado de flagrância autoriza que os persecutores adentrem no domicílio, dia ou noite, independentemente de mandado, desde que a perseguição venha ocorrendo de forma ininterrupta.

A hipótese é controversa, mormente diante do disposto do art. 294 do CPP, que indica a aplicação do teor do art. 293 acima transcrito aos casos de flagrância. Contudo, o posicionamento dominante, frente ao comando do art. 5o, inciso XI, da Constituição Federal, é o de que, no caso de perseguição que caracteriza estado de flagrância, o ingresso no domicílio para fins de prisão é perfeitamente possível.

Neste sentido:

CRIMINAL. HC. HOMICÍDIO QUALIFICADO. LIBERDADE PROVISÓRIA EM CRIME HEDIONDO. MATÉRIA NÃO-DISCUTIDA EM 2º GRAU DE JURISDIÇÃO. NÃO-CONHECIMENTO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. FLAGRANTE IMPRÓPRIO OU QUASE-FLAGRANTE. PERSEGUIÇÃO CARACTERIZADA. NULIDADE DO AUTO. MERAS IRREGULARIDADES. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E DENEGADA. I. Não se conhece de argumento relativo à possibilidade de concessão de liberdade provisória em crime hediondo, sob pena de indevida supressão de instância, na hipótese de não ter havido o seu exame em 2º grau de jurisdição. II. A perseguição pode ser caracterizada pelo patrulhamento e guarda, visando à prisão do autor do delito, pois a lei não explicita as diligências que a caracterizam, sendo que a única exigência é referente ao início da perseguição, a qual deve se dar logo após a prática do fato. III. Não é ilegal a entrada em domicílio sem o consentimento do autor do delito, que é perseguido, logo após a prática do crime, pela autoridade policial, pois a própria Constituição Federal permite a entrada em casa alheia, mesmo contra a vontade do morador, para fins de prisão em flagrante. IV. Meras irregularidades ocorridas no auto de prisão em flagrante, que não podem ser consideradas essenciais, não autorizam, por si só, a revogação da custódia cautelar. V. Ordem parcialmente conhecida e denegada. (STJ. HC 10899 / GO (Habeas Corpus 1999/0091473-2). Rel. Min. Gilson Dipp. Quinta Turma. J. 13/03/2001. DJ 23/04/2001 p. 166

Em sentido contrário:

“Perseguir é rastrear; é estar no encalço de determinada pessoa; é seguir o caminho por ela tomado, para encontra-la.

Procura, com posterior encontro, não se confunde com perseguição e consequente captura. Por esse motivo, a perseguição não há de ser desordenada, devendo ser entendida como a ação de procura e encalço dos meliantes,

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não a esmo ou aleatoriamente, mas possuindo-se como ponto de partida, rumo, itinerário, trajetória certos e definidos.

Não quebra a continuidade a substituição ou alternância de perseguidores, desde que não haja interrupção na perseguição.

Intentando o autor da infração homizar-se na própria casa ou em domicílio alheio, insta que se observe e acate o preceito do artigo 293 do Código de Processo, ex vi da remissão feita pelo artigo 294.” (PEDROSO, Fernando de Almeida. Prisão em flagrante. Justitia. São Paulo, 56 (167), jul./set. 1994, p. 30)

c) Pergunta-se: e se o perseguido adentrar na sua própria casa, a polícia pode entrar sem mandado de prisão?

A mesma situação indicada no item b será aplicável, salvo a incidência do crime de favorecimento pessoal, que somente poderia ser praticado pelo terceiro que lhe desse guarida.

Em princípio, no interior da casa não está ocorrendo a prática de nenhum delito. Isso porque a jurisprudência entende que não configura o crime de violação de domicílio (CP, art. 150) se o agente entrou na casa somente para escapar à perseguição policial (TACrSP, RT 637/283; TJRS, RT 768/674).

HABEAS CORPUS - CONSTRANGIMENTO ILEGAL - ROUBO QUALIFICADO POR TRÊS VEZES - ESTADO DE FLAGRÂNCIA DEVIDAMENTE CARACTERIZADO - VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO NÃO CONFIGURADA ANTE O ESTADO FLAGRANCIAL - CURADOR A RÉU MENOR - NOMEAÇÃO ATENDIDA - LIBERDADE PROVISÓRIA CONCEDIDA AO SEGUNDO PACIENTE E A UM TERCEIRO CO-RÉU, POR NÃO TEREM TIDO QUALQUER PARTICIPAÇÃO NO CRIME - DIREITO NÃO EXTENSIVO AO PRIMEIRO PACIENTE E AO QUARTO CO-RÉU, POR CONFESSOS EM AMBAS AS FASES PROCESSUAIS - ORDEM DENEGADA.

2. Havendo perseguição imediata e ininterrupta a um dos autores do roubo, logo após a sua execução e, no prosseguimento das diligências, efetuada a prisão dos outros dois meliantes, inclusive na posse de uma parte da “res furtiva”, está caracterizado o estado de flagrância, não havendo que se cogitar em violação de domicílio, se os policiais, ato contínuo, percebem que um dos meliantes, em situação de flagrante delito” (art.5º,XI da CF) se oculta no interior da sua residência, onde, inclusive, é encontrada a arma do crime e outra parte do produto da subtração, mediante violência.

3. O réu menor, a quem foi nomeado curador, que não os policiais que efetuaram a prisão dos incriminados, ficou devidamente agasalhado pela respectiva exigência legal, não havendo que se falar em suspeição do curador, se não comprovada. Ademais disso, houvesse irregularidade, esta não se constituiria em nulidade, por não contaminar a ação penal.

(TAPR - Segunda C. Criminal (extinto TA) - HCC 163391-8 - Santo Antônio da Platina - Rel.: Sonia Regina de Castro - Unânime - J. 23.11.2000)

OBS. 4: É possível a captura em flagrante impróprio se a pessoa, ao ser capturada, está

sem os objetos ou instrumentos do crime? A resposta é SIM. A jurisprudência já se posicionou no sentido de que o fato de o sujeito ser capturado sem nada nas mãos (sem os objetos do crime) não desconfigura o flagrante impróprio. A presença de objetos e instrumentos do crime é exigida para o flagrante presumido, no qual não ocorre perseguição.

Flagrante Presumido ou Ficto – Inciso IV – neste caso, não houve perseguição.

A pessoa é encontrada com instrumentos que façam presumir ser ela a autora do crime. Trata-se muitas vezes de um encontro até mesmo casual, apesar de certas críticas doutrinárias. Não existe um lapso temporal formal para a ocorrência do flagrante presumido, devendo ser utilizado um critério de razoabilidade. Ex. Cidadão que é preso com moto roubada horas após o crime presume-se que é o autor do roubo.

DICAS! Em relação à Prisão em Flagrante vale lembrar as seguintes dicas:

1ª) Não existe prisão em flagrante para averiguação.

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2ª) Não se prende em flagrante delito o condutor de veículo automotor que socorre vítima de acidente de trânsito, conforme Art. 301 da Lei nº 9.503/1997 – Código de Trânsito Nacional. Vale lembrar o teor do Art. 301 do CTN:

“Art. 301. Ao condutor de veículo, nos casos de acidentes de trânsito de que resulte vítima, não se imporá a prisão em flagrante, nem se exigirá fiança, se prestar pronto e integral socorro àquela.”

Lembrando que a hipótese se aplica aos crimes e lesão corporal culposa ou homicídio culposo, ambos na condução de veículo automotor. Quando, num acidente de trânsito com vítima, ocorre também a omissão de socorro, o agente poderá ser preso em razão dela.

3ª) Regra Geral: não cabe prisão em flagrante em infrações de menor potencial ofensivo.

As infrações de menor potencial ofensivo estão previstas na Lei 9.099/1995. O art. 61 desta lei define como infrações de menor potencial ofensivo as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima de até 2 anos, cumulada ou não com multa.

Em regra, não cabe prisão em flagrante em infração de menor potencial ofensivo, devendo o delegado, neste caso, lavrar um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), a ser imediatamente remetido ao Juizado Especial Criminal competente, acompanhado do suposto autor do fato e da vítima. No caso de impossibilidade de remessa imediata, será exigido do suposto autor do fato um termo de compromisso de comparecimento, não se impondo a prisão em flagrante.

Vale lembrar o conteúdo do art. 69 da Lei 9099/1995:

Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.

Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima.

Entretanto, não se pode confundir a lavratura do auto de prisão em flagrante com a simples captura ou mesmo com a condução.

A prisão em flagrante possui 4 etapas: Captura, Condução, Formalização (que ocorre na delegacia de polícia, tendo início com as oitivas, indicadas no art. 304 do CPP, e finalizando com a entrega da nota de culpa e remessa dos autos para ciência e análise do juízo). O que a Lei 9.099/95 impede é a lavratura do auto de prisão em flagrante (APF), e não a captura e a condução. Assim, caso determinado indivíduo seja encontrado em flagrante na prática de uma infração de menor potencial ofensivo, perfeitamente possível a captura, com a consequente condução do mesmo até a delegacia, onde será lavrado, via de regra, o termo circunstanciado e, se for o caso, o termo de compromisso.

Devemos nos lembrar, no entanto, que a recusa na assinatura do termo de compromisso implica na lavratura do flagrante pela infração praticada.

Vamos a um exemplo: Pessoa que foge de blitz comete desobediência, não sendo preso em flagrante se for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, porém, se a pessoa é levada para a delegacia e se recusa a assinar o termo de compromisso será autuada em flagrante, aplicando-se subsidiariamente os dispositivos referentes a liberdade provisória previstos no CPP.

Da mesma forma, imagine que Tício seja capturado em flagrante por um crime de lesões corporais leves, cuja pena máxima é inferior a 2 (dois) anos e, portanto, infração de menor potencial ofensivo. Conduzido até a delegacia de polícia, deverá a autoridade policial lavrar um

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termo circunstanciado e, não sendo possível a remessa imediata ao Juizado Especial Criminal competente, exigir do suposto autor do fato o termo de compromisso de comparecimento à audiência preliminar. Caso o “autor do fato” se recuse a assinar o termo de compromisso, o Delegado deverá autuá-lo em flagrante pelas lesões corporais praticadas.

Mas, ATENÇÃO, somente a recusa na assinatura do termo de compromisso que acarreta a autuação em flagrante, e não a recusa na assinatura do termo circunstanciado, que pode ser assinado a rogo por duas testemunhas.

4ª) Não cabe prisão em flagrante em uso de entorpecentes (art. 28 da Lei 11.343/2006).

No caso do usuário de drogas a lei veda totalmente a prisão em flagrante, ainda que o mesmo se recuse a assinar o termo de compromisso de que falamos na hipótese anterior.

5ª) Existem certas pessoas que não podem ser presas em flagrante.

Vale lembrar que não podem ser presas em flagrante delito, sob pena de ilegalidade material:

Presidente da República – o Presidente da República não pode ser preso em flagrante delito em hipótese alguma, conforme previsão expressa prevista no Art. 86, § 3º, da CF/88. O que é possível é tão somente a prisão do Presidente, nas infrações penais comuns, após a sentença penal condenatória, valendo ressaltar que não é necessário o trânsito em julgado da sentença.

Menores de 18 anos – os menores de 18 anos não podem ser presos em flagrante em hipótese alguma, pois não praticam crime, somente podendo submeter-se ao procedimento por ato infracional previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90).

ATENÇÃO! O leitor candidato deve estar atento às nomenclaturas utilizadas em

relação aos menores de idade. Não há prisão, e sim apreensão; não praticam crimes e sim ato infracional; também não são denunciados, eles são representados.

Representantes diplomáticos estrangeiros que estejam formalmente a serviço de seu país no Brasil – também não podem ser presos em flagrante delito os chefes de governo ou Estado estrangeiro e familiares, bem como os embaixadores e seus familiares. Trata-se da imunidade diplomática garantida pela Convenção de Viena, de 1961.

Juízes e promotores – não podem ser presos em flagrante delito por crimes afiançáveis, ou seja, somente podem ser presos em flagrante delito por crimes inafiançáveis, conforme Art. 33, II, da Lei Complementar 35/79 – Lei Orgânica Magistratura Nacional e Art. 40, III da Lei 8.625/93 – Lei Orgânica Nacional do Ministério Público. Vale ressaltar que, conforme doutrina dominante, são os juízes e promotores ativos que não podem ser presos em flagrante de crimes afiançáveis. Além disso, o conceito de Promotor de Justiça é lato senso, referindo-se aos membros do Ministério Público, razão pela qual os Procuradores da República, por exemplo, também não podem ser presos em flagrante delito por crimes afiançáveis. Deputados e Senadores - não podem ser presos em flagrante, desde a expedição do diploma, por crimes afiançáveis, ou seja, somente podem ser presos em flagrante delito por crimes inafiançáveis, conforme Art. 53, § 2º, da Constituição Federal. Cumpre ressaltar que em relação ao deputado estadual, não existe pacificação doutrinária se este não pode ser preso em flagrante por crimes afiançáveis. Porém, a corrente doutrinária a qual nos filiamos é de que o Deputado Estadual também não pode ser preso em flagrante por crime afiançável, utilizando-se o princípio da simetria.

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Advogados - não podem ser presos em flagrante por crimes afiançáveis, que sejam cometidos no exercício da atividade profissional, ou seja, os advogados podem ser presos em flagrante por crime afiançáveis que não tiverem ligação com o exercício de sua atividade profissional, bem como no caso de cometimento de crimes inafiançáveis, conforme o Art. 7º, § 3º, da Lei 8.906/94. Vale ressaltar que Advogado é quem está inscrito regularmente nos quadros da OAB, não se confundindo com o bacharel em direito ou o estagiário.

6ª) Flagrantes forjado e preparado são flagrantes materialmente ilegais, motivo pelo qual cabível o relaxamento de prisão.

Flagrante forjado

O flagrante forjado configura-se em fato atípico. A conduta imputada ao preso jamais ocorreu, tendo sido forjada por quem o prendeu. No flagrante forjado pratica crime quem efetua a prisão, podendo-se identificar, no mínimo, a conduta de denunciação caluniosa. Trata-se de prova obtida por meio ilícito aplicando-se a hipótese a teoria da prova ilícita por derivação.

Flagrante preparado ou provocado

Trata a Súmula 145, do Supremo Tribunal Federal, do chamado flagrante preparado ou provocado:

“não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”.

Estamos diante do chamado delito de ensaio, delito de experiência ou delito putativo por obra do agente provocador. Ocorre quando alguém, podendo ou não tratar-se de policial, de forma absolutamente insidiosa, provoca o agente à prática de um crime, para, durante os atos de execução supostamente puníveis, efetuar sua prisão, evitando, assim, que o mesmo se consume. Nesta espécie de flagrante não há crime e a prisão será ilegal.

Adotou o STF para a conhecida hipótese a teoria do crime impossível descrita no art. 17 do Código Penal.

No flagrante preparado, o policial ou terceiro induz o agente a praticar o delito e, ao mesmo tempo, toma providências para evitar a consumação.

Assim, no flagrante preparado o autor do fato age motivado por obra do provocador, sem o qual não haveria a prática daquela suposta conduta. E se a intenção do agente não é natural, uma vez que induzida pelo provocador, inexiste o crime.

2.3 Ilegalidade Formal.

Ocorre ilegalidade formal quando não são respeitadas as formalidades exigidas em lei para a personificação da prisão em flagrante. Desta forma, as ilegalidades formais podem ocorrer APÓS a lavratura do auto de prisão em flagrante, ou seja, qualquer ilegalidade que ocorrer antes deste momento será considerada ilegalidade material, conforme já foi explicado no item anterior.

São exemplos de ilegalidade formal no flagrante: erro na confecção do APF, não expedição da nota de culpa, não comunicação ao juiz e ao Ministério Público da ocorrência da prisão, ou ainda a não comunicação aos familiares ou pessoa indicada pelo preso, entre outros.

Na prisão em flagrante é indispensável a legalidade formal, devendo-se observar alguns procedimentos.

O primeiro procedimento é a lavratura do auto de prisão em flagrante. A regra geral é que ele seja lavrado na delegacia mais próxima do local da captura. Porém, pode ser que para o crime

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cometido exista uma delegacia especializada, estas são delegacias instituídas para cuidar de crimes específicos e, neste caso, pode haver a lavratura do auto de prisão em flagrante na delegacia especializada, ainda que o crime tenha sido cometido nas proximidades de outra delegacia não especializada, desde que não haja prejuízo temporal em sua condução ou atraso nos trâmites formalmente legais (art. 306 do CPP). São exemplos de delegacias especializadas a Delegacia de Homicídios, Delegacia de Entorpecentes e a Delegacia da Mulher, logo, o auto de prisão em flagrante pode ser formalizado nelas, ainda que não sejam as mais próxima do local que houve a captura.

OBS.: São etapas do flagrante:

Captura – não é considerado prisão em flagrante e sim o procedimento de pegar a pessoa. É o obstamento do agente delituoso em decorrência da prática delituosa, é segurar o sujeito e impedir que ele fuja.

Condução – não é considerado prisão em flagrante e sim procedimento de levar a pessoa a delegacia. É o deslocamento do indivíduo do lugar do crime a presença da autoridade policial mais próxima

Lavratura do auto de prisão em flagrante – é onde começa a prisão em flagrante, havendo a formalização desta prisão. É o delegado de polícia que irá formalizar a prisão em flagrante. A partir da lavratura do auto de prisão em flagrante é que podem surgir vícios formais. A formalização se inicia quando se realizam as oitivas dos policiais condutores, testemunhas e do conduzido, com a posterior lavratura do auto de prisão em flagrante (art. 304 do CPP) e entrega da nota de culpa (art. 306 § 2º. do CPP).

Judicialização – Após a lavratura do auto de prisão em flagrante, deve o mesmo ser encaminhado ao juiz competente para análise e confirmação de sua legalidade, conforme prescreve o art. 306 § 1º. do CPP.

Após a lavratura do APF o delegado de polícia tem 24 horas para adotar uma série de formalidades, sob pena de haver a ilegalidade formal da prisão em flagrante, dentre elas:

1) Expedição da nota de culpa (Art. 306, § 2º, CPP) – a nota de culpa é o documento que indica ao preso o artigo em que se encontra incurso (o motivo da prisão), contendo o nome da autoridade policial, do condutor e das testemunhas, sendo um requisito formal para a legalidade do flagrante. Ela deve ser expedida dentro do prazo de 24 horas contadas do momento da captura, sob pena de a prisão se tornar ilegal. Caso não seja expedida e apresentada ao preso a nota de culpa dentro de 24 horas, a prisão em flagrante também será formalmente ilegal. A lei exige que o preso preste recibo da nota de culpa, isto é, o preso deve dar ciência da nota de culpa. Caso o preso não saiba ler/escrever, ou se recuse a dar ciência da nota de culpa, o delegado deverá ler o documento em voz alta, na presença de duas testemunhas que prestarão recibo na pessoa do preso. A nota de culpa configura-se verdadeira garantia constitucional, inserta no art. 5o., inc. LXIV, da CRFB/88.

DICA! As testemunhas que assinam a nota de culpa no lugar do preso são chamadas de

testemunhas quirografárias, estas são espécies de um gênero que são as testemunhas instrumentárias. Testemunhas instrumentárias são aquelas que validam, dão fé a diligências policiais e atos processuais, algumas destas testemunhas instrumentárias vão assinar no lugar de outras pessoas, passando a ser chamadas de testemunhas quirografárias.

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2) Comunicação imediata ao juiz competente, ao Ministério Público e à pessoa indicada pelo preso (art. 5o., inciso LXII, da CRFB/88 c/c Art. 306, caput, CPP) – é um dever da autoridade policial. A comunicação à família ou à pessoa indicada pelo preso é um direito do preso e não um dever, pois o preso pode abrir mão do direito de comunicação, desde que seja de forma fundamentada, expressa, sendo obrigação do delegado reduzir a termo (Ex. preso tem mãe doente, neste caso pode pedir para mão do seu direito de comunicação a família para não causar maiores problemas). Atualmente, o art. 306 exige a comunicação imediata da prisão também ao Ministério Público, exigência antes apenas prevista como uma dedução lógica da titularidade do Ministério Público na ação penal pública incondicionada e na ação penal pública condicionada a representação do ofendido.

Dentro de 24 horas contadas da captura, o delegado deverá enviar os autos do flagrante ao juiz competente, com cópia ao defensor público (Art. 306, § 1º, CPP) – no caso de o preso em flagrante não possuir advogado constituído, deve-se comunicar a prisão também à defensoria pública. Tal comunicação é um dever do delegado.

Para estas formalidades, estes os dispositivos constitucionais pertinentes:

Art. 5o. da CRFB/88:

LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;

LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

LXIV - o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial;

E no Código de Processo Penal:

Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.

§ 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

§ 2o No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas.”

DICA! Após a lavratura do auto de prisão em flagrante o inquérito policial deve ser

concluído nos prazos que a lei estabelece, sob pena de também haver ilegalidade formal. Em relação aos prazos do inquérito policial é importante relembrar os seguintes prazos de conclusão do inquérito:

PRAZOS DO INQUÉRITO POLICIAL

Regra geral (art. 10 do CPP) 10 dias o réu preso

30 dias o réu solto

IP feito pela PF (Lei 5010\66) 15 dias o réu preso

30 dias o réu solto

IP lei de drogas (Lei 11343\06) 30 dias o réu preso

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90 dias o réu solto

IP em crimes contra a economia popular (Lei 1521\51) 10 dias o réu preso ou solto

IP Militar 20 dias o réu preso

40 dias o réu solto

OBS.: Embora o Inquérito Policial esteja no CPP, a contagem do prazo quando o indiciado

está preso, seja em flagrante, temporariamente ou preventivamente, é de direito penal (direito material), ou seja, no prazo penal inclui-se o dia do início e exclui-se o do vencimento, na contagem penal se o prazo vencer em dia não útil mesmo assim ele estará encerrado (art. 10 do CP). No modelo processual penal, diferentemente, a contagem exclui o dia de início e inclui o de vencimento, assim, o prazo começa a correr a partir do primeiro dia útil, e se cair em dia não útil ele será prorrogado para o primeiro dia útil subsequente (art. 798 do CPP).

OBS.: Em relação ao inquérito policial é bom ficar ligado na seguinte questão: o inquérito

policial somente poderá ser presidido por autoridade policial?

A regra é que o IP seja presidido por delegado de carreira. Contudo, não podemos confundir inquérito policial (espécie) com investigação criminal (gênero).

Em casos específicos a investigação criminal pode ser presidida por outras autoridades, como nas hipóteses em que há competência por prerrogativa de função. Sobre a prerrogativa de função, veja o capítulo de competência.

Há também os casos de investigação direta por Membro do Ministério Público. De acordo com jurisprudência do STF, pode o MP promover a colheita de determinados elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e da materialidade de determinado delito, tendo em vista que ele é o detentor da ação penal, NÃO sendo inconstitucional a investigação realizada por membro do Ministério Público. É a adoção da teoria dos poderes implícitos. Neste sentido, o seguinte julgado:

DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ALEGAÇÕES DE PROVA OBTIDA POR MEIO ILÍCITO, FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO DE PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA E EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. PODERES INVESTIGATÓRIOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, IMPROVIDO.

(...) 5. A denúncia pode ser fundamentada em peças de informação obtidas pelo órgão do MPF sem a necessidade do prévio inquérito policial, como já previa o Código de Processo Penal. Não há óbice a que o Ministério Público requisite esclarecimentos ou diligencie diretamente a obtenção da prova de modo a formar seu convencimento a respeito de determinado fato, aperfeiçoando a persecução penal, mormente em casos graves como o presente que envolvem a presença de policiais civis e militares na prática de crimes graves como o tráfico de substância entorpecente e a associação para fins de tráfico.

6. É perfeitamente possível que o órgão do Ministério Público promova a colheita de determinados elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e da materialidade de determinado delito, ainda que a título excepcional, como é a hipótese do caso em tela. Tal conclusão não significa retirar da Polícia Judiciária as atribuições previstas constitucionalmente, mas apenas harmonizar as normas constitucionais (arts. 129 e 144) de modo a compatibilizá-las para permitir não apenas a correta e regular apuração dos fatos supostamente delituosos, mas também a formação da opinio delicti.

7. O art. 129, inciso I, da Constituição Federal, atribui ao parquet a privatividade na promoção da ação penal pública. Do seu turno, o Código de Processo Penal estabelece que o inquérito policial é dispensável, já que o Ministério Público pode embasar seu pedido em peças de informação que concretizem justa causa para a denúncia.

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8. Há princípio basilar da hermenêutica constitucional, a saber, o dos “poderes implícitos”, segundo o qual, quando a Constituição Federal concede os fins, dá os meios. Se a atividade fim - promoção da ação penal pública - foi outorgada ao parquet em foro de privatividade, não se concebe como não lhe oportunizar a colheita de prova para tanto, já que o CPP autoriza que “peças de informação” embasem a denúncia. (...)

(STF. RE 468523 / SC. Relator(a): Min. ELLEN GRACIE. Segunda Turma. J. 01/12/2009. DJe-030 19-02-2010. EMENT VOL-02390-03 PP-00580. RT v. 99, n. 895, 2010, p. 536-544)

Entretanto, também é pacífico o entendimento de que membro do Ministério Público NÃO poderá presidir inquérito policial.

DICA! Lembrar que não importa a hora em que o auto de prisão em flagrante (APF) foi

lavrado, se for lavrado as 23h30min de hoje conta-se o dia de hoje, sendo desprezadas as frações de dia ou horas, o que interessa é a data de lavratura do APF para a conclusão do inquérito policial em que haja indiciado preso. Isso decorre do fato do prazo prisional caracterizar-se como um fato penal, conforme acima indicado.

OBS.: O prazo de conclusão do IP pode ser prorrogado por igual ou distinto período,

porém a prorrogação do prazo de conclusão do IP, conforme jurisprudência, por si só, não autoriza a manutenção da prisão em flagrante delito. Ou seja, se houver necessidade de devolução dos autos de inquérito para a delegacia para a continuidade da investigação, a prisão deverá ser relaxada.

Por exemplo, o auto de prisão em flagrante (APF) foi lavrado no dia 22/03/2012, o delegado deve comunicar imediatamente as pessoas mencionadas no art. 306 do CPP (Juiz, Ministério Público e pessoa indicada pelo preso), apresentar ao preso, dentro de 24 horas da captura, a nota de culpa, bem como remeter os autos do flagrante, com cópia das oitivas, dentro das primeiras 24 horas, ao juiz competente, com cópia integral para a Defensoria Pública caso o preso não tenha indicado advogado. Ocorre que a lavratura do APF impõe ao delegado a instauração do inquérito policial, e, se o APF foi lavrado em 22/03/2012, em 31/03/2012 vence o prazo para sua conclusão. Ultrapassado tal prazo, a prisão será ilegal e deverá ser relaxada.

É certo que, com a nova sistemática do art. 310 do CPP, que determina que, tão logo receba os autos da prisão em flagrante para análise de sua legalidade, deve o mesmo relaxar a prisão se ilegal, conceder liberdade provisória ou converter a prisão em preventiva (quando presentes os seus pressupostos), dificilmente permanecerá o indiciado preso em flagrante durante o tal prazo de 10 dias de que trata o art. 10 do CPP. Assim, se ele for colocado em liberdade, o prazo do inquérito passará a ser de 30 (trinta) dias; somente interessando os 10 (dez) dias para o inquérito se sua prisão preventiva houver sido decretada.

2.4 Outras informações importantes.

a) Pessoa que está amparada por uma excludente de ilicitude e é presa em flagrante.

Não há crime se a pessoa está amparada por excludentes de ilicitude, motivo pelo qual deverá ser concedida pelo juiz, ao tomar ciência do flagrante, a liberdade provisória de que trata a nova redação do art. 310, parágrafo único, do CPP.

b) Outros tipos de flagrante delito e cabimento do pedido de relaxamento de prisão em flagrante.

Como dito anteriormente, quando a hipótese é de flagrante forjado ou de flagrante provocado, a prisão é materialmente ilegal, da mesma forma que nas hipóteses em que decorre unicamente de prova obtida por meio ilícito.

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Já o flagrante esperado é totalmente válido.

Lembrando:

Flagrante Forjado – ocorre quando o sujeito simplesmente não praticou crime algum, havendo uma simulação por parte da polícia ou de um particular com a intenção de incriminar outrem, efetuando-se a prisão em flagrante. Esta modalidade de flagrante é ilícita sendo cabível o pedido de relaxamento de prisão, pois há a criação de uma situação de flagrância que não existe.

Flagrante provocado – é aquele em que existe um agente provocador que instiga outrem a cometer um crime, sem que o mesmo saiba que está sendo vigiado por autoridade policial ou terceiro. Iniciados os atos de execução do crime efetua-se a prisão em flagrante. Esta modalidade de flagrante é ilícita sendo cabível o pedido de relaxamento de prisão, com base na Súmula 145 do STF.

OBS.: No tráfico de drogas, se o sujeito já está na posse das drogas e o agente provocador,

polícia ou terceiro, instiga a venda da substância entorpecente para efetuar o flagrante não será possível a prisão em flagrante pela conduta “vender”, pois houve instigação para o cometimento do crime de tráfico de drogas na modalidade de venda. Entretanto, como o crime de tráfico de drogas é de ação múltipla, caso o agente tenha cometido outras ações, como manter em depósito a droga, será possível a prisão em flagrante por esta conduta, que se configura em delito de caráter permanente, conforme entendimento pacífico dos tribunais superiores, neste sentido há a seguinte decisão do STJ referente a antiga lei de drogas mas que tem aplicação atual:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. (ART. 12 DA LEI 6.368/76). FLAGRANTE PREPARADO. INOCORRÊNCIA. PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. 3 ANOS. AUMENTO DE 1/3 PELA REINCIDÊNCIA. PENA CONCRETIZADA: 4 ANOS DE RECLUSÃO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FAVORÁVEIS. FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL FECHADO. IMPOSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 269/STJ. PRECEDENTES DESTA CORTE. WRIT PARCIALMENTE CONCEDIDO, PARA ESTABELECER O REGIME SEMI-ABERTO PARA O INÍCIO DO CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE IMPOSTA AO PACIENTE. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ORDEM CONCEDIDA EM PARTE.

O tráfico ilícito de entorpecentes é um crime de ação múltipla, estando prevista no bojo do tipo penal a conduta ter em depósito, de modo que estando comprovado que o acusado mantinha as drogas em depósito antes da simulação de compra feita pelos agentes policiais, inviável o reconhecimento de crime impossível em razão de flagrante preparado. Precedentes do STJ e do STF. (...)

(STJ. HC 101317 / SP (proc. 2008/0047689-0). Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho. Quinta Turma. J. 16/09/2008. DJe 28/10/2008)

Flagrante esperado – é uma modalidade de flagrante lícita e legal, pois neste caso sabe-se que o crime vai ser praticado e a autoridade, ou um terceiro, espera o cometimento do crime para efetuar a prisão em flagrante no momento da execução do crime, não havendo nenhuma instigação por parte da polícia ou do terceiro para a consumação do crime.

O flagrante esperado ocorre quando a polícia ou qualquer pessoa, por algum motivo, soube, de forma lícita, que em um determinado local alguém praticaria um crime. O flagrante esperado é reconhecido como plenamente lícito, pois aquele que pretende efetuar a prisão apenas aguarda o momento correto para agir, sem qualquer participação na cadeia fática que levou ao resultado. Este flagrante é, portanto, legal, NÃO sendo cabível o relaxamento de prisão, salvo se existentes outras ilegalidades.

Da mesma forma, é a princípio lícito o flagrante retardado ou diferido, em que há o retardo no momento do flagrante para que se consiga um maior número de provas, ou outros elementos de investigação criminal, mas entende a jurisprudência dos Tribunais Superiores que deve ser mantida

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uma permanente vigilância nesta modalidade de flagrante. Trata-se, em verdade, de uma modalidade de flagrante esperado, que foi introduzida no ordenamento jurídico pela Lei 9.034/95. São, portanto, exemplos expressos desta modalidade de flagrante delito temos o Art. 2º da Lei 9.034/95 – Lei de Crime Organizado e o Art. 53, § 2º, da Lei 11.343/06 – Lei de Tóxicos.

Logo, no flagrante esperado e no flagrante retardado, não é cabível o pedido de relaxamento da prisão em flagrante, pois não existe ilegalidade. Neste sentido, a seguinte decisão do STJ:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. FLAGRANTE PREPARADO. INEXISTÊNCIA. HIPÓTESE QUE CONFIGURA FLAGRANTE ESPERADO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. DESCABIMENTO. SENTENÇA QUE ENCONTRA AMPARO NAS ACUSAÇÕES VAZADAS NO ADITAMENTO FEITO À DENÚNCIA. PENA-BASE. FIXAÇÃO ACIMA DO PATAMAR MÍNIMO. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. OBTENÇÃO DE LUCRO FÁCIL. CIRCUNSTÂNCIA INERENTE AO TIPO. VEDAÇÃO À PROGRESSÃO DE REGIME. INCONSTITUCIONALIDADE.

1. Nos termos da Súmula nº 145⁄STF, “não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”.

2. No caso dos autos, a ação policial partiu de investigações efetivadas a partir do descobrimento da droga, dentro de um veículo responsável por entregar mercadorias – peças automobilísticas. O ora paciente foi reconhecido pela atendente da empresa transportadora como sendo o responsável pela remessa das peças e também da droga apreendida.

3. De se ver que, a partir da interceptação da droga, a autoridade policial apenas acompanhou o restante da operação supostamente levada a efeito pelo ora paciente, até a chegada em sua residência, quando lhe foram entregues as encomendas – pelo funcionário da transportadora – e dada voz de prisão. Assim, inexiste flagrante preparado. A hipótese, como bem delineou o Tribunal de origem, caracteriza flagrante esperado. (...)

(STJ. HC 83196 / GO. (proc. 2007/0113377-5). Rel. Min. Og Fernandes. Sexta Turma. J. 30/06/2010. DJ e 09/08/2010)

a) No pedido de relaxamento de prisão em flagrante não se discute o mérito da causa.

No pedido de relaxamento de prisão em flagrante o que se discute é tão somente a ilegalidade da prisão em flagrante, não havendo discussão de mérito. Esta discussão será abordada na peça processual oportuna, como a resposta a acusação.

b) Impossibilidade de prisão em flagrante para o crime de consumo de drogas.

O consumo de drogas é considerado crime, consoante art. 28, da Lei 11.343/2006, porém esta conduta não mais admite a aplicação de pena privativa de liberdade, somente sendo a ela aplicável penas alternativas, como a restritiva de direito (art. 48, § 1o, da lei 11.343/2006). Por este motivo, a Lei de Tóxicos veda, expressamente, a prisão em flagrante do simples usuário (art. 48, § 2o, da lei 11.343/2006), devendo o mesmo ser conduzido à sede policial apenas para se lavrar um termo circunstanciado de ocorrência –TCO.

Neste sentido vale lembrar o teor do Art. 48, § 2º, da Lei 11.343/2006:

Art. 48. O procedimento relativo aos processos por crimes definidos neste Título rege-se pelo disposto neste Capítulo, aplicando-se, subsidiariamente, as disposições do Código de Processo Penal e da Lei de Execução Penal.

§ 2o Tratando-se da conduta prevista no art. 28 desta Lei, não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários.

Vale lembrar também que não cabe o princípio da insignificância no crime de consumo de drogas consoante jurisprudência do STF, neste sentido:

Habeas corpus. Constitucional. Penal Militar e Processual Penal Militar. Porte de substância entorpecente em lugar sujeito à administração militar (art. 290 do CPM). Não-aplicação do princípio da insignificância aos crimes relacionados a entorpecentes. Precedentes. Inconstitucionalidade e revogação tácita do art. 290 do Código Penal Militar. Não-ocorrência. Precedentes. Habeas corpus denegado.

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É pacífica a jurisprudência desta Corte Suprema no sentido de não ser aplicável o princípio da insignificância ou bagatela aos crimes relacionados a entorpecentes, seja qual for a qualidade do condenado. (...)

(STF. HC 91759 / MG. Rel: Min. Menezes Direito. Primeira Turma. J. 09/10/2007. DJe- 152, 30-11-2007. DJ 30-11-2007, pp-00077, vol-02301-03, pp-00547)

Além disso, o Juiz e o Delegado de Polícia, conforme orientação do STJ, devem observar o art. 28 § 2º da Lei de Drogas para distinguir o consumo de drogas do tráfico, não sendo apenas a quantidade o critério preponderante para distinguir o tráfico de drogas do consumo. Neste caso, deverão ser levados em conta também a natureza da substância apreendida, o local e as condições em que se desenvolveu a ação, as circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes do agente.

c) Prisão em flagrante em crimes culposos.

Existe discussão sobre a possibilidade de ser possível ou não a prisão em flagrante de crime culposo. A orientação a ser seguida é a de que o sujeito pode ser preso em flagrante por crime culposo, o que provavelmente ocorrerá é que o sujeito não permanecerá preso. Ou seja, pode haver a captura e a condução. A dúvida se dá quanto à lavratura. É certo entretanto que, ainda que venha a ser lavrado, deverá a autoridade policial conceder liberdade provisória mediante fiança, ou representar para que o juiz a conceda, com ou sem fiança, já que incabível prisão preventiva em crimes culposos.

Devemos lembrar que em crimes de lesão corporal culposa de trânsito ou homicídio culposo de trânsito está vedada a prisão em flagrante, embora a mesma possa ocorrer no caso de omissão de socorro (que é crime doloso).

2.5. ESTRUTURA DO RELAXAMENTO DE PRISÃO

Endereçamento

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA CRIMINAL DA COMARCA DE _________________________________ (Regra Geral)

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ___ VARA CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE __________________________ (Crimes da Competência da Justiça Federal).

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA DO TRIBUNL DO JÚRI DA COMARCA DE _________________________ (Crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados)

-> Não precisa saltar 10 linhas efetivamente.

Identificação do preso

(Fazer parágrafo – regra dos dois dedos) Nome, nacionalidade, estado civil, profissão, portador da Cédula de Identidade número _______, expedida pela ____________, inscrito no Cadastro de Pessoa Física do Ministério da Fazenda sob o número ________________, residência e domicílio, por seu advogado abaixo assinado, conforme procuração anexa a este instrumento, vem muito respeitosamente à presença de Vossa Excelência, requerer o

RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE

Com fundamento no art. 5º, LXV da Constituição Federal, e art. 310, I, do Código de Processo Penal, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:

1. Exposição dos Fatos

2. Da (s) ilegalidade (s) da prisão em flagrante

Mostrar claramente as ilegalidade do flagrante e discorrer sobre estar ilegalidade.

3. Da impossibilidade de decretação da prisão preventiva

Como existe a possibilidade do juiz relaxar a prisão e decretar a prisão preventiva, deve-se deixar claro ao julgador que não existe motivo para tal procedimento.

4. Pedido

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Ante o exposto, postula-se a Vossa Excelência o relaxamento da prisão em flagrante imposta ao requerente, a fim de que possa permanecer em liberdade durante o processo.

Termos em que, ouvido o ilustre representante do Ministério Público e, expedindo-se o alvará de soltura, pede deferimento.

Comarca, data.

Advogado, OAB

2.6. CASOS PRÁTICOS

Caso Prático resolvido.

Kelly, brasileira, solteira, residente e domiciliada à Rua Barão de Souza Leão, n. 40, em Recife –PE, no Bairro de Boa Viagem, grávida de 8 meses, é uma garçonete e trabalha no bar “A Saideira”, situado na Avenida Domingos Ferreira, n. 300, Bairro de Boa Viagem.

No dia 13.04.2012, por volta das 1h00 da madrugada, Kelly estava atendendo um cliente, de nome Bruno, brasileiro, solteiro, com 50 anos de idade, residente e domiciliado na Avenida Domingos Ferreira, n. 302, apt. 1001, Edf. Renascer, muito conhecido no Bar “A Saideira”, pois sempre era o último a sair do estabelecimento. Em decorrência da hora, Kelly informou que o bar iria fechar e que somente poderia servir mais uma bebida.

Bruno não se conformou com a resposta de Kelly e, por esta razão, com intenção de lesionar, mesmo vendo que ela estava grávida, desferiu 5 tapas no rosto de Kelly, o que ofendeu a sua integridade corporal e deixou Kelly extremamente nervosa, acarretando a aceleração de seu parto.

Ao perceber o seu ato impulsivo e impensado Bruno fugiu para a sua residência, onde ficou refletindo sobre a sua atitude. O dono do Bar “A Saideira” presenciou o ocorrido com Kelly e prontamente foi informar a autoridade policial competente sobre o crime. No momento que os policiais de plantão foram perseguir o acusado Bruno, este entra na delegacia e informa que queria se entregar, reconhecendo que lesionou Kelly.

Os policiais, após as declarações de Bruno, deram ao mesmo ordem de prisão em flagrante e efetuando, ali mesmo, sua prisão sob a alegação do cometimento do crime de lesões corporais de natureza grave, em decorrência da aceleração do parto de Kelly, conforme Art. 129, § 1º, IV, do CP.

Além disso, após a lavratura do auto de prisão em flagrante, que se deu no dia 13.12.2012, por volta das 3h00 da madrugada, o delegado de polícia, notificou o juiz competente, o Ministério Público, a Defensoria Pública, já que o acusado não tinha advogado constituído e, como tinha um compromisso muito importante no dia seguinte, recusou-se a permitir contato de Bruno com seus familiares, somente comunicando a família do mesmo sobre o flagrante no dia 15.12.2012, por volta das 13h00.

Em face dessa situação hipotética, na condição de advogado (a) contratado (a) por Bruno, redija a peça processual que atenda aos interesses de seu cliente.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ VARA CRIMINAL DA COMARCA DE RECIFE CAPITAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO

Bruno, brasileiro, solteiro, portador da Cédula de Identidade número _______________, expedida pela ________________, inscrito no Cadastro de Pessoa Física do Ministério da Fazenda sob o número ____________________, residente e domiciliado na Avenida Domingos Ferreira, n. 302, apt. 1001, Edf. Renascer, por seu advogado abaixo assinado, conforme procuração anexa a este instrumento, vem muito respeitosamente à presença de Vossa Excelência, requerer o

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RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE

com fundamento no artigo 5º, LXV da Constituição Federal, e art. 310, I, do Código de Processo Penal, pelos motivos de fato e direito a seguir expostos:

1. Exposição dos fatos

Conforme consta do auto de prisão em flagrante, o requerente apresentou-se espontaneamente à autoridade policial competente atribuindo a si mesmo a suposta prática do crime de lesões corporais contra Kelly.

O crime teria sido cometido no dia 13.12.2012, por volta das 1h00 da madrugada, no Bar “A Saideira”, quando Kelly estava atendendo o requerente e, em decorrência da hora, informou ao requerente que o bar iria fechar e que somente poderia servir mais uma bebida. Foi neste momento que o ora requerente teria supostamente desferido 5 tapas no rosto da vítima, o que teria deixado esta extremamente nervosa e acarretado a aceleração de seu parto.

Entretanto, apesar de o requerente ter se apresentado espontaneamente à autoridade policial competente, os policiais de plantão, após as declarações do requerente, deram-lhe ordem de prisão em flagrante, com a alegação do cometimento do crime de lesões corporais de natureza grave, em decorrência da aceleração do parto de Kelly, conforme Art. 129, § 1º, IV, do Código Penal.

Além disso, após a lavratura do auto de prisão em flagrante, que se deu no dia 13.12.2012, por volta das 3h00 da madrugada, o delegado de polícia, notificou o juiz competente, o Ministério Publico, a Defensoria Pública, já que o requerente não tinha advogado constituído e, sob a alegação de possuir um compromisso muito importante no dia seguinte, recusou-se a permitir que o ora requerente entrasse em contato com seus familiares, em flagrando abuso de autoridade, somente comunicando a família do requerente sobre o flagrante no dia 15.12.2012, por volta das 13h00.

2. Das ilegalidades da prisão em flagrante.

Inicialmente, cumpre esclarecer que a situação de o réu se entregar a autoridade policial não se enquadra em nenhuma das hipóteses de flagrante delito constantes do Art. 302, do Código de Processo Penal, o que evidencia uma ilegalidade material.

Portanto, não se encontrava, o ora requerente, em estado de flagrância a justificar sua prisão.

O art. 302 do Código de Processo Penal prevê a hipótese de flagrante próprio, quando o sujeito está cometendo ou acaba de cometer um crime, de flagrante impróprio quando o sujeito é perseguido pela autoridade policial logo após o crime em situação que faça presumir ser o autor da infração e do flagrante presumido, quando o sujeito é encontrado logo depois com objetos que façam presumir ser ele o autor da infração.

Ora, no caso em concreto, o requerente apresentou-se espontaneamente à autoridade policial e atribuiu a si mesmo a suposta prática do crime de lesão corporal, não havendo a configuração de nenhuma das hipóteses de flagrante delito constantes do Art. 302 do Código de Processo Penal, o que viabiliza o presente pedido de relaxamento de prisão em flagrante em face da patente ilegalidade material.

Não bastasse a ilegalidade material do flagrante, também não foi obedecido um requisito formal na lavratura do auto de prisão em flagrante, qual seja, a comunicação do flagrante à família do preso, conforme preceituam o art. 5o, LXII, da Constituição Federal, e o art. 306, caput, do Código de Processo Penal. Vale ressaltar que a autoridade policial, em razão de alegados compromissos pessoais, simplesmente recusou-se a cumprir a exigência de comunicação à família do requerente, incorrendo em evidente abuso de autoridade.

Consta dos autos que o requerente foi preso em flagrante no dia 13.12.2012, por volta das 3h00 da madrugada, e o delegado de polícia, apenas notificou o juiz competente, o Ministério Público e a Defensoria Pública e como tinha um compromisso muito importante no dia seguinte, somente deixou para comunicar a família do requerente sobre o flagrante no dia 15.12.2012, por volta das 13h00, em evidente afronta ao art. 306 do Código de Processo Penal, que exige a comunicação imediata à família do preso ou pessoa por ele indicada.

Patente, portanto, a ilegalidade formal da prisão em flagrante.

3. Da impossibilidade de decretação de prisão preventiva.

Por fim, em caráter subsidiário e apenas por cautela, vale ressaltar que no caso concreto, após o relaxamento da prisão em flagrante em face dos patentes vícios materiais e formais, não existe a possibilidade de ser decretada a prisão preventiva do requerente.

No caso em comento não existe quaisquer dos motivo que autorizariam a prisão preventiva, configurando-se evidente a impossibilidade de manutenção do indiciado, ora requerente, no cárcere, a qualquer título.

4. Pedido.

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Ante o exposto, postula-se a Vossa Excelência, com base no artigo 5º, LXV da Constituição Federal, e art. 310, I, do Código de Processo Penal, diante da flagrante ilegalidade de sua prisão, o imediato relaxamento da prisão em flagrante a ele imposta ao requerente.

Termos em que, ouvido o ilustre representante do Ministério Público e expedindo-se o alvará de soltura, pede deferimento.

Recife, Data.

Advogado

Caso prático proposto

Roberval, brasileiro, solteiro, com 17 anos de idade, residente e domiciliado em Cabo Frio-RJ, na Rua Boa Esperança, bairro Bom Sucesso, desferiu contra Joel, brasileiro, solteiro, com animus necandi, três tiros, em decorrência de uma discussão sobre futebol.

Após o cometimento do crime, Roberval foi perseguido pelas autoridades policiais que tomaram conhecimento da ocorrência do crime, sendo preso 25 horas após a ocorrência do crime em uma perseguição ininterrupta.

A autoridade policial da cidade de Cabo Frio-RJ lavrou o auto de prisão em flagrante atribuindo ao acusado o cometimento do crime de homicídio qualificado por motivo fútil, Art. 121, § 2°, II, do CP, notificou dentro do prazo legal as autoridades constantes do Art. 306 do CPP e somente após 4 dias da lavratura do auto de prisão em flagrante, em decorrência de um esquecimento em virtude do grande volume de inquéritos policiais existentes na delegacia, expediu a nota de culpa do acusado.

Em face dessa situação hipotética, na condição de advogado (a) contratado (a) por Roberval, redija a peça processual que atenda aos interesses de seu cliente.

Endereçamento – Vara do Tribunal do Júri da Comarca de Cabo Frio Estado do Rio de Janeiro.

Tese – ilegalidade material – menor de idade não pode ser preso em flagrante e sim apreendido nos termos do Art. 172 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Ilegalidade formal – falta de expedição da nota de culpa do acusado dentro de 24 horas e a prestação do recibo, conforme preceitua o Art. 306 do CPP.

Pedido – relaxamento da prisão em flagrante e expedição do alvará de soltura.

3. QUADROS SINÓTICOS PARA MEDIDAS DE LIBERDADE

MEDIDAS DE CONTRACAUTELA

(PEDIDO DE LIBERDADE)

CAUSA OU CAUTELA

(TIPO DE PRISÃO) EFEITOS

Relaxamento de Prisão Prisão ILEGAL Liberdade plena.

Liberdade Provisória Prisão em flagrante

LEGAL

Vinculação ao juízo e ao processo,

podendo ainda o juiz impor uma das

cautelares não prisionais previstas nos

arts. 319 e 320 do CPP

Revogação da Preventiva Prisão preventiva LEGAL Acarretaria liberdade plena, mas o juiz

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pode cumular com as cautelares não

prisionais previstas nos arts. 319 e 320 do

CPP

HIPÓTESES FÁTICAS

HIPÓTESE AUTORIDADE

COATORA MEDIDA CABÍVEL

Prisão em flagrante ilegal da qual o juiz ainda não

tomou ciência. Delegado de Polícia

Relaxamento de prisão endereçado

ao juiz.

Juiz toma ciência da prisão em flagrante legal e

ainda não se manifestou acerca da concessão da

liberdade provisória, não decretou a preventiva,

nem relaxou a prisão, mas ainda estamos dentro de

um prazo razoável.

Liberdade Provisória ao juiz.

Juiz toma ciência da prisão em flagrante e não se

manifesta acerca da concessão da liberdade

provisória, nem decreta a preventiva, nem relaxa a

prisão. Ou seja, mantém o preso em flagrante além

do que autoriza a lei art. (310 do CPP).

Juiz Habeas corpus no tribunal.

Prisão temporária decretada ilegalmente. Juiz Habeas corpus no tribunal.

Prisão preventiva decretada ilegalmente. Juiz Habeas corpus no tribunal.

Prisão preventiva legal cujos pressupostos

desapareceram.

Revogação da preventiva ao juiz.

Caso ele negue, habeas corpus no

tribunal.

Prisão em flagrante legal. Liberdade provisória ao juiz.

Prisão temporária legal cujos motivos cessaram.

Revogação da temporária ao juiz.

Caso ele negue, habeas corpus no

tribunal.

Inquérito policial instaurado em conduta

flagrantemente atípica ou quando for evidente a

falta de justa causa.

Delegado de Polícia. Habeas corpus ao juiz para

“trancamento” do inquérito policial.

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4. LIBERDADE PROVISÓRIA

4.1. Cabimento

A liberdade provisória é a medida cabível nas hipóteses de flagrante lícito, tanto na materialidade quanto na formalidade, devendo-se demonstrar que não existe a necessidade de se manter o agente encarcerado.

Existem algumas formas de se demonstrar a desnecessidade de manutenção da prisão do agente, o que será devidamente analisado a seguir. Antes de mencioná-las, é importante observar as seguintes dicas:

DICAS ! 1ª) A liberdade provisória somente é possível em casos de flagrantes legais, portanto, ao pleitear a

medida, o requerente está admitindo a legalidade do flagrante. O advogado simplesmente não questiona a legalidade do flagrante, em decorrência, não se discute em preliminar a ilegalidade da prisão no pedido de liberdade provisória.

2ª) A liberdade provisória tem por objetivo a restituição do preso ao status de liberdade, uma vez que ausentes os pressupostos da prisão preventiva.

3ª) Assegura a Constituição Federal que “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança” (art. 5o, LXVI, da CRFB/88).

4.2. Formas de se demonstrar a desnecessidade da manutenção da prisão em flagrante

a) Ausência dos requisitos que autorizam a prisão preventiva.

Uma das formas de se demonstrar a desnecessidade da manutenção da prisão em flagrante é esclarecer que não estão presentes, no caso concreto, os requisitos autorizadores da prisão preventiva, previstos nos artigos 312 e 313 do CPP, sendo cabível o pedido de liberdade provisória COM ou SEM fiança nos termos do art. 321 e seguintes do CPP.

Ressalte-se que, se qualquer dos motivos autorizadores da prisão preventiva estiver presente, a liberdade provisória não será concedida, a qualquer título, motivo pelo qual, para o reconhecimento e a elaboração a peça processual da liberdade provisória, é de suma importância ter um conhecimento mais aprofundado sobre a prisão preventiva, modalidade de prisão cautelar.

Vale transcrever os artigos relacionados aos requisitos que autorizam a prisão preventiva previstos no CPP:

Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o).

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

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II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

IV - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

Art. 314. A prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal.

Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada.

Cabe neste momento relembrar a fórmula para o cabimento da preventiva:

PP = 2p + 1f + 1ca

Sendo:

PP= prisão preventiva;

p= pressupostos = prova da existência do crime e indício suficiente de autoria (fumus comissi delicti) – art. 312 do CPP;

f= fundamentos = garantia da ordem pública, da ordem econômica,

por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal (periculum in mora) – art. 312 do CPP;

ca= condições de admissibilidade = hipóteses de cabimento da

preventiva - art. 313 do CPP.

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

IV - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

Assim, para que uma prisão preventiva seja decretada, devem estar presentes o fumus comissi delicti (prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria) e o periculum libertatis (garantia da ordem pública ou garantia da ordem econômica ou conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal). Além disso, deve haver previsão legal de prisão para aquele caso concreto, ao que chamamos legalidade ou condições de admissibilidade.

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Deve-se observar os Art. 312 e o 313 do CPP que dão os critérios objetivos autorizadores da prisão preventiva. São estes os critérios a serem analisados pelo juiz quando toma ciência do flagrante, já que, com a reforma implementada pela Lei 12.403/2011, não é mais possível a manutenção da prisão em flagrante após a ciência formal do juízo.

Assim, ao receber os autos do flagrante, o juiz deve atentar para o que dispõe o art. 310 do CPP, com a atual redação:

Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:

I - relaxar a prisão ilegal; ou

II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou

III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.

Na liberdade provisória a discussão é, portanto, de mérito, e deve-se demonstrar que não estão presentes os requisitos objetivos e subjetivos da prisão preventiva, devendo ser pleiteada até o momento em que o juiz toma ciência e decide conforme art. 310 supra.

Repare que o juiz deve, de acordo com o atual art. 310 do CPP, manifestar-se de ofício acerca da concessão do benefício, mas nada impede que seja o mesmo, antes daquele momento, provocado pelo advogado. Entretanto, se não houver pedido de liberdade provisória em momento anterior, nem o juiz a conceder de ofício, ou seja, se após ciência do flagrante, o juiz mantiver o preso “em flagrante”, sem conceder a liberdade, relaxar a prisão ou converter o flagrante em preventiva, a prisão passa a ser prisão ilegal, e, a partir daí, a solução seria impetrar o habeas corpus no tribunal, já que o juiz, agindo em desconformidade com a lei, passa a se configurar como autoridade coatora.

Hoje, portanto, em razão da nova lei, quando o juiz for analisar o flagrante inicial, terá que decidir se deve conceder a liberdade provisória ou se modifica esse flagrante pela prisão preventiva, fundamentando-a no art. 312 do CPP, ou ainda se há a possibilidade de aplicação de outra medida cautelar diversa da prisão (art. 319 do CPP). Ou seja, o juiz agora tem que fundamentar mais as suas decisões, não sendo possível a manutenção do flagrante após a ciência formal do juiz. O flagrante legal tem, então, natureza de uma pré-cautelar, já que haverá necessariamente a sua conversão em uma outra cautelar, seja ela a preventiva, seja uma das cautelares não prisionais previstas nos arts. 319 e 320 do CPP:

Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:

I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

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V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;

VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;

IX - monitoração eletrônica.

§§ 1o, 2o e 3o (revogados)

§ 4o A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares.

Art. 320. A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.

Lembre-se:

Medidas de contracautela – Nada mais são que medidas cautelares que visam atacar uma cautela já decretada pelo juízo. As medidas de contracautela ou cautelares de liberdade são endereçadas ao juízo processante, o que as diferencia da ação autônoma de impugnação de Habeas Corpus.

São medidas de contracautela ou cautelares de liberdade o relaxamento de prisão, visto no capítulo anterior, a liberdade provisória e a revogação da preventiva, que hoje pode ser aplicada também à prisão temporária. Veja novamente o quadro abaixo:

MEDIDAS DE CONTRACAUTELA

(PEDIDO DE LIBERDADE)

CAUSA OU CAUTELA

(TIPO DE PRISÃO) EFEITOS

Relaxamento de Prisão Prisão ILEGAL Liberdade plena.

Liberdade Provisória Prisão em flagrante

LEGAL

Vinculação ao juízo e ao processo,

podendo ainda o juiz impor uma das

cautelares não prisionais previstas nos

arts. 319 e 320 do CPP

Revogação da Preventiva Prisão preventiva LEGAL

Acarretaria liberdade plena, mas o juiz

pode cumular com as cautelares não

prisionais previstas nos arts. 319 e 320 do

CPP

Como já foi dito acima a prisão preventiva possui a seguinte fórmula PP = 2P + 1f + 1Ca, que pode ser explicada da seguinte forma:

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Pressupostos - a lei exige prova da materialidade do crime, ou seja, no que se refere a materialidade deve-se ter a certeza de que ela foi demonstrada mediante prova. Além disso, a lei exige a existência de indícios suficientes da autoria, isto é, deve-se demonstrar indicativos de que o sujeito é o autor ou participou do crime, não sendo exigida prova cabal em relação a este segundo pressuposto. Contudo, devem estar presentes estes dois pressupostos para que seja viável a decretação da prisão preventiva, conforme interpretação extraída do Art. 312, do CPP.

Fundamentos – existem quatro fundamentos, devendo haver pelo menos um para que seja viável a decretação da prisão preventiva. Os fundamentos da prisão preventiva podem ser explicados da seguinte forma:

Garantia da ordem pública – ocorre quando há risco na prática de novas infrações por parte do indiciado ou réu, motivo pelo qual o mesmo não será solto. A preocupação está na segurança social, uma vez que há sérios indícios de que o réu, se solto estiver, voltará a delinquir. A preventiva é decretada com o objetivo de se evitar que o indivíduo venha a cometer mais crimes. Contudo, importante ressaltar que não mais se admite uma preventiva fundada em clamor público ou na gravidade abstrata da conduta. Neste sentido, indicamos a leitura do voto do Min. Celso de Mello no HC 80719 / SP, parcialmente transcrito abaixo:

“A privação cautelar da liberdade individual reveste-se de caráter excepcional, somente devendo ser decretada em situações de absoluta necessidade. A prisão preventiva, para legitimar-se em face de nosso sistema jurídico, impõe - além da satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da existência material do crime e indício suficiente de autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base empírica idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do indiciado ou do réu. A PRISÃO PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR - NÃO TEM POR OBJETIVO INFLIGIR PUNIÇÃO ANTECIPADA AO INDICIADO OU AO RÉU. - A prisão preventiva não pode - e não deve - ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia. A prisão preventiva - que não deve ser confundida com a prisão penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal. O CLAMOR PÚBLICO, AINDA QUE SE TRATE DE CRIME HEDIONDO, NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE. - O estado de comoção social e de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a decretação da prisão cautelar do suposto autor do comportamento delituoso, sob pena de completa e grave aniquilação do postulado fundamental da liberdade. O clamor público - precisamente por não constituir causa legal de justificação da prisão processual (CPP, art. 312) - não se qualifica como fator de legitimação da privação cautelar da liberdade do indiciado ou do réu...”

Garantia da ordem econômica – a prisão é decretada por garantia da ordem econômica quando verificada a probabilidade de, estando solto o réu, voltar o mesmo a praticar crimes contra a ordem econômica ou as relações de consumo. Trata-se de questão semelhante à garantia da ordem pública, porém com especificidade para crimes desta natureza (contra a ordem econômica ou as relações de consumo).

Garantia da aplicação da lei penal – ocorre quando há risco do indivíduo, se solto, tentar evadir-se, furtando-se à aplicação da lei no caso de uma eventual condenação. Ou seja, há risco de o réu vir a fugir, o que inviabilizaria a aplicação da lei penal.

Conveniência da instrução criminal – ocorre quando há risco do indiciado ou réu, se solto, dificultar o andamento do inquérito policial ou da instrução criminal, prejudicando, assim, a colheita de provas. Os clássicos exemplos são aqueles em que o réu ameaça testemunhas, forja provas, prejudica perícias, destrói documentos etc.

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LEMBRETE: Não é possível a prisão preventiva fundamentada exclusivamente na

repercussão social do crime, gravidade em abstrato da conduta ou clamor público. Assim, uma prisão decretada por tais motivos não possui fundamentação idônea, configurando-se numa prisão ilegal, passível de habeas corpus.

Além dos pressupostos, que nos indicam a necessidade da prisão, deve-se analisar se a prisão preventiva é possível naquele caso concreto, daí a necessidade de se verificar as condições de admissibilidade.

Condições de admissibilidade

Deve-se observar o art. 313 do CPP:

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

IV - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

Como antes indicado, não é cabível liberdade provisória quando presente qualquer dos motivos autorizadores da preventiva. Assim, para requerer a liberdade provisória deve-se demonstrar a ausência do periculum libertatis, ou seja, a ausência da garantia de ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou aplicação da lei penal, da mesma forma em que não será cabível a preventiva em hipóteses diversas daquelas indicadas no art. 313 supra. Ou seja, não é cabível prisão preventiva em crimes com pena máxima in abstracto igual ou inferior a 4 (quatro) anos, salvo se o indiciado ou réu for reincidente (inciso II do art. 313), se houver necessidade de garantia das tutelas de urgência nos casos de violência doméstica (veja inciso III do art. 313), ou ainda nos casos em que há dúvida sobre a identidade civil (parágrafo único do 313).

A prisão preventiva é a ultima ratio. Por tal motivo, hoje, o juiz somente poderá decretá-la quando as medidas cautelares de que trata os artigos 319 e 320 do CPP forem insuficientes ao caso concreto, mostrando-se a preventiva extremamente necessária.

Assim, na peça em que será formulado o pedido de liberdade provisória, deve o candidato demonstrar que não estão presentes os pressupostos, ou não estão presentes os fundamentos ou não estão presentes as condições de admissibilidade da prisão preventiva, pedindo, em seguida, a concessão da liberdade provisória.

Lembre-se, entretanto, que nos casos em que o juiz já tenha decretado a preventiva, embora ausentes seus requisitos, a prisão será manifestamente ilegal, e o juiz passa a ser considerado autoridade coatora, caso em que a medida correta é o habeas corpus, endereçado ao tribunal competente.

Ainda em relação a prisão preventiva, vale lembrar que ela possui as seguintes características básicas:

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1.ª) Somente pode ser decretada mediante ordem judicial. Vale ressaltar que a decretação pode ocorrer de ofício pelo juiz ou mediante provocação (delegado de polícia, Ministério Público, querelante ou assistente). Fique atento, pois a prisão temporária não pode ser decretada de oficio, esta somente poderá ser decretada por provocação da autoridade policial ou do MP (em caso de representação da autoridade policial será necessário ouvir o MP – art. 2º, § 1º, Da Lei. 7960/89).

Importante lembrar, entretanto, que após a alteração da Lei 12.403/11, o art. 311 do CPP somente admite que o juiz decrete a prisão preventiva de ofício durante a ação penal. Assim, caso a mesma seja decretada de ofício em fase de inquérito estará configurada prisão ilegal e, como o juiz é a autoridade coatora, cabível habeas corpus para o tribunal.

2.a) A prisão preventiva não tem prazo determinado, o seu prazo será mantido enquanto persistirem os seus requisitos autorizativos. No caso dela já ter sido decretada e o advogado entenda que não mais persistem os seus requisitos, deve haver um pedido de revogação. A prisão preventiva é rebus sic stantibus, ou seja, dura enquanto durar o estado das coisas.

Embora não haja prazo determinado pela lei, doutrina e jurisprudência sempre apresentaram o entendimento de que a instrução criminal, quando se tratar de réu preso, não poderia ultrapassar o prazo de 81 dias, sob pena de constrangimento ilegal por excesso de prazo e consequente relaxamento da prisão, que pode ocorrer de ofício pelo juiz ou a requerimento de qualquer das partes. Contudo, há exceções: quando a defesa deu causa, quando há excessivo número de réus ou complexidade probatória. Trata-se de construção jurisprudencial fundada nos prazos do antigo rito ordinário, portanto, é provável que, num futuro breve, este prazo seja modificado. O único dispositivo legal que menciona esses 81 dias é o art. 8º. da Lei 9.034/95. Caso a instrução criminal ultrapasse o prazo de 81 dias utilizado até a reforma de 2011, entende-se a prisão por ilegal e, se o juiz não a relaxar, deve-se impetrar habeas corpus no tribunal.

3º ) A prisão preventiva pode ser decretada a qualquer tempo desde que não tenha existido o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Logo, é plenamente possível a decretação da prisão preventiva em fase recursal, desde que presentes os motivos que a autorizam.

Importante lembrar que questões meramente pessoais, por si só, não ensejam a concessão da liberdade provisória, ou seja, o advogado deve demonstrar que não estão presentes todos os requisitos objetivos da prisão preventiva.

Outra forma de demonstrar a desnecessidade da manutenção da prisão em flagrante delito é quando, no caso concreto, o acusado estiver amparado por uma excludente de ilicitude prevista no art. 23 do CP, tendo em vista que, nos termos do Art. 310, parágrafo único, do CPP, a presença de qualquer destas excludentes autoriza a concessão da liberdade provisória SEM fiança.

A razão da existência desta hipótese de concessão de liberdade provisória sem fiança, é a de que se houver indícios de que o sujeito agiu amparado por uma excludente de ilicitude, simplesmente não haverá crime, e, por consequência, não há a necessidade de manter o sujeito preso em flagrante, sendo também desnecessária a prisão preventiva.

4.3. Espécies de liberdade provisória após a Lei 12.403/11

Com as alterações implementadas pela Lei 12.403/2011, podemos identificar no Código de Processo Penal as seguintes espécies de liberdade provisória:

Liberdade provisória mediante fiança (arts. 322 e seguintes do CPP)

Liberdade provisória sem fiança por pobreza (art. 350 do CPP)

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Liberdade provisória porque presentes excludentes de ilicitude (art. 310, parágrafo único, do CPP)

Liberdade provisória sem fiança com a aplicação das medidas do art. 319 e 320 do CPP (art. 321 do CPP)

Assim, a liberdade provisória poderá ser com ou sem fiança, neste sentido devem ser observadas as seguintes regras quanto a possibilidade de concessão de fiança na liberdade provisória:

Cabimento de fiança: regra geral será cabível a liberdade provisória COM fiança.

Não cabimento de fiança: exceção que deve estar prevista expressamente na lei. Desta forma, pode-se elencar de forma resumida quais são as hipóteses de impossibilidade de concessão de fiança hoje:

Art. 323. Não será concedida fiança:

I - nos crimes de racismo;

II - nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos;

III - nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;

IV - (Revogado)

V - (Revogado)

Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança:

I - aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código;

II - em caso de prisão civil ou militar;

III - (Revogado)

IV - quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312).

ATENÇÃO! Quando analisamos a legislação extravagante, verificamos uma série de

outras vedações normativas à liberdade provisória ou à fiança, como por exemplo no art. 7º da lei 9.034/95 (combate ao crime organizado), no Estatuto do Desarmamento (hipótese expressamente declarada inconstitucional pelo STF), contudo tais hipóteses já eram compreendidas pela jurisprudência como inconstitucionais. A jurisprudência e a doutrina entendem que estes dispositivos ferem a lógica processual, pois caso seja preso em flagrante o agente não poderia pleitear liberdade provisória, mas em sendo preso por determinação judicial, poderia perfeitamente ingressar, através de seu advogado com um pedido de revogação.

Todavia, com o advento da Lei 12.403/2011, desaparece toda e qualquer discussão, somente sendo vedada a liberdade provisória mediante fiança nos crimes indicados no art. 323 do CPP acima transcrito, que são os mesmos indicados como inafiançáveis pela Constituição Federal de 1988, art. 5o., incisos XLII, XLIII e XLIV:

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

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XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;

Estando presentes qualquer das vedações acima elencadas, NÃO será possível a concessão da liberdade provisória COM fiança, entretanto, uma vez ausentes os pressupostos da prisão preventiva, surge a discussão sobre a possibilidade da liberdade provisória SEM fiança, aplicando-se cumulativamente as medidas cautelares previstas no art. 319 e 320 do CPP já vistas anteriormente. Lógico que a discussão doutrinária e jurisprudencial é acirrada, mas para o advogado, lógico que mais favorável a tese de possibilidade de concessão do benefício. Sobre tal discussão veja item 1.4.5 deste capítulo.

OBS.: Na regra geral não há necessidade de pleitear liberdade provisória em infrações de

menor poder ofensivo.

Em caso de ocorrência desta modalidade de infração penal, deve o suposto autor do fato ser encaminhado imediatamente ao JECRIM, e somente na impossibilidade de adoção deste procedimento, deverá o acusado prestar compromisso de a ele comparecer, não se imputando flagrante nem fiança (art. 69 da Lei 9.099\95);

Perceba a lógica: não existirá flagrante, logo não há que se discutir a liberdade provisória; Caso o suposto autor do fato aceite prestar o compromisso de comparecimento ao juizado e, ainda assim, seja preso em flagrante, tal flagrante será manifestamente ilegal, cabendo relaxamento de prisão, e não liberdade provisória que, como vimos, é cabível para prisões em flagrante legais;

Somente será possível a lavratura do auto de prisão em flagrante por infração de menor poder ofensivo nas hipóteses em que o suposto autor do fato claramente se recuse a prestar compromisso, cabendo neste caso, a título de excepcionalidade, a liberdade provisória, que poderá ser concedida diretamente pela autoridade policial, já que a infração de menor potencial ofensivo tem pena de até 2 anos, portanto, inferior aos 4 anos indicados no art. 322 do CPP.

Art. 322. A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos.

Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.

Em caso de não concessão da liberdade provisória mediante fiança pela autoridade policial, o preso, ou alguém por ele, poderá peticionar ao juiz competente buscando sua concessão.

Art. 335. Recusando ou retardando a autoridade policial a concessão da fiança, o preso, ou alguém por ele, poderá prestá-la, mediante simples petição, perante o juiz competente, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.

4.4. Casos de decretação de prisão temporária ou de prisão preventiva

Como já foi dito, o pedido de liberdade provisória será cabível quando houver a prisão em flagrante e não houver a necessidade de sua manutenção. Entretanto, o candidato deve ficar atento ao seguinte detalhe:

Somente será cabível o pedido de liberdade provisória se a prisão preventiva ou a prisão temporária NÃO houver sido decretada. Em caso de decretação de uma prisão preventiva ou temporária legal, cabível será o pedido de revogação da prisão preventiva ou temporária e não um pedido de liberdade provisória.

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A prisão preventiva já foi devidamente abordada em tópico anterior, já prisão temporária merece algumas considerações que podem ser pedidas nas provas da OAB.

A prisão temporária possui as seguintes características básicas:

1ª) Visa precipuamente auxiliar nas investigações policiais, somente sendo possível em fase de inquérito policial. Assim, a prisão temporária só pode ser decretada na fase do inquérito policial – desta forma, sendo impossível sua decretação após o recebimento da denúncia. Esta é outra diferença em relação à prisão preventiva, que pode ser decretada a qualquer tempo antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

2ª) A prisão temporária não pode ser decretada de ofício pelo juiz. Para que ele a decrete, necessária a representação da autoridade policial ou o requerimento do Ministério Público. No caso de representação da autoridade policial, antes de decidir o juiz deverá ouvir o Ministério Público.

3ª) Só é cabível nos crimes indicados no art. 1o, inc. III, da Lei 7.960/89. O rol ali constante é taxativo e todos os crimes são, na hipótese, de ação penal pública, sendo, portanto, vedado ao ofendido requerer prisão temporária. Não é cabível prisão temporária em crimes de ação penal privada.

4ª) Possui prazo determinado – diferentemente da prisão preventiva, a prisão temporária possui um prazo determinado de duração. Seu prazo é de 5 dias, prorrogável por mais 5 em caso de comprovada e extrema necessidade. Já em relação aos crimes hediondos e equiparados o seu prazo é de 30 dias, prorrogável por mais 30 dias em caso de comprovada e extrema necessidade. Esta prorrogação não é automática, dependendo de decisão fundamentada.

4.5. Questão Polêmica: é cabível ou não pedido de liberdade provisória em crimes

hediondos e equiparados?

Há muito doutrina e jurisprudência discutem o cabimento da liberdade provisória nos crimes hediondos e equiparados, destacando-se, dentre as muitas discussões, decorrentes de inúmeras alterações e inovações legislativas, aquelas referentes à possibilidade do benefício no caso de tráfico de entorpecentes.

Após as alterações da Lei 8.072/90 (Crimes Hediondos) pela Lei 11.464/2007, os tribunais superiores passaram, salvo decisões isoladas, a entender possível o pedido de liberdade provisória em crimes hediondos, diferenciando a liberdade provisória mediante fiança daquela sem fiança por ausência dos pressupostos da preventiva.

Por certo, crimes hediondos são inafiançáveis, e, portanto, inadmissível a liberdade provisória mediante fiança. O mesmo podendo ser dito do crime de tráfico de entorpecentes.

A dúvida, entretanto, não está na possibilidade de fiança, esta completamente inviável nestes casos, seja por ditame constitucional (dispõe o art. 5o., inc. XLIII, da CRFB/88, que “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”), seja em função do já transcrito art. 323 do CPP.

A dúvida e divergências dela decorrentes surgem quanto à possibilidade de concessão da liberdade provisória SEM fiança, quando ausentes os pressupostos da preventiva.

Inicialmente deve-se saber quais são os crimes hediondos, para tanto deve-se olhar o art. 1º da Lei 8.072/90, valendo ressaltar que somente dois crimes sexuais são hediondos, estupro e o

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estupro de vulnerável. Além de inafiançáveis, os crimes hediondos são também insuscetíveis de graça e anistia, devendo a pena ser cumprida inicialmente no regime fechado, sendo plenamente possível a progressão de regime quando cumprido 2/5 da pena se o apenado for primário, ou 3/5 da pena se reincidente em crime hediondo específico. Vale ressaltar que o tráfico de entorpecentes, a tortura e o terrorismo não são hediondos, e sim equiparados a hediondos.

Pois bem, com o advento da Lei 11.464/2007, que alterou o art. 2o da Lei de Crimes Hediondos, extraindo do texto a vedação à “liberdade provisória”, o entendimento majoritário era pela possibilidade de liberdade provisória sem fiança, por ausência dos pressupostos da preventiva.

Contudo, após decisão da 1ª Turma do STF, que acompanhou voto da Min. Carmen Lúcia, no sentido da impossibilidade de liberdade provisória no tráfico de entorpecentes em razão de sua inafiançabilidade, passou aquela Turma a entender que não seria cabível o pedido de liberdade provisória nos crimes hediondos geral, pelo mesmo motivo (são inafiançáveis). Neste sentido os seguintes julgados, todos anteriores à reforma de 2011:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSO PENAL. PRISÃO EM FLAGRANTE POR TRÁFICO DE DROGAS. LIBERDADE PROVISÓRIA: INADMISSIBILIDADE. ORDEM DENEGADA.

1. A proibição de liberdade provisória, nos casos de crimes hediondos e equiparados, decorre da própria inafiançabilidade imposta pela Constituição da República à legislação ordinária (Constituição da República, art. 5º, inc. XLIII): Precedentes. O art. 2º, inc. II, da Lei n. 8.072/90 atendeu ao comando constitucional, ao considerar inafiançáveis os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos. Inconstitucional seria a legislação ordinária que dispusesse diversamente, tendo como afiançáveis delitos que a Constituição da República determina sejam inafiançáveis. Desnecessidade de se reconhecer a inconstitucionalidade da Lei n. 11.464/07, que, ao retirar a expressão ‘e liberdade provisória’ do art. 2º, inc. II, da Lei n. 8.072/90, limitou-se a uma alteração textual. A proibição da liberdade provisória decorre da vedação da fiança, não da expressão suprimida, a qual, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, constituía redundância. Mera alteração textual, sem modificação da norma proibitiva de concessão da liberdade provisória aos crimes hediondos e equiparados, que continua vedada aos presos em flagrante por quaisquer daqueles delitos.

2. A Lei n. 11.464/07 não poderia alcançar o delito de tráfico de drogas, cuja disciplina já constava de lei especial (Lei n. 11.343/06, art. 44, caput), aplicável à espécie vertente.

3. Irrelevância da existência, ou não, de fundamentação cautelar para a prisão em flagrante por crimes hediondos ou equiparados: Precedentes.

4. É firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal no sentido de que as condições subjetivas favoráveis do Paciente, tais como emprego lícito, residência fixa e família constituída, não obstam a segregação cautelar. Precedentes. 5. Ordem denegada.

(STF. HC 103715 / RJ. Rel. Min. Cármen Lúcia. Primeira Turma. J: 23/11/2010. DJe- 055 24-03-2011 VOL-02488-01 PP-00065)

EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. ART. 35 DA LEI 11.343/2006. LIBERDADE PROVISÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. ART 5º, XLIII, DA CONSTITUIÇÃO. INAFIANÇABILIDADE. VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL. PRISÃO CAUTELAR. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. NOVO TÍTULO A RESPALDAR A SEGREGAÇÃO DO PACIENTE. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. MATÉRIA NÃO SUSCITADA NO TRIBUNAL A QUO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

I - A superveniência de sentença condenatória torna prejudicado o exame do pedido referente ao excesso de prazo da prisão cautelar e à ausência de seus requisitos autorizadores.

II - A proibição da liberdade provisória nos crimes hediondos e equiparados decorre da própria inafiançabilidade imposta pelo art. 5º, XLIII, da Constituição Federal à legislação ordinária. Precedentes.

III - A alegação de que a custódia do paciente viola o princípio da presunção de inocência não foi submetida à apreciação do Tribunal a quo, o que impede seu exame por esta Corte sob pena de supressão de instância.

IV - Habeas Corpus não conhecido.

(STF. HC 101503 / RJ. Rel. Min. Ricardo Lewandowski. Primeira Turma. J 10/08/2010. DJe-200 22-10-2010 EMENT VOL-02420-02 PP-00435)

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EMENTA: HABEAS CORPUS. PACIENTE PRESO EM FLAGRANTE POR RECEPTAÇÃO (ART. 180 DO CP), POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ART. 12 DA LEI 10.826/03) E TRÁFICO DE ENTORPECENTES E RESPECTIVA ASSOCIAÇÃO (ARTS. 33 E 35 DA LEI 11.343/06). PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDO. OBSTÁCULO DIRETAMENTE CONSTITUCIONAL: INCISO XLIII DO ART. 5º (INAFIANÇABILIDADADE DO DELITO DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES). JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ORDEM DENEGADA.

1. Se o crime é inafiançável e preso o acusado em flagrante delito, o instituto da liberdade provisória não tem como operar. O inciso II do art. 2º da Lei 8.072/90, quando impedia a “fiança e a liberdade provisória”, de certa forma incidia em redundância, dado que, sob o prisma constitucional (inciso XLIII do art. 5º da CF/88), tal ressalva era desnecessária. Redundância que foi reparada pelo art. 1º da Lei 11.464/07, ao retirar o excesso verbal e manter, tão-somente, a vedação do instituto da fiança.

2. Manutenção da jurisprudência desta Primeira Turma, no sentido de que “a proibição da liberdade provisória, nessa hipótese, deriva logicamente do preceito constitucional que impõe a inafiançabilidade das referidas infrações penais: [...] seria ilógico que, vedada pelo art. 5º, XLIII, da Constituição, a liberdade provisória mediante fiança nos crimes hediondos, fosse ela admissível nos casos legais de liberdade provisória sem fiança” (HC 83.468, da relatoria do ministro Sepúlveda Pertence).

3. Correto esse entendimento jurisprudencial, na medida em que o título prisional em que o flagrante consiste opera por si mesmo; isto é, independentemente da presença dos requisitos do art. 312 do CPP. Há uma presunção constitucional de periculosidade da conduta protagonizada pelo agente que é flagrado praticando crime hediondo ou equiparado. A Constituição parte de um juízo apriorístico (objetivo) de periculosidade de todo aquele que é surpreendido na prática de delito hediondo, o que já não comporta nenhuma discussão. Todavia, é certo, tal presunção opera tão-somente até a prolação de eventual sentença penal condenatória. Novo título jurídico, esse, que há de ostentar fundamentação específica quanto à necessidade, ou não, de manutenção da custódia processual, conforme estabelecido no parágrafo único do art. 387 do CPP. Decisão, agora sim, a ser proferida com base nas coordenadas do art. 312 do CPP: seja para o acautelamento do meio social (garantia da ordem pública), seja para a garantia da aplicação da lei penal. Isso porque o julgador teve a chance de conhecer melhor o acusado, vendo-o, ouvindo-o; enfim, pôde aferir não só a real periculosidade do agente, como também a respectiva culpabilidade, elemento que foi necessário para fazer eclodir o próprio decreto condenatório.

4. Isso não obstante, esse entendimento jurisprudencial comporta abrandamento quando de logo avulta a irregularidade do próprio flagrante (inciso LXV do art. 5º da CF/88), ou diante de uma injustificada demora da respectiva custódia, nos termos da Súmula 697 do STF (“A proibição de liberdade provisória nos processos por crimes hediondos não veda o relaxamento da prisão processual por excesso de prazo”). O que não é o caso dos autos.

5. Ordem denegada.

(STF. HC 103399 / SP. Rel. Min. AYRES BRITTO. Primeira Turma. J. 22/06/2010. DJe-154 20-08-2010 EMENT VOL-02411-04 PP-00813)

Muito embora, fosse a Primeira Turma do STF desfavorável a concessão da liberdade provisória em crimes de tráfico de entorpecentes, o posicionamento divergente da Segunda Turma provocou a manifestação do Pleno, em 10/05/2012, no HC 104.339/SP, que acabou por declarar, incidenter tantum, a inconstitucionalidade da expressão “e liberdade provisória” do caput do art. 44 da lei 11.343/06.

Este o teor divulgado no Informativo 665 do STF:

Tráfico de drogas e liberdade provisória

O Plenário, por maioria, deferiu parcialmente habeas corpus — afetado pela 2ª Turma — impetrado em favor de condenado pela prática do crime descrito no art. 33, caput, c/c o art. 40, III, ambos da Lei 11.343/2006, e determinou que sejam apreciados os requisitos previstos no art. 312 do CPP para que, se for o caso, seja mantida a segregação cautelar do paciente. Incidentalmente, também por votação majoritária, declarou a inconstitucionalidade da expressão “e liberdade provisória”, constante do art. 44, caput, da Lei 11.343/2006 (“Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos”). A defesa sustentava, além da inconstitucionalidade da vedação abstrata da concessão de liberdade provisória, o excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal no juízo de origem. Discorreu-se que ambas as Turmas do STF teriam consolidado, inicialmente, entendimento no sentido de que não seria cabível

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liberdade provisória aos crimes de tráfico de entorpecentes, em face da expressa previsão legal. Entretanto, ressaltou-se que a 2ª Turma viria afastando a incidência da proibição em abstrato. Reconheceu-se a inafiançabilidade destes crimes, derivada da Constituição (art. 5º, XLIII). Asseverou-se, porém, que essa vedação conflitaria com outros princípios também revestidos de dignidade constitucional, como a presunção de inocência e o devido processo legal. Demonstrou-se que esse empecilho apriorístico de concessão de liberdade provisória seria incompatível com estes postulados. Ocorre que a disposição do art. 44 da Lei 11.343/2006 retiraria do juiz competente a oportunidade de, no caso concreto, analisar os pressupostos de necessidade da custódia cautelar, a incorrer em antecipação de pena. Frisou-se que a inafiançabilidade do delito de tráfico de entorpecentes, estabelecida constitucionalmente, não significaria óbice à liberdade provisória, considerado o conflito do inciso XLIII com o LXVI (“ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”), ambos do art. 5º da CF. Concluiu-se que a segregação cautelar — mesmo no tráfico ilícito de entorpecentes — deveria ser analisada assim como ocorreria nas demais constrições cautelares, relativas a outros delitos dispostos no ordenamento. Impenderia, portanto, a apreciação dos motivos da decisão que denegara a liberdade provisória ao paciente do presente writ, no intuito de se verificar a presença dos requisitos do art. 312 do CPP. Salientou-se que a idoneidade de decreto de prisão processual exigiria a especificação, de modo fundamentado, dos elementos autorizadores da medida (CF, art. 93, IX). Verificou-se que, na espécie, o juízo de origem, ao indeferir o pedido de liberdade provisória formulado pela defesa, não indicara elementos concretos e individualizados, aptos a justificar a necessidade da constrição do paciente, mas somente aludira à indiscriminada vedação legal. Entretanto, no que concerne ao alegado excesso de prazo na formação da culpa, reputou-se que a tese estaria prejudicada, pois prolatada sentença condenatória confirmada em sede de apelação, na qual se determinara a continuidade da medida acauteladora, para a garantia da ordem pública.

O Min. Dias Toffoli acresceu que a inafiançabilidade não constituiria causa impeditiva da liberdade provisória. Afirmou que a fiança, conforme estabelecido no art. 322 do CPP, em certas hipóteses, poderia ser fixada pela autoridade policial, em razão de requisitos objetivos fixados em lei. Quanto à liberdade provisória, caberia ao magistrado aferir sua pertinência, sob o ângulo da subjetividade do agente, nos termos do art. 310 do CPP e do art. 5º, LXVI, da CF. Sublinhou que a vedação constante do art. 5º, XLIII, da CF diria respeito apenas à fiança, e não à liberdade provisória. O Min. Ricardo Lewandowski lembrou que, no julgamento da ADI 3112/DF (DJe de 26.10.2007), a Corte assinalara a vedação constitucional da prisão ex lege, bem assim que os princípios da presunção de inocência e da obrigatoriedade de fundamentação de ordem prisional por parte da autoridade competente mereceriam ponderação maior se comparados à regra da inafiançabilidade. O Min. Ayres Britto, Presidente, consignou que, em direito penal, deveria ser observada a personalização. Evidenciou a existência de regime constitucional da prisão (art. 5º, LXII, LXV e LXVI) e registrou que a privação da liberdade seria excepcional.

Vencidos os Ministros Luiz Fux, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio, que entendiam constitucional, em sua integralidade, o disposto no art. 44 da Lei 11.343/2006. O Min. Luiz Fux denegava a ordem. Explicitava que a Constituição, ao declarar inafiançável o tráfico, não dera margem de conformação para o legislador. O Min. Joaquim Barbosa, a seu turno, concedia o writ por entender deficiente a motivação da mantença da prisão processual. Por sua vez, o Min. Marco Aurélio também concedia a ordem, mas por verificar excesso de prazo na formação da culpa, visto que o paciente estaria preso desde agosto de 2009. Alfim, o Plenário, por maioria, autorizou os Ministros a decidirem, monocraticamente, os habeas corpus quando o único fundamento da impetração for o art. 44 da Lei 11.343/2006. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio. (HC 104339/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.5.2012. (HC-104339)

É certo que a decisão do STF é compatível com a reforma das prisões implementada pela Lei 12.403/11.

Portanto, “se ligue” nos seguintes detalhes:

Se for perguntado sobre o cabimento de liberdade provisória em crimes hediondos ou equiparados, a resposta é SIM. Embora inafiançáveis (o que significa NÃO admitir liberdade provisória MEDIANTE FIANÇA), não existe no ordenamento processual penal brasileiro prisão obrigatória, e se ausentes os pressupostos da prisão preventiva cabível liberdade provisória independentemente de fiança.

Assim, surgindo a discussão na peça prático profissional, como advogado, você deve sustentar que, embora a conduta seja inafiançável, estando ausentes os pressupostos da prisão preventiva, deverá ser concedida ao preso em flagrante por crime hediondo ou equiparado liberdade provisória por ausência dos pressupostos da preventiva (art. 282, § 6o, c/c art. 321, ambos do CPP, c/c art 5o, inc. LXVI, da CRFB/88), com a aplicação de uma das medidas cautelares não prisionais do art. 319 do CPP, se for o caso.

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Além deste detalhe, deve-se observar, fora qualquer discussão acerca da liberdade provisória, que é indiscutível a possibilidade do relaxamento da prisão processual no caso de excesso de prazo, conforme a Súmula 697 do STF:

SÚMULA Nº 697 DO STF - A proibição de liberdade provisória nos processos por crime hediondos não veda o relaxamento da prisão processual por excesso de prazo.

Da mesma forma, cabível o relaxamento ou o habeas corpus em outras hipóteses de ilegalidade da prisão. Veja, por exemplo, estas decisões do próprio STF (1a. e 2a. Turmas), já posteriores à vigência da “reforma das prisões” pela Lei 12.403/2011:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL, PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. REGULARIDADE. LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. MANUTENÇÃO DA PRISÃO. ORDEM DENEGADA. 1. A superveniência de sentença condenatória não prejudica a pretensão do paciente de ver concedida a liberdade provisória para desconstituir a prisão em flagrante por tráfico de entorpecente, pois a solução dessa controvérsia tem influência direta na discussão quanto à possibilidade de apelar em liberdade. Precedente. 2. A homologação do auto de prisão em flagrante não reclama fundamentação exaustiva, pois, em princípio, deve ser exigido do Magistrado apenas o exame da regularidade formal do ato, salvo se houver provocação dos envolvidos ou se for constatada situação extrema que justifique um pronunciamento motivado. 3. A gravidade concreta do crime, o modus operandi da ação delituosa e a periculosidade do agente respaldam a prisão preventiva para a garantia da ordem pública. Precedentes. 4. É possível a prisão decorrente de sentença condenatória, desde que a privação da liberdade do sentenciado contemple os requisitos de cautelaridade e a situação dos autos evidencie a real necessidade de sua adoção. Precedentes. 5. Ordem denegada.

(STF. HC 108794, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 04/10/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-208 DIVULG 27-10-2011 PUBLIC 28-10-2011)

Habeas Corpus. 2. Alegada falta de fundamentação da decisão que indeferiu o pedido de liberdade provisória ao paciente. Ocorrência. 3. Superação da restrição sumular 691. 4. Ordem concedida.

(STF. HC 109892, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 25/10/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-217 DIVULG 14-11-2011 PUBLIC 16-11-2011)

Ementa: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE. PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDO PELO JUÍZO PROCESSANTE. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. GRAVIDADE EM ABSTRATO DO DELITO. REITERADA JURISPRUDÊNCIA DESTE STF. DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS. ORDEM CONCEDIDA. 1. Em tema de prisão cautelar, a garantia da fundamentação importa o dever da real ou efetiva demonstração de que a segregação atende a pelo menos um dos requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal. Sem o que se dá a inversão da lógica elementar da Constituição, segundo a qual a presunção de não culpabilidade é de prevalecer até o momento do trânsito em julgado de sentença penal condenatória. 2. O Supremo Tribunal Federal entende que a alusão à gravidade do delito ou o uso de expressões de mero apelo retórico não validam a ordem de prisão cautelar. O juízo de que a liberdade de determinada pessoa se revela como sério risco à coletividade só é de ser feito com base no quadro fático da causa e, nele, fundamentado o respectivo decreto prisional. Necessidade de demonstração do vínculo operacional entre a necessidade da segregação processual do acusado e o efetivo acautelamento do meio social. 3. O fato em si da inafiançabilidade dos crimes hediondos e dos que lhes sejam equiparados não tem a antecipada força de impedir a concessão judicial da liberdade provisória, submetido que está o juiz à imprescindibilidade do princípio tácito ou implícito da individualização da prisão (não somente da pena). A prisão em flagrante não pré-exclui o benefício da liberdade provisória, mas, tão-só, a fiança como ferramenta da sua obtenção (dela, liberdade provisória). 4. Ordem concedida para assegurar à paciente o direito de responder a ação penal em liberdade. Ressalvada a expedição de nova ordem de prisão, embasada em novos e válidos fundamentos.

(STF. HC 106963, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, julgado em 27/09/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-195 DIVULG 10-10-2011 PUBLIC 11-10-2011)

EMENTA Habeas Corpus. Processual Penal. Prática de ilícitos penais por organização criminosa denominada Primeiro Comando da Capital (PCC), na região do ABC paulista. Paciente incumbida de receber e transmitir ordens, recados e informações de interesse da quadrilha, bem como auxiliar na arrecadação de valores. Sentença penal condenatória

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que vedou a possibilidade de recurso em liberdade. Pretendido acautelamento do meio social. Não ocorrência. Ausência dos requisitos justificadoras da prisão preventiva (art. 312 do CPP). Última ratio das medidas cautelares (§ 6º do art. 282 do CPP - incluído pela Lei nº 12.403/11). Medidas cautelares diversas: I - Comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II - Proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; e III - Proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante. (art. 319 do CPP – com a alteração da Lei nº 12.403/11). Aplicabilidade à espécie, tendo em vista o critério da legalidade e proporcionalidade. Paciente que, ao contrário dos outros corréus, não foi presa em flagrante, não possui antecedentes criminais e estava em liberdade provisória quando da sentença condenatória. Substituição da prisão pelas medidas cautelares diversas (Incisos I a III do art. 319 do CPP). Ordem parcialmente concedida. 1. O art. 319 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 12.403/2011, inseriu uma série de medidas cautelares diversas da prisão, detre elas: I - Comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II - Proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; e III - Proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante. 2. Considerando que a prisão é a última ratio das medidas cautelares (§ 6º do art. 282 do CPP - incluído pela Lei nº 12.403/11), deve o juízo competente observar aplicabilidade, ao caso concreto, das medidas cautelares diversas elencadas no art. 319 do CPP, com a alteração da Lei nº 12.403/11. 3. No caso, os argumentos do Juízo de origem para vedar à paciente a possibilidade de recorrer em liberdade não demonstram que a sua liberdade poderia causar perturbações de monta, que a sociedade venha a se sentir desprovida de garantia para a sua tranquilidade, fato que, a meu ver, retoma o verdadeiro sentido de se garantir a ordem pública - acautelamento do meio social -, muito embora, não desconheça a posição doutrinária de que não há definição precisa em nosso ordenamento jurídico para esse conceito. Tal expressão é uma cláusula aberta, alvo de interpretação jurisprudencial e doutrinária, cabendo ao magistrado a tarefa hermenêutica de explicitar o conceito de ordem pública e sua amplitude. 4. Na espécie, o objetivo que se quer levar a efeito - evitar que a paciente funcione como verdadeiro pombo-correio da organização criminosa, como o quer aquele Juízo de piso -, pode ser alcançado com aquelas medidas cautelares previstas nos incisos I a III do art. 319 do CPP em sua nova redação. 5. Se levado em conta o critério da legalidade e da proporcionalidade e o fato de a paciente, ao contrário dos outros corréus, não ter sido presa em flagrante, não possuir antecedentes criminais e estar em liberdade provisória quando da sentença condenatória, aplicar as medidas cautelares diversas da prisão seria a providência mais coerente para o caso. 6. Ordem parcialmente concedida para que o Juiz de origem substitua a segregação cautelar da paciente por aquelas medidas cautelares previstas nos incisos I a III do art. 319 do Código de Processo Penal.

(STF. HC 106446, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 20/09/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-215 DIVULG 10-11-2011 PUBLIC 11-11-2011)

4.6. ESTRUTURA DA LIBERDADE PROVISÓRIA

Endereçamento:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ VARA CRIMINAL DA COMARCA DE _______________________ (Regra Geral)

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ____ VARA CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE _______________________ (Crimes da Competência da Justiça Federal)

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE _______________________ (Crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados)

Não precisa saltar 10 linhas efetivamente. Identificação do preso.

(Fazer parágrafo – regra dos dois dedos) Nome, nacionalidade, estado civil, profissão, portador da Cédula de Identidade número _______________, expedida pela ________________inscrito no Cadastro de Pessoa Física do Ministério da Fazenda sob o número ____________________, residência e domicílio, por seu advogado abaixo assinado, conforme procuração anexa a este instrumento, vem muito respeitosamente à presença de Vossa Excelência, requerer a sua

LIBERDADE PROVISÓRIA

sem arbitramento de fiança (ou com arbitramento de fiança) com fundamento no artigo 5º, LXVI, da Constituição Federal, e arts. 310, III, e 321, ambos do Código de Processo Penal pelos motivos de fato e direito a seguir expostos:

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DICA: Ao ser apresentado o caso concreto, deve-se observar os artigos 323 e 324 do CPP para identificar se o

crime é ou não afiançável.

Art. 323. Não será concedida fiança:

I - nos crimes de racismo;

II - nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos;

III - nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;

IV - (Revogado)

V - (Revogado)

Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança:

I - aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código;

II - em caso de prisão civil ou militar;

III - (Revogado)

IV - quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312).

CONTINUANDO O MODELO…

1. Exposição dos fatos;

Deve-se fazer uma breve exposição dos fatos indicando os principais pontos do caso apresentado que servirão de base para demonstrar a desnecessidade da manutenção da prisão preventiva.

Neste ponto NÃO precisa discorrer sobre o direito a concessão de liberdade provisória com ou sem fiança, tendo em vista que tal ponto será abordado no tópico seguinte.

2. Da desnecessidade da manutenção da custódia cautelar

Indicar que o auto de prisão em flagrante respeitou os pressupostos de legalidade material e formal, estando o indiciado recolhido __________________________ (indicar estabelecimento onde o cliente está preso);

Indicar claramente que para a manutenção do flagrante seria necessário estarem presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva ou demonstrar que existe uma causa de exclusão de ilicitude que inviabiliza a manutenção da prisão em flagrante ou demonstrar que o caso é de liberdade provisória com fiança.

Evite entrar no mérito da questão, mas demonstre claramente a impropriedade da manutenção da prisão.

PEDIDO – NO CASO DE NÃO EXISTIR FIANÇA.

(Fazer parágrafo – regra dos dois dedos) Ante o exposto, postula-se a Vossa Excelência, nos termos do art 5o, inc. LXVI, da Constituição Federal, e do art. 321, do Código de Processo Penal, a concessão da liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, quando intimado.

(Fazer parágrafo – regra dos dois dedos) Termos em que, ouvido o ilustre representante do Ministério Público e expedindo-se o alvará de soltura, pede deferimento.

Comarca, Data

Advogado

PEDIDO – NO CASO DE EXISTIR FIANÇA

(Fazer parágrafo – regra dos dois dedos) Ante o exposto, postula-se a Vossa Excelência, nos termos do art. 325, do Código de Processo Penal, o arbitramento de fiança, colocando-se o indiciado em liberdade, que, antecipadamente compromete-se a comparecer a todos os atos do processo, quando intimado.

(Fazer parágrafo – regra dos dois dedos) Termos em que, expedindo-se o alvará de soltura, pede deferimento.

DICA: Neste caso não se deve pedir a ouvida do MP, pois nos termos do art. 333 do CPP a fiança não necessita

de audiência deste. Neste sentido, vale transcrever o referido artigo:

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Art. 333. Depois de prestada a fiança, que será concedida independentemente de audiência do Ministério Público, este terá vista do processo a fim de requerer o que julgar conveniente.

Comarca, Data

Advogado

4.7. CASOS PRÁTICOS

Caso Prático resolvido.

José Antônio, brasileiro, solteiro, residente e domiciliado na Rua da Laranjeiras, em Olinda-PE, foi preso em flagrante delito pela prática de roubo, em 21/06/2010, tendo em vista que por volta das 22.00h subtraiu uma bolsa da Senhora Maria de Lourdes, brasileira, casada, residente e domiciliada na Rua das Crioulas, em Paulista-PE, quando esta estava em uma das paradas de ônibus da cidade de Olinda, utilizando-se de violência.

A prisão em flagrante foi efetuada em virtude de denuncia anônima de moradores locais que ouviram os disparos de arma de fogo e foram de imediato a um posto policial, os policiais de plantão iniciaram perseguição e conseguiram capturar José Antônio.

O acusado em seu depoimento policial afirmou que nunca foi processado por nenhum crime, tinha residência fixa e emprego e realizou o roubo porque estava precisando pagar umas dívidas.

Após a lavratura do auto de prisão em flagrante pela autoridade policial, o inquérito foi remetido para o juiz competente que se encontra com os autos de inquérito conclusos para decisão.

Considerando a situação hipotética acima, na qualidade de advogado contratado por José Antônio, redija a peça cabível, excetuando-se a utilização do Habeas Corpus.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA __VARA CRIMINAL DA COMARCA DE OLINDA– PE

José Antônio, brasileiro, solteiro, (profissão), titular de carteira de identidade Registro Geral n. ____, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o n.o ____, residente e domiciliado na Rua da Laranjeiras, em Olinda-PE, por intermédio de seu advogado(a), com procuração em anexo, vem, perante Vossa Excelência, ,requerer sua

LIBERDADE PROVISÓRIA

sem arbitramento de fiança, com fundamento no artigo 5º, LXVI, da Constituição Federal, e arts. 310, III, e 321, ambos do Código de Processo Penal pelos motivos de fato e direito a seguir expostos:

1. Exposição dos fatos

O requerente foi preso em flagrante no dia 21/06/2010, sob a acusação de ter cometido o crime de roubo contra a vítima Maria de Lourdes, quando esta estava em uma das paradas de ônibus da cidade de Olinda, estando supostamente incurso no artigo 157, caput, do Código Penal.

Consta do inquérito policial que a prisão em flagrante foi efetuada em virtude de denúncia anônima de moradores locais, que ouviram os disparos de arma de fogo e foram de imediato a um posto policial. Consta do auto de prisão em flagrante que os policiais de plantão teriam iniciado perseguição, da qual resultou a captura de José Antônio, que se encontra preso em flagrante até o presente momento.

2. Da desnecessidade da manutenção da custódia cautelar.

Inicialmente cumpre esclarecer que o auto de prisão em flagrante respeitou os pressupostos de legalidade material e formal, estando o indiciado atualmente recolhido ________________.

Entretanto, a manutenção da prisão em flagrante do acusado é completamente desnecessária, tendo em vista que não estão presentes, no caso concreto, os requisitos autorizativos da prisão preventiva, enquadrando-se a hipótese nos moldes do art. 321 do Código de Processo Penal.

No caso em concreto, patente a ausência de qualquer dos pressupostos da prisão preventiva, pois não existem indícios suficientes de autoria, tendo em vista que o acusado foi denunciado anonimamente, não havendo certeza de que ele foi o autor da suposta infração.

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Além disso, não se encontram presentes os fundamentos da prisão preventiva, pois o requerente, conforme se depreende de seu depoimento perante a autoridade policial, possui bons antecedentes, identidade certa, residência fixa e trabalho, da mesma forma que não demonstra qualquer conduta que pudesse justificar sua custódia cautelar pelos requisitos indicados no art. 312 do CPP, razão pela qual pode responder ao presente processo em liberdade.

Além disso, é certo que a prisão se caracteriza como critério de absoluta exceção, devendo-se observar o disposto n o art. 282, § 6 o., do CPP:

Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:

§ 6o A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).

Assim sendo, inexiste qualquer perigo a ordem pública e econômica, pois não existe receio de que o requerente, se solto, volte a delinquir, não oferecendo periculosidade social.

Além disso, não há fundamento para a decretação da preventiva por conveniência da instrução criminal, pois inexistem indícios de que o acusado, se solto, venha a impedir a busca da verdade real e obstar a instrução processual.

Por fim, não há fundamento para a decretação da preventiva para assegurar a aplicação da lei penal, pois inexiste receio de que o requerente, se solto, venha a evadir-se do distrito da culpa.

Vale ressaltar, inclusive, que a gravidade em abstrato do crime de roubo não é fundamento para a decretação de uma futura prisão preventiva, pois não há a sua previsão no Art. 312 ou 313 do Código de Processo Penal, conforme entendimento dos tribunais superiores, estando o magistrado equivocado também neste ponto.

Ressalte-se ainda que a conduta imputada ao requerente não se encontra dentre os crimes indicados no art. 323 do CPP, sendo, portanto, afiançável.

3. Do Pedido

Ante o exposto, postula-se a Vossa Excelência, nos termos dos arts. 310, inciso III, c/c 321, ambos do Código de Processo Penal a concessão da liberdade provisória, independentemente de fiança, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, quando intimado.

Contudo, face o critério da eventualidade, e diante da afiançabilidade da conduta imputada, requer seja concedida liberdade provisória mediante fiança ou aplicada uma das medidas cautelares indicadas no art. 319 do CPP, conforme entenda conveniente.

Termos em que, ouvido o ilustre representante do Ministério Público e expedindo-se o alvará de soltura.

Nestes termos,

Pede deferimento.

Olinda, data.

Advogado, OAB

Caso Prático proposto.

César foi preso em flagrante no dia 21 de abril do ano de 2012, sob a alegação de ter sido surpreendido desferindo golpes de faca em Beltrano de Tal, por volta das 22:00 horas, no interior de um bar situado na Rua Y, n. 40, bairro Z, da cidade de Salvador-BA.

A vítima não resistiu aos ferimentos e faleceu, motivo pelo qual, quando foi detido, a autuação do delegado de polícia se fez com base em homicídio simples.

Após a lavratura do auto de prisão em flagrante pela autoridade policial, o inquérito foi remetido para o juiz da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Salvador, que manteve o flagrante, mesmo sendo o réu primário, com bons antecedentes e residência fixa.

Considerando a situação hipotética acima, na qualidade de advogado contratado por José Antônio, redija a peça cabível, excetuando-se a utilização do Habeas Corpus.

Endereçamento – Vara do Tribunal do Júri da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Salvador - Bahia.

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Tese – desnecessidade da manutenção da prisão em flagrante em virtude da ausência de fundamentos autorizativos da prisão preventiva, pois o réu é primário, com bons antecedentes e tem residência fixa, encontrando-se ausentes os pressupostos indicados no art. 312 do CPP. Além disso, a conduta imputada ao requerente (homicídio simples) não se insere dentre aquelas indicadas no art. 323 do CPP, sendo cabível a liberdade provisória mediante fiança.

Pedido – liberdade provisória sem o arbitramento de fiança e expedição do alvará de soltura.

Pedido subsidiário – liberdade provisória com o arbitramento de fiança e expedição do alvará de soltura.

5. REVOGAÇÃO DA PREVENTIVA

5.1. Cabimento

De acordo com o art. 316 do CPP, o juiz poderá revogar a prisão preventiva quando há falta de motivo para que a mesma subsista, portanto, a decisão que decreta ou denega a prisão preventiva é lastreada na cláusula rebus sic stantibus, ou seja, dura enquanto durar o estado das coisas.

Assim, mantida a situação fática e jurídica que ensejou a decretação da prisão preventiva, a mesma deverá ser mantida. Em contrário senso, se não houver mais os motivos que ensejaram a decretação da medida cautelar, o juiz, de forma fundamentada, irá revogar a prisão preventiva, o que poderá ser feito de ofício ou a requerimento.

Veja também, neste sentido, a nova redação do art. 282 do CPP:

Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:

§ 5o O juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.

Consequentemente, se uma prisão preventiva foi legalmente decretada, porém seus motivos desapareceram, deverá a mesma ser revogada pelo juiz, sendo possível ao preso, através do seu advogado, postular a REVOGAÇÃO DA PREVENTIVA.

Para tanto, deverá sustentar o desaparecimento dos motivos que justificavam a prisão, pleiteando, ao final, sua revogação, com a expedição do competente alvará de soltura.

Após a reforma implementada pela Lei 12.403/2011, o juiz poderá, ao revogar a prisão preventiva, aplicar uma das medidas cautelares não prisionais previstas no art. 319 do CPP.

5.2. A revogação da prisão temporária

Da mesma forma que na preventiva, quando decretada uma prisão temporária (Lei 7.960/89) legal, é possível que, antes do fim do prazo estabelecido em lei, os motivos que antes a justificavam venham a desaparecer.

Neste caso, perfeitamente cabível sua revogação, de ofício ou a requerimento.

Contudo, já que nos encontramos em fase de inquérito (a prisão temporária não pode ocorrer durante o processo, somente em fase pré-processual) e a ação penal ainda não foi intentada, não há que se falar na aplicação das medidas do art. 319 do CPP.

Assim, o advogado deverá sustentar o desaparecimento dos motivos que justificavam a prisão temporária, pleiteando, ao final, sua revogação, com a expedição do competente alvará de soltura.

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A estrutura da revogação da temporária é semelhante a da revogação da preventiva.

ATENÇÃO! REVOGAÇÃO DA PRISÃO DEPENDE DE UMA PRISÃO PREVENTIVA OU UMA PRISÃO TEMPORÁRIA LEGALMENTE DECRETADA!

Se a prisão for ilegal, a hipótese será de habeas corpus!

5.3. ESTRUTURA DA REVOGAÇÃO DA PREVENTIVA

Endereçamento:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ VARA CRIMINAL DA COMARCA DE _______________________ (Regra Geral)

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ____ VARA CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE _______________________ (Crimes da Competência da Justiça Federal)

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE _______________________ (Crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados)

Não precisa saltar 10 linhas efetivamente. Processo número:

(Fazer parágrafo – regra dos dois dedos) Nome, já qualificado nos autos do processo às folhas ( ) _____________, por seu advogado e bastante procurador que a esta subscreve, conforme procuração em anexo, vem, muito respeitosamente a presença de Vossa Excelência, apresentar com fundamento nos artigos 282, § 5º, e 316, ambos do Código de Processo Penal

REVOGAÇÃO DA PREVENTIVA

pelos motivos de fato e direito a seguir expostos:

DICA: Ao ser apresentado o caso concreto, deve-se demonstrar o desaparecimento dos motivos indicados no

art. 312 do CPP.

CONTINUANDO O MODELO…

1. Exposição dos fatos;

Deve-se fazer uma breve exposição dos fatos indicando os principais pontos do caso apresentado que servirão de base para demonstrar a desnecessidade da manutenção da prisão preventiva.

Neste ponto NÃO precisa discorrer sobre o direito à concessão de liberdade provisória com ou sem fiança.

2. Da desnecessidade da manutenção da custódia cautelar.

A discussão aqui são os motivos da preventiva que desapareceram.

3. Do Pedido.

(Fazer parágrafo – regra dos dois dedos) Ante o exposto, postula-se a Vossa Excelência, nos termos dos arts. 282, § 5o, e 316, ambos do Código de Processo Penal, seja revogada a prisão anteriormente decretada, com a imediata expedição do competente alvará de soltura.

Nestes termos,

Pede deferimento.

Comarca, Data.

Advogado, OAB

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5.4. CASOS PRÁTICOS

Caso Prático resolvido.

No dia 5 de fevereiro, Mévio, de 25 anos, enquanto caminhava pela rua, passou por Fernando, seu desafeto. Dez minutos após Mévio ter passado por Fernando, o mesmo foi surpreendido por um carro escuro e ao perceber que seria abordado pelos seus integrantes tentou evadir-se do local. Contudo, depois de grande resistência, Fernando, ao levar um tiro na perna esquerda, acabou entrando no citado carro. Para tentar garantir o sigilo do fato, os integrantes do veículo levaram Fernando para um município próximo onde o mesmo foi cruelmente assassinado com um tiro na testa. Após aparentes 24 horas do ocorrido, a autoridade policial encontrou o corpo de Fernando amarrado a um tronco de uma árvore.

Durante o inquérito policial, apenas uma testemunha, de nome Maria, relatou que ouviu falar que Mévio era desafeto de Fernando, e que teria sido ele o mandante do crime. Após as investigações, o Ministério Público denunciou Mévio, Vicente, Augusto e Renato por homicídio qualificado.

A denúncia foi recebida e o juiz do Tribunal do Júri da Comarca X decretou a prisão de Mévio fundamentando-a na garantia da ordem pública e na conveniência da instrução criminal.

Ocorre que durante a instrução criminal, a testemunha de nome Maria, bem como as demais testemunhas arroladas, Rodolfo e Pedro, relataram que apenas ouviram dizer que Mévio era desafeto da vítima Fernando, e que o mesmo havia passado por ele minutos antes do mesmo ser capturado pelos integrantes do veículo. Afirmaram também as testemunhas que não viram Mévio dentro do carro ou no local dos fatos, e que realmente só ouviram dizer que os dois não se davam.

Na qualidade de advogado de Mévio, elabore a peça processual pertinente na busca por sua liberdade, excetuando-se o intento do Habeas Corpus.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA X

Processo número:

Mévio, qualificado às fls. ___ dos autos do processo crime que lhe move o Ministério Público, por seu advogado,

vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, na forma dos arts. 282, § 5, e 316, ambos do Código de Processo Penal, requerer a

REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA

pelos motivos de fato e direito a seguir expostos:

1. Exposição dos fatos;

O acusado teve sua custódia cautelar decretada por esse douto juízo, sob o suposto fundamento de ter ordenado aos seus capangas, Vicente, Augusto e Renato, a execução de seu desafeto Fernando no dia 5 de fevereiro. Os fatos narrados na denúncia relatam que, após a vítima ser surpreendida por um carro escuro, foi a mesma levada para um município próximo, para garantir o sigilo do fato, onde houve a execução com um tiro na testa e logos após, o corpo da mesma foi amarrado a um tronco de uma árvore.

Por tais motivos foi o requerente denunciado e preso preventivamente por esse Juízo, sendo certo que sua prisão fora decretada por garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal.

Ocorre que, realizada a instrução criminal, foram ouvidas as testemunhas Maria, Rodolfo e Pedro, que relataram que apenas ouviram dizer que Mévio era desafeto da vítima Fernando, e que o mesmo havia passado por ele minutos antes do mesmo ser capturado pelos integrantes do veículo. Afirmaram também as testemunhas que não viram Mévio dentro do carro ou no local dos fatos, e que realmente só ouviram dizer que os dois não se davam.

2. Do desaparecimento dos motivos autorizadores da custódia cautelar.

A prisão preventiva é medida de extrema exceção, somente cabível quando evidentes os pressupostos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal.

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O réu, ora requerente, teve sua prisão decretada por garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal. Ocorre que todas as testemunhas já foram ouvidas por esse douto juízo sendo certo que as mesma foram contundentes em afirmar que não presenciaram qualquer envolvimento do ora requerente com os fatos, e que somente ouviram dizer que o mesmo não se dava com a vítima.

Desta forma, evidencia-se a absoluta ausência de fundamentos para a manutenção de sua custódia cautelar, uma vez que inexistente a garantia da ordem pública ou ainda a conveniência da instrução criminal. Ressalte-se, inclusive, que a prova testemunhal já foi colhida.

Desta feita, tendo desaparecido todo e qualquer motivo que autorizasse a prisão preventiva, deve a mesma ser revogada, conforme arts. 282, § 5, e 316, ambos do Código de Processo Penal.

3. Do Pedido.

Ante o exposto, postula-se a Vossa Excelência, nos termos dos arts. 282, § 5, e 316, ambos do Código de Processo Penal a revogação da prisão preventiva do ora requerente, com a consequente expedição do alvará de soltura.

Termos em que,

Pede deferimento.

X, data.

Advogado, OAB

Caso Prático proposto.

Tício e Caio eram amigos, entretanto numa discussão calorosa entre os dois, Caio desfere um chute no joelho de Tício, causando-lhe uma lesão que demandou tratamento cirúrgico e repouso por 90 dias. Com base no boletim médico hospitalar, o Ministério Público ofereceu denuncia contra Caio, e o Juiz em atendimento aos requerimentos formulados pela acusação, determina que Tício compareça à perícia para fins de exame complementar, de forma a viabilizar a apuração da gravidade das lesões sofridas.

Ocorre que Tício procura o juízo informando que Caio o estava o ameaçando de forma a evitar que o mesmo comparecesse na data designada pela perícia do IML. Em face das declarações prestadas por Tício, o juiz decretou a prisão preventiva de Caio por conveniência da instrução criminal.

Uma semana após a prisão, Tício finalmente comparece à perícia. O laudo pericial complementar já se encontra nos autos.

Como advogado elabore a peça processual cabível, excetuando-se a impetração do Habeas Corpus.

Endereçamento – EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ VARA CRIMINAL DA COMARCA DE _______________________ (Regra Geral)

Tese – desaparecimento dos motivos que autorizaram a prisão preventiva, uma vez que a vítima já se submeteu ao exame pericial, cujo laudo já se encontra nos autos.

Pedido – Revogação da prisão preventiva e expedição do alvará de soltura.