02 Augusto Dos Anjos Decifrado-Monólogo de Uma Sombra 01

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  • 7/25/2019 02 Augusto Dos Anjos Decifrado-Monlogo de Uma Sombra 01

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    Boa noite, amigas e amigos

    Vamos declamar Monlogo de Uma Sombra, a primeira poesia do livrode Augusto dos Anjos.Por ser longa, vamos recit-la em duas partes, e aps, faremos adecifrao.Nesta primeira gravao do Monlogo de Uma Sombra,Augusto narra o que escutou da Sombra, seu alter ego, querepresenta o Filsofo,e a angstia e frustrao das quais ele padece, dada a incerteza emque vive, prpria

    do filosofar.

    Na segunda parte, ele fala do antagonista direto do Filsofo: o Stiro,o quegoza a vida de modo egosta e egocntrico, mas mais prazerosa quea vida do Filsofo.

    O poeta mostra-se inconformado e sofredor frente aparente injustia

    da vida, e sua alma faz um esforo para superar este sofrimento. Eleencontra uma resposta, e a Sombra, seu alter ego que a revela,o que veremos na segunda parte.

    Na terceira parte vamos ento decifrar o que a poesia oculta sobo manto da erudio. Se necessrio, estenderemos.

    Monlogo de uma Sombra

    "Sou uma Sombra! Venho de outras eras,Do cosmopolitismo das moneras...Plipo de recnditas reentrncias,Larva de caos telrico, procedoDa escurido do csmico segredo,

    Da substncia de todas as substncias!

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    A simbiose das coisas me equilibra.Em minha ignota mnada, ampla, vibraA alma dos movimentos rotatrios...E de mim que decorrem, simultneas,A sade das foras subterrneasE a morbidez dos seres ilusrios!

    Pairando acima dos mundanos tetos,No conheo o acidente da Senectus Esta universitria sanguessugaQue produz, sem dispndio algum de vrus,

    O amarelecimento do papirusE a misria anatmica da ruga!

    Na existncia social, possuo uma arma O metafisicismo de Abidarma E trago, sem bramnicas tesouras,Como um dorso de azmola passiva,A solidariedade subjetiva

    De todas as espcies sofredoras.

    Como um pouco de saliva quotidianaMostro meu nojo Natureza Humana.A podrido me serve de Evangelho...Amo o esterco, os resduos ruins dos quiosquesE o animal inferior que urra nos bosques com certeza meu irmo mais velho!

    Tal qual quem para o prprio tmulo olha,Amarguradamente se me antolha, luz do americano plenilnio,Na alma crepuscular de minha raaComo uma vocao para a DesgraaE um tropismo ancestral para o Infortnio.

    A vem sujo, a coar chagas plebias,

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    Trazendo no deserto das idiasO desespero endmico do inferno,Com a cara hirta, tatuada de fuligensEsse mineiro doido das origens,Que se chama o Filsofo Moderno!

    Quis compreender, quebrando estreis normas,A vida fenomnica das Formas,Que, iguais a fogos passageiros, luzem.E apenas encontrou na idia gasta,O horror dessa mecnica nefasta,

    A que todas as cousas se reduzem!

    E ho de ach-lo, amanh, bestas agrestes,Sobre a esteira sarcfaga das pestesA mostrar, j nos ltimos momentos,Como quem se submete a uma charqueada,Ao claro tropical da luz danada,esplio dos seus dedos peonhentos.

    Tal a finalidade dos estames!Mas ele viver, rotos os liamesDessa estranguladora lei que apertaTodos os agregados perecveis,Nas eterizaes indefinveisDa energia intra-atmica liberta!

    Ser calor, causa biqua de gozo,Raio X, magnetismo misterioso,Quimiotaxia, ondulao area,Fonte de repulses e de prazeres,Sonoridade potencial dos seres,Estrangulada dentro da matria!

    E o que ele foi: clavculas, abdmen,O corao, a boca, em sntese, o Homem,

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    Engrenagem de vsceras vulgares Os dedos carregados de peonha,Tudo coube na lgica medonhaDos apodrecimentos musculares!

    A desarrumao dos intestinosAssombra! Vede-a! Os vermes assassinosDentro daquela massa que o hmus come,Numa glutoneria hedionda, brincam,Como as cadelas que as dentuas trincamNo espasmo fisiolgico da fome.

    uma trgica festa emocionante!A bacteriologia inventarianteToma conta do corpo que apodrece...E at os membros da famlia engulham,Vendo as larvas malignas que se embrulhamNo cadver malso, fazendo um s.

    E foi ento para isto que esse doidoEstragou o vibrtil plasma todo, guisa de um faquir, pelos cenbios?!...Num suicdio graduado, consumir-se,E aps tantas viglias, reduzir-se herana miservel de micrbios!

    Estoutro agora o stiro peralta - continua na gravao seguinte.