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A força do rádio local no enfrentamento da realidade das metrópoles: uma relação entre a mídia de proximidade e o Desenvolvimento Local Maria Cláudia SANTOS Mestre em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local Centro Universitário UNABrasil Membro do Grupo de Rádio e Mídia Sonora da Intercom 1 [email protected] Resumo A comunicação deve ser sempre destacada quando são discutidas alternativas de fortalecimento das identidades locais, como base para a união dos atores sociais em torno do enfrentamento da realidade criada pela globalização. Este texto discute a importância dos veículos de comunicação locais para o Desenvolvimento Local, sob a ótica de que mídia local privada, também, pode ser motor de mobilização social e reforçadora dos laços de identidade territorial. Pesquisa realizada com uma rádio local brasileira, do Estado de Minas Gerais, mostra que os ouvintes do mundo globalizado ainda têm forte ligação com emissoras de produção local e avaliam que esse tipo de veículo pode gerar o sentimento de proxemia entre os cidadãos do Estado. Palavraschave: Desenvolvimento local, globalização, rádio, identidade territorial. Abstract Communication should always be emphasized when alternatives are discussed strengthening of local identities as a basis for the union of social actors around the face of reality created by globalization. This paper discusses the importance of local media outlets for Local Development, under the view that local private media can be an engine for social mobilization, and reinforcing the ties of territorial identity. Research conducted with a local radio Brazilian state of Minas Gerais, shows that listeners of the globalized world still have strong links with local broadcasters and production estimate that this type of vehicle can generate the feeling of proxemics between citizens of the state. Keywords: Local Development, globalization, radio, territorial identity. 1 Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Ciência da Comunicação.

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A  força  do  rádio  local  no  enfrentamento  da  realidade  das  metrópoles:  uma  relação  entre  a  mídia  de  proximidade  e  o  

Desenvolvimento  Local      

Maria  Cláudia  SANTOS  Mestre  em  Gestão  Social,  Educação  e  Desenvolvimento  Local  

Centro  Universitário  UNA-­‐Brasil  Membro  do  Grupo  de  Rádio  e  Mídia  Sonora  da  Intercom1    

[email protected]      

Resumo    A   comunicação   deve   ser   sempre   destacada   quando   são   discutidas   alternativas   de  fortalecimento  das  identidades  locais,  como  base  para  a  união  dos  atores  sociais  em  torno  do   enfrentamento   da   realidade   criada   pela   globalização.   Este   texto   discute   a   importância  dos  veículos  de  comunicação  locais  para  o  Desenvolvimento  Local,  sob  a  ótica  de  que  mídia  local   privada,   também,   pode   ser  motor   de  mobilização   social   e   reforçadora   dos   laços   de  identidade  territorial.  Pesquisa  realizada  com  uma  rádio  local  brasileira,  do  Estado  de  Minas  Gerais,  mostra  que  os  ouvintes  do  mundo  globalizado  ainda  têm  forte  ligação  com  emissoras  de  produção  local  e  avaliam  que  esse  tipo  de  veículo  pode  gerar  o  sentimento  de  proxemia  entre  os  cidadãos  do  Estado.    Palavras-­‐chave:  Desenvolvimento  local,  globalização,  rádio,  identidade  territorial.        Abstract      Communication   should   always   be   emphasized   when   alternatives   are   discussed  strengthening  of   local   identities  as  a  basis  for  the  union  of  social  actors  around  the  face  of  reality  created  by  globalization.  This  paper  discusses  the   importance  of   local  media  outlets  for  Local  Development,  under  the  view  that  local  private  media  can  be  an  engine  for  social  mobilization,  and  reinforcing  the  ties  of  territorial  identity.  Research  conducted  with  a  local  radio  Brazilian  state  of  Minas  Gerais,  shows  that   listeners  of  the  globalized  world  still  have  strong   links  with   local   broadcasters   and   production   estimate   that   this   type   of   vehicle   can  generate  the  feeling  of  proxemics  between  citizens  of  the  state.    Keywords:  Local  Development,  globalization,  radio,  territorial  identity.           1 Sociedade  Brasileira  de  Estudos  Interdisciplinares  da  Ciência  da  Comunicação.    

Introdução    

o   longo  das  últimas   três  décadas,  o   conceito  de  desenvolvimento   tem  passado  por  mudanças.   Deixou   de   ser   somente   o   resultado   do   progresso   econômico   e  material  para   ser  associado  ao  bem  estar   social,   à   sustentabilidade  ambiental  e  à  afirmação  

política   e   cultural.   Dentro   desta   perspectiva,   as   realidades   locais   têm   assumido  responsabilidades  no  desenvolvimento  do  território.  Paralelamente  ao  nascimento  de  uma  crença  na  homogeneização  da  cultura,  a  partir  da  globalização,  concebe-­‐se  a  idéia  de  que  é  na  esfera  local  que  a  cultura  ganha  sua  dimensão  simbólica  e  material,  combinando  matrizes  globais,  nacionais,  regionais  e  locais.    A  mudança  de  paradigma  do  desenvolvimento  acontece  num  período  de  transição  que  afeta  diretamente  as  formas  de  produção  e  gestão  empresarial,  assim  como  o  papel  do  Estado  na  regulação   sócioinstitucional   e   o   funcionamento   eficiente   das   organizações   públicas   e  privadas.   Nesta   fase   de   transição   tecnológica   e   reestruturação   sócio-­‐econômica   que   os  países   latino-­‐americanos   vêm   atravessando,   ganha   importância   o   papel   das   chamadas  políticas  de  Desenvolvimento  Local  (DL).      A  expressão  Desenvolvimento  Local  pressupõe  alterações  nas  maneiras  de  as  comunidades-­‐localidades  envolvidas  (e,  por  somatória,  o  próprio  país  que  as  integre)  se  relacionarem  com  os  modelos  de  desenvolvimento  capitalista  globalizante  em  curso.  O  enfoque  do  DL  integra  investimentos  em  capital  humano,  social  e  natural,  além  do  econômico  e  do  financeiro.  Essa  política   adota,   portanto,   uma  perspectiva   integral   que  deve   ser   concretizada  nos   próprios  territórios  com  a  participação  dos  atores  locais.    A  comunicação,  portanto,  não  pode  ser  colocada  de  lado  quando  se  discutem  alternativas  de  fortalecimento  das  identidades  locais,  como  base  para  a  união  dos  atores  sociais  em  torno  de   um  desenvolvimento   que  objetiva   buscar   o  melhor   enfrentamento   da   realidade   criada  pela   globalização.   O   alcance   e   a   abrangência   dos   meios   de   comunicação   na   definição   e  renovação   dos   hábitos   e   valores   da   sociedade   são   evidentes,   sendo,   portanto,  indispensáveis   nestes   esforços   atuais.   De   acordo   com   Thompson   (1998),   o   processo   de  formação   do   self   humano   é   afetado   por   um   tipo   novo   de   identidade   a   partir   do  desenvolvimento  da  mídia.  Além  disso,  há  que  se  considerar  que  a  comunicação  pode  ser  observada  como  cimento  social  (Mafessoli,  2008)  capaz  de  ligar  os  atores  sociais.      Numa  perspectiva  mais  ampla  de  observação  do  desenvolvimento,  o  território  passou  a  ser  visto  como  o   local  de  viabilização  dessas  possibilidades.  Esse  espaço  deixa  de  ser  somente  funcional  e  passa  a  ser  visto  como  agente  de  transformação  social.  Dentro  deste  contexto,  é  pertinente   a   discussão   da   relevância   das   mídias   locais   (no   caso   deste   estudo,   das   rádios  locais2  privadas  de  perfil  jornalístico)  quando  se  trata  de  reforçar  laços  de  uma  comunidade.  Borin   (1992),   quando   faz   referência   à   imprensa,   afirma   que   a   regional   está   muito   mais  próxima  dos  conhecimentos  locais  e  se  expressa  através  de  uma  linguagem  adequada  ao  seu  

2Uma  emissora  de  programação  especializada  dentro  de  uma  concepção  generalista  de  enfoque  geral   sobre  tudo  o  que   concerne  à   localidade  em  que  está   situada.  Uma   rádio  que  atende  aos   interesses,   responde  aos  gostos  e  necessidades  de  serviços  de  comunicação.  A  rádio  está  centrada  na  vida  social,  econômica,  política  e  cultural  de  sua  área  de  abrangência  e  também  em  tudo  o  que  ocorre  em  seu  exterior  e  que  tenha  repercussões  na  vida  da  comunidade  (Cebrián  Herreros.  2001,  p.146).  

A  

público.  Se  souber  se  identificar,  então,  com  o  público,  sem  repetir  formas  e  expressões  da  grande  imprensa,  estará  colaborando  para  o  desenvolvimento  do  país.        Noticiário  Local  X  Globalização      Com   a   globalização   da   mídia,   em   um   primeiro   momento,   chegou-­‐se   a   pensar   no   fim   da  comunicação  local.  Mas,  em  seguida,  foi  possível  constatar  o  contrário:  a  sua  emergência  ou  consolidação   em  diferentes   contextos   e   sob  múltiplas   formas   (Peruzzo,   2005).   A  mídia   de  proximidade,   ou   novo   localismo   como   é   chamada   agora,   passou   por   um   movimento   de  renascimento,  assim  como  em  outras  áreas,  a  partir  da  conscientização  de  que,  por  mais  que  se  argumente  a  favor  da  aldeia  global,  da  diminuição  das  distâncias,  do  espaço  de  fluxos,  do  deslocamento   de   imaginários,   o   lugar,   físico   e   próximo,   ainda   exerce   importância  significativa  para  a  maioria  das  pessoas.  “O  espaço  de  fluxos  não  permeia  toda  a  esfera  da  experiência  humana  na   sociedade  em  rede”   (Castells,  2001,  p.  447).  A  grande  maioria  das  pessoas  vive  em  lugares  e  percebe  seu  espaço  com  base  nesse  lugar.      A   cidade   ou   a   região,   ainda   constituem   pontos   de   referência   relativamente   estáveis.   As  pessoas,  para  as  mais  diferentes  necessidades,  ainda  dependem  umas  das  outras,  constroem  vínculos  e   relações,  compartilham  valores  e  emoções,  mantém  na  memória  a  sensação  de  enraizamento  num  lugar.  O  estudioso  português  Carlos  Camponez  chama  a  atenção  para  o  fato   dos   discursos   de   proximidade   em   geral   terem   sofrido   uma   inflação   como   resposta   à  uniformização.  Se  por  um  lado  temos  grandes  fusões  entre  empresas  mundiais,  por  outro,  há  um  desejo  do  encontro  com  o  próximo.   “Fala-­‐se  da  gestão   local,  de  políticas   locais,  da  ligação  do  político  aos  seus  eleitores,  de  políticas  de  proximidade,  renasce  o  interesse  pelas  identidades   e   as   culturas   particulares   e,   conseqüentemente,   pelos   fenômenos   de  comunicação  local  ”(Camponez,  2002,  pp.15  e  16).    No  mundo  marcado  pela  globalização  as  pessoas  sustentam  a  necessidade  de  saber  o  que  acontece  nas  proximidades  de  onde  elas  estão   inseridas.  É  expressivo  também  o   interesse  delas  de  verem  os  temas  das  suas  localidades  retratados  nas  notícias.  Para  Maffesoli  (2008,  p.5),  de  alguma  forma,  o  mais  interessante  parece  ser  o  “grau  zero  da  informação”,  nível  no  qual   o   receptor   se   reconhece   enquanto   indivíduo   na   notícia.   O   essencial   estaria   em  reconhecer-­‐se,  ver-­‐se,  em  fazer  parte  de  uma  comunidade  presencial  ou  virtual.  É  a  lógica  de  que   o   público   absorve,   do   conjunto   das   informações,   aquilo   que   faz   vibrar   e   estabelecer  comunidade,  “a  informação  é  qualificada  em  função  da  sua  capacidade  de  gerar  proxemia”.      Mas  o  que  pode  ser  definido  como  mídia  de  proximidade  nos  dias  atuais?    O   retorno   dos   olhares   para   a   imprensa   local/regional   acontece,   no   entanto,   em   um  momento  histórico  de   transformações  estruturais.  Vivemos  uma   renovação  nas   formas  de  organização  geográfica  da  sociedade  de  espaços  de  fluxos  e  de  lugares.  Quando  se  fala  em  mídia   de   proximidade   levanta-­‐se   atualmente   o   debate   sobre   que   proximidade   é   essa,   em  tempos   em   que   esse   conceito   pode   ser,   às   vezes,   muito   relativo.   “Apesar   das   distâncias  geométricas,  vivemos  uma  nova  sensação  de  proximidade,  assente  no  conceito  de  rede  e  de  conexão,  onde  a  noção  de  marco  geodésico  fica  profundamente  perturbada:  o  centro  está  

aqui  e  está  em  todo  o  lado”  (Camponez,  2002,  p.25).  Essa  alteração  rebate  diretamente  na  imprensa  local  que  tem  como  pedra  fundamental  a  proximidade,  geográfica  e  cultural.      Em  Portugal,  o  Decreto  de  Lei  no  106/88  define  o  Estatuto  da  Imprensa  Regional  e  Local.  A  lei  assim  define  a  imprensa  regional:      

Imprensa  regional  são  todas  as  publicações  periódicas  de   informação  geral,  conforme  a  Lei  de   Imprensa,  que  se  destinem  predominantemente  às  respectivas  comunidades  regionais  e  locais,  dediquem,  de  forma  regular,  mais  da  metade  da  sua  superfície  redactorial  a  fatos  ou  assuntos  de  ordem  cultural,  social,   religiosa,  econômica  e  política  a  elas  respeitantes  e  não  estejam   dependentes,   diretamente   ou   por   interposta   pessoa,   de   qualquer   poder   político,  inclusive  o  autárquico  (Camponez,  2002,  p.  30).    

Para   países   que   não   contam   com   leis   definidoras,   a   imprensa   local   tem   sido   conceituada  como   aquela   que   retrata   a   realidade   regional   ou   local,   trabalhando   a   informação   de  proximidade,  que  expressa  as  especificidades  de  uma  dada  localidade,  os  acontecimentos  de  uma   determinada   região   e   os   diferentes   pontos   de   vista,   a   partir   dos   cidadãos,   das  organizações  e  dos  diferentes  segmentos  sociais.  Peruzzo  (2005,  p.78)  explica  que  “a  mídia  de  proximidade  caracteriza-­‐se  por  vínculos  de  pertença,  enraizados  na  vivência  e  refletidos  num  compromisso  com  o  lugar  e  com  a  informação  de  qualidade.”  Sendo  assim,  o  meio  de  comunicação   local   tem,   teoricamente,   a   possibilidade   de   mostrar,   melhor   que   qualquer  outro,   a   vida   em   determinadas   regiões,   municípios,   cidades,   vilas,   bairros,   zonas   rurais,  comunidades,  etc.      Para  Jean-­‐Marie  Launay  apud  Camponez  (2002,  p.110),  o  conceito  de  proximidade  pode  ser  explorado  a  partir  de  diferentes  perspectivas,  mas,  quando  se  trata  de  mídia  local  e  regional,  ele   se   refere   aos   laços   originados   pela   familiaridade   e   pela   singularidade   de   uma  determinada  região,  que  possuem  muita  relação  com  a  questão  do  locus  territorial.      Já   na   proposta   de   Camponez   (2002,   pp.128   e   129),   o   conceito   de   proximidade   na  comunicação  resulta  de  uma  geometria  variável,  cujo  enfoque  está  em  uma  “geometria  da  identidade,  com  tudo  o  que  isso  implica  de  criação  e  recriação,  do  que  em  uma  identidade  geográfica  propriamente  dita.”  Como  o  autor  destaca,  “a  proximidade  não  se  mede  mais  em  metros.   [...]   Devemos   estar   preparados   para   conceber   a   produção   de   conteúdos   que,  embora  longe  de  nossas  casas,  nos  são  próximos”.  O  local  referido  é  mais  que  o  geográfico,  pode   ter   bases   culturais,   ideológicas,   idiomáticas,   de   circulação   da   informação,   de  identidades  histórias  culturais  ou  de  proximidade  de  interesses.    Caminha-­‐se   para   a   discussão   de   uma   definição   de   mídia   de   proximidade   dos   chamados  “tempos  líquidos”,  como  aquela  que,  mesmo  longe  pode  estar  perto  e  que  nem  sempre  tem  ligação  somente  com  as  raízes,  com  a  identidade  substância,  mas  também  com  a  identidade  construto   (que  pode  dissolver-­‐se   rapidamente).   Seguindo   essa   lógica,   o   “não   lugar”,   Auge  (1994),   espaço   só   de   interesses   e   não   físico,   também   pode   gerar   informações   de  proximidade.    Camponez   (2002)   deixa   claro,   no   entanto,   que   a   geografia   tem  um  papel   estruturante   na  definição   da   informação   local.   A   implantação   estrategicamente   localizada   de   um   veículo  circunscreve,  naturalmente,  o  seu  âmbito  de  ação.  Por   isso,  continuam  sendo   importantes  

as  empresas  locais  ou  com  laços  locais  fortes.  Elas  ainda  são  as  que  têm  mais  condições  de  responder   à   expectativa   de   informações   de   real   interesse   para   os   ouvintes   que   querem  saber  mais  sobre  o  seu  território  de  origem  e  outros  que  ele  tem  construído  em  espaços  que  não  são  fixos.      

Essa  proximidade  da  comunidade  de   lugar,   criada  na  partilha  de  valores  de  um  território  é  também   geradora   de   formas   comunicacionais   característica   de   que   a   imprensa   regional   e  local   é   um   exemplo.   E   isso   faz   a   diferença   entre   o   órgão   de   comunicação   “da   terra”   e   os  outros:  os  de  outras  regiões,  os  nacionais,  os  além  fronteiras  (Camponez,  2002,  p.20).    

Os   veículos   de   comunicação   local/regional,   portanto,   devem   permanecer   ligados   à  comunidade   lugar,  mas  sem  desconsiderar  a  “não   lugar”.  O   local  e  o  global  deixam  de  ser  reconhecidos   como   extremos   que   se   opõem   e   passam   a   ser   vistos   como   espaços   que  interagem,  ainda  que,  às  vezes,  de  forma  desequilibrada.  “O  local  é  o  lugar  de  compromissos  comunitários,   que   tanto  podem  direcionar-­‐se  para   as  denominadas   comunidades  de   lugar  como  para  as  lógicas  globais  mais  desterritorializadas”  (Camponez,  2002,  p.20).      Desafios  da  mídia  local      A   realidade  globalizante  aponta  os  novos   caminhos  que  devem  ser  percorridos  pela  mídia  local,   mas,   também,   ditou   inúmeros   desafios.   Os   veículos   de   comunicação   locais,   com   o  diferencial  da  proximidade  geográfica,  precisam  estar  com  uma  parte  do  olhar  voltada  para  o   locus  e   a   outra   para   o  mundo  e   suas  múltiplas   conexões,   já   que  o   novo  ouvinte,   leitor,  telespectador   demanda   isso.   Olórtegui   (1996,   p.34),   lembra   que   as   inter-­‐relações   entre  local-­‐regional-­‐global   permitem   entender   “as   formas   de   um   mercado   informativo   que  trabalha  com  um  imaginário  desterritorializado,  mas  que  precisa  está  totalmente  conectado  a  imagens  territorializadas  e  reivindicadoras  da  realidade  local”.    O  cenário  enfrentado  pelos  veículos  regionais  não  é  dos  mais  fáceis  para  o  exercício  desse  novo  papel  que  se  espera  da  mídia   local.  Os  desafios  devem  ser  superados   levando-­‐se  em  consideração   um   contexto   extremamente   adverso.   Além   de   disputar   espaço   com   a  avalanche  de   informações  de   várias  partes  do  mundo  e  produzidas   sob  vários   suportes,   o  momento   é  marcado   por   reconfigurações   da   organização   e   propriedade   das   empresas   de  comunicação.  O  processo  de  concentração,  desencadeado  pelas  fusões  e  convergências  têm  favorecido  de  maneiro  decisiva  os  grandes  grupos  de  mídia  em  detrimento  das  rádios  locais.    

 Essa   tendência   de   fusões   e   consolidação   de   grandes   redes   de   comunicação   não   pode   ser  traduzida,  no  entanto,  como  supressão  do  noticiário  local,  mas,  determina,  pelo  menos,  uma  redefinição  dele.  Os  grandes  grupos  em  rede  também  apresentam  estratégias  de  criação  de  edições   locais  ou  regionais.  Há  o   interesse  por  parte  da  mídia  em  ocupar  esse  espaço  com  vistas  a  atingir  objetivos  mercadológicos.  A  informação  local,  no  entanto,  tem  sido  produzida  e  distribuída,  muitas  vezes,  por  rádios,  denominadas  semi-­‐locais,  que  não  possuem  ligação  histórica  com  a  localidade  onde  está  situada  e  suas  especificidades.      Os  veículos  de  raízes  verdadeiramente  localizadas,  principalmente,  os  menores  sem  o  poder  das   redes,   tendem  a  desenvolver,   cada  vez  mais,   laços  políticos   fortes  e  a  comprometer  a  informação  de  qualidade.  Essa  é  apenas  uma  das  ameaças  dentre  várias  outras,  como  o  risco  

de   reprodução   pela  mídia   local   da   grande   imprensa,   ao   imitar   o   estilo   de   tratamento   da  informação  ou  dedicar  amplos  espaços  para  notícias  nacionais  e  internacionais,  às  vezes  por  exigência  de  matrizes,  como  no  caso  das  redes  de  televisão  e  de  rádio.  “Parece  que  há  no  país   um   jornalismo   quase   como   um   padrão,   passando   a   ser   reproduzido   por   jornais   das  capitais   dos   estados   e   de   cidades   do   interior.   A   imprensa   do   interior   tende   a   cobrir   os  mesmos  tipos  de  assuntos”  (Peruzzo,  2005,  p.  82).    

 Outra   tendência  é  a   falta  de  ampla  cobertura  e  de  apuração  de  acontecimentos,   tanto  no  nível   local   como  no   regional,   traço  marcante,  neste  caso,  das  emissoras  pequenas.   Isso   se  deve  às  estruturas  de  produções  reduzidas,  com  poucos  profissionais.  Nessas  condições,  o  jornalismo   local   deixa   de   explorar   seu   imenso   potencial   de   trabalhar   com   a   informação  isenta   e   atender   a   todos   os   setores   da   vida   de   uma   comunidade.   Perde,   assim,   uma  oportunidade  de  mercado,  a  de  trabalhar  com  competência  a   informação  de  proximidade,  que  é  a  razão  de  ser  da  imprensa  local.    Camponez  (2002,  p.17)  observa  que,  no  mundo   inteiro,  o  futuro  da  mídia  de  proximidade,  como  aquela  ligada  à  identidade  e  às  questões  locais,  ainda  é  muito  incerto.  Para  o  autor,  é  muito  difícil  identificar  que  lugar  a  globalização  reserva  à  imprensa  local  e  regional  e  há  que  se   saber   se   os  meios   de   comunicação   de  massa   “tenderão   a   incentivar   outras   formas   de  comunicação   alternativas,   menos   massificadas,   capazes   de   preencher   o   vazio   criado   em  tipos  de  sociabilidade  mais  centrados  na  identidade  e  na  comunidade”.      As  possibilidades  de  aproveitamento  da  mídia  de  massa  em  prol  das  políticas  de  DL    O  que  parece  estar  certo  nesse  cenário  de  imprevistos  é  que  a  demanda  pela  mídia  local  é  real,  faz  parte  do  anseio  popular.    Sendo  assim,  alguns  consensos  podem  ser  apontados  em  termos   da   importância   e   da   possibilidade   do   uso   dos   veículos   de   comunicação   locais   em  defesa  dos  esforços  para  o  Desenvolvimento  Local.    Na  perspectiva  do  DL  torna-­‐se  relevante  que   o   território   seja   visto   como   ambiente   favorável   à   inovação   e   impulsionador   da  participação  ativa  de  seus  atores  locais.  A  lógica  é  capitalizar  as  potencialidades  do  local  para  elevar  a  qualidade  de  vida   integral  da  população.  Para   isso,  é  necessária  a  articulação  dos  atores   estatais,   da   sociedade   civil   e   do   capital   em   torno   de   projetos   que   surjam   de  negociações   de   interesses,   inclusive   os   divergentes.     Dowbor   (1996)   também   destaca   a  necessidade  de  participação  e  integração  dos  atores  do  território,  já  que  as  ações  locais  de  desenvolvimento   não   podem   ocorrer   como   monopólio   do   poder   público.   Este   deve   ser  apenas  um  dos  agentes.      O  papel  da  imprensa  regional  pode  ser  primordial  nesse  sentido.  O  primeiro  alvo  da  atuação  desses   veículos   passa   pelo   campo   da   visibilidade,   importante   fator   de   reforço   para   as  mobilizações   sociais3.   Henriques   e   Mafra   (2001)   concordam   que   a   mobilização,   como  

3Quando  se  fala  da  importância  da  comunicação  para  mobilização  social  é  preciso  destacar,  no  entanto,  que  a  estabelecida  pela  grande  mídia,  por  meio  da  visibilidade,  por  exemplo,  é  apenas  uma  parte.  Para  garantir  maior  efetividade,  no  entanto,  a  comunicação  dirigida  deve  ser  adotada  cotidianamente  pelos  movimentos   sociais.  Ela   tem   por   finalidade   transmitir   ou   conduzir   informações,   estabelecendo   uma   comunicação   orientada   e  frequente  com  um  público  identificado.        

processo   amplo,   não   depende,   para   ser   bem   sucedida,   apenas   da   simples   difusão   de  informações,  mas  a  visibilidade,  a  divulgação  e  a  presença  na  mídia  são  elementos  decisivos.  Deixada   clara   a   importância   dos   veículos   de   comunicação   de   massa   para   a   mobilização  dentro  do  território,  cabe  destacar  a  necessidade  de  atenção  para  as  produções  jornalísticas  locais.      Ainda   dentro   da   discussão   do   uso   dos   veículos   de   comunicação   de  massa,   com   destaque  para   as   produções   locais,   no   processo   contribuição   para   as   políticas   de   Desenvolvimento  Local   há   que   se   estabelecer   relação   com   os   conceitos   de   capital   social.   O   termo   trata   de  elementos  chave,  como  confiança,  coesão  social,  redes,  normas  e  instituições  que  facilitam  a  ação  e  a  cooperação  na  busca  de  objetivos  comuns.  Putnam  (2006)  acredita  que  a  confiança  lubrifica  a  vida  social  e  que  sociedades  com  elevados  graus  desse  sentimento  tornam-­‐se  e  permanecem  ricas  porque  são  cívicas.  A  confiança  é,  por  sua  vez,  alcançada  quando  há  um  conhecimento  mútuo  entre  os  membros  de  uma  comunidade  e  uma  forte  tradição  de  ação  comunitária.  Sob  este  ponto  de  vista,  a  partir  do  momento  que  os  veículos  de  comunicação,  por   meio   das   suas   produções   locais,   divulgam   acontecimentos   de   proximidade,   valores,  situações   e   vivências   próximas,   eles   estão   reforçando   os   laços   territórios   criando,   ainda,  ambiente  mais  propício  para  a  confiança  entre  os  seus  atores.    Musse   (2007,   p.50)   lembra   que   a   expansão   territorial   e   a   massificação   da   cidade,   que  reduziram  as  interações  entre  os  bairros,  ocorreram  junto  com  a  reinvenção  de  laços  sociais  e   culturais  que  passam  através  do   rádio  e  da   televisão.  Atualmente,   são  estes  meios  que,  com  a  sua   lógica  vertical  e  anônima,  diagramam  os  novos  vínculos   invisíveis  da  cidade.   “A  imprensa  mobiliza  a  circulação  e  a  difusão  rápida  de  informações,  criando  uma  solidariedade  que  já  não  depende  mais  da  presença  física,  é  uma  nova  rede  de  trocas”.    

   A  experiência  de  uma  rádio  local  do  Brasil      Dentre   os   veículos   de   comunicação   local   este   trabalho   se   atém   ao   rádio.   De   acordo   com  Wedell   (1991)   apud   Vasques   (2004),   as   origens   do   termo   rádio   de   proximidade   são  francesas.  Esta  forma  de  abordar  o  rádio  comercial  local  tem  como  sua  pedra  fundamental  o  conceito  da  proximidade  entre  a   rádio  e  o   seu  ouvinte.  Para  estabelecer  o  conceito  dessa  proximidade,   é   necessário   estabelecer   duas   categorias   fundamentais:   a   geográfica   e   a  cultural.  A  presença  de  uma  dessas  categorias,  ou  de  ambas,  é  condição  fundamental  para  classificar  uma  rádio  como  sendo  de  proximidade.    Para   tentar   apontar  o  potencial   do   rádio  para  possível   impulso  nas  políticas  de  DL,   foram  pesquisados   ouvintes   da   Rádio   Itatiaia,   rede   de   rádio   do   Estado   de   Minas   Gerais,   de  propriedade   particular,   sediada   em   Belo   Horizonte.   A   emissora   tem   um   histórico   de  investimentos  em  produção  local  de  jornalismo  e  conta  com  a  maior  audiência  de  rádio  no  Estado,   quando   se   trata   de   analisar   rádios   com   perfil   jornalístico   (IBOPE,   2009).   A   Rádio  Itatiaia,  fundada  em  1952,  conta  com  programação  baseada  no  tripé:  esporte,  jornalismo,  e  prestação   de   serviços.   Formada   por   uma   rede   de   seis   emissoras   próprias   e   51   estações  filiadas,  que  captam  as  transmissões  via  satélite  e  as  retransmitem  para  sua  região,  a  Itatiaia  

atinge   cerca   de   760  municípios  mineiros,   do   total   de   8534.   A   emissora   também   pode   ser  ouvida  em  tempo  real  na  internet  pelo  endereço  www.itatiaia.com.br.      O  público  ouvinte  da  Rádio  Itatiaia  é  de  maioria  masculina  adulta.  42%  deles  têm  mais  de  50  anos.  No  caso  da  distribuição  por  sexo,  64%  são  homens  e  36  %  mulheres.  A  maior  parte  da  audiência  está  concentrada  nas  classes  C,  D  e  E,  65%.  A  maior  parte  da  audiência,  56%,  é  de  moradora  da  área  urbana  de  Belo  Horizonte.    O  índice  de  audiência  fora  de  Belo  Horizonte,  o  que   se   entende   por   cidades   da   Região   Metropolitana,   é   de   44%.   No   que   diz   respeito   à  escolaridade,  a  audiência  da  emissora  figura  da  seguinte  forma:  10%  têm  formação  superior  completa,  45%  estão  entre  o  grau  o  fundamental  completo  e  o  superior   incompleto  e  45%  estão  dentro  do  grupo  que  reúne,  na  condição  mínima,  analfabetos  e,  na  máxima,  donos  de  curso  fundamental  incompleto  (IBOPE,  2009).        Por  meio  de  uma  abordagem  quantitativa  que  usou  como  instrumento  de  coleta  de  dados  o  questionário,  esta  pesquisa  ouviu  454  ouvintes  da  emissora.  Num  segundo  momento,  foram  aplicadas   entrevistas   em   profundidade   em   sete   participantes   da   primeira   fase   do   estudo,  que  representavam  perfil  da  maioria  do  pesquisados  que  responderam  ao  questionário.            Resultados:  relação  com  o  rádio    A  pesquisa  constatou  que  a  expressiva  e  histórica  audiência  do  rádio  hertziano  ainda  é  uma  realidade   destacável   entre   os   pesquisados,   apesar   dos   tempos   modernos   e   de   todas   as  novidades   que   eles   trouxeram,   sobretudo   no   campo  da   comunicação.  Os   dados   apurados  apontam   a   existência   de   forte   relação   do   pesquisado   com   o   veículo.   Mais   de   60%   dos  respondentes  têm  o  rádio  como  fonte  principal  de   informação.  Cerca  de  90%  ouvem  rádio  todos  os  dias  por,  pelo  menos,  uma  hora.  Algumas  das  principais  características  do  veículo,  praticidade,  agilidade  e   instantaneidade,  ainda  explicam,  de  acordo  com  os  pesquisados,  a  predileção  pelo  rádio.  49%  deles  ouvem  rádio  principalmente  por  poder  fazer  isso  ao  mesmo  tempo  em  que  desempenham  outras  atividades.  Os  pesquisados  relataram  nas  entrevistas  que   ouvem   rádio   tomando   banho,   fazendo   trabalhos   domésticos   e   de   outros   tipos,   se  deslocando  para  diferentes  lugares,  realizando  exercícios  físicos,  entre  outras  ações.      Também  ficou  claro  que  a  predileção   tem  relação  com  a  agilidade  e  a   instantaneidade  do  veículo.   23,01%   dos   pesquisados   apontaram   isso   e   a   verticalização   mostrou   declarações  marcadas   por   palavras   que   destacam   essas   características   deste   meio   de   comunicação:  notícias  curtas,  rápidas  e  completas.  O  aprofundamento  deste  estudo  apontou  também  que  muitos  ouvem  rádio  como  parte  de  um  costume  incorporado  à  rotina.  Frases  como  “Eu  não  escolho  um  momento  do  dia  para  escutar  rádio,  Eu  ligo  o  rádio  e  vou  escutando  ou  Escuto  porque  gosto  e  porque  aprendi   isso  com  meus  pais”  foram  muito  marcantes  nas  respostas  dos   entrevistados.   Mas   esta   pesquisa   mostrou   também   que   o   ouvinte   de   rádio   tem   se  interessado,   cada   vez   mais,   pela   internet.   Para   40,9%   dos   pesquisados,   a   internet   já   é   a  segunda   fonte   de   informação   depois   do   rádio.   É   importante   esclarecer,   que   o   ouvinte  pesquisado   não   faz   uso   da   rede   mundial   de   computadores   para   acessar   páginas   de  emissoras  hertzianas  que  podem  ser  ouvidas  pela  internet.  A  maioria  da  amostra  60,7%,  não   4  Fonte:  dados  fornecidos  pela  emissora,  em  abril  de  2009,  para  realização  deste  trabalho.    

ouve   rádio   hertziano   pela   internet.   A   rede   é   usada   como   fonte   de   informação   e  entretenimento  complementar.      Relação  com  o  rádio  local      O  ouvinte  de  rádio  pesquisado  mostrou  ter  uma  relação  de  grande  proximidade  e  fidelidade  com  a  emissora  de  rádio  local  pesquisada,  a  Rádio  Itatiaia.  87,3%  dos  pesquisados  disseram  que  recorrem  à  Rádio  Itatiaia  quando  querem  se  informar.  A  maior  parte  dos  pesquisados,  47%,  explica  que  prefere  a  emissora  pela  qualidade  da  programação.  Um  olhar  mais  próximo  mostra  que  o  ouvinte  pesquisado   tende  a   compreender   como  qualidade  da  programação,  sobretudo,   a   amplitude   da   cobertura,   a   capacidade   da   emissora   de   cobrir   muitos   fatos  principalmente   do   estado   de   Minas   Gerais,   onde   ele   vive.   As   respostas   contiveram  observações   como:   [...]   grande   quantidade   de   notícias   completas,   [...]   informação   sobre  tudo,   [...]   maior   volume   de   notícias,   [...]   dão   tudo   resumidamente,   entre   outras.   Outras  declarações   explicitam   ainda   mais   a   confiança   do   ouvinte   pesquisado   na   capacidade   de  cobertura   da   emissora:   Se   acabar   com   a   Itatiaia,   Belo   Horizonte   some.   Não   ficaremos  sabendo  das  coisas,  ou  ainda:  Informação  sobre  tudo  é  com  a  Itatiaia  mesmo.      O   fato   de   a   rádio   ser  mineira   também   foi   muito   destacado   entre   os   entrevistados   como  motivo  de  preferência.  19,8%  dos  pesquisados  disseram  isso  e  as  entrevistas  explicitaram  o  que  essa  opção  quis  dizer,  com  frases  do  tipo:   [...]  pelo   fato  de  entender  o   jeito  da  minha  cidade,  do  meu  estado  ou  Não  sei,  mas  a  Itatiaia  valoriza  as  coisas  de  Minas.  Para  14,7%  dos  entrevistados,   a   regionalização   da   programação   é   outro   fator   que   pode   explicar   a  preferência   pela   emissora,   o   fato   de   trazer   grande   volume   de   informações   do   Estado   de  Minas  Gerais.  Algumas  declarações  trazem  menções  diretas  sobre  essa  percepção:  A  rádio  é  muito   boa,   a   regionalização   da   emissora   é  muito   boa.  Outra   questão   pesquisada   além  da  que  tratou  de  tentar  explicar  o  motivo  da  predileção  pela  emissora  em  questão,  reafirma  a  importância   dada   ao   caráter   regional   da   programação   da   Rádio   Itatiaia.   90%   dos  pesquisados   acreditam   que   a   Rádio   Itatiaia   invariavelmente   noticia   os   principais   fatos   do  Estado.    A   partir   de   maior   aproximação   dos   pesquisados,   por   meio   das   entrevistas,   foi   possível  observar   que   a   audiência   da   Rádio   Itatiaia   está  muito   ligada,   ainda,   ao   costume/tradição,  assim  como  no  rádio  em  geral.  São  ouvintes  que  cresceram  presenciando  os  pais  ouvindo  a  emissora  e  continuaram  a  fazer   isso.  É  por   isso  também  que  eu  procuro  a   Itatiaia  para  me  informar,  pela  tradição  dela,  [...]  Desde  criança  observo  meus  pais  ouvindo  a  Itatiaia,  ou  [...]  eu  aprendi  a  ouvir  com  os  meus  pais.  A  seriedade  e  credibilidade  da  emissora  também  foram  observadas   pelos   ouvintes.   A   emissora   é   considerada   segura,   sob   o   ponto   de   vista   de   ter  certeza  do  que  informa.      Além  de   todas   as   explicações   já   citadas,   no   caso  da  Rádio   Itatiaia,   a   audiência   está  muito  relacionada   com   uma   relação   quase   afetiva,   de   grande   proximidade,   que   os   pesquisados  demonstraram   possuir   com   a   emissora.   As   repostas   dos   pesquisados,   principalmente   nas  entrevistas   em   profundidade,   confirmam   também   o   perfil   de   ouvinte   fiel   que   a   emissora  tem.  São  verdadeiros  seguidores  da  programação  da  Rádio  Itatiaia,  que  sabem  detalhes  do  que  é  veiculado  em  vários  horários  do  dia  e  procuram  interação  com  a  rádio.  A  participação  

em   si   neste   trabalho   pode   ser   vista   como   um   busca   por   aproximação   de   situações  relacionadas  com  a  Rádio  Itatiaia.    A  pesquisa  também  identificou  uma  tendência  por  parte  dos  respondentes  de  considerar  a  Rádio   Itatiaia  como  uma  rádio   local  por  vocação.  Pela  percepção  do  ouvinte  pesquisado,  a  emissora  reúne  as  duas  características  de  proximidade,  geográfica  e  cultural,  propostas  por  como  delineadoras  de  uma  rádio  de  raízes  locais.    Dentro  desta  abordagem,  outro  objetivo  desta  pesquisa  era  avaliar  se  emissoras,  a  exemplo  da  Rádio  Itatiaia,  com  programação  local  podem  reforçar  os  laços  dos  ouvintes  com  a  cidade  ou  Estado  onde  eles  vivem.  Mais  de  90%  dos  entrevistados  afirmam  que  a  Rádio  Itatiaia  desempenha  este  papel.  Ao  explicar  melhor  a  questão  um  entrevistado  talvez  tenha  tido  maior  poder  de  síntese:  A  Itatiaia  coloca  Minas  no  rádio.      Os  ouvintes  explicam  que  a  emissora  personifica  as  características  do  Estado,  faz  as  pessoas  se  sentirem  representadas  e  estabelece  a  ligação  entre  mineiros  de  várias  partes  ao  colocar  no  ar  situações,  problemas  ou  simples  participação  de  ouvintes  de  vários  lugares.  Seria  um  ponto   de   encontro   de   mineiros,   onde   eles   se   identificam   como   tal.   Para   a   maioria   dos  pesquisados,   a   Itatiaia   é   vista   quase   como   um   patrimônio   de   perpetuação   de   valores  mineiros.   A   emissora   é   observada   como   mantenedora   de   valores   de   Minas   Gerais,   do  conjunto  de  valores  e  características  atribuído  aos  moradores  desse  Estado.  “Não  sei,  mas  a  Itatiaia  sabe  valorizar  as  coisas  de  Minas”,  afirma  um  dos  entrevistados.  Outro  pesquisado  diz:  “Porque  o  mineiro  sabe  que  do  jeito  da  Itatiaia  não  existe,  é  uma  só,  é  bom  saber  que  só  tem  aqui”.  Considerações  Finais      Esta   pesquisa   constatou   que   os   ouvintes   de   rádio   do   mundo   global   pesquisados   ainda  estabelecem  relação  muito  forte  e  duradoura  com  emissoras  locais,  como  a  brasileira  Rádio  Itatiaia.    Numa  metrópole  como  Belo  Horizonte,  capital  de  Minas  Gerais,  a  sexta  cidade  mais  populosa  do  Brasil,  com  cerca  de  2.452.000  habitantes5,  uma  rádio  local  tradicional  é  dona  de  audiência  expressiva,  apesar  de  tantas  formas  atuais  de  comunicação.  O  ouvinte  que  dá  a  essa   emissora   o   status   de   líder   de   audiência   na   capital   atribuiu   a   preferência   pela   Rádio  Itatiaia  a  um  conjunto  de  fatores  ligados  às  raízes  locais  do  veículo  de  comunicação.      Os  pesquisados  destacaram  a  capacidade  da  emissora  de  cobrir  muitos  fatos  do  Estado  onde  vive  e  a  importância  dessa  informação  ser  veiculada  por  uma  rádio  que  “entende  o  jeito  da  cidade  e  do  Estado  dele”,   como  disseram  alguns   respondentes.  Comprovando  a   tendência  de   não   desligamento   das   raízes,   mesmo   em   tempos   de   globalização,   os   pesquisados  mostraram  satisfação  pela  emissora  pesquisada  valorizar  as  questões  locais,  personificar  as  características  do  Estado  de  Minas  Gerais  e,  de  certa  forma,  conectar  os  mineiros  de  várias  localidades  do  Estado.      A  emissora,  pelo  o  que  apontaram  os  ouvintes,  consegue  estimular  a  manutenção  de  laços,  despertando   nos   ouvintes   o   sentimento   de   pertencimento   à   cidade   onde   vivem   ou   ao  Estado.  De   acordo   com  os   pesquisados   neste   trabalho,   a   Rádio   Itatiaia   gera   a   informação  que  Mafessoli   (2008)  afirma  ser   capaz  de  estabelecer   comunidade,  por   sua  capacidade  de  gerar  proximidade.   5 Instituto  Brasileiro  de  Geografia  e  Estatística  (IBGE)  (14  de  agosto  de  2009).  

 As  conclusões  desta  investigação  apontam  para  a  importância  de  se  levar  em  consideração  a  importância  do   rádio   local  dentro  dos  esforços  das  políticas  de  Desenvolvimento  Local.    O  poder   do   rádio   como   reforçador   das   identidades   locais   e   possível   aglutinador   dos   atores  sociais  é  apontado  claramente  pelos  respondentes  desta  pesquisa.  A  investigação  feita  com  ouvintes  da  Rádio  Itatiaia  foi  ao  encontro  da  análise  de  Musse  (2007),  “a  imprensa  mobiliza  a  circulação  e  a  difusão  rápida  de  informações,  criando  uma  solidariedade  que  já  não  depende  mais  da  presença  física,  é  uma  nova  rede  de  trocas”.    

 As   rádios   locais   podem   ajudar,   ainda   que   indiretamente,   na   possível   obtenção   de  alternativas   para   fortalecer   as   políticas   de   Desenvolvimento   Local,   que   passam,   também,  pela   necessidade   de   conhecimento   e,   consequentemente,   valorização   da   esfera   local.   O  entendimento  da   relação  do  ouvinte  de   rádio  de  uma  época  de  mídia   globalizada   com  as  emissoras  locais  pode  abrir  caminhos  para  estudos  futuros  sobre  formas  de  potencializar  a  força   do   rádio   e   de   outras   mídias   locais,   como   recurso   de   promoção   dos   laços   de  pertencimento  sociocultural  e  do  Desenvolvimento  Local.          Referências    AUGÉ,   M.   (1994)   Não-­‐lugares:   introdução   a   uma   antropologia   da   supermodernidade.  Papirus,  Campinas,  SP.      BORIN,  Jair  (1992)  A  vez  da  imprensa  regional.  Página  D'Oeste:  Maracai.  SP    CAMPONEZ,  Carlos  (2002)  Jornalismo  de  proximidade.  Minerva  Coimbra,  Coimbra,  PT.      

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