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    Introduo

    O ponto de vista dos alunos, os significados e valores que

    eles vinculam s vrias atividades do ensino devem ser

    considerados pelo professor, pois a alteridade um dos

    princpios pedaggicos que deve orientar a Educao Fsica

    (BETTI, 1999). Para Ricouer (1991), a alteridade implicanuma dialtica entre o si e o diverso de si: o outro (o

    aluno) constitutivo do si mesmo (o professor) ou vice-

    versa. Em outras palavras, o professor constitui-se em funo

    do aluno e vice-versa. Todorov (1991) estabelece trs nveis

    nesse relacionamento: 1) axiolgico, que envolve um

    julgamento de valor: o outro bom ou mau, eu gosto dele ou

    no, ele me igual ou inferior; 2) praxiolgico: eu me

    aproximo do outro, adoto seus valores, identifico-me com ele,

    ou me distancio do outro, impondo-lhe a minha prpria

    imagem (o outro tem de ser igual a mim); e 3)

    epistemolgico: eu conheo ou ignoro a identidade do outro.

    Em resumo: o professor precisa gostar de seus alunos,

    respeit-los, ouvi-los, conhec-los. no plano epistemolgico

    que se situa a preocupao deste estudo: conhecer mais sobre

    as atitudes dos alunos diante dessa disciplina, o que sentem e

    percebem em relao s aulas de Educao Fsica.

    Todavia, a perspectiva dos alunos com relao Educao

    Fsica na escola, suas opinies, preferncias, expectativas,

    etc., tm sido objeto de poucos estudos no Brasil.

    O problema da pesquisa ser aqui delimitado pelas seguintesquestes:

    - Quais so as atitudes e motivaes das alunas diante daEducao Fsica?

    Motriz, Rio Claro, v.9, n.3, p.135142, set./dez. 2003

    Educao Fsica escolar: a perspectiva de alunas do ensino fundamentali

    Mauro BettiMarlene Terezinha Facco Liz

    1Laboratrio de Estudos Socioculturais e Histricos da Educao Fsica- Universidade Estadual

    Paulista Bauru SP2Colgio Francisco Garrido - Lenis Paulista SP

    Resumo: O objetivo deste estudo descrever a perspectiva que possuem da disciplina Educao Fsica, sob o ponto devista de suas atitudes, alunas de 5 8 srie do Ensino Fundamental, considerando os seguintes aspectos: gosto pelasaulas, importncia atribuda disciplina, benefcios percebidos, preferncias, opinio com relao obrigatoriedade eoutros. Questionrio compreendendo questes abertas e fechadas foi aplicado a uma amostra de 151 alunas do sexofeminino. A Educao Fsica fortemente associada ao esporte, mas as dimenses do ldico, do movimento e dacompetio parecem ser mais importantes do que os contedos especficos. Os benefcios percebidos incidemprioritariamente sobre o desenvolvimento corporal. O esporte percebido, simultaneamente, como contedo de quemais gostam e menos gostam. Conclui-se que as alunas percebem as peculiaridades e ambigidades da EducaoFsica e possuem atitude favorvel com relao a ela ao menos no plano do gosto em participar das aulas.

    Palavras-chave: Educao Fsica Escolar, atitudes, adolescncia.

    Elementary and middle school female students attitudes about physical education

    Abstract: This studys objective is to describe the attitudes that 5th to 8th grade female students have about physicaleducation with respect to the following aspects: class enjoyment, attributed importance of subject matter, perceivedbenefits, preferences, and relative importance to other issues. An open- and closed-question questionnaire was

    administered to a sample of 151 female students. Physical education is strongly associated to sport, althoughdimensions ofplay, movement, and competition seem more important than do specific contents. Perceived benefits arerelated to body development, while, simultaneously, the content that is liked and disliked more than others is sport. Itwas concluded that female students perceive physical education peculiarly and ambiguously, and have favorableattitudes related to it, at least with regard to class participation.

    Key Words: Physical Education, attitudes, adolescence.

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    M. Betti & M. T. F. Liz

    Motriz, Rio Claro, v.9, n.3, p.135-142, set./dez. 2003136

    - Quais benefcios percebem como provenientes daparticipao em aulas de Educao Fsica?

    - Como vem a questo da obrigatoriedade das aulas?

    - Que importncia atribuem Educao Fsica em relao soutras disciplinas?

    Este estudo objetiva descrever a perspectiva de alunas da

    5 8 sriedo Ensino Fundamental com relao disciplina

    Educao Fsica, no que se refere a: gosto pelas aulas;

    importncia atribuda disciplina; benefcios percebidos;

    preferncias e rejeies de contedos e outros aspectos

    ligados s aulas; opinio com relao obrigatoriedade das

    aulas; associao da Educao Fsica a um ou mais

    conceitos/atividades/sentimentos indicados.

    Reviso de literatura

    Lovisolo (1995), em estudo que entrevistou 432

    pais/responsveis e 703 alunos de seis escolas da rede

    municipal pblica de ensino da cidade do Rio de Janeiro

    sobre diversos aspectos ligados Escola e Educao Fsica,

    lembra-nos inicialmente que, em geral, no necessrio

    obrigar algum a fazer algo de que goste,e como em nossa

    sociedade existiria uma tendncia adeso voluntria

    prtica esportiva e de atividades fsicas, no haveria razo

    para a Educao Fsica ser uma disciplina obrigatria na

    escola. Essa apenas uma das questes polmicas quepermeiam o debate sobre a Educao Fsica escolar

    atualmente no Brasil.

    No referido estudo, os alunos declararam que rejeitam na

    escola a sujeira, a baguna, e o que mais gostam so os

    professores, os amigos e as aulas de Educao Fsica, dentre

    um total de 25 itens mencionados. As trs primeiras

    disciplinas de que mais gostam so Educao Fsica,

    Matemtica e Portugus. Um dado interessante que a

    Educao Fsica aparece em primeiro lugar na relao das

    disciplinas que os alunos mais gostam; entretanto est em

    stimo entre as consideradas mais importantes. As seis mais

    importantes so: Matemtica, Portugus, Cincias, Histria,

    Geografia e Ingls. As atividades corporais mais mencionadas

    so: corrida, ginstica, basquete, futebol, voleibol e handebol.

    A maioria dos alunos entrevistados afirma gostar das

    atividades que realiza (mais de 80%) e atribui a elas utilidades

    como desenvolver o corpo e a fora, ter mais sade,

    praticar esportes, aprender a competir, ficar com o corpo

    mais bonito. No carter psicolgico, perder o medo, ser ele

    mesmo e ser descontrado so funes atribudas Educao

    Fsica. Com relao obrigatoriedade e optatividade, 54,1%

    preferem as aulas de Educao Fsica obrigatrias, e 43% as

    optativas.

    Betti (1986) entrevistou , mediante questionrio, 380

    escolares de ambos os sexos, de quatro escolas pblicas da

    cidade de So Paulo, com respeito aos benefcios que sentiam

    como resultantes da prtica da Educao Fsica, opinio a

    respeito das aulas, significado da Educao Fsica, status da

    Educao Fsica relativamente a outros componentes

    curriculares e opinio com relao importncia da atuao

    do professor na aprendizagem esportiva. Concluiu que os

    escolares apresentam atitudes bastante favorveis Educao

    Fsica, sendo esta Educao Fsica a disciplina de que mais

    gostam; o desenvolvimento do corpo, a melhoria da condio

    fsica e sade e a aprendizagem de esportes esto no centro

    dos valores e motivaes dos alunos, e que o professor de

    Educao Fsica fortemente valorizado como agente de

    aprendizagem de esportes.

    Betti (1995) investigou como o aluno experimenta o

    prazer nas aulas de Educao Fsica e os fatores que

    interferem para o seu alcance. Cinqenta e oito alunos, de

    ambos os sexos, foram os participantes dessa pesquisa, todos

    alunos de 5 8 srie do Ensino Fundamental e 1 srie do

    Ensino Mdio, oriundos de quatro escolas pblicas e quatro

    escolas particulares da cidade de Rio Claro, interior do Estado

    de So Paulo. A autora constatou que os colegas, o professor,o contedo e as condies de infra-estrutura escolar so os

    principais fatores que contribuem para o alcance do prazer

    por parte dos alunos nas aulas de Educao Fsica. A

    presena dos colegas um fator decisivo, conforme relatam

    as diversas entrevistas; mas, por outro lado, h interferncia

    dos mesmos, pois alguns no possuem uma participao

    cooperativa nas aulas, zombam dos menos habilidosos,

    provocam desentendimentos, contribuindo assim para que se

    deixe de gostar e at de participar das aulas de Educao

    Fsica.

    Para os alunos, ainda segundo Betti (1995), a figura do

    professor de extrema importncia, uma vez que ele

    geralmente responsvel pela organizao das aulas e escolha

    dos contedos, embora muitas vezes repetitivos e falhos. A

    autora observou que o esporte o contedo mais

    desenvolvido nas escolas e o preferido dos alunos, desde a 5

    srie do Ensino Fundamental at a 1 srie do Ensino Mdio.

    O professor, presena necessria e vital para os alunos,

    tambm recebeu muitas crticas, relacionadas ao jeito de

    conversar com os alunos, falta de pacincia e dilogo; seu

    interesse e desinteresse no passam despercebidos pelos

    alunos, em alguns casos o modo de tratamento do professor

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    Educao Fsica escolar: a perspectiva de alunas

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    para com os alunos responsvel pela permanncia ou no

    nas aulas de Educao Fsica.

    A autora constatou tambm que as condies de infra-

    estrutura no podem ser consideradas como as mais

    importantes, mas fator percebido pelos alunos. Concluindo:

    apesar de todos os problemas que envolvem a prtica da

    Educao Fsica na escola, os alunos, em sua maioria,

    continuam sentindo prazer em fazer as aulas.

    Para Caviglioli (1976), autor de um aprofundado estudo

    sobre motivaes, comportamentos e sentimentos frente Educao Fsica e esporte entre pr-adolescentes e

    adolescentes franceses:

    Eles representam a argila viva onde se inscrevem, empresses e comportamento, as dificuldades de seusfuturos, os esforos de seus educadores, as presses einfluncias mltiplas do seu meio. Estudar suas atitudese motivaes diante do esporte e da Educao Fsica ,portanto, inclinar-se igualmente sobre o presente e ofuturo dessas instituies. (CAVIGLIOLI, 1976, p.11)

    Caviglioli realizou uma enquete com 1.276 escolares do

    sexo masculino entre 11 e 17 anos, que delineia as atitudes

    dos escolares com relao Educao Fsica e prtica

    esportiva. A principal finalidade do estudo foi buscar

    perceber qual havia sido a imagem deixada na conscincia

    dos adolescentes pela prtica obrigatria de uma disciplinaescolar - a Educao Fsica. O autor chegou s concluses

    que se seguem.

    Os escolares possuem uma imagem fortemente valorizada

    da Educao Fsica, e vem na sua prtica um aspecto

    positivo, encontrando mais liberdade do que constrangimento,

    mais alegria do que tristeza, mais interesse que

    aborrecimento, mais beleza que feira, mais prazer que

    sofrimento.

    E dos esportes? Fica bastante clara a interveno das

    motivaes esportivas em Educao Fsica segundo uma

    ptica esportiva.

    Os escolares foram solicitados a responder qual, dentre

    estas quatro palavras lhe parecia mais prxima da EducaoFsica: corpo, movimento, jogo, competio. Caviglioli

    identificou que enquanto o conceito competio obtm o

    maior nmero de partidrios at os 14 anos, ele

    acompanhado aos 15 e 16 anos por corpo antes de ser

    superado por este mesmo smbolo a partir dos 17 anos.

    Reunindo as porcentagens de corpo e movimento de um

    lado (educao com dominante corporal) e de jogo e

    competio do outro (considerao da personalidade do

    educando no seu conjunto), o primeiro conjunto domina antes

    dos 12 e a partir dos 18 anos, enquanto que o segundo

    majoritrio de 13 a 17 anos.

    Pode-se observar que, de uma maneira ou de outra, a

    Educao Fsica sempre fato presente e marcante na vida do

    adolescente, indo do esporte para o corpo e de atividade

    competitiva para atividade de lazer, variando de acordo com a

    idade, conforme explica Caviglioli quando analisa a evoluo

    das atitudes escolares. Trs grupos, ento aparecem:

    - de 11 a 13 anos, os pr-adolescentes manifestam, comrelao Educao Fsica e Esportiva e ao Esporte, uma

    grande espontaneidade e um vivo entusiasmo; o pr-

    adolescente reencontra o movimento como expresso da vida:

    viver, para ele, tentar agir, movimentar-se, deixar seu corpo

    ir pelos caminhos arriscados que nem sempre so controlados

    por um pensamento racional;

    - de 14 a 16 anos, em um perodo que pode variar segundo os

    indivduos, e que marcado pela dvida, pela discusso e

    pela rebelio intelectual, o ritmo torna-se mais excitante, mais

    reservado, mais ativo;

    - a partir de 17 anos, um nvel de exigncia mais elevado se

    acompanha, no que se refere Educao Fsica esportiva,

    motivada por uma procura de atividades de compensao,

    permitindo afirmar um equilbrio pessoal comprometido pelavida.

    Com relao aos horrios da Educao Fsica, a maioria

    prefere escolher o horrio que mais lhe convm, enquanto

    outros preferem um horrio estvel. Quanto

    obrigatoriedade, entre 11 e 13 anos vence a prtica

    obrigatria; j dos 14 aos 16 anos, 50% optam pela Educao

    Fsica facultativa e 46% pela Educao Fsica obrigatria.

    interessante notar que, ao mesmo tempo em que o

    adolescente quer escolher seu horrio e sua atividade, ele

    tambm quer a Educao Fsica como obrigatria, reconhece

    seu valor e necessidade e a quer integrada no sistema de

    ensino.

    Depois dos 16 anos, eles percebem o esporte como parte

    integrante de sua vida e como necessidade fundamental,conforme declarou um dos escolares entrevistados por

    Caviglioli (1976, p. 83): Inteligncia e ao devem ser os

    dois plos de nossa vida.

    Por intermdio da Educao Fsica, especialmente do

    esporte, conforme relata Caviglioli, o adolescente reencontra

    seu corpo, reduz as tenses, libera energia, aprende a se

    conhecer melhor, se expressa e se comunica, conquista uma

    liberdade at ento talvez reprimida dentro da sala de aula ou

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    em sua prpria casa, e percebe corpo e alma como uma

    unidade. Entretanto, o corpo, no utilizado nas disciplinas

    habituais, tem poucas ocasies de participar do processo de

    educao, por causa da pouca importncia e do pouco

    prestgio de que gozam os trabalhos prticos e manuais.

    Cavilioli prossegue, ao considerar o adolescente um ser

    em pleno desenvolvimento, cujos terrenos corporal, psquico,

    motor e fisiolgico aperfeioam-se constantemente. Diante

    dessas contnuas mudanas, ele tem necessidade de se

    conhecer, de voltar-se para si mesmo, para se definir, ir alm

    de si mesmo para traar os limites de suas faculdades e se por

    prova. Conforme declarou um dos adolescentes

    entrevistados por Caviglioli (1976, p. 54): o esporte uma

    possibilidade de se conhecer pessoalmente. A gente se

    conhece melhor depois de uma partida. A gente se conhece de

    fato porque no pode trapacear consigo mesmo.

    Metodologia

    Este um estudo descritivo, que se caracteriza como uma

    pesquisa de levantamento, na qual, segundo Selltiz et al

    (1987), coletam-se dados de uma populao relativamente

    grande, relacionados s variveis scio-culturais ou

    caractersticas das pessoas (sexo, idade, religio, nvel

    socioeconmico etc.), comportamento, opinies e atitudes, em

    geral utilizando questionrio e/ou entrevistas. Este estudoutilizou um questionrio contendo 11 questes, tanto

    abertas como fechadas.

    Populao alvo e amostragem

    Alunas do sexo feminino de quatro escolas de Ensino

    Fundamental, da 5 8 srie do Ensino Fundamental, sendo

    duas escolas pblicas e duas particulares de Lenis Paulista,

    cidade de pequeno porte situada na regio oeste do Estado de

    So Paulo, que freqentavam aulas de Educao Fsica.

    Optou-se por incluir escolas da rede pblica e da rede

    particular de ensino, para abranger uma populao mais

    diversificada. As escolas foram escolhidas por critrio de

    acessibilidade do pesquisador e existncia das sries em

    questo.

    Das 352 alunas que freqentavam as duas escolas

    pblicas e das 145 que freqentavam as duas escolas

    particulares da 5 8 srie, responderam ao questionrio, 106

    e 45 alunas, respectivamente, correspondendo a cerca de

    30% da populao total.

    Em uma das escolas pblicas, na qual havia trs classes de

    cada srie, foram sorteadas duas delas e na outra, onde havia

    somente duas classes de cada srie, foram utilizadas ambas.

    Nas escolas particulares havia apenas uma classe de cada

    srie. A escolha das alunas foi feita aleatoriamente, a partir

    das listas de chamada. O questionrio foi respondido de

    prprio punho pelas prprias alunas, com assistncia do

    pesquisador.

    Resultados

    Perguntadas sobre quais disciplinas mais gostam, em

    questo aberta, na qual as alunas podiam listar tantas

    disciplinas quantas quisessem, a Educao Fsica foi alada

    ao primeiro lugar, sendo indicada por quase dois teros dasalunas. Matemtica e Histria, com nmero aproximado de

    indicaes, aparecem em segundo e terceiro lugares, vindo a

    seguir Cincias e Educao Artstica. As demais disciplinas

    tiveram baixa incidncia de escolha.

    Com relao s disciplinas que as alunas gostam menos,

    Geografia, Matemtica, Portugus e Ingls foram as quatro

    disciplinas mais citadas, com percentuais prximos de

    escolha, entre 37 e 40,3 %, aparecendo a seguir Histria.

    Observe-se que a Matemtica est, simultaneamente, entre as

    cinco disciplinas das quais as alunas mais gostam (ver

    Tabelas 1 e 2).

    Tabela 1.As cinco disciplinas que as alunas mais gostam.

    DISCIPLINA N %Educao Fsica 98 64,9

    Matemtica 68 45,0

    Histria 66 43,7

    Cincias 56 37,1

    Educao Artstica 55 36,4

    Tabela 2.As cinco disciplinas que as alunas menos gostam.

    DISCIPLINA N %

    Geografia 61 40,3

    Matemtica 60 39,7

    Portugus 59 39,1Ingls 56 37,1

    Histria 41 27,1

    Para as alunas, a Matemtica a disciplina mais

    importante, seguida de Portugus, ambas com escolhas por

    parte de mais de 80% das alunas, seguidas de Ingls, Cincias

    e Geografia, com indicaes inferiores a 40%. (ver Tabela 3).

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    Uma aparente contradio que a Matemtica e Portugus

    esto entre as trs disciplinas que as alunas gostam menos e

    entre as duas disciplinas mais importantes. A Educao Fsica

    ocupa o sexto lugar na ordem de importncia para as alunas.

    Tabela 3. As cinco disciplinas que as alunas consideram maisimportantes.

    DISCIPLINA N %

    Matemt ica 134 88,8

    Portugus 121 80,1

    Ingls 60 39,7

    Cincias 52 34,4

    Geografia 47 31,1

    Os dados encontrados com relao s disciplinas

    preferidas e as consideradas mais importantes so

    semelhantes aos de Lovisolo (1995). A Educao Fsica

    aparece em primeiro lugar nas disciplinas mais apreciadas,

    entretanto cai para sexto ou stimo lugar entre as disciplinas

    consideradas mais importantes, do mesmo modo que

    Matemtica e Portugus ocupam os primeiros lugares na

    ordem de importncia atribuda pelos alunos em ambos os

    estudos. A tendncia comum a atribuio de maiorimportncia s disciplinas heursticas e cientficas, e menor s

    disciplinas humansticas.

    Em relao s disciplinas que as alunas menos gostam

    houve coincidncias parciais com o estudo de Lovisolo

    (1995): a Educao Fsica obteve pouqussimas escolhas;

    Matemtica, Geografia e Cincias aparecem em ambos os

    estudos includas dentre as disciplinas menos prezadas. Como

    no citado estudo de Lovisolo, conclui-se que as alunas

    distinguem entre o gostar - o prazer e a satisfao que as

    aulas de Educao Fsica podem lhe propiciar - e a

    importncia que percebem em outras disciplinas para suas

    vidas.

    As escolares encaram a Educao Fsica simultaneamente

    como obrigao e como diverso, ou seja, evidencia-se

    como a Educao Fsica lida com princpios contraditrios:

    trabalho versus lazer. Ao mesmo tempo que as aulas so

    obrigatrias, tambm trazem satisfao pessoal. Poucas

    alunas vem a Educao Fsica apenas como diverso ou

    como obrigao.

    Tabela 4.Como as alunas percebem as aulas de EducaoFsica.

    PERCEPO N %

    Obrigao 9 5,9

    Diverso 29 19,2

    Obrigao e diverso 107 70,9

    Nenhuma das anteriores 6 4,0TOTAL 151 100,0

    Cerca de 75% das alunas declararam que gostam ou

    gostam muito da Educao Fsica. Salta aos olhos o fato de

    que as aulas proporcionam enorme satisfao e realizao

    pessoal (ver Tabela 5). oportuno acrescentar que, em

    muitos questionrios, as alunas registraram, espontaneamente,

    seus sentimentos para com a Educao Fsica, tais como: "eu

    adoro Educao Fsica..."... eu amo Educao Fsica..., no

    tem nada ruim pra mim..."ela mexe com o corpo e com a

    cabea..., d uma alegria...".

    Tabela 5. Sentimento em relao s aulas de EducaoFsica.

    SENTIMENTO N %

    Gosto muito 64 42,4

    Gosto 50 33,1

    Gosto mais ou menos 32 21,2

    No gosto 5 3,3

    TOTAL 151 100,0

    Com relao aos benefcios percebidos como decorrentes

    das aulas de Educao Fsica, aprender esportes, melhorar

    o condicionamento fsico e a sade, fortalecer os msculose desenvolver o corpo, foram as alternativas mais

    assinaladas (v. Tabela 6). Esses resultados evidenciam dois

    ncleos de valorizao: o "esportivo" e o "corporal" (ligado

    ao condicionamento fsico e sade), que superam amplamente

    os valores ligados sociabilizao (disciplinar, desinibir e

    fazer amizades). Confirmam-se aqui os resultados

    encontrados por Betti (1986).

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    Motriz, Rio Claro, v.9, n.3, p.135-142, set./dez. 2003140

    Tabela 6.Benefcios percebidos.

    BENEFCIOS N %

    Aprender esportes 139 93,0

    Melhorar a condio fsica e a sade 139 92,0

    Fortalecer os msculos 125 82,8

    Desenvolver o corpo 107 70,9

    Desinibir 64 42,4

    Disciplinar 51 33,8

    Fazer amizades 49 32,4

    Descansar a cabea 46 30,4

    Inibir 5 3,0

    Outros 8 5,3

    Indagadas sobre o que mais gostam nas aulas de Educao

    Fsica, as alunas listaram prepdonderantemente contedos.

    Dentre as atividades que informaram mais gostar esto, em

    primeiro lugar, algumas modalidades esportivas (voleibol,

    handebol, futebol, basquetebol), seguidas de jogos e

    esportes, vindo dana e queimada logo a seguir (v.Tabela 7).

    Tabela 7. O que as alunas mais gostam nas aulas deEducao Fsica.

    CONTEDO N %

    Voleibol 57 37,7

    Handebol 45 29,8

    Futebol 30 19,9

    Basquetebol 25 16,5

    Jogos 23 15,2

    Esportes 21 13,9

    Dana 16 10 ,6

    Queimada 15 9,9

    Tudo 7 4,6

    Ginstica 5 3,3

    Professor 5 3,3

    Outras 12 7,9

    Em uma aparente contradio, so tambm modalidades

    esportivas o que as alunas declararam gostar menos nas aulas

    de Educao Fsica. Surgiram tambm referncias a aspectos

    ligados interao social, como dividir aulas com os

    meninos (v. Tabela 8). Segundo justificativa que

    apresentaram algumas alunas, aulas em conjunto com os

    meninos so desmotivantes porque, segundo elas, a

    preferncia masculina, em relao aos contedos, diferente

    da feminina.

    Tabela 8. O que as alunas menos gostam nas aulas deEducao Fsica.

    CONTEDO N %

    Basquetebol 35 23,2

    Futebol 18 11,9

    Voleibol 15 9,9

    Handebol 15 9,9

    Div idi r aulas com os meninos 11 7.3

    Sol forte 7 4,6

    Fundamentos esportivos 6 4,0

    Prob lemas de re lacio-namen to 5 3 ,3

    Outras 17 11,3

    A Tabela 9 apresenta as respostas questo que indagava:

    "a Educao Fsica para voc lembra...", que listava 26

    palavras, podendo as escolares escolher quantas quisessem.

    Os resultados indicam uma certa coerncia na ordem das

    escolhas. Em primeiro lugar, situam-se as palavras esporte,

    jogo, diverso e movimento. Este primeiro grupo, que

    apresentou escolha mdia de 80,8%, abrange algumas

    dimenses conceituais que permeiam a Educao Fsica: a

    cultura esportiva, o ldico e o movimento. interessante

    notar que, neste grupo, a palavra competio teve escolha

    bastante inferior (65,6%), o que sugere que a dimenso

    competitiva nas aulas de Educao Fsica no a mais

    significativa para as escolares, o mesmo ocorrendo com apalavra corpo, escolhida por 49% das entrevistadas. No

    segundo grupo de palavras, com escolha mdia de 66,7%,

    encontram-se basicamente atividades, com destaque para

    modalidades esportivas, alm de ginstica. O terceiro

    grupo, que registrou escolha mdia de 49,3%, inclui todas as

    associaes a palavras que expressam sentimentos positivos

    com relao s aulas: brincadeira, alegria, vontade,

    prazer. No ltimo grupo aparecem as palavras associadas a

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    Educao Fsica escolar: a perspectiva de alunas

    Motriz, Rio Claro, v.9, n.3, p.135-142, set./dez. 2003 141

    sentimentos negativos, tais como cansao, sacrifcio,

    tristeza, com escolha mdia de 12,1%.

    Esses resultados coincidem em grande parte com os

    autores j revisados. Esporte, jogo, movimento e competio

    foram as palavras escolhidas por Caviglioli (1976) para

    exprimir as dimenses psicossociais presentes na Educao

    Fsica e no esporte, e destas, trs palavras (exceto

    competio), dentre as vinte e seis sugeridas, foram as mais

    lembradas pelas alunas entrevistadas. Betti (1995), em seu

    estudo, concluiu que o esporte o contedo maisdesenvolvido nas escolas e o preferido dos alunos. J Betti

    (1986) concluiu que a Educao Fsica fortemente associada

    idia de movimento e corpo, antes que competio e

    brincadeira.

    Tabela 9. Palavras associadas pelas alunas Educao Fsica.

    PALAVRA N % % mdia

    Esporte 134 88,7

    Jogo 128 84,8

    Diverso 114 75,5

    Movimento 112 74,1 80,8%

    Vlei 109 72,2

    Ginstica 105 69,5

    Handebol 102 67,5

    Competio 99 65,6

    Futebol 95 63,0

    Basquete 94 62,2 66,7%

    Brincadeira 77 60,0

    Gostoso 87 57,6

    Atletismo 85 56,3

    Alegria 84 55,6

    Corpo 74 49,0

    Corrida 73 48,3

    Vontade 71 47,0

    Dana 69 45,7

    Prazer 64 42,4

    Recreao 47 31,1 49,3%

    Obrigao 42 27,8

    Trabalho 28 18,5

    Cansao 26 17,2

    Sacrifcio 10 06,6

    Desnimo 04 02,6

    Tristeza 01 00,7 12,1%

    Com relao obrigatoriedade das aulas de Educao

    Fsica cerca de 70% das alunas responderam que fariam aulas

    de Educao Fsica mesmo que no fossem obrigatrias;

    poucas responderam que no fariam e 20% expressaram

    indeciso (v. Tabela 10).

    Tabela 10. Participao voluntria nas aulas de EducaoFsica.

    RESPOSTA N %

    Sim 107 70,9No 13 8,6

    No sei 31 20,5

    TOTAL 151 100,0

    Concluses

    Alguns resultados confirmam estudos anteriores e

    estabelecem assertivas claras:

    1- A Educao Fsica a disciplina de que as escolares maisgostam, mas no considerada muito importante, quer

    dizer, fazem distino entre o prazer e a satisfao

    propiciadas pelas aulas de Educao Fsica, e a

    importncia que atribuem a outras disciplinas, em

    especial Matemtica e Portugus.

    2- A Educao Fsica fortemente associada pelas escolaresao esporte.

    3- Os benefcios percebidos pelas escolares comodecorrentes da Educao Fsica giram prioritariamente

    em torno do desenvolvimento corporal.

    Contudo, existe uma complexidade de relaes entre os

    dados que precisa ser considerada. As alunas classificaram a

    Educao Fsica simultaneamente como obrigao e

    diverso quer dizer, a Educao Fsica lida com

    princpios contraditrios: de um lado a obrigao de uma

    disciplina escolar tal como as demais, de outro, o prazer, a

    diverso, a alegria proporcionadapor sua dinmica peculiar, o

    que percebido pelas alunas. Seria necessrio investigar, em

    maior profundidade, em qual ou quais aspectos os alunos

    percebem o componente de obrigao na Educao Fsica.

    Porm, a essa percepo de obrigao, associa-se um alto

    grau de voluntariedade: as alunas freqentariam as aulas de

    Educao Fsica, mesmo que no fossem obrigadas a faz-lo.

    Tal opo tambm aparece, embora em menor grau, nos

    escolares entrevistados por Caviglioli (1976) e Lovisolo

    (1995), que preferiram a Educao Fsica como disciplina

    optativa.

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    M. Betti & M. T. F. Liz

    Motriz, Rio Claro, v.9, n.3, p.135-142, set./dez. 2003142

    Seria o caso de perguntar o que aconteceria se as aulas de

    Educao Fsica deixassem de ser obrigatrias, como sugere

    Lovisolo? Como a dimenso afetiva, ligada ao gostar das

    aulas muito forte entre os alunos, no haveria alteraes de

    grande monta na freqncia s aulas. Todavia, o mesmo

    estudo de Lovisolo evidenciou que os pais/responsveis

    atribuem pequena importncia Educao Fsica,

    comparativamente a outras disciplinas (em especial as de

    cunho heurstico/cientfico), no se deveria temer pela

    continuidade futura da disciplina no currculo?

    Embora a Educao Fsica seja fortemente associada ao

    esporte, as dimenses do ldico (jogo, diverso, prazer

    etc.), do movimento e da competio parecem ser mais

    importantes do que os contedos especficos. Tambm a

    opinio manifestada pelas escolares com relao ao esporte,

    simultaneamente contedo de que mais gostam e de que

    menos gostam, evidencia a problemtica que ele faz surgir no

    contexto escolar. Belbenoit (1976) entende que so os

    educadores que fazem do esporte um objeto e meio de

    educao na escola: o esporte aquilo que se fizer dele.

    Alguns dos dados dados aqui apresentados alertam para a

    necessidade de combater a tendncia do esporte tornar-se um

    fim em si mesmo, acarretando a nfase na busca da vitria e

    no rendimento tcnico, que causa excluso e desmotivao de

    muitos alunos, assim como a tendncia de tornar-se

    hegemnico nos programas de Educao Fsica escolar,

    inibindo a diversidade de contedos e estratgias.

    Em contrapartida, os benefcios percebidos, ligados

    prioritariamente a aspectos do desenvolvimento corporal,

    embora a palavra corpo tenha sido a dcima quinta escolha

    associada pelas escolares Educao Fsica, conotam uma

    viso utilitarista da disciplina.

    Conclui-se, por fim, que as alunas percebem as

    peculiaridades e, em parte, as ambigidades da Educao

    Fsica, e possuem atitude favorvel em relao a ela ao

    menos no plano do gosto em participar das aulas.

    Referncias

    BELBENOIT, G. O desporto na escola. Lisboa: EditorialEstampa, 1976.

    BETTI, I. C. R. Educao fsica escolar: a percepo

    discente. Revista Brasileira de Cincias do Esporte,

    Florianpolis, v. 16, n.2, p.158-167, 1995.

    BETTI, M. Atitudes e opinies de escolares de 1 grau em

    relao educao fsica. In: SIMPSIO DE CINCIAS DO

    ESPORTE, 14., 1986, So Caetano do Sul. Anais... So

    Caetano do Sul; Celafiscs, Fec do ABC, 1986. p.66.

    BETTI, M. Educao fsica, esporte e cidadania. Revista

    Brasileira de Cincias do Esporte, Florianpolis, v.20, n.2-

    3, p.84-92, 1999.

    CAVIGLIOLI, B. Sport et adolescents. Paris: Librairie

    Philosophique J. Vrin, 1976.

    LOVISOLO, H. Educao fsica: a arte da mediao. Rio deJaneiro: Sprint, 1995.

    RICOEUR, P. O si-mesmo como um outro. Campinas:

    Papirus, 1991.

    SELLTIZ, C. et al. Mtodos de pesquisa nas relaes

    sociais. 2. ed. So Paulo: E.P.U, 1987. v.1. Delineamento de

    pesquisa.

    TODOROV, T. A conquista da Amrica: a questo do

    outro.3. ed. So Paulo: Martins Fontes, 1991.

    Texto completo do trabalho apresentado no 8 Congresso de

    Educao Fsica e Cincias do Desporto dos Pases de LnguaPortuguesa, Lisboa, 2000.

    Endereo:

    Mauro BettiUNESP Departamento de Educao FsicaAv. Eng. Luiz C. Coube s/n Vargem LimpaBauru SP17033-360Telefax: (14) 221.6082e-mail: [email protected]

    Manuscrito recebido em 20 de agosto de 2003.

    Manuscrito aceito em 27 de fevereiro de 2004.