1. Fundamentos Da Transferencia de Massa

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1. Fundamentos da transferência de massa este capítulo, são introduzidos os conceitos gerais da transferência de massa. Inicialmente, são apresentadas as principais equações que regem o fenômeno e é realizada uma analogia com o transporte de momento e de calor, seguida pelas relações matemáticas de concentração e fluxo muito utilizadas nas resoluções de problemas. Alguns aspectos interessantes do curso de transferência de massa também são abordados, como a apresentação do coeficiente de transferência de massa e situações em que a lei de Fick não prevê o comportamento das espécies. 1.1 Introdução A transferência de massa é um dos três fenômenos de transporte, ou seja, podemos dizer que os fenômenos de transferência de momento, calor e massa, originalmente reunidos em um único livro por Bird e colaboradores (BIRD et al., 1960), apresentam muitas semelhanças entre si. Um exemplo é obtido pela comparação das Equações 1, 2 e 3, a seguir, que apresentam as leis de Newton da viscosidade, a de Fourier e a primeira lei de Fick, respectivamente, equações básicas de cada um dos três fenômenos. =− (1) Onde τ é a taxa de deformação angular do fluido[ML -1 θ -2 ], dv/dz é o gradiente de velocidade na direção z [θ -1 ] e μ é uma constante de proporcionalidade conhecida como viscosidade dinâmica [ML -1 θ -1 ]. =− (2) Onde q é a taxa de transferência de calor [Mθ -2 ], dT/dz é o gradiente de temperatura na direção z [K.L -1 ] e k é uma constante de proporcionalidade conhecida como condutividade térmica [MLK -1 θ -2 ]. =− (3) N

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1. Fundamentos da

transferência de massa

este capítulo, são introduzidos os conceitos gerais da transferência de massa.

Inicialmente, são apresentadas as principais equações que regem o fenômeno e

é realizada uma analogia com o transporte de momento e de calor, seguida

pelas relações matemáticas de concentração e fluxo muito utilizadas nas resoluções de

problemas. Alguns aspectos interessantes do curso de transferência de massa também

são abordados, como a apresentação do coeficiente de transferência de massa e

situações em que a lei de Fick não prevê o comportamento das espécies.

1.1 Introdução

A transferência de massa é um dos três fenômenos de transporte, ou seja, podemos dizer

que os fenômenos de transferência de momento, calor e massa, originalmente reunidos

em um único livro por Bird e colaboradores (BIRD et al., 1960), apresentam muitas

semelhanças entre si. Um exemplo é obtido pela comparação das Equações 1, 2 e 3, a

seguir, que apresentam as leis de Newton da viscosidade, a de Fourier e a primeira lei de

Fick, respectivamente, equações básicas de cada um dos três fenômenos.

� = −� ���� (1)

Onde τ é a taxa de deformação angular do fluido[ML-1

θ-2

], dv/dz é o gradiente de

velocidade na direção z [θ-1

] e µ é uma constante de proporcionalidade conhecida como

viscosidade dinâmica [ML-1

θ-1

].

� = − ��� (2)

Onde q é a taxa de transferência de calor [Mθ-2

], dT/dz é o gradiente de temperatura na

direção z [K.L-1

] e k é uma constante de proporcionalidade conhecida como

condutividade térmica [MLK-1

θ−2

].

� = −� � �� (3)

N

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Onde j é a taxa de transferência de massa, ou fluxo mássico, [ML-2

θ-1

], dρ/dz é o

gradiente de concentração mássica na direção z [M.L-4

] e D é uma constante de

proporcionalidade conhecida como coeficiente de difusão [L2θ

-1].

Vale destacar que todas as três leis apresentam um sinal negativo, indicando que o

transporte ocorre no sentido contrário do gradiente, ou seja, da região de maior valor de

velocidade, temperatura ou concentração mássica para a região de menor valor.

Portanto, as equações apresentadas acima apresentam sempre uma taxa de transferência,

primeiro membro da equação, que é função de uma força motriz, ou seja, gradientes de

velocidade, temperatura ou concentração, multiplicados por uma propriedade

característica do sistema em estudo.

O que diferencia a transferência de massa dos demais fenômenos é a natureza química

das espécies envolvidas, ou seja, a massa molar (tamanho) e a forma da molécula

tornam o processo um pouco mais complexo, uma vez que pode haver atrito entre estas

espécies durante o seu escoamento. Assim, por exemplo, podemos imaginar dois bulbos

contendo três gases, conforme ilustrado na Figura 1. O que podemos esperar se a

membrana que impede a mistura dos gases for retirada?

Figura 1: Três gases em dois bulbos ligados por um capilar estreito.

A resposta deve levar em conta não somente a variação da concentração dos gases, mas

também seu tamanho e sua forma. Isso não está previsto na lei de Fick, que não avalia o

tempo para que o transporte ocorra. Mas, com os seus conhecimentos até este momento,

o que você esperaria que acontecesse com o nitrogênio?

1.2 Relações de concentração e de fluxo

Concentração

Como existem diversas maneiras de expressar a concentração de uma espécie, serão

apresentadas nesta seção as formas mais comuns utilizadas na transferência de massa.

A concentração mássica da espécie i é dada pela razão entre a massa de i e o volume da

solução [ML-3

], e será expressa por ρi. Note que, apesar do símbolo ser idêntico ao que

usamos para a densidade, a grandeza ρi está definida em relação ao volume da solução,

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sendo, portanto, distinta da densidade. A soma das concentrações mássicas de todas as

espécies, ρ, é dada pela Equação 4 e corresponde à densidade da mistura.

� = ∑ ������ (4)

A fração mássica da espécie i, wi, pode ser obtida pela razão entre a concentração

mássica de i e a densidade da mistura, conforme Equação 5.

�� = � (5)

A partir das equações anteriores, temos a Equação 6.

∑ �

���� = ∑ ���

��� = 1 (6)

A concentração molar da espécie i é dada pela razão entre o número de mols de i e o

volume da solução [molL-3

], e será expressa por Ci. A soma das concentrações mássicas

de todas as espécies, C, é dada pela Equação 7 e corresponde à concentração molar da

mistura.

� = ∑ ������ (7)

A fração mássica da espécie i, xi, pode ser obtida pela razão entre a concentração molar

de i e a concentração molar da mistura, conforme Equação 8.

�� = ��� (8)

A partir das Equações 7 e 8, temos a Equação 9.

∑ ���

���� = ∑ ���

��� = 1 (9)

Para converter a concentração mássica em concentração molar, basta utilizar a Equação

10, em que Mi é a massa molar da espécie [Mmol-1

].

�� = ���

(10)

Fluxo

Vale destacar neste ponto que o fluxo difere da vazão já que o fluxo tem sempre uma

área perpendicular ao escoamento associada a ele. Assim, o fluxo corresponde à vazão

dividida pela área.

Para calcular o fluxo de uma espécie, frequentemente é conveniente descrever a

transferência em relação a um sistema de coordenadas fixo. Neste caso, podemos

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assumir que Ni [molL-2

θ−1

] seja o fluxo molar da espécie i em relação ao referencial fixo

e a Equação 11, descreve a relação entre Ni com a concentração molar de i, Ci [molL-3

],

e a velocidade de i em relação ao referencial fixo, Ui [Lθ-1

].

������ = �������� (11)

Por analogia, a Equação 12 apresenta o fluxo mássico do componente i, ni [ML-2

θ−1

],

em relação à concentração mássica ρi.

����� = �������� (11)

Em alguns casos, é conveniente escrever o fluxo em relação a um sistema de referência

diferente do sistema fixo. Neste caso, as equações de fluxo mássico, ji [ML-2

θ-1

], e fluxo

molar, Ji [molL-2

θ-1

], podem ser escritas conforme as Equações 12 e 13.

!���� = �� "������ − �#������$ (12)

%���� = �� "������ − �#������$ (13)

Onde Uo é uma velocidade de referência.

Mas Uo pode ser escrita como resultado das propriedades do sistema, ou seja, pode ser

utilizada a velocidade média mássica, Um

, a velocidade média molar, UM

, ou a

velocidade média volumétrica UV, conforme apresentado nas Equações 14, 15 e 16.

�#������ = �&������� = ∑ ����� � ������ (14)

�#������ = ��������� = ∑ ����� � ������ (15)

�#������ = �������� = ∑ '(������ � ������ (16)

Na Equação 16, '(� é o volume parcial molar de i [L3mol

-1].

Substituindo a Equação 15 na Equação 13, e considerando a Equação 11, temos a

Equação 17, após algebrismo simples:

������ = %���� + ����������� (17a)

������ = −���∇�� + ����������� (17b)

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Na equação 17b, o segundo termo é a soma das parcelas difusiva e convectiva.

Considerando a definição da velocidade média molar, Equação 15, temos as Equações

18 e 19.

������ = %���� + ��� ∑ �������

��� � (18)

������ = %���� + �� ∑ �������� � (19)

Para misturas em que o termo xi é pequeno, o escoamento pode ser desprezado e o fluxo

referente a um sistema de coordenadas fixo fica igual ao termo difusivo (HINES e

MADDOX, 1985).

Sistemas binários

Consideremos as equações de Fick para um sistema binário composto por A e B

unidimensional dado pelas Equações 20 e 21:

%+ = −��+, �-.�� (20)

�+ = −��+, �/.�� (21)

Em ambas as equações, os coeficientes de difusão são idênticos e possuem a mesma

unidade. Para um sistema binário arbitrário, a Equação 19 pode ser reescrita da forma

das Equações 22, 23 ou 24.

�+����� = %+���� + �+0�+����� + �,������1 (22)

�+����� = −��+, �-.�� + �+0�+����� + �,������1 (23)

+����� = −��+, �/.�� + �+2 +����� + ,�����3 (23)

1.3 Outra abordagem

Outra abordagem para o equacionamento dos problemas de transferência de massa tem

como premissa a necessidade de simplificar o equacionamento do processo escrevendo

que o fluxo é resultado do produto entre uma constante de proporcionalidade e uma

diferença de concentração, conforme apresentado na Equação 24. Desta forma, todo o

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inconveniente da equação diferencial é englobado pela constante kc, que corresponde ao

coeficiente de transferência de massa.

%+ = 42�� − �53 (24)

Este tipo de equação será apresentado em detalhes posteriormente, mas é muito

conveniente para solucionar problemas de engenharia, como o projeto de uma coluna de

adsorção, absorção ou mesmo para evaporadores.

1.4 Para pensar um pouco

Considere um sistema fechado contendo heptano e etano, conforme ilustrado na Figura

2. Inicialmente, heptano líquido foi misturado com etano gasoso, na temperatura de 300

K e 1 atm de pressão. O sistema foi hermeticamente fechado e, depois de algum tempo,

as composições das fases líquida e gasosa foram aquelas apresentadas na Figura 2.

Figura 2: Equilíbrio líquido/vapor para etano e heptano.

Como explicar a ausência de variação na composição, se há diferença de concentração e

o sistema está fechado?

Referências bibliográficas

BIRD, R. B., STEWART, W. E., LIGHTFOOT, E. N., Transport phenomena, John

Wiley & Sons, Boca Raton, FL (1960).

HINES, A. L., MADDOX, R. N., Mass Transfer – Fundamentals and Applications,

New Jersey: Prentice-Hall, (1985).