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1 UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE Governança Corporativa Desde a origem do capitalismo até os dias de hoje Leonardo Targino Marques Prado Orientadora: Luciana Chaves Madeira Rio de Janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

Governança Corporativa

Desde a origem do capitalismo até os dias de hoje

Leonardo Targino Marques Prado

Orientadora: Luciana Chaves Madeira

Rio de Janeiro

2011

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

Governança Corporativa

Desde a origem do capitalismo até os dias de hoje

Apresentação de monografia à Universidade Cândido

Mendes como condição prévia para conclusão do Curso de

Pós-Graduação “Lato Sensu” em Finanças e Gestão

Corporativa.

Por Leonardo Targino Marques Prado

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Metodologia

O método utilizado nesse trabalho foi pesquisa bibliográfica através de livros

selecionados com o tema, monografias apresentadas e sítios da internet das

principais instituições envolvidas com esse assunto e tema Governança

Corporativa.

Após leitura e reflexões foram abordados diversos assuntos que consideramos

relevantes para a confecção do trabalho.

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Sumário

Introdução...........................................................................................................6

Capítulo I – A Formação do Sistema Capitalista................................................8

1. Formação do Sistema Capitalista.......................................................8

1.1 Definindo o Sistema Capitalista..........................................8

2. Fatores Importantes da Evolução Capitalista.....................................10

1.2.1 A Ética Calvinista..............................................................10

1.2.2 Doutrina Liberal...................................................................11

1.2.3 Revolução Industrial e Desenvolvimento

Tecnológico..................................................................................11

1.2.4 Ascensão do capital como fator de produção....................11

1.2.5 O Sistema de Sociedade Anônima....................................12

1.2.6 Desenvolvimento da Ciência da Administração................13

1.2.7 O Crescimento das Corporações e o Divórcio Propriedade-

Gestão...............................................................................14

Capítulo II - Governança Corporativa

2.1 O Nascimento e Origem....................................................................18

2.2 Conceito de Governança Corporativa...............................................21

2.2.1 Análise Shareholders x StakeholdersDDDD...................23

2.2.2 Construção das Duas Abordagens.....................................24

2.2.3 Princípios e Valores............................................................25

2.3 Códigos de Melhores Práticas de Governança Corporativa.............26

5

Capítulo III – Governança Corporativa No Brasil

3.1 Transformações Brasileiras.............................................................30

3.2 Código das melhores práticas.........................................................31

3.3. Níveis de Governança Corporativa na Bovespa............................32

3.4 Condições Determinantes do Modelo Brasileiro.............................37

Conclusão.........................................................................................................39

Bibliografia........................................................................................................41

Folha de Avaliação...........................................................................................43

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Introdução

Esse trabalho tem o objetivo de apresentar que uma boa governança

corporativa não é um modismo passageiro ou um efeito de uma idéia de

negócio conjuntural, isto é, uma boa governança corporativa para as

corporações significa recuperar ou garantir credibilidade e assegurar aos seus

acionistas uma análise confiável para uma boa tomada de decisão de

investimento.

O estudo abordou inicialmente uma análise da formação do capitalismo como

observado hoje em dia, pois desta forma é possível entender como as

evoluções sociais, as evoluções nos negócios e as transformações históricas

formaram a matéria-prima para os pensamentos e comportamentos

corporativos de hoje em dia.

Logo depois no capítulo 2 serão também apresentadas as razões das

diferenças no emprego das práticas de Governança Corporativa pelo mundo

gerado pelas estruturas e culturas das sociedades nas quais foram

empregadas, assim como as diferenças de abordagem existentes.

O capítulo 3 irá considerar a importância do estudo da Governança Corporativa

no Brasil, a fim de verificar sua relevância ou apenas mostrar que as mudanças

de comportamento no mundo corporativo foram iniciadas pelos processos de

globalização, privatização e desregulamentação da economia, que exigiram

das empresas a modernização de sua alta gestão.

7Esta modernização baseou-se nos Princípios de Boa Governança que foram

então elaboradas a fim de reger esses novos comportamentos, dos quais

podemos citar: transparência, equidade, prestação de contas e

responsabilidade corporativa.

E por fim, tenta-se mostrar os pilares e princípios que regem a boa governança

corporativa juntamente com suas melhores práticas a fim de observar suas

influências no mercado e na sociedade brasileira.

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Capítulo I – A Formação do Sistema Capitalista

1. Formação do Sistema Capitalista

O propósito central deste capítulo é o de analisar as raízes históricas do

sistema capitalista e as bases sobre as quais o mundo corporativo se

constituiu. As mudanças que ocorreram ao longo do tempo nos fatores de

produção, nas diferentes fases de desenvolvimento do capitalismo e nas

alterações de estrutura de poder.

Este apanhado histórico é considerado relevante, no sentido de mostrar a

evolução dos acontecimentos que embasaram o desenvolvimento capitalista ao

longo dos anos e que sedimentou a formação do mundo corporativo como

vemos nos dias atuais, além de ser em última análise a origem do que se

convencionou a chamar de nascimento da governança corporativa.

1.1 Definindo o Sistema Capitalista

Pode-se entender por capitalismo baseado na análise de Rosseti (2005) o

emprego do fator capital no processo produtivo, associado à economia de

trocas e à busca dos benefícios privados decorrentes deste mecanismo. A

partir desta definição, encontramos três visões históricas que procuram

entender esta dinâmica: a idealista, de Werner Sombart, a racionalista, de Max

Weber, e a crítica, de Karl Marx.

Estas três concepções não conflitam entre si, apenas abordam óticas sob

ângulos diferentes de percepção capitalista. Na concepção idealista de

9Sombart, a essência do sistema capitalista está no espírito que movimenta os

empreendimentos econômicos, isto é, é o espírito de aventura, de expansão e

de acumulação a motivação principal para os empreendedores produzirem

mais do que suas necessidades básicas.

Por outro lado, a concepção racionalista de Weber descreve que o

comportamento dos empreendedores é regido pela busca do lucro, de forma

sistemática e racional. O lucro privado é o prêmio pela ousadia, pela inovação

e pelos riscos inerentes á criação de novos produtos, que mudam os hábitos

individuais e sociais, promovem o crescimento dos mercados e ampliam as

aspirações humanas e os padrões de desenvolvimento das nações.

Por fim temos a concepção crítica de Karl Marx que não contrapõe as outras

visões. Sua crítica se baseia na forma como se cristalizaram as forças

produtivas e as relações sociais delas decorrentes. A observação de Marx

considerou que a concentração dos meios de produção nas mãos de uma nova

classe social produziu acumulação de retornos, concentração de propriedade e

transferência de poder dos proprietários de terra para os detentores do capital

em detrimento da força de trabalho.

Todas estas expressões históricas são aprovadas , como bem afirma Rosseti

(2005), pela reforma calvinista do século XVI, que amadureceu com as

transformações políticas e sociais do liberalismo econômico, conjugadas com

as rupturas nos modos de produção que vieram com a Revolução Industrial

dos séculos XVIII e XIX. A partir de então, ocorreram mudanças na

organização da produção e nos mecanismos de financiamento de sua

expansão. Mudanças estas, que provocaram o surgimento de outras formas

mais complexas de relacionamento dos agentes econômicos, de novas idéias

políticas, de novos processos produtivos e do desenvolvimento de novas

indústrias, novos mercados e novos produtos.

10

1.2 Fatores Importantes da Evolução Capitalista

Para que estas mudanças pudessem ocorrer na sociedade e na estrutura de

produção, alguns fatores importantes precisavam surgir como determinantes na

evolução do capitalismo a fim de influenciar o sistema produtivo e a evolução

das grandes corporações. Iremos reproduzir algumas afirmações de Rosseti

(2005) na seqüência histórica em que apareceram:

• Aprovação da ética calvinista.

• A doutrina liberal, enquanto revolução política e econômica.

• A Revolução Industrial e o desenvolvimento tecnológico.

• Ascensão do capital como fator de produção.

• O Sistema de Sociedade Anônima

• O desenvolvimento da ciência da administração.

• O crescimento das corporações e o divórcio propriedade-gestão.

1.2.1 A Ética Calvinista

Como bem observa Rosseti (2005) a reforma do pensamento calvinista

promovia a conciliação da diligência empreendedora com a vida espiritual,

tratando o trabalho produtivo e a virtude como sinônimos e a energia

empresarial como uma inviolável e sagrada determinação divina.

Segundo Robert L. Heilbroner em seu livro The making of economic life, ”os

calvinistas conclamavam os crentes a uma vida de retidão, de austeridade

e, com ênfase equivalentes, de trabalho e de diligência. Em contraste com

os teólogos da ortodoxia cristã, os calvinistas santificavam e aprovavam o

11esforço humano como espécie de indicador de valor espiritual. De fato,

valorizou-se entre os seguidores de Calvino a idealização dos homens

vocacionados para o empreendimento produtivo e dedicados religiosamente

ao seu trabalho”.

Segundo esta lógica, Rosseti (2005) conclui que a sociedade mercantil

começou a conflitar com a reprovação da prosperidade material e com as

restrições religiosas à acumulação de fortunas terrenas elaboradas na

Idade Média. Encontrou-se na ética calvinista a aprovação teológica da

busca pela riqueza, com o bom uso da acumulação e o emprego dos

excedentes em investimentos que promovessem mais progresso. Criou-se

então uma nova atmosférica religiosa, cuja influência é difícil de ser medida,

mas que certamente foi um estímulo favorável para a evolução da economia

capitalista de mercado.

1.2.2 Doutrina Liberal

Rosseti (2005) continua afirmando que outra impulsão forte à economia

capitalista foi dada pela corrente clássica do pensamento liberal, que se

desenvolveu a partir da segunda metade do século XVIII. A revolução liberal

elaborou as bases conceituais de um novo modo de organização das forças

produtivas. Até então prevaleciam formas autocráticas de articulação da

ordem econômica, onde a vida econômica e as iniciativas empresariais

subordinavam-se ao “olho regulador” de uma autoridade centralista e

regulamentarista, que estabelecia regulamentações detalhadas para as

corporações de ofícios, para a produção agrícola e manufatureira, para o

comércio e para as finanças.

Este padrão feudal e senhorial foi posto em cheque por uma rebelião de

novas idéias, historicamente coincidente com a Revolução Industrial, com a

Guerra da Independência nos Estados Unidos e com a Revolução

12Francesa. Tais idéias tinham como base a redução e as funções do estado

assim como a ascensão da importância da propriedade privada dos meios

de produção da liberdade de empreendimento e livre concorrência. Os

mecanismos de mercado guiariam o processo econômico como um todo.

Um dos marcos das correntes que revolucionaram as bases de sustentação

da vida econômica foi à publicação da “mão invisível” em The wealth of

nations, de Adam Smith.

No plano econômico, as concepções de Smith e de outros pensadores

liberais deram suporte doutrinário para a construção das condições

institucionais do sistema capitalista. Com as revoluções liberais do século

XVII, as dimensões e as funções do estado foram reduzidas, enquanto a

propriedade privada dos meios de produção, a liberdade de

empreendimento e a livre concorrência foram alçadas à condição de

princípios essenciais da ordem econômica.

1.2.3 Revolução Industrial e Desenvolvimento Tecnológico

A Revolução Industrial dos séculos XVIII e XIX estabeleceu as bases

tecnológicas do desenvolvimento do sistema capitalista. A nova estrutura

industrial, iniciada na Inglaterra, levou não apenas a mudanças substanciais

nos modos de produção, como a novas relações entre os agentes

econômicos, empreendedores, trabalhadores e governos. Ao juntar o

pensamento liberal e a Revolução Industrial os fundamentos da vida em

sociedade foram transformados, alterando as formas e escalas de

produção, a divisão do trabalho e o modelo de suprimento tradicional das

necessidades humanas. Ainda Rosseti (2005), combinadas as

circunstâncias históricas em que se desenvolveu a doutrina liberal e em que

se deu a Revolução Industrial proporcionaram condições favoráveis para o

florescimento da sociedade capitalista. Surgiu um incipiente setor

13siderúrgico difundindo o vapor como força-motriz, substituiu as corporações

de ofícios pela manufatura fabril, aumentou a produtividade do trabalho,

surgiram novos produtos finais e novas exigências de implantação de infra-

estrutura cujo objetivo era a interligação dos mercados internos com o

comércio internacional.

1.2.4 Ascensão do capital como fator de produção

A Revolução Industrial subordinou a produção ao processo de acumulação

de capital. Antes dela, a terra era o fator dominante e a sua propriedade era

fonte de poder, de estima e de posição militar, assegurando ao proprietário

uma posição eminente em sua comunidade.

Porém com advento da economia fabril, baseada no uso crescente de

equipamentos mecanizados, condenou ao desaparecimento o modo

tradicional de produção. A indústria movida pelos novos bens de capital

aumentou significativamente sua participação na formação da riqueza. A

descoberta e o desenvolvimento de novas tecnologias de produção

expandiram as oportunidades para o emprego do capital.

Emergiu então uma nova classe dominante composta de produtores de

bens de capital, de proprietários de grandes manufaturas e pelos

empreendedores dos novos sistemas portuários e do setor ferroviário. Esta

nova classe possuidora de características empreendedoras produziu

impactos sociais, econômicos e institucionais que mudaram toda a estrutura

produtiva. Podemos citar como exemplo o aparecimento e expansão dos

trabalhadores assalariados, o aumento da produtividade, economias de

escala que produziram redução dos custos médios, compressão dos preços

e a criação de mercados de massa, supridos por produção em série de

produtos e talvez a mais relevante que é a regulação das relações

14econômicas, do direito de propriedade, da concentração do poder

econômico e das condições de formação das sociedades anônimas.

1.2.5 O Sistema de Sociedade Anônima

Seguindo um curso histórico paralelo ao da ascensão do capital, surgiu e se

institucionalizou o sistema de sociedade anônima, de incorporação

acionária ou de capitalismo de propriedade coletiva.

Rosseti (2005) afirma ainda que na Idade Média existiam as instituições

chamadas de corporações de artes e ofícios que exerciam a função de

centros de convergência da atividade artesanal e manufatureira, atuando

como unidades coletivas de negócios. Regulavam a atividade produtiva,

fixavam preços, estabeleciam deveres e direitos, buscavam a preservação

da ordem econômica e garantiam a perenidade das artes e ofícios úteis à

sobrevivência e à melhoria de vida. Funcionavam como unidades de

controle da divisão do trabalho e eram os pilares do comportamento social,

promovendo a dedicação ao trabalho e a regularidade dos suprimentos. As

corporações de artes e ofícios e as companhias de comércio são as raízes

remotas do sistema de sociedade anônima por atuarem de forma a unir

recursos, desenvolver os mercados, promover a acumulação e distribuir

resultados.

Para que houvesse uma maior disciplina das sociedades por ações fora

necessárias o surgimento de um agente que fosse capaz de possuir um

olhar para a mobilização de recursos, tanto de alavancagem financeira,

quanto de participação acionária com notório talento para a geração de

lucros. Como condutores das atividades, eram dotados de um impulso para

o êxito nos negócios e para as oportunidades de acumular fortunas. Assim

15foi Rockfeller, no petróleo: Armour e Swift, nos alimentos industrializados e

Huntigton, nas ferrovias.

Esta instituição penetrou em todos os setores produtivos, desenvolveu-se e

tornou-se totalmente dominante, ao ponto de se tornar um dos mais

importantes instrumentos de organização social da propriedade. Teve o seu

nascedouro na França em 1807 pela publicação do Código Comercial,

seguido pela Inglaterra em 1811, EUA em 1837 chegando ao Brasil em

1891.

As sociedades anônimas romperam com as antigas relações de

propriedade e de poder. A direção dos empreendimentos constituídos por

este instituto passou a ser confiada a empresários que, na construção de

seus impérios, captaram recursos de investidores de todos os portes.

Desaparecia assim o controle absoluto, derivado da plena concentração da

propriedade.

Por fim, Rosseti (2005) conclui que esta nova estrutura suscitou novos

mecanismos que assegurassem a segurança patrimonial dos investidores e

que regulassem a crescente assimetria entre a riqueza própria dos

empresários aplicada nos negócios e as captadas no mercado de capitais.

1.2.6 Desenvolvimento da Ciência da Administração

A eclosão do espírito de empreendimento, as revoluções que moldaram as

instituições do sistema capitalista e a formação histórica do mundo

corporativo tiveram o respaldo de outro fator de alta importância que é o

desenvolvimento da ciência da administração.

16Impulsionado pelo gigantismo das corporações, o surgimento da escola

clássica de administração foi uma resposta aos desafios que os grandes

negócios passaram a impor aos métodos de gestão. Nas duas primeiras

décadas do século, com Taylor, enfatizaram-se métodos que se

traduzissem em maios eficiência, com Fayol, buscou-se separar as funções

administrativas e departamentalizar a gestão das grandes companhias.

Estabeleceram-se assim as bases das estruturas burocráticas sobre as

quais se ergueu e se agigantou o sistema corporativo, dando á ele suporte

organizacional.

Ao longo do processo histórico da administração as forças de gestão do

mundo corporativo mudaram, assim como os beneficiários de seus

resultados. Ao mesmo tempo em que evoluíram as concepções, as

abordagens e os instrumentos de gestão, modificou-se também a estrutura

de poder. Começou chamar a atenção uma das mais impactantes

mudanças do sistema capitalista e do mundo corporativo: a separação entre

a propriedade e a gestão.

Evidenciou-se segundo Rosseti (2005) um novo fator de poder dentro das

corporações exercido pelos gestores e não mais pelos proprietários ou

fundadores do negócio. Os conflitos e os custos desta nova estrutura

empresarial impulsionaram os acionistas a participar mais ativamente da

gestão por meio de conselhos que representassem os seus interesses.

Nascia assim, a governança corporativa.

1.2.7 O Crescimento das Corporações e o Divórcio

Propriedade-Gestão

Rosseti (2005) diz que a partir da Revolução Industrial e notadamente no

século XX o mundo corporativo teve índices de crescimento expressivos ao

17longo da história. Avanços tecnológicos, inovações, expansão demográfica,

produção em série e economia de escala, evolução do mercado de capitais,

investimentos públicos, globalização fusão e aquisições e proliferação de

pequenas empresas, são alguns dos motivos que proporcionaram este

crescimento.

As dimensões do mundo corporativo alcançaram o mundo inteiro, ao ponto

de no século XX as 500 maiores empresas do mundo apresentar valores de

receitas operacionais e de lucro tão expressivos quanto de alguns países.

Em 2004, o total das receitas das 500 maiores corporações mundiais

(US$16,8 trilhões) foi 43% superior ao PNB da maior economia mundial, a

dos EUA (US$11,7 trilhões).

Tamanho crescimento implica em mudanças nas estruturas de poder. O

agigantamento das corporações proporcionou a abertura de capital de

empresas fechadas nas bolsas de valores, atraindo investidores para o

mercado de capitais e o conseqüente fracionamento da propriedade das

companhias, ao mesmo tempo em que ocorrem os processos de fusão que

ampliam o número de acionistas, mas reduz a participação no capital total.

A dispersão do número de acionistas e a pulverização da propriedade

também trouxe em sua esteira profundas mudanças nas companhias.

Talvez a mais significativa seja a administração se desligando da

propriedade alterando a estrutura de poder. Os fundadores proprietários

foram substituídos por executivos contratados que tinham a missão de

exercer a gestão e determinar os rumos da empresa. Os objetivos que

antes eram de maximização do lucro aos poucos perde importância dando

lugar à segurança da operação e ao controle adequado dos riscos.

A partir de então, várias inadequações e conflitos de interesses passaram a

ser observados no interior das companhias. Conflitos decorrentes do

choque de interesses entre os agentes principais das corporações, seus

acionistas, e os agentes condutores das operações, os executivos-chefes.

18Esses conflitos denominados na literatura de conflitos de agência são as

razões fundamentais do despertar da governança corporativa.

Ocorreram várias razões para o despertar e para os avanços da

governança corporativa nos últimos anos. As transformações pelas quais

passaram as economias de todo o mundo estão entre elas. Como a

governança nasceu no mundo ocidental, são particularmente fortes os seus

vínculos com as transformações pelas quais passou o sistema capitalista,

ao longo de sua formação histórica. Vem daí o interesse em tratarmos da

formação do sistema capitalista e das razões pelas quais a governança

corporativa se estabeleceu através de sua evolução.

A partir desta exposição histórica da evolução capitalista e do mundo

corporativo, podemos entender melhor, a partir das análises de Rosseti

(2005), as origens da governança corporativa. Abordaremos no próximo

capítulo os conflitos de agência e as novas condições que se

estabeleceram no mundo dos negócios que exigiram mudanças nas

práticas de alta gestão.

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Capítulo II - Governança Corporativa

II. 1 O Nascimento e Origem

Os conflitos de agências são as razões fundamentais do nascimento da

governança corporativa. Seja pela busca de minimizar os efeitos da vantagem

dos gestores na direção empresarial pela dispersão e ausência de participação

dos acionistas, ou por atitudes oportunistas de acionistas majoritários em

detrimentos dos direitos dos minoritários. Porém, as melhores práticas de

governança foram incentivadas também por alterações ocorridas nos últimos

anos dentro e fora das corporações.

Pelo lado de dentro, além dos conflitos de agência surgiram demandas de

mudanças nas práticas de alta gestão. Os modos de atuação da direção

executiva tinham se tornado um problema que prejudicava os interesses dos

proprietários. Claramente os autobenefícios concedidos pelos executivos-

chefes como o pagamento de remunerações e bônus exagerados, foram

aspectos conflitantes com a geração de valor para os acionistas.

“Conforme observa M. A”. “Hitt (2001) “em uma curiosa comparação:” Em

1999, a remuneração média total dos CEOs norte-americanos era um pouco

inferior a US$ 10 milhões anuais, aproximadamente 12 a 13 vezes o seu peso

médio em ouro”.

Outro ponto de descontentamento dos acionistas se refere ao âmbito de

caráter dos ocupantes de cargos de alta gestão. Surgiram vícios de

manipulações contábeis para forjar resultados e esses acontecimentos

passaram a ocorrer em larga escala, apesar das exigências por sistemas mais

sofisticados de auditoria independentes.

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Para José Paschoal Rosseti (2006), “as pressões por melhores práticas de

governança que passaram a ser exigidas pelos acionistas visaram corrigir

esses desvios de conduta e as deficiências gerenciais de toda espécie. Na

origem dos primeiros códigos de boa governança encontram-se, assim,

reações de grupos de interesse organizados, de fundos de private eqüity ou de

investidores institucionais que se rebelaram contra as práticas viciosas que ao

longo dos anos, com o divórcio da propriedade-gestão e com a supremacia

questionável de majoritários, cristalizaram-se nas corporações”.

Razões Externas e Outras Razões Adicionais

Os desafios internos das corporações não foram os únicos geradores de

mudanças no mundo corporativos. Somaram-se a ele outras razões históricas

que têm conduzido a governança corporativa a uma posição de relevância.

Essas novas razões estão interligadas, isto é, elas influenciam-se mutuamente

e influenciam os ambientes em seu entorno.

Razões Externas

Certamente a mudança que gerou o maior impacto foi, segundo Rossetti (2006,

pág.95), “o processo de desfronteirização de mercados reais e financeiros e a

conseqüente constituição de blocos econômicos”. As integrações de mercados

na esfera global impulsionaram fortes impactos nas estratégias corporativas. A

competição tornou-se acirrada e a produtividade foi estimulada. A privatização

encerrou um longo ciclo de estatização e de monopólio, abrindo novas

oportunidades de negócios.

21

Como conseqüência, as mudanças no ambiente político-econômico ampliaram

os fluxos de comércio e os financeiros. Os movimentos internacionais de

capitais promoveram a entrada de investidores estrangeiros em todos os

mercados e em contrapartidas intensificaram as exigências de padrões

diferenciados de governança corporativa.

O aumento dos fluxos de comércio/financeiro promoveu complexidades no

ambiente dos negócios tornando-os mais incertos e sujeitos a turbulências

externas. Ao observar esta nova dinâmica os investidores institucionais

tornaram-se mais ativos. Como Brancato (1966) registra, “quando os

investidores institucionais, tanto nos Estados Unidos quanto no Reino Unido,

começaram a investir em outros mercados de capitais, eles se tornaram cada

vez mais interessados nas práticas de governança corporativa adotadas em

outros países”.

Razões Adicionais

Adicionam-se a estas razões externas outras de âmbito interno que têm levado

a transformações estruturais no ambiente corporativo. No âmbito societário as

sucessões promoveram mudanças no controle acionário. Tais mudanças

levaram ao realinhamento estratégico em face ao ambiente de maior

competitividade, a abertura de maiores mercados e de alterações impostas

pelas fusões e aquisições. Com estes reordenamentos, a gestão se tornou

mais profissionalizante focada na administração do negócio e em resultados.

Como dito anteriormente, estas razões são interligadas e interagem entre si.

Através desta interação surge a necessidade de assimilar e internalizar boas

práticas de governança corporativa a fim de definir estratégias de boa

qualidade para a empresa, para os acionistas e gestores.

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II. 2 Conceito de Governança Corporativa

A discussão sobre governança corporativa surge para superar o chamado

conflito de agência de agência, que é o resultado da separação entre a

propriedade e a gestão das companhias. Esta discussão vai propor um

conjunto de procedimentos, regulamentos e leis que permitam aos

investidores/acionistas ter um melhor acompanhamento das administrações em

que seus recursos foram alocados.

Como área de estudo a governança corporativa inclui conhecimentos de

finanças, economia e direito e seu estudo ganha relevância para controladores

e gestores, ao ponto de Rappaport (1998, pg.1) dizer: “avaliar a empresa como

intuito de gerenciá-la com base na evolução do seu valor é preocupação atual

de praticamente todos os principais executivos, fazendo com que nos próximos

anos a criação de valor para o acionista provavelmente se torne o padrão

global para mensuração do desempenho do negócio”.

Desta forma, governança corporativa é o sistema pelo qual as sociedades são

dirigidas e monitoradas envolvendo todos os relacionamentos corporativos,

tendo como objetivo principal aumentar o valor da sociedade, facilitar seu

acesso ao capital e contribuir para a perenidade do negócio.

Na doutrina existem diversas definições a respeito do conceito de governança

corporativa. As principais são:

Shleifer e Vishny (1997): ”governança corporativa lida com as maneiras pelas

quais os fornecedores de recursos garantem que obterão para si o retorno

sobre seu investimento”.

23La Porta (2000): ”governança corporativa é o conjunto de mecanismos que

protegem os investidores externos da expropriação pelos internos (gestores e

acionistas controladores)”.

Millstein (1998): “governança corporativa compreende a estrutura de

relacionamentos e correspondentes responsabilidades de acionistas,

conselheiros e executivos, definidas estas da melhor maneira, de modo a

encorajar as empresas a terem o desempenho econômico como objetivo

principal”.

No Brasil, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, IBGC, apresenta a

seguinte definição: “Governança Corporativa é o sistema pelo qual as

organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os

relacionamentos entre proprietários, conselho de administração, diretoria e

órgãos de controle. As boas práticas de governança corporativa convertem

princípios em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade

de preservar e otimizar o valor da organização, facilitando seu acesso ao

capital e contribuindo para a sua longevidade.”

Já para a Comissão de Valores Mobiliários, CVM: Governança corporativa é o

conjunto de práticas que tem por finalidade otimizar o desempenho de uma

companhia ao proteger todas as partes interessadas, tais como investidores,

empregados e credores, facilitando o acesso ao capital. “A análise das práticas

de governança corporativa aplicada ao mercado de capitais envolve,

principalmente: transparência, eqüidade de tratamento dos acionistas e

prestação de contas”.

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II.2.1 Análise Shareholders x Stakeholders

Ao chegar neste ponto, é importante ressaltar que estas definições levam em

consideração apenas os interesses do grupo de sócios das empresas, ou em

outras palavras o modelo shareholder (acionista), que vigora principalmente

nos Estados Unidos e Reino unido.

Este tipo de modelo tem por fundamento a constituição de maximização do

valor da empresa ou de seu retorno a fim de que haja um estímulo para novos

empreendimentos e que de alguma forma compense os riscos de montar

negócios inovadores, ou de criar novos produtos.

De acordo com Lazonick (2002) a abordagem shareholders é baseada em

princípios que conduzem os gestores a adotarem medidas de desempenho que

levem em consideração o retorno do capital investido. O sistema de gestão é

centrado na geração de valor para os proprietários e os parâmetros de

desempenho são claramente definidos.

Outro tipo de abordagem inclui grupos sociais que também têm interesse na

preservação da companhia e que são igualmente afetados pelas decisões

tomadas por seus administradores. Esta outra visão teve usa origem em países

da Europa Ocidental, notadamente Alemanha e Japão, e aborda os interesses

de credores, fornecedores, trabalhadores, consumidores e a comunidade em

geral, chamado de modelo stakeholders.

Sobre este ponto de vista o lucro não é a única categoria de retorno

maximizável. Outras formas de retorno são igualmente importantes para dar

sustentação a sobrevivência, crescimento e continuidade das companhias.

25Donaldson (1995) define desta forma: A abordagem stakeholders busca

“conciliar múltiplos objetivos, satisfazendo a todas as pessoas, grupos ou

instituições com interesses legítimos em jogo nas empresas”

Certamente valorizar o capital humano é um exemplo. Fornecer benefícios

materiais e imateriais além do salário constitui como construção de riqueza

para uma categoria que possui seus objetivos, mas que, no entanto, estes

estão interligados ao desempenho do negócio.

II. 2.2 Construção das Duas Abordagens

As duas abordagens expostas não são mutuamente excludentes, porém sua

ocorrência é fortemente influenciada por fatores culturais e institucionais que

diferem entre os países. Babic (2003) registra que as abordagens e os modelos

de governança corporativa efetivamente praticada nas diferentes partes do

mundo são decorrentes de condições históricas, culturais e institucionais. São

também decorrentes da formação econômica dos países, com destaque para

as relacionadas à construção e maturação de seu sistema financeiro e de seu

mercado de capitais que somadas com a cultura empresarial e as instituições

legais, geram a forma de propriedade e de financiamento das empresas.

A abordagem shareholders é utilizada com maior ênfase nos países onde os

valores do capitalismo e as evoluções do mundo corporativo foram mais

determinantes. Por isso, os modelos de governança corporativa que se

desenvolveram nos Estados Unidos e no Reino Unido enfatizaram a proteção

aos acionistas contra o oportunismo dos gestores.

“Como observa Rossetti (2006),” nesses modelos, a forma predominante de

alavacagem de recursos é via equity e o mercado de capitais é o supridor

26número um dos recursos das grandes corporações. “Exercitam-se, então,

procedimentos que facultem aos acionistas dispersos o controle externo das

companhias, assegurando a eles direitos de voto e acompanhamento ativo dos

atos dos administradores”.

Nestes modelos, os conselhos de administração e outros órgãos de

governança são constituídos de modo a possuírem critérios mais rigorosos e

sua eficácia acompanhada. Os conselheiros são estimulados a participarem de

forma ativa no cotidiano das empresas. Formulam estratégias e acompanham a

o exercício da diretoria executiva.

Por outro lado, na Alemanha e Japão os modelos de governança permitem na

constituição de seus conselhos a presença de instituições financeiras e

representantes dos empregados que representam outros interesses além da

maximização de lucro.

Ainda com Rossetti (2006), “nestes países o sistema bancário é o supridor de

recursos. A alavancagem é construída por exigíveis (debt) e as ações não tem

a mesma liquidez. Portanto, os acionistas minoritários têm participação limitada

nos conselhos e a preocupação com sua proteção tende a ser menos

enfatizada”.

II. 2.3 Princípios e Valores

Segundo Rossetti (2006), “partindo de uma concepção que define sua

abrangência, a governança corporativa é um conjunto de princípios, propósitos,

processos e práticas que rege o sistema de poder e os mecanismos de

gestão”. Desta forma, os princípios e valores têm muita importância, pois são

eles que dão sustentação às aplicações e práticas de governança. São eles:

27

• Equidade no tratamento dos acionistas. Respeitos aos direitos dos

minoritários, tanto no aumento da riqueza corporativa, quanto nos

resultados das operações, quanto na presença ativa em assembléias

gerais.

• Transparência das informações, especialmente das de alta relevância,

que impactam os negócios e que envolvem resultados, oportunidades e

riscos.

• Prestação de contas, fundamentada nas melhores práticas contábeis e

de auditoria.

• Conformidades no cumprimento de normas regulatórias, expressas nos

estatutos sociais e nos regimes internos.

Mais do que conceitos, esses princípios e valores precisam estar nos códigos

de boas práticas, estabelecendo critérios fundamentados na conduta ética para

permear o exercício das funções e das responsabilidades dos órgãos que

exerçam a governança.

II. 2.3 Códigos de Melhores Práticas de Governança

Corporativa

Baseado nestes princípios e valores somados com a evolução natural da

governança corporativa surgiu nos países com mercado de capitais mais

desenvolvidos, os “Códigos de Melhores Práticas de Governança Corporativa”.

O primeiro desses códigos surgiu no Reino Unido em 1992 por iniciativa da

Bolsa de Valores de Londres e do Instituto de Contadores Certificados que

constituiu o comitê Cadbury, (nome este dado por ter sido presidido por Adrian

Cadbury que era um antigo conselheiro do Banco da Inglaterra), que tinha o

28objetivo de enfatizar a prestação responsável de contas e valorizar a

transparência.

Deste comitê surge o Relatório Cadbury cujo foco é direcionado para a

constituição e responsabilidades dos Conselhos de Administração assim como

para uma divulgação clara e correta da remuneração dos executivos e das

avaliações de desempenho.

As práticas de governança corporativa recomendadas influenciaram a alta

gestão das empresas no Reino Unido e serviram de base para posições

semelhantes em outros países.

Porém com a adoção dos Princípios da OCDE (Organization for Economic Co-

operation and Development) divulgado pelo relatório em 1999 os conceitos

foram difundidos ao redor do mundo. Nesta esteira de alcance, não foram

apenas os 30 países membros alcançados, mas as idéias atingiram também

ONGs, e diversas sociedades civis.

Um dos maiores e mais importantes Fundos de Pensão dos EUA, a CALPERS

– Califórnia Public Employees Retirement System preparou um documento

denominado Corporate Governance Core Principles and Guidelines, com

princípios básicos e regras de governança que abordam independência,

funcionamento e avaliação dos Conselhos de Administração e remuneração de

executivos.

No Brasil os códigos de boas práticas originaram-se em uma sociedade civil, o

Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, expandido para investidores

institucionais como a PREVI (Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco

29do Brasil), permeando todo mercado pela iniciativa da Bolsa de Valores de São

Paulo e da Comissão de Valores Mobiliários.

30

Capítulo III – Governança Corporativa No Brasil

Governança Corporativa No Brasil

As sociedades corporativas brasileiras estão vivenciando um momento de

amplas e profundas transformações. De grandes oligopólios, empresas com

administração exclusivamente familiar e controle acionário concentrado,

acionistas minoritários passivos e Conselhos de Administração ausente de

decisões, estamos caminhando para uma nova estrutura marcada pela

participação de investidores institucionais, com uma maior participação e

fragmentação do controle acionário, bem como, pela ênfase dada à eficiência

econômica e transparência de gestão.

Alguns fatores figuram como os responsáveis por estas mudanças no ambiente

corporativo brasileiro. Carlos Guilherme de Paula Aguiar (2005) cita entre

outros:

• Privatizações;

• Fusões e aquisições em níveis internacionais;

• Globalização comercial e financeira;

• Necessidade de rebaixamento dos custos de capital;

• Intensificação dos investimentos dos fundos de pensão.

A partir da década de 90 a economia brasileira se abre para o mundo, e sua

visibilidade atrai investidores estrangeiros que em busca de encontrar novos

negócios aportam seus recursos em empresas nacionais.

31Os níveis de exigências e sofisticações desses investidores obrigam as

empresas a aperfeiçoarem suas políticas de divulgação de informações e de

ampliarem a transparência. Uma nova postura é adotada, na qual se busque

um tratamento equânime entre todos os acionistas a fim de assegurar proteção

aos seus direitos. E por fim, porém não menos importante, exige-se dos

agentes de governança a prestação de contas de acordo com sua

responsabilidade corporativa. Estes são alguns exemplos das reformulações

nas práticas de governança corporativa adotada no Brasil.

No entanto, não houve um motivo isolado que gerou o nascimento da

governança corporativa no Brasil, mas ao contrário, foram um conjunto de

fatores que somados formaram a força propulsora para que esta nova dinâmica

empresarial se tornasse preponderante na economia brasileira.

III. 1 Transformações Brasileiras

Rossetti (2006) enquadra conceitualmente este ambiente mostrando uma visão

em que estas forças modeladoras impactam o Brasil por diferentes formas,

mas que conjugadas se tornam agentes indutores de mudanças. Podemos citar

como exemplo as megamudanças globais, quer sejam as reformulações

geopolíticas ou as reformulações econômicas, que realinham as políticas e

estratégias das empresas brasileiras.

Outro fator importante mencionado pelo professor Rossetti situa-se no

ambiente externo da governança corporativa no Brasil. Algumas iniciativas

institucionais e governamentais foram implementadas com o objetivo de

assegurar melhoria nas práticas de governança. Destacamos os novos marcos

legais como a aprovação da Lei n° 10.303/01 que rege sobre a reforma da Lei

de Sociedade por Ações, a divulgação da “cartilha de governança corporativa”

editada em 2002 pela CVM.

32Certamente não podemos deixar de mencionar a criação do Novo Mercado e

dos Níveis 1 e 2 de governança corporativa da Bolsa de Valores de São Paulo

– Bovespa e também a criação em 1995 do Instituto Brasileiro de Conselheiro

de Administração (IBCA) cujo foco era reunir e promover a formação de

profissionais qualificados para atuarem no desenvolvimento dos negócios e na

gestão das companhias.

III. 2 Código das melhores práticas

No Brasil, o IBGC tem se dedicado a divulgar as melhores práticas de

governança corporativa, por meio do Código Brasileiro das Melhores Práticas

de Governança Corporativa. O Código é um instrumento de apoio e motivação

para a melhoria contínua das práticas de governança corporativa no país.

Segundo Nilton de Assis Costa (2007) para o IBGC, o objetivo central do

código é indicar caminhos para todos os tipos de sociedade, sejam ela por

ações de capital fechado ou aberto, limitada ou civil, visando:

• Aumentar o valor da sociedade;

• Melhora seu desempenho;

• Facilitar o seu acesso ao capital a custos mais baixos;

• Contribuir para sua perenidade.

Os princípios que regem o Código são:

Transparência: mais que a “obrigação de informar” é o desejo de disponibilizar

para as partes interessadas as informações que sejam de seu interesse e não

apenas aquelas impostas por disposições de leis ou regulamentos. A adequada

transparência resulta um clima de confiança, tanto internamente, quanto nas

relações da empresa com terceiros. Não deve restringir-se ao desempenho

33econômico-financeiro, contemplando também os demais fatores (inclusive

intangíveis) que norteiam a ação gerencial e que conduzem à criação de valor.

Equidade: caracterizam-se pelo tratamento justo de todos os sócios e demais

partes interessadas (stakeholders). Atitudes ou políticas discriminatórias, sob

qualquer pretexto, são totalmente inaceitáveis.

Prestação de contas (accountability): os agentes de governança devem

prestar contas de sua atuação, assumindo integralmente as conseqüências de

seus atos e omissões.

Responsabilidade Corporativa: os agentes de governança devem zelar pela

sustentabilidade das organizações, visando à sua longevidade, incorporando

considerações de ordem social e ambiental na definição dos negócios e

operações. Responsabilidade corporativa é uma visão mais ampla da

estratégia empresarial, contemplando todos os relacionamentos com a

comunidade em que a sociedade atua. A função social da empresa deve incluir

a criação de riquezas e de oportunidades de empregos, qualificação e

diversidade da força de trabalho, estimulando o desenvolvimento científico por

intermédio do progresso tecnológico, e melhoria da qualidade de vida por meio

de ações educativas, culturais, assistenciais e de defesa do meio ambiente.

O Código publicado pelo IBGC é dividido em seis capítulos:

Propriedade (sócios), Conselho de Administração, Gestão, Auditoria

independente, Conselho Fiscal e Conduta e Conflito de interesses. Em cada

capítulo, são tratados aspectos e ações relativas a conceitos, tomadas de

decisões, implantação de melhorias e avaliações.

III.3 Níveis de Governança Corporativa na Bovespa

No final de 2000 a Bolsa de Valores de São Paulo – Bovespa, implementou o

Novo Mercado e os Níveis Diferenciados de Governança Corporativa que são

34segmentos especiais de listagem que foram desenvolvidos com o intuito de

proporcionar uma ambiente que estimulasse o interesse dos investidores e

uma maior transparência das empresas.

A Bovespa define um conjunto de práticas e normas de condutas que ao serem

adotadas pelas empresas, administradores e controladores serão consideradas

importantes para uma maior transparência e conseqüentemente tendem a

terem boa valorização de suas ações e demais ativos emitidos pelas

companhias. A adesão aos níveis de governança não é obrigatória, e os níveis

são definidos pelo maior ou menor grau de compromisso assumido pelas

empresas.

A premissa básica dos segmentos especiais é que boas práticas de

governança corporativa têm valor para os investidores, pois os direitos

concedidos aos acionistas e a qualidade das informações prestadas reduzem

as incertezas no processo de avaliação e, conseqüentemente, o risco.

A redução do risco gera uma melhor precificação das ações que, por sua vez,

incentiva novas aberturas de capital e novas emissões fortalecendo o mercado

acionário como alternativa de financiamento para as empresas, cujas

necessidades de investimento aumentaram com a abertura da economia e a

globalização.

Segundo Rafael La Porta (1997) juntamente com outros professores da

Universidade de Havard, quanto mais rígida for à regulamentação de um país

em termos de proteção aos direitos dos acionistas, mais forte é seu mercado

acionário.

35

Companhia Nível 1

As Companhias Nível 1 se comprometem, principalmente, com melhorias na

prestação de informações ao mercado e com a dispersão acionária. Dentre as

principais destacam-se.

• Manutenção em circulação de uma parcela mínima de ações,

representando 25% do capital social da companhia.

• Realização de distribuições públicas de ações, adoção de mecanismos

que favoreçam a dispersão do capital.

• Melhoria nas informações prestadas, adicionando às Informações

Trimestrais (ITRs) disponibilizado ao público que contenham

demonstrações financeiras trimestrais entre outras: demonstrações

financeiras consolidadas e a demonstração dos fluxos de caixa.

• Apresentação de um calendário anual, do qual conste a programação

dos eventos corporativos, tais como assembléias, divulgação de

resultados etc.

Companhia Nível 2

As Companhias Nível 2 se comprometem a cumprir as regras aplicáveis ao

Nível 1 e, adicionalmente, um conjunto mais amplo de práticas de governança

relativas aos direitos societários dos acionistas minoritários. São eles:

• Conselho de Administração com mínimo de 5 (cinco) membros e

mandato unificado de até 2 (dois) anos, permitida a reeleição. No

mínimo, 20% (vinte por cento) dos membros deverão ser conselheiros

independentes.

• Extensão para todos os acionistas detentores de ações ordinárias das

mesmas condições obtidas pelos controladores quando da venda do

36controle da companhia e de, no mínimo, 80% (oitenta por cento) deste

valor para os detentores de ações preferenciais (tag along).

• Realização de uma oferta pública de aquisição de todas as ações em

circulação, no mínimo, pelo valor econômico, nas hipóteses de

fechamento do capital ou cancelamento do registro de negociação neste

Nível;

• Adesão à Câmara de Arbitragem do Mercado para resolução de conflitos

societários.

Além de presentes no Regulamento de Listagem, alguns desses compromissos

deverão ser aprovados em Assembléias Gerais e incluídos no Estatuto Social

da companhia.

Novo Mercado

O Novo Mercado foi instituído pela Bovespa com o objetivo de fortalecer o

mercado de capitais e atender aos anseios dos investidores por maior

transparência de informações com relação aos atos praticados pelos

controladores e administradores da companhia.

Trata-se de fatores determinantes para avaliação do grau de proteção do

investidor e que por isso influenciam sua percepção de risco e o custo de

capital das empresas.

O Novo Mercado é um segmento de listagem destinado à negociação de ações

emitidas por companhias que se comprometam, voluntariamente, com a

adoção de práticas de governança corporativa adicional em relação ao que é

exigido pela legislação.

37A entrada de uma companhia no Novo Mercado ocorre por meio da adesão de

um contrato que implica um conjunto de regras societárias, genericamente

chamadas de "boas práticas de governança corporativa”, mais exigente do que

as presentes na legislação brasileira. Essas regras, consolidadas no

Regulamento de Listagem do Novo Mercado, ampliam os direitos dos

acionistas, melhoram a qualidade das informações usualmente prestadas pelas

companhias, bem como a dispersão acionária e, ao determinar a resolução dos

conflitos societários por meio de uma Câmara de Arbitragem, oferecem aos

investidores a segurança de uma alternativa mais ágil e especializada.

A principal inovação do Novo Mercado, em relação à legislação, é a exigência

de que o capital social da companhia seja composto somente por ações

ordinárias. Porém, esta não é a única. Por exemplo, a companhia aberta

participante do Novo Mercado tem como obrigações adicionais:

• Extensão para todos os acionistas das mesmas condições obtidas pelos

controladores quando da venda do controle da companhia (tag along);

• Realização de uma oferta pública de aquisição de todas as ações em

circulação, no mínimo, pelo valor econômico, nas hipóteses de

fechamento do capital ou cancelamento do registro de negociação no

Novo Mercado.

Além de presentes no Regulamento de Listagem, alguns desses compromissos

deverão ser aprovados em Assembléias Gerais e incluídos no Estatuto Social

da companhia.

O sucesso da iniciativa da Bovespa pode ser observado pelo nível de adesão

das empresas ao Novo Mercado e aos Níveis 1 e 2 de Governança. O

segmento Novo Mercado tem assumido importância crescente, com empresas

aderindo as suas regras. Ao ponto que a maioria das distribuições primárias de

ações realizadas ao longo de 2004 e todos IPO´s foram feitos por companhias

38cujas ações são listadas em um dos níveis diferenciados de governança

corporativa da Bovespa.

Um estudo divulgado pela revista Capital Aberto com apoio dos dados da

Thomson Financial e da Economática comparou o múltiplo EV/Ebitda (valor da

companhia em relação a sua geração operacional de caixa) das companhias

que fizeram ofertas públicas neste ano e constatou que os investidores se

dispuseram a pagar mais por companhias listadas no Novo Mercado e no Nível

2.

Este estudo comprova o crescente compromisso das companhias brasileiras

com as boas práticas de governança corporativa assim como a disposição dos

investidores em aplicarem seus recursos nestas empresas que estiverem

enquadradas nas listagens diferenciadas de governança.

III. 4 Condições Determinantes do Modelo Brasileiro

Rosseti (2005) destaca algumas condições influenciadoras do ambiente

corporativo que foram essenciais para o surgimento e evolução da governança

corporativa no Brasil. Citaremos alguns.

Alterações no ambiente mundial

As mudanças que ocorreram no mundo tiveram sua extensão no Brasil.

Propostas de órgãos reguladores para adoção de um número crescente de

códigos de boas práticas, assim como um ativismo de investidores

institucionais, ganharam aos poucos legitimidade. A desfronteirização dos

mercados, a criação de rating corporativo e as grandes reações aos

escândalos corporativos também foram os insumos do cenário externo que

contribuíram para que as idéias de Governança influenciassem no Brasil.

39Cenário macroeconômico e condições institucionais

Certamente a estabilização da economia e o crescimento moderado geraram

oportunidade de investimentos. Com a abertura do mercado nacional os fluxos

comerciais aumentaram em escalas enormes e em sua esteira surgiram

pressões para a adoção de melhores práticas de governança, revisão dos

marcos regulatórios e diferenciação, através dos critérios de listagem em

bolsas, das empresas que adotassem boas práticas de governança

corporativa.

Condições internas nas empresas e fontes de financiamento

Por fim, o cenário corporativo brasileiro foi fortemente impactado pelas

mudanças estruturais ocorridas no mundo. Com base em experiências

internacionais as empresas receberam recomendações para alterar as suas

estruturas de propriedade tanto no âmbito de fusões e aquisições quanto na

baixa assimetria entre controle e propriedade.

Já no âmbito das fontes de financiamento havia as dificuldades em acessar os

recursos de fundos internos de longo prazo, com um mercado doméstico de

capitais pouco expressivos e um baixo índice de investimento em relação ao

PIB.

40

Conclusão

O objetivo deste trabalho foi demonstrar a importância e a atualidade do estudo

no tema governança corporativa. Considerou-se este estudo importante no

sentido de aperfeiçoar e contribuir para o desenvolvimento do mercado de

capitais em nosso país.

A adoção de boas práticas de governança serve para a empresa como um

todo, isto é, todos aqueles envolvidos em suas atividades sejam os acionistas,

credores, empregados, investidores, governo e a comunidade em que ela atue.

Foi visto que as regras de governança corporativa não estão dissociadas da

realidade das sociedades em que são aplicadas, principalmente em relação á

estrutura de propriedade das companhias. Por exemplo, em mercados como o

brasileiro, com predominância de empresas com capital concentrado e

controlador definido, os principais problemas de governança envolvem o

relacionamento entre o acionista controlador e os acionistas minoritários,

deixando para segundo plano aqueles decorrentes da separação entre

propriedade e controle entre acionistas e gestores, típicos de mercados com

predomínio de empresas com capital pulverizado.

No caso brasileiro, merece destaque as iniciativas adotadas para o

aperfeiçoamento das regras de governança corporativa, em especial as

alterações na lei das Sociedades Anônimas, introduzidas pela Lei n° 10.303/01

e a iniciativa da Bolsa de valores de São Paulo de criar o Novo Mercado, um

ambiente de negociação de ações emitidas por empresas que apresentem

boas práticas de governança corporativa.

41Como bem observou Rosseti (2005), a governança corporativa não é um

modismo a mais. Seu desenvolvimento tem raízes firmes. E sua adoção tem

fortes razões para se disseminar. Organizações multilaterais, como as Nações

Unidas e a OCDE, vêem as boas práticas de governança corporativa como

pilares da arquitetura econômica global e um dos instrumentos do

desenvolvimento, em suas três dimensões – a econômica, a social e a

ambiental.

Essas organizações multilaterais reconhecem que as boas práticas de

governança são fundamentais para o controle dos riscos dos investimentos nas

empresas abertas, especialmente os decorrentes do ambiente competitivo de

negócios em que elas operam dos processos de gestão de seus ativos físicos,

financeiros e intangíveis e dos associáveis à qualidade das informações que

orientam e que sustentam as decisões dos investidores.

Além das organizações multilaterais, as empresas também têm buscado se

aperfeiçoar na melhoria de suas práticas de governança corporativa e na

geração de valor aos acionistas. E como resposta a esse movimento, os

investidores têm reagido positivamente procurando esses papéis e dispostos a

pagar um até um preço maior em troca de uma maior transparência.

A reação positiva da sociedade mostra o amadurecimento do mercado de

capitais brasileiro e comprova que a governança corporativa não é um

modismo passageiro ou uma “onda conjuntural”, mas contrário uma orientação

de negócio com fundamentos sólidos definidos a partir de princípios éticos e

possuidor de um desenvolvimento que gera afirmações com raízes

macroeconômicas e microeconômicas que em última analise tem um único

objetivo que é aperfeiçoar os processos de gestão empresarial.

42

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44

Folha de Avaliação