CAPTULO 10

CAPTULO 10

As Tcnicas de Grupo:

da Ideologia aos Fenmenos

Ficamos espantados quando se faz referncia j imensa literatura sobre dinmica de grupo ou qualquer outra pesquisa ativa (action research) quanto vida dos pequenos grupos, quando se ouve a discusso de espe cialistas que conheceram uma formao diversa ou ainda quando se participa de experincias de grupo com obje tivos aparentemente distintos (grupos de discusso, gru pos de diagnstico, grupos de psicoterapia), mas que tm ao menos um trao comum: a confuso que constante mente se apresenta entre os fatos observados ou interpre tados e a ideologia, isto , um conjunto socialmente de terminado de valores e representaes. Confuso e impregnao to profundas, que mal se consegue perceber, mesmo fazendo-se abstrao da ideologia, o que poderia sobrar dos fatos.

Tal observao no atestaria acaso um desconheci mento das condies em que necessariamente se deve efetuar qualquer pesquisa de psicologia social? Jamais haveria uma sondagem ou observao que fossem abso lutamente desinteressadas. Toda pesquisa referente aos grupos, se for realmente uma pesquisa, isto , mais do que uma simples coleta de dados, implicaria necessaria mente uma idia de seu funcionamento, uma representao ao menos aproximada do que devem ser seus objetivos. Poderamos mesmo dizer que, sem dvida, o nico projeto de uma anlise metdica dos pequenos grupos supe uma

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idia, que funcione como conceito regulador, a respeito da sociedade global e de suas molas fundamentais.

No entanto, no se deve procurar nessas verdades gerais e confusas pretexto para qualquer avaliao como, por exemplo, pressupostos normativos sob o disfarce de uma hiptese de trabalho, ou a ideologia de um grupo social invocando a necessidade de uma conceitualizao a partir do instante em que no se deseja fixar-se num empirismo catico; se no e isso o que freqente mente ocorre acabar-se-ia por considerar como fatos cientificamente estabelecidos o que, nas condies de dependncia terica e tcnica em que se opera, apenas um artifcio: descobre-se uma prova onde o que existe apenas uma ideologia compartilhada.

Em lugar de reconhecer o risco de tal confuso ocultamo-la, repetii complacentemente que teoria e pr tica so indissolveis ou recorrendo noo de modelo, a qual tende a tornar-se uma chave-mestra para todos os problemas. Mas um autor, pouco suspeito de empirismo e que soube mostrar no apenas as vantagens, mas tambm a fecundidade dos modelos conceituais, reformulou h pouco tempo essas regras metodolgicas elementares: No tocante observao, a regra principal poder-se-ia mesmo dizer a nica que todos os fatos devem ser exatamente observados e descritos, sem permitir que os preconceitos tericos alterem sua natureza e sua impor tncia.. . Os modelos conscientes que so chamados de normas contam-se entre os mais pobres que possam existir, em virtude de sua funo, que mais perpetuar as crenas e os usos do que expor-lhes as normas.

E se essa funo das normas se exercesse no mbito daquilo que acreditamos estar apenas observando nos pe quenos grupos? E se, enquanto afirmamos apoiar-nos num sistema de definies destinado a facilitar a explorao dos fenmenos, a anlise da vida dos grupos depen desse na realidade de representaes, de valores que escapam anlise, e se oferecem como algo natural a ponto de nem sempre serem formulados? Ento daramos

1 Claude Lgvl-STRAVss, Anthropotogle structurale, p. 307.

razo crtica freqentemente lanada contra a psicologia social contempornea: se ela interessa e retm, no se-:

gundo grau, como uma expresso disfarada da sociedade em que nasce, como uma elaborao secundria que, longe de nos fornecer uma anlise vlida de um certo nvel das relaes sociais, deveria ser interpretada, por sua vez, como um dos elementos do mito social, do esforo mal sucedido de uma sociedade para representar-se a si mesma em sua totalidade.

Crtica ainda mais irritante, uma vez que as pes quisas de psicologia social se destinam, em princpio, a pr em evidncia as relaes inter-humanas vividas muito alm das representaes oficiais que as desfiguram (como qualquer um v nas grandes circunstncias, aqueles mo mentos fulgurantes da vida social). Operando sobre grupos restritos, a psicossociologia poderia revelar o aspecto vivido do social e tornando-se, em certa medida, experimental ao analisar certos determinantes sem conjeturar, o que compete sociologia geral, sobre a natureza do social. 2 Mas s poderemos dar-lhe o mrito dessa orientao, que visa a reduzir definitivamente a distncia entre o oficial e o oficioso e com isso poderia fazer-nos duvidar das imagens das relaes e das estruturas formais, se ela vier a rejeitar a crtica que lhe dirigida de artificialismo.

Essa crtica poderia ser assim formulada: os meca- nismos observados so totalmente relativos situao em cujo seio eles aparecem. Ora, essa situao artificial. Se tomarmos como exemplo o Training Group (grupo de diagnstico), que valor, diro, pode ter um diagnstico

2 No pretendemos retomar aqui as criticas feitas anlise dos grupos restritos em nome das exigncias sociolgicas. Remetemos o leitor a um artigo de F. Bourricaud, que escreve: 0 estudo do pequeno grupo sem passado, sem localizao territorial precisa, corre o risco de j no apelar seno para mecanismos psicolgicos abstratos e superficiais, de revelar os esteretipos e de deixar escapar a profundeza espacial, a espessura tem poral da realidade social. (A anlise microscpica na sociologia ameri cana contempornea, cio Cahiers internationaux de sociologie, 1952, flQ 13).

Nota-se incontestaveiniente um mau emprego da psicologia social, que consiste em reduzir a vida social psicologia. Mas nosso objetivo aqui no mais uma vez denunciar esse mau emprego. Pois, coma se observou, a mistificao no se prende ao prprio princpio de uma psicologia social. E por isso que pensamos que convm de inicio interrogar-se sobre os pressupostos ideolgicos, tericos e tcnicos das experlncias de grupo interrogao necessria e permanente para toda pesquisa em que o obser vador, com seu horizonte pessoal, poltico e social, est to manhfestamente ligado observao.

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calcado em um amlgama de pessoas reunidas por algumas horas, sem .tarefa, sem passado e sem futuro comuns, tendo como presente uma indicao mais ou menos desgastada de suas atitudes como membros de um grupo e tendo, tanto os participantes como o monitor, suas motivaes mal elucidadas? E bem verdade que sempre se pode diagnosticar, sem risco de desmentido, tal seqncia de atitudes, tal processo, tal relao dentro do grupo, prin cipalmente quando se tomam como base os conceitos que a dinmica de grupo pe nossa disposio. Mas seriam interpretaes que ficariam sempre intransferveis e per petuamente presas ao quadro de referncias que as torna possveis. A experincia ficaria fechada em si mesma, no se encontraria na chegada seno o que j estivesse na sada , a realidade ficaria definitivamente desconside rada. O fato que os que praticam tais tcnicas de grupo se parecem muitas vezes com os principiantes no jud: so eficazes diante de um adversrio complacente, mas desarmados frente a um leigo.

A crtica, apresentada nessa forma brutal, parece difcil de ser refu.tada. Mas na verdade ela encobre muitas outras crticas que no so aceitveis. Eliminemos primeiro, em sua generalidade, a acusao de artificia lismo. Se a tomarmos ao p da letra, ela tornar impossvel qualquer enfoque metdico e a fortiori qualquer anlise. Daniel Lagache demonstrou isso com um exemplo da psicanlise. E preciso acrescentar que no se saber rejeit-la sem se submeter ipso facto a um certo nmero de exigncias das quais a primeira a de jamais perder de vista aquilo que se est instituindo. O apelo lin guagem do experimentalismo no deve aqui servir de libi destinado a tranqilizar o pesquisador sobre o que ele faz. Assegurando-nos controlar as variaes, persua dimo-nos da validade cientfica de seu trabalho, mas negligenciamos todo o resto no controlado que deno

A menos que a sociedade em seu conjunto jogue o jogo, isto , coloque em uso, segundo os mesmos conceitos e as mesmas normas, as relaes que nela se desenvolvem. Isso ainda no seria suficiente para verificar os resultados da psicologia dos pequenos grupos, no mximo provaria a aspirao a uma mitologia coerente.

D. LAGACHE, Os Artifcios da Psicanlise, tudes philosophiqueS, i95 nQ 4.

minamos ideologia e que enfeixa toda a pesquisa referente aos pequenos grupos. Na realidade, no se trata de objetar: os grupos de diagnstico no existeni na na tureza, portanto, todas as concluses que se pretendem tirar estaro marcadas pela inutilidade, mas deve-se fazer a seguinte pergunta: o que se faz quando se instituem tais grupos? Depois, pode-se falar tecnicamente. Acon tece que comparamos, quanto ligao entre os modelos conceituais e a experincia, as tcnicas de grupo e a tcnica psicanaltica; que seja, mas com a condio de no esquecer que foi a experincia que imps questes a Freud, e continua a imp-las aos analistas, uma ex perincia singularmente desorientadora, aberta, proble mtica; da a diversidade de modelos, e at das metforas de Freud, cujas caractersticas de provisrio, mutvel e parcial so sempre lembradas. Depende sempre de ns se o saber um guia ou uma tela.

Primeiro, pois, haveria interesse em colocar franca mente em destaque aquilo que orientou o saber com referncia aos pequenos grupos. Nesse ponto nos limita remos a indicaes esquemticas.

Poder-se-ia primeiro distinguir, na escala macros cpica, um certo nmero de determinantes:

a) Aquelas que dependem da orientao do conjunto das cincias humanas; por exemplo, referncia ao modelo de uma biologia concebida como teoria geral das re laes entre o organismo e os meios (Canguilhem), essas so conduzidas a tomar como objeto a comunicao do homem com um contexto social especfico.

b) Razes propriamente sociolgicas: pesquisa, muito alm das instituies formais, fixas, constitudas, de rela es sociais em criao e criadoras. A, o prolongamento ideolgico manifesto, sem ser logicamente implicado:

o pequeno grupo ofereceria o exemplo, em contraste com uma organizao social impessoal e opressiva, de uma unidade plstica com um ndice de participao muito elevado; no horizonte, haveria a esperana de ver a dilui

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o dos conflitos sociais nos ajustamentos das pessoas aos pequenos grupos a que pertencem.

c) Aquela determinante que concerne evoluo da psicologia: a considerao dos fenmenos interpessoais leva o indivduo a aparecer no mais como monarca absoluto, mas como o termo de uma relao, parte de uma teia, o lugar e o momento de um processo.

d) Motivos de ordem econmica: o desenvolvimento da organizao industrial convida a que se levem em conta fatores humanos, a modificar o esprito da chefia, a reorganizar a hierarquia, a experimentar a moral das empresas, etc. Para que tais objetivos sejam alcana dos, os pequenos grupos servem a um s tempo de material de experincia e de referncia normativa.

e) Motivos propriamente ideolgicos: prevalncia da democracia ou, pelo menos, daquela concepo de demo cracia que a limita livre discusso; supondo-se uma concordncia quanto s instituies, ento s se teria por meta modificar as atitudes para facilitar a cooperao.

Manter uma discusso nesse nvel de generalizao sobre a psicologia dos pequenos grupos condenar-se a opor vrios grupos ideolgicos ou doutrinrios. E pre fervel dirigir tal discusso ao nvel das noes efetiva mente utilizadas.

Primeiro a noo de grupo. Infere-se a existncia dos fenmenos, dos efeitos de grupo, constatveis (o que no significa que tenham sido observados com preciso, muito menos que sua descrio e anlise tenham sido aprofun dadas estamos atrasados em relao etologia) frente concepo de que o grupo uma individualidade. Re A esse respeito, cf. F. Hourricaud, art. citado.

Cf. por exemplo a obra de Norman MAIER, Prncipes des relations humaines. Sobre a utilizao reacionria da psicologia social nas em presas, cf. M. CROZIER, Human Engineering, Les Temps modernes, nO 69.

Ou, em termos gestaltistas; a democracia uma boa forma:

negativamente, no que ela minimiza as tenses, positivamente, no que fornece um procedimento de Integrao e de composio aos pontos de vista dos diversos individuos, escreve F. Bourricaud, comentando a expe rlncia famosa de Lippitt e White e o mtodo chamado das Relaes Humanas tal como esse mtodo se exprime, com uma confiana desorien tadora, na obra de N. MAIER (em Cahiers InternatiOflaUX de sociologie, 19, 1955).

cordemos nossos primeiros passos, a preocupao de ouvir dizer, como dados reais, de atmosfera de grupo, de objetivos do grupo, de sua progresso, do impasse que surge, da liderana que o grupo recusa, etc. Tantas metforas poderemos dizer, que seria uma ingenuidade tom-las ao p da letra; e condenar o antropomorfismo e at o misticismo pelos quais certos autores, grupistas cuidadosos, se considerariam culpados. O fato que, de incio desorientados por essa referncia constante a um grupo como se fosse um grande fantasma, chegamos logo a encarnar esse fantasma, a reconhecer seus deslo camentos, sua consistncia, suas transformaes, e chegar o tempo ideal em que no pensaremos mais como indi vduo, mas como grupo. No entanto, teremos realmente encontrado uma dimenso nova de existncia, ter havido alguma aprendizagem ou doutrinao? No teremos con fundido a concluso com as premissas? No estar a toda a descoberta?

Digamos que essas questes no sejam o fato de um individualismo coriceo, provocado pela capacidade aparentemente ilimitada de alguns em pronunciar a pa lavra grupo. .. Tambm no se trata de opor um con ceito a outro , mas de dissipar um equvoco. A psicosso. ciologia de grupo originalmente acusa o grupo dos valores simblicos e de trabalho com os quais esse grupo estar efetivamente investido quando no funcionar como abso luto. Mas, na realidade, o que que assegura a existncia de um grupo humano? Sua funo institucional, seu lugar num universo simblico. Um conselho de administrao, antes de constituir simplesmente um grupo de homens que discutem, um conselho de administrao, isto , uma forma de instituio que se encarrega de toda uma concepo das relaes sociais, da repartio do poder,

Talvez no se tenha observado de maneira conveniente que a etimo logia da palavra faz do conceito de individuo uma negao. O individuo um ser no limite do no-ser, sendo o que no pode mais ser fragmentado sem perder suas caracteristicas prprias. E um mnimo de ser. Mas nenhum ser em si um mnimo. O individuo supe necessariamente em si sua relao com um mundo mais vasto, exige um fundo de continuidade sobre o qual sua continuidade se destaca. (O. CANGUILHEM, A Teoria Celular, em La Connalssance de la vie. A prevalncia do modelo biolgico

como norma seno como aparelho conceitual nas pesquisas sobre os pequenos grupos nos parece indiscutvel.

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do funcionamento das empresas. A psicossociologia (mas deve-se incriminar aqui menos um projeto do que atitudes mentais) teria tendncia a deixar de lado essas evidn cias e a representar o conjunto dos pequenos grupos hu manos seguindo o modelo dessas unidades provisrias formadas por indivduos ligados, por um tempo limitado, por uma tarefa ou um perigo comuns; patrulha perdida, doze homens em fria, exploradores em misso. .. Tm-se feito reparos obra de certos autores americanos, prin cipalmente por no fazerem uma distino clara, nos re gistros de suas experincias, entre grupos institudos artificialmente e grupos restritos naturais. Mas deve- se denunciar aqui menos uma falta de rigor do que um postulado: a lei de estruturao de um grupo seria ima nente a esse grupo. Ele poderia sempre achar em si mesmo (no seu tipo de liderana, nas relaes entre seus mem bros, etc.) as razes de ser de sua desfuno, e na soluo de suas tenses a condio necessria e suficiente de seu progresso. O grupo, assim considerado em sua exis tncia absoluta e no na sua dependncia do universo social, assegura as ligaes reguladoras que garantem a cooperao. Repetiremos que os grupos de diagnstico somente fazem aumentar e depurar os mecanismos subja centes vida de todos os grupos.

E tambm de admirar a variao que se efetua cons tantemente nos problemas tcnicos que, segundo critrios definidos, admitem uma nica soluo (a tarefa do lder consiste em justificar e fazer aceita uma deciso que se fundamenta e se legitima em outros critrios que no sejam o acordo dos interessados ), em outras si tuaes em que o acordo que faz o problema. Variao significativa: faz-se como se, em cada caso, os parti cipantes constitussem uma sociedade homognea e nada restasse a fazer seno dissipar os malentendidos, remo ver os obstculos num tecido social contnuo, modificar os papis fixos ou inadequados. Verdadeiramente as condies de uma comunicao integral seriam ento preenchidas e seria suficiente, para obter sua real satis

F. I3OURRICAtJD, A Democracia nos Pequenos Grupos, em Ca/,iers !nternationaux de Sociologie, 19. 1955.

fao, reduzir as barreiras imaginrias que bloqueiam, retardam e perturbam um processo natural. E por isso que h na psicossociologia a tentao permanente de conduzir a dinmica social aos acasos da vida em comum. O grupo, enquanto quadro nico de referncia, escapa por princpio a qualquer problemtica, a qualquer con-. testao.

Tambm se vem as experincias de grupo oscilar entre um scio-tecnicismo, totalmente devotado ao ajus tamento, e um biologismo edificante que no procura na histria seno uma finalidade imanente, a realizao, se gundo uma ordem de apario de comportamentos suces sivos, de um plano de desenvolvimento. A noo de grupo cujo monitor o representante manifesto opera como idia, como tarefa prtica ( nesse sentido que se pode ver no training group um grupo princeps:

fora de qualquer ordem do dia, o grupo que est na ordem do dia); ela se realizard progressivamente, impondo, entre os diferentes estmulos que se apresentam, a esco lha dos estmulos que convm s exigncias de sua realizao.

E onde ento termina a ideologia, onde comea a experincia? Como se refugiar na casa forte da tcnica, se a tcnica, em seus processos e procedimentos, suas frmulas e as formulaes de seus adeptos, comandada pela ideologia? Geralmente se salienta a variedade das tendncias (lewiniana, sociomtrica, de inspirao psica naltica, etc.) em psicossociologia dos grupos. Mas a diversidade de enfoques e de conceitos positiva somente na medida em que traduz a dificuldade que os observa dores sentem em tomar conscincia de fenmenos com plexos e embaraosos; por outro lado, ela apenas reflete as preferncias de cada um em relao a determinado instrumento mental, em relao a determinado vocabulrio.

io como no ver ai um ressurgimento, com uma maior discriminao conceltual, da concepo organicista da sociedade que J. Vuillemin assim resume: A sociedade se define pelo conjunto das foras de coeso, de estabilidade e de regulao que imprimem natureza humana o selo da organicidade, enquanto que o Individuo psicolgico torna-se o lugar das foras de dissoluo e de desregramento que se opem s primeiras e importa moralizar, socializando-as (Em LEtre et le trava!! P.U.F., 1949, p. 114).

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Ora, h uma notvel convergncia entre as diferentes tcnicas de grupo, quanto funo do grupo, quanto ao papel do monitor, quanto maneira pela qual se repre sentam os processos em questo, quanto ao benefcio que delas se espera. Alm das diferenas verbais, que tendem a se acentuar notadamente com a difuso (um dos males da nossa poca) do vocabulrio psicanaltico, a teleologia permanece a mesma.

a

Teremos certeza disso se recorrermos s concepes mais difundidas da psicoterapia de grupo, tais como as desen volvidas nas publicaes especializadas e como as temos visto aplicar no decorrer de uma experincia recente qual nos foi dado assistir. O exemplo interessante na medida em que pe em evidncia o que, em outras tcnicas de grupo, fica implcito; revela traos que, em outros casos, permanecem ocultos.

O que surpreende de incio em tais concepes a insistncia do psicoterapeuta em sempre chamar a ateno dos participantes para o grupo; o grupo, como unidade, que toma essa deciso, aborda esse tema, experimenta tal fracasso. E o grupo que est em causa com relao a tudo o que se passa aqui e agora. Tambm a clivagem entre o terapeuta ou os terapeutas e os doentes atenuada ao mximo, cada um tendo seus problemas, suas ne cessidades, de uma maneira que muitas vezes parece hipcrita ao leigo. Nada deixado de lado um sorriso benevolente, a confisso de seus prprios feelings, etc. para facilitar a integrao social em que se v a con dio da integrao pessoal, para apaziguar aquela social hunger que Slavson considera constitutiva do indi vduo humano; ao favorecer a expresso da necessidade de ser aceito pelo grupo e ao lhe dar satisfao, o que se

11 Por exemplo o In lona! Journal of Group Psychotherapy, U.S.A.

Deixemos claro com uma palavra que no fazemos aqui nenhuma aluso psicoterapia de grupo seno para liberar brevemente um horizonte ideolgico. No se trata pois de criticar-lhe o princpio, e menos ainda de apreciar-lhe os resultados.

faz segurizar, desculpabilizar os doentes. Inter rogados sobre os benefcios que obtiveram num grupo teraputico, eles insistem na atenuao de seu sentimento de isolamento e de culpabilidade, no aperfeioamento do insight de si mesmo e do prximo, na aceitao de seus problemas: Estamos todos no mesmo barco, o que dizem. O primeiro efeito da experincia de grupo seria induzir a esse sentimento.

Quanto ao terapeuta o lder um princpio de estabilidade, de consistncia, a prpria imagem da boa forma (ou do eu forte), o sinal carnal de que ali no existe uma coleo de indivduos separados e dividi dos em si mesmos, mas uma unidade j encarnada em sua pessoa. A um s tempo ele indica que um indivduo um subgrupo, logo precisa se integrar. Representa o futuro e a norma dos membros do grupo. No passa de um delegado e progressivamente ceder lugar me dida que o grupo adquirir existncia concreta e ao prprio grupo: de leader-centered, a terapia torna-se grou p-centered, e no final o terapeuta no passa de um um ego na repblica dos egos.

Determinado autor, com certa dose de coragem, fez um resumo das etapas destinadas a favorecer tal proces so. Por exemplo: mostrar simpatia pelas palavras e pelas expresses fisionmicas, utilizar os prenomes, es timular a expresso das resistncias discusso de pro blemas pessoais em situao de grupo, auxiliar o grupo a encontrar um problema em comum, favorecer as tenta tivas de liderana, etc. No detalhe das receitas que melhor se pode surpreender a inteno.

Um outro autor mas ler cem, na verdade, o mesmo que ler apenas um assim resume o papel do terapeuta: ele d ao grupo o sentimento de ser seu pro No de espantar que essa concepo alcance a mais edificante

pedagogia. Citaremos, a titulo de exemplo: A maneira pela qual o terapeuta entrenta as situaeS no grupo serve de exemplo para os pacientes. Seu aspecto calmo e sua presena segura Constituem uma demonstrao viva da tora de seu eu e de sua objetividade. S. 1 SLAVSON, A Contribution to a Systematic Theory c Group Psychotherapy (Internat. J. Group Psychotlzer., 4, n 1, 1954).

D.-W. B Description of a Project in Group Thcrapy, em Journal of Consulflng Psychology 1945. Essa lista merece ser percorrida por Inteiro e em sua lngua original.

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tetor: parafraseia o que dizem os pacientes, no chega a interpretar (.client-centered therapy de Rogers: aceitar o que diz o consulente; reexpor o que ele disse; escla recer o que ele sente); faz a integrao do grupo por meio de analogias que permitem estabelecer um elo entre as sesses; tem em mente um plano estrutural de desen volvimento do grupo (tambm sublinha as fases de seu comportamento); enfim, sua atitude mantm-se sempre flexvel e tolerante: recolhe as necessidades irreais e os sentimentos hostis dos pacientes, de modo a confront-los com sua prpria imaturidade e com o temor de uma destruio de si mesmos como indivduos. 15 A psico terapia de grupo psicoterapia pelo grupo. Primitivamente, perder a afeio social era considerado uma doena, um castigo que criava no conjunto da sociedade um dese quilbrio que o tratamento xamanstico tinha a funo de restabelecer. Aqui, no seio de um grupo restrito, mas explicitamente definido como prefigurador da sociedade real, que o paciente convidado a alcanar e a estruturar seus estados no determinados ou mal determinados. O grupo o nico agente do tratamento, o tarapeuta apenas reflete a estrutura mvel e encarna a sua finalidade.

Depois disso, releia-se a anlise feita por Freud dos fenmenos de grupo (em Massenpsychologie und !ch Analyse, Psicologia Coletiva e Anlise do Eu, 1921). Sabe-se e o nico elemento da obra a que nos refe-. riremos que Freud vai mais alm da objeo, formulada explicitamente no captulo III, segundo a qual a multido, massa artificial, provisria, inorganizada, no poderia ser tomada como amostra vlida do conjunto dos grupos hu manos. E que Freud centraliza sua anlise na sugesto em que no v, como acontecia na psicologia pr-analtica, um princpio explicativo, mas um produto; com efeito, ela resulta das ligaes libidinosas entre membros da mul tido isto , foras que garantem sua coeso que

15 c BEUKENKAMP, The Nature of Orality as Revealed in Group Psychotherapy, em lnfernat. J. Group Psychoter. (1 5, na 4.

Tambm certos autores salientam a superioridade absoluta da psico terapia de grupo sobre a individual: experincia mais heterognea, logo mais estruturante, menos de livre associao (sic), melhor da realidade, etc.

so eles prprios os efeitos da ligao de cada um com o lder. A identificao coletiva, o contgio afetivo ou o que se chamou posteriormente a reduo a si mesmo so, pois, secundrios a essa relao, que se pode isolar no relacionamento hipntico que j um grupo de dois, e onde se v o sujeito substituir seu ideal do eu por um objeto, o terapeuta.

Pode-se ver que para Freud no h nada que se compare a um instinto gregrio primitivo ou a uma social hunger que faria com que o indivduo se sentisse incompleto enquanto no pertencesse a um grupo. Segundo ele, o nervo do grupo a ligao com o lder e o sentimento coletivo resultante. Essa anlise pode ser considerada insuficiente ou surpreendente (sobretudo se concordarmos que Freud d a uma explicao psico lgica antecipada do nazismo); mas no esse o nosso objetivo. Se nos referimos a isso, porque ela pe em evidncia que uma certa forma de existncia em grupo que induz identificao coletiva. Freud apia toda sua anlise na descrio manifestamente sumria de Le Bon apenas por ver nela elaborados, de forma ntida e gritante, os efeitos de grupo quando a funo de ideal do eu encontra plena expanso (haja ou no um lder autori trio, esteja o grupo no lugar do chefe que se encontre investido dos valores positivos tudo isso apenas torna o jogo da identificao mais flexvel e manejvel). Ora, justamente no seio de tais grupos de que se pe de lado a insero na vida social efetiva e que Mauss, diri gindo-se aos psiclogos em 1924, definia como um mun do de ligaes simblicas que se exercem eminente- mente as tcnicas de grupo. No se condenam ento essas tcnicas a no surpreender nem os processos sociais, fora de seu alcanc nem as relaes interpsicolgicas que elas percebem apenas refratadas pela lei do grupo? Alm disso, j observamos, o grupo no funciona aqui como instituio, mas como formao imaginria, o que

Isso o essencial e basta para definir qualquer grupo. Dito isso, preciso, bem entendido, reconhecer estruturas de grupo especificas segundo a natureza das identificaes.

1$ Analogia ptica qual Freud recorre para definir a censura.

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apenas torna mais difcil apreciar o significado dos pro cessos que nela se desenvolvem.

Tcnica e formao so palavras essencialmente relativas que, ca,da vez mais, ouvimos empregadas de maneira absoluta, como se pudssemos imaginar para elas, como complemento, o desvendamento da verdade... Mas a isso que conduzem as experincias de grupo? Nos casos menos favorveis, experimentase o sentimento, que satis faz ou exaspera, de se iniciar na arte da manobra psico lgica; nos casos mdios, aprende-se a objetivar certos mecanismos sem a garantia de saber domin-los e de discernir certos traos com o risco de deixar escapar todos aqueles que no se enquadram nas categorias (lide rana, coeso, isolamento, etc.). Enfim e o diremos de forma deliberadamente aproximativa e no cientfica

h os grupos, na nossa opinio os melhores, em que ocorre alguma coisa, mesmo que provocada.

O equvoco real dos objetivos que devem ser os dos grupos de diagnstico (aprendizagem do trabalho em equipe, insiglit psicossociolgico, modificao do compor tamento social), significativo, talvez at encorajador.

Pois, se queremos dissip-lo e no nos limitar a justapor objetivos contraditrios ou sem nexo necessrio, seremos levados a liberar as tcnicas de grupo da ideologia que as suscitou (e a no mais reduzir o desejo de ser reco nhecido satisfao de ser aceito por um grupo), a traar os conceitos ao nvel dos fenmenos, a ver no monitor aquele que d as interpretaes e no que faz a sugesto

como necessariamente o caso quando ele se apre 1 Grupo de diagnstico. A expresso, no que oferece de condensado,

assinala uma ambigidade: em primeiro lugar, e essencialmente, trata-se de um diagnstico baseado no estado do grupo (seus conflitos manifestos ou subjacentes, suas esperanas e decepes, os motivos de sua satisfao e portanto a imagem que tem de si mesmo, suas condutas reais, sua organizao e como esta pode contradizer aquelas, etc.); mas tambm como neg-lo? mais secreto aquele, e garantindo experincia impacto em cada um, diagnstico de si mesmo, na medida em que ser testado nosso poder de iniciativa e de compreenso, apreciado o que trazemos ao grupo, como somos vistos, ouvidos e tolerados por ele.

senta, sob uma forma mais ou menos declarada, como modelo. Finalmente entenda-se que a uma experincia vlida de psicologia de grupo no se fixar qualquer soluo precipitada; como, por exemplo, pode ser a des coberta por seus participantes da inconsistncia (quanto a suas pretenses) da psicologia, da funo do libi e do logro do pequeno grupo, do carter irredutvel dos conflitos. Uma tcnica no pode pretender favorecer uma formao qualquer que seja, o que em cada domnio supe contestao e descoberta, a no ser no momento em que, no que diz respeito a ela, pratica essa contestao, que a fundamenta e ao mesmo tempo lhe abre os caminhos da descoberta.

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