130 anos - Instituto Agronômico (IAC) · é proibid A reprodução To l ou p rCi l de TexTos,...

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SETEMBRO DE 2017 WWW.REVISTAPESQUISA.FAPESP.BR IAC 130 anos

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setembro de 2017 www.revistapesquisa.fapesp.br

IAC130 anos

pESQUISA FApESp | 3

EspEcial

iac130 anos

4 ApresentAçãoCarlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP

6 produçãoEm 130 anos, foram desenvolvidas 1.067 cultivares de 96 espécies

26 MAndiocATubérculo com maior qualidade nutricional teve importância social em São Paulo

27 MelhorAMentoProjetos buscam novas propriedades em culturas já conhecidas

28 engenhAriA AgrícolAPrograma de aplicação de agroquímicos no campo é referência nacional

30 MudAnçAs cliMáticAsPossível diminuição de chuva alteraria extensão das áreas de cultivo

31 históriAIAC multiplicou suas áreas de interesse para dar respostas a demandas dos produtores brasileiros

8 infográficoMelhoramento genético clássico

10 cAféSeleção de plantas tem o apoio de análises químicas e biologia molecular

14 cAnA-de-AçúcArInstituto oferece variedades para o setor sucroalcooleiro desde os anos 1950

18 grãos e fibrAsGenética transforma o cultivo de soja, milho, feijão e algodão no país

22 citrosCentro alia pesquisa e melhorias na produção de frutas cítricas

Capabroto de laranja doce selecionado em meio de cultura no laboratório de biotecnologia do centro de citricultura sylvio Moreira, do iAc

Foto léo ramos chaves

José GoldemberGPresidente

eduardo moacyr KrieGervice-Presidente

Conselho superior

carmino antonio de souza, eduardo moacyr KrieGer, fernando ferreira costa, João fernando Gomes de oliveira, João Grandino rodas, José GoldemberG, marilza vieira cunha rudGe, José de souza martins, Pedro luiz barreiros Passos, Pedro WonGtschoWsKi, suely vilela samPaio

Conselho TéCniCo-AdminisTrATivo

carlos américo Pachecodiretor-Presidente

carlos henrique de brito cruzdiretor científico

fernando menezes de almeidadiretor administrativo

Conselho ediToriAlcarlos henrique de brito cruz (Presidente), caio túlio costa, eugênio bucci, fernando reinach, José eduardo Krieger, luiz davidovich, marcelo Knobel, maria hermínia tavares de almeida, marisa lajolo, maurício tuffani, mônica teixeira

ComiTê CienTífiColuiz henrique lopes dos santos (Presidente), anamaria aranha camargo, ana maria fonseca almeida, carlos américo Pacheco, carlos eduardo negrão, fabio Kon, francisco antônio bezerra coutinho, francisco rafael martins laurindo, José Goldemberg, José roberto de frança arruda, José roberto Postali Parra, lucio angnes, luiz nunes de oliveira, marie-anne van sluys, maria Julia manso alves, Paula montero, roberto marcondes cesar Júnior, sérgio robles reis queiroz, Wagner caradori do amaral, Walter colli

CoordenAdor CienTífiColuiz henrique lopes dos santos

direTorA de redAção alexandra ozorio de almeida

ediTor-Chefe neldson marcolin

ediTores fabrício marques (Política de C&T), marcos de oliveira (Tecnologia), ricardo zorzetto (Ciência), carlos fioravanti e marcos Pivetta (Editores espe ciais), maria Guimarães (Site), bruno de Pierro (Editor-assistente)

repórTeres yuri vasconcelos e rodrigo de oliveira andrade

redATores Jayne oliveira (Site) e renata oliveira do Prado (Mídias Sociais)

ArTe mayumi okuyama (Editora), ana Paula campos (Editora de infografia), Júlia cherem rodrigues e maria cecilia felli (Assistentes)

foTógrAfos eduardo cesar e léo ramos chaves

bAnCo de imAgens valter rodrigues

rádio sarah caravieri (Produção do programa Pesquisa brasil)

revisão alexandre oliveira

ColAborAdor maurício Pierro

é proibidA A reprodução ToTAl ou pArCiAl de TexTos, foTos, ilusTrAções e infográfiCos

sem préviA AuTorizAção

TirAgem 25.700 exemplaresimpressão Plural indústria GráficadisTribuição dinaP

gesTão AdminisTrATivA fusP – fundaÇão de aPoio À universidade de são Paulo

pesQuisA fApesp rua Joaquim antunes, no 727, 10o andar, ceP 05415-012, Pinheiros, são Paulo-sP

fApesp rua Pio Xi, no 1.500, ceP 05468-901, alto da lapa, são Paulo-sP

secretaria de desenvolvimento econômico,

ciência e tecnoloGia governo do esTAdo de são pAulo

issn 1519-8774

fundaÇão de amParo À Pesquisa do estado de são Paulo

4 | especial iac

ApresentAção

Motor da agricultura paulistaCarlos Henrique de Brito Cruz, diretor CientífiCo da faPesP

om 130 anos, o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) é uma das mais impor-tantes instituições de pesquisa do país.

Criado no final da era imperial, o IAC continua sendo um dos motores da agricultura paulista. As atividades de pesquisa, iniciadas com o estudo da química de solos e de fertilizantes para cafeicultura, o desenvolvimento de variedades de cana-de-açú-car e frutas, rapidamente ganharam força e raízes e chegam a 2017 mostrando como resultados o de-senvolvimento de mais de mil cultivares, milhares de trabalhos científicos, treinamento de pesquisa-dores e muitas outras ações determinantes para a pujança do agronegócio no estado de São Paulo.

Com 143 pesquisadores, o IAC obteve, em 2016, 32% de seus recursos de parcerias com o setor pri-vado, demonstrando sua capacidade de entrega de resultados com impacto econômico. Capacidade aliás demonstrada em vários estudos detalhados e rigorosos.

Já em 1972, os pesquisadores Harry Ayer (Uni-versidade do Arizona) e G. Edward Schuh (Uni-versidade Purdue) publicaram o trabalho “Social rates of return and other aspects of agricultural research: The case of cotton research in São Pau-lo, Brazil”1, estudando justamente o impacto dos investimentos em pesquisa sobre algodão desen-volvida no IAC. Destacam os autores que São Paulo desenvolveu, desde 1924, um programa singular e efetivo para aumentar a competitividade dos pro-dutores de algodão no estado e que os dispêndios no programa de pesquisas haviam sido em valor superior àquele aplicado pelos Estados Unidos no programa de milho híbrido daquele país. Ayer e Schuh apontaram que a taxa de retorno para a sociedade brasileira fora excepcional devido aos benefícios em exportações aumentadas e na re-dução de preço local.

Outros autores têm estudado a mensuração dos benefícios obtidos com a atividade de pesquisa agrícola. No setor citrícola, no qual o IAC tem enorme impacto, Margarida G. Figueiredo, André Lahoz Mendonça de Barros e Junia C.P.R. Concei-

ção calcularam, no trabalho “Retorno econômico dos investimentos em P&D na citricultura paulis-ta”2, que, para cada R$ 1,00 de recursos públicos aplicados em P&D no setor, obtém-se um ganho de produção de R$ 13,67.

Além do efeito contínuo da pesquisa do IAC sobre o agronegócio paulista e brasileiro, eviden-ciado no estudo acima citado, algumas vezes foi a pesquisa do Instituto Agronômico que evitou o desastre. Por exemplo, no Relatório da FAPESP de 19723, o então diretor-presidente, professor Jayme Arcoverde, destaca que:

“Os pesquisadores do Instituto Agronômico, que já haviam conseguido debelar brilhantemente a ‘tristeza’ dos laranjais paulistas, obtiveram, re-centemente, o ressurgimento dos nossos laran-jais por intermédio dos clones nucelares. É do conhecimento geral que no período de apenas um ano, ou seja, em 1972, nossa exportação de frutas cítricas, ‘in natura’ e principalmente sob a forma de sucos concentrados, atingiu cerca de 50 milhões de dólares.”

Este caso ilustra o fato, nem sempre bem com-preendido, de a ciência e a tecnologia avançarem por esforços cumulativos e de longo termo. No caso dos clones nucelares, citados pelo professor Arcoverde, o esforço vinha desde 1938, quando Sylvio Moreira introduziu a técnica no Brasil4.

Poderíamos também lembrar a tradição de me-lhoramento genético do café, iniciada já nos anos 1930, quando Carlos Krug e depois Alcides Carva-lho começaram a longa tradição do IAC nessa área, contada neste suplemento da revista Pesquisa FA-PESP (página 10). Muitos outros exemplos haveria a citar, para ilustrar a relevância do IAC para São Paulo. Neste suplemento conta-se como café, pês-sego, uva, laranja, cana, feijão, arroz e mais dezenas de culturas são plantadas e colhidas eficientemente no estado de São Paulo, e no Brasil, graças aos 130 anos de trabalho dos pesquisadores do Instituto Agronômico de Campinas. Parabéns a eles e ao IAC.

1 AYER, H. G; SCHUH G. E. “Social rates of return and other aspects of agricultural research: The case of cotton research in São Paulo, Brazil”, American Journal of Agricultural Economics, v. 54, n. 4, part 1, p. 557-569. nov. 1972.2 FIGUEIREDO, M. G.; MENDONÇA DE BARROS, A. L.; J. C. P. R., Conceição. “Retorno econômico dos investimentos em P&D na citricultura paulista”, RESR, Piracicaba-SP. v. 50, n. 3, p. 493-502. jul/set 2012.3 FAPESP, Relatório de atividades 1972, p. 6 (consultado em http://www.fapesp.br/publicacoes/relat1972.pdf em 14 de agosto de 2017). 4  SALIBE, A.A., “Clones Nucelares de Citros no Estado de São Paulo”, Laranja, v.1-2, p. 117-136 (2009).

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IAC em números

OrçAmEntO 2016

EQUIpE 2017

póS-grAdUAçãO

pESQUISA

Consórcio Pesquisa Café 1%

49% recursos públicos estaduais

32% parcerias com empresas

8% faPesP

6% venda de produtos e serviços

2% CnPq

2% Programa de aceleração do Crescimento

580 colaboradores como mestrandos, doutorandos e pós-doutorandos, além de estagiários técnicos de nível médio e superior

143 pesquisadores científicos (90% com doutorado)

260 funcionários de apoio à pesquisa

12 Centros de Pesquisadistribuídos em

5 cidades ocupando

2.150 hectares

240 projetos de pesquisa estão sendo

executados em sP e outros estados, como

MG, Ba, Pr e Mt

o programa de PG em agricultura tropical e subtropical foi criado em 1999

no mestrado,foram defendidas 407 dissertações

o doutorado foi iniciado em 2009, que resultou em 50 teses defendidas no instituto

Cordeirópolis

ribeirão Preto

Votuporanga

CampinasJundiaí

89,9

milhões

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erar e transferir ciên cia, tecnolo-gia e produtos pa-

ra otimização dos sistemas de produção vegetal. A primeira frase da missão insti-tucional do IAC abrange todo o trabalho feito no instituto, desde aspectos mais fundamentais do conhecimento cien-tífico até contribuições bem práticas e palpáveis, como a produção de novas cultivares e sua transferência para os agricultores. Cultivar é o nome que se dá a variedades de plantas seleciona-das para perpetuar e exacerbar carac-terísticas desejáveis. Quando se trata de produzir alimentos, destacam-se a busca por melhorar a produtividade, re-forçar nutrientes específicos e promo-ver resistência a doenças ou adaptação a condições climáticas. São necessidades tão prementes que as versões originais, selvagens, das plantas usadas como ali-mento são praticamente inexistentes nas mesas mundo afora. O IAC tem partici-pação representativa nesse trabalho e

chega aos 130 anos com 1.067 cultivares desenvolvidas de 96 espécies agrícolas destinadas não apenas aos campos pau-listas, mas a todo o país e até ao exterior.

O IAC obtém essas variedades por meio de melhoramento genético con-vencional, que envolve cruzamentos con-trolados de indivíduos (os parentais) portadores da característica de interesse. É um processo quase artesanal que en-volve a troca de pólen entre as flores de plantas adultas (ver infográfico na pági-na 8) e a análise dos resultados muitas vezes ao longo de anos.

Das 1.067 cultivares já desenvolvidas, 748 constam do Registro Nacional de Cultivares do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), que em 1997 passou a registrar as variedades aptas para serem cultivadas no Brasil. O que existe hoje, porém, não é necessa-riamente uma lista completa. “Cultivares antigas não foram registradas porque haviam sido lançadas muito tempo an-tes, entraram no domínio público e se

descaracterizaram”, explica o agrôno-mo Sérgio Augusto Morais Carbonell, diretor-geral do IAC.

Nesse tipo de registro, empresas e agricultores compram o material repro-dutivo – como mudas ou sementes – e podem revender, plantar e reutilizar o material sem custos adicionais. O Mapa também fornece o Serviço Nacional de Proteção de Cultivares (SNPC), compa-rável ao regimento das patentes porque o desenvolvedor tem direito à propriedade intelectual da cultivar e pode cobrar por seu uso. “No SNPC, o comprador do ma-terial reprodutivo da cultivar assina um contrato de licenciamento de produção e comercialização, tem de repassar ro-yalties (de 3% a 5%) e não pode vender a semente para terceiros sem autorização”, conta Carbonell. O IAC tem 28 cultiva-res no SPNC, a grande maioria de cana, cafeeiro e feijoeiro. “Fazemos esse regis-tro para cultivares que podem apresen-tar maior lucratividade, como culturas de grande porte e com participação de fo

tos

léo

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cultivares

Produção

... de 96 espécies diferentes foram geradas pelo Iac em 130 anos

1.067

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empresas na produção de sementes.” Em todos os casos, as cultivares podem ser usadas sem pagamento de royalties na pesquisa de novas variedades.

O maior número de cultivares desen-volvidas pelo IAC se concentra nos citros. São 147 tipos de laranjas, limões, tange-rinas, pomelos, entre outros, coerente com o fato de o estado de São Paulo ser a região que mais colhe frutas cítricas no mundo (ver reportagem na página 22). “O IAC tem o maior banco de germoplasma de citros do planeta”, informa Carbonell. Ele se refere à coleção que representa o patrimônio genético das plantas estuda-das na instituição, muitas vezes armaze-nado na forma de pomar com exemplares de uma diversidade de espécies e culti-vares, embora possa também ser com-posto por sementes ou material vegetal armazenado de outra forma.

O banco de germoplasma de café co-meçou a ser feito no final do século XIX e representa, atualmente, cerca de 90% das variedades plantadas no país. “Ao longo do tempo, o instituto desenvolveu 70 cultivares de cafeeiros que têm gran-de valor econômico e social”, destaca o diretor-geral.

que seria exigido pela árvore. Com isso, a safra paulista, que perde em volume ape-nas para a gaúcha, é a primeira disponível no país a cada ano, a partir de agosto. Na América do Sul o Brasil é um dos princi-pais produtores, atrás do Chile e da Ar-gentina, com 1% dos pêssegos colhidos no mundo. “Algumas cultivares também oferecem a opção de polpa branca ou ama-rela”, conta a bióloga Graciela da Rocha Sobierajski, pesquisadora do Centro de Fruticultura de Jundiaí. Além das culti-vares de pessegueiro de mesa, há outras destinadas a conservas e sucos, uma di-versidade de usos que gerou a demanda de mercado para o considerável investi-mento na pesquisa. A partir de 1970 o IAC também dedicou atenção à nectarina, que parece um pêssego de casca lisa.

Um trio de alimentos básicos – arroz, feijão e trigo – teve igualmente suas cultu-ras incrementadas por cultivares do IAC, muitas delas hoje espalhadas pelo país. “O melhoramento do feijoeiro começou em 1932, mas o grande impulso dado a essa cultura aconteceu no final dos anos 1960, quando o IAC lançou a variedade de feijão-carioca”, conta Carbonell, espe-cializado justamente nesse grão central da dieta brasileira. A pesquisa com arroz, cujo melhoramento genético teve início na década de 1930, recentemente tem ampliado seu alcance explorando nichos específicos como o arroz preto, lançado em 2006, o vermelho e um tipo especial para risoto. Arroz com feijão não precisa mais ser sinônimo de básico absoluto. ▼

Trigo, milho, feijão, arroz preto, frutas cítricas, soja (acima, da esq. para a dir.) e café (à esq.): variedades espalhadas pelo Brasil

A primeira cultivar do IAC, no entan-to, não apelava à nutrição e ao paladar. Foi uma variedade de algodoeiro lan-çada em 1932, a IA-7387, época em que o plantio de café estava em declínio e o algodão se tornou uma boa opção de cul-tivo. Outras 34 cultivares dessa planta se seguiram e nas últimas décadas, mesmo com a migração da cultura para Mato Grosso e Goiás e a entrada de empresas multinacionais na venda de sementes, as pesquisas continuaram. Em 2007, o IAC lançou uma cultivar resistente a múlti-plas doenças: o IAC 25 RMD, resultado de 22 anos de estudos.

As duas principais culturas agrícolas brasileiras em volume de produção, a so-ja e o milho, também foram enriquecidas por cultivares do IAC (ver reportagem na página 18). Os primeiros experimentos com soja datam do início das atividades do instituto; já o milho começou a ser pesquisado na década de 1930. Para que pudesse ser plantada comercialmente na região Sudeste, a seringueira, árvore de origem amazônica, começou a ser acli-matada no IAC em 1942 e posteriormen-te o melhoramento genético colocou 37 cultivares à disposição dos agricultores.

Arroz, feijão e pêssegoEmbora os cítricos sejam mais reconhe-cidos, com sucos de laranja e limão cons-tantemente presentes no cotidiano, é para outra fruta que o IAC registra o número mais expressivo de cultivares: o pêssego, estudado desde a década de 1940 e com a primeira cultivar obtida 20 anos depois. Hoje são 64 variedades que permitem cultivar essa espécie de clima temperado no estado de São Paulo e no sul de Minas Gerais, lugares onde faz menos frio do

Uma nova cultivar, como a do cafeeiro, demora décadas para chegar ao produtor desde a seleção inicial das plantas

Melhoramento genético clássico

Seleção e cultivo de plantas com as características desejadas

Cruzamento entre as plantas selecionadas e formação de mudas

Avaliação e seleção das plantas resultantes dos cruzamentos

Novos cruzamentos e avaliações dos descendentes, por mais duas gerações, para fixação dos caracteres almejados

Plantio no campo e produção de sementes da nova cultivar

Registro da cultivar

Distribuição aos produtores

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info

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GLOSSÁRIOBioprospecção Busca de características biológicas de interesse econômico, social ou ambiental em moléculas ou seres vivos. No melhoramento de plantas, essa procura pode ser conduzida para encontrar indivíduos superiores ou apenas genes ou características agronômicas pontuais.

Cultivar População homogênea de plantas selecionadas para uma ou mais características de interesse. o termo resulta da expressão em inglês cultivated variety, variedade cultivada.

Domesticação de plantas Qualquer alteração induzida pelo homem nas espécies selvagens para que incorporem características mais desejáveis de uso ou cultivo.

Enxertia Técnica de propagação vegetativa na qual uma gema é enxertada sobre um porta-enxerto, propiciando o desenvolvimento de um novo clone da planta original sem perder suas características genéticas e fisiológicas.

Gemas estrutura de brotação de plantas, como a cana.

Híbrido Resultado do cruzamento de duas plantas geneticamente distintas.

Melhorista Profissional dedicado ao melhoramento genético de plantas e animais.

Porta-enxerto Planta que constituirá a base (raízes) da planta enxertada sobre ela. A prática permite a formação de uma planta com maior resistência a doenças, além de modificar as características do enxerto.

Praga insetos e ácaros que causam danos diretos ao atacar o produto a ser comercializado, ou indiretos, se atacar estruturas vegetais não comercializadas, mas com reflexo na produção. os danos indiretos incluem a transmissão de agentes causadores de doenças, como os vírus, e a deposição de substâncias açucaradas nas folhas e em outras estruturas vegetais, facilitando a colonização de fungos.

Variedade Planta ou grupo de plantas classificadas em nível hierárquico inferior à espécie ou subespécie. Pode ser botânica, exótica ou cultivada (cultivar).

Zoneamento agrícola Técnica usada para indicar locais com maior possibilidade de desenvolvimento de determinada cultura.

TEMPo MéDio DE DEsEnVolViMEnTo

FonTE iAC

Cafeeiro

Cana

Feijoeiro

Algodoeiro

Soja

20 a 30 anos

até 20 anos

6 a 7 anos

12 a 20 anos

8 a 10 anos

Café 70

Pêssego 64

Videira 62

laranja 58

Cana-de-açúcar 49

Feijão 48

Arroz 46

milho 44

Trigo 38

Seringueira 37

Soja 36

Algodão 35

Tangerina 30

Antúrio 26

Amendoim 24

mandioca 20

macadâmia e pera 19

Caqui 18

Ameixa, lírio-amarelo e nectarina 14

maçã 13

Nêspera 12

Batata, laranja-ácida e milho-pipoca 11

Abacate 10

Abóbora, aveia, batata-doce, citandrim, manga, quiabo 8

Alface 7

Alho, mamona, morango, pimentão, trifoliata, 6

Açucena, girassol, hemerocale, mexerica, tomate e triticale 5

Bastão do imperador, cebola, cevada, lima-doce e sorgo-vassoura 4

Capim-colonião, citrange, citrumelo, crotalária, damasco, fumo, gergelim, limão, limão-cravo, maracujá azedo, tangor

3

Abacaxi, barbasco, brócolos, chá, cidra, couve-flor, gladíolo, maracujá, pimenta, pomelo vermelho, repolho e tangelo

2

Aspargo, banana, cacau, cará, caruru, cenoura, clementina, couve, gengibre, goiaba, grão-de-bico, guandu, labelabe, laranja-azeda, limão rugoso, limão-volkameriano, marmelo, menta, moranga, mucuna, pepino e sorgo

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núMEro DE CulTiVarEs DEsEnVolViDas PElo iaC

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amostras de café arábica em secagem antes de serem analisadas no laboratório de sementes

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a incessante seleção de cafeeiros mais produtivos e resistentes a doenças e pragas agora conta com o apoio de análises químicas e biologia molecular

difícil dar um passo além da porta do laboratório do engenheiro-agrônomo Her-

culano Penna Medina Filho, no final do corredor à direita do saguão de entrada do centro de pesquisas do café do IAC. Caixas com amostras de grãos secos de café – todas resultantes de cruzamentos entre cafeeiros cultivados no institu-to – se espalham pelo chão, enchem os armários e ocupam as bancadas do la-boratório, deixando pouco espaço livre.

Várias vezes por semana, Medina – aos 67 anos, um dos veteranos entre os 13 pesquisadores do centro – abre os envelopes com os grãos, passa-os pe-lo moedor e pelo torrador de uma das bancadas, ferve água em um fogão ao lado da porta e prepara um café, cujas propriedades – corpo, doçura, aroma, acidez, entre outras – são avaliadas por especialistas que se organizam na mesa central da sala de menos de 30 metros quadrados. “Continuamos a busca por

café

Batalhas contínuas

cultivares de melhor qualidade, mais produtivas e mais resistentes a doenças, principalmente ferrugem”, diz Medina, cujos pais também trabalharam no IAC.

Ao desenvolver novas cultivares, a equipe de melhoramento genético de café sintetiza a história da pesquisa do IAC, criado em 1887 para apoiar a cafei-cultura no Brasil, já nessa época um dos maiores produtores mundiais. Desde o início, uma das principais linhas de pes-quisa é o desenvolvimento de cultivares resistentes à ferrugem, doença que pro-voca a queda das folhas e da produção.

A atenção é contínua porque o cafeeiro é muito sensível a pragas e doenças, sem contar o impacto das mudanças climáti-cas. Estudos recentes indicam que um aumento de 1 grau Celsius (ºC) na tem-peratura média anual e de 15% na preci-pitação pluviométrica poderia reduzir à metade a área ocupada pelos cafezais no estado de São Paulo. Das 125 espécies de Coffea, apenas duas são cultivadas comer-

carlos fioravanti

cialmente: Coffea arabica (café arábica) e Coffea canephora (café robusta). O arábica responde por cerca de 60% da produção mundial e é o mais cultivado no Brasil, na Colômbia e na América Central. Com 6,4 bilhões de cafeeiros plantados, o Brasil é o maior produtor e exportador mundial.

O engenheiro-agrônomo Carlos Ar-naldo Krug (1906-1973) começou o me-lhoramento genético de café e de outras culturas no IAC em 1932, ao voltar do doutorado em genética na Universidade Cornell, Estados Unidos. Para formar sua equipe, Krug voltou à Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Univer-sidade de São Paulo (Esalq-USP), onde havia se formado, e convidou um dos melhores alunos, Alcides Carvalho (1913-1993), que começou no instituto em 1935 e ali trabalhou por 50 anos, tornando-se um nome de referência internacional na pesquisa em café.

A primeira cultivar do IAC foi o Bour-bon Vermelho, que começou a ser distri-

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buída aos produtores em 1937. Não era muito produtiva e era bastante suscetí-vel a pragas e doenças, mas foi aceita e cultivada pelos cafeicultores. O Bourbon Vermelho e, logo depois, o Amarelo fo-ram deixados de lado em 1952, quando o instituto lançou a cultivar Mundo No-vo, mais produtiva e adaptada a várias regiões do país.

Desde o Bourbon, o IAC desenvolveu 68 cultivares. Saiu de lá também o porta--enxerto Apoatã, desenvolvido a partir da espécie Coffea canephora, uma das duas espécies das quais se originou a C. ara-bica, a espécie comercial mais cultivada no mundo atualmente. O C. canephora é resistente a três espécies de vermes nema-toides que atacam as raízes e impedem o crescimento dos cafeeiros. Por essa razão, serviu como porta-enxerto, sobre o qual se pode implantar a cultivar desejada, que desse modo escapará da ação dos vermes. A cultivar mais recente, de 2016, é o Ca-tuaí SH3, resistente à ferrugem, expres-sando a preocupação com essa doença, depois da conquista de patamares ele-

vados de produtividade, que passou da média de 8 sacas (60 quilogramas) por hectare (ha) na década de 1990 para as atuais 24 sacas/ha.

FLores rosas e brancasAs cultivares resultam do cruzamento entre as 18 espécies, dezenas de varie-dades, híbridos e mutantes que formam o chamado banco de germoplasma, um acervo de cerca de 60 mil plantas, in-cluindo as cópias, que ocupa 30 hectares nos arredores do centro de pesquisa. Por ali estão árvores que não parecem ca-feeiro, algumas altas e com folhas largas como uma mangueira.

À esquerda da entrada do centro estão os pés de Coffea racemosa, de Moçam-bique, na África, peculiar por deixar as folhas caírem antes de produzir flores de cor rosa; as duas espécies mais comuns de café atualmente, C. arabica e C. cane-phora, não perdem as folhas e produzem flores brancas. Mais à esquerda estão os pés de Coffea eugenioides, espécie de fo-lhas pequenas que originou a C. arabica

depois de cruzar naturalmente com a C. canephora.

O trabalho com cultivares a partir de C. eugenioides objetiva cafés de alta qua-lidade. “Por meio do cruzamento com as espécies exóticas, hoje temos linha-gens sendo desenvolvidas idênticas às principais cultivares de C. arabica, mas com mais sabor e aroma”, diz o enge-nheiro-agrônomo Júlio César Mistro, diretor do Centro de Café. Por sua vez, o engenheiro-agrônomo Gerson Giomo intensificou em 2011 a procura por plan-tas capazes de produzir cafés especiais, com sabor e aroma únicos, em meio às cultivadas no vasto jardim de cafeeiros, trazidos principalmente da África, como permuta a variedades brasileiras (ver Pesquisa FAPESP no 187).

Foi também ali que a engenheira--agrônoma Maria Bernardete Silvarol-la, depois de examinar cerca de 3 mil plantas, identificou três, originárias da Etiópia, que produziam frutos com um teor bastante baixo de cafeína – apenas 0,07%, enquanto o Mundo Novo tem 1,2% de cafeína. Examinadas em colabo-ração com o engenheiro-agrônomo Pau-lo Mazzafera, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e divulgadas em 2004 em um artigo na revista Nature, as plantas motivaram um programa de cruzamento e melhoramento genético, ainda sem data para ser concluído. Em meados da década de 2000, começou também o desenvolvimento de culti-vares de café adequadas ao clima e ao solo da Amazônia, em testes em Rorai-ma e no Acre.

epudand aeceat alitaturiae doluptas inverrum erferit atest, quia parchil lestrum quias aliqui occullabo poratur si

extração de Dna de folhas de café arábica com nitrogênio líquido no laboratório de biologia molecular (à esq.) e broto crescendo em viveiro (acima)

pESQUISA FApESp | 13

Os pesquisadores estão desenvolvendo plantas resistentes a um inseto conhe-cido como bicho-mineiro, cujas lagartas provocam a queda das folhas do cafeei-ro, por meio do cruzamento da espécie Coffea racemosa, resistente à praga, com as cultivares Icatu e Catuaí. “A pesquisa ainda não foi finalizada devido à dificul-dade de fixação dos genes que conferem essa resistência, explica o engenheiro--agrônomo Oliveiro Guerreiro Filho.

O programa de melhoramento gené-tico segue as mesmas diretrizes estabe-lecidas por Krug há 85 anos: o conheci-mento sobre genética, a experimentação e o aproveitamento da biodiversidade, por meio do banco de germoplasma. A diferença é que hoje há técnicas que aju-dam a selecionar as plantas candidatas a novas cultivares. Em seu laboratório, à esquerda do saguão de entrada do centro, a bioquímica Terezinha de Jesus Garcia Salva e sua equipe separam as plantas

com diferentes teores de cafeína, açú-cares, trigonelina, ácidos clorogênicos, óleos ou sólidos solúveis, com o propó-sito de facilitar o trabalho das equipes de melhoramento genético. A seleção de plantas com características químicas especiais já é por si só relevante. O IAC identificou uma espécie de café trazida da África e mantida no IAC, a Coffea sal-vatrix, com 29% de óleo nas sementes, bem acima do teor encontrado na maio-ria das espécies, de 9% a 15%. O óleo do café pode ser usado principalmente em cosméticos e filtros solares.

a rede sociaL do caFéInstalada também à esquerda do saguão de entrada, a equipe do laboratório de biologia molecular prepara sondas de DNA e outros tipos de marcadores ge-néticos para facilitar a identificação de plantas com características desejadas e encurtar o prazo de testes de novas cul-tivares. Os pesquisadores desse labora-tório identificaram genes que poderiam direcionar o crescimento de raízes e fo-lhas em variedades sensíveis ao ataque de nematoides. “O gene só seria ativado quando a raiz fosse atacada por nema-toide ou quando a folha sofresse dano

mecânico”, diz a bióloga Mirian Perez Maluf, uma das coordenadoras do labo-ratório, ao lado da engenheira-agrônoma Lilian Padilha, ambas da Embrapa Café e cedidas ao IAC.

O instituto preserva outras linhas tra-dicionais de pesquisa – sobre colheita mecanizada, técnicas de processamen-to, impactos socioeconômicos da cafei-cultura, entre outras – e não deixou de dar atenção ao mundo on-line. Ninguém mais se importa que o engenheiro-agrô-nomo Sérgio Parreiras Pereira passe par-te do dia no computador, escrevendo em redes sociais. Como mediador da Rede Social do Café – formada por quase 5 mil produtores, torrefadores, exportadores, órgãos do governo e de universidades, estudantes de agronomia –, ele vive atrás de notícias, palestras e filmes de trei-namento em campo, além de ajudar a resolver problemas. “Em 2016, um pro-dutor de Nova Resende, sul de Minas, comentou que tinha encontrado larvas em frutos já maduros do café e estava muito preocupado com o que poderiam fazer. Fiz a ponte com um pesquisador da Universidade de Viçosa, que disse que era mosca da fruta e oferecia poucos riscos para o cafezal”, exemplificou. ▼Fo

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viveiro de mudas usadas na seleção de novas cultivares

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Instituto oferece desde os anos 1950 opções de cultivares para produtores do setor sucroalcooleiro em várias regiões do país

ma das principais con-tribuições do IAC para a cultura da cana-de-

-açúcar é a criação de novas cultivares para plantio em São Paulo e outros esta-dos do país. A importância dessa contri-buição na história do IAC ficou marcada na cerimônia dos 130 anos do instituto realizada no dia 27 de junho, quando fo-ram lançados duas novas cultivares de cana. Ao todo, desde a década de 1950, já são 49 disponíveis aos produtores da matéria-prima do açúcar e do álcool. Por meio do cruzamento tradicional rea-lizado no campo, os pesquisadores do instituto fazem a hibridização através da combinação de plantas chamadas de parentais, com indivíduos masculinos doando pólen para os femininos, em uma troca feita com critérios de escolha que envolve desde a distância genética entre eles até características produtivas. O ob-jetivo é obter, após várias combinações, uma terceira planta, superior aos paren-tais, que ofereça, por exemplo, melhor produtividade e resistência a doenças.

cana-de-açúcar

Evolução no canavial

Marcos de olIveIra

Cada cultivar tem suas especificida-des e as duas novas, a IACSP01-3127 e a IACSP01-5503, apresentaram ganhos de produtividade em torno de 15% nos tes-tes em campo quando comparadas com a mais cultivada no centro-sul do país, a RB867515, da Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Su-croenergético (Ridesa), formada por 10 universidades federais. A IACSP01-3127 é destinada a campos que recebem, por exemplo, adubação de vinhaça ou para regiões onde as chuvas ocorrem regu-larmente, podendo ser colhida de maio a outubro. Já a IACSP01-5503 é mais rús-tica e se adapta bem à região de Cerrado, em solos com pouca capacidade de ar-mazenamento de água e baixa fertilida-de, como o noroeste dos estados de São Paulo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais.

Os primeiros estudos com cana no IAC começaram com o fundador e primeiro diretor do instituto, o austríaco Franz Wilhelm Dafert (1863-1933), que fez ex-perimentos com 42 cultivares utilizadas

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na época por agricultores, entre 1894 e 1895. A planta, originária da Índia, foi trazida pelos portugueses nos primeiros anos da colonização. Dafert estudou tam-bém a adaptação de exemplares trazidos da Ásia no solo paulista. Variedades vin-das principalmente da Índia e de Java, na Indonésia, foram adaptadas e multi-plicadas no IAC nas primeiras décadas do século XX para renovar o canavial de São Paulo, afetado por várias doenças.

No início da década de 1930 foi estru-turado um programa de melhoramento de cana-de-açúcar no IAC sob a coor-denação do pesquisador José Manoel Aguirre Junior. As primeiras hibridações aconteceram em 1934 em um experi-mento realizado em Miracatu, no Vale do Ribeira. No ano seguinte, foi imple-mentada a Seção de Cana-de-Açúcar. O trabalho de Aguirre contribuiu para as duas primeiras variedades originadas no IAC, que foram para o campo no final da década de 1950 sob a coordenação dos agrônomos Antônio Lazzarini Segalla e Raphael Alvarez. Depois se seguiram mais cinco variedades que se tornaram importantes para o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), a partir de 1975. Em 1983, três das seis variedades planta-das no estado de São Paulo eram do IAC.

O instituto é hoje um dos três produto-res e lançadores de novas variedades, ao lado da Ridesa, que assumiu as funções do Plano Nacional de Melhoramento de Cana-de-Açúcar (Planalsucar), criado em 1971 pelo Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), extinto em 1990, e tam-bém do Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), ex-Copersucar, que foi mantido por muitos anos pelos produtores de ca-na e hoje é uma empresa de capital aber-to. Desde a década de 1950, o IAC testa também variedades desses institutos e do Centro de Campos Brasil, que era do IAA e desenvolvia novas cultivares na cidade de Campos, no Rio de Janeiro.

A criação das novas opções de plan-tio, além de buscar melhor produtivida-de e adaptação ao solo e clima, cumpre um papel de proteção contra doenças. Quanto mais variedades plantadas numa extensão de terra, menor é a possibili-dade de uma praga causar grandes per-das. Para desenvolver novas variedades é preciso que a planta floresça. Mas a cana não floresce com facilidade no Su-deste do Brasil, devido às noites frias do inverno. Desde os anos 1930, o instituto

câmara de brotação de mudas no centro avançado da Pesquisa Tecnológica do agronegócio de cana do Iac, em ribeirão Preto

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experimentais da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta) es-palhadas pelo estado, como em Assis, Mococa, Jaú, Piracicaba e Pindorama. Landell conta que a produção de uma variedade pode demorar até 20 anos. As recém-lançadas começaram a ser pre-paradas em 2001. “A atividade envolve um grupo de trabalho perene que precisa coletar dados ao longo dos anos, além de se manter motivado, porque os resulta-dos demoram a aparecer.”

Volta por cimaEm 1989, certa desmotivação atingiu o setor sucroalcooleiro, com os carros a álcool entrando em declínio. Essa situa-ção repercutiu no IAC, onde vários pes-quisadores estavam se aposentando, o que culminou na extinção da Seção de Cana-de-Açúcar. “Nessa época, apesar de ser novo, porque entrei no IAC em 1982, comecei a tentar mudar esse estado de coisas junto com outros dois pesquisa-dores que trabalhavam com cana, Pery Figueiredo e Mário Campana. Inicia-mos reuniões informais com técnicos das usinas para formar um novo modelo de atuação no setor sucroalcooleiro”, conta

Landell. O grupo, em 1992, reunia cerca de 20 profissionais. Logo recebeu o nome de Grupo Fitotécnico de Cana e debatia temas relevantes para a cultura. Reúne na atualidade a média de 250 pessoas, entre técnicos de usinas e associações de produtores, pesquisadores de institutos de pesquisa e universidades, e produ-tores de cana. “Tratamos de assuntos fitotécnicos, como variedades, pragas e doenças, nutrição e adubação. Para nós pesquisadores, passou a ser também um ambiente onde prospectamos demandas para pesquisa.”

A equipe abriu a participação também para pesquisadores das universidades Federal de São Carlos (UFSCar), esta-duais de Campinas (Unicamp) e Paulista (Unesp), Escola Superior de Agricultu-ra Luiz de Queiroz (Esalq) e do Cen-tro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena), ambos ligados à Universidade de São Paulo (USP), além de ter feito parcerias com empresas. Depois dessa movimentação, os experimentos no IAC puderam retomar um ritmo mais agres-sivo, com a contratação de pessoal. Em 2017 são 13 pesquisadores do IAC no Grupo Fitotécnico de Cana-de-Açúcar e outros de áreas diferentes, que também trabalham com cana. Como a agrônoma Raffaella Rosseto, pesquisadora na área de resíduos da industrialização de cana e participante de entidades mundiais de pesquisadores e técnicos da área, o engenheiro-agrônomo André Vitti, em conservação do solo, e o agrônomo Hei-

experimentos para preparo de novas cultivares na estação do instituto em camamu, na Bahia (à esq.); imagem escaneada do solo mostra crescimento das raízes de cana (acima)

contou com uma estação em Miracatu, próximo ao litoral sul de São Paulo, e depois em Ubatuba, cidade litorânea. “Em Ubatuba, a umidade relativa do ar é alta, o que é um fator positivo para o processo de cruzamento, mas as noites frias, abaixo de 18 °C, inviabilizam a hi-bridização”, diz o engenheiro-agrônomo Marcos Guimarães de Andrade Landell, diretor do Centro Avançado da Pesquisa Tecnológica do Agronegócio de Cana, com sede em Ribeirão Preto.

Para facilitar o trabalho de hibrida-ção e avançar no desenvolvimento de cultivares, os pesquisadores do IAC começaram a utilizar em 1976 a Esta-ção Experimental de Cruzamento de Camamu, município baiano, que era da Copersucar, na época. Em 2009, o Pro-grama Cana IAC, por meio da Fundação de Pesquisa Agrícola, instalou uma esta-ção de hibridação no litoral do estado da Bahia utilizada até hoje como berço das futuras variedades do instituto. Assim que as sementes estão disponíveis, elas são levadas para Ribeirão Preto, onde passam por um processo de germinação até se transformar em pequenas plantas, e distribuídas para as outras estações

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tor Cantarella, em nutrientes e ecossis-tema dos solos. “Para quem iniciou com três pessoas, em 1990, um esforço para organização da pesquisa canavieira do IAC, ter hoje quase cem pesquisadores, contando com estudantes e bolsistas, é uma grande vitória”, diz Landell.

Com a nova estruturação do estudo da cana no IAC iniciada em 1990, uma das áreas priorizadas foi a de geração de informações sobre o solo para os pro-dutores. Coordenado pelo engenheiro- agrônomo especialista em solo Hélio do Prado, o programa Ambicana, iniciado em 1998, tem o objetivo de treinar os técnicos das usinas na classificação de solos. Nessa área são realizados experi-mentos para verificação das condições de produtividade, coloração e teor de argi-la, além de permeação da água. Ao todo, o programa já envolveu cerca de 2 mi-

Depois de uma seleção visual, os minirre-bolos recebem fungicidas e são levados a uma caixa de brotação com temperatura e umidade controladas. O passo seguinte é colocar as mudas em tubetes plásticos para plantio, que hoje ocorre por meio de máquinas apropriadas.

“O MPB permite uma melhor unifor-midade da cultura, reduzindo falhas nas linhas de plantio e competição entre as próprias touceiras, porque não há brota-ção de mudas muito juntas como acon-tece no processo tradicional, o que leva à disputa por luz, água e nutrientes”, explica Landell. Entre as vantagens do novo sistema está o uso de 1 tonelada (t) a 2 t de MPB (minirrebolos) suficien-te para 1 hectare de cana, enquanto no método tradicional são utilizados de 18 a 20 t de colmos-semente. Como o uso de colmos no plantio diminui, o restante vai para a produção de álcool e açúcar. “Desde 2012, demos cursos para mais de 600 produtores de cana, que estão replicando o novo sistema.”

A adoção do sistema de plantio MPB também abriu um novo estudo em outra área importante do plantio de cana, a ir-rigação. A engenheira-agrônoma Regina Celia de Matos Pires, diretora do setor de Ecofisiologia e Biofísica do IAC, que participa do Programa de Cana do insti-tuto, está desenvolvendo um estudo para verificar a eficiência do uso da água na produção de mudas MPB. “Temos ex-perimentos com várias cultivares para verificar a necessidade de água de cada uma e a distribuição e o crescimento das raízes”, explica Regina. Para realizar esse estudo, um dos instrumentos utilizados foi um escâner de raiz, que capta a ima-gem do sistema radicular por um tubo de acrílico transparente instalado no so-lo até 1 metro de profundidade. Dentro do tubo, o escâner obtém fotos do perfil do solo mostrando as raízes ao longo do crescimento da planta. Com isso é possí-vel determinar a estratégia de aporte de água e nutrientes. “Quanto mais profun-da a raiz, melhor ela aproveita a água”, diz Regina. ▼

Preparo de plantas do sistema Mudas Pré-brotadas, em ribeirão Preto: inovação no plantio

lhões de hectares, que representam 20% da área de cana do estado de São Paulo.

Uma das contribuições recentes do IAC para a cultura da cana foi a criação do sistema Mudas Pré-brotadas, que re-cebeu a sigla MPB. “Foi uma inspiração que tivemos em 2008 e que está se expan-dindo para as regiões produtoras”, infor-ma Landell. Coordenado pelo agrônomo Mauro Xavier, esse sistema traz ganhos de produtividade no plantio e benefícios fitossanitários ao evitar doenças nas fases iniciais do cultivo. Ele transforma o modo tradicional de plantar cana, que consiste em abrir sulcos na terra e colocar o cha-mado colmo-semente – um pedaço de cana –, que irá brotar no campo. No MPB, plantam-se mudas com 60 dias de ida-de, que são formadas por pequenos cor-tes de cana chamados de minirrebolos, nos quais estão as gemas que vão brotar. fo

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Vagens de feijão-carioca colhidas na plantação experimental em Campinas

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Melhoramento genético transforma o cultivo de soja, milho, feijão e algodão no país

agrônomo Alisson Chiorato se orgu-lha das variedades

de feijão que ajudou a desenvolver no Centro de Grãos e Fibras do IAC. Ele estu-da o melhoramento genético do feijoeiro há quase uma década e, com sua equipe, trabalhou na geração de 16 novas cultiva-res dessa leguminosa. É uma tarefa que exige conhecimento e paciência. Para se obter plantas cada vez mais produtivas e resistentes a pragas e doenças, é preciso cruzar variedades já conhecidas, gerar sementes, plantá-las em diferentes con-dições de solo e clima e aguardar o re-sultado, o que consome anos de testes. Em abril deste ano, Chiorato apresentou na Agrishow, a maior feira de tecnolo-gia agrícola da América Latina, realizada em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, duas novas variedades de feijão gourmet, destinadas à exportação. Uma é a cultivar IAC Tigre, que produz um feijão rajado de grão mais alongado, muito consumido no México e na Europa. A outra, a cultivar IAC Nuance, é a primeira variedade na-cional de um feijão do tipo cranberry, com

grãos e fibras

Fonte de riqueza

grãos de casca cor de avelã e listras púr-pura, bastante aceito nos Estados Unidos, no Canadá e também na Europa. “Antes de criarmos essa cultivar, quem plantava esse feijão no Brasil usava sementes im-portadas”, conta Chiorato.

No ano anterior, ele e sua equipe já haviam lançado na Agrishow outra va-riedade do feijão-carioca, há tempos o preferido dos brasileiros. É a IAC Sinto-nia, que gera um feijão com casca creme rajada de marrom e alta produtividade. A depender da época de plantio, essa variedade rende quase 4 toneladas por hectare (ton/ha), cerca de 12% mais do que a cultivar Milênio, da geração ante-rior. “Conseguimos uma planta de porte ereto, sistema radicular robusto, resis-tência à seca e às pragas, além de maior produtividade por área plantada”, ex-plica Chiorato, atual diretor do Centro de Grãos e Fibras.

Com a Sintonia, o IAC chegou à 12a geração de cultivares de feijoeiro tipo carioca, resultado de quase cinco déca-das de melhoramento dessa variedade da leguminosa. “O melhoramento do

riCardo ZorZetto

feijão começou em 1932, mas o grande impulso dado a essa cultura aconteceu no final dos anos 1960, quando o IAC lançou a variedade de feijão-carioca”, conta o agrônomo Sergio Augusto Morais Carbonell, diretor-geral do IAC e pesqui-sador especializado em feijão.

Em meados dos anos 1960, equipes do instituto identificaram em uma fazenda no município de Palmital, no oeste de São Paulo, uma variedade de feijoeiro mais produtiva que as então cultivadas no país. Era uma planta que dava grãos com casca de cor creme e listras mar-rons, apelidada de carioquinha pelo dono da propriedade, por lembrar a pelagem dos porcos dessa raça criados ali e não por ter algo a ver com o Rio de Janeiro. Após testes e cruzamentos feitos por equipes do instituto, ela foi lançada como cultivar em 1969 e, seis anos mais tarde, já era a mais plantada em todo o estado. Hoje 70% do feijão produzido no país é do tipo carioca.

“Esse trabalho fez o consumo do fei-jão-carioca superar o das variedades an-tes tradicionais, como o rosinha, o roxi-nho, o manteiga e o jalo, e permitiu que o cultivo se tornasse um negócio viável no Brasil”, afirma Chiorato. Os feijões cul-tivados antes do carioca apresentavam baixa produtividade (500 quilos por ha). Hoje o país é o terceiro maior produtor de feijão no mundo. São quase 3 milhões de ha plantados que devem resultar na colheita de 3,3 milhões de toneladas de feijão – estima-se que quase 20% sejam cultivares desenvolvidas no IAC.

Plumas do camPoA maior parte do trabalho no Centro de Grãos e Fibras consiste no melhoramento genético e no desenvolvimento de culti-vares não apenas de feijoeiro, mas tam-bém de algodoeiro, amendoinzeiro, ar-roz, aveia, trigo, milho e outros grãos e plantas fibrosas. No caso do algodoeiro, o esforço de aumentar a área plantada e a produtividade começou no IAC com o engenheiro-agrônomo maranhense Rai-mundo Cruz Martins. Em 1924, ao retor-nar de um período de estudos nos Estados Unidos, Martins passou a selecionar as variedades de algodoeiro mais produti-vas entre as existentes em São Paulo e a distribuir as sementes melhoradas, para alavancar a produção da fibra no estado.

As cultivares de algodoeiro do IAC substituíram, em parte, os cafezais e de-lé

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ram novo fôlego à agricultura paulista depois da crise da bolsa de Nova York de 1929. “As duas culturas criaram as condições básicas para a industrialização de São Paulo, porque geravam riquezas e introduziam moedas fortes. Fazendeiros e empreendedores conseguiram com-prar equipamentos”, escreveu Armando Conagin, engenheiro-agrônomo e esta-tístico do IAC, no livro Ciência da terra, publicado em 2008 em homenagem aos 120 anos do IAC.

As lavouras de algodoeiro, inicial-mente restritas à região de Campinas e Americana, espalharam-se por todo o interior. Nas décadas de 1950 e 1960, os algodoeiros ocuparam 1 milhão de ha de terras paulistas. “Antes do surgimento da Embrapa e do Instituto Agronômico do Paraná, nos anos 1970, todo o algodão plantado no Brasil tinha como origem o IAC”, afirma o engenheiro-agrônomo Edivaldo Cia, que iniciou sua carreira de pesquisador no IAC em 1967 e há dois anos está aposentado. “Fornecíamos se-mente para todo o país”, lembra.

O programa de melhoramento do al-godoeiro nunca foi interrompido e gerou 30 cultivares da planta. Os mais recentes, como o IAC RDN, de 2016, e o IAC FC 1 e o IAC FC2, que produzem fibras colori-das, são resistentes a múltiplas doenças e pragas. Nos anos 1980, a chegada de uma nova praga ao país – o bicudo (An-thonomus grandis), besouro que danifica o botão do algodoeiro – fez essa cultura migrar de São Paulo e do Paraná para os estados do Centro-Oeste e do Nordes-te. Na década seguinte, multinacionais produtoras de sementes entraram no

mercado nacional e disseminaram as variedades de algodão transgênico, resis-tentes a lagartas e ao uso de herbicidas, que hoje dominam o cultivo do algodão no Brasil. Em cinco décadas, a quanti-dade de semente usada diminuiu 85% e a produtividade aumentou quase 40% – hoje é de 3,7 ton/ha. A área plantada no país continua na casa de 1 milhão de ha e o Brasil é o quinto maior produtor do mundo. “Nossas variedades são tão produtivas quanto as transgênicas, des-de que se faça o controle adequado de pragas e plantas daninhas”, afirma Cia.

Fora de éPocaA equipe do IAC voltou a fazer história no início dos anos 1990, quando o gover-no federal extinguiu a Comissão para a Compra do Trigo Nacional (Cetrin), ór-gão ligado ao Banco do Brasil e responsá-vel por adquirir a produção brasileira do grão, cultivado nos estados da região Sul logo após a colheita da soja. Sem o estí-mulo da compra garantida, agricultores do Paraná, do sudoeste de Mato Grosso do Sul e de São Paulo substituíram o trigo pelo milho. Passaram a usar a sobra das sementes do plantio tradicional, feito no verão, em um segundo plantio, no outono-inverno, que resultava em uma produção menor, a chamada safrinha.

À época, recém-formado e contratado pelo IAC, o engenheiro-agrônomo Aild-son Pereira Duarte trabalhava na região de Assis, no oeste paulista, quando es-

sementes de feijão que integram a coleção do Centro de grãos e fibras

Plumas de fibra colorida produzidas por uma variedade de algodoeiro desenvolvida recentemente

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se movimento começou. Ele percebeu a transição e decidiu ajudar. Com sua equi-pe no IAC, iniciou experimentos para selecionar as cultivares mais adequadas ao plantio fora de época e realizou testes para definir a melhor estratégia de adu-bação e de controle de pragas, doenças e plantas daninhas. O trabalho desse e de outros grupos fez a produtividade do milho safrinha dobrar em pouco mais de duas décadas, alcançando os atuais 5,5 ton/ha, e contribuiu para mudar o padrão de cultivo desse cereal no país. “Houve uma migração temporal e espacial da pro-dução do milho”, resume o pesquisador.

O plantio do safrinha se disseminou por São Paulo, Mato Grosso do Sul e pelo Paraná, tradicionais produtores do ce-real, e avançou por Goiás, Mato Grosso e, mais recentemente, Rondônia, Tocan-tins, Maranhão e Piauí. Dos 17 milhões de hectares de milho hoje cultivados no Brasil, o terceiro produtor mundial do grão, 63% são de milho safrinha, que de-ve responder por dois terços dos 97 mi-lhões de toneladas previstas para serem colhidas em 2017.

Antes plantado a partir de março, o milho safrinha agora é semeado também em janeiro e fevereiro. Usa-se o sistema de plantio direto, no qual as máquinas depositam sementes no solo logo após a colheita da soja, sem a necessidade de revolver a terra, como antes. Foi uma transformação com múltiplos ganhos: diminuiu a perda de água do solo e a ne-cessidade de adubação tornou-se menor do que a do milho plantado no verão, porque bactérias das raízes da soja aju-dam a fixar nitrogênio no solo. “Entender como funcionava a sucessão dessas duas culturas foi importante para aumentar a produção”, conta Duarte.

O trabalho de adaptação e melhora-mento do milho safrinha é desdobra-mento de uma história iniciada em 1932, quando o engenheiro-agrônomo Carlos Krug e sua equipe de pesquisa implan-taram no IAC um programa – o segundo do mundo – para a produção de híbridos de milho, até então plantavam-se apenas variedades de linhagem pura. Adapta-das ao uso de fertilizantes e herbicidas, as cultivares do IAC predominaram no mercado nacional até a década de 1970 – uma delas, a HMD 7974, foi comercia-lizada durante 10 anos, três vezes mais que a média das cultivares atuais. Hoje o mercado de sementes é dominado por hí-

bridos, principalmente transgênicos, de empresas estrangeiras. Depois de produ-zir cultivares convencionais resistentes à seca e tolerantes à presença de alumínio no solo, o que permitiu a expansão dessa cultura para áreas de menor fertilidade natural, o IAC passou a se dedicar, sob a coordenação dos pesquisadores Eduar-do Sawazaki e Maria Elisa Paterniani, ao desenvolvimento de cultivares de milhos especiais, como o milho-branco, para canjica, o milho-verde e o milho-pipoca.

o grão do séculoDe todos os programas de melhoramento do IAC, o que possivelmente gerou maior impacto na economia nacional foi o da adaptação da soja ao Cerrado. De origem asiática e cultivada há quase 3 mil anos, a soja cresce bem em regiões de clima temperado, com dias curtos e noites lon-gas. Chegou à Europa no século XVIII e em 1882 já era plantada de forma expe-rimental na Bahia. Em 1889, o químico austríaco Franz Wilhelm Dafert (1863-1933), primeiro diretor da Imperial Es-tação Agronômica, iniciou os primeiros testes em Campinas com o grão, que na virada do século passou a ser distribuído

pela Secretaria de Agricultura do estado para quem quisesse plantá-lo. Em mea-dos dos anos 1920, pesquisadores do IAC começaram a indicar o cultivo da soja pa-ra a recuperação de terras exauridas de nutrientes, mas levaria tempo para que uma transformação radical ocorresse.

Em 1952, o engenheiro-agrônomo Shi-ro Miyasaka (1925-2017), o primeiro imi-grante japonês a doutorar-se em agro-nomia no Brasil, iniciou o programa de melhoramento da soja usando sementes trazidas dos Estados Unidos e do Japão. Em 1957, ele identificou variedades menos sensíveis a períodos mais longos de luz e às baixas temperaturas que na década seguinte serviriam de base para o trabalho de melhoramento dos engenheiros-agrô-nomos Romeu Kiihl, então pesquisador do instituto, e Manoel Albino Coelho de Miranda. Associados à seleção de varie-dades, estudos de adubação e de caracte-rísticas do solo, feitos por Hipólito Mas-carenhas e Eli Sidney Lopes, em paralelo com pesquisas realizadas na Embrapa, permitiram demonstrar que seria viável plantar soja nas terras mais ácidas e en-solaradas do Cerrado, revolucionando o cultivo do grão no país. Hoje o Brasil é o segundo produtor mundial de soja, que desempenha na economia nacional o pa-pel que o café teve há um século. Em 2017, foram colhidas 114 milhões de toneladas de soja – o equivalente a 48% da safra nacional de grãos. Metade desse volume vem do Cerrado. ▼Fo

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Casa de vegetação na qual se iniciou, nos anos 1950, o desenvolvimento de cultivares de soja adaptadas aos trópicos

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Centro Sylvio Moreira alia pesquisa, acervo de variedades e melhorias na produção de frutas cítricas

o final de junho, como parte das comemora-ções dos 130 anos do

Instituto Agronômico de Campinas, a equipe do Centro de Citricultura Sylvio Moreira, em Cordeirópolis, preparava-se para lançar a tangerina Maria. Entre do-ce e azedo, o fruto aromático, suculento e com poucas sementes é um exemplo do trajeto entre laboratório e citricultor que caracteriza o trabalho do centro, que tem 14 pesquisadores, além de estudantes e estagiários de pós-doutorado, e se pre-para para completar 90 anos em 2018. “É a primeira variedade de tangerina prote-gida do IAC”, afirma o agrônomo Marcos Machado, diretor do Centro de Citricul-tura. A proteção é a inclusão no acervo de plantas matrizes que serve de referência para verificação das variedades.

CitroS

Laboratório, campo e mesa

Maria guiMarãeS

de resistência à doença e muita paciência para que as plantas começassem a pro-duzir de maneira estável para submeter os frutos a testes de paladar.

O caminho ao mercado não terminou de ser percorrido. Uma vez registrada, a nova variedade de tangerina passa a estar disponível na forma de borbulhas, os pe-quenos brotos que dão origem às mudas, para viveiristas interessados – que por sua vez fornecem aos citricultores. “Ain-da estamos estudando qual é o melhor porta-enxerto e o melhor espaçamento para plantio”, diz Mariângela. Mesmo assim, ela imagina que o fruto possa estar no mercado em poucos anos com uma produção ainda modesta.

Machado explica que os carros-chefes da instituição são a busca por resistência a doenças e por qualidade dos frutos, sem-

Os cruzamentos que deram origem à Maria foram feitos durante o doutorado da engenheira-agrônoma Mariângela (daí o nome) Cristofani-Yaly, defendido há 20 anos. “Foi um cruzamento entre tangerina e laranja que inicialmente deu origem a frutos com característica de laranja e ou-tros de tangerina”, conta a pesquisadora hoje integrante do corpo de pesquisado-res do centro, e que buscava resistência à mancha marrom de alternária, doença que afeta as variedades Murcott e Pon-kan. A doença obriga produtores a aplicar fungicida por até 25 vezes ao ano, o que representa um alto custo e justifica a bus-ca de plantas resistentes que possam pro-duzir frutos sem a necessidade frequente de aplicações de defensivos. De lá para cá, a seleção das melhores plantas envolveu o mapeamento genético dos marcadores

Cultivo em meio de cultura permite

estudar mudas no Laboratório

de Biotecnologia

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genético nas plantas das quais a ninfa do inseto se alimenta, de maneira a com-plementar o combate e reduzir o uso de inseticidas. Os próximos passos são fazer experimentos de campo e buscar parceiros interessados em desenvolver o produto. O pesquisador ressalta que os resultados são possíveis graças aos esforços de sequenciamento de citros empreendidos no passado. “É a nossa enciclopédia.”

Foi com a experiência do sequencia-mento do genoma da bactéria Xylella fas-tidiosa – causadora da clorose variegada dos citros (CVC) –, finalizado em 2000, que a bióloga Alessandra Alves de Sou-za começou a carreira com cítricos em que até hoje combate a CVC. Há alguns anos ela descobriu que a N-acetilcisteína (NAC), substância ativa de um medica-

mento de uso comum para problemas respiratórios em crianças, poderia ser usada para desfazer o biofilme forma-do pelas bactérias dentro dos vasos das plantas (ver Pesquisa FAPESP nº 214). Em testes de campo, ela e o agrônomo Helvecio Della Coletta Filho avaliaram o impacto da aplicação do medicamento para a safra, em parceria com a empresa Citrosuco. “As plantas que receberam NAC aumentaram o tamanho dos fru-tos e a produtividade”, conta Alessan-dra. Uma surpresa foi ver que as plantas sadias, quando submetidas aos trata-mentos, tiveram um desempenho ainda melhor: produção aumentada e frutos maiores do que as não tratadas. Mais uma vez, a comparação com a ação em seres humanos ajuda a entender: “Nos Estados Unidos, a NAC é vendida co-Lé

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pre tendo em vista que 80% da produção de cítricos corresponde à indústria de suco de laranja. Restam 20% para o mer-cado de frutos de mesa, no qual há mais espaço para desenvolver novos sabores.

O diretor do centro coordena também o setor de biotecnologia, cujos projetos vão da pesquisa básica à aplicação prá-tica. Um exemplo recente é o projeto de doutorado do biólogo Diogo Man-zano, que buscou maneiras de controlar o inseto que transmite a doença huan-glongbing (HLB), uma das mais preo-cupantes pragas de cítricos. “Com RNA de interferência conseguimos silenciar alvos que reduzem a sobrevivência do inseto”, explica Machado, orientador do trabalho, sobre o artigo que foi publi-cado em março na revista PLOS ONE. A ideia é borrifar a solução com o agente

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Vocação paraa viticultura

mo suplemento antioxidante e ajuda em doenças nas quais há um aumento de estresse”, explica a pesquisadora. Pelo jeito, mesmo as plantas sadias sofrem com estresse oxidativo.

A bactéria Xanthomonas citri, causa-dora do cancro cítrico, tem semelhanças genéticas com a Xylella e também age formando um biofilme – sobre as folhas, e não dentro da planta. Segundo Alessan-dra o tratamento atual envolve cobre, um metal tóxico em grandes quantidades. A bióloga Simone Picchi, em estágio de pós-doutorado no grupo de Alessandra, mostrou que a NAC é eficaz contra esse patógeno, conforme publicou em 2016 na revista Plant Pathology. Experimentos de campo indicam que o tratamento com a substância é mais eficaz sozinho do que combinado com cobre, um resultado sa-lutar. “Para aplicar o cobre é preciso se proteger porque é perigoso aspirá-lo”, diz Alessandra. “Já o NAC é bom para a saúde.” Com base nisso, Simone está de-senvolvendo um produto para aplicação do fármaco em citros, no âmbito do pro-grama Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe) da FAPESP.

Enquanto isso, Helvecio Della Coletta tem rastreado geneticamente a bactéria X. fastidiosa em outras plantas. Ele es-teve envolvido, assim como Alessandra, no estudo e na tentativa de combate à praga que acometeu oliveiras milenares no sul da Itália (ver Pesquisa FAPESP nº 233). Embora o Brasil não tenha tradi-ção de produção de azeitonas, a serra da Mantiqueira tem um cultivo crescente de oliveiras e o Brasil já está entre os

quatro países que relataram a presença de X. fastidiosa nessas árvores, uma su-bespécie diferente da registrada na Itá-lia. “A rastreabilidade genética mostra que a bactéria saiu de plantas de café”, explica Coletta, que este ano publicou a caracterização das subespécies na revista Phytopathology. Pesquisas em andamen-to investigam a relação entre a bactéria e as oliveiras em condições tropicais.

atuação práticaEle também está à frente de outro tipo de monitoramento de doenças, na Clínica Fi-topatológica. Trata-se de uma prestação de serviço aos produtores que envolve a produção certificada de mudas cítricas, a vigilância de doenças nos pomares e o atestado de sanidade aos frutos cítricos destinados à exportação que analisa entre 800 e 1.000 amostras por mês.

O combate a doenças também requer adubação adequada, já que plantas bem nutridas, além de mais produtivas, po-dem ser mais tolerantes a doenças. Mas não basta concentrar-se na nutrição sem estudar o controle da doença, alerta o engenheiro-agrônomo Rodrigo Boaretto. Ele conta que o grupo de nutrição for-mado por pesquisadores dos centros de Citricultura e de Solos do IAC teve uma postura crítica diante da estratégia nor-te-americana de combater o HLB: apli-car um pacote de micronutrientes e ou-tros compostos para suprir a deficiência de absorção de nutrientes que a doença causa nas plantas. A expertise brasileira sugeria a prática por vezes drástica de erradicar as plantas infectadas e eliminar

em Jundiaí, o Centro de Frutas contribui para o fortalecimento do setor vitivinícola da região. “Já temos tradição na produção de uvas para mesa, agora existe uma tendência para o aumento na produção para vinho”, conta a agrônoma Mara Moura, diretora do centro.

todos os anos a equipe avalia a produtividade e a qualidade das 280 variedades de uva cultivadas na coleção de germoplasma e uma delas se mostrou promissora para plantio em Jundiaí e no noroeste do estado. experimentos em campo e avaliação dos frutos em laboratório atestaram a produtividade das plantas e a qualidade dos frutos. “o vinho produzido é tranquilo e neutro”, descreve Mara. uma caracterização bioquímica mais aprofundada do mosto e do vinho ainda deve ser feita antes do lançamento da variedade, prevista no máximo para 2019.

Na busca por fomentar a atividade vitivinícola que está na base da cultura dessa região de colonização italiana, o Centro de Frutas este ano também recebeu, de uma instituição parceira na itália, amostras de 28 variedades de uvas vitiviníferas para serem enxertadas e testadas nas condições locais.

o plantio de uva de mesa e das destinadas à produção de vinho já interessava ao fundador e primeiro diretor do instituto, o austríaco Franz Wilhelm Dafert (1863-1933). ele trouxe, no final do século XiX, exemplares norte-americanos e europeus para produção de vinho e iniciou estudo – um programa que já resultou em 62 variedades de uvas. técnicos agrícolas preparam material para produção de mudas

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o inseto transmissor, adotada por gran-de parte dos citricultores brasileiros. “O resultado é que hoje praticamente 100% dos pomares norte-americanos têm a doença”, afirma. O combate implacável à doença, associado à nutrição e outras práticas de cultivo, permitiu aumentar a produtividade por área plantada. “Há 25 anos produzíamos 25 toneladas por hectare e hoje o padrão é, em média, 40 toneladas por hectare”, resume o enge-nheiro-agrônomo Dirceu Mattos Junior.

Outra doença que pode se tornar mais severa conforme a nutrição é a estreli-nha, ou podridão floral, que em 2009 causou uma perda na safra que em al-gumas fazendas chegou a 80%. O grupo mostrou que o acréscimo de cálcio cria condições menos favoráveis ao estabele-

cimento da doença e aumenta a produ-tividade. Essas mudanças, assim como o manejo de nutrientes necessário nos anos 2000 para fazer frente à substitui-ção dos porta-enxertos atacados pela morte súbita dos citros (MSC), acaba-ram transformando os percalços em van-tagens. “A cada desafio, novos avanços em conhecimento e ganhos em produ-tividade são obtidos”, conclui Mattos. O desafio agora é entender melhor como a nutrição pode trazer benefícios em produtividade e na qualidade das frutas.

Experimentos de campo feitos pelo grupo do agrônomo Fernando Alves de Azevedo também mostram que práti-cas de cultivo podem trazer benefícios aos citricultores. Ele defende o uso da roçadeira ecológica, que corta o mato

das entrelinhas do pomar e joga a palha para a base das árvores, mantendo o solo coberto. “Isso reduz a perda de água e a erosão, além de melhorar a composição química, física e microbiológica do solo”, explica. O solo mais úmido se torna mais propício para a proliferação de bactérias e fungos benéficos às plantas cítricas, co-mo as micorrizas, e a barreira física im-posta pela palha dificulta a emergência de plantas daninhas, conforme publica-do este ano na revista Weed Technology. “Observamos um aumento de 34% na produtividade do pomar, com uma queda de 50% no uso do herbicida glifosato.”

O produto final está sempre à vista no Centro de Citricultura. A transmissão do conhecimento produzido ali é feita por meio de boletins, distribuídos todos os meses para 1.200 produtores, e por even-tos dirigidos a esse público. Alguns são específicos para determinados temas, como certas doenças, porta-enxertos e informações para viveiristas. A semana da citricultura, que acontece todos os anos e já teve 39 edições, é mais ampla e reúne exposições de avanços no conhe-cimento realizadas pelos pesquisadores do centro. “Somos um centro de produ-to e temos por obrigação pensar nele”, resume Machado. ▼fo

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Plantas produzidas no laboratório e em estufas (no alto) são fornecidas para citricultores e mantidas como referência para identificação (ao lado)

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Tubérculo vitaminado e com grande produtividade teve importância social em São Paulo

MANDIOCA

Cultivo sem interrupções

NelDSON MArCOlIN

m meados dos anos 1980, uma equipe de técnicos e pesqui-sadores do IAC começou um

trabalho de coleta de variedades nativas em todo o estado de São Paulo cultiva-das na periferia de pequenas cidades. O cultivo era feito por agricultores que plantavam hortas para consumo próprio. “Naquele período coletamos 750 varie-dades de mandioca que foram trazidas por migrantes de suas regiões de origem. Verificamos que havia 250 variedades diferentes”, conta a agrônoma Teresa Losada Valle. A posterior análise das va-riedades nativas mostrou que elas tinham a metade da produtividade de uma culti-var muito bem-sucedida, a IAC 576-70.

“Começamos a distribuir nossa cul-tivar em parceria com a Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati) e as prefeituras para que fossem plan-tadas pelos pequenos agricultores das áreas urbanas”, diz Teresa. Rapidamente essa variedade se disseminou: além de produzir o dobro de raízes, o alimento era mais nutritivo, com maior quanti-dade de carotenoides, um precursor da produção da vitamina A no organismo.

Também melhorava o orçamento fami-liar, pois o excedente era vendido para a vizinhança. Essa variedade, conhecida como amarelinha, é também mais resis-tente a doenças.

O trabalho de distribuição da IAC 576-70 durou por volta de cinco anos e se tornou importante para pequenos agri-cultores, que começaram a abastecer os restaurantes e mercados das cidades e a indústria de congelados. Consequente-mente, a renda aumentou e isso os aju-dou a se manter na atividade agrícola. Segundo a pesquisadora, essa história de sucesso não está contemplada nas estatísticas e estudos.

A amarelinha tornou-se a mandioca de mesa mais consumida no Brasil e é consequência dos estudos realizados no IAC desde 1935, quando foi criada a seção de Raízes e Tubérculos. Hoje as pesquisas estão concentradas no Centro de Horticultura do instituto. “Para sorte dos pesquisadores que vieram depois, os trabalhos com mandioca nunca foram in-terrompidos”, conta Teresa. A variedade IAC 576-70 é resultado do cruzamento de duas cultivares: a IAC 14-18 – de alta

produtividade e resistência à bacterio-se – com a Ouro-do-Vale, que tem polpa amarela e boas características sensoriais. O agrônomo Araken Soares Pereira (1916-2001) começou a trabalhar no desenvol-vimento da IAC 576-70 em 1970. O traba-lho se intensificou a partir de 1982 e no início dos anos 1990 estava pronta para o plantio comercial. Hoje, a raiz responde por praticamente a totalidade das 160 mil toneladas de mandioca de mesa vendida em São Paulo anualmente.

Para uso na indústria, as características da raiz têm de ser diferentes. Como é uti-lizada na produção de farinha e para ex-tração de amido, a quantidade de matéria seca deve ser grande para proporcionar bom rendimento. A variedade IAC-12, por exemplo, é mais utilizada no Cerrado por-que tolera bem as condições locais e tem alto teor de matéria seca (40%).

A mandioca é originária da Amazônia e foi domesticada há cerca de 7 mil anos pelos povos pré-colombianos. É cultiva-da em todos os estados brasileiros duran-te o ano inteiro. Em São Paulo, sua pro-dutividade média é de 16 toneladas por hectare, uma das mais altas do mundo. ▼

Folha de mandioca:

cultivares atuais têm maior qualidade nutricional

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Projetos buscam identificar novas propriedades em culturas já conhecidas

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Em busca do novo

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tral, já está começando a conquistar no-vos horizontes graças aos esforços de pesquisa no IAC. Chamada popularmen-te de falsa erva-cidreira, ou falsa-melissa, a Lippia alba é tradicionalmente consu-mida como chá, atuando como calmante e anti-inflamatório naturais.

Em 2003, o melhorista Walter José Siqueira começou a estudar a biologia da Lippia alba, com o objetivo de explorar seu potencial aromático. O trabalho ini-ciou com a coleta de diversas amostras, o que levou à consolidação, a partir do melhoramento genético, de um banco com 90 variedades de Lippia alba com aspectos morfológicos diferentes uns dos outros. A partir dessa coleção, Si-queira identificou compostos da planta que despertam o interesse das indústrias farmacêutica e alimentícia. “Em parce-ria com a empresa Beraca, em Belém, no Pará, temos obtido sucesso no plantio de L. alba na região e em breve come-çaremos a extração do óleo da planta”, informa Siqueira.

A tarefa de buscar na natureza as me-lhores variedades de determinada es-pécie faz parte do cotidiano do biólogo Luís Carlos Bernacci, pesquisador do Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento do Jardim Botânico do IAC. Bernacci dedica-se a identificar espécies de ma-racujá e indicar diferenças entre elas. “O trabalho de bioprospecção ajuda a reconhecer elementos para a distinção das cultivares de maracujá e a identifi-car as características mais apropriadas para o comércio, como a coloração da casca”, diz Bernacci, ao explicar que o IAC foi responsável pela padronização do cultivo de maracujá azedo no Brasil, em meados da década de 1990. ▼

lidade por meio de cruzamentos entre plantas com características agronômicas complementares, para se chegar a cul-tivares próprias para o plantio”, explica Colombo.

De acordo com o pesquisador, os agri-cultores geralmente resistem à ideia de investir em uma nova cultura, ainda pou-co explorada comercialmente. “O setor privado não costuma investir naquilo que é desconhecido. Por ser uma ins-tituição pública, o IAC pode desbravar novas cultivares, explorar seu potencial e apresentar dados científicos que possam convencer a indústria.” Outro exemplo de planta com potencial, a Lippia alba, planta típica da América Latina e Cen-

sucesso de cultiva-res desenvolvidas no Instituto Agronômico

de Campinas (IAC) ocorreu em gran-de parte pelas pesquisas no campo do melhoramento genético. O objetivo é, cruzando diferentes variedades, lançar cultivares mais resistentes a doenças, com maior produtividade e boas carac-terísticas nutricionais. Foi esse conjunto de técnicas que possibilitou não apenas a geração de novas cultivares de cafeeiro, soja, milho, feijoeiro, cana-de-açúcar, frutas, hortaliças, entre muitos outros, mas também a domesticação de espécies promissoras para a agricultura no país. “Uma das missões do instituto é agregar valor a recursos genéticos pouco explora-dos ou até mesmo desconhecidos”, diz o engenheiro-agrônomo Carlos Colombo, diretor do Centro de Recursos Genéticos Vegetais do IAC.

Colombo coordena um projeto que procura identificar e explorar a varia-bilidade genética da macaúba, palmeira presente em quase todo o Brasil. O óleo extraído do fruto dessa planta pode ter diversas aplicações, especialmente na indústria alimentícia e de cosméticos e na produção de biodiesel.“Tenho viaja-do pelo país atrás de plantas de macaú-ba mais produtivas e de baixo porte. O objetivo é encontrar plantas superiores, avaliar suas progênies ou gerar variabi- Futuro promissor: óleo da macaúba é testado no centro de recursos Genéticos vegetais

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Centro de Engenharia e Automação tem hoje programa de referência em aplicação de agroquímicos no campo

EngEnhAriA AgríColA

Solos mais saudáveis

rodrigo dE olivEirA AndrAdE

segundo o agrônomo Hamilton Humber-to Ramos, pesquisador do CEA e coor-denador do Aplique Bem. “Muitos têm baixa escolaridade e não sabem usar os pulverizadores ou mesmo ler o rótulo dos produtos com as instruções”, explica. “Vários aplicam a substância em doses acima do recomendado e de maneira ina-dequada para as pragas que pretendem controlar.” O uso incorreto dos agroquí-micos também pode gerar perdas eco-nômicas da ordem de R$ 2 bilhões por ano, além de representar um entrave à sustentabilidade da agricultura.

No Aplique Bem, técnicos e pesqui-sadores visitam propriedades rurais em diferentes regiões do país e ensinam a

Lançado em maio de 2007, em parceria com a empresa Arysta Life Sciences, a iniciativa prevê a avaliação de pulveri-zadores e do processo de pulverização, oferecendo treinamento para a aplicação de agroquímicos, de modo a prevenir contaminações, reduzir o desperdício e mitigar impactos no ambiente.

O Brasil é o maior consumidor mun-dial de agroquímicos. Em média, cerca de 130 mil toneladas de defensivos são aplicadas por ano nas lavouras do país, segundo a Agência Nacional de Vigilân-cia Sanitária (Anvisa). O uso inadequa-do dessas substâncias pelos produtores rurais é um dos principais problemas impostos hoje à agricultura brasileira,

ndispensáveis à agricultura de lar-ga escala, os agroquímicos podem representar sérios riscos à saúde

humana e ao ambiente se não aplicados corretamente. Esses produtos costumam ser pulverizados manualmente sobre as lavouras ou com o auxílio de tratores. Mesmo quando usam equipamentos de proteção, como luvas, máscaras e óculos, os trabalhadores podem se contaminar. Com o propósito de orientá-los sobre o manejo adequado dos defensivos quími-cos, o Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA-IAC), em Jundiaí, São Paulo, investe em diversas estratégias de capacitação profissional. A principal é o programa Aplique Bem.

Técnicos do Aplique Bem durante treinamento de produtores para o emprego correto de pesticidas e fertilizantes

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maneira correta de aplicar esses produ-tos. Nessas visitas, eles também avaliam e calibram os pulverizadores usados pe-los trabalhadores. “O treinamento para a aplicação de defensivos químicos é feito com base nas culturas com as quais os produtores trabalham, os equipamentos que manejam e as substâncias que estão acostumados a aplicar”, diz Ramos. Ao redor de 6 mil trabalhadores são trei-nados por ano. Desde que foi lançado, o Aplique Bem já capacitou 55 mil pro-dutores em 22 estados. Durante esse pe-ríodo, aproximadamente 900 pulveriza-dores foram avaliados

Isso permitiu a construção de um ban-co de dados sobre a qualidade das má-quinas em uso no Brasil. Os interessados podem solicitar as informações ao IAC e à Arysta, que as fornece na forma de relatórios e gráficos. Os dados podem ser analisados por tipo de pulverizador, marca, região em que foi usado, desgaste de componentes etc. “Essa análise lança luz sobre os principais problemas en-volvendo esses equipamentos e auxilia as empresas fabricantes na correção de possíveis falhas”, destaca o agrônomo.

O sucesso do Aplique Bem segue na esteira de outros projetos, como o Pro-grama de Qualidade em Equipamentos de Proteção Individual (Quepia). Cria-do em 2006 em parceria com empresas produtoras de equipamentos de prote-ção individual (EPI), o programa visa aprimorar a qualidade das vestimentas agrícolas usadas pelos profissionais do campo para aplicar agroquímicos. O tra-balho desenvolvido no âmbito do Quepia fez com que o IAC se tornasse um dos coordenadores do Consórcio Internacio-nal para Desenvolvimento e Avaliação de EPI para Aplicadores de Agrotóxicos e Trabalhadores em Período de Reentrada.

Em outra frente, o CEA criou a Uni-dade de Referência em Tecnologia e Se-gurança na Aplicação de Agrotóxicos. A ideia é promover o treinamento de agen-tes multiplicadores para que estendam o conhecimento adquirido no programa às suas comunidades. “Pretendemos di-fundir o conhecimento sobre o controle eficaz de pragas e doenças nas lavouras e incentivar a adoção de boas práticas de manejo de agrotóxicos”, explica Ramos.

Outro projeto importante é o Progra-ma de Adjuvantes da Pulverização. Lan-çado há doze anos, o projeto se propõe a desenvolver métodos de avaliação de

adjuvantes agrícolas, substâncias acres-cidas na preparação dos defensivos pa-ra aumentar sua eficácia. A proposta é classificar esses produtos de acordo com sua funcionalidade, isto é, se ajudam a reduzir a evaporação do agroquímico ou se favorecem uma melhor fixação da substância às plantas. Mecanização agrícolaCom uma economia dinâmica, impul-sionada pela cafeicultura, o governo do estado decidiu, em 1938, pela criação de uma divisão que promovesse a mecani-zação agrícola, a conservação do solo e que orientasse as obras de engenharia rural em São Paulo. “Criou-se, assim, a Seção de Mecânica Agrícola, Irrigação e Drenagem, ligada à Divisão de Solos, Mecânica Agrícola e Tecnologia”, con-ta o agrônomo Moises Storino, diretor

Algumas das primeiras máquinas introduzidas nas lavouras de São Paulo no final da década de 1930

do CEA. A seção teve vários nomes e, em 2002, passou a se chamar Centro de Engenharia e Automação.

O CEA hoje estende-se por 110 hectares e conta com la-boratórios e áreas dedicadas à realização de ensaios de tra-tores agrícolas, semeadoras e adubadoras, testes de protóti-

pos, EPIs e produtos fitossanitários. Den-tre as ações do CEA com impacto direto na agricultura, destacam-se o estudo da colheita seletiva da videira em pequenas propriedades, um novo sistema de cor-tador de base, com lâminas serrilhadas e inclinadas para a colheita mecanizada de cana-de-açúcar, e um projeto de monito-ramento da bacia do Rio Jundiaí-Mirim, em parceria com a prefeitura de Jundiaí e o Departamento de Água e Esgoto da cidade. Também estão sendo feitos estu-dos sobre biocombustíveis e tecnologia de produção, agricultura de precisão e de gestão agroambiental.

Apesar de sua importância, o CEA so-fre com a evasão de pesquisadores e a falta de reposição de mão de obra quali-ficada. Mais recentemente o centro pas-sou a lidar com a possibilidade de ser transferido para Campinas. ▼

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Instituto tem 212 pontos de coleta de informações climatológicas em todo o estado

mudanças clImátIcas

Dados em tempo real

marcos PIvetta

coleta sistemática de dados climáticos em território paulista remonta aos pri-

mórdios do IAC. Em 1890, o instituto inaugurou a estação meteorológica de Campinas, a mais antiga do estado. Hoje o IAC conta com uma rede de 212 pon-tos de coleta de informações climatoló-gicas que cobrem todo o estado. Além de fornecer dados em tempo real para os produtores agrícolas e fazer previ-sões de curto prazo, a rede fornece da-dos para construção e manutenção de uma série histórica detalhada sobre o clima. Mais recentemente, esses dados têm sido usados para fazer projeções de longo prazo sobre como diferentes ce-nários de mudanças climáticas podem afetar os rumos da agricultura em São Paulo nas próximas décadas. Os estu-dos sugerem que eventuais diminuições no regime de chuvas, sobretudo se elas forem da ordem de 20%, podem causar mais problemas nas lavouras do que um possível aumento na temperatura média entre 2 e 4 ºC.

“O fator chuva parece ser mais crí-tico do que a temperatura”, comenta o

engenheiro-agrônomo Orivaldo Bruni-ni, coordenador do Centro Integrado de Informações Agrometeorológicas (Ciia-gro) do IAC. “Um aumento de até 2 ºC, sem diminuição significativa de pluvio-sidade, não deve afetar muito as lavou-ras.” Mesmo que ocorram alterações no regime de chuvas, Brunini afirma que é possível mudar a época de plantio e de colheita de algumas culturas, como o amendoim e o algodão, e assim adequá--las às novas condições do clima. “Nos casos do café e da cana, dois cultivos importantes para o estado, não espera-mos ter de alterar a época de plantio em função das mudanças climáticas”, des-taca Brunini. O cenário mais pessimista do último relatório do Painel Intergo-vernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) menciona a possibilidade de a temperatura média global subir até 4 ºC no final deste século. Brunini, no en-tanto, destaca que é difícil prever o que deverá ocorrer com o clima no estado de São Paulo, situado em uma zona de transição climática. Aumentos de tem-peratura são considerados prováveis, mas não há consenso sobre a questão

das chuvas, se elas devem aumentar ou diminuir no território paulista.

Os trabalhos do Ciiagro simularam os possíveis impactos das mudanças cli-máticas no tamanho das áreas agrícolas capazes de abrigar 34 culturas de impor-tância econômica para São Paulo, desde cultivos tradicionalmente adaptados ao território paulista, como cana, café e la-ranja, até plantas que ganharam relevân-cia apenas nas últimas décadas, como as seringueiras para a produção de borra-cha. O IAC dispõe de um zoneamento climático para todo o território paulista, baseado nas temperaturas e índices de pluviosidade médios dos últimos 30 anos e nas preferências ambientais de cada cultivo, se adaptado à área seca ou úmida, se acostumado com zona fria ou quente.

cenáriosAs projeções usaram como base o zonea-mento atual de cada cultura, que discri-mina quais são as melhores (e também as piores) áreas do estado para esse cultivo. Em seguida, foi calculado se a extensão das áreas boas para plantio de cada cul-tura aumenta ou diminui em razão de mudanças na temperatura e, às vezes, também no regime de chuvas. Sete ce-nários foram simulados: diminuição de 2 ºC; aumento de 2 ºC; aumento de 2 ºC e acréscimo de 20% de chuva; aumento de 4 ºC; aumento de 4 ºC e acréscimo de 20% de chuva; aumento de 2 ºC e me-nos 20% de chuva; e aumento de 4 ºC e menos 20% de chuva.

Em linhas gerais, um aumento de até 2 ºC na temperatura média ampliou as áreas do estado consideradas adequadas para a maior parte dos cultivos. As zonas aptas para a agricultura diminuem de tamanho quando o aumento de tempe-ratura é acompanhado de uma diminui-ção de 20% no índice médio de chuva, segundo as projeções. A situação da cana ilustra essa tendência. A simples eleva-ção da temperatura não modifica de for-ma significativa o perfil do zoneamento agroclimático para o cultivo. Atualmente, quase todo o interior paulista depois de Campinas é considerado ao menos ade-quado para o plantio da cana. Mas, se a chuva também se reduzir em um quinto, o norte de São Paulo, região hoje mais seca, pode se tornar inviável para esse cultivo. Nesse cenário, apenas o centro do estado e o Vale do Paraíba ainda se-riam aptos para o plantio da cana. ▼

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Em 130 anos de trajetória, IAC multiplicou suas áreas de interesse para dar respostas a demandas dos produtores brasileiros

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Por uma agricultura rica e diversa

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austríaco Franz Wilhelm Dafert tinha 24 anos e

um título de doutor em química pela Universidade de Giessen, na Alemanha, quando desembarcou no Brasil, em ju-nho de 1887, contratado pelo governo do imperador Pedro II. Meses antes, quan-do trabalhava na Estação Experimental de Química Agrícola de Poppelsdorf, na cidade alemã de Bonn, Dafert rece-bera uma sondagem da embaixada bra-sileira em Berlim: gostaria de se mudar para o Brasil e implantar um centro de pesquisas agrícolas na mais rica região cafeeira do país? Não foi ocasional a es-colha de um químico especializado em solos para coordenar o que seria a Impe-rial Estação Agronômica de Campinas.

sede e centro experimental do Instituto Agronômico na década de 1920

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Dafert veio da Alemanha em 1887 para implantar técnicas de adubação. Ao lado, o Laboratório de Análise de solos no início do século XX

Prédio D. Pedro II, o mais antigo do IAC, construído em Campinas em 1888

A agricultura brasileira buscava superar o modelo colonial baseado na mão de obra escrava e caracterizado pelo uso exaustivo da terra, até o seu empobre-cimento e a busca de uma nova fronteira agrícola. A mudança era necessária para garantir mais produtividade com técni-cas de adubação e de melhoramento que já eram desenvolvidas em estações da Europa, como aquela em que o austría-co trabalhava. Também pesou o fato de a economia brasileira ser em grande parte

necessário diversificar a produção do país, desenvolvendo variedades de outras culturas para impulsionar a economia e garantir uma oferta variada de alimentos. Instalou-se em Campinas, numa área experimental adquirida pelo governo, mas a primeira impressão que causou não foi boa: fazendeiros que visitavam a estação não enxergavam utilidade nas experiências com adubos e com novas variedades apresentadas por Dafert e passaram a criticá-lo publicamente.

projeto embrionárioCom a queda do Império, o governo re-publicano rescindiu seu contrato em 1890 e ele retornou à Europa quando a estação campineira era pouco mais do que um projeto embrionário. Mas vol-tou dois anos depois para completar o trabalho. Ocorre que o governo paulista assumiu a área experimental e entregou a Dafert não apenas seu comando como também a tarefa de implantar uma esco-la de engenharia agronômica numa fa-zenda em Piracicaba recém-doada pelo fazendeiro Luiz de Queiroz. O austríaco logo delegou o encargo educacional a uma outra pessoa, já que seu interes-se era mesmo a pesquisa. E preparou o terreno para que o rebatizado Instituto Agronômico do Estado de São Paulo se tornasse referência, já nos anos seguin-tes, em fertilizantes para a cafeicultura e no desenvolvimento de variedades de cana-de-açúcar e da fruticultura.

ancorada no café e havia a preocupação em ter uma produção sempre pujante.

Dafert (1863-1933) aceitou o desafio. Alertou o governo imperial, contudo, de que existia pouco conhecimento cientí-fico sobre a agricultura brasileira e que talvez não pudesse dar respostas instan-tâneas. Minucioso, apresentou um plano que buscava soluções não apenas para os problemas do café, na época o principal produto de exportação do Brasil, como também contemplava a ideia de que era

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Em 130 anos de trajetória, o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) multi-plicou suas áreas de interesse e seguiu dando respostas a demandas da agri-cultura brasileira – mantendo-se fiel ao ideário do fundador. Sob o comando do agrônomo Theodureto Camargo, dire-tor do IAC entre os anos 1920 e 1940, a instituição estabeleceu suas primeiras estações experimentais em São Roque e em Jundiaí voltadas à viticultura para ajudar os colonos italianos a desenvolver no Brasil sua expertise na produção de vinho. Nas décadas seguintes, uma rede de estações experimentais espalhou-se por dezenas de municípios paulistas, cobrindo a maioria dos tipos de solo e de clima do Estado e garantindo boas condições de pesquisa, além de apoio aos agricultores.

Depois de a economia do café sucum-bir à crise de 1929, os pesquisadores do instituto tiveram um papel na expansão

reforma nove anos mais tarde. A gestão financeira teve uma mudança importan-te em 1970, com a criação de um Fundo Especial de Despesas que, na prática, revogou a possibilidade de o diretor da instituição contratar novos pesquisado-res e adquirir material de consumo sem autorização do governo – tal flexibilida-de permitia que o instituto arrecadasse recursos com a prestação de serviços e reinvestisse em suas atividades.

O perfil dos recursos humanos e dos pesquisadores se transformou ao longo do tempo. O número de funcionários chegou a mais de 2.500 nos anos 1970. Em 2016, havia 262 servidores apoian-do o trabalho dos 147 pesquisadores da instituição. “Quando ingressei no ins-tituto em 1978, cada ensaio de campo envolvia mais de 50 pessoas. Hoje, co-mo tudo está mecanizado, duas pessoas são suficientes”, afirma Orlando Melo de Castro, diretor do IAC entre 2004 e 2008 e atual coordenador da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), órgão da Secretaria Estadual da Agricultura que desde 2002 coordena a atividade de seis institutos estaduais de pesquisa, entre os quais o IAC.fo

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vista aérea do Centro Experimental Central do Instituto Agronômico

da cultura do algodão na década de 1940, aplicando técnicas de melhoramento genético que triplicaram o tamanho das fibras. Na mesma época, desenvolveram em cooperação com a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Univer-sidade de São Paulo (Esalq-USP) o pri-meiro milho híbrido nacional. Durante a Segunda Guerra Mundial, o pesquisador Olavo Boock coordenou o programa na-cional de produção de batatas-semente, insumo cuja importação sofreu restri-ções durante o conflito.

Em outubro de 1949, o IAC já era uma instituição de pesquisa reconhecida na-cionalmente quando sediou a primeira reunião anual da recém-criada Socieda-de Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que atraiu a Campinas cerca de 50 cientistas.

gestão financeiraÉ certo que dificuldades burocráticas e restrições orçamentárias próprias da ad-ministração pública também marcaram a história do IAC. Em 1945, a instituição perdeu parte da autonomia, com sua vin-culação ao Departamento de Produção Vegetal, que só seria retomada em uma

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Os pesquisadores do instituto, que até o século passado eram recrutados prin-cipalmente entre os recém-graduados da Esalq-USP, hoje ingressam com título de doutor e não raro têm experiência em estágios de pós-doutorado. No final dos anos 1990, a pesquisa da institui-ção ganhou um reforço, com a criação de um programa de pós-graduação em Agricultura Tropical e Subtropical. Pelo curso de mestrado, lançado em 1999, e o doutorado, de 2009, já passaram 450 alu-nos, formados por pesquisadores da casa e integrados aos estudos realizados na instituição. O programa recebeu conceito 5 (do total de 7) na avaliação da Coor-denação Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

A biografia de pesquisadores que mol-daram a história do instituto segue inspi-rando a geração atual. São nomes como o do geneticista Alcides Carvalho (1913-1993), que se dedicou por 52 anos ao es-tudo da genética e ao melhoramento do café e foi um dos principais responsáveis pelas dezenas de variedades desenvolvidas no instituto, hoje presentes em 90% dos cafeeiros tipo arábica do país (ver repor-tagem na página 10). Ou então o de Ângelo Paes de Camargo, que nos anos 1970 foi um pioneiro em estudos sobre climato-logia agrícola e fez estudos sobre zonea-mento climático para diversas culturas,

mo nacional da Embrapa, que espalhou unidades por todo o território brasileiro, estimulou o IAC a se dedicar com mais foco às culturas de grande interesse dos produtores paulistas – o instituto man-tém centros de pesquisa sobre cana, em Ribeirão Preto, e citricultura, em Cordei-rópolis, que não encontram redundância na estrutura da Embrapa. “Não há espa-ço para repetição de esforços e, cada vez mais, as instituições precisam trabalhar juntas e com parceiros privados”, afirma Orlando Melo de Castro.

A pesquisa em cana resume a habilida-de do IAC em se adaptar às necessidades da agricultura brasileira. O instituto, que em seus primórdios investiu em novas variedades e técnicas de cultivo, pratica-mente abandonou a cultura nos anos 1980. Mas retomou esse espaço em meados dos anos 1990, depois que instituições do setor privado como a Copersucar reduziram in-vestimentos em pesquisa e um programa do governo federal para melhoramento da cana, o Planalsucar, foi extinto. Com foco em melhoramento genético, o centro de pesquisa do IAC em Ribeirão Preto, ar-ticulado com universidades, instituições de pesquisa e empresas do setor sucroal-cooleiro de 11 estados, foi responsável nos últimos anos pelo desenvolvimento de duas dezenas de variedades de cana (ver reportagem na página 14). ▼

Ensaios de campo, que nos primórdios do IAC mobilizavam muitos funcionários e pesquisadores, hoje se beneficiam da mecanização

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IACentre as quais o plantio de café arábica

e robusta. Ou ainda Hermes Moreira de Souza (1918-2011), precursor de pesquisas com flores e plantas ornamentais também na década de 1950, e Álvaro Santos Costa (1912-1998), virologista de plantas.

“A contribuição do IAC foi marcante em muitas áreas, do impulso à horticul-tura no estado ao desenvolvimento de uma variedade de morango, a guarani, talhado para a produção industrial, da adaptação do trigo ao solo brasileiro ao melhoramento do arroz e do feijão”, diz o engenheiro-agrônomo Carlos Eduardo Ferreira de Castro, assessor da diretoria do IAC. “Uma característica da institui-ção é nunca parar de procurar coisas no-vas. Nos últimos anos, o trabalho do IAC foi decisivo, por exemplo, para tornar o estado de São Paulo o principal produ-tor de amendoim e de látex do Brasil.”

protagonismoPioneiro na pesquisa agrícola brasileira na primeira metade do século XX, o IAC tornou-se um elo de uma rede de insti-tuições federais e estaduais que garante lastro científico e tecnológico ao agro-negócio no país. Nos anos 1970, foi um parceiro importante da nascente Empre-sa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em estudos sobre arroz, fei-jão, soja, milho e frutas. O protagonis-

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