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www.cers.com.br FILOSOFIA DO DIREITO BERNARDO MONTALVÃO 1 Uma breve apresentação do pensamento de John rawls. John Rawls foi um autor do século XX, que nasceu e morreu neste século (1921-2002) e que vivenciou de perto os seus problemas, em especial, a Guerra Fria. O problema que move Rawls é: “o que é uma sociedade justa?”. A partir de tal pergunta, Rawls chama para si a tarefa de propor uma Teoria da Justiça que propicie, a partir de bases realísticas, a aproximação maior possível de uma sociedade justa. Rawls é um liberal e, a partir do liberalismo, irá formular a sua Teoria da Justiça. Johw Rawls é um dos mais importantes e difundidos autores de Filosofia Moral e Política. Os dois mais importantes livros de John Rawls são: “Teoria da Justiça” e “Justiça como Equidade”. John Rawls almeja elaborar uma Teoria da Justiça que consiga conjugar os dois mais importantes valores do mundo moderno: a liberdade (valor supremo da vida humana) e a igualdade (valor fundamental na convivência entre os membros de uma comunidade política). A liberdade como valor maior que conduz o agir de cada indivíduo. E a igualdade, como valor-guia que orienta a convivência em sociedade. Ou seja, a liberdade como valor próprio da dimensão individual. E a igualdade, como valor típico da dimensão social. Valores que aparentemente são incompatíveis, ou que, pelo menos, as duas principais ideologias do século XX, e que marcaram a Guerra Fria, procuraram difundir como se fossem inconciliáveis. O liberalismo (na seara econômica, o capitalismo) fundado no valor da liberdade. E o marxismo (ou o comunismo) edificado a partir do valor da igualdade. O grande mérito de Rawls, portanto, foi perceber que era preciso elaborar uma Teoria da Justiça que combinasse os dois valores. A partir deste raciocínio, Ralws acredita que será possível responder a pergunta chave da Filosofia Moral e Política: o que é uma sociedade justa? O pensamento de Rawls não opera num tipo de “vácuo histórico”, ou em “um vazio teórico”. Ou seja, ele elabora a sua teoria a partir das experiências históricas da Filosofia Política, desde o século XVIII até o século XX. Logo, o seu pensamento se situa em um contexto histórico e partir das contribuições que a história lhe proporcionou. Não podendo ser visto, portanto, como um autor que propôs uma teoria justiça a-histórica, com a pretensão de ser perpétua, porque não contaminada pelo seu tempo. A Teoria da Justiça que Rawls irá propor é aquilo que ele chamou de “Teoria da Justiça como Equidade”. Equidade é a melhor tradução possível para o termo em inglês “fairness”. A sua Teoria da Justiça como Equidade parte de vários pressupostos, os quais ele apresenta em sua obra. Mas os três pressupostos mais importantes são: 1ºPRESSUPOSTO: 01) A vida humana em sociedade é marcada por uma escassez limitada (moderada) dos recursos naturais e por uma demanda infindável de pretensões ou, se preferir, por um

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FILOSOFIA DO DIREITO BERNARDO MONTALVÃO

1

Uma breve apresentação do pensamento de

John rawls.

John Rawls foi um autor do século XX, que

nasceu e morreu neste século (1921-2002) e

que vivenciou de perto os seus problemas, em

especial, a Guerra Fria.

O problema que move Rawls é: “o que é uma

sociedade justa?”.

A partir de tal pergunta, Rawls chama para si a

tarefa de propor uma Teoria da Justiça que

propicie, a partir de bases realísticas, a

aproximação maior possível de uma sociedade

justa.

Rawls é um liberal e, a partir do liberalismo, irá

formular a sua Teoria da Justiça.

Johw Rawls é um dos mais importantes e

difundidos autores de Filosofia Moral e

Política.

Os dois mais importantes livros de John Rawls

são: “Teoria da Justiça” e “Justiça como

Equidade”.

John Rawls almeja elaborar uma Teoria da

Justiça que consiga conjugar os dois mais

importantes valores do mundo moderno: a

liberdade (valor supremo da vida humana) e a

igualdade (valor fundamental na convivência

entre os membros de uma comunidade

política).

A liberdade como valor maior que conduz o

agir de cada indivíduo. E a igualdade, como

valor-guia que orienta a convivência em

sociedade.

Ou seja, a liberdade como valor próprio da

dimensão individual. E a igualdade, como valor

típico da dimensão social.

Valores que aparentemente são

incompatíveis, ou que, pelo menos, as duas

principais ideologias do século XX, e que

marcaram a Guerra Fria, procuraram difundir

como se fossem inconciliáveis.

O liberalismo (na seara econômica, o

capitalismo) fundado no valor da liberdade. E

o marxismo (ou o comunismo) edificado a

partir do valor da igualdade.

O grande mérito de Rawls, portanto, foi

perceber que era preciso elaborar uma Teoria

da Justiça que combinasse os dois valores.

A partir deste raciocínio, Ralws acredita que

será possível responder a pergunta chave da

Filosofia Moral e Política: o que é uma

sociedade justa?

O pensamento de Rawls não opera num tipo

de “vácuo histórico”, ou em “um vazio teórico”.

Ou seja, ele elabora a sua teoria a partir das

experiências históricas da Filosofia Política,

desde o século XVIII até o século XX.

Logo, o seu pensamento se situa em um

contexto histórico e partir das contribuições

que a história lhe proporcionou. Não podendo

ser visto, portanto, como um autor que propôs

uma teoria justiça a-histórica, com a pretensão

de ser perpétua, porque não contaminada pelo

seu tempo.

A Teoria da Justiça que Rawls irá propor é

aquilo que ele chamou de “Teoria da Justiça

como Equidade”. Equidade é a melhor

tradução possível para o termo em inglês

“fairness”.

A sua Teoria da Justiça como Equidade parte

de vários pressupostos, os quais ele apresenta

em sua obra. Mas os três pressupostos mais

importantes são:

1ºPRESSUPOSTO:

01) A vida humana em sociedade é marcada

por uma escassez limitada (moderada) dos

recursos naturais e por uma demanda

infindável de pretensões ou, se preferir, por um

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desejo ilimitado de posse por parte dos

indivíduos.

OBS: os recursos naturais nem estão prestes

a acabar, nem são ilimitados e abundantes.

Eles existem na natureza, mas não em grande

quantidade, de modo a que todos os indivíduos

que participam da sociedade possam ter as

suas pretensões satisfeitas. O que nos leva à

conclusão que viver em sociedade é está

exposto a um iminente e constante risco de

conflito.

Diante disso, então, Rawls percebe que o

problema da justiça se torna o da justa

repartição dos bens, pois eles não estão

disponíveis para todos nem estarão

disponíveis, necessariamente, para as

gerações futuras.

E, deste modo, a liberdade dos indivíduos deve

ser o máximo responsável possível, pois das

escolhas tomadas pela presente geração irá

depender da existência das gerações futuras

e, até mesmo, a existência do próprio planeta.

02º PRESSUPOSTO:

02) Reconhecimento do fato do Pluralismo (da

existência de um desacordo profundo

irredutível e instransponível entre as

concepções de bem de cada indivíduo e grupo

que compõe a sociedade moderna).

Pluralismo das formas de vida.

Ou seja, a sociedade moderna é fragmentada,

não há uma só de visão de mundo

compartilhada por todos, mas, sim, muitas

visões de mundo, cada vez mais, e entre elas

há uma desacordo profundo e que não tem

como ser superado.

O que se chama de “bem”, ou o que é

considerado valioso, não é considerado por

todos. Pelo contrário, cada vez mais, dentro da

comunidade, tende haver muitas e variadas

concepções ou compreensões de bem.

Isto marca uma ruptura com o sistema de

valores tradicionais (típicos das sociedades

primitivas, segundo Weber), pois esses partem

do pressuposto de que a Coletividade é fonte

das obrigações morais e políticas.

Porém, os PRINCÍPIOS FUNDADORES da

Ordem Moderna são?

a) Liberdade individual;

b) Igualdade entre todos os indivíduos.

Há, portanto, uma ruptura entre o modo de

entender a Política na Moderna e o modo

Clássico de compreender a Política.

A Política Clássica (das sociedade pré-

modernas) se propunha a cumprir as seguintes

tarefas:

a) Identificar o Bem Supremo (o ideal

compartilhado por todos os membros da

sociedade);

b) Identificar a forma de organização política (o

sistema de governo) que melhor conduzisse a

realização do modo mais excelente de

desenvolvimento da vida humana.

Este entendimento é compartilhado por todos

os autores clássicos: Platão, Aristóteles,

Estóicos, Epicuristas, Santo Agostinho

(exemplo, o modelo contido na obra “Cidade

de Deus”), São Tomás de Aquino.

Porém, na Política Moderna estas premissas

modificam-se. E aí, os dois grandes ícones,

cada um ao seu modo, desta virada na

compreensão política são: Nicolau Maquiavel

(1469-1527) e Thomas Hobbes (1588-1679).

A filosofia política moderna, a partir destes dois

autores passa a ter um papel fundamental, a

saber: o de estabelecer princípios de justiça

que possam regular a vida em comum de

indivíduos que, embora divirjam sobre o

sentido último da existência (indivíduos que

nascem e permanecem livres e iguais em

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direitos e, por isso, divergem sobre o que vem

a ser bem), convivem em uma mesma

comunidade.

Traços característicos da política moderna:

a) Objetivo: Estabelecer princípios de

justiça;

b) Pressuposto: Indivíduos que não

compartilham de uma mesma visão de

mundo;

c) Pressuposto: Indivíduos que convivem

em uma mesma sociedade e que

pretendem conservar os seus direitos

naturais (e não, como na Antiguidade,

na disseminação de um modo

excelente de vida).

Estas características aparecem com clareza e

são transformadas em lei seja na Declaração

dos Direitos do Homem e do Cidadão (de

1789), seja na Declaração de Independência

Americana (1776).

O século XVIII é marcado, então, pela:

a) ruptura com o antigo regime,

b) pela aceleração do modo capitalista de

produção

c) pela ascensão progressiva da

burguesia ao Poder,

d) E pela disseminação da cultura de

progresso que terá os seus frutos a

partir do séculos XIX, mas que se fará

sentir a partir da primeira Revolução

Industrial.

Ou seja, na Filosofia Política Moderna, em

especial, na Declaração de Independência

Norte-Americana:

a) o Poder Político deriva do

consentimento dos cidadãos;

b) Os direitos do homem são naturais e

precedem à fundação do Estado;

c) O Estado é fundado pelos cidadãos

para que ele proteja e assegure aos

homens os seus direitos;

d) Uma vez que o Estado não cumpra o

papel que dele se espera, o POVO tem

o direito, por isso, de alterar ou abolir

esta forma de governo.

e) São direitos naturais a vida, a liberdade

e a busca da felicidade.

Tudo isto acaba por colocar como o problema

central da Filosofia Política Moderna:

A) O PROBLEMA DA LEGITIMIDADE DO

PODER POLÍTICO.

O que coloca para a política um desafio, pois a

convivência se transforma em um problema. O

que explica porque, a partir daí, a palavra de

ordem será TOLERÂNCIA. Para viver é

preciso conviver e, para conviver, é preciso ser

tolerante.

O certo é que o Sentido último da existência

humana, apesar de não ser dado pela política,

passa a depender dela para que possa vir a ser

realizado.

Na Filosofia Antiga, cabe a Ética e a Política

dizer qual é o sentido da existência humana e,

a partir daí, disseminá-lo, o que acabaria por

torná-lo compartilhado por todos ou pela

maioria.

Agora, a partir da Modernidade, não cabe mais

a Ética ou a Política dizer qual é o sentido

último da existência humana. Cada indivíduo

estabelecerá, para si próprio, o sentido de sua

existência. O problema da Política passa a ser,

então, proporcionar a cada um desses

indivíduos que eles possam alcançar o seu

ideal de vida, sem que com isso fique

inviabilizada à convivência social.

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John Rawls dirá, então, que só será possível

fazer Filosofia Política séria, no século XX,

uma vez que se tome como pressuposto o Fato

do Pluralismo (Fragmentariedade Social ou a

Diversidade de Ideais de vida).

Por isso, Rawls admite que a tendência é que

os indivíduos entrem em divergência, ao invés

de chegarem a um consenso, uma vez que não

há mais uma meta-narrativa que seja difundida

entre eles. Pelo contrário, a liberdade dos

indivíduos tende a multiplicar, de forma

exponencial, as visões de mundo.

Logo, se cada homem utiliza a sua razão de

forma livre, a tendência é que cada uma tem a

sua própria compreensão de mundo. A única

forma de inibir isso, segundo Rawls, seria o

Fato da Opressão, isto é, o empenho de um

Poder Político para que os seus cidadãos

comunguem de uma mesma visão de mundo

(de uma mesma concepção de bem).

A tendência da sociedade moderna, segundo

Rawls, não é a da homogeneização de uma só

concepção de bem, mas, sim, que se mostre,

cada vez com mais força, o fato do pluralismo.

Quando a questão é: o que é dignidade

humana? Não haverá consenso.

Diante disso, pergunta Rrawls: qual é o

problema da Filosofia Política

Contemporânea?

a) Como estabelecer Princípios de Justiça

(regras de comportamento) que regulem a vida

em sociedade, em meio a diversidade e

conflito de opiniões sobre o que seja o sentido

último da existência.

OBS: Este desafio, Rawls denomina como o

NÓ GÓRDIO (a novidade) da Filosofia Política

Contemporânea.

3º PRESSUPOSTO: AS CAPACIDADES

MORAIS DE CADA INDIVÍDUO.

Este pressuposto é decorrente do anterior.

Este é pressuposto é o do reconhecimento de

que todos os membros da sociedade são

compreendidos como indivíduos racionais e

razoáveis.

Ou seja, indivíduos capazes de formular uma

concepção do bem (uma visão de mundo ou

um sentido para sua vida) e de desenvolver um

senso de justiça.

Rawls entende que todo cidadão é dotado

destas duas capacidades ou poderes morais

(inerentes):

A) A racionalidade – ele é capaz de criar um

sentido para sua vida; ser capaz de criar e

escolher fins (ou metas), de dotar-se dos

meios adequados e eficazes para atingi-los

(racionalidade meios e fins; racionalidade

técnica ou científica), ou mesmos de rever os

fins que haviam escolhido;

A razoabilidade – ele é capaz de desenvolver

um senso de justiça. Cada individuo sabe o

que é respeitar os termos equitativos da

cooperação social. A razoabilidade é

capacidade de conjugar o livre-arbítrio de cada

um no ambiente de uma lei universal que

assegure a todos a liberdade em que todos

possam compartilhar dela em comum. Logo,

quando o indivíduo pretende realizar os seus

fins, ele não pode pensar a realização dos fins

dos outros como um obstáculo a realização

dos seus fins, sob pena de colocar em dúvida

a lei universal da liberdade.

O que é, então, a razoabilidade?

É a capacidade que todo ser humano tem de

perceber que os fins por ele elegidos podem

não ser os melhores fins para promover a

convivência social, ou que eles podem não ser

aceitáveis por todos os demais homens. Os

quais podem avalia-los a partir de critérios e

pesar na balança até que ponto aqueles são

os melhores fins, ou os mais aceitáveis.

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OBSERVAÇÃO:

E nisto reside o terceiro pressuposto da Teoria

da Justiça de Rawls, a capacidade de tentar

conjugar a racionalidade dos indivíduos com a

razoabilidade dos seus fins.

Exemplo: a sociedade admite, racionalmente,

uma pluralidade de credos religiosos, mas não

julga razoável que um determinado credo

pratique rituais macabros e sacrifícios com

crianças.

AGIR DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS OU

REGRAS:

Logo, para Rawls, agir de acordo com

princípios não é apenas agir em conformidade

com eles (o que a vida social nos impõe é que

nossas ações estejam em conformidade com

as normas, logo, qualquer sujeito, usando a

sua razão estratégica, é capaz de agir de modo

a não transgredir a norma, mas isso não

significa que ele seja capaz de ele fins

razoáveis).

Vale, aqui, lembrar Aristóteles quando ele dizia

que a justiça era uma virtude humana, pois ela

não foi feita nem para os deuses nem para as

bestas. Logo, ainda segundo Aristóteles, uma

sociedade com justiça faz com que os homens

se assemelhem aos deuses. Sem ela, os

homens se tornam a pior das bestas.

Do que se conclui que há uma diferença entre

agir em conformidade com o dever (os

princípios de justiça) e agir segundo critérios

de justiça aos quais o homem dá a sua

aquiescência por considerá-los corretos.

Exemplo:

Uma coisa é não furar a fila, por considerar que

se trata de uma regra democrática válida e

fundamental porque segue ao princípio de que

o último chegado deve ser o último a ser

servido, salvo em casos excepcionais, como,

por exemplo, no caso dos idosos. Outra coisa,

muito diferente, é a pessoa que obedece a fila

ou porque não conhece um jeito de burlá-la, ou

porque teme uma eventual sanção.

TESE PRINCIPAL:

Baseado nestes três pressupostos, Rawls

afirma que não é possível encontrar os

princípios capazes de ordenar a estrutura

básica de uma sociedade, a não ser quando os

indivíduos procurem estes princípios no

contexto de uma situação peculiar, que ele,

Rawls, chama de POSIÇÃO ORIGINAL. E

mais, que os indivíduos estejam submetidos a

condições restritivas, que Rawls chama de

VÉU DA IGNORÂNCIA, de modo que os

indivíduos não possuam informações sobre a

situação particular e as características

pessoais que serão suas na sociedade para

qual eles elaboram o princípio de justiça.

Segundo Rawls, os três elementos

fundamentais de uma concepção política da

justiça, são:

a) Objeto da Teoria da Justiça – é a

estrutura básica da sociedade – a

quem cabe formular as regras que irão

regular a sociedade;

b) O Modo de apresentação da teoria da

justiça (ou método de justificação):

como alcançar ou elaborar estas regras

– partindo-se da Posição Original;

c) Conteúdo da Concepção Política da

Justiça – a justiça é a virtude cardeal

das instituições e regras que irão

regular a vida em sociedade – as

regras elaboradas devem ser justas.

O que é a ESTRUTURA BÁSICA?

São as principais instituições políticas, sociais

e econômicas de uma sociedade e como estas

instituições se encaixam em um sistema de

cooperação social ao longo do tempo.

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O foco, aí, é voltado às instituições que tem

como função determinar direitos e deveres aos

cidadãos, bem como às instituições que tem

como função contribuir para repartição dos

bens (bônus) e ônus do viver em sociedade.

E viver em sociedade é está sujeito a bônus e

ônus. Bônus: a vida em sociedade proporciona

uma série de coisas que ele sozinho seria

incapaz de alcançar (represar água para o

período de seca). Ônus: se submeter aos

limites impostos pela sociedade.

O que há de mais original na teoria de Rawls

são método e o conteúdo da sua concepção.

Qual é o método?

Uma nova forma de contrato social, o qual não

toma como premissa o Estado da Natureza (de

Rousseau, Hobbes e Locke). Para ele, o que

antecede ao contrato social é o que ele chama

de POSIÇÃO ORIGINAL (que é o seu método).

Para Hobbes, por exemplo, no Estado da

Natureza, o “homem é o lobo do homem”. Não

há justiça nem injustiça, pois não há critérios,

onde todos possuem direitos ilimitados. Logo,

segundo Hobbes, é o medo da morte violenta

que leva os homens a assinarem o contrato

social dando poderes ao Estado Leviatã.

No que Locke (1632-1704) discorda dele.

Locke parte da ideia do Estado da Natureza,

mas não conclui que é necessário um Estado

Absolutista, mas, sim, uma Democracia

Parlamentarista. Isto porque, segundo Locke,

não faz sentido abrir mão da liberdade natural

para entrega-la a um tirano que pode usurpar

o direito que levou o cidadão a assinar o

contrato social e a querer viver em sociedade.

Já para Rousseau (1712-1788), a imagem do

homem no Estado da Natureza era a de um

Homem Puro e bom, que não se corrompeu

ainda, mas que a vida em sociedade é que o

corrompe.

O que há em comum entre os Contratualistas?

O homem não é um ser naturalmente político.

Ao contrário, o Estado e a Sociedade são

constructos, são artifícios inventados pelo

homem para que consigamos conviver em

comum.

Para Rawls, a ideia do contrato social é muito

importante para que seja possível fazer a

contraposição da situação anterior a ele com a

situação que a ele se segue. Mas como Rawls

não está preocupado com a Origem da

Sociedade, nem tampouco com a

Legitimidade do Poder Político, ele coloca no

lugar do contrato social o que ele chama de

Posição Original.

A posição original, segundo Rawls, é uma

situação na qual os participantes, que não são

todos os indivíduos, são representantes deles.

Uma situação que não é real, não é um

acontecimento histórico que um dia aconteceu

ou que pode vir a acontecer, mas, sim, uma

situação hipotética, um modelo de

representação. E nesta situação os

participantes decidem os princípios de

organização das Instituições Básicas da

Sociedade, estando eles, os participantes,

envolvidos por um véu de ignorância.

O que é o véu de ignorância?

Os participantes são colocados na posição

original sem conhecer suas posições na vida

real. Nesta situação, imagina Rawls, a justiça

poderá se manifestar. E, por quê? Porque ela,

a justiça, se manifestará, poderá aflorar a partir

da Imparcialidade do Procedimento adotado.

Para que isto seja possível, é preciso que os

indivíduos encobertos pelo véu, desconheçam

os seus atributos físicos, naturais e

psicológicos. Ou seja, os representantes não

sabem se são homens ou mulheres, se serão

pretos ou brancos, se serão ricos ou pobres e

etc. Estes indivíduos, sobretudo, ignoram as

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suas concepções de bem e seus projetos de

vida.

Mas Rawls afirma, porém, que estes

indivíduos não ignoram que terão uma

concepção do bem, e nem ignoram certos

bens básicos que toda concepção necessita

para se desenvolver, bastando, então, que

estes indivíduos possuam Bens Primários

(primary goods).

Mas eles não sabem quais serão as suas

concepções particulares sobre estes bens que

eles irão buscar ao longo da vida. E é

importante que não saibam, para que suas

posições ou opiniões sobre o que é a justiça

não venham a ser determinadas por uma

concepção particular de qual é o fim último da

vida humana. Os representantes que estão na

posição original devem também ignorar o

estado de desenvolvimento da sociedade para

qual elaboram os princípios de justiça, bem

como a história pregressa dela.

O princípio de que o outro é um fim em si

mesmo (logo, nunca pode ser tratado como um

meio);

O princípio de negação à tese utilitarista – pois

a tese utilitarista admite, implicitamente, a

premissa sacrificial, a de que se for para o bem

da coletividade, devemos sacrificar,

eventualmente este ou aquele individuo. Mas

se nenhum dos indivíduos sabe qual deles

será o sacrificado, então, nenhum deles, na

posição original, admite o princípio da

utilidade.

A tese de Rawls é que a sua Teoria da Justiça

pode ser uma alternativa clara em

contraposição ao Utilitarismo, na medida em

que ela é inspirada em um princípio ético

fundamental, segundo o qual o Outro jamais

pode ser utilizado como um simples meio para

atingir os meus próprios fins.

O conteúdos dos princípios de justiça:

Segundo Rawls, a Teoria da Justiça como

Equidade ela defende dois princípios de justiça

que seriam escolhidos, necessariamente, na

posição original:

a) Princípio da Igual Liberdade para todos

– assegura que a sociedade irá

assegurar ao máximo os direitos

básicos (humanos ou fundamentais) a

todos os indivíduos.

b) Princípio segundo o qual as desigualdades

econômicas e sociais devem ser distribuidas

de tal forma que:

b.1.) garantam os maiores benefícios

possíveis aos menos favorecidos – Rawls

chama de Princípio da Diferença;

b.2.) estejam vinculadas a tarefas e posições

acessíveis a todos em circunstâncias de justa

igualdade de oportunidades – Rawls de

princípio da igualdade de oportunidades;

OBS: Segundo Rawls, o primeiro princípio tem

prioridade sobre o segundo e a segunda parte

do segundo princípio tem prioridade sobre a

primeira parte do segundo princípio.

Como cada indivíduo teria dons, talentos e

capacidades diferentes, naturalmente, as

liberdades iriam acarretar, com o tempo,

desigualdades sociais e econômicas.

Para resolver o problema das desigualdades,

Rawls, então, propõe que:

a) O acesso aos postos e lugares de

poder dentro da sociedade seja

baseado no princípio da igualdade de

oportunidades;

Ou seja, haverá disputas pelos cargos, logo,

haverá mérito, mas irá se garantir a mesma

oportunidade a cada um do indivíduos de se

poder aceder aos cargos de poder dentro da

sociedade.

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b) E, sabendo que haverá, com o tempo,

desigualdades econômicas, os indivíduos na

posição original irá defender que se assegure

os maiores benefícios possíveis aos menos

favorecidos, de sorte a reduzir as

desigualdades.

Logo, estas pessoas não escolheriam nem o

princípio de uma utilidade máxima nem o de

uma utilidade mínima ou média. Elas

escolheriam, segundo Rawls, o princípio do

MAXIMIN.

O termo maximin significa MAXIMUM

MINIMORUM. Ou seja, todos escolheriam o

máximo do mínimo.

Regra do Maximin: “A regra maximin

estabelece que se deve ordenar as

alternativas em função das piores dentre as

respectivas consequências possíveis” (citação

de Rawls).

Ou seja, deve-se adotar a alternativa cuja a

pior consequência seja superior a cada uma

das piores consequências das outras

alternativas.

Exemplo: suponha que você tem um certo

número de recursos a distribuir. Rawls diz que

você irá preservar melhor a ideia (de justiça)

de que estes recursos serão melhor

distribuídos quando garantir:

a) Mais para cada um;

b) Mas desde que se tenha a certeza de

que se favorece ao máximo a quem

estiver na pior posição.

Pensar o contrário, segundo Rawls, é admitir

que os representantes na posição original são

jogadores de pocker que blefam, que dizem

para si mesmo: “eu posso me dar bem...”.

Ao que Rawls responde que: “escolher

princípios de justiça não é jogar ficha em cima

de uma mesa, pois o blefe, do mesmo jeito que

permite ao jogador vencer o adversário, ele

também pode levar o jogador a bancarrota”.

Logo, o princípio da razoabilidade irá impedir

que o indivíduo na posição original atue como

free rider (arrisca tudo na tentativa de ganhar).

EM SUMA: Para Rawls, uma sociedade justa

irá conjugar os valores da liberdade e da

igualdade.