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Associação de Leitura do Brasil

COMISSÃO EXECUTIVA EDITORIALGabriela Fiorin Rigotti (coordenadora) (Unicamp); Alik Wunder (PUCCamp); Ana Lúcia Horta Nogueira (USP); Antonio Carlos Amorim (Unicamp); Davina Marques (USP); Heloísa Helena Pimenta Rocha (Unicamp); Lílian Lopes Martin da Silva (Unicamp); Maria Lygia Köpke Santos (ECC); Rosalia de Ângelo Scorsi (Unicamp); Ubirajara Alencar Rodrigues (Unicamp).

CONSELHO EDITORIAL EXTERNOÁgueda Bernardete Bittencourt (Unicamp); Ana Luiza Bustamante Smolka (Unicamp); António Manuel da Costa Guedes Branco (Universidade do Algarve - Portugal); Charly Ryan (University of Winchester - Inglaterra); Antônio Augusto Gomes Batista (UFMG); Edmir Perrotti (USP); Eliana Kefalás Oliveira (UFAL); Francisca Izabel Pereira Maciel (UFMG); Giovana Scareli (UNIT); Guilherme do Val Toledo Prado (Unicamp); Héctor Rubén Cucuzza (Universidad Nacional de Luján e Universidad Nacional de La Plata - Argentina); Heitor Gribl (Unicamp); João Wanderley Geraldi (Unicamp); Joaquim Brasil Fontes (Unicamp); Lívia Suassuna (UFPE); Luciane Moreira de Oliveira (PUCCamp); Luiz Percival Leme Britto (UFOPA); Magda Becker Soares (UFMG); Maria do Rosário Longo Mortatti (UNESP); Maria Inês Ghilardi Lucena (PUCCamp); Maria Teresa Gonçalves Pereira (UERJ); Marly Amarilha (UFRN); Max Butlen (UCP IUFM - França); Milton José de Almeida (Unicamp); Norma Sandra de Almeida Ferreira (Unicamp); Núria Vilài Miguel (Universidad Autonoma de Barcelona - Espanha); Raquel Salek Fiad (Unicamp); Regina Zilberman (UFRS); Roberval Teixeira e Silva (UM – FSH – China); Rosa Maria Hessel Silveira (UFRGS); Rosana Horio Monteiro (UFG); Sônia Kramer (PUCRJ).

APOIOFaculdade de Educação / UNICAMP

REVISÃO EDITORIALFabiano Corrêa da Silva

PROJETO GRÁFICO E EDITORAÇÃOGlobal Editora e Distribuidora LtdaR. Piratinguin, 111 – Liberdade – São Paulo – SP – CEP: 01508-020 Fone +55 xx 11 3277-7999 – Fax: +55 xx 11 3277-8141CNPJ: 43.825.736.001-01 – Insc. Est: 109.085.073.112CAPA: Criação e layout: Rosalia de Angelo Scorsi sobre Calligraphy Tools – Hokusai – 1822 (2009 – Parkstone Press International, New York, USA)

Leitura: Teoria & Prática solicita colaborações, mas reserva-se o direito de publicar ou não as matérias enviadas para a redação. Todos os textos deverão seguir as regras de publicação expressas ao fi nal da Revista.

ASSOCIAÇÃO DE LEITURA DO BRASIL – DIRETORIAPresidente: Antonio Carlos AmorimVice-presidente: Gabriela Fiorin Rigotti1º Secretário: Alik Wunder2º Secretário: Ana Lúcia Horta Nogueira 1º Tesoureiro: Davina Marques2º Tesoureiro: Ubirajara Alencar RodriguesObs.: Além da diretoria, a ALB conta com um Colegiado Nacional de Representantes.

REDAÇÃOLeitura: Teoria & Prática – Associação de Leitura do BrasilCaixa Postal 6117 – Anexo II - FE/UNICAMP -CEP: 13083-970 – Campinas – SP – BrasilFone +55 xx 19 3521-7960 – Fone/Fax +55 xx 19 3289-4166. E-mail: [email protected] – Home page http://alb.com.br/

Catalogação na fonte elaborada pela Biblioteca da Faculdade de Educação / UNICAMP

Leitura: Teoria & Prática / Associação de Leitura do Brasil. – ano 1, n.0, 1982 -. – Campinas, SP: Global, 2012.

Revista da Associação de Leitura do BrasilPeriodicidade: SemestralISSN: 0102-387XAno 30, n.58, jun. 2012

1. Leitura - Periódicos. 2. Educação - Periódicos. 3. Lín- guas - Estudo e ensino - Periódicos. 4. Literatura - Periódicos. 5. Biblioteca – Periódicos - I. Associação de Leitura do Brasil.

CDD - 418.405

Indexada em:Edubase (FE/UNICAMP) / Sumários de Periódicos Conrrentes Online (FE/

UNICAMP)/ Linguistics and Language Behavior Abstracts (LLBA) / Clase (México, DF) / BBE (INEP/SIBEC)

Impresso no Brasil - 2012© by autores

Editada pela ALB - Associação de Leitura do Brasil (Campinas, SP) em co-edição com a Global Editora (São Paulo).

Atualmente a Revista faz um total de 55 permutas. A ALB tem interesse em estabelecer permuta de sua revista Leitura: Teoria & Prática com outros periódicos congêneres nacionais ou estrangeiros. Os interessados devem entrar em contato com a Biblioteca da Faculdade de Educação da UNICAMP para estabelecer a permuta através do endereço abaixo:

Gildenir Carolino SantosDiretor da Biblioteca Prof. Joel MartinsFaculdade de Educação - Universidade Estadual de CampinasRua Bertrand Russell, 801 - Cidade UniversitáriaCaixa Postal: 6120 – CEP: 13083-970 – Campinas – SP – BrasilTel +55 xx 19 3521-5571 – Fax +55 xx 19 3521-5570E-mail: [email protected] – URL: http://www.bibli.fae.unicamp.br/index.html

CONTANDO UM CONTO E AUMENTANDO TRÊS PONTOS...Marcela Afonso Fernandez1

1 - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).

Resumo

A arte de contar histórias constitui uma experiência de interação com o texto literário com o potencial de suscitar um encontro entre o leitor e a narrativa, marcado pela palavra emocionalmente confi denciada e sentida. Inserida no universo das artes, o ato de contar e de ouvir narrativas possibilita um envolvimento com a criação literária e com a imaginação, ampliando as possibilidades de exploração dos múltiplos sentidos manifestos e latentes na obra. Com base nesta premissa, a ofi cina Quem conta um conto aumenta três pontos, realizada em 2011 na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) teve como objetivo central levar os estudantes do Curso de Licenciatura em Pedagogia a conhecerem a arte de contar histórias com vistas à promoção do texto literário e, consequentemente, a formação de sujeitos-leitores. Este trabalho se propõe a compartilhar todo o percurso de implementação desta ofi cina, ressaltando a importância da experimentação da arte de narrar no processo de formação do professor que atua diretamente como mediador da leitura de alunos-leitores iniciantes e em formação. Para tanto, viabilizou-se a discussão e refl exão sobre os diferentes enfoques presentes na arte de contar histórias — o quê; para quê; para quem; como e onde contar histórias, estimulando a sensibilidade estética e o apuro crítico decorrentes de uma relação prazerosa com o universo das histórias da literatura oral e escrita.

Palavras-chave

Formação de leitores; leitura; literatura; contação de histórias.

Abstract

The art of telling story is an experience of interaction with the literary text with the potential to elicit a meeting between the reader and the narrative, marked by the word felt emotionally. Inserted in the universe of the arts, the act of telling and listening to narratives enables an engagement with the literary creation and imagination, expanding the possibilities for exploration multiple meanings manifest and latent in the work.

Based on this premise, the workshop Who tells a tale raises three points, happened in 2011 at the University Federal of Rio de Janeiro State (UNIRIO) had as mainly aim to take the students of the Education Degree Course to know the art of telling story with a view to promoting the literary text, and consequently the formation of subject-readers. This paper aims to share all the way to implement this workshop, showing the importance of testing the art of relating in the process of teacher education that acts directly as a mediator of beginning students-readers in development. It made possible the discussion and refl ection on the different approaches present in the art of telling stories - what, why, for whom, how and where telling them, stimulating an esthetic sensibility and critical refi nement due to a pleasant relationship with the universe of stories of oral and writing literature.

Keywords

Development of readers; reading; literature; story-telling.

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1. Introdução

A leitura pode ser compreendida como uma prática cultural marcada por gestos e hábitos delineados por distintos grupos em determinados espaços geradores (CHARTIER, 1999, 2002, 2003). Baseada sobretudo em estudos relacionados à história da leitura como prática cultural, e tendo em mente o fato de que estamos cada vez mais norteados por uma diversidade de práticas de leitura produzidas por diferentes comunidades de leitores, neste artigo me proponho a lançar um olhar mais focado sobre um tema investigado sob diferentes perspectivas e nuances, mas, nem por isso, menos instigante: os processos de formação de professores-leitores.

Nesse sentido, ao longo de minha trajetória acadêmica e profi ssional em cursos de formação de professores, tenho procurado investigar os avanços em relação aos modos de ler e de ser leitor, a partir dos relatos de meus alunos quando no papel de professores, e do resgate de seus processos formativos como leitores. Conforme seus relatos, esses processos formativos abrangem tanto os ambientes geradores de leitura que contribuíram nessa formação, como também a experiência acadêmica vivenciada no decorrer desses percursos. No cerne destes relatos, pude identifi car uma íntima relação entre suas memórias e experiências de leitura literária e seu pensar-fazer docente vinculado a promoção e dinamização deste gênero textual nas salas de aula.

Essas investigações impulsionaram a busca de caminhos teórico-metodológicos capazes de viabilizar a formação de estudantes-professores leitores de textos literários no âmbito da universidade e que contribuíssem para (re)dimensionar e (res)signifi car o encontro entre a literatura e o aluno-leitor iniciante e em formação no universo escolar.

A partir do diálogo promovido entre a leitura literária e a formação de sujeitos-leitores, uma questão, entre tantas outras, despertou meu olhar investigativo: como proporcionar aos alunos, nos cursos de formação de professores, processos

formativos que, primeiro, os levem a se conhecer enquanto sujeitos-leitores e, segundo, com o potencial de impulsionar práticas alternativas de leitura literária nos diferentes espaços educativos onde transitam?

Pensar em um caminho alternativo para o diálogo entre o gênero literário e a escola, questão anteriormente investigada em signifi cativos estudos (SILVA, 2003a, 2003b 2009a; PAIVA & MACIEL, 2005; LAJOLO, 2000), e panoramicamente focalizada aqui, pressupõe a necessidade de se evidenciar o fato de que essa mudança passa, entre outros fatores e condicionantes, pela formação do professor que atua diretamente como mediador da leitura de alunos-leitores iniciantes e em formação.

Considero a tríade leitura, leitor e texto pilares fundamentais na promoção da literatura e na emancipação do sujeito-leitor, orientando as diversas opções metodológicas de abordagem do texto literário. Adotando essa visão, a qualidade do trabalho com o texto literário reside não somente no texto em si, mas nos modos de compreensão, uso e apropriação que se constroem a partir dele pelas comunidades de sujeitos-leitores envolvidos no processo.

Partindo desta premissa, a arte de contar histórias constitui uma experiência de interação com o texto literário capaz de suscitar um encontro entre o leitor e a narrativa, marcado pela palavra emocionalmente confi denciada e sentida. Inserida no universo das artes, o ato de contar/ouvir histórias possibilita um envolvimento com a criação literária e com a imaginação, ampliando as possibilidades de exploração dos múltiplos sentidos manifestos e latentes na obra pelo leitor-contador de histórias e pelo leitor-ouvinte.

Foi baseando-se nessa argumentação que a ofi cina, Quemconta um conto aumenta três pontos foi concebida2 de maneira a viabilizar a discussão e a refl exão sobre os diferentes enfoques presentes na arte de contar histórias — o quê; para quê; para quem; como e onde contar histórias. Tomando por base a bagagem de experiências e conhecimentos prévios dos alunos-professores articulados a pressupostos teóricos vinculados

2 - Ressalto que a ofi cina Quem conta um conto aumenta três pontos foi concebida e desenvolvida por mim juntamente com o professor titular da área de Língua Portuguesa da UNIRIO e que esta contou com a participação especial de um contador de histórias.

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ao tema em questão, a ofi cina se propôs a vivenciar a arte de narrar, estimulando a sensibilidade estética e o apuro crítico decorrentes de uma relação prazerosa com o universo das histórias da literatura oral e escrita, sobretudo, infanto-juvenil.

2. Formando professores contadores de histórias

Esta ofi cina, inserida no Projeto Educativo TIC TAC - Tecnologias da Informação e Comunicação & Transversalidade Arte, Ciência e Cotidiano3, organizou-se em dois encontros, no segundo semestre de 2011, na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Seu objetivo central foi levar os estudantes pertencentes ao curso de Pedagogia a conhecerem a arte de contar histórias voltada para o público infanto-juvenil. Esse objetivo, porém, teve outros três decorrentes: promover a leitura do texto literário e, consequentemente, a formação de leitores; levar os alunos a conhecerem os contos populares tradicionais; e provocar a experimentação de estratégias da contação de histórias.

No primeiro encontro, os estudantes foram convidados a apresentarem-se, contando aos colegas sobre a origem de seus próprios nomes. Essa foi uma maneira destes se conhecerem de forma descontraída, além de vivenciarem o valor da narrativa oral por meio da experiência. Em seguida, foram realizados exercícios de aquecimento corporal e vocal, explorando a riqueza das cirandas, cantigas populares, parlendas e travalínguas, que representaram quase um “voltar à infância”, lembrando os textos da literatura oral que marcaram muitos de nós, semelhante ao que diz Cecília Meireles em “Permanência da literatura oral”:

Nem todos terão aberto livros, na sua infância. Mas quem não terá ouvido uma lenda, uma fábula, um provérbio, uma adivinhação? Quem não terá brincado com uma canção que um dia lhe aparecerá noutro idioma? Quem não terá pensado

e agido em função de exemplos que são os mesmos de outros povos, de outras eras, provenientes de um esforço análogo do homem para adaptar-se à sua condição na terra? (1984, p. 79)

Nesse encontro foram também enfatizadas as distintas experiências na perspectiva de contadores e de ouvintes sobre as estratégias de contação de histórias com ou sem a utilização de recursos como fantoches, dedoches, marionetes, dobradura, luva, teatro de sombras etc. Além disso, argumentamos sobre o entrelaçamento da narrativa com o canto, a expressão corporal, gestual e, sobretudo, a liberdade de escolha do contador, buscando enfatizar que o valor desta arte está na impressão da marca da narrativa “como a mão do oleiro na argila do vaso” (BENJAMIN, 1994, p. 203).

Para fi nalizar o encontro, foi proposto aos participantes que estes escolhessem uma história da cultura popular para que pudessem estudá-la, em casa, e apresentá-la oralmente no encontro seguinte. O propósito neste momento foi promover o resgate de textos que se valem da narração oral como via para organizar e perpetuar os valores, mitos e crenças fundadores de nossa cultura.

O segundo encontro dessa ofi cina possibilitou aos participantes observarem as variadas imagens, ritmos e intenções presentes na narração oral quando incorporadas por narradores distintos. O trabalho teve início pelo aquecimento corporal e vocal dos participantes para que, em seguida, todos pudessem contribuir para a elaboração de uma história coletiva. Para tanto, foi utilizada a estratégia de narrar um conto, parando em uma determinada parte do texto e deixando todos os ouvintes curiosos para saber mais a respeito do enredo. Fez-se, então, uma provocação, instigando o público a imaginar, procurar e dar continuidade à história. Essa foi uma forma de se promover a refl exão sobre uma dentre tantas formas de se contar histórias, o que remete a contadora de histórias Regina Machado, quando afi rma: “(...) os contos produzem efeito em diferentes níveis

3 - O Projeto Educativo TIC TAC, está inserido na Escola de Educação, responsável pelos cursos de licenciatura em Pedagogia presencial e semi-presencial e foi elaborado por professores dos departamentos de Didática (do qual faço parte), de Fundamentos da Educação e de Filosofi a e Ciências Sociais do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO. Este projeto visa melhorar a qualifi cação dos estudantes dos cursos de licenciatura presencial e semi-presencial da Escola de Educação, por meio de estratégias educativas interdisciplinares e transversais envolvendo os campos da arte, ciência e cotidiano.

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de apreensão: podem intrigar, fazer pensar, trazer descobertas, perguntas, questões, provocar o riso, o susto, o maravilhoso.” (MACHADO, 2004, p. 31)

Outra estratégia utilizada para a contação coletiva, durante esta segunda sessão, foi a criação de uma teia de barbante, isto é, cada um dos participantes desenvolveu uma parte da narrativa, à medida que recebia o fi o da meada, até que, tendo o barbante passado por todas as mãos, uma grande teia foi enredada, metaforizando a própria maneira de se contar uma história, de linha em linha, de narrador em narrador: uma verdadeira rede entre contadores e ouvintes, nos abrindo a possibilidade da discussão a esse respeito. Essa experiência estimula a articulação entre o falar e o ouvir como ato de criação e de impressão de sentimentos, ideias e traços na qual “a palavra vem de fora e perpassa o ouvinte, ganha cores próprias segudno a interação que se estabelece e é soprada de volta” (YUNES, 2009, 17)

No segundo momento desse encontro, os participantes passaram a narrar as histórias que escolheram e prepararam, de acordo com as estratégias por eles privilegiadas. No momento seguinte às apresentações, os trabalhos foram comentados por todos nós, com vistas a aprimorar as maneiras de contar. Foi a oportunidade de uns e outros se perceberem como narradores e de conhecerem diversas formas de contação de histórias. Essas observações discutidas envolveram a postura, o corpo e o gesto; a voz e a continuidade; o tempo e o ritmo de cada um, tudo o que chama a atenção do ouvinte, conquistando-o ou não. Foi possível também perceber a relevância e valor do espaço e dos objetos utilizados durante uma contação. Observando o fato de todos esses elementos se mostrarem harmoniosos e colaborativos à narração das histórias, tornou-se evidente a importância da familiaridade com a história, isto é, voltamos a conversar sobre o momento de ensaio e de estudo para um efetivo aprimoramento da contação de uma história escolhida.

Nesse aspecto, fi cou claro para os participantes que um contador não tem necessariamente que encenar, como o ator, lembrando todo o trabalho realizado na ofi cina, ou seja, que existem várias formas de se contar histórias. Nesse sentido, a narrativa esta centrada na oralidade. Essa refl exão ressoa,

novamente, o estudo de Regina Machado sobre a arte de contar histórias:

Não se trata de fazer teatro, e sim de narrar. (...) Quem conta histórias todos os dias pode preparar-se para surpreender as crianças com situações variadas. É preciso saber contar uma história sem nenhum recurso externo, para experimentar a sensação da soberania de história, contando apenas com sua força expressiva, tal como se revela pela presença do contador. Muitos contadores sentam-se numa cadeira e começam a falar, tendo como recurso a voz, o gesto e o olhar. E a magia se instaura, o mundo se cria imaginariamente em cada ouvinte. (...) Tais recursos externos não podem ser óbvios, descritivos ou redundantes. Eles precisam, antes de mais nada, surpreender a audiência pelo inusitado, pela expressividade, pelo comentário sutil que agregam às palavras da narrativa. Eles dialogam com a história, contando-a de outros pontos de vista, atiçando as imagens internas dos ouvintes, desafi ando sua percepção. Um baú é um repositório do mistério. O que será que há dentro dele? Um chapéu é sufi ciente para caracterizar o contador como veículo do maravilhoso. Síntese, simplicidade, sutileza, surpresa. (...) ler ou contar (...) (2004, 77-78)

O terceiro momento desse encontro foi destinado à avaliação da ofi cina como um todo. Por esse motivo, em círculo, todos nós pudemos conversar sobre os objetivos da ofi cina e sua relação com o ouvir e o contar histórias, valorizando essa ação para o nosso cotidiano, sobretudo na escola. Daí a importância de sua realização durante um curso de formação de professores, que entre outros aspectos, se propõe a despertar a curiosidade epistemológica dos alunos (FREIRE, 1996).

3. Apontamentos fi nais

Observamos, de fato, que o trabalho com diversas formas de literatura, em geral, durante a sensibilização, e do conto popular, em particular, foram oportunidades de relembrarmos nossas infâncias. Sendo assim, questionamo-nos sobre a possibilidade de proporcionarmos a nossos alunos um trabalho voltado à estética literária e, ao mesmo tempo, tão relacionado à infância, como também afi rmou o folclorista Luis da Câmara

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Cascudo a respeito do conto popular: “O valor do conto não é apenas emocional e delicioso, uma viagem de retorno ao país da infância” (1999, p. 9).

Essas refl exões todas me permitiram observar o proveito desta ofi cina aos estudantes de Pedagogia que a frequentaram, já que, diante de um conto popular, terão subsídios para estudá-lo, prepará-lo e contá-lo a partir de um conhecimento marcado pelo ouvir, ler, experimentar, pensar, imaginar, criar, acolhendo a literatura em seu caráter plurissignifi cativo e, consequentemente, lhe imprimindo um sentido singular.

Referências

BENJAMIN, Walter. O narrador: considerações sobre a obra e Nikolai Leskov. In Magia e técnica, arte a política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo, Brasiliense, 1994.

BUSATTO, Cléo. A arte contar histórias no século XXI: Tradição e ciberespaço. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

CASCUDO, Luís da Câmara. Contos tradicionais do Brasil (folclore). 12ª ed. São Paulo: Ediouro, 1999.

CHARTIER, Roger. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os séculos XIV e XVIII. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999.

_________________. Os desafi os da escrita. São Paulo: Editora UNESP, 2002.

_________________. Formas e sentido – cultura escrita: entre distinção e apropriação. Campinas,: Mercado de Letras, 2003.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000.

LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. São Paulo: Ática, 2000.

MACHADO, Regina. Acordais: fundamentos teóricos-poéticos da arte de contar histórias. São Paulo: DCL, 2004.

MEIRELES, Cecília. “Permanência da literatura oral”. In MEIRELES, Cecília. Problemas da literatura infantil. 4ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.

PAIVA, Aparecida; MACIEL, Francisca. Discursos da paixão: a leitura literária no processo de formação do professor das séries iniciais. In: PAIVA, Aparecida; MARTINS, Aracy; PAULINO, Graça; e VERSIANI, Zélia (orgs.). Leiturasliterárias: discursos transitivos. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

SILVA, Ezequiel Theodoro da. Conferências sobre leitura - trilogia pedagógica. Campinas: Autores Associados, 2003a.

____________. Leitura em curso - trilogia pedagógica.Campinas: Autores Associados, 2003b.

____________. Criticidade e leitura. São Paulo: Global, 2009.YUNES, Eliana. Tecendo um leitor: uma rede de fi os cruzados.Curitiba: Aymará, 2009.