Curso Lacan e a Psicanálise- Aula 16: Lacan e a contemporaneidade: confluências
19133256 Marcio Peter Lacan Com Marx
-
Upload
eduardo-nogueira -
Category
Documents
-
view
213 -
download
0
Transcript of 19133256 Marcio Peter Lacan Com Marx
-
7/27/2019 19133256 Marcio Peter Lacan Com Marx
1/4
Lacan com Marx: Clnica da cultura(Mrcio Peter de Souza Leite)
A clnica psicanaltica consiste em, a partir do contedo manifesto,
presentificar a verdade contida no contedo latente. De que verdade se
trata? Da verdade do sujeito, da verdade ocultada na fala (manifesta) dosujeito. Da opor-se verdade e saber, onde o saber se aprende na articulao
das palavras, e a verdade fugidia.
A verdade se sofre, diz Lacan, verdade esta, do sujeito, diferente de uma
verdade formalizada, que se reduz ao manejo de letras e nmeros, diferente
de uma verdade lgica. O psicanalista uma das figuras que na civilizao
recolhe os gritos desta verdade no formalizada que se apresenta ao
analista como sintomas do sujeito.
A inveno da prtica analtica abriu um novo campo que foi chamada por
Freud de realidade psquica. Fato que tem uma incidncia poltica, poisevidencia alm da realidade da que organiza nosso mundo uma outra,
particular do sujeito, que no pode ser coletivizada.
Para Lacan o sintoma constitui a ordem na qual se verifica nossa poltica,
onde a questo da polis pode ser interpretada. Freud formulou uma teoria
da cultura considerando que caractersticas do psquico decorrem da
passagem do humano, visto evolutivamente enquanto animal, para o
humano enquanto regulado por uma ordem cultural.
Freud descobre que a razo desta passagem a sexualidade que ao inserir
a diferena, instaura o simblico. O animal humano fica entodesnaturalizado pelo fato dele ser parasitado pela linguagem.
A sexualidade humana mostra que pelo fato do animal humano estar
atravessado por uma ordem diferente da natural, diferentemente dos outros
animais, no tem um objeto sexual pr-determinado. Para Freud, o principal
parmetro que demonstraria a submisso do sujeito humano a uma
organizao diferente da natural, que o simblico, seria a existncia das
estruturas de parentesco.
Esta submisso ao regime de proibies que regula a interdio do incesto,
piv da estrutura de parentesco, exige do sujeito uma renncia pulsional,
fundamento da coexistncia social. A cultura se constri, segundo Freud,
sobre a renncia pulsional. Porm Freud observou um paradoxo ao qual ele
chamou de mal-estar na civilizao, que a constatao de que a
civilizao exige de cada sujeito no s renncias, mas cada vez mais
renncias.
Lacan, sensvel s caractersticas atuais da cultura, a pensou no como
satisfao substitutiva de desejos, como Freud, mas incluiu o gozo que
implica uma complementao objetal, caso das culturas capitalistas.
-
7/27/2019 19133256 Marcio Peter Lacan Com Marx
2/4
A viso da cultura difere de Lacan difere da de Freud, pois Lacan equaciona
a cultura em termos de gozo. A figura atual da renncia ao gozo, o mal-
estar da cultura atual, segundo Lacan, decorre do consumo interminvel de
bens. Objetos estes impostos pelo mercado, que nos obrigam a trabalhar
mais, fazendo com que forma de renncia atual ao gozo seja a alienao do
sujeito ao trabalho.
Lacan em um texto que est nos Escritos "De um sujeito finalmente em
questo", diz: ... difcil no ver, j antes da psicanlise, introduzida uma
dimenso que poderia chamar de sintoma, que se articula pelo fato de que
representa o retorno da verdade como tal na falha de um saber, se pode
dizer que esta dimenso, inclusive se no est explicitada ai, altamente
diferenciada na crtica de Marx...
Lacan faz Marx o inventor do sintoma, o que desloca uma noo idealista desintoma que seria a de entend-lo como realizao de desejos como era
para Freud, e ampli-lo, pois para Marx o sintoma o sintoma de uma
verdade (por isso Marx o inventor do sintoma) e para Freud o sintoma a
verdade.
Segundo Lacan: H apenas um sintoma social: cada indivduo realmente
um proletrio. Ainda Lacan: O proletrio no simplesmente explorado,
ele aquele que foi despojado da sua funo de saber. Todos somos
proletrios, porque a condio que determina as relaes entre os sujeitos
humanos deve-se a que no h uma verdade que possa ser dita.
A mais valia marxista um conceito que permite que Marx precise a
explorao imposta ao proletrio pelo proprietrio dos meios de produo.
Marx diz que quando o capitalista percebe que o preo pago por uma
mercadoria como valor de troca tem uma mais-valia (que o trabalho) ele
ri. Marx diz: "O capitalista sorri quando est frente ao encanto de algo que
brota de nada".
A partir desse riso do capitalista Lacan estabelece a homologia entre mais-
valia e mais-gozar entre MEHWERT e MERLUST = MARXLUST.
Lacan prope uma frmula que resume sua posio: "A mais-valia a causado desejo da qual uma economia faz seu princpio. Ou seja, o mais-gozar
foi deduzido por Lacan tanto de Freud (Lustgwinn) como de Marx, o que
permite a Lacan formular uma nova conexo entre o objeto produzido
tecnicamente e a satisfao da pulso. Ao colocar Marx como o inventor do
sintoma, Lacan pode definir o sintoma como sendo a expresso do Real no
Simblico, reformulando a definio de sintoma como uma comemorao de
um trauma ou como a expresso de uma realizao de desejo, com sua
estrutura de metfora.
A sexualidade e a globalizao
-
7/27/2019 19133256 Marcio Peter Lacan Com Marx
3/4
Se no h cura do mal-estar, para que serve interpretar a cultura?
O psicanalista no pode prometer uma cura do sintoma social, nem um lao
social adequado, nem satisfao, mas apenas uma tica outra que a que
identifica o bem com o bem-estar.
No se pode negar que existe uma demanda social, que se identifica comuma demanda teraputica, que a de reduzir o sintoma. O psicanalista
trabalha para a adaptao do analisante ao mundo capitalista ou para a
verdade particular do sujeito?
0 analista, sendo ele mesmo um objeto do mercado deve se lembrar
que a tica analtica situa-se alm do teraputico.
Como o analista no pode deixar de levar em considerao o desejo de
alvio teraputico dos sintomas, isto faz com que ele tenha que secomprometer com a causa do inconsciente, o que, quase sempre, se
contrape causa do mercado, j que cada um conta somente com sua
verdade particular para responder ao mal-estar.
O piv da mquina que sustenta a estrutura social a figura do Pai, funo
ligado a sexuao masculina, que comporta um todo. Na cultura atual
observa-se uma menor eficcia da metfora paterna, e uma pulverizao
dos ideais. A poca da globalizao deixou de ser regida pelo Pai, que o
que faz todo, totaliza, a globalizao uma destotalizao, o no-todoligado ao feminino, ligado a individuao, ligado ao sujeito sem referncia
do discurso capitalista.
Se o antigo mestre era o pai, que se fazia obedecer, o mestre
contemporneo o mercado. A cultura atual, claramente capitalista, exige
do sujeito que se submeta ao imprio do consumo.
Lacan ao usar de figuras poticas, de ironias, de chistes para falar da
anlise, consegue amalgamar poeticamente outras dimenses na reflexo
da clnica, que incluem o social, como exemplifica o conceito de mais
-gozar, pardia da mais-valia marxista.
Lacan, revisita a sexualidade com o conceito de falo e inventa o termo
sexuao que se separa do sexo biolgico e do gnero. Sexuao para
Lacan significa que, para um sujeito, se coloca a questo de saber como se
significantiza o sexo biolgico. A sexuao edefinida em relao ao falo e
no aos gametas.
Figura refere-se a uma forma de expresso que foge a uma norma
rigorosa, smbolo, licena potica. Lacan usou e abusou da criao de
termos, expresses, frases e paralelamente a uma formalizao rigorosa da
clnica utilizou metforas e analogias para referir-se ao que encontrava na
-
7/27/2019 19133256 Marcio Peter Lacan Com Marx
4/4
prtica, criando figuras que constituem o que se pode chamar de clnica
assistemtica.
A srie das figuras criadas por Lacan para ilustar os efeitos da sexuao
inclui expresses como Empuxo mulher, parceiro sintoma, homem
sem enrolao.Para falar da mulher Lacan inventa ditos tais como (in Televiso): Todas as
mulheres so loucas ou ainda A mulher s encontra o homem na psicose.
Outras construes se sustentam exclusivamente na referncia literatura,
como a mulher pobre, referncia a um romance de Leon Bloy; ou a um
texto de psicanlise, como mascarada feminina, artigo de Joan Riviere.
Lacan adjetiva cimes e masoquismo de femininos, inventa uma
devastao feminina, e define a verdadeira mulher, que pode ser
entendido como um elogio castrao. Existe tambm figuras criadas por
comentadores de Lacan, como homem lacaniano proposto por J. A. Miller
in De mulheres e semblantes.
Encontra-se na obra de Lacan o que J. Aubert chama de gestos joyceanos de
escritura, caracterizados por neologismos como parletre, que uma
condensao entre parler (falar) e etre (ser); paretre, condensao
entre "parecer e "ser; lituraterre, corruptela de "literature;
linguisteria, condensao entre lingstica e histeria, etc.