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41 Anuário de Literatura, ISSNe: 2175-7917, vol. 16, n. 2, p. 41-53, 2011 DOI: 10.5007/2175-7917.2011v16n2p41 EDGAR ALLAN POE E O SURGIMENTO DO CONTO ENQUANTO GÊNERO DE FICÇÃO Greicy Pinto Bellin Universidade Federal do Paraná Resumo: o objetivo do presente trabalho é descrever, discutir e analisar o surgimento do conto enquanto gênero de ficção, tendo como ponto de partida uma reflexão a respeito de Review of Twice-Told Tales, resenhas críticas de Edgar Allan Poe sobre os contos de um de seus contemporâneos, o escritor Nathaniel Hawthorne. Em tais textos, Poe apresenta a teoria da unidade de efeito, juntamente com a tese de que o conto poderia ser o veículo apropriado para a expressão máxima dos talentos de um artista. Além disso, será analisado o contexto literário norte-americano de princípios do século XIX, período no qual Poe produziu sua obra e que assistiu à consolidação do conto enquanto gênero ficcional. Neste sentido, serão abordados alguns aspectos do referencial teórico existente sobre narrativas curtas, a fim de problematizar alguns aspectos suscitados pela análise de Poe. Por último, serão feitas algumas considerações a respeito das ressonâncias de Poe na crítica literária, considerando que Mário de Andrade, Machado de Assis e Julio Cortázar retomam, rediscutem e reelaboram algumas noções propostas por Poe a respeito do conto. Palavras-chave: Conto. Gênero de ficção. Unidade de efeito Introdução Edgar Allan Poe foi poeta, ficcionista, crítico literário e editor. Sua figura até hoje é alvo de inúmeros debates no campo dos estudos literários, seja pelo seu consciente e preciso trabalho com a linguagem, ou por ter ajudado a difundir o estereótipo do poeta maldito, que influenciou vários poetas de gerações posteriores ao Romantismo. Como escritor, Poe é um dos precursores da literatura de ficção científica e fantástica modernas. Seus contos de terror, tais como “A queda da casa de Usher”, “O gato preto” e “O coração denunciador”, só para citar alguns, mergulham fundo na psique humana e provocam estados de tensão violenta, características que fizeram com que o autor fosse elevado à categoria de mestre do horror. Outros de seus contos, tais como “Os crimes da Rua Morgue”, Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.

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  • 41 Anurio de Literatura, ISSNe: 2175-7917, vol. 16, n. 2, p. 41-53, 2011

    DOI: 10.5007/2175-7917.2011v16n2p41

    EDGAR ALLAN POE E O SURGIMENTO DO CONTO ENQUANTO GNERO DE FICO

    Greicy Pinto Bellin Universidade Federal do Paran

    Resumo: o objetivo do presente trabalho descrever, discutir e analisar o surgimento do

    conto enquanto gnero de fico, tendo como ponto de partida uma reflexo a respeito de

    Review of Twice-Told Tales, resenhas crticas de Edgar Allan Poe sobre os contos de um de

    seus contemporneos, o escritor Nathaniel Hawthorne. Em tais textos, Poe apresenta a teoria

    da unidade de efeito, juntamente com a tese de que o conto poderia ser o veculo apropriado

    para a expresso mxima dos talentos de um artista. Alm disso, ser analisado o contexto

    literrio norte-americano de princpios do sculo XIX, perodo no qual Poe produziu sua obra

    e que assistiu consolidao do conto enquanto gnero ficcional. Neste sentido, sero

    abordados alguns aspectos do referencial terico existente sobre narrativas curtas, a fim de

    problematizar alguns aspectos suscitados pela anlise de Poe. Por ltimo, sero feitas algumas

    consideraes a respeito das ressonncias de Poe na crtica literria, considerando que Mrio

    de Andrade, Machado de Assis e Julio Cortzar retomam, rediscutem e reelaboram algumas

    noes propostas por Poe a respeito do conto.

    Palavras-chave: Conto. Gnero de fico. Unidade de efeito

    Introduo

    Edgar Allan Poe foi poeta, ficcionista, crtico literrio e editor. Sua figura at hoje

    alvo de inmeros debates no campo dos estudos literrios, seja pelo seu consciente e preciso

    trabalho com a linguagem, ou por ter ajudado a difundir o esteretipo do poeta maldito, que

    influenciou vrios poetas de geraes posteriores ao Romantismo.

    Como escritor, Poe um dos precursores da literatura de fico cientfica e fantstica

    modernas. Seus contos de terror, tais como A queda da casa de Usher, O gato preto e O

    corao denunciador, s para citar alguns, mergulham fundo na psique humana e provocam

    estados de tenso violenta, caractersticas que fizeram com que o autor fosse elevado

    categoria de mestre do horror. Outros de seus contos, tais como Os crimes da Rua Morgue,

    Esta obra est licenciada sob uma Licena Creative Commons.

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    A carta roubada e O mistrio de Marie Roget, figuram entre as primeiras obras

    reconhecidas como policiais, exercendo grande influncia, no sculo XIX, sobre a obra de

    Arthur Conan Doyle, e no sculo XX, sobre os romances de Agatha Christie. Alm das

    narrativas detetivescas e de mistrio, Poe escreveu stiras, contos de humor e de fico

    cientfica, tais como The Balloon Hoax, no qual narra o aparecimento de novas tecnologias

    como os bales de ar quente. Ao mesmo tempo em que ajudou a lapidar uma tradio literria

    independente dos padres ingleses, Poe mantinha-se preso a certos padres literrios

    europeus, em especial vertente gtica do Romantismo ingls e obra da escritora Ann

    Radcliffe.

    Como poeta, Poe sofre uma srie de influncias: Lord Byron, William Wordsworth e

    Samuel Taylor Coleridge, seja na caracterizao de personagens noturnos e bomios, seja nas

    descries poticas da natureza, ou na preocupao em retratar o mistrio e o sobrenatural. O

    autor tambm inovou a forma de se escrever poesia ao produzir os ensaios O princpio

    potico e A racionalidade do verso, nos quais preconizava a preponderncia dos aspectos

    formais sobre os de contedo. Outro ensaio de grande importncia A filosofia da

    composio, no qual ele relata como comps o poema O corvo, mostrando que o fazer

    potico poderia ser uma elaborao racional e desmistificando a noo de que a poesia era

    uma simples expresso dos sentimentos do artista.

    Como editor, Poe atuou em revistas de Richmond, Filadlfia e Nova Iorque. O autor

    foi auxiliado por John Pendleton Kennedy, o principal mecenas literrio do sul dos EUA.

    Com a ajuda de Kennedy, ele se tornou a figura literria de maior importncia nesta regio,

    opondo-se de maneira ferrenha ao transcendentalismo1 predominante na literatura da Nova

    Inglaterra. Isto lhe garantiu a antipatia de escritores como o transcendentalista Ralph Waldo

    Emerson, fazendo com que ele se tornasse uma figura controversa no mercado editorial

    norte-americano2 (HAYES, 2002, p. 6).

    1 Primeiro movimento literrio norte-americano, liderado por Ralph Waldo Emerson e Henry David Thoreau,

    surgido entre 1815 e 1836 na pequena cidade de Concord, no Estado de Massuchussets, que se configurou como

    uma forte reao contra o racionalismo do sculo XVIII e conferiu profundidade filosfica literatura norte-americana. Os transcendentalistas afirmavam que o indivduo poderia transcender a realidade e dar origem a uma

    nova forma de pensamento. Para eles, o homem o centro espiritual do universo, e pode encontrar sozinho o

    caminho para a natureza e para o cosmos. Dentro desta perspectiva as convenes literrias e sociais no eram

    teis e sim perigosas, pois o escritor deveria encontrar uma forma, uma voz e um contedo literrio autnticos. A

    filosofia transcendentalista um misto de neoplatonismo, filosofia idealista alem e misticismo oriental, tendo

    influenciado bastante a literatura norte americana posterior, desde Walt Whitman at o movimento beat na

    dcada de 1960. 2 A controversial figure in the American literary market. ( traduo nossa)

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    Com base nestas ideias, o objetivo deste trabalho descrever, discutir e analisar o

    surgimento do conto enquanto gnero de fico, tendo como ponto de partida as reflexes de

    Poe em Review of Twice Told-Tales, um conjunto de resenhas crticas publicadas na revista

    literria Grahams Magazine nos anos de 1842 e 1847. Em tais textos, Poe analisa uma

    coletnea de contos de um de seus contemporneos, o escritor Nathaniel Hawthorne, da Nova

    Inglaterra, argumentando que a fico curta seria o veculo mais apropriado para a expresso

    mxima dos talentos de um artista. Alm disso, o autor prope a teoria da unidade de efeito,

    que preconiza que uma narrativa deve ser lida de uma s assentada, do contrrio os

    interesses do mundo que intervm durante as pausas da leitura modificam, desviam, anulam,

    em maior ou menos grau, as impresses do livro (POE, 2004, p. 3). Ao defender esta tese,

    Poe se posiciona contra grande parte do fazer literrio de sua poca. De acordo com Robert

    Spiller, as opinies sobre Poe na poca romntica eram divergentes, mas preponderantemente

    negativas: Tennyson o achava um gnio, e Emerson acreditava que ele era um homem da

    selva. Henry James pensava que o fascnio em relao obra de Poe refletia um estado

    primitivo de conscincia. Paul Valry, por sua vez, acreditava que Poe havia contribudo

    muito para a crtica literria com suas ideias vanguardistas (SPILLER, 1963, p. 321). Outros

    crticos acreditam que Poe era uma alma perturbada, fato que ajuda a explicar sua falta de

    sucesso profissional (TOMC, apud HAYES, 2002, p. 21). E o escritor Robert Louis

    Stevenson, em um ensaio intitulado A academia, expressou sua convico a respeito do

    talento de Poe mas criticou sua imagem pessoal, pois tambm acreditava que o esteretipo do

    alcolatra que intercalava perodos criativos com crises depressivas foi um empecilho para o

    estabelecimento de uma reputao respeitvel (STEVENSON, apud SPILLER, 1963, p. 322).

    A crtica das ltimas dcadas tenta desmistificar a imagem de Poe como alienado e

    passa a se concentrar na maestria de seu trabalho com a linguagem literria. Na viso de

    Ricardo ARAJO (2002, p. 37), o poeta se movia entre o grotesco, o arabesco3 e o bizarro,

    caractersticas estas que eram personificadas nas maldades dos protagonistas masculinos. E

    para William Carlos Williams, foi o primeiro escritor a fazer da literatura norte-americana

    3 De acordo com os dicionrios de lngua portuguesa, arabesco apresenta duas definies. A primeira se refere

    a uma elaborada combinao de formas geomtricas semelhantes s de animais e plantas. So elementos da arte

    islmica, normalmente usados para enfeitar as paredes das mesquitas. A segunda definio se refere ao ato de

    rabiscar de forma pouco legvel. Tales of the grotesque and arabesque o ttulo original das Histrias

    Extraordinrias de Poe, nas quais o grotesco corresponderia s narrativas satricas, e o arabesco s narrativas de terror, que causam calafrios no leitor. A primeira definio de arabesco foi usada por Poe no ensaio Filosofia do mobilirio, no qual discorre sobre arquitetura. Baseando-se em todas estas informaes, chegamos concluso de que arabesco, em seu sentido figurado, significa algo extico e misterioso, j que a palavra tambm usada no conto A queda da casa de Usher, para descrever a aparncia do aristocrata Roderick Usher.

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    algo srio, no uma questo de imaginao ou de verdade (WILLIAMS, apud ASSELINEAU,

    2009, p. 5). Desta forma, devemos no s enfatizar a importncia de Poe para a formao da

    literatura de seu pas como tambm reconhecer a relevncia de suas contribuies para

    geraes subsequentes de escritores. Exemplos no nos faltam: Mrio de Andrade, Julio

    Cortzar e at Machado de Assis retomaram, rediscutiram e reelaboraram a teoria da unidade

    de efeito. Este tambm um dos objetivos deste trabalho: compreender e refletir, ainda que

    brevemente, como estes autores se posicionaram em relao s teorias de Poe, contribuindo

    assim para a consolidao do conto enquanto gnero de fico.

    Edgar Allan Poe e o Romantismo norte-americano

    A fim de entender as condies que favoreceram o surgimento do conto, necessrio

    discorrer a respeito do contexto norte-americano de princpios do sculo XIX. Aps a

    revoluo de 1776, teve incio um grande processo de expanso territorial que diminuiu os

    contatos com a Europa e fortaleceu o nacionalismo norte-americano. Desde a revoluo at

    1820, a rea do pas dobrou mais da metade; a populao americana saltou de 9 milhes em

    1820 para 23 milhes em 1850. A nova literatura comea a ser produzida por volta de 1820,

    tendo como principais caractersticas o nacionalismo e a busca de uma independncia em

    relao literatura britnica. Com a expanso das primeiras instituies de ensino superior, o

    contingente de leitores comeou a crescer. Este crescimento tambm se verificou graas ao

    avano das tcnicas de impresso e publicao, melhora dos meios de comunicao e

    sofisticao da vida urbana. Nova York e Boston se tornaram os mais importantes centros

    literrios dos EUA, produzindo grandes oradores, professores e escritores, entre eles o

    transcendentalista Ralph Waldo Emerson. O Romantismo norte-americano foi baseado na

    imitao de poetas ingleses como Wordsworth e Coleridge, mas com fortes contornos

    nacionalistas, uma vez que o surgimento da esttica romntica coincidiu com o despertar da

    conscincia nacional americana. Os primeiros escritores que se preocuparam com a

    construo de uma literatura nacional foram Washington Irving, William Cullen Bryant e

    James Fenimore Cooper. Bryant considerado o emancipador da poesia dos EUA, pois

    conferiu-lhe espontaneidade e simplicidade. Washington Irving, por sua vez, iniciou a carreira

    como humorista, tornando-se mais tarde um autor romntico. Ele manifesta um gosto pelo

    sentimentalismo, pelo passado lendrio e pela bondade da natureza humana, tendo sido

    influenciado pelos romances de Sir Walter Scott. Fenimore Cooper explorou o nacionalismo,

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    situando suas narrativas nas reas da fronteira norte-americana, desenvolvendo o chamado

    romance de fronteira, que se popularizou na famosa obra O ltimo dos moicanos.

    Poe, que nasceu em Boston mas produziu sua obra no sul dos EUA, foi influenciado

    principalmente por Samuel Taylor Coleridge, influncia esta que fica bastante clara em

    Poems, publicado em 1831. Os poemas de Coleridge so retratados em lugares distantes e

    misteriosos, se referindo muitas vezes a um passado medieval, que uma das preferncias dos

    poetas romnticos. Ele se interessava por magia, ocultismo, misticismo e hipnotismo,

    explorando os desvios da mente humana e as atmosferas pesadelares que eram caractersticas

    do consumidor de pio, j que o prprio Coleridge consumia esta droga. Assim como o poeta

    ingls, Poe acreditava que o objetivo da poesia era falar de beleza, e com isso acaba

    rompendo com todas as tendncias moralistas e filosficas da Amrica do Norte,

    escarnecendo as especulaes poticas dos transcendentalistas (TAYLOR, 1956, p. 118).

    Desta maneira, o autor se coloca contra a perspectiva que concebia a literatura como algo

    moralizante, que deveria inculcar valores ticos e at mesmo religiosos nos leitores. Para ele,

    o objetivo da literatura era, alm de falar de beleza, criar uma sensao de prazer, de deleite,

    permitindo ao leitor uma fuga da realidade e a imerso em um mundo sobrenatural e

    imaginrio. Com isto, Poe faz jus ideia de suspenso da descrena defendida por Coleridge,

    segundo a qual o leitor, para entrar no mundo ficcional, deve dispor-se a aceitar como

    verdadeiras as premissas deste mundo, mesmo que elas sejam fantsticas, impossveis e

    contraditrias.

    A partir destas idias, no difcil imaginar a posio excntrica que Poe ocupava

    em relao ao fazer literrio de sua poca. Neste sentido, o surgimento da fico curta de

    suma importncia, pois, ao mesmo tempo em que sinalizava a originalidade do autor,

    confirmava uma tendncia que estava se esboando no mercado editorial norte-americano. Na

    dcada de 1850, as revistas norte-americanas publicavam um nmero enorme de contos, de

    quatro a cinco por edio. Eles se popularizaram devido ao grande pblico leitor, constitudo

    principalmente por mulheres. Mas como ainda era forte a presena do romance, a fico curta

    no apresentava um estatuto literrio consolidado, firmando-se como um campo de

    experimentao artstica no mundo anglo-americano. Ela foi usada no s para explorar temas

    fantsticos como tambm para introduzir novas regies, temas e personagens, expressando

    novas vises de mundo e/ou a prpria desordem social. Na viso de OConnor (2004, p. 39),

    os norte-americanos so grandes contistas: eles desenvolveram to bem o conto curto que

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    esta forma parece ser americana4. De acordo com Pratt (1994, p. 104), o conto foi

    considerado por muitos uma forma de sinalizar o suposto fim da dominao literria britnica

    na literatura dos EUA. Pela primeira vez os escritores da Amrica do Norte tinham

    encontrado uma forma prpria de fazer literatura que traduzia os anseios de uma nao

    independente, seja representando a natureza como fez Irving, seja retratando o sobrenatural

    como fez Poe, seja expressando e/ou contestando a ideologia puritana como fez Hawthorne.

    Alm disso, o conto era visto como uma forma de se expressar o mundo dos sonhos e

    do inconsciente. Isto talvez possa explicar a abundncia de narrativas curtas de mistrio e

    terror, que tematizam os excessos e os desvios da mente humana. Sem dvida o conto foi o

    principal veculo de expresso da literatura fantstica e sobrenatural, tpicos marginalizados

    por uma tradio romanesca calcada no realismo. bvio que h uma srie de romances

    representando o sobrenatural, tais como os de Ann Radcliffe, mas tal representao no a

    mesma que observamos no conto. Um dos objetivos da fico curta isolar um determinado

    momento da vida humana e representar o ser humano solitrio, e desta forma os estados

    emocionais dos personagens podem ser retratados de forma minuciosa. A maioria deles

    complexa e passa por mudanas internas, conforme percebemos no conto Berenice, de Poe,

    narrado em primeira pessoa por Egeu, um intelectual que vive compenetrado na leitura de

    seus livros e em suas meditaes na biblioteca. Quando sua prima Berenice adoece, ele

    comea a ficar agitado e a ter uma srie de fantasias com a jovem a ponto de lhe propor

    casamento, algo que no havia passado pela sua cabea enquanto ela estava saudvel. A

    excentricidade e o desequilbrio emocional de figuras como esta parecem explicar a

    associao de formas ficcionais curtas com o mergulho no universo psicolgico dos

    personagens e a sondagem de mundos onricos que escapam compreenso humana. Isto fica

    bastante claro em outros contos de Poe, tais como O corao denunciador, O gato preto,

    O barril de Amontillado e A mscara da morte rubra. Neste sentido, possvel identificar

    a tendncia a representar, no conto, personagens tidos como outsiders, uma vez que o gnero

    curto permite a explorao de figuras que transgridem as regras sociais (OCONNOR, 2004,

    p. 18).

    Review of Twice-Told Tales e o surgimento do conto enquanto gnero ficcional

    4 Americans have handled the short story story so wonderfully that one can say it is a national form. (minha

    traduo)

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    Tendo atuado como crtico e editor, Poe foi o primeiro a refletir a respeito da fico

    curta, por meio das resenhas sobre Twice Told-Tales. Ao analisar tais textos, iremos nos deter

    em aspectos fundamentais para a compreenso da teoria da unidade de efeito e dos problemas

    tericos suscitados por ela.

    Um aspecto que no pode deixar de ser problematizado diz respeito diferena entre

    os termos tale e short story. Tale se refere a uma narrativa relatada oralmente, na qual,

    segundo MAY (2004) no h um aprofundamento na psique dos personagens, que so apenas

    alegorias criadas com o objetivo de provar uma determinada moral. O termo short story, por

    sua vez, se refere a um gnero de fico no qual h uma unidade de efeito, alm de

    personagens complexos, que passam por mudanas internas. No presente trabalho, optei por

    usar o termo conto ou fico curta como equivalente de short story na lngua portuguesa, a

    fim de uniformizar a terminologia utilizada. Em suas resenhas, Poe usa o termo tale para se

    referir a conto, o que nos indica que o termo short story ainda no era usado naquela poca,

    tendo sido adotado posteriormente.

    Em suas duas primeiras resenhas, Poe faz grandes elogios aos contos de Hawthorne,

    atitude esta que no observamos na terceira resenha, na qual ele afirma que o escritor no de

    forma alguma original, e sim singular. A falta de originalidade de Hawthorne vem do fato de

    que seus contos so tales, isto , meras alegorias morais que, na viso de Poe, obliteram os

    sentidos das narrativas, uma vez que se, alguma vez, uma alegoria obteve algum resultado,

    foi custa da aniquilao da fico (POE, 2004, p. 9). Com esta afirmao, o autor sugere

    que os contos de Hawthorne no so short stories, pois carecem da originalidade que deve

    acompanhar este gnero ao lanar mo de narrativas alegricas que possuem um fundo moral.

    As crticas a Hawthorne parecem ter relao com a cisma nutrida por Poe em relao ao

    establishment literrio de sua poca, aspecto este que se faz presente de forma muito clara nas

    resenhas. Neste sentido, no podemos deixar de sublinhar que Hawthorne era um escritor da

    Nova Inglaterra, cuja produo literria se caracteriza pelo puritanismo e pela preocupao

    excessiva com a moral crist e o pecado original. Alm disso, Hawthorne era filiado ao

    movimento transcendentalista, sendo amigo de Ralph Waldo Emerson. A literatura de Poe,

    por outro lado, no comungava com os princpios e valores do Transcendentalismo, uma vez

    que ele escrevia contos de terror, mistrio e morte. Sendo assim, podemos interpretar as

    censuras de Poe como manifestaes de uma certa repulsa em relao s panelinhas

    insolentes que acossam nossa literatura (POE, 2004, p. 4). importante tambm ressaltar

    que, ao longo das resenhas, se faz presente a crena de que a literatura norte-americana carece

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    de obras de real mrito e valor, e, ao afirmar isso, Poe no s critica seus contemporneos

    como tambm clama por originalidade e por um fazer literrio que fosse, de fato, norte-

    americano.

    No primeiro pargrafo da primeira resenha, que foi publicada na Grahams

    Magazine em abril de 1842, Poe lana os principais motes da reflexo sobre o conto,

    suscitando alguns problemas tericos que devem ser problematizados. Alm de reconhecer as

    possibilidades da fico curta como forma de expresso artstica, o autor afirma que ela

    possui vantagens peculiares sobre o romance, uma rea muito mais refinada que o ensaio, e

    chega a ter pontos de superioridade sobre a poesia (POE, 2004, p. 1). A comparao do

    conto com o romance , de fato, frequente nos manuais de crtica literria. Em relao ao

    romance, o conto apresenta um referencial terico mais restrito por ser, obviamente, um

    gnero mais recente. Para Pratt (1994, p. 95), o conto uma construo artstica na qual se d

    a comunicao de uma sequncia limitada de acontecimentos, experincias ou situaes de

    acordo com uma ordem que possui uma totalidade prpria. E na viso de Fergusson (1994, p.

    218), o conto definido em termos de unidade de efeito, tcnicas de compresso do enredo,

    revelao ou mudana de personalidade, sem falar no lirismo. Tal forma de fico apresenta

    apenas fragmentos da vida, pedaos da existncia humana, de forma que as digresses so

    omitidas, pois a ideia oferecer ao leitor subsdios suficientes para interpretar a narrativa, sem

    grandes reflexes a respeito de um tema e/ou de um personagem. De acordo com OConnor

    (2004, p. 13), o objetivo do conto seria satisfazer o leitor individual, crtico e solitrio, pois tal

    leitor, inserido em um contexto marcado pela rapidez na comunicao e pela agilidade da vida

    moderna, no teria tempo hbil para ler um romance, preferindo a leitura de uma narrativa

    curta.

    Mary Louise Pratt sustentava a opinio de que a fico curta era incompleta em

    relao ao romance, uma vez que este ltimo representava a vida humana em sua totalidade,

    enquanto o conto iluminava apenas uma parte de uma teia maior de acontecimentos. (PRATT,

    2004, p. 99). Entretanto, Poe, em sua segunda resenha, publicada em maio de 1842, continua

    a afirmar que o conto superior ao romance, uma vez que no possvel ler este ltimo de

    uma s assentada (POE, 2004, p. 3). Na viso do autor, durante a leitura do conto o leitor

    deve ficar merc do escritor, o que preconiza um domnio da tcnica literria que se

    manifestar tambm na composio da narrativa. A esse respeito, Poe afirma que

    Um artista literrio habilidoso constri um conto. Se sbio, no amolda os

    pensamentos para acomodar os incidentes, mas, depois de conceber com cuidado

    deliberado a elaborao de um certo efeito nico e singular, cria os incidentes

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    combinando os eventos de modo que possam melhor ajud-lo a estabelecer o efeito anteriormente concebido. Se a primeira frase no se direcionou para esse efeito, ele

    fracassa j no primeiro passo. Em toda a composio no deve haver sequer uma

    palavra escrita cuja tendncia, direta ou indireta, no leve quele nico plano pr-

    estabelecido. Com tal cuidado e habilidade, atravs desses meios, um quadro por fim

    ser pintado e deixar na mente de quem o contemplar um senso de plena satisfao.

    A ideia do conto apresentou-se imaculada, visto que no foi perturbada por nada.

    Este um fim a que o romance no pode atingir. A brevidade excessiva censurvel

    tanto no conto quanto no poema, mas a excessiva extenso deve ser ainda mais

    evitada. (POE, 2004, p. 3)

    Tais ideias parecem revelar uma excessiva racionalizao do fazer literrio, expressa

    em noes categricas e programticas a respeito da criao ficcional, mas na realidade

    apontam para a existncia de um artista extremamente consciente das tcnicas que devem ser

    utilizadas para a elaborao bem sucedida de uma narrativa curta. A subordinao dos

    incidentes narrados a um efeito nico e singular remete a um princpio de coerncia que deve

    existir no texto de fico, a fim de criar no leitor uma impresso derivada da totalidade. Desta

    maneira, Poe reafirma a superioridade do conto sobre o romance, argumentando que este

    jamais poderia atingir a unidade de efeito de uma narrativa de curta extenso.

    Poe prossegue sua argumentao afirmando que a Beleza o objetivo do poema,

    conforme explicitado em A filosofia da composio, ao passo que o objetivo do conto seria

    a Verdade. O autor volta a dizer que h poucos contos americanos de real valor, com exceo

    dos Tales of a Traveller, de Washington Irving, e os Twice Told-Tales. Neste sentido, Poe

    sustenta que de vez em quando, encontram-se em nossos peridicos artigos que podem ser

    vantajosamente comparados aos melhores exemplares das revistas britnicas. Mas,

    geralmente, estamos muito atrs de nossos progenitores neste departamento da literatura

    (POE, 2004, p. 4). Ao analisar esta citao, percebemos o quanto Poe era consciente no s da

    dependncia da literatura norte-americana em relao britnica, como tambm da suposta

    inferioridade da produo ficcional dos EUA em comparao com as produes inglesas da

    mesma poca.

    Na terceira resenha, publicada em 1847, Poe reitera a teoria da unidade de efeito,

    criticando Hawthorne ao invs de elogi-lo, destacando sua preferncia pela alegoria e

    rotulando-o de bom mstico (POE, 2004, p. 12). O golpe final de misericrdia dado nas

    quatro ltimas linhas do texto, que expressam um verdadeiro desprezo no pela pessoa de

    Hawthorne em si mas pelo tom geral de sua obra e pelo iderio transcendentalista que o

    acompanha: que o Sr. Hawthorne emende a sua pena, procure um frasco de tinta visvel,

    abandone sua Velha Morada, rompa com o Sr. Alcott, enforque (se possvel) o diretor de The

    Dial e jogue aos porcos todos os nmeros que tenha de The North American Review (POE,

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    2004, p. 13). No que concerne a esta citao, algumas informaes devem ser esclarecidas

    para que se compreenda o sentido da crtica de Poe. Ao citar o Sr. Alcott, o autor est se

    referindo a Bronson Alcott, pedagogo norte-americano que comungava com algumas ideias

    do Transcendentalismo. The Dial era o peridico do grupo transcendentalista, e The North

    American Review a primeira revista literria dos EUA, criada em Boston em 1815. Sendo

    assim, podemos inferir que a teoria esttica proposta por Poe, bem como as censuras dirigidas

    a Hawthorne, representam um incisivo questionamento em relao s prticas literrias e

    editoriais de princpios do sculo XIX. Isto parece nos mostrar que Poe no era simplesmente

    um crtico ressentido pela quase total ausncia de originalidade no fazer literrio de sua poca,

    mas um verdadeiro inovador no campo da teoria literria e, principalmente, da prpria

    literatura.

    Consideraes finais

    De acordo com Gotlib (2006, p. 32), a teoria de Poe sobre o conto recai no princpio

    de uma outra relao: entre a extenso do conto e a reao que ele consegue provocar no leitor

    ou o efeito que a leitura lhe causa. A problemtica da extenso foi retomada por Machado de

    Assis na nota de prefcio de Vrias Histrias, na qual o escritor brasileiro, alm de fazer

    referncia explcita a Poe, reafirma a superioridade da fico curta sobre o romance:

    No so feitos (os contos)5 daquela matria, nem daquele estilo que do aos de

    Mrime o carter de obras primas, e colocam os de Poe entre os primeiros escritos

    da Amrica. O tamanho no o que faz mal a este gnero de histrias,

    naturalmente a qualidade; mas h sempre uma qualidade nos contos, que os torna

    superiores aos grandes romances, se uns e outros so medocres: serem curtos.

    A partir da leitura no s deste trecho mas dos contos presentes em Vrias Histrias,

    percebemos a ressonncia de Poe na produo literria do prprio Machado de Assis, que

    reconhece sua genialidade e as vantagens da curta extenso na elaborao ficcional. De fato,

    Machado recebeu considervel influncia de Poe, uma vez que contos como A cartomante,

    por exemplo, primam pela unidade de efeito e pelo impacto que causam no leitor. Mrio de

    Andrade, em seu ensaio Contos e Contistas, afirma que Machado de Assis um dos

    descobridores da forma do conto, que considera indefinvel, insondvel, irredutvel a

    receitas (ANDRADE, 1972, p. 8). O escritor modernista inicia seu ensaio afirmando que a

    definio de conto um problema de esttica literria, e que cabe a cada autor definir se uma

    5 Grifo do autor.

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    narrativa conto ou no. Contudo, Mrio reconhece a brevidade desta forma literria ao

    classific-la como romance para revista (ANDRADE, 1972, p. 6), declarando que um

    romance jamais poderia ser publicado aos fragmentos mensais em revistas. Ao contrrio de

    Poe, Mrio de Andrade deixa em aberto a definio de conto, afirmando que ela depende de

    um julgamento pessoal do escritor e que um livro de contos causaria fadiga psicolgica,

    uma vez que o leitor deve deixar de lado os personagens de uma narrativa curta a fim de

    passar para a prxima. Da a necessidade de publicao em revistas literrias, veculos mais

    apropriados para formas breves e concisas.

    Julio Cortzar, em seu ensaio Alguns aspectos do conto, reclama que quase

    ningum se interessa pela problemtica do conto, um gnero que, a seu ver, ganha cada vez

    mais importncia na modernidade. O escritor argentino retoma a definio poeana de conto e

    a rediscute, criando uma metfora que ilustra a atividade (e a criatividade) do contista:

    Um bom conto incisivo, mordente, sem trgua desde as primeiras frases. No se

    entenda isto demasiado literalmente, porque o bom contista um boxeador muito

    astuto, e muitos dos seus golpes iniciais podem parecer pouco eficazes quando, na

    realidade, esto minando j as resistncias mais slidas do adversrio (CORTZAR,

    1974, p. 152).

    Cortzar tambm no perde de vista a ideia de que um conto deve apresentar

    intensidade e tenso, manifestas na eliminao de digresses que fujam da temtica central

    desenvolvida pelo contista. Sem a intensidade a narrativa curta ruim, uma vez que todos os

    elementos devem convergir para o tema desenvolvido. Neste sentido, relevante sublinhar a

    admirao de Cortzar por Poe, visto como o primeiro a aplicar, sistematicamente, o critrio

    de economia, de estrutura funcional (CORTZAR, 1974, p. 124). O autor tambm comenta

    que Poe escrevia seus contos com a finalidade de submeter o leitor, tanto espiritual quanto

    imaginativamente, e que este domnio raramente alcanado por outros contistas. Tambm

    importante sublinhar a comparao feita por Cortzar entre o filme e o romance, o conto e a

    fotografia: os primeiros se caracterizam pela extenso e pela apresentao de longos enredos,

    ao passo que os segundos se aproximam por flagrarem, de forma concisa, breves aspectos da

    vida humana. Em suma, na viso de Cortzar o conto deve ser eficaz e perdurar na memria

    do leitor, da sua filiao s ideias de Poe sobre a unidade de efeito.

    Com base em tudo o que foi exposto no presente artigo, foi possvel observar que, ao

    teorizar a respeito do conto, Edgar Allan Poe foge do esteretipo normalmente associado ao

    escritor romntico, em uma poca na qual, de acordo com Cortzar, o Neoclassicismo

    convidava a espraiar ideias e engenho sob pretexto de qualquer tema, e a influncia romntica

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    induzia a efuses incontroladas e carentes de toda a vertebrao (CORTZAR, 1974, p.

    124). na incisiva crtica ao Transcendentalismo e na lcida teorizao sobre o gnero conto

    que se revela a faceta racional e arguta de Poe, muitas vezes obliterada pelo seu alcoolismo e

    principalmente por sua obscura morte, para a qual, at hoje, no foi encontrada uma razovel

    explicao.

    Referncias

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  • 53 Anurio de Literatura, ISSNe: 2175-7917, vol. 16, n. 2, p. 41-53, 2011

    [Recebido em agosto de 2011 e aceito para publicao em outubro de 2011]

    Edgar Allan Poe and the appearance of the short-story as a genre of fiction

    Abstract: This paper aims to describe, discuss and analyze the appearance of the short story

    as a genre of fiction, using Edgar Allan Poes Review of Twice-Told Tales as a starting point for this reflection. In these critical papers, Poe analyzes Nathaniel Hawthornes short stories, proposing the theory of the unity of effect, as well as the thesis that short narratives could be

    the appropriate vehicle for expressing the highest talents of an artist. The North-American

    literary context from the beginning of the 19th

    century will also be analyzed, as it was the

    period in which Poe produced his works and in which the short story has consolidated itself as

    a genre of fiction. In this sense, some theoretical aspects regarding short narratives will be

    explored, in order to problematize some ideas aroused by Poes theory. Finally, some of Poes influences on literary criticism will be considered, as authors such as Mrio de Andrade,

    Machado de Assis and Julio Cortzar seek to reelaborate and propose new discussions about

    Poes notions about the short story. Keywords: Short-story. Genre of fiction. Unity of effect