22. DO DIREITO DAS SUCESSÕES - Breve introdução

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09 de julho de 2009 DO DIREITO DAS SUCESSÕES (Livro V) Introdução e breves considerações CONCEITO Segundo a doutrina de Clóvis Beviláqua, o direito das sucessões é o conceito de normas e princípios segundo o qual se realiza a transmissão do patrimônio de alguém para depois de sua morte. NATUREZA 1

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09 de julho de 2009

DO DIREITO DAS SUCESSÕES (Livro V)

Introdução e breves considerações CONCEITO

Segundo a doutrina de Clóvis Beviláqua, o direito das sucessões é o conceito de normas e princípios segundo o qual se realiza a transmissão do patrimônio de alguém para depois de sua morte.

NATUREZA

No Brasil o direito sucessório é considerado como um direito fundamental, previsto no art. 5º, CF:

Art. 5º, CFXXX - é garantido o direito de herança;

SISTEMA DA DIVISÃO NECESSÁRIA

Segundo Orlando Gomes, consagrou-se no Brasil o sistema da divisão necessária sobre o patrimônio consubstanciado na herança (1.789, CC).

Art. 1.789, CC - Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança.

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ESPÉCIES DE SUCESSÕES

Aqui serão mencionadas as espécies de sucessões mortis causas, como sucessão hereditária, podendo ser:

1) SUCESSÃO HEREDITÁRIA TESTAMENTÁRIA

Esta espécie de sucessão é realizada através do ato solene do testamento. No Brasil esta espécie de sucessão não é muito utilizada, pela tradição e por razão da cultura brasileira.

A pessoa que morre sem testamento morre ab intestato. Não havendo o testamento válido e eficaz (pode o testamento caducar ou ser considerado inválido), haverá a aplicação do regramento de direito sucessório sobre da sucessão hereditária legítima.

A sucessão hereditária testamentária será de melhor forma estudada no Intensivo II.

2) SUCESSÃO HEREDITÁRIA LEGÍTIMA

Art. 1.786, CC - A sucessão dá-se por lei ou por disposição de última vontade.

Art. 1.787, CC - Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo da abertura daquela.

Art. 1.788, CC - Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado nulo.

Observação: a professora Maria Helena Diniz observa que a sucessão é a título universal quando houver a transferência da totalidade ou de parte indeterminada da herança; por outro lado, será feita a sucessão a título singular

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Parte legítima

Parte disponível

Pode dispor o testador desta

parte como bem entender.

Necessariamente esta parte irá

para os herdeiros legítimos do

testador

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quando o testador transferir ao beneficiário os objetos de forma certa e determinada, como ocorre no caso do legatário.

Não é possível no Brasil haver a celebração de um contrato que tenha por objeton a herança de uma pessoa viva, chamado este contrato vedado de pacta corvina.

Art. 426, CC - Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.

LEI SUCESSÓRIA NO TEMPO E NO ESPAÇO

A disposição sobre a lei sucessória no espaço é matéria que envolve a “competência” para a análise do direito sucessório e será delimitada dentro da seara do direito processual civil.

Art. 1.785, CC - A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido.

O grande problema do direito civil é a disposição legal sobre a aplicação da lei sucessória no tempo, como é disposto no artigo 1.787, CC:

Art. 1.787, CC - Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo da abertura daquela.

Em suma, segundo a leitura do artigo 1.787, CC, a lei que regula o direito à herança, também a legitimidade para recebê-la, no bojo do inventário ou arrolamento é a lei vigente ao tempo da morte do de cujus, isto é, o tempo da abertura da sucessão (REsp 205517/SP, REsp 740127/SC).

Direito civil. Sucessão. Companheira. Sobrinhos do de cujus. Lei aplicável.I. - No direito das sucessões aplica-se a lei vigente ao tempo da abertura da sucessão. Antes da Lei nº 8.971, de 29/12/1994, a companheira não podia se habilitar como herdeira em detrimento de sobrinhos do de cujus.II. - Recurso especial não conhecido.(REsp 205517/SP, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/04/2003, DJ 19/05/2003 p. 222)

Direito civil e processual civil. Recurso especial. Família. Adoção de menor. Lei vigente. Aplicabilidade. Sucessão. Ordem de vocação hereditária. Legitimidade dos irmãos.- Nas questões que versam acerca de direito sucessório, aplica-se a lei vigente ao tempo da abertura da sucessão.- As adoções constituídas sob a égide dos arts. 376 e 378 do CC/16 não afastam o parentesco natural, resultante da consangüinidade, estabelecendo um novo vínculo de parentesco civil tão-somente entre adotante(s) e adotado.- Tem, portanto, legitimidade ativa para instaurar procedimento de arrolamento sumário de bens, o parente consangüíneo em 2º grau na linha colateral (irmão natural), notadamente quando, pela ordem de vocação hereditária, ausentes descendentes, ascendentes (naturais e civis), ou cônjuge do falecido.Recurso especial conhecido e provido.(REsp 740127/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/10/2005, DJ 13/02/2006 p. 799)

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PRINCÍPIO DA SAISINE

A pronúncia correta do vocábulo em francês é princípio da “sésini”. Na linha de entendimento do professor Francisco Cahali, o princípio da

saisine é uma ficção jurídica que visa a impedir que a herança permaneça sem titular: aberta a sucessão, a herança é transmitida imediatamente aos herdeiros legítimos e testamentários.

Art. 1.784, CC - Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.

Observação: vale lembrar que a herança, nos termos do artigo 1.791, CC, enquanto se processa o inventário ou o arrolamento, é indivisível, cabendo a cada herdeiro apenas uma fração ideal do todo.

Art. 1.791, CC - A herança defere-se como um todo unitário (em condomínio, por exemplo), ainda que vários sejam os herdeiros.

Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio.

Observação: O julgado do REsp 570723/RJ, o STJ vem passando a admitir que o herdeiro que ocupa com exclusividade o imóvel do inventário ou do arrolamento, deverá pagar aluguel aos outros herdeiros, enquanto o processo de inventário ou de arrolamento não acaba.

Direito civil. Recurso especial. Cobrança de aluguel. Herdeiros.Utilização exclusiva do imóvel. Oposição necessária. Termo inicial.- Aquele que ocupa exclusivamente imóvel deixado pelo falecido deverá pagar aos demais herdeiros valores a título de aluguel proporcional, quando demonstrada oposição à sua ocupação exclusiva.- Nesta hipótese, o termo inicial para o pagamento dos valores deve coincidir com a efetiva oposição, judicial ou extrajudicial, dos demais herdeiros.Recurso especial parcialmente conhecido e provido.(REsp 570723/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/03/2007, DJ 20/08/2007 p. 268)

ACEITAÇÃO E RENÚNCIA DA HERANÇA

A aceitação da herança é um ato jurídico (que não admite condição, termo ou encargo) pelo qual o herdeiro confirma o recebimento da herança no limite das suas forças (art. 1.792, CC).

Art. 1.792, CC - O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demonstrando o valor dos bens herdados.

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O herdeiro não pode responder ultra vires hereditatis, isto é, não poderá ele responder com seu próprio patrimônio, às dívidas do de cujus, além das forças da herança que virá a responder.

A aceitação da herança admite algumas tipologias, muito recorrentes em concurso; a aceitação da herança, nos termos dos artigos 1.805 e 1.807, CC, poderá ser: expressa, tácita ou presumida.

Art. 1.805, CC - A aceitação da herança, quando expressa, faz-se por declaração escrita (aceitação expressa da herança) ; quando tácita, há de resultar tão-somente de atos próprios da qualidade de herdeiro (normalmente é a aceitação da herança que ocorre).

§ 1o Não exprimem aceitação de herança os atos oficiosos , como o funeral do finado, os meramente conservatórios, ou os de administração e guarda provisória.

§ 2o Não importa igualmente aceitação a cessão gratuita, pura e simples, da herança, aos demais co-herdeiros.

Exemplo da situação do §2º: Pato Donald é pai de Huguinho, Zezinho e Luisinho e vem a falecer. Se Huguinho diz que está cedendo gratuitamente a sua parte aos seus irmãos Zezinho e Luisinho, tecnicamente ele não está aceitando a herança, mas renunciando a ela.

Mas, se Huguinho disser que aceita sua parte na herança e a direciona a sua parte, cedendo-a gratuitamente a Zezinho, há tecnicamente aceitação da herança e posterior ato de cessão. Neste caso incidem dois impostos, o ITBI e o ICMD – um em razão da herança e outro em razão da transmissão decorrente da cessão.

Art. 1.793, CC - O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.§ 1o Os direitos, conferidos ao herdeiro em conseqüência de substituição ou de direito de acrescer, presumem-se não abrangidos pela cessão feita anteriormente.§ 2o É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente.§ 3o Ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por qualquer herdeiro, de bem componente do acervo hereditário, pendente a indivisibil idade.

Observação: em suma, se um dos herdeiros resolve aceitar a herança e, em seguida, ceder a sua cota, nos termos do artigo 1.793, CC, a um dos herdeiros determinados, está, em verdade, aceitando e realizando uma cessão de cota hereditária, com dupla incidência tributária.

Art. 1.807, CC - O interessado em que o herdeiro declare se aceita, ou não, a herança, poderá, vinte dias após aberta a sucessão, requerer ao juiz prazo razoável, não maior de trinta dias, para, nele, se pronunciar o herdeiro, sob pena de se haver a herança por aceita (aceitação presumida da herança).

Quanto à análise da renúncia, primeiramente é preciso que se estabeleça o conceito do direito de representação. O direito de representação, regulado a

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partir do artigo 1.851, CC, mitiga a regra segundo a qual o parente mais próximo exclui o mais remoto.

Art. 1.851, CC - Dá-se o direito de representação, quando a lei chama certos parentes do falecido a suceder em todos os direitos, em que ele sucederia, se vivo fosse.

Art. 1.852, CC - O direito de representação dá-se na linha reta descendente, mas nunca na ascendente.

Art. 1.853, CC - Na linha transversal, somente se dá o direito de representação em favor dos fi lhos de irmãos do falecido, quando com irmãos deste concorrerem.

Art. 1.854, CC - Os representantes só podem herdar, como tais, o que herdaria o representado, se vivo fosse.

Art. 1.855, CC - O quinhão do representado partir-se-á por igual entre os representantes.

Art. 1.856, CC - O renunciante à herança de uma pessoa poderá representá-la na sucessão de outra.

Neste caso do exemplo, os filhos de “B”, “E” e “F” herdarão a 1/3 parte que era direito de “B”, seu pai que faleceu em pré-moriência, isto é, antes de falecido o autor da herança que se tem como objeto nesta relação.

Na linha reta, subindo, quanto aos ascendentes, não há direito de representação; a herança não irá para os avós de “E” e “F”, que são pais de “B”, segundo o entendimento do artigo 1.852, CC, acima transcrito.

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"A"

"B""C"

"D"

Morre em 2009

Morreu em 2008

“E”

“F”

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Somente os sobrinhos têm direito de representação neste caso para receber a herança do tio D; se F e G estivessem mortos, seus filhos (como H, por exemplo) não teriam direito de representação (mandamento do artigo 1.853, CC, acima transcrito).

Art. 1.806, CC - A renúncia da herança deve constar expressamente de instrumento público ou termo judicial.

Ultrapassado o estudo do direito de representação, é preciso que se estude o ato de renúncia à herança. A renúncia é uma declaração abdicativa do direito à herança com efeitos retroativos, razão pela qual os herdeiros do renunciante não herdam por direito de representação. O direito de representação somente poderá ser exercido no caso da pré-morte do ascendente que deveria receber a herança.

Quando a pessoa renuncia à herança, o efeito é de como se ela nunca houvesse sido herdeira. Se o pai “C” renunciar à herança do irmão “D”, exclui-se o direito de representação de seus filhos “I” e “J”. É o efeito retroativo desta declaração abdicativa.

A não ser que também “B” renunciasse à herança, aí seus filhos, ou seja, todos os sobrinhos envolvidos herdariam por cabeça.

LEGITIMADOS A SUCEDER A HERANÇA

Art. 1.798, CC - Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão.

Pela lei brasileira, somente possui legitimidade para suceder à herança as pessoas:

1. Vivas, no momento da morte do herdeiro;2. Pessoas já concebidas (nascituro).

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C (renuncia à herança

de seu irmão D)

BD

(morreu sem filhos)

E (irmão

pré-morto do de cujus)

IRMÃOS

F GHI J

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O enunciado 267, da III Jornada de Direito Civil, interpretando o artigo 1.798, CC, reconhece legitimidade ao nascituro, bem como ao embrião formado por técnica de reprodução assistida para o efeito de recebimento da herança.

Enunciado 267, III Jornada de Direito Civil – Art. 1.798: A regra do art. 1.798 do Código Civil deve ser estendida aos embriões formados mediante o uso de técnicas de reprodução assistida, abrangendo, assim, a vocação hereditária da pessoa humana a nascer cujos efeitos patrimoniais se submetem às regras previstas para a petição da herança.

Sobre a legitimidade para suceder, é preciso que se faça uma leitura do artigo 1.799, CC:

Art. 1.799, CC - Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:

I - os fi lhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão (este inciso deve ser analisado juntamente ao art. 1800, §4º, CC);

II - as pessoas jurídicas;

III - as pessoas jurídicas, cuja organização for determinada pelo testador sob a forma de fundação.

Nos termos do art. 1.797, III, CC, não há prazo para a inseminação artificial post mortem: a qualquer tempo poderá nascer o filho do falecido. No entanto, para que este filho também seja herdeiro, conjugando-se o art. 1.799, I, com o artigo 1.800, §4º, ambos do Código Civil, a concepção deverá ocorrer no prazo de dois anos após a morte.

Art. 1.800, CC - No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz.§ 1o Salvo disposição testamentária em contrário, a curatela caberá à pessoa cujo fi lho o testador esperava ter por herdeiro, e, sucessivamente, às pessoas indicadas no art. 1.775.§ 2o Os poderes, deveres e responsabilidades do curador, assim nomeado, regem-se pelas disposições concernentes à curatela dos incapazes, no que couber.§ 3o Nascendo com vida o herdeiro esperado, ser-lhe-á deferida a sucessão, com os frutos e rendimentos relativos à deixa, a partir da morte do testador.§ 4o Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador, caberão aos herdeiros legítimos.

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