25-34

download 25-34

of 10

description

artigo cientifico

Transcript of 25-34

  • R E V I S T A P O R T U G U E S A

    CINCIAS VETERINRIASDE

    ARTIGO DE REVISO

    25

    Desenvolvimento embrionrio inicial eqino reviso

    Early equine embryonic development a review

    Ester Siqueira Caixeta1*, Nadia Simarro Fagundes

    2, Mariana Siqueira Caixeta

    3,

    Elen Silvia Siqueira Pyles4

    1Faculdade de Agronomia e Veterinria, Cincias Animais, Universidade de Braslia, Braslia, DF, Brasil, 70910-9702Faculdade de Medicina Veterinria, Universidade Federal de Uberlndia, Uberlndia, MG, Brasil, 38.400-902

    3Pontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais, Poos de Caldas, MG, Brasil, 37701-3554Departamento de Reproduo Animal, Faculdade de Medicina Veterinria e Zootecnia,

    Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil, 18618-000

    Resumo: O incio da gestao eqina envolve aspectos especficos do gnero Equus, como reconhecimento materno dagestao, desenvolvimento morfolgico do embrio, origem dosanexos fetais, juno feto-maternal, desenvolvimento do mnioe dos clices endometriais, alm da mobilidade e atividade fetal.No presente trabalho foi revisado o desenvolvimento embrio-nrio inicial em eqinos, que aps a fecundao, passa pela clivagem, dando origem mrula e mais tarde ao blastocisto,entrando no tero no dia 6 a 6,5 aps a ovulao. Um fenmenoexclusivo da espcie eqina a reteno de ovcitos no fecundados e/ou embries no viveis no oviduto. Entre os dias6 a 7 ocorre a formao de uma cpsula que envolve completa-mente o concepto, e no dia 8 a zona pelcida de desprende damesma. O concepto eqino permanece esfrico at 6 a 8 semanas de gestao. Os clices endometriais produzem aGonadotrofina Corinica egina (eCG) durante aproximada-mente os dias 33 a 120 com efeitos gonadotrficos. A placentada gua classificada como epitliocorial, difusa, microcotile-donria e adeciduada. Ela secreta hormnios trficos eesterides, sendo essencial uma placenta madura e inteiramentefuncional para uma gestao normal e a produo de um fetosadio e bem desenvolvido. Em vista da complexidade dos eventos relacionados e do conhecimento destas caractersticaspeculiares espcie eqina, a fisiologia e endocrinologia da gestao na gua podem ser melhor compreendidas, sendo de grande valia na aplicao prtica das biotecnologias dareproduo eqina.

    Palavras-chave: gua, embriologia, gestao, placenta.

    Summary: The beginning of pregnancy in equine involves specific aspects of genus Equus, such as maternal recognition ofpregnancy, embryo morphology development, origin of fetalplacenta, fetomaternal junction, amnion and endometrial cupsdevelopment, in addition to fetal mobility and activity. In thepresent work, embryo development in the horse was reviewed.After fertilization, the equine embryo undergoes cleavage,forming the morula and later the blatocyst, and arrives into theuterus on day 6 to 6.5 after ovulation. An exclusive characteristicis the retention of non-fertilized oocytes and/or non-viableembryos in the oviduct. Between the days 6 and 7 the formationof a capsule that involves completely the concept, and at day 8,the zona pellucida sheds from the capsule. The equine conceptusremains spherical until 6 to 8 weeks of pregnancy. The endome-trial cups secrete equine Chorionic Gonadotropin (eCG) overapproximately days 33 to 120, with gonadotrophics effects. Themare placenta is classified as epitheliochorionic, diffuse, micro-cotyledonary and adeciduous. It segregates trophic and steroidhormones, being essential a mature and entirely functional placenta for a normal pregnancy in the mare and production ofa healthy and well developed fetus. In face of the complexity ofrelated events and the knowledge of these peculiar characteris-tics of the equine species, the physiology and endocrinology ofpregnancy in the mare can be better understood, being veryimportant in the practical application of equine reproductionbiotechnologies.

    Keywords: mare, embryology, pregnancy, placenta.

    Introduo

    Muitos aspectos do incio da gestao na guamostram-se nicos no gnero Eqqus e tm importantesignificado prtico na moderna medicina veterinriaeqina (Allen, 2000). O desenvolvimento embrionriotem incio a partir da fecundao do ovcito (Ginther,1992). A partir deste momento, at o estabelecimentode uma placenta madura e funcional, aproximadamenteaos 150 dias, uma srie de alteraes morfolgicas,imunolgicas e endocrinolgicas ocorrem no ovidutoe tero, as quais podem ser presumidas como importantes componentes do estabelecimento e

    *Correspondncia: [email protected]: +55 (14) 3813 7787

  • manuteno do estado gestacional, e que diferem deeventos equivalentes em outras espcies animaisdomsticas (Allen, 2000). A espcie eqina apresentaparticularidades em relao ao desenvolvimento morfolgico do embrio, origem dos anexos fetais, juno feto-maternal, ao desenvolvimento do mnione dos clices endometriais e mobilidade e atividadefetal, os quais sero abordados nesta reviso.

    No momento apropriado o embrio deve sinalizar asua presena no sistema materno, sinal este necessriopara a manuteno do corpo lteo, produo de proges-terona e para a continuao do desenvolvimento doendomtrio e da sua atividade secretora. Outros sinaisutilizados pelo embrio como sntese de hormnios eprotenas parecem tambm serem responsveis peloreconhecimento materno da gestao, sendo alvo deestudos e pesquisas.

    A placenta muito estudada na gestao eqina,tanto no aspecto anatmico quanto fisiolgico. Aspesquisas realizadas nessa rea so direcionadas sestruturas nicas na placenta da gua como os clicesendometriais e cinta corinica, produo daGonadotrofina Corinica eqina (eCG) e s seiscamadas de tecido entre os capilares materno e fetal(Ginther, 1992).

    O presente trabalho tem o intuito de revisar o desenvolvimento embrionrio desde a fecundao ata placentao inicial. Atravs do conhecimento destascaractersticas peculiares espcie eqina, a fisiologiae endocrinologia da gestao podem ser melhor compreendidas, sendo de grande valia na aplicaoprtica das biotecnologias da reproduo eqina.

    Fecundao

    A fecundao ocorre quando h fuso do ovcitocom o espermatozide. Para tanto, necessrio queocorra a migrao espermtica entre as clulas documulus, a unio da cabea do espermatozide zonapelcida e em seguida a penetrao espermtica poruma abertura atravs da zona pelcida para atingir amembrana vitelnica e, por ltimo, a fuso dos gametas(Hafez e Hafez, 2004).

    No momento da ovulao ocorre a liberao doovcito maturado, o qual foi submetido a transfor-maes durante o desenvolvimento folicular, como aformao da zona pelcida e a retomada e finalizaoda primeira diviso meitica, com a extruso doprimeiro corpsculo polar, em preparo para a fecun-dao. A placa metafsica marca o incio da segundadiviso meitica, porm a meiose no pode continuarat que ocorra a penetrao do espermatozide noovcito (Ginther, 1992).

    Para atingir a capacidade de fecundao os espermatozides passam por vrias modificaesseqenciais incluindo a maturao, capacitao e areao do acrossoma. Os componentes de sua superfcieso modificados ou removidos pelas secrees do

    trato genital feminino, desestabilizando a bicamadafosfolipdica e permitindo a ativao do acrossomo. Acapacitao desencadeia a reao acrossomal queenvolve a fuso da membrana plasmtica do esperma-tozide com a membrana externa do acrossomo,seguida por uma extensa vesiculao sobre o segmentoanterior do acrossomo. Essa reao promove a liberao de enzimas hidrolticas, como, hialuronidasee acrosina que so necessrias para a penetrao noovcito (Hafez e Hafez, 2004).

    A unio da cabea espermtica zona pelcida regida por receptores espermticos especficos na sua superfcie. A zona pelcida sintetizada por ovcitos em maturao, sendo sua matriz extracelular constituda por glicoprotenas denominadas ZP1, ZP2e ZP3, presentes em todas as espcies de mamferos.As ZP1 e ZP2 so glicoprotenas estruturais, enquanto a ZP3 age como receptor espermtico(Herrler e Beier, 2000; Hafez e Hafez, 2004).

    Apenas espermatozides com acromossos intactospodem se ligar ZP3. A ligao da cabea espermtica ZP3 permite interaes com outras zonas compe-tentes que estimulam a ativao do acrossoma,liberando enzimas que digerem uma abertura atravsda zona pelcida para atingir a membrana vitelnica(Hafez e Hafez, 2004). A regio equatorial da cabeaespermtica liga-se membrana vitelnica estimulandoa retomada da segunda diviso meitica, liberando osegundo corpsculo polar (Ginther, 1992; Hafez eHafez, 2004).

    Os dois pr-ncleos, masculino e feminino migrampara o centro do ovo, os envelopes nucleares serompem e ento se fundem, formando um ncleodiplide e a primeira clula do concepto, o zigoto.Esta fuso, chamada singamia, finaliza a fecundao eestimula o zigoto a iniciar o seu desenvolvimento(Ginther, 1992; Hafez e Hafez, 2004).

    Aps a fecundao ocorrem modificaes na superfcie do ovcito para impedir a fuso de outroespermatozide, a polispermia (Herrler e Beier,2000). O incio do bloqueio ocorre com a penetraodo espermatozide no ovcito, quando os grnuloscorticais so liberados dentro do espao perivitelnico.A liberao do contedo desses grnulos provoca umareorganizao extensa da zona pelcida e/ou reaocortical da superfcie vitelina, resultando na liberaode enzimas que provocam endurecimento da zonapelcida e inativao dos receptores espermticos(Hafez e Hafez, 2004).

    Clivagem

    Depois do estgio de zigoto, os embries sofremuma srie de divises mitticas. A primeira clivagemdo embrio eqino ocorre 24 horas aps a fecundao(Herrler e Beier, 2000). O zigoto, estgio de uma clu-la, bastante grande, possuindo uma proporonuclear/citoplasmtica baixa. Nessas divises celu-

    Caixeta ES et al. RPCV (2008) 103 (565-566) 25-34

    26

  • lares no ocorre aumento da massa celular, sendo queo dimetro do ovcito pr-ovulatrio, zigoto eembrio clivado no se altera, at a formao de umblastocisto, geralmente aps deixar o oviduto(Ginther, 1992; Betteridge, 2000).

    A clivagem do zigoto se d por diviso vertical e asclulas irms resultantes so denominadas blast-meros. As divises iniciais ocorrem simultaneamenteem todos os blastmeros, porm, aps algum tempoessa sincronizao perdida. O processo de clivagemdo embrio eqino similar ao observado nos demaismamferos. Entretanto, nessa espcie ocorre umexcessivo processo de deutoplasmlise atravs da qualse observa a extruso do material embrionrio para oespao perivitelnico, desde os primeiros estgios dedesenvolvimento. A partir do estgio de 16 blastmeroso material extrusado vai diminuindo e desaparece. Oprocesso de deutoplasmlise parece estar associado quantidade de lipdeos presente no ovcito. Em ovcitosparticularmente ricos em lipdeos, como os de eqino,bastante material eliminado durante a segmentao(Ginther, 1992).

    Compactao

    Os blastmeros de mamferos, at o estgio de 8clulas, formam um arranjo frouxo, com espao abundante entre eles. Em seguida terceira clivagemocorre uma grande alterao no comportamento dosblastmeros. Eles repentinamente se aglomeram maximizando o contato entre si, formando uma massaesfrica compacta de clulas. Este arranjo compacto estabilizado por junes que se formam entre as clulas externas da massa celular. As clulas internasda esfera formam junes do tipo "gap", permitindodeste modo, o transporte de pequenas molculas eons entre as clulas (Hafez e Hafez, 2004).

    Aproximadamente 4 a 5 dias aps a fecundao, oembrio apresenta-se com 16 a 32 clulas (Ginther,1992). Uma vez que o embrio tenha formado 16blastmeros, ele denominado mrula (Herrler e Beier,2000). Durante esta fase o embrio transportado dolocal da fecundao, regio da ampola do oviduto, emdireo ao tero, onde deve ocorrer o desenvolvimentoda gestao (Betteridge, 2000).

    Transporte do embrio no oviduto

    Segundo Allen (2000; 2001) existem diferenasimportantes no transporte de ovcitos e embries nooviduto eqino quando comparado s outras espciesde mamferos. Um fenmeno exclusivo a retenode ovcitos no fecundados ou embries no viveisno oviduto, sendo que estes podem ser retidos por atsete meses ou mais e so eventualmente degenerados.Essa reteno ocorre nas dobras tortuosas da mucosado oviduto, podendo o ovcito se alojar no teromdio do oviduto ou na regio da juno stimo-

    ampola (Ginther, 1992; Allen, 2000; Betteridge, 2000;Allen, 2001). Por outro lado, se o ovcito fecundado,resultando em um embrio, eles atravessam a apertadae proeminente juno tero-tubria, entrando no teroentre 144 e 168 horas aps a ovulao (dia 6 - 6,5) no estgio de desenvolvimento de mrula tardia oublastocisto inicial (Betteridge et al., 1982; Allen,2000; Betteridge, 2000; Allen, 2001).

    Vrios autores observaram que o embrio vivelcomea a secretar grande quantidade de PGE2 quandoatinge o estgio de mrula compacta, no dia 5 aps a ovulao (Ginther, 1992; Allen, 2000; Betteridge,2000; Sharp, 2000; Allen, 2001; Stout e Allen, 2001,2002). Essa PGE2 tem a propriedade de provocar contraes locais e relaxamento da musculatura lisa,atuando na parede do oviduto, permitindo assim que oembrio se mova progressivamente com o auxlio dobatimento ciliar rtmico, entrando no tero aproxima-damente aps 24 horas (Gastal et al., 1998). Destaforma, este estgio de desenvolvimento depende dacapacidade secretria de PGE2 pelo embrio (Allen,2000).

    A permanncia do embrio eqino no oviduto at odia 6 considerada prolongada, quando comparadacom a permanncia do embrio suno (48 horas) e deruminantes (72 horas) (Allen, 2000). Este fato trazdesvantagens na aplicao prtica das biotecnologiasda reproduo eqina. Um exemplo a bipartio deembries para a produo de gmeos monozigotos,que tem maior sucesso quando realizada no estgio demrula, sendo que este ndice cai consideravelmentese o embrio bipartido mesmo com sinais iniciais deblstula. De modo similar, o sucesso da congelao deembries cai quando se tem um pequeno aumento nodesenvolvimento, idade e tamanho do embrio,provavelmente devido a uma combinao de danos namassa celular interna e impermeabilidade relativa dacpsula do blastocisto eqino aos crioprotetores(Allen, 2000, 2001).

    Blastocisto

    Simultaneamente com o desenvolvimento dasjunes intercelulares compactas da mrula, ocorre oacmulo de fluido no interior da cavidade central formando a blastocele. Quando esta detectada, oconcepto denominado blastocisto inicial (Ginther,1992). A relao temporal entre o surgimento da blastocele e a entrada no tero no est completa-mente determinada, sendo possvel chegar no teroum embrio no estgio de mrula tardia ou blastocistoinicial. O concepto entra no tero no dia 6, quandotem aproximadamente 0,2 mm (Betteridge et al.,1982; Sharp, 2000).

    De acordo com Ginther (1992) as clulas doembrio nessa fase se diferenciam em dois grupos, otrofoblasto e o embrioblasto. O trofoblasto originadoa partir das clulas da massa celular externa, sendo

    Caixeta ES et al. RPCV (2008) 103 (565-566) 25-34

    27

  • constitudo por clulas colunares recobertas por densasmicrovilosidades e que tem funes na captao denutrientes seletivos. Este grupo de clulas forma ocrion, a poro embrionria da placenta, que permiteao feto obter oxignio e alimento a partir da me.Estas clulas do trofoblasto so necessrias para aimplantao do embrio na parede uterina.

    O embrioblasto, que se projeta para o interior dablastocele formado a partir da massa celular interna(MCI) e originar o embrio propriamente dito. Asclulas do interior da MCI so redondas, pequenas ese dividem rapidamente. Elas so unidas por junesdo tipo "gap" e interconectadas por uma elaboradacadeia de microvilos longos e sintetizam protenasdiferentes em relao ao trofoblasto. A principal caracterstica do blastocisto a diferenciao em trofoblasto e boto embrionrio. O embrioblasto sedesenvolve em 3 camadas germinativas primrias doembrio (ectoderme, mesoderme e endoderme)durante o processo de gastrulao (Ginther, 1992).

    O dimetro da vescula embrionria nos prximosdias varia bastante e o estgio de desenvolvimentoparece mais relacionado com o dimetro e morfologiado que com a idade (Ginther, 1992).

    Surgimento da cpsula e desprendimento da zona

    pelcida

    O desenvolvimento inicial do embrio eqino caracterizado pela formao de uma cpsula queenvolve completamente o concepto. A cpsula umafina camada acelular e transparente depositada entre a zona pelcida e o trofoblasto no momento da formao do blastocisto intra-uterino no dia 6 ou 7aps a ovulao, sendo composta por glicoprotenassemelhantes mucina produzidas pelo trofoblasto(Betteridge et al., 1982; Ginther, 1992; Oriol et al.,1993; Chu et al., 1997; Allen, 2001). Pode haver tambm um envolvimento uterino na origem da cpsula, pois foi observado no cultivo in vitro deembries pr-capsulares que no houve a formao damesma. A cpsula demonstrada com dificuldade invitro. A zona pelcida provavelmente no necessriana formao da cpsula, uma vez que blastocistos semzona pelcida transferidos no dia 7 tm a cpsulaaparentemente normal quando examinados uma semana depois (Ginther, 1992).

    O blastocisto se expande rapidamente aps suaentrada no tero, ocorrendo uma diminuio na espes-sura da zona pelcida. Desta forma ela se desprendeda cpsula em poucos dias (dia 8), a cpsula entopermanece no exterior, revestindo completamente oembrio (Ginther, 1992; Crossett et al., 1998;Betteridge, 2000; Stout et al., 2005). A presena dacpsula contribui para esse afrouxamento e perda dazona pelcida (Stout et al., 2005).

    Alguns estudos sugerem que a mucina capsular seja

    secretada em maior parte pelo trofoblasto (Arar et al.,2007), entretanto a cpsula tambm contm outrasprotenas de origem materna. A produo de mucina observada aps a formao do blastocisto, aumentandoat o dia 18, e ento comea a diminuir, antes de desa-parecer completamente entre os dias 21 e 23 (Stewartet al., 1995; Chu et al., 1997; Stout et al., 2005).

    Especula-se que a funo da cpsula seja semelhante da zona pelcida, substituindo-a aps asua perda (Ginther, 1992). Ela tem uma granderesponsabilidade na manuteno da forma esfrica do concepto durante o perodo do reconhecimento materno da gestao. Embora fina, a cpsula bastante resistente e elstica funcionando como umaproteo fsica ao concepto durante a fase de migraopermitindo com que ele migre de uma extremidade outra no lmen uterino (Oriol et al., 1993; Betteridge,2000; Sharp, 2000; Arar et al., 2007; Quinn et al.,2007), atuando como uma molcula anti-adesiva comalta concentrao de cido silico (Chu et al., 1997;Sharp, 2000; Stout et al., 2005). Alm disso, a cpsula atua fornecendo proteo contra o estressemecnico das contraes miometriais (Stout et al.,2005) e tambm funcionando como uma defesabiolgica contra ataques virais e bacterianos ou ataqueimunolgico materno. Finalmente, a posio da cpsula na interface materno-fetal sugere que elatenha uma importante funo na comunicao entreme e feto durante o incio da gestao (Stewart et al.,1995; Chu et al., 1997).

    A fixao do embrio no futuro local da placentaoest associada a uma flacidez e perda de cido silicodas glicoprotenas capsulares (Oriol et al., 1993; Chuet al., 1997; Arar et al., 2007; Quinn et al., 2007).Segundo Stewart et al. (1995), uma grande quantidadede protena de 19 kDa (p19) secretada peloendomtrio. Foi sugerido que essa protena possa serincorporada dentro da estrutura capsular durante suafase de crescimento, depois do dia 11. A secreo dap19 pelo endomtrio dependente de progesterona. Aadministrao de prostraglandinas reduz a concen-trao de progesterona, reduzindo a secreo da p19.Portanto, cpsulas defeituosas, com deficincia dap19, mostram uma falha na perda de cido silico,refletindo a possibilidade de que a falta ou mudanade protenas na estrutura capsular impeam a queda decido silico, interferindo no processo de fixao doembrio (Arar et al., 2007).

    Segundo Stout et al. (2005) atravs da remoo dacpsula e posterior transferncia dos embries emguas receptoras foi demonstrado que nenhumembrio desprovido da cpsula desenvolveu a gestao, enquanto os embries que no tiveram acpsula removida desenvolveram normalmente a gestao, comprovando que ela essencial na viabili-dade dos embries eqinos.

    Caixeta ES et al. RPCV (2008) 103 (565-566) 25-34

    28

  • Desenvolvimento do saco vitelnico

    Uma alterao relativa no tamanho da vesculaembrionria no estgio de saco vitelnico pode servista ultra-sonografia nos dias 10 a 21 (Ginther,1992). Um dos aspectos distintos do concepto eqino o saco vitelnico persistente. Muitas espcies animais desenvolvem o saco vitelnico, mas ele rapidamente se torna afuncional e aparentemente nocontribui para a nutrio do embrio. Nos eqinos,entretanto, ele uma estrutura predominante nasprimeiras trs ou quatro semanas de gestao e temum importante papel no suprimento nutricional inicialdo embrio (Sharp, 2000).

    Um revestimento interno de clulas endodrmicascompletam a converso do blastocisto em um sacoembrionrio vitelnico bilaminar (duas paredes), essasclulas so originadas do embrioblasto ou massa celularinterna e envolvem a blastocele, desenvolvendo umamembrana contnua que ir se tornar um constituintedo saco vitelnico (Sharp, 2000). O lmen do sacovitelnico est diretamente em contato com o lmendo intestino primitivo e, portanto, solutos orgnicos einorgnicos e gua do ambiente uterino so absorvidospelo saco vitelnico tornando-os disponveis para oembrio (Ginther, 1992).

    As clulas internas ou revestimento endodermal dosaco vitelnico so cuboidais, enquanto as clulas dotrofoblasto so colunares com caracterstica absortivas.A terceira camada, mesoderme, comea a aparecerentre o trofoblasto (ectoderme) e a endoderme do sacovitelnico, dando origem parede do disco embrio-nrio. A formao da mesoderme provavelmentecomea no dia 14 (Sharp, 2000). O concepto eqinocom duas semanas de gestao esfrico e est locali-zado no corpo uterino. O tecido mesodrmico crescedo disco embrionrio para a rea entre o trofoblasto ea endoderme do saco vitelnico. A mesoderme dorigem ao mesnquima de sustentao ou aos vasossangneos do tecido conjuntivo (Hafez e Hafez,2004).

    Ilhas de sangue so formadas na mesoderme e estas gradualmente aumentam originando a paredefuncional do saco vitelnico que est conectada porum canal ao embrio. O saco vitelnico no armazenanutrientes, mas com a vascularizao o material nutritivo chega rapidamente e com eficincia paraabastecer o desenvolvimento embrionrio (Ginther,1992). A principal extremidade da vascularizao damesoderme demarcada por uma proeminentecoleo de veias denominada sinus terminalis. Aparede do saco vitelnico entre o sinus terminalis e o embrio propriamente dito possui trs camadas (endoderme, mesoderme e ectoderme) e denominadaonfalopleura trilaminar. A parede distal formada por duas camadas (ectoderme e endoderme) e denominada onfalopleura bilaminar (Ginther, 1992;Hafez e Hafez, 2004).

    A onfalopleura bilaminar e o sinus terminalis soestruturas anatmicas muito importantes, que indicamo lado oposto ao desenvolvimento embrionrio propriamente dito, e que mais tarde marcam a posiode fixao do cordo umbilical no feto (Ginther,1992).

    Transio de saco vitelnico para saco alantide

    Com o desenvolvimento do embrio, o trofoblastofunde-se com a membrana interna de clulas da meso-derme formando o crion. Este envolve externamentetodo o embrio e as outras trs membranas fetais: omnio, o saco vitelnico e o alantide. Este ltimo o responsvel pelas mudanas fisiolgicas que surgema partir do dia 21 (Ginther, 1992). Ocorre umarepleo da cavidade anmitica e a emergncia doalantide a partir do intestino que cresce para dentrodo exoceloma, entre a somatopleura e a esplancno-pleura (Hafez e Hafez, 2004).

    Segundo Sharp (2000) durante as primeiras trs ouquatro semanas de gestao a placenta eqina pode serdescrita como corio-vitelnica. Ela se torna alanto-corinica devido predominncia do saco alantide, oqual consiste da endoderme, mesoderme e ectoderme,constituindo o alanto-crion.

    O mnio se desenvolve a partir da ectoderme extra-embrionria e da mesoderme avascular circundandocompletamente o embrio. O lquido amnitico considerado como produto de secrees das paredesou folhetos amniticos, bem como pela saliva,secreo nasal do feto e temporariamente pela urina.O feto flutua neste lquido, sendo protegido dadesidratao e de choques mecnicos (Ginther, 1992).

    Na fenda existente entre o folheto interno e externodo mnio encaixa-se, como parte da bexiga fetal, osaco alantide, que se compe tambm de um folhetointerno que se apresenta bem junto ao interno domnio formando o alanto-mnio. E um folheto externoque se adere ao crion, formando o alanto-crion.Dando origem assim a uma placenta alanto-corinica.Entre o alanto-crion e o alanto-mnio encontra-se oespao alantoideano que envolve totalmente oembrio. O lquido alantoideano de origem renal,geralmente composto pela urina fetal (Ginther, 1992).

    O concepto eqino permanece esfrico at 6 a 8semanas de gestao, em contradio com as outrasespcies domsticas nas quais o alanto-crionexpande e alonga tremendamente nas primeiras duassemanas de gestao. Este aspecto morfolgico estassociado extrema mobilidade intra-uterina do concepto eqino at os dias 16 ou 17 (Sharp, 2000).

    O exoceloma est localizado entre a somatopleura eesplancnopleura. A somatopleura uma parede formada pela mesoderme e uma camada de trofoblasto.J a esplancnopleura formada pela mesoderme euma camada de endoderme. No dia 24 ou 25 o saco

    Caixeta ES et al. RPCV (2008) 103 (565-566) 25-34

    29

  • alantide j est vascularizado e grande se comparadocom o embrio propriamente dito. No dia 25 oembrio tem aproximadamente 5 mm de comprimento,crescendo cerca de 1 mm ao dia at os 12 mm no dia30, e 17 mm no dia 35. O batimento cardaco doembrio e a passagem de sangue no sistema circu-latrio podem ser detectados ao redor do dia 26, sendoum critrio importante para estimativa da viabilidadefetal (Ginther, 1992).

    Uma fita de clulas corinicas de 1 mm de larguraforma-se ao redor do embrio. Essa fita corinicalocaliza-se entre o saco alantide e o saco vitelnico,sendo que a mesoderme nessa rea permanece avascular (Lunn et al., 1997).

    O alantide continua a crescer e o saco vitelnicoregride gradualmente, pois fica preso na onfalopleurabilaminar, reduzindo a proporo da vescula embrio-nria. O embrio levado durante o crescimento do alantide para o plo oposto; essa ascendncia inicia-se em torno dos dias 22 a 25 (Hafez e Hafez,2004).

    No dia 40 (final do estgio de embrio) o embrio eseu mnio j foram movidos para o plo oposto e osaco vitelnico desaparece, sendo sua funo substitu-da pela placenta. Nessa fase o embrio parece estarsuspenso pelo alantide, flutuando dentro de um sacoaneico. Devido ao crescimento do saco alantide, asmembranas que separavam o saco vitelnico e o sacoalantide se encontram no plo dorsal da vescula,resultando na formao de um cordo umbilical; poressa razo o cordo se anexa no lado dorsal do tero(Ginther, 1992).

    O cordo umbilical estabelece a ligao entre osenvoltrios fetais e o produto (feto). As clulas da fitacorinica invadem o endomtrio para formar osclices endometriais (de Mestre et al., 2008); apenasuma camada simples de trofoblasto permanece(Ginther, 1992).

    Formao e funo dos clices endometriais

    As alteraes endocrinolgicas que ocorrem nagua durante a gestao so tpicas desta espcie. Umfato bastante importante o desenvolvimento, funo,manuteno e finalmente a degradao dos clicesendometriais, que so estruturas temporrias produtorasdo hormnio eCG (Ginther, 1992; de Mestre et al.,2008).

    Aps a ovulao, o corpo lteo primrio passa aproduzir progesterona. Esta produo atinge concen-traes plasmticas de 6 a 10 ng/mL no dia 5 aps aovulao e continuam, na gua prenhe, a crescer at os35 a 40 dias de gestao quando a eCG comea a serproduzida pelos clices endometriais (Lunn et al.,1997; Allen et al., 2002b). No incio do segundo msde gestao os clices endometriais so formados.Estes correspondem a formaes discretas, pequenas

    protuberncias de tecido altamente compacto, semelhantes a um anel, presentes na poro caudal do corno gravdico, resultantes da invaso de clulastrofoblsticas para dentro do endomtrio (Ginther,1992; Lunn et al.,1997; Sharp, 2000; Wooding et al.,2001; Hafez e Hafez, 2004).

    A gua possui uma placenta do tipo epitliocorial,que representa a forma menos invasiva de placentao(Lunn et al., 1997). No entanto, uma sub-populaode clulas trofoblsticas altamente invasivas se dife-renciam entre os dias 25 e 36 de gestao para formaruma faixa avascular composta por um tecido denomi-nado cinta corinica que circunda o concepto esfricona regio entre o alantide em formao e o sacovitelnico em regresso (Ginther, 1992; Lunn et al.,1997; Adams e Antazak, 2001; Wooding et al., 2001;de Mestre et al., 2008). Ao contrrio das demais clu-las no invasivas do trofoblasto eqino, as clulas dacinta corinica comeam a se fixar e invadir o epitliouterino ao redor dos 35 dias de gestao (Lunn et al.,1997; Wooding et al., 2001; Allen et al., 2002b).

    Segundo Ginther (1992), a formao histolgica dasclulas clices pode ser dividida em 5 fases: fixao,invaso, fagocitose, migrao e diferenciao. A cintacorinica inicialmente consiste em um envoltrio rasoe em seguida vai se alongando como estruturasvilosas, ao redor do dia 33 (de Mestre et al., 2008). Afixao ocorre no dia 37 e consiste numa ligao entreas interdigitaes da superfcie das clulas corinicasalongadas com os dentculos correspondentes doepitlio endometrial. As clulas trofoblsticas inva-dem o endomtrio para a penetrao do citoplasmanas clulas epiteliais. Quando a invaso concluda,somente uma minoria das milhares de clulas da cintaso transformadas em clulas clices, as clulas dacinta que no invadem sofrem necrose.

    Continuando a invaso, as clulas da cinta seqes-tram e fagocitam as clulas epiteliais rompidas e des-organizadas (Ginther, 1992). O processo de invasodestri o epitlio endometrial em contato com as clu-las da cinta, no entanto, o epitlio se regenera rapida-mente e recobre a face luminal dos clices endometri-ais ao redor do dia 45, deixando este tecido completa-mente separado da placenta (Lunn et al., 1997). A fasede migrao envolve penetrao das clulas trofobls-ticas e seu contedo na membrana basal do epitliouterino, atingindo o estroma endometrial, entre asglndulas endometriais, formando ndulos distintosde 0,5 a 1,0 cm na superfcie do endomtrio, os quaiscircundam o concepto na base do corno uterinogravdico, denominados clices endometriais(Ginther, 1992; Lunn et al., 1997; Adams e Antazak,2001). A invaso cessa aps a infiltrao no estromaendometrial e ento as clulas trofoblsticas sehipertrofiam e diferenciam nas clulas clicesmaduras (Ginther, 1992).

    As clulas da cinta corinicas possuem um grande

    Caixeta ES et al. RPCV (2008) 103 (565-566) 25-34

    30

  • ncleo e nuclolo. Sua matriz extracelular provavel-mente tem, alm da funo de adesivo durante a fasede fixao, a funo de digesto dos fragmentos dasclulas epiteliais (Ginther, 1992). Elas se diferenciamem clulas secretrias binucleadas durante a formaodos clices endometriais, e secretam eCG duranteaproximadamente os dias 33 a 120 da gestao (Lunnet al., 1997; Adams e Antazak, 2001; Wooding et al.,2001; Allen et al., 2002b; de Mestre et al., 2008). Aquantidade secretada grande e provavelmente umaimportante parte no desenvolvimento do contato feto-maternal, necessrio para o sucesso da gestao(Wooding et al., 2001). A sua concentrao permanece alta at 90 dias, aps esse perodo declinae aos 150 dias est ausente. O pico de secreo deeCG ocorre ao redor dos 55 a 70 dias de gestao ecorresponde ao perodo de tamanho mximo dosclices endometriais (Allen, 2000).

    A eCG um hormnio glicoprotico com alto pesomolecular que possui uma funo complexa, a qualno totalmente entendida. conhecido que quandoadministrado a outras espcies, ela tem efeitosgonadotrficos, tanto de FSH, como de LH (Lunn et al., 1997; Allen, 2001). Na gua, em associaocom gonadotrofinas da hipfise, a eCG estimula a formao de corpos lteos acessrios atravs daluteinizao, com ou sem ovulao, dos folculos dasondas foliculares (Ginther, 1992; Lunn et al., 1997;Wooding et al., 2001; Allen, 2001; de Mestre et al.,2008). Desta forma, aos 40 dias de gestao a concen-trao de progesterona srica dobra seu valor (Lunn etal., 1997).

    Os corpos lteos acessrios aumentam em nmero epersistem at a metade da gestao, quando a placen-ta j est madura o suficiente para assumir inteiramenteo suprimento de progesterona para a manuteno dagestao, sem qualquer ajuda dos ovrios (Allen, 2000;Allen, 2001; Hafez e Hafez, 2004).

    A partir dos 80 a 90 dias de gestao, ocorre aregresso dos tecidos dos clices associada a umaintensa resposta leucocitria materna (Lunn et al.,1997; Sharp, 2000; Adams e Antazak, 2001; Woodinget al., 2001). Aprecivel nmero de leuccitos maternos,incluindo linfcitos, plasma celular e eosinfilos seacumulam na base dos clices endometriais para formar um tipo de barreira imunolgica entre os tecidos materno e fetal (Allen, 2000; Allen, 2001),degenerando e destruindo os clices, sendo restabele-cida a passagem dos ductos obstrudos das glndulasendometriais (Allen, 2000).

    Os leuccitos maternos invadem o tecido dos clicese destroem as clulas fetais, formando um tecidonecrtico que aflora na superfcie endometrial, dandoorigem estruturas pedunculadas no alanto-crion,que se projetam para o interior da cavidade alantide,as chamadas bolsas alantocorinicas (Lunn et al.,1997; Allen, 2000).

    Reconhecimento materno da gestao

    Allen (2000; 2001) utiliza o termo reconhecimentomaterno da gestao para comparar as diferentesestratgias utilizadas pelas espcies domsticas paragarantir a continuao da vida e da funo secretriado corpo lteo, e ento manter o tero em um estgioprogestacional adequado para o suporte da gestao ecrescimento do feto. A secreo de progesterona indispensvel para a manuteno da gestao(Ginther, 1992; Sharp, 2000).

    A Prostaglandina F2 (PGF2) o hormnio luteoltico que induz a regresso cclica do corpolteo, ela secretada pelo endomtrio aps o diestro(Allen, 2000; Hafez e Hafez, 2004). Portanto, o crescimento do concepto eqino depende da supressode sua liberao pelo endomtrio (Stout e Allen,2002).

    A gua provida de uma distinta e aparentementenica maneira pela qual o embrio possui uma totalimportncia no sinal do reconhecimento materno dagestao (Allen, 2000). O embrio eqino envoltopor uma resistente e ajustada cpsula de glicocliceentre os dias 6,5 a 22 aps a ovulao, sendo incapazde reorganizar e alongar o trofoectoderma entre osdias 10 e 14 aps a ovulao, permanecendo esfricoe completamente solto dentro do lmen uterino(Allen, 2000; Allen e Stewart, 2001) onde ele se movecontinuamente de uma extremidade outra do terolevado por fortes contraes peristlticas domiomtrio, nos dias 9 a 17 aps a ovulao (Ginther,1983; Leith e Ginther, 1984; Gastal et al., 1998; Allen,2000; Allen e Stewart, 2001; Stout e Allen, 2001,2002).

    Este processo incomum de mobilidade do conceptona gua persiste at o dia 16 ou 17 aps a ovulao,quando ocorre um rpido aumento no dimetro doembrio e um sbito espasmo que aumenta o tnusmiometrial e fixa o concepto no eventual local deimplantao, na base de um dos cornos uterinos(Ginther, 1983; Leith e Ginther, 1984; Allen, 2000;Sharp, 2000; Allen, 2001; Stout e Allen, 2001, 2002).

    Est claro que este constante movimento do concepto uma adaptao evolucionria que garanteao embrio o sinal de reconhecimento materno da gestao por toda a extenso do tero (Allen, 2000),levando a uma supresso na liberao cclica de PGF2 pelo endomtrio, permitindo a luteostasenecessria para a manuteno da gestao (Ginther,1983; Sharp, 2000; Stout e Allen, 2001). A restriocirrgica do embrio eqino em um tero da rea totaluterina seguida por lutelise e um retorno ao cio noperodo esperado do ciclo estral (Allen, 2000; Sharp,2000). A ausncia de qualquer barreira fsica quepossa impedir o concepto de se movimentar livremente de uma extremidade outra no lmenuterino um pr-requisito para a manuteno da gestao nos eqinos. Alteraes dentro do

    Caixeta ES et al. RPCV (2008) 103 (565-566) 25-34

    31

  • endomtrio, bem como grandes cistos ou septosendometriais, podem contribuir para um insuficientereconhecimento materno e subseqente perda da ges-tao (Allen, 2001).

    Outra diferena na gua a habilidade do conceptoeqino em secretar grande quantidade de PGF2 eProstaglandina E2 (PGE2) tanto in vivo como quandocultivado in vitro (Allen, 2000; Allen, 2001). A produo de prostaglandinas pelo concepto alta nodia 10 aps a ovulao, elevando significantementeem funo do aumento da idade gestacional (Stout eAllen, 2001; Stout e Allen, 2002). As prostaglandinassecretadas pelo concepto inicial aparentementederivam da membrana corio-vitelnca (Allen, 2000;Allen, 2001; Stout e Allen, 2002) e no tm acesso circulao sistmica em quantidade suficiente quecomprometa a funo do corpo lteo. A funo destasprostaglandinas no completamente definida (Stoute Allen, 2002), porm tem sido proposto que elas sonecessrias para simular localmente as contraesperistlticas (tubricas e uterinas) e o relaxamento domiomtrio requeridos para propulsar o concepto deuma extremidade outra no lmen uterino (Allen,2000; Stout e Allen, 2001; Stout e Allen, 2002).Tambm possvel que essas prostaglandinas produzidas tenham outras funes, como promover arpida expanso do blastocisto inicial e aumentarem ofluxo sanguneo uterino e a permeabilidade vascular,facilitando a distribuio de nutrientes para o desen-volvimento do concepto (Stout e Allen, 2002).

    Na natureza, o sinal pelo qual o embrio eqinoinforma bioquimicamente a gua da sua presena notero para completar a necessria luteostase ainda desconhecido (Allen, 2000; Betteridge, 2000).Diferente dos ruminantes, o concepto eqino no produz a molcula protica interferon tau com propriedade luteosttica, mas semelhante ao embriosuno, ele comea a secretar estrgeno desde os setedias aps a ovulao e, portanto, inicialmente acredi-tou-se que essa seria a substncia que teria a funo dointerferon tau no reconhecimento materno da gestaono eqino (Allen, 2000; Allen, 2001; Raeside et al.,2002, 2004; Hafez e Hafez, 2004). A produo deestradiol pelo concepto eqino inicial significantepara o estabelecimento da gestao, porm sua exatafuno no processo ainda no est bem determinada.Uma das funes do estrgeno a de mediador localnos tecidos e desempenha tambm uma contribuioessencial na comunicao materno-fetal na placentaepitliocorial (Raeside et al., 2002, 2004).

    Alguns experimentos mostraram que um processogradual permite a queda de receptores para a ocitocinano endomtrio entre os dias 10 e 16 aps a ovulao(Allen, 2000; Betteridge, 2000; Allen e Stewart, 2001)reduzindo potencialmente a cascata do cidoaracdnico que em adio produo de um inibidorda sntese de prostaglandinas bloqueiam a conversodo cido aracdnico na potente PGF, auxiliando na

    manuteno do corpo lteo (Sharp, 2000).Uma elevada taxa na perda de gestao na gua

    (32%) ocorre entre os dias 12 e 30 aps a ovulao,por no suportar uma deficincia na liberao do fatorde reconhecimento materno da gestao pelo concepto,impedindo a ao cclica da prostaglandina, a qualganha acesso circulao perifrica, atravs da veiauterina, e acidentalmente induz a lutelise do corpolteo eqino (Allen e Stewart, 2001).

    Nos ltimos anos caracterizou-se uma molcula deprotena como sendo a responsvel pelo reconheci-mento materno da gestao nos eqinos. Ocorre uma maior produo de protenas totais e especficasintra-uterinas nos dias do reconhecimento materno dagestao. Na espcie eqina a PGF2 produzida pelotero ao redor do dia 14 aps a ovulao provocandoa regresso do corpo lteo. A maior produo do fatorde inibio de produo de prostaglandina ocorre nosdias 12 e 13 ps-ovulao, sendo que no dia 16 essesnveis no so mais significativos. Isso indica umaonda de supresso justamente no momento em queocorreria o pico de produo de PGF2 (Sharp, 2000).

    Embora o estrgeno sozinho no seja responsvelpela sinalizao materna da gestao em eqinos, eleparece estar envolvido. Altas concentraes deestrgeno, associadas ao aumento da progesteronalevam a um aumento considervel na produo deuteroferrinas (Ellenberger et al., 2008), e estas parecemser as protenas responsveis pelo reconhecimentomaterno da gestao (Sharp, 2000).

    Placentao inicial

    A placenta da gua classificada como epitliocorial, difusa, microcotiledonria e adeciduada(Abd-Elnaeim et al., 2006). Na gua, a aderncia placentria ocorre somente por volta dos dias 24 a 40 (Hafez e Hafez, 2004). Este tipo de placentao no invasiva e produz uma mnima resposta celularmaterna (Ginther, 1992; Gerstenberg et al., 1999).

    A placenta eqina classificada como epitliocorialuma vez que o epitlio uterino est em contato com acamada do crion, apresentando, portanto, seiscamadas de tecido entre os capilares materno e fetal(endotlio, tecido conjuntivo e epitlio), por isso,nesta espcie no ocorre a passagem de imunoglobu-linas da me para o feto, sendo a administrao do colostro muito importante. A classificao difusase deve ao fato de que a vilosidade do crion est distribuda uniformemente sobre toda a superfcie detecido materno, formando pequenos agrupamentosdos vilos aparentando microcotildones (Allen et al.,2002a). A caracterstica adeciduada da placenta sedeve ao fato de no ocorrer perda de tecido maternodurante o parto (Ginther, 1992; Gerstenberg et al.,1999).

    A adeso precoce ocorre por meio de uma interdigi-tao entre a superfcie epitelial da vescula embrio-

    Caixeta ES et al. RPCV (2008) 103 (565-566) 25-34

    32

  • nria e o revestimento uterino. Com a contnua expansoda placenta por todo o tero, a justaposio dosmicrovilos do crion com o epitlio uterino torna-semais complexa para permitir o aparecimento de milhares de estruturas microcoteledonrias que prendem firmemente a placenta (Ginther, 1992;Sharp, 2000; Allen, 2001; Allen et al., 2002a; Hafez eHafez, 2004).

    A placentao envolve um aumento e uma reorgani-zao considerveis em ambos os tecidos, materno e fetal (Gerstenberg et al., 1999). Como estruturas distintas da placenta eqina madura, os microcotil-dones so completamente formados no quinto ms de gestao. As dobras primrias do trofoblasto sosubdivididas com a progresso da gestao. Estasmodificaes so reflexos das estruturas das criptasmaternas que recebem os vilos fetais. Dentro de cadamicrocotildone, os epitlios corinico e uterino estoem contato ntimo e a juno do microvilo formadaentre os limites materno-fetais (Allen, 2001; Hafez eHafez, 2004; Abd-Elnaeim et al., 2006). Cada micro-cotildone suprido por uma artria maternal e umaequivalente artria da placenta fetal (Allen, 2001;Wilsher e Allen, 2003).

    As funes da placenta so diversas e incluemnutrio e respirao fetal (Abd-Elnaeim et al., 2006),retirada de detritos, e segurana de que o feto seja protegido da resposta imune materna, que direciona-da contra o feto ou antgenos placentrios (Ginther,1992).

    Em guas a gestao gemelar rara, devido competio entre as placentas pelo contato com oendomtrio materno, resultando em insuficincia placentria para ambos os conceptos. A perspectiva que ocorra morte embrionria no incio da gestao ouque o feto em desvantagem morra durante a segundametade da gestao, dando incio ao abortamento(Ginther, 1992; Allen e Stewart, 2001).

    A placenta microcotiledonria e o endomtriointeiramente funcionais so pr-requisitos essenciaispara uma gestao normal na gua e produo de umfeto sadio e bem desenvolvido (Ginther, 1992; Allen eStewart, 2001; Wilsher e Allen, 2003).

    Consideraes finais

    Por apresentar caractersticas to distintas, o eqinotem sido uma espcie modelo na embriologia. Aindano est completamente esclarecida a origem de algumas peculiaridades no desenvolvimento embrio-nrio eqino, mas sabe-se que do incio ao fim da gestao, a gua contrasta com as outras espcies animais domsticas em muitos aspectos estruturais efuncionais, que se combinam para fornecer nutriosuficiente para o crescimento e desenvolvimento doembrio.

    Com o uso cada vez maior das tcnicas de repro-duo assistida, torna-se de grande importncia o

    conhecimento das fases do desenvolvimento embrio-nrio e da fisiologia e endocrinologia da gestao,para com isso, diminuir problemas como a perda precoce da gestao e otimizar os resultados dasbiotecnologias da reproduo eqina.

    Bibliografia

    Abd-Elnaeim MMM, Leiser R, Wilsher S, Allen WR (2006). Structural and haemovascular aspects of placental growth throughout gestation in young and aged mares. Placenta, 27: 1103-1113.

    Adams AP, Antczak DF (2001). Ectopic Transplantation of Equine Invasive Trophoblast. Biology of Reproduction, 64: 753-763.

    Allen WR (2000). The Physiology of Early Pregnancy in the Mare. In: American Association of Equine Practitioners. Proceedings, 46: 338-354.

    Allen WR (2001). Fetomaternal interactions and influences during equine pregnancy. Journals of Reproduction and Fertility, 121: 513-527.

    Allen WR, Stewart F (2001). Equine placentation. Reproduction, Fertility and Development, 13: 623-634.

    Allen WR, Wilsher S, Turnbull C, Stewart F, Ousey J, Rossdale PD, Fowden AL (2002a). Influence of maternalsize on placental, fetal and postnatal growth in the horse. I. Development in utero. Reproduction, 123: 445-453.

    Allen WR, Wilsher S, Stewart F, Ousey J, Fowden A (2002b). The influence of maternal size on placental, fetal and postnatal growth in the horse. II. Endocrinology of pregnancy. Journal of Endocrinology, 172: 237-246.

    Arar S, Chan KH, Quinn BA, Waelchli RO, Hayes MA, Betteridged KJ, Monteiroa MA (2007). Desialylation of core type 1 O-glycan in the equine embryonic capsule coincides with immobilization of the conceptus in the uterus. Carbohydrate Research, 342: 11101115.

    Betteridge KJ (2000). Comparative aspects of equine embryonic development. Animal Reproduction Science, 60-61: 691-702.

    Betteridge KJ, Eaglesome MD, Mitchell D, Flood PF, Beriault R (1982). Development of horse embryos up to twenty two days after ovulation: observations on fresh specimens. Journal of Anatomy, 135: 191-209.

    Chu JWK, Sharom FJ, Oriol JG, Betteridge KJ, Cleaver BD, Sharp DC (1997). Biochemical Changes in the Equine Capsule Following Prostaglandin-Induced Pregnancy Failure. Molecular Reproduction and Development, 46: 286-295.

    Crossett B, Suire S, Herrler A, Allen WR, Stewart F (1998). Transfer of a uterine lipocalin from the endometrium of the mare to the developing equine conceptus. Biology of Reproduction, 59: 483490.

    de Mestre AM, Bacon SJ, Costa CC, Leadbeater JC, Noronha LE, Stewart F, Antczak DF (2008). Modeling trophoblast differentiation using equine chorionic girdle vesicles. Placenta, 29: 158-169.

    Ellenberger C, Wilsher S, Allen WR, Hoffmann C, Kolling M, Bazer FW, Klug J, Schoon D, Schoon HA (2008). Immunolocalisation of the uterine secretory proteins uterocalin, uteroferrin and uteroglobin in the mares

    Caixeta ES et al. RPCV (2008) 103 (565-566) 25-34

    33

  • uterus and placenta throughout pregnancy. Theriog-enology 70: 746757.

    Gastal MO, Gastal EL, Torres CAA, Ginther OJ (1998). Effect of PGE2 on Uterine Contractility and Tone in Mares. Theriogenology, 50: 989-999.

    Gerstenberg C, Allen WR, Stewart F (1999). Cell prolifera-tion patterns during development of the equine placenta. Journals of Reproduction and Fertility, 117: 143-152.

    Ginther OJ (1983). Mobility of the early equine conceptus. Theriogenology, 19: 603-611.

    Ginther OJ (1992). Reproductive biology of the mare: basic and applied aspects. 2 Ed. Equiservices: Madison, Wisconsin, 642 p.

    Hafez B, Hafez ESE (2004). Reproduo Animal. 7 Ed. Monole, So Paulo, 513 p.

    Herrler A, Beier HM (2000). Early Embryonic Coats: Morphology, Function, Practical Applications. Cells Tissues Organs, 166: 233-246.

    Leith GS, Ginther OJ (1984). Characterization of intrauter-ine mobility of the early equine conceptus. Theriog-enology, 22: 401-408.

    Lunn P, Vagnoni KE, Ginther OJ (1997). The equine immune response to endometrial cups. Journal of Reproductive Immunology, 34: 203-216.

    Oriol JG, Sharom FJ, Betteridge KJ (1993). Developmentally regulated changes in the glycoproteins of the equine embryonic capsule. J Reprod Fertil, 99: 653-664.

    Quinn BA, Hayes MA, Waelchli RO, Kennedy MW, Betteridge KJ (2007). Changes in major proteins in the embryonic capsule during immobilization (fixation) of the conceptus in the third week of pregnancy in the mare. Reproduction, 134: 161-170.

    Raeside JI, Christie HL, Renaud RL, Waelchli RO, Betteridge KJ (2002). Estrogen metabolism in the equine conceptus and endometrium in early pregnancy. Theriogenology, 58: 817-820.

    Raeside JI, Christie HL, Renaud RL, Waelchli RO, Betteridge KJ (2004). Estrogen Metabolism in the Equine Conceptus and Endometrium During Early Pregnancy in Relation to Estrogen Concentrations in Yolk-Sac Fluid. Biology of Reproduction, 71: 1120-1127.

    Sharp DC (2000). The early fetal life of the equine conceptus.Animal Reproduction Science, 60-61: 679-689.

    Stewart F, Charleston B, Crossett B, Barker PJ, Allen WR (1995). A novel uterine protein that associates with the embryonic capsule in equids. Journal of Reproduction and Fertility, 150: 65-70.

    Stout TAE, Allen WR (2001). Role of prostaglandins in intrauterine migration of the equine conceptus. Journals of Reproduction and Fertility, 121: 771-775.

    Stout TAE, Allen WR (2002). Prostaglandin E2 and F2_ production by equine conceptuses and concentrations in conceptus fluids and uterine flushings recovered from early pregnant and dioestrous mares. Society for Reproduction and Fertility, 123: 261-268.

    Stout TAE, Meadows S, Allen WR (2005). Stage-specific formation of the equine blastocyst capsule is instrumentalto hatching and to embryonic survival in vivo. Animal Reproduction Science, 87: 269-281.

    Wilsher S, Allen WR (2003). The effects of maternal age and parity on placental and fetal development in the mare. Equine Veterinary Journal, 35: 476-483.

    Wooding FBP, Morgan G, Fowden AL, Allen WR (2001). A Structural and Immunological Study of Chorionic Gonadotrophin Production by Equine Trophoblast Girdle and Cup Cells. Placenta, 22: 749-767.

    Caixeta ES et al. RPCV (2008) 103 (565-566) 25-34

    34