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José Saramago

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Memorial do Convento

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José Saramago

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Para escrever Memorial do Convento, Saramago viu-se obrigado a estudar as bases históricas e a preencher as lacunas deixadas nos documentos históricos. O romance apresenta-se como questionador, na medida em que não aceita as imposições feitas pelos historiadores em relação a uma verdade una na História.

José Saramago vislumbrou a parcela de subjetividade da História, uma vez que conseguiu perceber que os produtores do discurso histórico possuem ideologia, determinados pontos e que, ao decodificarem tais documentos, acabam por preencher as lacunas existentes entre os documentos com um ponto de vista subjetivo.

“Entra aí o novo olhar do ficcionista que se quer historiador de uma nova História, pois o Memorial do Convento rebela-se contra a visão de uma história que coloca o rei como sujeito da ação de “erguer” o convento de Mafra” .

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Memorial do Convento pretende essencialmente reinventar a História

através da ficção, não só para resgatar do anonimato o povo humilde que é

assumido como o verdadeiro herói construtor do Convento de Mafra, mas

também para garantir os seguintes aspetos:

- o empenhamento crítico do leitor face a todas as formas de repressão

que limitam a liberdade do ser humano ao longo de todos os tempos

(através de Blimunda, que recolhe a alma de Baltasar quando este é

condenado, Saramago representa a sobrevivência do povo, quando a

repressão atinge requintes de sadismo);

- a compreensão do destino do homem, da sua grandeza e dos seus

limites, procurando a sua realização plena através do trabalho, do sonho,

do amor, da fé e do mistério…

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● Significado de MAFRA

« (…) e a vila, lá em baixo na cova, é Mafra, que dizem os eruditos

ser isso mesmo o que quer dizer, mas um dia se hão-de rectificar os

sentidos e naquele nome será lido, letra por letra, mortos, assados,

fundidos, roubados, arrastados (…)»

► Segundo alguns críticos, o povo trabalhador constitui o

verdadeiro herói de Memorial do Convento. O herói deficiente,

feio, rude e, às vezes, violento: não tardaria que se começasse a

dizer que isto é uma terra de defeituosos, um marreco, um

maneta, um zarolho…, porém, verdades são verdades.

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“...Resumindo as suas razões naquilo que, em seu entender, significavam as cinco letras de Mafra:

o M de mortos, o A de assados, o F de fundidos, o R de roubados, o A de arrastados.

Assim via aquele abade beneditino os milhares de desgraçados que, mais ou menos de toda a terra portuguesa, a esta obra vieram, forçados pela vontade do Senhor D. João V. Não quero, nem por sombras, insinuar que no desabafo desta indignação tão santa tenham pesado ciúmes da Ordem de S. Bento por causa do estupendo edifício de que iam passar a gozar-se os franciscanos...”

José Saramago, Cadernos de Lanzarote, Diário III, Ed. Caminho. Lisboa 1996, pp.164/165

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Ao escrever o seu Memorial, o ficcionista propõem-se resgatar o papel dos oprimidos, dos 40 mil operários que humildemente sofrem e se esforçam por sobreviver durante a construção do monumento: Deve-se a construção do convento de Mafra ao rei D. João V, por um voto que fez se lhe nascesse um filho, vão aqui seiscentos homens que não fizeram filho nenhum à rainha e eles é que pagam o voto, que se lixam.

(Cap. XIX)

Não se pense, contudo, que estamos simplesmente perante uma massa coletiva e anónima. Para além de Baltasar e Blimunda, o autor cria uma pequena galeria de homens-trabalhadores: Francisco Marques, Pêro Pinheiro, José Pequeno, João Anes e outros. São ainda individualmente caracterizados os familiares de Baltasar, residentes em Mafra, e João Elvas, companheiro das primeiras aventuras.

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► O verdadeiro protagonista de Memorial do Convento é o povo

trabalhador. Espoliado, rude, violento, o povo atravessa toda a

narrativa, numa construção de figuras que, embora corporizadas por

Baltasar e Blimunda, tipificam a massa coletiva e anónima que

construiu, de facto, o convento. A crítica e o olhar mordaz do narrador

enfatizam a escravidão a que foram sujeitos quarenta mil portugueses,

para alimentar o sonho de um rei megalómano ao qual se atribui a

edificação do Convento de Mafra.

● Razão do livro: homenagem coletiva aos trabalhadores

“ (…) só para isso escrevemos, torná-los imortais( …)”(Cap. XIX)

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Todos aqueles que não podem ser caracterizados são, ao menos, nomeados, numa derradeira homenagem: Alcino, Brás, Cristóvão…uma letra de cada um para ficarem todos representados. Esta passagem textual pode ser interpretada como síntese da relação História – Verdade. (na realidade contemporânea, quantos nomes de trabalhadores anónimos serão lembrados nas cerimónias de inauguração?)

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Memorial do Convento é uma obra que:

•Caracteriza uma época de excessos e diferenças sociais:

opulência/miséria, poder/opressão, amor ausente/amor sincero.

•Oferece-nos uma descrição minuciosa da sociedade portuguesa do

início do século XVIII, preocupando-se com a realidade social.

•Visa denunciar a história repressiva portuguesa da primeira metade do

século XX ( ditadura Salazarista).

•Revela a necessidade do autor em repensar os acontecimentos e figuras

históricas à luz de uma nova realidade criada no presente e pressentida

no futuro.

•Preocupa-se com o ser humano, a sua miséria e as suas lutas, as

injustiças, a sua grandeza e os seus limites.

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Disciplina: PortuguêsProf.ª: Helena Maria Coutinho