3. Introdução à Proctologia
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Principais Temas da Aula
1 - Introdução
1.1 - Anatomia
1.2 - Motivos habituais de uma consulta de proctologia
1.3 - Semiologia
1.4 - Exame Proctológico
2 - Patologia
2.1 - Doença hemorroidária
2.2 - Fissura anal
2.3 - Abcesso anal e fístula anal
2.4 - Oncologia e Proctologia
2.5 - Outras Patologias
Bibliografia
Desgravada do ano passado
Slides da aula
Alves Pereira
Desgravadas do 3º Ano – 2006/07 Data: 13 de Outubro 2007
Disciplina: Cirurgia I Prof.: Manuel Limbert
Tema da Aula: Introdução à Proctologia
Autor(es): Daniela Pereira Alves e Manuela Leal
Equipa Correctora:Catarina Santos e Mariana Freire
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1 - Introdução
Proctologia: ciência que estuda as doenças ano-rectais (grego
“proktos”- anús)
1. 1 - Anatomia
1.1.1 Região ano-rectal: porção terminal do tubo digestivo, formada
por dois componentes em continuidade, o canal anal e o recto que formam entre
si um ângulo agudo.
1.1.2 Canal anal
É constituído por feixes musculares, que representam o aparelho
esfíncteriano.
Tem a função de manutenção da continência, permitindo a expulsão
selectiva do conteúdo rectal.
Figura 1: Anatomia do recto e canal anal.
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O canal anal é dividido em duas partes por uma zona irregular,
denominada linha pectínea:
Supra pectínea:
Ocupada pelas colunas de Morgani, pequenas pregas verticais que
delimitam as criptas. Existem a este nível por vezes umas formações
triangulares em dente de gato, chamadas papilas anais, que podem estar mais
ou menos hipertrofiadas por fenómenos inflamatórios.
Nesta área situa-se o plexo hemorroidário interno (coloração vermelha
marcada).Tem origem na endoderme.
Subpectínea:
Também conhecida por pécten, 2 a 15 mm, cor cinza azulada, é bem
aderente aos planos profundos pelo ligamento de Parks, nesta área começa o
plexo hemorroidário externo. Tem origem na ectoderme
1.1.3. Musculatura do canal anal:
O canal é rodeado por duas camadas concêntricas de fibras
musculares, os sistemas esfincterianos, interno e externo, separados por uma
camada intermediária de fibras verticais, a camada longitudinal complexa.
Esfíncter anal interno: músculo liso (involuntário), prolongamento
camada circular do recto, em permanente contracção tónica (85% da pressão).
Esfíncter anal externo: músculo estriado (voluntário), com feixe
profundo e outro subcutâneo, continua-se com o puborectal, responsável pela
contracção voluntária do ânus, importante na continência de urgência. Inervado
pelo nervo pudendo.
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Camada longitudinal complexa: tem fibras de várias origens;
camada longitudinal do recto (lisas), puborectal e feixe profundo do esfíncter
externo (estriadas), fibras tendinosas da aponevrose pélvica superior. Envia
ramificações em sentido radial que formam o ligamento de Parks quando
atravessam o EI e se inserem na região justa-pectínea.
1.1.4. Glândulas do canal anal:
Glândulas de Herman e Defosses: Abrem-se no fundo das criptas
anais, tem origem em canais embrionários situados na submucosa, estendem-se
através do sistema esfíncteriano, podendo enviar ramificações que atravessam o
EI e seguem a camada longitudinal complexa. Papel fundamental na patogenia
das fístulas anais.
1.1.5 Epitélio:
O recto tem epitélio colunar. Entre o anel ano-rectal e a linha pectínea
temos uma zona de transição em que vamos deixando de ter epitélio colunar e
passamos a ter epitélio estratificado pavimentoso. Abaixo da linha pectínea o
epitélio do ânus é estratificado pavimentoso não queratinizado.
A diversidade de epitélios encontrados nesta zona explica a diversidade
de carcinomas que podem surgir.
Figura 2: Musculatura do canal anal.
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Limite anatómico
1. 1.6 Limites do ânus
Segundo o apontado na aula são considerados como limites cirúrgicos do ânus
a região em que se forma um ângulo entre o canal anal e o ânus, acima das
colunas de Morgani - anel ano-rectal. O limite anatómico corresponde à linha
pectínea.
1.2 - Motivos habituais de uma consulta de
proctologia
Sinais habituais:
Dor 50%
Rectorragia 40%
Tumefacção anal 25%
Alterações recentes no trânsito 18%
Prurido 15%
Escorrências sem sangue 12%
Limite cirúrgico
Figura 3: Limites do ânus.
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Diagnósticos mais frequentes:
Hemorróidas 40 %
Fissuras 18% (10% associadas a
hemorróidas)
Supurações (abcesso/fístula) 16 %
Condilomas 7 %
Eczema 6%
Patologia tumoral 4%
Outros (d.venéreas, nevralgias, Crohn) 9%
1. 3. Semiologia
1.3.1. Dor ano-rectal – forma de apresentação
No momento da evacuação
Fissura anal (prolonga-se após a evacuação);
Criptite e papilite;
Cancro anal.
Contínua, exacerbando-se com a evacuação
Trombose hemorroidária;
Abcesso;
Anite.
Sem relação com a evacuação
Contínua Cancro anal avançado;
Descontínua Proctalgia fugaz, nevralgia anal, coccigodinia.
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1.3.2. Dor ano-rectal essencial
Proctalgia fugaz
Dor rectal profunda, tipo caímbra;
Surge na primeira metade da noite;
Sobretudo no sexo feminino, entre os 40-50 anos;
Intensidade variável;
Pode demorar desde alguns segundos até meia hora.
Nevralgia anal
Dor anal mal definida;
Variável na intensidade, localização e irradiação;
Sem horário determinado;
Mais frequente nas mulheres, entre os 50-60 anos, com alterações
psiquiátricas.
Coccigodinia
Representa a maioria dos casos das algias proctológicas
essenciais;
Dor referida ao ânus, recto ou períneo;
Agravada pelo toque ou pela mobilização do cóccix;
Agravada com os movimentos, a posição de sentado e, por vezes,
com a defecação;
Tratamento muito difícil;
Mais frequente nas mulheres com mais de 50 anos;
Associada a traumatismos antigos do cóccix ?
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Pode suspeitar-se da origem provável da rectorragia em algumas situações:
I. Rectorragia mínima que mancha a roupa interior faz pensar numa lesão muco-cutânea anal ou peri-anal, num prolapso permanente ou, mais raramente, num cancro anal ulcerado.
II. Sangue vermelho vivo que pinga na sanita é característico de uma causa hemorroidária. Em geral, o sangue é expulso depois da evacuação, sob a forma de gotas ou em jacto.
III. Sangue vermelho que recobre as fezes em regra devido a uma lesão ulcerada, tumoral ou inflamatória, de localização distal.
1.3.3. Rectorragia
Emissão de sangue vermelho pelo ânus, não misturado com as fezes,
habitualmente no acto da defecação. É muito grande a probabilidade da causa
da hemorragia estar no ânus e/ou no recto /sigmóide.
Tipo de hemorragia
Duração e frequência;
Relação com as fezes (misturado nas fezes, antes ou depois,
isoladamente);
Quantidade (abundante, pequena ou apenas tingindo o papel ao
limpar);
Queixas associadas
Tenesmo, alterações do trânsito intestinal, dor abdominal ou anal,
emissão de muco ou pús, febre, etc.
Antecedentes
Introdução de corpos estranhos, cirurgia ano-rectal prévia,
radioterapia, medicamentos anticoagulantes, antecedentes familiares de
polipose ou cancro cólico
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Quadro ano-rectal associado a rectorragia
Se há dor intensa ao defecar, poderá pensar-se em fissura se a
quantidade de sangue é mínima; e em fissura e hemorróidas (situações
frequentemente associadas) se a quantidade de sangue é abundante.
Se houver tenesmo e/ou falsas vontades de defecar, deve pensar-
se na existência de um tumor benigno ou maligno do recto, ou de uma rectite.
Se o sangue estiver diluído numa grande quantidade de muco,
pode pensar-se num tumor viloso do cólon ou do recto.
Se à rectorragia se associa muco ou pús, inclinamo-nos para o
diagnóstico de colite ulcerosa no caso de haver diarreia, ou para o diagnóstico
de estenose inflamatória ou neoplásica no caso de haver obstipação recente.
Rectorragia – causas mais frequentes
Hemorróidas;
Fissura;
Pólipos;
Cancro;
Doença diverticular do cólon;
Doenças inflamatórias inespecíficas do intestino;
Lesões vasculares.
1.3.4. Tumefacção anal
Excrescência de longa duração pode corresponder a mariscas
(prega cutânea de pequenos milímetros, ligeiramente espessa e
hiperpigmentada que corresponde a sequelas de trombose hemorroidária), a
papilomas ou a um quisto sebáceo.
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Tumefacção com evolução relativamente curta, pode sugerir o
cancro anal.
Tumefacção de evolução recente e aguda, faz pensar em
trombose hemorroidária ou em abcesso do ânus, os quais constituem,
normalmente, urgências cirúrgicas.
Excrescência de aparição intermitente está geralmente associada
com prolapso, papila hipertrófica ou lesão polipóide.
1.3.5. Prurido anal
Sensação e necessidade mais ou menos imperiosa e intensa de coceira.
Embora possa aparecer como uma manifestação isolada, o prurido
habitualmente está associado a outras queixas, como a rectorragia, a
escorrência anal ou a dor.
Prurido anal – Formas clínicas e etiológicas
Proctológicas
Supurações perianais e anais;
Estados inflamatórios: criptites, papilites, ano-rectites;
Ulcerações, fissuras;
Hemorróidas, sobretudo prolapsadas;
Tumores benignos e malignos;
Afecções víricas (condilomas, herpes), psoríase, líquen;
Sequelas de pós-operatórios proctológicos.
Alérgicas
Alergias de contacto: tópicos, roupa interior.
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Infecciosas
Microbiana; micótica (candidíase).
Locoregionais
Ginecológicas: leucorreia por Candida, Trichomonas;
Intestinais: parasitoses (oxiuríase, áscaris, ténia, giardia); diarreia
(fezes ácidas).
Sistémicas
Diabetes, gota, nefropatias, hemopatias.
Sem causa
Prurido essencial.
1.3.6. Escorrências anais
A escorrência pode ser anal e estar em relação com uma fístula ou
fissura infectada.
A escorrência pode ser independente do ânus e recto, como
acontece no sinus pilonidal e na hidroadenite supurativa.
Algumas vezes, o doente refere simplesmente uma impressão de
humidade anal incolor, que é ocasionada por uma sudorese abundante, ou está
em relação com um pequeno prolapso hemorroidário intermitente, ou é
provocada por uma dermatite perianal com escorrência.
Uma pequena escorrência fecal na ausência de causa orgânica,
corresponde habitualmente a problemas funcionais de ligeira incontinência.
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1.4 - Exame protológico
O exame físico é fundamental para o diagnóstico da maioria das doenças
anorectais faz o diagnóstico em cerca de 80% das situações.
Exame físico geral (não esquecer região inguinal, exame abdominal e
toque vaginal)
Na avaliação clínica em Proctologia, o Exame Objectivo inclui:
Inspecção;
Palpação (toque rectal);
Anuscopia;
Rectoscopia rígida.
I. Inspecção
Inspecção da roupa interior;
Inspecção directa (localizar as anomalias
encontradas segundo um esquema igual aos ponteiros do relógio: 0 horas para comissura anterior e 6 horas para a posterior);
Afastamento das nádegas;
Observação com esforço defecatório (avaliar
descida do períneo, despistar a presença de prolapsos).
Posição do doente Figura 4 – Posições possíveis para
exame da região anal
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Inspecção - Anomalias que se podem encontrar
Lesões dérmicas: eczemas, micoses, condilomas, ulcerações;
Supurações: abcessos, orifícios fistulosos, quistos e fístulas
pilonidais;
Fissuras anais: quando localizadas fora da linha média, deverão
levantar a hipótese de ulceração por outras causas (doença de Crohn,
neoplasia);
Trombose hemorroidária;
Mariscas;
Lesões tumorais: benignas, malignas, condilomas;
Cicatrizes: indicando intervenções cirúrgicas ou traumatismos
anteriores, e fazendo suspeitar de lesões esfincterianas;
Períneo descido;
Hipotonicidade anal;
Prolapsos: diferenciando entre prolapso hemorroidário, mucoso do
recto e rectal completo.
II. Palpação e toque ano-rectal
Palpação da região peri-anal: delimitar extensão de abcessos,
orientação dos trajectos fistulosos, infiltração associada a lesões tumorais ou
dos bordos de lesões ulcerosas.
Exame neurológico da região peri-anal: indispensável em doentes
com incontinência ou prolapso.
Consiste em dois exames:
Pesquisa do reflexo anal
Avaliação da sensibilidade peri-anal
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Toque ano-rectal
Recto: conteúdo da ampola rectal, superfície mucosa, lesões do
recto distal (estenoses, pólipos, carcinoma, úlceras, abcesso intra-mural do
recto);
Estruturas extra-rectais: cóccix e espaço pré-sagrado, parede
pélvica lateral, recesso recto-vesical e os orgãos pélvicos anteriores (próstata,
vesículas seminais, colo do útero);
Pavimento pélvico: angulação ano-rectal (cerca de 130º em
repouso), resistência do puborectal em repouso e em contracção voluntária,
inibição reflexa da actividade do puborectal e esfíncteres com esforço
defecatório; presença de rectocelos;
Inspecção da luva
III. Anuscopia (realizada com o doente em repouso e em esforço
defecatório para avaliação de prolapso do recto distal e dos pedículos
hemorroidários).
Anuscopia – Anomalias que se podem encontrar
Prolapso mucoso do recto (parede anterior ou circular);
Figura 5 – Toque rectal
Canal anal: depressões
(correspondendo a criptites) ou papilas
hipertróficas da linha pectínea, lesões
tumorais e infiltrativas, fissuras, tonicidade
anal de repouso e após contração do
esfincter externo;
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Pedículos hemorroidários: número de pedículos prolapsados,
quantificação do prolapso;
Linha pectínea: lesões de criptopapilite, papilas hipertróficas;
Ulcerações do recto distal e do canal anal: doença de Crohn,
neoplasia maligna.
IV. Rectoscopia
Rectoscopia – Anomalias que se podem encontrar
Sangue ou pús no recto, com mucosa normal (impõe uma
exploração cólica complementar);
Alterações difusas da mucosa (as patologias inflamatórias
caracterizam-se nas fases iniciais por perda do padrão vascular, progredindo
para uma mucosa granular e hiperémica, friável, podendo observar-se
ulcerações);
Lesões localizadas: pólipos, carcinoma, úlcera solitária do recto,
áreas focais de doença de Crohn;
Dilatação do recto
Prolapso rectal (com o doente em esforço defecatório).
Para a maioria dos doentes proctológicos, basta esta investigação.
Casos selecionados poderão necessitar de outras técnicas:
Colonoscopia total
Técnicas radiológicas especiais, Defecografia (o ângulo rectal
rectifica para defecar); Ecografia, RM, Defecografia, Fistulografia, tempo do
trânsito cólico.
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Estudos funcionais, EMG - Electromiografia de Esfíncter anal (para
doenças motoras e desnervação) ; Manometria, importante para medir a pressão
necessária para relaxar os esfíncteres.
Ecografia endoanal e rectal
Visualizamos 3 camadas:
Interna, hiperecogénica, representa a mucosa e submucosa;
Intermediária, hipoecogénica, é o esfíncter interno;
Externa ou periférica, mais larga, hiperecogénica corresponde à
camada longitudinal complexa e ao esfíncter externo.
Estas duas estruturas são frequentemente indissociáveis na mulher, mas
no homem o carácter menos hiperecogénico do EE, permite diferencia-lo. A
espessura do EI aumenta com a idade, bem como a sua ecogenicidade. O EE,
cilíndrico no homem, é visível em toda a altura do canal anal; na mulher a sua
obliquidade para baixo e para a frente não permite a sua visualização na porção
mais alta do canal anal, o que pode gerar confusão com uma ruptura
esfincteriana.
ECOGRAFIA ENDOANAL E RECTAL
Figura 6 Figura 7
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A Ecografia endo-rectal: permite distinguir as camadas da parede, os
gânglios linfáticos periviscerais do meso, os órgãos vizinhos e planos adjacentes
podendo assim distinguir-se uma parede normal de uma parede com lesão e
fazer o estadiamento caso haja um tumor (T1 a T4)
2 - Patologia
2.1. Doença Hemorroidária
Caso clínico típico:
Mulher de 50 anos, com história de rectorragias intermitentes, depois da
defecação, com mais de dez anos de evolução. O sangue é vermelho vivo e
pinga a sanita. Antecedentes de obstipação.
Hemorróidas: Constituem como que almofadas vasculares, existindo
em 30% da população. Dividem-se em internas(1) e externas(2), consoante o
plexo venoso dilatado se situe acima ou abaixo da linha pectínea ou denteada.
Podem também ocorrer em combinação, havendo uma comunicação entre os
plexos hemorroidários interno e externo (3)
Fig. 10 - Trajecto de fístula
transesfincteriana
Fig 8 - CPC canal anal
invadindo o EI e o EE
Fig 9 - Rotura
obstétrica do EE
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1
2
3
Estas almofadas vasculares são suportadas por uma rede fibromuscular
constituída por:
Elementos do esfíncter interno (2)
Elementos da camada longitudinal (entre os
dois esfíncteres)
Ligamento de Parks (1) espessamento
inferior (evita o prolapso da rede fibromuscular
durante a defecação)
Desta forma, os indivíduos que fazem muito esforço para evacuarem
“empurram” o plexo para o exterior.
Embora assintomáticos na maioria dos casos, cerca de 30% dos
indivíduos com hemorróidas vêm a sofrer de hemorragia, trombose ou prolapso,
na sequência de períodos de congestão pélvica (sedentarismo, obesidade,
gravidez), obstipação e de um maior esforço na defecação.
Figura 11 - Plexos hemorroidários
Figura 12 – Elementos fibro-musculares de
suporte aos plexos hemorroidários
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As hemorróidas internas podem ser classificadas em 4 graus:
Grau I hemorróidas internas que ao defecar e com esforços
físicos sangram, mas sem prolapsarem;
Grau II exteriorizam-se com o esforço, mas reduzem
espontaneamente após a defecação;
Grau III necessitam de redução manual após a defecação;
Grau IV existe prolapso hemorroidário permanente, os plexos
internos e externos estão em continuidade.
Manifestações clínicas mais frequentes da hemorroidas:
Hemorragia
Maioria das vezes após defecação hemorragia de sangue
vermelho que pinga a sanita.
Não é patognomónico, mesmo depois de comprovadas a
existência de hemorróidas, deve-se proceder a exame fibroendoscópico do
cólon esquerdo, uma vez que em 12-15% dos casos, além da patologia
hemorroidária, detecta-se lesões tumorais, sob a forma de pólipos ou cancro.1
Prolapso hemorroidário (intermitente/permanente)
Tromboses hemorroidárias
Ocorre devido a fenómenos mecânicos que lesam a parede e
obliteram o lúmen, levando à formação de coágulos
1 Atenção especial a doentes com mais de 50 anos.
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O processo trombótico desencadeia uma inflamação (do tipo
reacção de corpo estranho)
Deve-se efectuar a excisão cirúrgica das hemorróidas trombosadas
até aos 4 dias de evolução, a partir do 4º dia, deve-se manter o quadro clínico
sob vigilância, com administração de venotrópicos (diosmina), AINE’s, pomada
heparinóide e gelo.
Tratamento das hemorroidas
Grau I Grau II Grau III Grau IV Hem. ext.2
Dieta
Escleroterapia
Infravermelhos ()3
Laqueação elástica ()
PPH
Hemorroidectomia ()
Dieta rica em fibras e elevada ingestão de água;
Escleroterapia injecção de um esclerosante na submucosa que
recobre os plexos;
2 Hemorróidas exteriorizadas
3 (): Sob análise cuidada do quadro clínico.
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Hemorroidectomia são retirados 3 a 4
pedículos, deixando-se pontes de tecido entre estes,
de forma a não se formar um anel contínuo, cuja
cicatrização provocaria uma estenose (figura 15).
Infravermelhos a aplicação da radiação provoca a fibrose do tecido,
tornando-o mais resistente, permitindo uma melhor contenção das
hemorróidas durante a defecação;
Laqueação elástica faz-se a tracção
do plexo para o interior do anuscópio e
depois aplica-se um elástico em torno do
plexo, ao fim de algum tempo, este plexo
necrosa e cai (figura 13);
PPH hemorroidopexia segundo técnica de Longo (figura 14);
Figura 13 – Laqueação elástica
Figura 14 –Hemorroidopexia segundo técnica de Longo
Figura 15 - Hemorroidotomia
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2.2 - Fissura Anal
Caso clínico típico:
Mulher de 50 anos, com história de rectorragias intermitentes, depois vida
defecação, com um ano de evolução. O sangue é vermelho vivo e, a maior parte
das vezes, é identificado apenas do papel higiénico. A hemorragia é
frequentemente acompanhada de dor anal, por vezes muito intensa, que surge 5
minutos depois da defecação e pode durar 2 a 3 horas.
É a causa mais frequente de dor anal, particularmente nas pessoas
cronicamente obstipadas. Trata-se de uma úlcera longitudinal do canal anal,
localizada normalmente na linha média posterior, causada por traumatismo
provocado pela emissão de fezes volumosas e duras. A maioria das fissuras são
agudas, recentes.
Etiopatogenia:
Traumatismo secundário à passagem de fezes duras (menos
frequentemente, um episódio de diarreia também pode provocar perda de
substância);
A persistência da fissura após o factor iniciador parece estar
associado a um aumento da pressão anal em repouso (hipertonia menor
perfusão da anoderme);
Factor vascular pobreza vascular no pólo posterior do ânus.
As fissuras anteriores e posteriores, são, na maioria dos casos, devidas a
hipertonicidade do canal anal.
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As fissuras laterais podem ser devidas a outras causas:
Doença de Crohn;
Colite ulcerosa;
Sífilis;
Tuberculose;
Leucemia;
Cancro;
HIV.
Manifestações clínicas mais frequentes das fissuras anais:
A dor surge durante e após a defecação, sendo sempre
acompanhada por espasmo do esfíncter anal, o que por sua vez agrava a dor;
A defecação é frequentemente seguida pela perda de sangue vivo.
Tríade de sinais de cronicidade (figura11):
No bordo externo (inferior) marisca sentinela(1)4
No bordo interno (superior) papila (2)
Fibras do esfíncter interno no leito da fissura (3)
4 Pelo que entendi, e tendo em conta o Alves Pereira, marisca sentinela não é mais que
uma hemorróida sentinela
1
2
3
Figura 16 – Exemplos de patologias da região
anal
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Tratamento das fístulas anais
Cirurgia: esfincterectomia (esfíncter interno) que diminui a pressão
do canal anal;
Se não houver hipertonia retalhos cutâneos ou mucosos;
Devido às complicações a longo prazo da esfincterectomia,
surgiram outros tratamentos cujo objectivo é a diminuição da pressão anal média
máxima em repouso (esfincterectomia química):
1. Nitratos tópicos (nitroglicerina, dinitrato de isosorbido). O NO
(neurotransmissor do músculo liso do esfíncter interno)
vasodilatação;
2. Bloqueadores dos canais de cálcio tópicos ou orais (nifedipina,
diltiazem) vasodilatação;
3. L-arginina (dador de NO);
4. Agonistas muscarínicos tópicos (betanecol);
5. Toxina butolínica (injecção subfissurária).
2.3 - Abcesso anal e Fístula anal
Ambas as situações são fases diferentes do mesmo processo
supuração anal.
2.3.1. Abcesso anal
Fase aguda da supuração anal. É uma colecção de material purulento na
região anorrectal, que começa, na maioria dos casos, nas adenites supurativas
das glândulas anais.
Cerca de 2/3 das glândulas anais atingem o esfíncter interno; e 50%
atingem o espaço inter-esfíncteriano.
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Caso clínico típico:
Homem de 30 anos, com queixas de dor peri-anal, não ritmada com as
dejecções, muito intensa, irradiando para os órgãos genitais, e com dois dias de
evolução. A dor está associada a alterações do estado geral e a febre. È visível
e palpável uma tumefacção da região peri-anal.
Etiologia do abcesso anal:
Não específica
Criptoglandular
Específica
. Doença inflamatória intestinal
Doença de Crohn
Colite ulcerosa
Infecção
Tuberculose
Actinomicose
Linfogranuloma venereum
Trauma
Empalamento
Corpo estranho
Cirurgia
Episiotomia
Hemorroidectomia
Prostatectomia
Neoplasia
Carcinoma
Leucemia (M4)
Linfoma
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Classificação de abcesso anal (figura 17)
Submucoso
Perianal
Interesfincteriano
Isquioanal
Supralevantadoriano
Tratamento dos abcessos anais
A drenagem pode ser efectuada de duas formas:
Aspiração com seringa (maior risco de fecho);
Incisão (com ou sem dreno);
Figura 18 – Aspiração com seringa (A),
Incisão (B) e (C)
Fig 17 – Possíveis localizações de
abcessos anais
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O professor chamou a atenção para a Fistulotomia primária: com este
método cirúrgico pretende-se, após a drenagem do abcesso, seguir o trajecto do
pus e descobrir o orifício interno, fazendo-se de imediato a fistulotomia primária.
Mas este processo está associado a um maior número de problemas de
incontinência (inflamação com edema dificulta a percepção da anatomia
esfíncteriana). Assim, opta-se por uma solução de meio termo coloca-se um
sedanho até passar a inflamação.
Diagnóstico diferencial de abcessos anais
Sinus pilonidal
Representa cerca de 15% dos abcessos perianais;
Tem origem no tecido celular subcutâneo do sulco inter-glúteo;
A cavidade infectada encontra-se ocupada por um tufo de pêlos e
comunica com a pele por um ou vários orifícios geralmente
medianos;
O quadro pode ser agudo (abcessos) ou crónico (descarga de
material purulento através dos orifícios presentes no sulco inter-
glúteo).
Tratamento: cirúrgico5 (depilação eficaz e definitiva pode resolver).
Etiopatogenia de sinus pilonidal:
o Teoria congénita: defeito na coalescência da rafe mediana
subcutânea com origem na primeira camada mesoblástica;
o Teoria adquirida: pressão interglútea rasga folículo piloso e
penetra o sulco criando uma reacção de corpo estranho.
5 Deve ser evitada a incisão ao nível da linha média.
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2.3.2. Fístula anal
Constitui a fase crónica do processo de supuração anal.
Tem origem num abcesso criptoglandular (que corresponde ao orifício
interno) que drena para o exterior através de um orifício (designado por orifício
externo da fístula) geralmente na margem do ânus ou na mucosa anal, após um
trajecto mais ou menos complexo através do aparelho esfincteriano. Este
trajecto é preenchido por tecido de granulação.
Classificação das fístulas anais (fig19)
As fistulas anais podem ser classificadas segundo a sua relação com o
esfícter externo:
1. Interesfincterianas (A): internamente em relação ao esfíncter
externo (entre o interno e o externo);
2. Trans-esfincterianas (B): passam através do esfíncter externo;
3. Supra-esfincterianas (C): localizam-se acima do esfíncter
externo, atravessando o músculo pubo-rectal;
4. Extra-esfíncterianas (D): Se o orifício interno se situar no recto, e
não no canal anal
Figura 19 – Trajecto de fístulas anais
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Distribuição dos orifícios internos:
Lei de Goodsall (figura 16)
Imaginando uma linha transversal que passa pelo ânus, dividindo esta
região em anterior e posterior, verifica-se que:
Orifício externo posterior: trajecto fistuloso curvilíneo;
Orifício externo anterior: trajecto fistuloso rectilíneo;
Esta lei é válida para orifícios externos que se encontrem num raio inferior
a 3cm em relação ao ânus.
Figura 21 – Trajecto de fístulas
anais
Figura 20 – Localização de fístulas anais
anais
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Figura 22 – Lesões herpéticas
anais
Tratamento das fístulas anais
Fístulotomia
Fístulectomia
Seton cortante ou seton de drenagem
Fistolotomia parcial com colocação de seton
Cola de fibrina
“Plug” obturador de fístula anal prostético)
Retalhos mucosos de avanço
Retalhos cutâneos de avanço
Encerramento do orifício interno e drenagem do trajecto extra-
esfincteriano
Ressecção anterior do recto
Colostomia (fístulas mais complexas)
Tratamento médico
Vigilância
2. 4. Oncologia e Proctologia
Condilomas acuminados
São lesões assintomáticas provocadas pelo vírus do HPV. Existem
estirpes de baixo (6, 11) e alto risco (16, 18, 31, 33, 35). É das mais frequentes
doenças sexualmente transmissíveis. A localização anal é própria dos que
praticam coito anorreceptivo.
São pequenas excrescências esbranquiçadas,
separadas por pele normal. Localizam-se mais
frequentemente ao nível da margem, mas também
podem existir dentro do canal anal. Raramente podem
degenerar e dar origem a um tumor localmente invasivo
(tumor de Buschke-Lowenstein) faz-se a coloração
com ácido acético a 5% para evidenciar displasia
epitelial.
Fig 22 – Lesões herpéticas
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O tratamento é efectuado com pomada Imiquimod (Aldara) para as lesões mais
pequenas ou cirurgia (lesões mais volumosas).
Doença de Bowen
Carcinoma espinocelular do canal anal
Tem como manifestações clínicas a dor e a hemorragia. É por vezes
confundido com o quadro de doença hemorroidária. Este tipo de neoplasia pode
metastizar para os gânglios locorregionais (nomeadamente inguinais).
O tratamento é realizado com quimiorradioterapia, se ocorrer recidiva
faz-se uma amputação abdominoperineal.
É uma lesão que traduz um carcinoma pavimento-
celular “in situ”, mais recentemente denominado de HSIL
(high-grade squamous intrepithelial lesions).
Caracteriza-se como sendo uma lesão do tipo
dermatose crónica, facilmente confundida com as
apresentações clínicas do prurido anal, da queratose senil ou
da psoríase.
O tratamento é cirúrgico (excisão alargada).
Fig 23 – Doença de Bowman
Doença de Paget
Esta lesão contém células de Paget, que
representam um adenocarcinoma intraepitelial com uma
fase pré-invasiva longa e que eventualmente pode evoluir
para um adenocarcinoma de uma glândula apócrina
subjacente.
Tem um aspecto eczematoso com prurido intratável.
O tratamento é cirúrgico (excisão / amputação
abdominoperineal).
Fig 24 – Doença de Paget
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Melanoma do canal anal
Neoplasia que também pode ocorrer nesta região, pode ser confundido
com hemorróidas, daí a importância de saber o diagnóstico anatomo-patológico
de uma hemorroidectomia.
Outros
Linfoma;
Sarcoma;
Carcinoma Malpighiano;
Carcinoma basocelular;
Adenocarcinoma;
(…)
2.5 - Outras Patologias6
Hidradenite supurativa
É devida à infecção das glândulas sudoríparas da pele. A acumulação de
secreções pode levar à infecção e à fistulizacção por razões desconhecidas.
Distingue-se de outras patologias por só apresentar orifícios externos
(e não internos ao nível do canal anal). O tratamento é cirúrgico fistulotomia.
Prolapso rectal
Caracteriza-se pela exteriorização completa do recto em toda a sua
espessura através do ânus.
Deve-se a uma conjugação de factores:
Mesossigmóide longo;
Fundo-de-saco de Douglas anormalmente profundo;
6 Não mencionadas na aula
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Esfíncter anal enfraquecido;
Defeitos no pavimento pélvico com afastamento dos músculos
levantadores do ânus.
Existe exteriorização completa transanal durante os esforços de
defecação. A invaginação recto-rectal, por sua vez, provoca uma sensação de
tenesmo que conduz à repetição do esforço defecatório que vai agravando
progressivamente a situação. A incontinência anal acompanha frequentemente o
quadro.
Nas fases iniciais o prolapso reduz espontaneamente ou é reduzido
manualmente após a defecação. Nas fases mais avançadas o prolapso
exterioriza-se com o doente em pé, ou encontra-se exteriorizado
permanentemente.
O tratamento é cirúrgico:
Ressecção e anastomose colo-rectal;
Rectopexia (fixação do recto ao sacro);
Encerramento parcial do ânus.