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EFEITO DA ADAPTAÇÃO DA RELAÇÃO FLUXO-VELOCIDADE EM ESTIMATIVAS DO NÍVEL DE SERVIÇO DE RODOVIAS DE PISTA DUPLA NO ESTADO DE SÃO PAULO Gustavo Riente de Andrade José Reynaldo Setti Universidade de São Paulo Escola de Engenharia de São Carlos RESUMO Com o avanço do uso de tecnologia na coleta de dados nas rodovias paulistas, tornou-se possível a obtenção automática de amostras representativas de observações da corrente de tráfego. Com isso, foram criadas condições para a criação de um modelo matemático para a relação fluxo-velocidade em autoestradas e rodovias de pista dupla no estado de São Paulo, que poderia substituir o usado pelo Highway Capacity Manual – HCM e, possivelmente, melhorar a fidelidade das estimativas de nível de serviço para essa classe de rodovias. O modelo fluxo-velocidade proposto foi criado a partir de mais de 730 mil observações de fluxo e velocidade média da corrente de tráfego, coletadas em 25 estações em quatro rodovias paulistas. Esses dados de tráfego são estratificados por faixa de rolamento e tipo de veículo (automóveis e veículos pesados). Não foram encontradas diferenças significativas entre os modelos para autoestradas e rodovias de pista dupla; no entanto, foram observadas diferenças significativas entre os modelos para trechos urbanos e rurais. Assim sendo, foram propostos dois conjuntos de modelos fluxo-velocidade: um para trechos urbanos e outro para trechos rurais. Nos modelos propostos, verifica-se que o segmento convexo da curva fluxo-velocidade inicia-se com fluxos de tráfego menores que os observados no modelo do HCM 2010, especialmente nos modelos para rodovias em áreas urbanas. Não se observou diferença significativa entre as capacidades nos dois modelos, mas a velocidade na capacidade é mais alta no modelo proposto, se comparada à do modelo do HCM 2010. Os impactos da adoção do modelo proposto, em termos do nível de serviço, foram estudados comparando-se os valores do nível de serviço obtidos com o modelo original do HCM 2010 e com o modelo fluxo-velocidade proposto para um conjunto de trechos de rodovias localizados em zonas rurais e zonas urbanas. Palavras-chave: Autoestradas; Rodovias de pista dupla; HCM; Capacidade; Relação fluxo-velocidade. 1. INTRODUÇÃO A necessidade de padronização e a facilidade da compreensão do conceito de nível de serviço, tanto por técnicos quanto tomadores de decisão, conduziu ao estabelecimento do Highway Capacity Manual – HCM como norma técnica em várias partes do mundo. No Brasil, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte – DNIT preconiza a adoção do HCM para a avaliação, em estudos de tráfego, do cenário existente e o benefício gerado com a introdução de obras de melhoramento (DNIT, 2006). Para as rodovias concedidas paulistas, a Agência Reguladora de Transporte do Estado de São Paulo (ARTESP), considerando que a monitoração da condição operacional é parte do serviço delegado à iniciativa privada, determina como obrigatória a utilização do HCM para verificação do atendimento a padrões de desempenho operacional (ARTESP, 2004), devendo ser implantadas obras de aumento de capacidade caso o nível de serviço na hora de projeto seja pior do que o limite estabelecido nos contratos de concessão. No entanto, o HCM foi desenvolvido a partir de dados oriundos de rodovias distribuídas pelo território norte-americano e deve ser adaptado às condições locais de cada região na qual for utilizado (TRB, 2010). Trata-se de uma necessidade frequentemente percebida pelos profissionais do setor de transportes do Brasil, sendo que na última década, vários órgãos e autores vêm recomendando a adaptação do HCM às condições das rodovias do país (Demarchi, 2000; Egami e Setti, 2006; DNIT, 2006, p. 263; Andrade et al., 2008; Setti, 2009;

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EFEITO DA ADAPTAÇÃO DA RELAÇÃO FLUXO-VELOCIDADE EM ESTIMATIVAS DO NÍVEL DE SERVIÇO DE RODOVIAS DE PISTA DUPLA NO

ESTADO DE SÃO PAULO

Gustavo Riente de Andrade José Reynaldo Setti

Universidade de São Paulo Escola de Engenharia de São Carlos

RESUMO Com o avanço do uso de tecnologia na coleta de dados nas rodovias paulistas, tornou-se possível a obtenção automática de amostras representativas de observações da corrente de tráfego. Com isso, foram criadas condições para a criação de um modelo matemático para a relação fluxo-velocidade em autoestradas e rodovias de pista dupla no estado de São Paulo, que poderia substituir o usado pelo Highway Capacity Manual – HCM e, possivelmente, melhorar a fidelidade das estimativas de nível de serviço para essa classe de rodovias. O modelo fluxo-velocidade proposto foi criado a partir de mais de 730 mil observações de fluxo e velocidade média da corrente de tráfego, coletadas em 25 estações em quatro rodovias paulistas. Esses dados de tráfego são estratificados por faixa de rolamento e tipo de veículo (automóveis e veículos pesados). Não foram encontradas diferenças significativas entre os modelos para autoestradas e rodovias de pista dupla; no entanto, foram observadas diferenças significativas entre os modelos para trechos urbanos e rurais. Assim sendo, foram propostos dois conjuntos de modelos fluxo-velocidade: um para trechos urbanos e outro para trechos rurais. Nos modelos propostos, verifica-se que o segmento convexo da curva fluxo-velocidade inicia-se com fluxos de tráfego menores que os observados no modelo do HCM 2010, especialmente nos modelos para rodovias em áreas urbanas. Não se observou diferença significativa entre as capacidades nos dois modelos, mas a velocidade na capacidade é mais alta no modelo proposto, se comparada à do modelo do HCM 2010. Os impactos da adoção do modelo proposto, em termos do nível de serviço, foram estudados comparando-se os valores do nível de serviço obtidos com o modelo original do HCM 2010 e com o modelo fluxo-velocidade proposto para um conjunto de trechos de rodovias localizados em zonas rurais e zonas urbanas. Palavras-chave: Autoestradas; Rodovias de pista dupla; HCM; Capacidade; Relação fluxo-velocidade. 1. INTRODUÇÃO A necessidade de padronização e a facilidade da compreensão do conceito de nível de serviço, tanto por técnicos quanto tomadores de decisão, conduziu ao estabelecimento do Highway

Capacity Manual – HCM como norma técnica em várias partes do mundo. No Brasil, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte – DNIT preconiza a adoção do HCM para a avaliação, em estudos de tráfego, do cenário existente e o benefício gerado com a introdução de obras de melhoramento (DNIT, 2006). Para as rodovias concedidas paulistas, a Agência Reguladora de Transporte do Estado de São Paulo (ARTESP), considerando que a monitoração da condição operacional é parte do serviço delegado à iniciativa privada, determina como obrigatória a utilização do HCM para verificação do atendimento a padrões de desempenho operacional (ARTESP, 2004), devendo ser implantadas obras de aumento de capacidade caso o nível de serviço na hora de projeto seja pior do que o limite estabelecido nos contratos de concessão. No entanto, o HCM foi desenvolvido a partir de dados oriundos de rodovias distribuídas pelo território norte-americano e deve ser adaptado às condições locais de cada região na qual for utilizado (TRB, 2010). Trata-se de uma necessidade frequentemente percebida pelos profissionais do setor de transportes do Brasil, sendo que na última década, vários órgãos e autores vêm recomendando a adaptação do HCM às condições das rodovias do país (Demarchi, 2000; Egami e Setti, 2006; DNIT, 2006, p. 263; Andrade et al., 2008; Setti, 2009;

Andrade et al., 2011). Dentre os aspectos a serem considerados em uma adaptação do HCM ao ambiente viário brasileiro, incluem-se a definição das condições base em rodovias em termos de infraestrutura e tráfego, seguido pela determinação da capacidade de tráfego nessas condições e relação entre fluxo e velocidade (Setti, 2009). Modelos que relacionam fluxo e velocidade também estão presentes em diversas aplicações em Engenharia de Transportes, como exemplificado a seguir. Na esfera dos estudos de demanda, essa relação é empregada por métodos de alocação de tráfego para o ajuste de funções de atraso, que definem o incremento das impedâncias relacionadas a cada rota possível em função de aumentos no volume de tráfego (CALIPER, 2008). O modelo Highway

Development and Management 4, por sua vez, emprega funções de atraso para a estimativa de custos operacionais veiculares, usados em avaliações econômicas de projetos, programas e estratégias de investimento em rodovias (Odoki e Kerali, 2006). Por fim, observações empíricas de fluxo e velocidade podem ser usadas para calibrar simuladores microscópicos de tráfego, de modo a garantir que os resultados produzidos pelos microssimuladores se ajustem aos parâmetros macroscópicos que podem ser observados em campo (Van Aerde e Rakha, 1995). A calibração da relação fluxo-velocidade requer dados empíricos, que contenham observações de fluxo e velocidade desagregadas entre veículos leves e pesados, para trechos rodoviários com condições variadas. Nesse sentido, um dos aspectos decorrentes da consolidação dos programas de concessão de rodovias no Brasil foi a sistematização de procedimentos de coleta de dados de tráfego, normalmente com o uso de laços indutivos, suportados por softwares usados para a organização e tratamento dos dados brutos coletados pelos sensores. Isso possibilitou desenvolver este estudo, que se baseou em uma base de dados constituída por 788.122 observações válidas, coletadas em 25 estações fixas em quatro rodovias paulistas. A meta da pesquisa aqui relatada foi produzir um conjunto de curvas fluxo-velocidade que possam substituir as do HCM, bem como obter valores representativos para a capacidade em rodovias de pista dupla e autoestradas brasileiras. Para isso, os seguintes objetivos específicos foram estabelecidos:

� verificar a adequabilidade da classificação apresentada pelo HCM, entre autoestradas (freeways) e demais rodovias de pista dupla (multilane highways), para as rodovias paulistas;

� propor modelos representativos para a capacidade de tráfego e a relação fluxo-velocidade em rodovias paulistas, a partir dos dados disponíveis; e

� estudar os impactos da adoção do modelo proposto, em termos do nível de serviço, comparando-se os valores obtidos com o modelo original do HCM 2010 e com o modelo fluxo-velocidade proposto, para um conjunto de trechos de rodovias localizados em zonas rurais e zonas urbanas.

2. MODELO FLUXO-VELOCIDADE DO HCM Segundo o HCM, a qualidade da viagem como percebida pelos usuários é caracterizada por meio de seis níveis de serviço, que constituem uma medida quantitativa e qualitativa da condição da corrente de tráfego em uma dada via, considerando fatores tais como velocidade, tempo de viagem, liberdade de manobra, interrupções de tráfego, conforto e conveniência (TRB, 2010). Medidas de desempenho permitem relacionar os níveis de serviço com

parâmetros operacionais que possam ser observados em campo. Para rodovias de pista dupla e autoestradas, a medida de desempenho usada é a densidade do tráfego. A estimativa do nível de serviço é feita a partir de curvas fluxo-velocidade calibradas com base em dados empíricos. Os modelos fluxo-velocidade usados nas diversas versões do HCM são descritos a seguir. 2.1. Evolução do modelo fluxo-velocidade do HCM A Figura 1Error! Reference source not found. mostra a evolução da relação entre fluxo e velocidade ao longo das edições do HCM, tomando como exemplo uma curva para velocidade inicial próxima a 60 milhas/h, conforme o sistema de unidades usado pelo HCM.

Figura 1: Evolução da relação fluxo-velocidade em autoestradas ao longo das edições do HCM

A primeira edição do manual, de 1950, não continha quantidade significativa de material sobre trechos rodoviários de fluxo não interrompido. Apenas na segunda edição (HRB, 1965), a primeira desenvolvida sob orientação do Highway Capacity and Quality of Service

Committee (HCQSC), foram apresentadas as características fundamentais e métodos de análise para autoestradas e rodovias de pista dupla, incluindo as primeiras curvas fluxo-velocidade (Roess, 2011a), que eram baseadas na velocidade de projeto da via. A partir da terceira versão do HCM, publicada em 1985 e revisada em 1994 (TRB, 1994) as curvas fluxo-velocidade passaram a ser baseadas na velocidade de fluxo livre (FFS), ao invés da velocidade de projeto. O conceito de FFS ganhou ainda maior importância a partir das conclusões de diversos estudos empreendidos entre o fim da década de 1980 e princípio da década de 1990, que mostraram que há um significativo intervalo de fluxos de tráfego no qual a velocidade média dos automóveis se mantém virtualmente equivalente à FFS (Hall e Agyemang-Duah, 1991; Urbanik II et al., 1991; Banks, 1990; Persaud e Hurdle, 1988; Hall e Hall, 1990; Chin e May, 1991). Tal premissa se mantém até a edição atual (TRB, 2010). A partir do conhecimento da existência e relevância desse patamar de velocidades, o projeto de pesquisa conduzido por Schoen et al. (1995) concentrou seus esforços na determinação, para cada curva fluxo-velocidade, dos fluxos de tráfego correspondentes aos pontos de transição (BP) a partir dos quais a velocidade média começa a declinar com o aumento do fluxo. Esse trabalho, que também investigou valores para a capacidade e velocidade na

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HCM 2010

capacidade, subsidiou a elaboração da quarta edição do HCM, publicada em 2000 (TRB, 2000). No HCM 2000, os valores adotados para a capacidade são médias dos maiores fluxos observados nos trechos estudados, que estão distribuídos por todo o território dos Estados Unidos. O HCM 2000 originalmente apresentava curvas fluxo-velocidade para autoestradas com velocidade de fluxo-livre variando entre 80 e 110 km/h. Com o aumento do limite legal de velocidade nos EUA, foi sentida a necessidade da existência de uma nova curva, de 120 km/h. Essa nova curva foi formada a partir de uma extrapolação das existentes, sem que um novo estudo fosse realizado, sendo sua capacidade estabelecida como 2.400 cp/(h.faixa), próxima à capacidade para a curva de 110 km/h (Roess, 2011a). Para a elaboração do HCM 2010, foi realizado um estudo para a recalibração da curva fluxo-velocidade de 120 km/h em autoestradas (Roess, 2009b), que exigiu a coleta de dados para uma ampla faixa de velocidades de fluxo livre. Com isso, todo o conjunto de curvas pôde ser reavaliado (Roess, 2011b). O modelo para rodovias de pista dupla foi mantido inalterado em relação ao usado no HCM 2000, por falta de recursos para financiar os estudos necessários para sua substituição. As curvas fluxo-velocidade produzidas para o HCM 2010 (Roess, 2009b) mantiveram a abordagem usada pelo HCM 2000, sofrendo apenas pequenas alterações no formato. Foi decidido que não havia evidência suficiente que justificasse a alteração dos valores adotados no HCM 2000 para a capacidade C e velocidade na capacidade CS (Roess, 2011a). A principal alteração na edição de 2010 do manual se deu nos valores atribuídos ao ponto em que a velocidade da corrente começa a decrescer (BP). A análise dos dados sugeriu que a porção das curvas na qual a velocidade é constante e igual à de fluxo livre seria mais curta do que o indicado pelo HCM 2000, sendo os valores da taxa de fluxo correspondentes a esse ponto apresentados pelo HCM 2010 inferiores aos usados na edição anterior. Como resultado desse processo, a edição do HCM de 2010 (TRB, 2010) apresenta curvas fluxo-velocidade para autoestradas com FFS entre 120 km/h e 90 km/h e para rodovias de pista dupla com FFS entre 100 km/h e 70 km/h, representativas de uma ampla gama de características físicas e operacionais. A Figura 2 mostra as curvas do HCM 2010 para os dois tipos de via, em unidades do SI. O fluxo de tráfego é expresso em carros de passeio, de forma que os veículos pesados devem ser convertidos para automóveis, com o uso de fatores de equivalência. Da mesma forma, a velocidade apresentada corresponde à velocidade média dos automóveis. Com relação à estrutura lógica do conjunto de curvas como um todo, percebe-se que os valores estabelecidos para a capacidade C são linearmente crescentes em função da velocidade de fluxo livre FFS, visto que a densidade na capacidade é admitida constante. O inverso ocorre com relação aos pontos de quebra BP, para as autoestradas. Para as rodovias de pista dupla, BP foi considerado constante para todas as curvas (1.400 cp/(h.faixa)). Em ambos os casos, o caráter linear da relação BP-FFS se mantêm. Por fim, vale destacar que a porção das curvas que liga BP a C são sempre de forma convexa, mantendo uma transição suave com a porção de velocidade constante.

(a) Autoestradas (freeways) (b) Rodovias de pista dupla (multilane highways)

Figura 2: Curvas fluxo-velocidade do HCM 2010 para: (a) autoestradas; (b) rodovias de pista dupla (TRB, 2010)

2.2. Considerações quanto à calibração do modelo do HCM Uma das dificuldades enfrentadas quando da condução dos estudos que subsidiaram a elaboração do HCM 2010 (Roess, 2009) foi a insuficiência de recursos para a revisão do modelo do HCM 2000 para rodovias de pista dupla. De forma a manter a coerência do método do manual como um todo, os pesquisadores não podiam aceitar, para as autoestradas, um modelo que levasse ao estabelecimento de velocidades médias inferiores às obtidas pelo modelo de rodovias de pista dupla, para um mesmo fluxo de tráfego e velocidade de fluxo livre. Dessa forma, foi recomendada, para estudos futuros, a calibração simultânea de curvas para autoestradas e rodovias de pista dupla (Roess, 2011b). Outra observação se refere ao método de calibração usado. Embora análises usadas, baseadas em regressão tenham produzido ajustes razoáveis individualmente, as curvas assim obtidas não formaram inicialmente um “conjunto de aspecto coerente” quando vistas juntas. Assim, o modelo final foi ajustado visualmente, sendo indicado que estudos futuros para a calibração da capacidade e relação fluxo-velocidade abordem simultaneamente todo o conjunto de curvas. A partir da análise dos modelos mostrados na Figura 2, percebeu-se que a porção curva da relação fluxo-velocidade consiste, de fato, em modelos matemáticos ancorados nos pontos notáveis das curvas: o ponto de transição BP e a densidade na capacidade CD, que é a razão entre a capacidade C e a velocidade na capacidade CS (Roess, 2011b). Dessa forma, neste trabalho faz-se a obtenção de curvas fluxo-velocidade a partir da estimativa de valores de BP e CD, conforme descrito na parte 4 deste texto. 3. CLASSIFICAÇÃO DOS TRECHOS ESTUDADOS Inicialmente, foi desenvolvido e aplicado um método para a caracterização e seleção de trechos adequados à coleta dos dados necessários ao estudo (Andrade e Setti, 2011). Das 76 estações inicialmente disponíveis, 25 se mostraram compatíveis com os objetivos do estudo. Desta amostra, catorze trechos consistem em autoestradas rurais e quatro em autoestradas urbanas. Com relação às rodovias de pista dupla convencionais, três se situam em área urbana e outras quatro em zona rural. No total, foram obtidas mais de 730.000 observações, tendo a velocidade de fluxo livre FFS variado aproximadamente entre 80 e 120 km/h, embora não

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Fluxo de tráfego (cp/(h.faixa))

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tenha se verificado nenhuma estação com FFS próxima a 90 km/h. Com relação ao emprego dos dados coletados, neste trabalho optou-se por focar a análise na faixa mais à esquerda, na qual a corrente é composta majoritariamente por automóveis e é menor o efeito dos veículos pesados. Além disso, foram eliminadas todas as observações nas quais o percentual de veículos pesados PT era maior do que 5%. Pontos com PT entre 0 e 5 % foram mantidos, de forma a evitar a diminuição exagerada da amostra, especialmente em momentos de maior fluxo de tráfego (Bessa Júnior, 2009). Nesses casos, foram aplicados os fatores de equivalência propostos por Cunha e Setti (2009), que foram calculados a partir de dados da frota do estado de São Paulo. Em uma primeira análise sobre os dados de fluxo e velocidade disponíveis, foi obtido o número de observações a intervalos de 50 cp/(h.faixa), para toda a gama de fluxos observados. Em seguida, para os intervalos com mais de 10 observações, foram calculadas as médias e medianas das velocidades medidas. Os resultados obtidos a partir desse procedimento foram representados por meio de gráficos (Figura 3), nos quais são mostradas as observações de fluxo e velocidade e as médias das velocidades a cada intervalo de 50 cp/(h.faixa).

(a) Autoestrada rural (b) Autoestrada urbana

(c) Rodovia de pista dupla rural (d) Rodovia de pista dupla urbana

Figura 3: Exemplos de dados coletados em autoestradas em zona rural e urbana

A comparação visual desses gráficos sugere que a divisão adotada pelo HCM entre autoestradas e rodovias de pista dupla pode não se a ideal para as rodovias estudadas. No entanto, nota-se uma divergência entre as observações de fluxo e velocidade para as rodovias em áreas urbanas e as rodovias em zonas rurais. A Figura 3 (a) e (b) mostra dados obtidos em autoestradas, com características físicas semelhantes: terreno plano; ausência de curvas

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Fluxo de tráfego (cp/(h.faixa))

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acentuadas; três ou mais faixas por sentido; sem restrição de velocidade; e fora do efeito de acessos à montante ou à jusante. A Figura 3 (a) mostra dados coletados em um trecho rural que, mesmo servindo a elevados volumes de tráfego, mantém velocidades médias acima de 100 km/h por um amplo intervalo de fluxos de tráfego. A Figura 3 (b) mostra dados de um trecho urbanizado. É possível notar uma queda mais precoce e mais acentuada na velocidade média dos automóveis, quando comparado com o trecho rural. A capacidade do trecho urbano também parece ser menor. O gráficos (c) e (d), por outro lado, comparam trechos de rodovias de pista dupla convencionais em áreas rurais e urbanas. No primeiro caso, as velocidades se mantém constantes até um fluxo de tráfego próximo a 1.000 cp./(h.faixa), enquanto que no segundo caso, percebe-se uma redução para um fluxo de aproximadamente 750 cp/(h.faixa). 4. CAPACIDADE E RELAÇÃO FLUXO-VELOCIDADE A seguir, são explicados os métodos usados para se estabelecer os limites das curvas fluxo-velocidade, que consistem em: (1) o ponto de transição BP, que define o ponto a partir do qual a velocidade média da corrente de tráfego decresce com o aumento do fluxo; e (2) a capacidade e a densidade máxima em condições de fluxo não congestionado, que corresponde ao limite final das curvas fluxo-velocidade. 4.1. Capacidade e densidade na capacidade Neste estudo, a determinação da capacidade foi feita através da aplicação de um método baseado na identificação dos fluxos e velocidades que causam o colapso (breakdown) da corrente de tráfego (Brilon et al., 2005; Washburn et al., 2010). A partir dos fluxos e velocidades na capacidade, é derivada a densidade. O conceito de colapso da corrente de tráfego pode ser definido como a transição entre um padrão operacional adequado e condições de fluxo congestionado (Brilon et al., 2005). Em autoestradas, esse fenômeno pode ser identificado quando a velocidade média da corrente de tráfego repentinamente cai abaixo de um valor considerado “aceitável”. Sob essa premissa, a capacidade pode ser definida como o fluxo máximo que pode ser atingido antes que ocorra o colapso do sistema. Este fenômeno intrinsicamente apresenta natureza estocástica. O método usado foi originalmente desenvolvido baseado em uma analogia com análises de ciclo de vida e confiabilidade, usando para a estimativa da função de sobrevivência o método estatístico de Kaplan e Meier (1958), “Product Limit Method” (PLM). Em essência, essa abordagem compara a previsão do fim da vida útil de um produto em função do tempo de uso com o atingimento da capacidade em uma via, em função do volume de tráfego. Para aplicar o método proposto, é necessário dispor de observações para intervalos curtos de tempo, normalmente variando de cinco a quinze minutos. Dispondo da base de dados tratados e ordenados cronologicamente, as observações foram inicialmente classificadas segundo o regime de tráfego: {C} congestionado; {F} não congestionado; e {B} de transição, correspondente a momentos no qual ocorreu o colapso da corrente de tráfego. No método estatístico PLM, cada um desses grupos fornece informações diferentes quanto aos possíveis volumes de tráfego que causam o colapso da corrente de tráfego, tomados como possíveis valores para a capacidade. A partir da técnica PLM e dos dados classificados em grupos, foi possível estimar as

probabilidades de colapso em função dos volumes de tráfego referentes aos dados do grupo {B}, sendo a distribuição completa de probabilidade de colapso modelada conforme a distribuição de Weibull, como sugerido pela literatura (Brilon et al., 2005; Washburn et al., 2010). Destaca-se que, nesta abordagem, a capacidade da via não é determinística, mas varia segundo a distribuição de Weibull, de forma estocástica. No entanto, para a montagem de um manual de capacidade que possa ser usado como norma técnica, é necessário estabelecer uma probabilidade máxima de colapso admissível, sendo o fluxo de tráfego relacionado a tal percentual determinado como a capacidade teórica do trecho. Nesse sentido, para rodovias alemãs, a diretriz fornecida por Geistefeldt (2008) sugere adotar o 3º percentil da distribuição de probabilidades. Isso significa que é estabelecido como valor representativo da capacidade um fluxo no qual a probabilidade de colapso é de 3%. Em um estudo mais amplo, Washburn et al. (2010) compararam três métodos para a definição da capacidade em rodovias dos EUA, recomendando que o 4º percentil da distribuição de Weibull pode produzir estimativas razoáveis da capacidade em um trecho. Assim, neste estudo, optou-se por utilizar o valor de 4% para a probabilidade de colapso como regra geral. O método descrito foi aplicado nos dados disponíveis, incluindo trechos rurais e urbanos. A Figura 3 mostra um exemplo contendo a distribuição de Weibull calibrada sobre os pontos obtidos através do modelo PLM. O fluxo correspondente ao 4º percentil é de 2.250 cp/(h.faixa) e a velocidade média nessa condição, 90 km/h. Após a aplicação do método, verificou-se que, para rampas inferiores a 4%, os valores obtidos para a capacidade C variaram entre 2000 e 2500 cp/h/faixa, aproximadamente, sendo a densidade na capacidade CD próxima à 27 cp/(km.faixa), tanto para as rodovias rurais quanto urbanas. Trata-se de valores próximos aos limites apresentados pelo HCM 2010 para autoestradas e rodovias de pista dupla, no qual CD varia entre 25 e 28 cp/(km.faixa).

Figura 4: Exemplo de resultados obtidos com o Modelo PLM e distribuição de Weibull

4.2. Ponto de transição BP Neste item, buscou-se testar o método usado na elaboração do HCM 2010 para a definição do ponto de transição BP (Roess, 2011) sob uma nova ótica, tendo sido aplicada a abordagem originalmente usada em dados agregados de vários locais para cada ponto de coleta individualmente, analisando-se os resultados posteriormente.

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100

110

120

130

140

0 500 1000 1500 2000 2500 3000

Ve

loc

ida

de

do

s a

uto

ve

is (

km

/h)

Fluxo de tráfego (cp/(h.faixa))

PLM

Weibull

Observações

1

2-4

4-10

10-27

≥ 27

A premissa básica da abordagem proposta é a de se avaliar o desvio padrão das velocidades médias em torno da velocidade de fluxo livre (σ), sendo BP definido no ponto no qual σ aumenta consideravelmente. Roess (2011) obteve BP a partir da observação dos gráficos das relações entre o fluxo de tráfego e σ. Neste trabalho, para automatizar a análise e estabelecer um critério objetivo para a determinação de BP, optou-se por ajustar um polinômio do terceiro grau para a relação fluxo-σ. Esse polinômio, dentre as funções testadas, produziu o melhor ajuste, medido através do R2. Para cada ponto de coleta, considerou-se como o ponto de transição BP, o fluxo a partir do qual a derivada do polinômio se torna positiva, denotando o princípio do aumento no desvio padrão σ em torno de FFS. Após a aplicação do método aos 25 pontos de coleta selecionados, verificou-se que os pontos de transição ocorrem tipicamente em fluxos maiores para as rodovias rurais, quando comparadas às rodovias urbanas, como mostrado na Figura 5. Além disso, como no modelo do HCM 2010 de autoestradas (freeways), foi identificada uma tendência de diminuição de BP com o aumento de FFS, tanto para rodovias rurais como urbanas. (a) Autoestrada rural (SP-280, km 59,6 leste) (b) Autoestrada urbana (SP-280,km 29,5 leste)

Figura 5: BP e desvio padrão da velocidade em torno de FFS – SP-280, km 59,6 leste

Nos dois casos, os valores encontrados foram significativamente inferiores aos apresentados pelo HCM 2010. Essa conclusão corrobora os estudos que subsidiaram a versão atual do manual americano, que mostraram que embora a porção de velocidade constante do modelo fluxo-velocidade exista de fato, ela não se estende tanto quanto se acreditava (Roess, 2011), de modo que o HCM 2010 apresenta valores de BP menores para autoestradas do que o HCM 2000. 4.3. Relação fluxo-velocidade Após o estabelecimento dos limites para a porção convexa do modelo fluxo-velocidade, como mostrado nos itens anteriores, procedeu-se para a calibração das curvas. Sendo BP e CD fixos, a premissa básica do método usado para a calibração do modelo fluxo-velocidade consistiu na minimização do erro total em relação às observações, considerando todas as estações de coleta simultaneamente. Para resolver o problema proposto, foi empregado um algoritmo de otimização não linear (GRG – Generalized Reduced Gradient), cujo objetivo é a minimização do quadrado dos erros entre a velocidade prevista pelo modelo proposto e as medianas das observações, para cada um dos intervalos de 50 cp/(h.faixa), calculados no item 3.

σ (

km

/h)

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

110

120

130

140

0 500 1000 1500 2000 2500 3000

Velo

cid

ad

e d

os

au

tom

óve

is (

km

/h)

Fluxo de tráfego (cp/(h.faixa))

Observações

1

2-5

5-12

12-22

≥ 22

σ (

km

/h)

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

110

120

130

140

0 500 1000 1500 2000 2500 3000

Velo

cid

ad

e d

os

au

tom

óve

is (

km

/h)

Fluxo de tráfego (cp/(h.faixa))

Observações

1

2

3

4-8

≥ 8

BP

σ

Polinômio (σ)

BP

σ

Polinômio (σ)

A Figura 6(a) mostra o conjunto de curvas obtido para rodovias rurais, enquanto a Figura 6 (b) mostra as curvas obtidas para rodovias urbanas, considerando-se os limites estabelecidos anteriormente. A velocidade de fluxo livre FFS de cada curva corresponde à velocidade na origem (fluxo igual a 0), em cada caso. Como a base de dados disponível não continha trechos com FFS igual ou próxima a 90 km/h, a curva de 90 km/h mostrada na Figura 6 (a) consiste em uma extrapolação, enquanto que a curva para 90 km/h foi interpolada na Figura 6 (b). (a) Rodovias rurais (b) Rodovias urbanas

Figura 6: Curvas fluxo-velocidade propostas

A Tabela 1 e a Tabela 2 resumem a comparação entre os dois conjuntos propostos e os modelos usados pelo HCM 2010. A comparação das curvas propostas indica que a velocidade média da corrente de tráfego nas rodovias urbanas apresenta uma queda mais precoce e acentuada do que a observada nas correntes de tráfego em rodovias rurais. Além disso, os valores estimados para a capacidade C e para a velocidade na capacidade CS para as rodovias urbanas são sistematicamente inferiores aos estimados para as rodovias rurais.

Tabela 1: Valores estimados com o modelo proposto para rodovias rurais e freeways (HCM 2010)

FFS (km/h)

Ponto de transição BP (cp/h) Capacidade C (cp/h) Velocidade na capacidade

CS (km/h)

Estimado HCM 2010 Estimado HCM 2010 Estimado HCM 2010

120 600 1.000 2.550 2.400 94 86 110 700 1.200 2.450 2.350 91 84 100 800 1.400 2.350 2.300 87 82 90 900 1.600 2.250 2.250 83 80

Tabela 2: Valores estimados com o modelo proposto para rodovias urbanas e multilane highways (HCM 2010)

FFS (km/h)

Ponto de transição BP (cp/h) Capacidade C (cp/h) Velocidade na capacidade

CS (km/h)

Estimado HCM 2010 Estimado HCM 2010 Estimado HCM 2010

110 500 - 2.300 - 90 - 100 500 1.400 2.150 2.200 84 88 90 500 1.400 2.000 2.100 78 81 80 500 1.400 1.850 2.000 72 74

5. IMPACTO DO MODELO PROPOSTO NAS RODOVIAS PAULISTAS Na etapa final deste trabalho, foram comparados os níveis de serviço estimados usando o modelo proposto e o adotado pelo HCM. Para cada um dos 237 intervalos simulados de fluxo

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

110

120

130

0 400 800 1.200 1.600 2.000 2.400

Ve

loc

ida

de

do

s a

uto

ve

is (

km

/h)

Fluxo de tráfego (cp/(h.faixa))

Ponto de transição

D = 27 cp/km/faixa

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

110

120

130

0 400 800 1.200 1.600 2.000 2.400V

elo

cid

ad

e m

éd

ia d

os a

uto

ve

is (

km

/h)

Fluxo de tráfego (cp/(h.faixa))

Ponto de transição

D = 27 cp/km/faixa

de tráfego em rodovias urbanas e para os 720 intervalos em rodovias rurais, o nível de serviço hipotético foi estimado diretamente a partir dos dados coletados, conforme a prática adotada nas rodovias concedidas do estado de São Paulo (ARTESP, 2004). Para tanto, a cada intervalo, foi calculada a densidade média da corrente de tráfego, através da expressão D = v/S, considerando-se S como a mediana das velocidades médias observadas e v, o ponto médio do intervalo de fluxos. A partir da densidade, foi determinado o nível de serviço, segundo o critério do HCM 2010. Este nível de serviço foi admitido como o nível de serviço que efetivamente existia na rodovia (“real”). Um procedimento semelhante foi aplicado, considerando porém as velocidades estimadas pelo modelo proposto e pelo usado no HCM. Os níveis de serviço estimados usando cada modelo foram comparados ao nível de serviço real. A Figura 7 resume a comparação em função do tipo de rodovia. Para rodovias rurais, a estimativa feita pelo modelo calibrado foi igual ao nível de serviço “real” em 98% dos casos, enquanto que, para as estimativas do nível de serviço usando o modelo do HCM 2010, somente em 92% dos casos houve a coincidência. Para rodovias urbanas, a diferença foi maior: 96% para o modelo proposto e 86% para o modelo do HCM 2010, respectivamente.

Figura 7: Níveis de acerto das estimativas de nível de serviço do modelo proposto e do modelo do HCM 2010

Na Tabela 3, é mostrada uma comparação entre o modelo proposto para rodovias rurais e o modelo do HCM 2010 para freeways, em termos de fluxos máximos de serviço, isto é, os fluxos de tráfego máximos, em carros de passeio, que podem ser atendido em cada nível de serviço. É possível notar que, de forma geral, os volumes de serviço são ligeiramente inferiores para o modelo proposto, com exceção dos níveis D e E das curvas de 120 e 110 km/h, para os quais a tolerância é maior para o modelo para rodovias rurais. A Tabela 4, por sua vez, compara o modelo proposto para rodovias urbanas e o modelo do HCM 2010 multilane highways. Neste caso, os fluxos máximos de serviço são sistematicamente inferiores para as rodovias urbanas, muito embora a diferença entre o modelo proposto e o apresentado pelo HCM não chegue a superar 150 cp/(h.faixa) e as capacidades sejam muito próxima entre si.

92%86%

98% 96%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

Rodovias rurais Rodovias urbanas

Taxa d

e C

oin

cid

ên

cia

Modelo do HCM 2010 Modelo proposto

Tabela 3: Fluxos máximos de serviço com o modelo proposto para rodovias rurais e o freeways (HCM 2010)

Proposto – Rodovias Rurais (cp/(h.faixa)) HCM 2010 – Freeways (cp/(h.faixa))

FFS 120 110 100 90 120 110 100 90

A 830 770 700 630 840 770 700 630 B 1260 1180 1080 980 1300 1210 1100 990 C 1730 1630 1530 1410 1750 1680 1580 1440 D 2210 2110 2000 1880 2140 2080 2010 1920 E 2550 2450 2350 2250 2400 2350 2300 2250

Tabela 4: Fluxos máximos de serviço com o modelo para rodovias urbanas e multilane highways (HCM 2010)

Proposto Rodovias Urbanas (cp/(h.faixa)) HCM 2010 – Multilane Highways (cp/(h.faixa))

FFS 110 100 90 80 100 90 80 70

A 750 690 620 560 700 630 560 490 B 1130 1040 950 860 1100 990 880 770 C 1550 1440 1320 1200 1570 1430 1280 1120 D 1980 1850 1710 1570 2010 1860 1700 1530 E 2300 2150 2000 1850 2200 2100 2000 1900

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste estudo, adotou-se uma abordagem baseada na calibração do modelo fluxo-velocidade como um todo, usando simultaneamente trechos de autoestradas e rodovias de pista dupla. Em uma primeira análise sobre os dados tratados, foi observado que a forma de classificação proposta pelo HCM, entre autoestradas (freeways) e rodovias de pista dupla convencionais (multilane highways) pode não fazer sentido para as rodovias estudadas. Alternativamente, verificou-se diferença operacional entre: (1) as vias rurais, isoladas do sistema viário local e que servem ao tráfego tipicamente rodoviário; e (2) as rodovias urbanas, nas quais os acessos, controlados ou não, são mais frequentes e cujo tráfego é composto por uma significativa parcela de viagens locais. Para esses dois conjuntos, foram investigados valores para a capacidade e calibradas curvas fluxo-velocidade, representativas de trechos com velocidade de fluxo livre entre 80 e 120 km/h, aproximadamente. Em seguida foram comparadas as estimativas de nível de serviço com o uso do modelo calibrado e do originalmente apresentado pelo HCM. Verificou-se que o modelo proposto estima corretamente o nível de serviço de rodovias rurais em 98% dos casos, enquanto que, para as estimativas usando o modelo do HCM 2010, em 92% dos casos houve a coincidência. Para rodovias urbanas, a diferença foi maior: 96% para o modelo proposto e 86% para o modelo do HCM 2010. Com relação ao impacto em termos de avaliação operacional, verificou-se que os níveis de serviço estimados com o uso do modelo proposto e o do HCM são próximos entre si, sendo os fluxos máximos de serviço ligeiramente inferiores com o uso do primeiro, de forma geral. No entanto, para as curvas de 120 e 110 km/h para rodovias rurais, a situação se inverte, sendo os fluxos máximo de serviço superiores para o modelo proposto. Em todos os casos, as capacidades são próximas entre si. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem o apoio da ARTESP e das concessionárias CCR RodoAnel, CCR ViaOeste e CCR AutoBan, que disponibilizaram os dados de tráfego. Os autores agradecem o apoio financeiro do CNPq, através de uma bolsa de mestrado e uma bolsa de produtividade em pesquisa, sem o qual esta pesquisa não poderia ter sido realizada.

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Gustavo Andrade de Andrade ([email protected]) Prof. Dr. José Reynaldo Setti ([email protected]) Departamento de Engenharia de Transportes, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo Av. Trabalhador São-Carlense, 400 – São Carlos, SP, Brasil