36 PRIMEIRO CADERNO CHINA E VATICANO Dois pastores, … · embora os Papas seguintes pareçam ter...

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Expresso, 25 de abril de 2014 36 PRIMEIRO CADERNO Perante a canonização de João Paulo II, o Papa Francisco mandou acelerar a de João XXIII, o homem do Concílio Vaticano II. Ambos serão santos a partir de amanhã Francisco impõe canonização de João XXIII Por um capricho da história, ou talvez dos homens, no domin- go vão ser canonizados João XXIII, o Papa que convocou o Concílio Vaticano II, e João Paulo II, o Papa que, segundo as críticas mais duras, não o aplicou. O acontecimento re- unirá em Roma quase um mi- lhão de peregrinos, delegações de mais de 60 países, 20 chefes de Estado e 24 primeiros-mi- nistros. A cidade organizou um dispositivo de segurança de mais 3500 agentes, 3000 voluntários e 75 ambulâncias. Não será uma apoteose, como aconteceu no funeral de Karol Wojtyla (João Paulo II), em 2005, quando todo o plane- ta se voltou para Roma, em ho- menagem ao Papa que mudou a história, colaborando ativa- mente no derrube do Muro de Berlim (1989), da União Sovié- tica e da divisão do mundo em zonas de influência. Foi o Papa que, pela primeira vez em tempos modernos, ór- fãos de líderes internacionais, deu à Igreja uma popularida- de mundial nunca vista. Em qualquer país do globo aquele Papa congregava milhões de cidadãos, como não conseguia nenhum líder político. Viajou por todas as nações do mundo, fosse junto dos in- dígenas da Papua Nova Guiné ou dos delegados da ONU, em Nova Iorque, para trans- mitir a mesma mensagem: sem valores éticos, sem Deus, não existe nenhuma sociedade. A parte principal da fes- ta deste fim de semana será para o primeiro Papa polaco da história, o primeiro Papa não-italiano em 400 anos, que os fiéis da Praça de São Pedro, no dia do seu enterro, queriam “santo subito”. Ao seu lado, a memória de João XXIII fica mais distante dos cidadãos contemporâneos. Apenas os 3000 bispos do Concílio Vaticano II (1963- 1965) pediram que Angelo Roncalli (João XXIII) fosse proclamado santo “por acla- mação”, mas o seu sucessor, Paulo VI, travou os ânimos e encaminhou o processo de canonização para o processo burocrático estabelecido. Des- de então passaram 50 anos, enquanto Wojtyla será santo apenas nove anos após a sua morte, coisa nunca vista. “Este processo está a avançar depres- da história. Não obstante, a mesma história mostra que a chamada “fábrica de santos” da Igreja Católica funciona à sua maneira e conforme o momento. João Paulo II, por exemplo, criou mais beatos (1345) e santos (482) do que to- dos os Papas anteriores juntos. O processo de canonização de Karol Wojtyla seguiu todas as etapas previstas. O de Ange- lo Roncalli não, porque o Papa Francisco o dispensou de fazer o milagre necessário para ser admitido como santo, o que muitos interpretam como uma indicação. É como se Francisco tivesse dito: “Querem que João Paulo II seja santo? Então, João XXIII também o será.” Depois do aparentemente insubstituível Pio XII que teve de gerir os imbróglios da II Guerra Mundial, os cardeais elegeram um Papa de transi- ção, Angelo Roncalli. Mas este sa demais”, lamentou o cardeal belga, Godfried Danneels. Uma fábrica de santos Os historiadores explicam que cada Papa é distinto, porque vive num momento diferente O Papa João XXIII VISTO DE PEQUIM ^ ^ Os^novos^líderes^da^China^ e^do^Vaticano^prometeram^ reduzir^a^pompa^e^combater^ os^desvios^éticos,^quando^não^ criminosos ^ ^ Tal^como^padres^católicos,^ também^houve^funcionários^ do^PCC^envolvidos^em^ transgressões^sexuais,^embora^ de^tipo^mais^convencional.^ Em^contrapartida,^os^seus^ desvarios^financeiros^vão^ muito^além^dos^imputados^ao^ clero^católico ^ ^ Promover^mais^abertura^na^ China^comporta^riscos^mas^o^ dilema^do^PCC^resume-se^^ a^enfrentar^um^problema^ grande^agora^ou^ver-se^diante^ de^um^problema^ainda^^ maior^no^futuro CHINA E VATICANO Dois pastores, duas revoluções Tirando Vladimir Putin e Ba- rack Obama, a agenda global é dominada, ainda que de forma diferente, por dois homens: Xi Jinping, novo presidente da China, e Jorge Mario Bergo- glio. Em março de 2013, um dia antes de Xi tomar posse, o jesuíta argentino tornou-se o Papa Francisco. Os dois fica- ram à frente dos destinos de uma imensa multidão de fiéis, cada qual representando mais de mil milhões de almas. E os paralelos não ficam por aqui. O Partido Comunista Chi- nês (PCC) e a Igreja Católica compartilham esquemas de organização semelhantes, com estruturas de poder de grande predomínio masculino. Ambos difundem ideologias ou siste- mas de crença de vocação ab- soluta, cujo sucesso é incerto numa sociedade onde a tendên- cia é haver cada vez menos en- tusiasmo por visões de mundo tão rígidas. Os novos líderes da China e do Vaticano prometeram de- dicar os seus mandatos à re- dução da pompa e ao combate aos desvios éticos, quando não criminosos, nas respetivas hie- rarquias. E também manifesta- ram vontade de combater glo- balmente a pobreza. Um ano de liderança é tempo mais do que suficiente para avaliar o desem- penho de ambos os ‘pastores’. Concretamente, estarão a con- seguir introduzir os ventos de mudança que há tanto tempo se faziam sentir nos bastidores? O Papa Francisco foi, à evi- dência, bem-sucedido em rom- per com práticas anteriores do Vaticano. Muitas das suas declarações públicas deixaram clara a intenção de impedir que a hierarquia da Igreja conti- nuasse a enveredar por maus caminhos, fechando-se sobre si própria, isolando-se dos fiéis e persistindo em atos conde- náveis. Estes, que não foram casos isolados, chegaram às manchetes dos jornais (apesar de campanhas para tentar si- lenciar as queixas) e incluíram, tanto crimes sexuais (nomea- damente com menores) como económicos. O Papa prometeu acabar com tudo isto. Ninguém questiona nem a sua sinceridade nem as suas intenções, mas que ho- mem se conseguirá impor à poderosa hierarquia do Vatica- no? Conhecida que é a tradição da Igreja nesta matéria, são de esperar duas coisas: grande resistência da parte dos que se envolveram ou deram co- bertura aos abusos, a começar pelo forte lóbi italiano dentro da cúria romana e forte inércia no sentido da manutenção do statu quo. Na verdade, o sis- tema em vigor satisfaz muita desta gente que, como tantos outros grupos ao longo da his- tória, pouco se preocupa com o destino de instituição a que pertence, muito menos com o além-túmulo. Nada mais curioso do que ve- rificar até que ponto esta análi- se pode ser extrapolada para a China. Como é igual o mundo, visto a partir da estrutura de poder do Partido Comunista da China! Também aqui se tenta preservar a situação vigente com base em poderes fáticos e num vasto sistema interno de ensino e disciplina. Tal como sucedeu com uma série de padres católicos, tam- bém houve funcionários do PCC envolvidos em transgres- sões sexuais, embora de tipo mais convencional. Em con- trapartida, os seus desvarios financeiros vão muito além dos imputados ao clero católico, mais não seja porque as opor- tunidades nesta área eram in- comparavelmente mais vastas. Há, portanto, motivos de so- bra para observar todos estes desenvolvimentos paralelos no eixo PCC-Vaticano. A questão é saber qual deles conseguirá reverter o curso dos aconteci- mentos, se é que algum real- mente o fará. Entretanto, muitos antigos fiéis afastaram-se para sem- pre dos ensinamentos das duas ‘igrejas’, seja por já não se reverem na sua missão ori- ginal, seja por descrerem da possibilidade de verdadeiras mudanças. Há indícios de que as revelações sobre a extrema riqueza das famílias dos líde- res chineses, feitas pelo diário “The New York Times”, terão compelido todos os membros do Politburo do PCC a declarar publicamente o montante dos seus bens e ativos financeiros. Esta ação foi vista como uma estratégia para conter o des- prestígio dos líderes políticos a todos os níveis junto da maio- ria da população. A convicção pública é que, diretamente ou através das respetivas famílias, os líderes desviem recursos públicos não apenas para os cofres pessoais, como para pa- raísos fiscais no exterior, fora do alcance das autoridades chinesas. Caixa de Pandora ou contenção? Alguns analistas dizem que, tendo o génio saído da lâmpa- da, não será fácil voltar a en- garrafá-lo. Em qualquer dos casos, aquilo de que o Presi- dente chinês, Xi Jinping, mais precisa é de símbolos públicos e visíveis capazes de conven- cerem o povo de que está em curso um imenso esforço de O Presidente chinês na UNESCO e o Papa Francisco na Praça de São Pedro FOTO^TONY^GENTILE^E^CHRISTIAN^HARTMANN/REUTERS Há um ano em funções, Xi Jinping e o Papa Francisco enfrentam desafios muito semelhantes

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Expresso, 25 de abril de 201436 PRIMEIRO CADERNO

Perante a canonização de João Paulo II, o Papa Francisco mandou acelerar a de João XXIII, o homem do Concílio Vaticano II. Ambos serão santos a partir de amanhã

Francisco impõe canonização de João XXIII

Por um capricho da história, ou talvez dos homens, no domin-go vão ser canonizados João XXIII, o Papa que convocou o Concílio Vaticano II, e João Paulo II, o Papa que, segundo as críticas mais duras, não o aplicou. O acontecimento re-unirá em Roma quase um mi-lhão de peregrinos, delegações de mais de 60 países, 20 chefes de Estado e 24 primeiros-mi-nistros. A cidade organizou um dispositivo de segurança de mais 3500 agentes, 3000 voluntários e 75 ambulâncias.

Não será uma apoteose, como aconteceu no funeral de Karol Wojtyla (João Paulo II), em 2005, quando todo o plane-ta se voltou para Roma, em ho-menagem ao Papa que mudou a história, colaborando ativa-mente no derrube do Muro de Berlim (1989), da União Sovié-tica e da divisão do mundo em zonas de influência.

Foi o Papa que, pela primeira vez em tempos modernos, ór-fãos de líderes internacionais, deu à Igreja uma popularida-de mundial nunca vista. Em qualquer país do globo aquele Papa congregava milhões de cidadãos, como não conseguia nenhum líder político.

Viajou por todas as nações do mundo, fosse junto dos in-dígenas da Papua Nova Guiné ou dos delegados da ONU, em Nova Iorque, para trans-mitir a mesma mensagem: sem valores éticos, sem Deus,

não existe nenhuma sociedade.A parte principal da fes-

ta deste fim de semana será para o primeiro Papa polaco da história, o primeiro Papa não-italiano em 400 anos, que os fiéis da Praça de São Pedro, no dia do seu enterro, queriam “santo subito”. Ao seu lado, a memória de João XXIII fica mais distante dos cidadãos contemporâneos.

Apenas os 3000 bispos do Concílio Vaticano II (1963-1965) pediram que Angelo Roncalli (João XXIII) fosse proclamado santo “por acla-mação”, mas o seu sucessor, Paulo VI, travou os ânimos e encaminhou o processo de canonização para o processo burocrático estabelecido. Des-de então passaram 50 anos, enquanto Wojtyla será santo apenas nove anos após a sua morte, coisa nunca vista. “Este processo está a avançar depres-

da história. Não obstante, a mesma história mostra que a chamada “fábrica de santos” da Igreja Católica funciona à sua maneira e conforme o momento. João Paulo II, por exemplo, criou mais beatos (1345) e santos (482) do que to-dos os Papas anteriores juntos.

O processo de canonização de Karol Wojtyla seguiu todas as etapas previstas. O de Ange-lo Roncalli não, porque o Papa Francisco o dispensou de fazer o milagre necessário para ser admitido como santo, o que muitos interpretam como uma indicação. É como se Francisco tivesse dito: “Querem que João Paulo II seja santo? Então, João XXIII também o será.”

Depois do aparentemente insubstituível Pio XII que teve de gerir os imbróglios da II Guerra Mundial, os cardeais elegeram um Papa de transi-ção, Angelo Roncalli. Mas este

sa demais”, lamentou o cardeal belga, Godfried Danneels.

Uma fábrica de santos

Os historiadores explicam que cada Papa é distinto, porque vive num momento diferente

O Papa João XXIII

VISTO DE PEQUIM

^^ Os^novos^líderes^da^China^e^do^Vaticano^prometeram^reduzir^a^pompa^e^combater^os^desvios^éticos,^quando^não^criminosos

^^ Tal^como^padres^católicos,^também^houve^funcionários^do^PCC^envolvidos^em^transgressões^sexuais,^embora^de^tipo^mais^convencional.^Em^contrapartida,^os^seus^desvarios^financeiros^vão^muito^além^dos^imputados^ao^clero^católico

^^ Promover^mais^abertura^na^China^comporta^riscos^mas^o^dilema^do^PCC^resume-se^^a^enfrentar^um^problema^grande^agora^ou^ver-se^diante^de^um^problema^ainda^^maior^no^futuro

CHINA E VATICANO

Dois pastores, duas revoluções

Tirando Vladimir Putin e Ba-rack Obama, a agenda global é dominada, ainda que de forma diferente, por dois homens: Xi Jinping, novo presidente da China, e Jorge Mario Bergo-glio. Em março de 2013, um dia antes de Xi tomar posse, o jesuíta argentino tornou-se o Papa Francisco. Os dois fica-ram à frente dos destinos de uma imensa multidão de fiéis, cada qual representando mais de mil milhões de almas. E os paralelos não ficam por aqui.

O Partido Comunista Chi-nês (PCC) e a Igreja Católica compartilham esquemas de organização semelhantes, com estruturas de poder de grande predomínio masculino. Ambos difundem ideologias ou siste-mas de crença de vocação ab-soluta, cujo sucesso é incerto

numa sociedade onde a tendên-cia é haver cada vez menos en-tusiasmo por visões de mundo tão rígidas.

Os novos líderes da China e do Vaticano prometeram de-dicar os seus mandatos à re-dução da pompa e ao combate aos desvios éticos, quando não criminosos, nas respetivas hie-rarquias. E também manifesta-ram vontade de combater glo-balmente a pobreza. Um ano de liderança é tempo mais do que suficiente para avaliar o desem-penho de ambos os ‘pastores’. Concretamente, estarão a con-seguir introduzir os ventos de mudança que há tanto tempo se faziam sentir nos bastidores?

O Papa Francisco foi, à evi-dência, bem-sucedido em rom-per com práticas anteriores do Vaticano. Muitas das suas declarações públicas deixaram clara a intenção de impedir que a hierarquia da Igreja conti-nuasse a enveredar por maus caminhos, fechando-se sobre si própria, isolando-se dos fiéis e persistindo em atos conde-náveis. Estes, que não foram casos isolados, chegaram às manchetes dos jornais (apesar

de campanhas para tentar si-lenciar as queixas) e incluíram, tanto crimes sexuais (nomea-damente com menores) como económicos.

O Papa prometeu acabar com tudo isto. Ninguém questiona nem a sua sinceridade nem as suas intenções, mas que ho-mem se conseguirá impor à poderosa hierarquia do Vatica-no? Conhecida que é a tradição da Igreja nesta matéria, são de esperar duas coisas: grande resistência da parte dos que se envolveram ou deram co-bertura aos abusos, a começar pelo forte lóbi italiano dentro da cúria romana e forte inércia no sentido da manutenção do statu quo. Na verdade, o sis-tema em vigor satisfaz muita desta gente que, como tantos outros grupos ao longo da his-tória, pouco se preocupa com o destino de instituição a que pertence, muito menos com o além-túmulo.

Nada mais curioso do que ve-rificar até que ponto esta análi-se pode ser extrapolada para a China. Como é igual o mundo, visto a partir da estrutura de poder do Partido Comunista da

China! Também aqui se tenta preservar a situação vigente com base em poderes fáticos e num vasto sistema interno de ensino e disciplina.

Tal como sucedeu com uma série de padres católicos, tam-bém houve funcionários do PCC envolvidos em transgres-sões sexuais, embora de tipo mais convencional. Em con-trapartida, os seus desvarios financeiros vão muito além dos imputados ao clero católico, mais não seja porque as opor-tunidades nesta área eram in-comparavelmente mais vastas.

Há, portanto, motivos de so-bra para observar todos estes desenvolvimentos paralelos no eixo PCC-Vaticano. A questão é saber qual deles conseguirá reverter o curso dos aconteci-mentos, se é que algum real-mente o fará.

Entretanto, muitos antigos fiéis afastaram-se para sem-pre dos ensinamentos das duas ‘igrejas’, seja por já não se reverem na sua missão ori-ginal, seja por descrerem da possibilidade de verdadeiras mudanças. Há indícios de que as revelações sobre a extrema

riqueza das famílias dos líde-res chineses, feitas pelo diário “The New York Times”, terão compelido todos os membros do Politburo do PCC a declarar publicamente o montante dos seus bens e ativos financeiros. Esta ação foi vista como uma estratégia para conter o des-prestígio dos líderes políticos a todos os níveis junto da maio-ria da população. A convicção pública é que, diretamente ou através das respetivas famílias, os líderes desviem recursos públicos não apenas para os cofres pessoais, como para pa-raísos fiscais no exterior, fora do alcance das autoridades chinesas.

Caixa de Pandora ou contenção?

Alguns analistas dizem que, tendo o génio saído da lâmpa-da, não será fácil voltar a en-garrafá-lo. Em qualquer dos casos, aquilo de que o Presi-dente chinês, Xi Jinping, mais precisa é de símbolos públicos e visíveis capazes de conven-cerem o povo de que está em curso um imenso esforço de

O Presidente chinês na UNESCO e o Papa Francisco na Praça de São Pedro FOTO^TONY^GENTILE^E^CHRISTIAN^HARTMANN/REUTERS

Há um ano em funções, Xi Jinping e o Papa Francisco enfrentam desafios muito semelhantes

Expresso, 25 de abril de 2014 37 PRIMEIRO CADERNO

O Vaticano II abriu a Igreja às sociedades contemporâneas, embora os Papas seguintes pareçam ter relegado os resultados do Concílio para segundo plano

diplomata fino e idoso surpre-endeu todos: como nos anos 60 o mundo estava a mudar a passos largos, decidiu convo-car os 3000 bispos do planeta para enfrentar essas mudan-ças e inserir a igreja católica no mundo que estava a surgir. Foi o Concílio Vaticano II, que terminou com a aprovação de 16 documentos que abriram a igreja católica às sociedades contemporâneas, embora des-de então os sucessivos Papas (Paulo VI, João Paulo II, Bento

XVI) parecessem ter relegado os resultados do Concílio para segundo plano.

Homem de Deus ou santo?

Durante o processo de cano-nização de Karol Wojtyla, fo-ram ouvidas 114 testemunhas e nem todas coincidiram na aprovação da sua santificação. Vários movimentos católi-cos de teólogos, professores e crentes anónimos, como o Nós Somos Igreja, divulgaram recentemente um comunicado no qual afirmam que João Pau-lo II “não aplicou o Concílio”.

Em 2006, interrogado como testemunha do processo, Gio-vanni Franzoni, antigo aba-de de São Paulo Extramuros (Roma), denunciou sete ano-malias no pontificado de João Paulo II, entre as quais salien-tou a repressão e marginaliza-ção de teólogos, a gestão opaca

das finanças do Vaticano e do seu banco (IOR), a desconsi-deração da ética sexual e do papel da mulher na igreja, e a não-aplicação do “governo colegial” com os bispos.

“Teria sido mais sábio dei-xar transcorrer mais tempo antes de o fazer santo”, decla-rou Franzoni. “Era um homem de Deus, mas não é necessário torná-lo santo”, diria, no seu depoimento, o cardeal Carlo Maria Martini.

O historiador eclesiástico Carlo Cardia escreveu, em vida daquele Papa, que “a igreja de João Paulo II não andou para trás, manteve-se simplesmente imóvel” e explicou que “a tra-dição católica é demasiado rica em valores e matizes para que se esgotem na interpretação de um único Papa”.

Rossend Domènechcorrespondente em Roma

[email protected]

VISTO DE ROMA

^^ O^Papa^foi^bem-sucedido^em^romper^com^práticas^anteriores^do^Vaticano.^Deixou^clara^a^intenção^de^impedir^que^a^hierarquia^da^Igreja^continuasse^a^fechar-se^sobre^si^própria,^isolar-se^dos^fiéis^e^persistir^em^atos^condenáveis

^^ A^decisão^de^perguntar^aos^fiéis^a^sua^opinião^antes^do^sínodo^dos^bispos^sobre^a^família^marcado^para^outubro^é^um^gesto^sem^precedentes

^^ Ninguém^questiona^nem^a^sua^sinceridade^nem^as^intenções^de^Francisco,^mas^que^homem^se^conseguirá^impor^à^poderosa^hierarquia^do^Vaticano^e,^dentro^desta,^ao^lóbi^italiano?^

autodisciplina. Doutra forma não conseguirá ganhar legiti-midade popular, nem reforçar a sua autoridade.

Contudo, promover um maior grau de abertura é sempre uma manobra arriscada, mais não seja por poder indispor muitos quadros do partido. Pode ser a abertura de uma caixa de Pan-dora porque, para o PCC não perder legitimidade, os esfor-ços de limpeza interna terão de abranger toda a hierarquia, indo muito além de Pequim e chegando ao nível provincial e municipal.

O d i l e m a d o p a r t i d o resume-se a enfrentar um pro-blema grande agora ou ver-se diante de um problema ainda maior no futuro. O Papa, por sua vez, está a apresentar medi-das inimagináveis. O seu recen-te pedido no sentido de à escala de paróquia se fazerem inqué-ritos aos católicos para saber o que pensam sobre alguns dos ensinamentos da Igreja é um passo espetacular. Tem po-tencial para transformar uma Igreja Católica, organizada de cima para baixo, numa con-gregação mais participativa. A

decisão de perguntar aos fiéis sua opinião antes do sínodo dos bispos sobre a família marcado para outubro é um gesto sem precedentes, cujo objetivo só pode ser visto como obrigar a Igreja a identificar-se mais com o seu “público consumidor”.

À sua própria maneira, os líderes chineses acabam por fazer o mesmo. A vigilância da internet, nomeadamente dos fóruns de debate e dos mi-croblogues, também obedece a um propósito construtivo (embora não exclusivamente, visto haver, também, uma com-ponente censória). Os líderes políticos chineses precisam de conhecer qual o retorno do de-sempenho dos quadros do PCC a todos os níveis da sociedade e nas diferentes regiões do seu imenso país.

O mundo segue com atenção os esforços do Presidente Xi Jinping e do Papa Francisco para reverter o curso dos acon-tecimentos.

Stephen Ricthereditor do sítio Globalist.com e

presidente do Globalist Research

Center de Washington

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