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4 CONTRATO DE GESTÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA Pelo já analisado e pelo que segue, vê-se que o contrato de gestão é um elemento estratégico crucial para a efetivação da Administração Pública Gerencial. Sendo este modelo administrativo baseado na gestão por resultados, impõe-se, nele, a existência de instrumento com a finalidade de proporcionar ao núcleo estratégico da Administração o estabelecimento de metas e prazos de execução bem definidos a serem cumpridos pela entidade privada, pelo ente da Administração indireta ou pelo órgão da Administração direta contratado. Neste sentido coloca Saravia: Uma das tendências inovadoras da moderna administração pública é a da contratualização, isto é, a substituição das tradicionais relações hierárquicas verticais, consagradas em normas, pelos relacionamentos negociados entre os diversos atores do aparelho do Estado e, eventualmente, entre estes e a sociedade civil. Os acordos são concretizados, depois, em contratos bilaterais. Entre essas novas formas, o contrato de gestão (ou contrato-programa ou contrato de desempenho) aparece com perfis definidos e conta já com ampla experiência internacional. Com efeito, as transformações do contexto político, econômico, social e tecnológico no qual se inserem as organizações públicas tornaram obsoletos os sistemas clássicos de gestão. A gerência de organizações privadas incorporou as práticas do planejamento estratégico, no primeiro momento, e as da gestão estratégica, posteriormente. O aparelho estatal vivenciou a crescente inadequação do modelo weberiano que, no momento de sua inserção no sistema organizacional público, foi um autêntico progresso civilizatório. Mas a nova realidade exigia uma flexibilidade e uma rapidez que não se coadunavam com a racionalidade normativa e processualística do modelo racional-legal.1 Por certo, como explanado, a contratualização é também medida que permite

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4 CONTRATO DE GESTÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRAPelo já analisado e pelo que segue, vê-se que o contrato de gestão é um elementoestratégico crucial para a efetivação da Administração Pública Gerencial. Sendo este modeloadministrativo baseado na gestão por resultados, impõe-se, nele, a existência de instrumentocom a finalidade de proporcionar ao núcleo estratégico da Administração o estabelecimentode metas e prazos de execução bem definidos a serem cumpridos pela entidade privada, peloente da Administração indireta ou pelo órgão da Administração direta contratado.Neste sentido coloca Saravia:Uma das tendências inovadoras da moderna administração pública é a dacontratualização, isto é, a substituição das tradicionais relações hierárquicasverticais, consagradas em normas, pelos relacionamentos negociados entre osdiversos atores do aparelho do Estado e, eventualmente, entre estes e a sociedadecivil. Os acordos são concretizados, depois, em contratos bilaterais. Entre essasnovas formas, o contrato de gestão (ou contrato-programa ou contrato dedesempenho) aparece com perfis definidos e conta já com ampla experiênciainternacional.Com efeito, as transformações do contexto político, econômico, social e tecnológicono qual se inserem as organizações públicas tornaram obsoletos os sistemasclássicos de gestão. A gerência de organizações privadas incorporou as práticas doplanejamento estratégico, no primeiro momento, e as da gestão estratégica,posteriormente. O aparelho estatal vivenciou a crescente inadequação do modeloweberiano que, no momento de sua inserção no sistema organizacional público, foium autêntico progresso civilizatório. Mas a nova realidade exigia uma flexibilidadee uma rapidez que não se coadunavam com a racionalidade normativa eprocessualística do modelo racional-legal.1

Por certo, como explanado, a contratualização é também medida que permitemaior envolvimento da sociedade. Por outro lado é medida que, ao garantir maior autonomiaem troca da cobrança de resultados, permite maior agilidade ao gestor público. Assim sendo,não é demais lembrar, como visto, que a falta de transparência e o enredamento deprocedimentos – chegando um a justificar o outro – são dois dos principais vícios daadministração burocrática, e, no caso brasileiro, notadamente a partir da Nova República, sãomeios de perpetuar o patrimonialismo.Como leciona Oliveira, o foco principal do gerencialismo é a programação deresultados, tendo por referência prévio acordo de desempenho. Para atingir estes resultados, a1 SARAVIA, Enrique J. Contratos de gestão como forma inovadora de controle das organizações estatais. In:Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, 10., 2005,Santiago, Chile. Paper... Disponível em:

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<http://www.iij.derecho.ucr.ac.cr/archivos/documentacion/inv%20otras%20entidades/CLAD/CLAD%20X/documentos/saravenr.pdf>. Acesso em: 31 maio 2009. p. 1.51partir da estipulação destes objetivos e metas, atribui-se maior autonomia a órgãos e entidadespúblicas.2Quanto ao contrato de gestão como instrumento de regulação e inserção social,traz Martins:O desenvolvimento de instrumentos de regulação política e inserção social, de talmodo que as organizações sejam mais eficientes (economia de recursos), efetivas(satisfaçam aos cidadãos) e responsáveis (accountable), é uma peça-chave noresgate da autonomia gerencial da Administração Pública brasileira. Um destesinstrumentos é o contrato de gestão, que embora não se constitua uma novidade (aomenos em relação ao nome) na Administração Pública brasileira, pode desempenhar,a exemplo da experiência internacional paradigmática, um relevante papel comofator de reforma institucional.3Assim sendo, não é difícil concluir pela colocação do contrato de gestão comofigura central na consecução de uma Administração Pública que esteja mais de acordo com oque a sociedade espera do Estado.4.1 CARACTERIZAÇÃO4.1.1 ConceitoDiógenes Gasparini conceitua o contrato de gestão como:[...] ajuste celebrado pelo Poder Público com órgãos e entidades da Administraçãodireta, indireta e entidades privadas qualificadas como organizações sociais, paralhes ampliar a autonomia gerencial, orçamentária e financeira ou para lhes prestarvariados auxílios e lhes fixar metas de desempenho na consecução de seusobjetivos.4Como se extrai do conceito acima e das aplicações deste conceito que serão vistas,o termo contrato de gestão, no direito brasileiro, engloba dois gêneros, os firmados entre entesou órgãos da Administração Pública e aqueles firmados entre a Administração e entidadesprivadas. Dentre aqueles contratos no âmbito interno do Poder Público também ocorremdiferenças. Assim, têm-se diferentes tipos de contratos que podem ser enquadrados naterminologia, mais geral, contrato de gestão, o que será analisado.2 OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justino de. O contrato de gestão e seus riscos. Disponível em<http://portal.rpc.com.br/gazetadopovo/opiniao/conteudo.phtml?tl=1&id=850439&tit=O-contrato-de-gestao-eseus-riscos> . Acesso em: 31 maio 2009.3 MARTINS, Humberto Falcão. Em busca de um Regime Contratual de Gestão: A recente implementação deContratos de Gestão na Administração Pública Brasileira. In: PEIXOTO, João Paulo M. (org.). Modernização e

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Reforma do Estado: Aspectos da Experiência Brasileira Recente: UVA, 2000. Disponível em<http://hfmartins.sites.uol.com.br/Publicacoes/publi_10.pdf>. Acesso em: 18 maio 2009. p. 14.4 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 5. ed. rev. atual. e aum. São Paulo : Saraiva, 2002, p. 58252Segundo Di Pietro, o contrato de gestão surgiu no direito francês, como se verácom mais vagar ao se tratar da evolução histórica. Em seu berço, foi inicialmente utilizadocomo meio de vincular a programas governamentais determinadas empresas privadas querecebiam algum tipo de auxílio por parte do Estado, logo vindo a ser utilizado como meio decontrole administrativo ou tutela sobre as empresas estatais. Mais recentemente, tais contratospassaram a ser celebrados com órgãos da Administração Direta; são os chamados centros deresponsabilidade, comprometidos, por meio do contrato de gestão, a atingir determinadosobjetivos institucionais, fixados em consonância com programa de qualidade proposto peloórgão interessado e aprovado pela autoridade competente, em troca, ainda, de maiorautonomia de gestão.5Tais utilizações do contrato de gestão foram constitucionalizadas, no direitobrasileiro, com o § 8º do art. 37 da Constituição Federal, que assim normatiza:§ 8º A autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades daAdministração direta e indireta poderá ser ampliada mediante contrato a ser firmadoentre seus administradores e o Poder Público, que tenha por objeto a fixação demetas de desempenho para órgão ou entidade, cabendo à lei dispor sobre:I – prazo de duração do contrato;II – os controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações eresponsabilidade dos dirigentes;III – a remuneração do pessoal.6Embora o dispositivo não mencione a expressão contrato de gestão, nele seencontra a previsão que dá respaldo a este instituto no que se refere a contratos entre órgãos eentidades da Administração Pública, ainda que houvesse experiências prévias, muitas delascarentes exatamente de amparo constitucional e legal.Para Medauar, o contrato de gestão é visto:[...] como técnica de gestão privada ou meio de propiciar autonomia a empresas,entes ou órgãos estatais, dentro de parâmetros fixados pelo poder central ou, ainda,como técnica de descentralização; mediante o contrato de gestão são estabelecidosobjetivos e metas a serem atingidos, ficando sua execução sujeita aoacompanhamento, fiscalização e sanção do poder público.7

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No caso brasileiro, temos ainda a figura do contrato de gestão utilizadanominalmente na normatização das organizações sociais. O art. 5º da Lei 9.637/98 conceituacontrato de gestão como o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificadacomo organização social, com vistas à formação de parceria entre as partes, para fomento e5 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Contratos de Gestão. Contratualização do Controle Administrativo sobre aAdministração Indireta e sobre as Organizações Sociais. Disponível em<http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista2/artigo9.htm> . Acesso em: 31 maio 2009.6 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: SenadoFederal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>.Acesso em: 27 de maio de 2009.7 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 10ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p.230.53execução de atividades relativas às áreas de ensino, pesquisa científica, desenvolvimentotecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde.8Tem-se, então, pelo menos dois instrumentos jurídicos que, ainda que se prestemao mesmo fim, têm naturezas diferentes. Quanto a esta diferenciação entre o contrato degestão firmado no âmbito interno da administração pública e aquele firmado com entidadesparticulares, leciona Di Pietro:Os contratos de gestão podem ser importante instrumento de ação do poder público,quer sob a forma de contratualização da tutela sobre as entidades da AdministraçãoIndireta, quer sob a forma de parceria com a iniciativa privada. No primeiro caso, ocontrato fixa programa a ser cumprido pela entidade em troca do reconhecimento demaior autonomia. No segundo caso, o contrato fixa igualmente programa a sercumprido pela entidade que atua como paraestatal, em colaboração com o PoderPúblico, recebendo ajuda financeira para esse fim.9

Aguilar ressalta que, nos primeiros casos (e aqui não se faz ainda a diferenciaçãoentre os contratos de gestão com entidades ou órgãos da administração pública), o contrato degestão redunda numa maior autonomia ao órgão da administração direta ou à entidade daadministração indireta, para permitir que as metas estabelecidas no contrato sejam atingidasao final do prazo definido, prestando-se, também, para fixar as metas, meios de redução de

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custo e prever um controle de resultados. Todavia, quando se trata de contrato firmado com asentidades paraestatais, o contrato de gestão tem o efeito de submeter estes entes aos ditamesda administração pública. Assim, para que possam merecer o repasse de verbas públicas, taisentidades submetem-se a um rígido controle de resultados, cedendo, com isto, parte de suaautonomia. 10

4.1.2 Breve análise da natureza jurídicaA natureza jurídica dos contratos de gestão tem suscitado inúmeras dúvidas.Embora tal temática, por si só, valha um estudo a parte, é necessária uma breve análise arespeito.8 BRASIL. Lei n° 9.637, de 15 de maio de 1998. Dispõe sobre a qualificação de entidades como organizaçõessociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a extinção dos órgãos e entidades que menciona e aabsorção de suas atividades por organizações sociais, e dá outras providências. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9637.htm>. Acesso em: 27 de maio de 2009.9 DI PIETRO, loc. cit.10 AGUILAR, Ana Patrícia. Contratos de gestão. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 491, 10 nov. 2004.Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5913>. Acesso em: 13 abr. 2009.54Quanto a este aspecto, cumpre destacar, como já visto acima, que há grandediferença dos contratos firmados entre o Poder Público e entidades privadas para aquelesfirmados no âmbito interno da Administração Pública. Quanto ao primeiro caso, não parecehaver duvidas quanto à natureza contratual do contrato de gestão, embora a identidade deinteresses seja considerada um problema por muitos, o que se abordará a frente. É no segundocaso que residem as grandes polêmicas do tema.Lima, após analisar a posição de alguns doutrinadores, verifica que a falta decapacidade jurídica dos órgãos da Administração Pública é um forte entrave a aceitação danatureza contratual do contrato de gestão, seja pela própria ausência de pessoa capaz, sejapela identidade de interesses. Esta última afirmação também se estendendo às entidades daAdministração indireta contratantes. Quanto à identidade de interesses – pois não há oposiçãodestes, o que já serviu para criticar até mesmo os contratos de gestão com entidades

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paraestatais, como já colocado – ressalta que as novas figuras contratuais decorrem doconsenso, cooperação e parcerias. Quanto à falta de pessoa capaz, crítica existente no caso decontrato com órgão da Administração direta, afirma que estes contratos são feitos nas pessoasde seus dirigentes.11

A teoria dos contratos é dinâmica, isto também se pode extrair do que discorreLima:Nos primórdios do século XX, havia uma grande dificuldade em se admitir que aAdministração pudesse realizar contratos com o particular, uma vez que o contratopressupunha, na concepção clássica, de direito privado, igualdade jurídica entre aspartes. Na Itália, com Alessi e outros anti-contratualistas, em decorrência dessaobrigatoriedade de igualdade, admitia-se que os contratos de direito públicopoderiam ser firmados apenas entre entidades públicas.12

Segundo Medauar, tal resistência derivava das concepções predominantes, noséculo XIX, a respeito da figura contratual, pois estas teorias voltavam-se para os contratosentre particulares, regido pelo direito privado. Apesar das resistências, a teoria do contratoadministrativo firmou-se, afastando-se, no entanto, da teoria do contrato privado vigentedesde o século XVIII. 13

Vê-se que a própria juridicidade dos contratos administrativos já foi questionada,mas se firmou por imperativo da dinâmica histórica, num típico caso em que a teoria jurídicase adapta aos fatos postos pelas relações sociais.11 LIMA, Sídia Maria Porto. A Emenda Constitucional nº 19/98 e a administração gerencial no Brasil. JusNavigandi, Teresina, ano 4, n. 38, jan. 2000. Disponível em:<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=475>. Acesso em: 19 abr. 2009.12 LIMA, loc. cit.13 MEDAUAR, 2006, p. 205-206.55A hoje teoria clássica dos contratos administrativos também passa, sobretudo apartir dos anos 70 do século XX, por questionamentos a respeito de alguns elementos de suaelaboração, principalmente em função do florescimento de novas atuações administrativas,instrumentalizadas por diferentes módulos contratuais e convencionais. Este novo modo deatuar fez surgir novas formas de ajustes, com moldes que não se enquadram no padrãoclássico de contrato administrativo, nem no padrão de contrato vigente no século XIX. Disto,pode-se concluir que tanto os contratos administrativos clássicos como os novos tipos

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contratuais incluem-se numa figura contratual, de caráter mais ampliado, num módulocontratual. 14

Percebe-se, então, que há novas formas de contrato, dentre as quais se inclui ocontrato de gestão, não enquadráveis na teoria clássica de contrato administrativo, mas nempor isso inexistentes no mundo jurídico. A adequação da figura do contrato de gestão a teoriacontratual predominante não altera seu fundamento jurídico, especialmente porque escoradona Lei e na Constituição.Segundo Lima:Neste ponto, torna-se oportuno lembrar que o sistema para a configuração docontrato é o numerus apertus, o que prescinde do seu ajustamento a tipos prefixados,diferentemente da tipicidade romana, que impunha o sistema numerus clausus, istoé, a prévia fixação das figuras contratuais. Dessa forma, o vigente sistema converte ocontrato em figura geral ou categoria genérica, cuja abrangência se demarca pelospróprios elementos que o configuram, de modo que a ausência no contrato degestão, de um dos pressupostos contratuais clássicos (ou a mais de um), não o retirada categoria.15

Aqui cabe ressaltar que a figura do contrato de gestão, atualmente, está escoradana Carta Magna Brasileira e integrada sistematicamente ao ordenamento constitucional. Nestesentido, parece correto dizer que tais contratos podem atuar na relação entre órgãos eentidades públicas, pois, se estas relações têm fundamento no texto constitucional e se aprópria Constituição Federal autoriza o contrato de gestão, não há como negar a existência deefeitos jurídicos dele decorrentes.Assim, a Constituição Brasileira autoriza um regime de maior autonomia àadministração pública, desde que fundado em contrato e desde que a lei traga asregulamentações exigidas pelo texto da Constituição. Isto ocorrendo, não há qualquerempecilho de ordem legal. Desde que não se fira ditame superior, deve-se reconhecer apossibilidade de abertura de exceções por norma de hierarquia equivalente, estando a figurado contrato de gestão absolutamente adequada ao Direito vigente, pelo que se expôs até aqui.14 MEDAUAR, loc. cit.15 LIMA, loc. cit.56Sobre esta questão, a lição de Meirelles só reforça a tese de que tal contrato está

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amparado em lei e daí decorre a possibilidade de mudar a configuração das relações jurídicasentre entes e órgãos da administração pública, ipsis literis:Como na Administração Pública domina o princípio da legalidade, o contrato degestão não é fonte de direitos. Ele é simplesmente um fato jurídico que permite aaplicação de determinados benefícios previstos em lei. A ampliação da autonomia eoutras vantagens a serem concedidas às agências executivas devem estar previstasem lei. 16

Deste modo, impõe-se se o reconhecimento da adequação do contrato de gestãoao direito brasileiro. Caberia, porém, ainda a questão dos contratos com órgãos daAdministração Direta.A respeito desta última questão, Medauar já afirma que a própria lei traz hipótesesde contratos entre pessoa jurídica de direito público interno e órgãos ou entidades daAdministração, citando a Lei 8.666/93.17

Meirelles coloca que os órgãos mantêm relações entre si e com terceiros, dasquais resultam efeitos jurídicos internos e externos, na forma legal ou regulamentar. Ressaltaainda que os órgãos podem ter prerrogativas próprias, que admitem defesa até mesmo pormandado de segurança.18

Assim sendo, parece juridicamente viável a possibilidade de contratos de gestãocom órgãos da Administração Pública, obviamente com peculiaridades pertinentes a cadacaso concreto.A respeito das citadas relações entre órgãos, Gasparini esclarece que o que existeé a relação entre os agentes públicos incumbidos das respectivas competências ou atribuições.Isto é, estes agentes são titulares de competências e o respectivo exercício é um poder-dever aque não podem furtar-se.19

Neste sentido, Medauar leciona que, no direito público, as atribuições de cadaórgão ou autoridade recebe o nome de competência. Competência é, então, a aptidão legal doórgão ou autoridade para realizar determinadas atividades.20

Meirelles entende por competência administrativa o poder que tem o agente daAdministração para desempenhar suas funções.21

16 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 262-263.17 MEDAUAR, 2006, p. 207.18 MEIRELLES, op. cit., p. 68-69.

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19 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 5. ed. rev. atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 45.20 MEDAUAR, op. cit., p. 53.21 MEIRELLES, op. cit., p. 149.57Com o até aqui colocado, pode-se concordar com a afirmativa de que o contratode gestão com órgãos da Administração se dá na pessoa dos dirigentes, mas não como meraspessoas físicas, e sim enquanto detentores das competências inerentes à chefia do órgão.De qualquer modo, o que salta aos olhos é que o contrato de gestão, em todassuas formas, ainda que estas se diferenciem, é juridicamente aceitável e dele decorrem efeitojurídicos específicos, desde que, naturalmente, cumpram-se os ditames legais econstitucionais vigentes.Assim – ressalvando-se que a análise da natureza jurídica do contrato de gestãonão compõem o cerne deste trabalho – vê-se que tal instrumento pode sim ser caracterizadocomo contrato, considerando-se contrato num sentido amplo, podendo-se afirmar que talfigura está integrada ao ordenamento jurídico vigente no Brasil, produzindo os efeitosinternos e externos peculiares a cada caso concreto.4.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA4.2.1 Experiência estrangeiraO contrato de gestão, ao menos nos moldes em que é concebido no Brasil, foicriado na França como conseqüência de uma recomendação do Relatório Nora, de 1967. Taldocumento foi produzido por um Grupo de Trabalho do Comitê Interministerial de EmpresasEstatais, organizado pelo governo francês com o objetivo de melhorar a situação de suasempresas, pois estas apresentavam sintomas de deterioração, identificada como causada peloexcesso de formalidades por parte do poder central. 22

Esta formatação inicial recebeu o nome de contrato de programa, fixando, pararamos sensíveis do setor público, objetivos atrelados àqueles do plano nacional.23

Neste primeiro momento, verifica-se contratos que procuravam exatamente darliberdade as empresas com a condição de atrelamento a grandes objetivos governamentais.Após, estes contratos passam por um período de estagnação.22 SARAVIA, loc. cit.

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23 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,terceirização e outras formas. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 251.58Esta prática é retomada em 1978, com a denominação de contratos de empresa,havendo uma expansão do número de empresas sob contrato. O teor destes contratos tambémé mais abrangente, detalhando programas de investimentos, indicadores de produtividade,contendo várias hipóteses de execução de acordo com a evolução econômica.24

Segundo Di Pietro:Os contratos de empresa eram reservados àquelas que exercessem atividadesindustriais ou comerciais sem viabilidade de competição; o objetivo era dotá-las decompetitividade. Ao contrário dos contratos de programa, os contratos de empresanão têm seus objetivos vinculados ao Plano nacional. Neles, são estabelecidosobjetivos específicos para cada empresa. A característica comum em todos eles é abusca de saneamento financeiro, pela fixação dos meios adequados para atingir aesse objetivo.25

Nem os contratos de programa nem os contratos de empresa foramregulamentados de maneira geral, tendo se desenvolvido empiricamente caso a caso. Apenasem 1982, no governo de Mitterrand, é aprovada forte e extensiva regulamentação para o que éagora chamado de contratos de plano.26

Esta terceira fase se distingue, de um lado, pela regulamentação do instituto e, deoutro, pelo retorno à política de se utilizar esta contratualização para como forma de atrelar asempresas aos objetivos estratégicos do governo.Segundo Di Pietro, os contratos de plano, adotados pelos governos a partir do ano1981, renovam a tradição anterior de utilizar tais contratos para assegurar o compromisso comobjetivos governamentais prioritários, atribuindo às empresas nacionais um papeldeterminante no desenvolvimento de políticas essenciais, como as de emprego, deinvestimento, de adoção de novas tecnologias ou de formação profissional.27

Houve ainda a evolução destes contratos para o que se chamou de contratos deobjetivos. De acordo com Tremel:Em 1988, o Ministro da Indústria francês define um novo procedimento decontratação para as suas empresas subordinadas. Foi chamado de contrato deobjetivos. Basicamente, este contrato era expresso por um documento anual, com asíntese dos principais pontos estratégicos e financeiros do plano estratégico daempresa.28

Vê-se, em todas as variações estudadas até o momento, a utilização da

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contratualização para o atrelamento de empresas aos objetivos do Estado, sejam objetivospolíticos, sejam objetivos relativos à eficiência da gestão destas.24 TREMEL, Rosângela. Contratos de gestão e o princípio constitucional da eficiência. 2001. 75 f.Monografia. (Especialização em Advocacia e Dogmática Jurídica)-Universidade do Sul de Santa Catarina,Florianópolis, 2001. p. 36-37.25 DI PIETRO, loc. cit.26 TREMEL, loc. cit.27 DI PIETRO, 2008, p. 252.28 TREMEL, loc. cit.59Num último momento de evolução, tratando ainda apenas do caso francês, estescontratos foram estendidos a própria Administração Direta. Conforme concisa, mas completa,explanação de Di Pietro:Há que se assinalar que esse tipo de contratualização estendeu-se, posteriormente,aos próprios órgãos integrantes da Administração direta, chamados "centros deresponsabilidade". Segundo a ENAP (ob. cit.,p. 62), "os centros de responsabilidade,que começaram a ser criados a partir de 1990 em caráter experimental na França,são órgãos que se beneficiam, através da realização de um contrato, deflexibilizações do controle administrativo sobre sua gestão, ao mesmo tempo que sepropõem a adotar determinados procedimentos e compromissos. Inicialmente, parase tornar um centro de responsabilidade, o órgão precisa ter desenvolvido umprojeto de serviço, ou seja, ter feito uma definição rigorosa de objetivos e adotadométodos de avaliação dos resultados"."As flexibilizações de gestão consentidas ao centro de responsabilidade podemenglobar:liberdade para o responsável do centro fazer deslocamentos internos;possibilidade de criar comissões administrativas paritárias locais;concessão de uma dotação global para pagamento de gratificações e trabalhossuplementares;liberdade para distribuição — com amplitude constante — dos horários detrabalho e sua globalização num quadro anual;concessão de uma dotação orçamentária global de funcionamento;supressão do controle financeiro prévio local;adaptação de regras e práticas internas do ministério responsável, tais como aelevação do nível de competência entre a administração central e o centro deresponsabilidade, a diminuição de certos prazos, a aplicação de uma organizaçãomais racional, assim como todas as facilidades complementares levando em contaas especificidades de cada órgão;em termos de créditos de equipamentos, alocação de dotações permitindo arealização de programas fixados no orçamento apresentado pelo centro;liberdade para usar as economias feitas em relação ao orçamento anterior,principalmente para desenvolver serviços sociais (creches, cheques-viagem,dentre outros) e melhorar as condições de trabalho ou de serviço e atendimentoaos usuários." (ENAP, ob. cit., p. 63).Há que se observar que todas essas modalidades citadas dizem respeito a acordoscelebrados pelo Estado com suas próprias entidades ou órgãos, todos eles integrantesda Administração Pública em sentido amplo.29

Pode-se concluir do colocado que as medidas de eficientização adotadas nasempresas, via contratualização, foram transplantadas para a Administração Direta, com a

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criação dos centros de responsabilidade. Assim, garantiu-se a estes órgãos uma autonomiaestranha ao seu cotidiano, mediante a assunção de compromissos. Isto, por si só, faz emergir afigura do contrato de gestão como instrumento fundamental para a gestão por resultados.Segundo Saravia, a partir de 1989 o governo francês implantou projetos decentros de responsabilidade no Ministério do Interior, no Ministério da Infraestrutura, noMinistério da Indústria, no Ministério da Cultura e em alguns órgãos do Ministério daEducação.30

29 DI PIETRO, 2008. p. 253-254.30 SARAVIA, 2005, p. 5.60Na Inglaterra também se verifica um projeto de contratualização. Neste casobaseado em agências executivas, num modelo com o qual o caso brasileiro guardasemelhança, ressalvadas as diferenças do sistema legal de cada país. Quanto ao exemplobritânico:No âmbito da administração pública direta houve uma significativa reforma nosentido de se promover a descentralização da execução em agências (as ExecutiveAgencies), que atuariam sob o controle de um órgão supervisor e dentro dascondições estabelecidas em um documento denominado frameworkdocument. Deacordo com a filosofia do programa Next Steps Agencies, adotado em 1988, oobjetivo era atingir eficiência e efetividade na prestações de serviços públicos, umavez que as referidas agências teriam maior autonomia gerencial na implementaçãodas políticas formuladas pelo governo central. Em contrapartida estariam sujeitas auma avaliação periódica do seu desempenho.31

Ainda em vários outros países há exemplos de instrumentos similares. ConformeSaravia, na Itália existem os "acordos de programa", menos formais que os similaresfranceses. Na Espanha, a Lei Geral do Orçamento estabeleceu, em 1979, a possibilidade derealizar contratos de gestão. Outro exemplo, bem sucedido, é da Índia, onde os contratos degestão são chamados de "memorandum of understanding”. Há ainda exemplos de utilizaçãodo mecanismo do contrato de gestão em países como Benin, Burundi, Congo, Gâmbia,Madagascar, Marrocos, Senegal, Uruguai, Venezuela e Bolívia.32

4.2.2 Experiência brasileiraA evolução da experiência contratual no Brasil tem três núcleos dedesenvolvimento:a) o das empresas estatais na década de 1980;b) o referente à Administração Pública paulista; e

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c) o que diz respeito à implementação, nos anos 1990, principalmente, deAgências Executivas (AE) e Organizações Sociais (OS), a partir das concepções doPDRAE.33

Nos anos 1980 tivemos as primeiras iniciativas de formulação de propostas decontratos de gestão por parte de empresas estatais federais. Porém, o próprio momentohistórico, de transição de regime, inclusive com alguns retrocessos administrativos, como já31 DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Contas. Contratos de gestão: metodologia de acompanhamento econtrole e sua aplicação. Brasília : Seção de Documentação, 2004. (Coleção estudos e documentos; v.3). p. 2832 SARAVIA, 2005. p. 2.33 MARTINS, 2000, p. 15.61se viu, pode ser colocado como um dos grandes entraves para o desenvolvimento de propostasdo gênero naquele período.Em 1983 a primeira proposta de contrato de gestão foi elaborada pela RedeFerroviária Federal, com outras empresas fazendo o mesmo posteriormente, mas semchegarmos, neste ponto, a uma implantação efetiva.34

Os primeiros contratos de gestão só foram celebrados na década de 1990,conforme Di Pietro:Os primeiros contratos de gestão com empresas estatais foram celebrados, na esferafederal, com a Companhia Vale do Rio Doce - CVRD e a Petróleo Brasileiro S.A -PETROBRÁS (ambos com base no Decreto n. 137, de 27.5.91, que instituiu oPrograma de Gestão das Empresas Estatais). Também foi celebrado contrato degestão com o Serviço Social Autônomo Associação das Pioneiras Sociais, antigaFundação das Pioneiras Sociais (fundação governamental); essa transformaçãoparece ter tido por objetivo aproximar a entidade dos antigos serviços sociaisautônomos (SESI, SESC, SENAI etc.), considerados como entidades paraestatais,porém não integrantes da Administração Indireta. Por sua vez, aquela mesmaentidade parece ter inspirado a instituição das organizações sociais, analisadas noitem subsequente.35

O caso específico das Pioneiras Sociais, já referido no capítulo 2, será novamenteabordado quando se tratar das aplicações do contrato de gestão no direito brasileiro.Percebe-se que, inicialmente, o foco dos contratos de gestão era similar aoexemplo francês, dar liberdade para que as empresas estatais possam ser mais competitivassem que com isto elas se descolem do controle governamental. Necessário observar, porém,

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que neste período tais contratos não possuíam amparo constitucional e sequer legal, pois eramnormatizados, como exposto, via decreto.O Tribunal de Contas da União manifestou preocupação a respeito, segundoSaravia:O Tribunal de Contas da União manifestou sua preocupação com a possibilidade doscontratos de gestão impedirem o controle exercido pelo órgão. Foi assim que em1994 baixou uma decisão em plenário (DECISÃO No.020/94 - TCU – PLENÁRIO)que estabelecia:“O Tribunal Pleno ... decide:1. Firmar, em caráter normativo, o entendimento de que a sistemática ... deCONTRATO DE GESTÃO ... não desobriga ... do cumprimento de preceitosconstitucionais e legais... tais como...:1.1. SELEÇÃO E ADMISSÃO DE PESSOAL: é obrigatória a realização deconcurso público ...1.2. REMUNERAÇÃO DE DIRIGENTES E SERVIDORES: é imperiosa aobservância do limite previsto no art. 37-XI da CF1.3. CONTRATAÇÃO DE OBRAS E SERVIÇOS, AQUISIÇÃO E ALIENAÇÃODE BENS: é imprescindível o cumprimento do disposto no art. 37-XXV da CF,regulamentado pela lei 8666/93, que instituiu normas para licitações e contratos noâmbito da administração pública direta e indireta".36

34 SARAVIA, 2005, p. 3.35 DI PIETRO. loc. cit.36 SARAVIA, op. cit. p. 4.62Quanto ao segundo núcleo identificado, houve a experiência do governo doestado de São Paulo a partir do final do Governo Montoro em 1986, onde se introduziu oscontratos de gestão para melhorar o acompanhamento da execução orçamentária das empresasestatais do estado (como se percebe, com implementação anterior aos exemplos federais).Porém, foi o governo Fleury que procedeu à implantação intensiva como instrumento decontrole orçamentário e gestão por resultado. Os contratos eram firmados tendo como baseprogramática o Plano Plurianual e as Diretrizes Gerais para os Órgãos. Inicialmente, oscontratos basearam-se na estreita conformidade em relação ao plano plurianual e às diretrizesgerais. Posteriormente, basearam-se nos planos estratégicos de cada ente específico.37

O terceiro núcleo refere-se às experiências advindas dos trabalhos do MARE. Estaetapa já diz respeito ao trabalho de desenvolvimento da administração pública gerencial,como viu-se, redundando em instrumentos legais e constitucionais para a implementação decontratos de gestão. Tal temática engloba as atuais aplicações do contrato de gestão no direitobrasileiro e será analisada com mais detalhes a seguir.

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4.3 APLICAÇÕES NO DIREITO BRASILEIROAs aplicações do contrato de gestão no direito brasileiro foram naturalmenteestudadas aqui e ali durante este trabalho. Desde as concepções do PDRAE, passando pelaaplicabilidade do instituto em cada figura da atual estrutura da Administração Pública noBrasil, e em especial ao se falar da evolução histórica no caso brasileiro.Viu-se que tal instituto surgiu também aqui como controle de empresas estatais,nos moldes da França, embora no momento em que ocorreu faltasse algo de amparo jurídico.Evolui-se, ainda, de uma experiência com o Serviço Social Autônomo das Pioneiras Sociaispara o instituto das Organizações Sociais, este último idealizado no âmbito do PDRAE, isto jáno campo das parcerias entre Poder Público e entidades privadas. Também a partir doPDRAE tivemos as agências executivas, embora tal modelo não tenha se alastrado com odesejado. Mas algo similar a esta agencificação proposta ocorreu com a política de Acordo deResultados do Estado de Minas Gerais, como se verá.37 MARTINS, 2000, p. 15-16.634.3.1 Administração diretaA utilização do contrato de gestão como contratualização de resultados naadministração direta ainda não é corrente no Brasil, mas é a última etapa de evolução nodireito francês, através da formação dos chamados centros de responsabilidade, como seviu. Na experiência francesa temos órgãos da Administração direta que recebem aflexibilização dos controles administrativos, consequentemente obtendo maior autonomia.Segundo Saravia, em troca deste alívio nas normas de gestão orçamentária exigeseda instituição uma definição rigorosa de objetivos, utilização de instrumentos de gestãomoderna e a aceitação da avaliação. O acordo pode prever globalização total dos fundosfinanceiros, transferência de créditos de funcionamento de um ano para o próximo,diminuição ou mesmo supressão do controle a priori, e a retenção dos ganhos por maioreficiência.38

No Brasil, a contratualização de resultados relativos aos serviços de caráter

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exclusivo do Estado foi inicialmente prevista, pelo PDRAE, dentro dos moldes de agênciasexecutivas – mais próximo do programa britânico Next Steps, como já se comentou. Emboranão conste originalmente do modelo brasileiro, esta política de agencificação não exclui,necessariamente, a Administração Direta. De qualquer modo, já há exemplos de contratos degestão com órgãos da Administração direta, inclusive com grande notoriedade, como oparadigmático caso de Minas Gerais, que passamos a analisar.Atualmente, a política de Acordo de Resultados, como é chamado o contrato degestão em Minas Gerais, vem normatizada pela Lei Estadual n° 17.600, de 1º de julho de2008. O art. 2º de referido diploma, em seus incisos I a IV, traz os conceitos pertinentes aospossíveis participantes do contrato de gestão e suas qualificações:Art. 2º Para os fins desta Lei, entende-se por:I - Acordo de Resultados o instrumento de contratualização de resultados celebradoentre dirigentes de órgãos e entidades do Poder Executivo e as autoridades quesobre eles tenham poder hierárquico ou de supervisão;II - acordante o órgão, a entidade ou a unidade administrativa do PoderExecutivo hierarquicamente superior ao acordado, responsável peloacompanhamento, pela avaliação e pelo controle dos resultados e, no que couber,pelo provimento dos recursos e meios necessários ao atingimento das metaspactuadas no Acordo de Resultados;III - acordado o órgão, a entidade ou a unidade administrativa do PoderExecutivo hierarquicamente subordinado ou vinculado ao acordante, comprometido38 SARAVIA, loc. cit.64com a obtenção dos resultados pactuados e responsável pela execução das açõese medidas necessárias para sua obtenção;IV - interveniente o órgão, a entidade ou a unidade administrativa signatáriodo Acordo de Resultados responsável pelo suporte necessário ao acordante ou aoacordado, para o cumprimento das metas estabelecidas;39

Vê-se que estão incluídos na Lei os órgãos da Administração direta comopossíveis acordantes, acordados e intervenientes. Mais do que incluídos na Lei, é práticarecorrente em Minas Gerais contratos de gestão com estes órgãos, como se pode verificar nosite da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão,40 onde constam os acordos deresultado assinados, seus resultados e legislação pertinente.Neste sentido, o art. 1º do Decreto Estadual n° 44.873, de 14 de agosto de 2008,que regulamenta supra citada Lei, conceitua o chamado acordo de resultados, estabelecendoas diretrizes gerais das relações entre os órgãos e entidades no contexto deste contrato de

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gestão, trazendo mais clareza a questão do uso deste instituto no âmbito da AdministraçãoDireta, abarcando aí as relações de hierarquia, típicas dos órgãos da Administração Direta.Assim, ipsis literis:Art. 1º - O Acordo de Resultados de que trata a Lei nº 17.600, de 1º dejulho de 2008, é um instrumento de contratualização de resultados celebradoentre dirigentes de órgãos e entidades do Poder Executivo e as autoridades quesobre eles tenham poder hierárquico ou de supervisão, tendo como objetivoestabelecer metas, alinhadas ao planejamento estratégico do Governo, e medir odesempenho de cada órgão e entidade da Administração Pública Estadual.41

Tais acordos de resultados têm como signatários, no caso em análise, os dirigentesdos órgãos, conforme art. 7º da Lei n° 17.600/08, reforçando o que foi colocado ao se falar danatureza jurídica do instituto. Nesta mesma linha, o art. 45 da referida Lei estabelece que se,durante a vigência do contrato, haver substituição do dirigente signatário, o novo dirigentenomeado torna-se o responsável pelo contrato firmado. 42

Assim sendo, a utilização dos contratos de gestão na Administração direta podeconstituir uma excelente alternativa de gestão por resultados, evitando a feudalização da39 MINAS GERAIS. Lei n° 17.600, de 1 de julho de 2008. Disciplina o Acordo de Resultados e o Prêmio porProdutividade no âmbito do Poder Executivo e dá outras providências. Disponível em:<http://hera.almg.gov.br/cgi-bin/nphbrs?co1=e&d=NJMG&p=1&u=http://www.almg.gov.br/njmg/chama_pesquisa.asp&SECT1=IMAGE&SECT2=THESOFF&SECT3=PLUROFF&SECT6=HITIMG&SECT7=LINKON&l=20&r=1&f=G&s1=LEI%2017600%202008.NORM.&SECT8=SOCONS>. Acesso em: 05 junho 2009.40 MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão. Disponível em:<http://www.planejamento.mg.gov.br/governo/choque/acordo_resultado/acordo_resultado.asp>. Acesso em: 05junho 2009.41 MINAS GERAIS. Decreto n° 44.873, de 14 de agosto de 2008. Regulamenta a Lei nº 17.600, de 1º de julhode 2008, que disciplina o acordo de resultados e o prêmio por produtividade no âmbito do Poder Executivo e dáoutras providências. Disponível em: <http://hera.almg.gov.br/cgi-bin/nphbrs?co1=e&d=NJMG&p=1&u=http://www.almg.gov.br/njmg/chama_pesquisa.asp&SECT1=IMAGE&SECT2=THESOFF&SECT3=PLUROFF&SECT6=HITIMG&SECT7=LINKON&l=20&r=1&f=G&s1=DECRETO%2044873%202008.NORM.&SECT8=SOTEXTO>. Acesso em: 05 junho 2009.42 MINAS GERAIS, 2008.65administração indireta e o ostracismo da burocracia central, identificados no primeirocapítulo.4.3.2 Administração indireta

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O PDRAE coloca como um dos objetivos para as atividades exclusivas do Estado:Transformar as autarquias e fundações que possuem poder de Estado em agênciasautônomas, administradas segundo um contrato de gestão; o dirigente escolhido peloMinistro segundo critérios rigorosamente profissionais, mas não necessariamente dedentro do Estado, terá ampla liberdade para administrar os recursos humanos,materiais e financeiros colocados à sua disposição, desde que atinja os objetivosqualitativos e quantitativos (indicadores de desempenho) previamente acordados;43

Pode-se, então, obter duas conclusões, a primeira, já lembrada, é de que osserviços exclusivos deveriam ser contratualizados através de agências, a segunda, é de queesta agencificação dar-se-ia através da qualificação de fundações públicas e autarquias.Assim, excluiu-se da agencificação a Administração direta, embora pudesse seadequar tal proposta também a este campo do Poder Público, como já dito, pois muito similaràs autarquias, visto que estas são, como já conceituadas, extensões do Estado, sua longamanus.Esta agencificação, que se amoldaria na contratualização das atividades do Estadonão voltadas para o mercado, assemelha-se ao programa britânico Next Steps. Com talproposta, os dois entes clássicos da Administração indireta não voltados para a produção epara o mercado ficaram enquadrados na possibilidade de se tornarem agências executivas.Quanto à arquitetura do contrato de gestão nestes casos, leciona Martins:No que se refere à arquitetura do contrato, este seria mais um contrato dedesempenho que de plano, um instrumento de implementação de políticas, de gestãopor resultado e de planejamento e controle (como elo entre o planejamento e a açãogovernamental). Na concepção do então Ministério da Administração Federal eReforma do Estado (MARE), os elementos indissociáveis do contrato de gestãoseriam metas (e respectivos indicadores), meios (recursos necessários ao alcance dasmetas) e mecanismos de controle (meios de verificação e avaliação do alcance dasmetas).44

Tem-se também, embora sem a prática usual do contrato de gestão, o caso dasagências reguladoras. Estas já conceituadas autarquias de regime especial, que desempenhamfunção exclusiva do Estado, também podem, em tese, tomar parte num contrato de gestão.43 BRASIL. Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado. Plano diretor da reforma doaparelho do Estado. Brasília, DF, 1995. p. 46.

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44 MARTINS, 2000, p. 17.66Outro ente da Administração indireta, embora sua criação possa ser objeto dequestionamento, como já colocado, são os consórcios públicos. Assim sendo, tem-se apossibilidade de efetuação de contratos de gestão com estes entes (o que seria figura nova).Em outro rumo, pode-se ter os contratos de gestão firmados com empresaspúblicas e sociedades de economia mista, já aí mais próximos da tradição francesa estudada.Um dos objetivos do PDRAE é implementar contratos de gestão em empresasestatais, havendo a ressalva de que se aplicariam no caso daquelas que não puderem serprivatizadas.45

Neste campo, tem-se à exposição de Di Pietro:Pelo artigo 8º do Decreto n. 137, as empresas estatais poderão submeter ao Comitêde Controle das Empresas Estatais - CCE "propostas de contratos individuais degestão, no âmbito do Programa de Gestão das Empresas Estatais, objetivando oaumento de sua eficiência e competitividade". Em consonância com o § 1º domesmo dispositivo, "os contratos de gestão, estipulando os compromissosreciprocamente assumidos entre a União e a empresa, conterão cláusulasespecificando:I - objetivos;II - metas;III - indicadores de produtividade;IV - prazos para a consecução das metas estabelecidas e para a vigência do contrato;V - critérios de avaliação de desempenho;VI - condições para a revisão, renovação, suspensão e rescisão; eVII - penalidades aos administradores que descumprirem as resoluções do CCE ouas cláusulas contratuais."46

Houve aí o mesmo objetivo que inspirou o sistema francês, isto é, contratualizar ocontrole que a Administração exerce sobre as entidades da Administração Indireta. Assim, oEstado submete as empresas ao cumprimento dos programas ou objetivos governamentaisenquanto as empresas ganham maior autonomia de gestão, sujeitando-se a um controle deresultados.47

Ressalte-se que tal decreto é de legalidade duvidosa, pois não amparado em lei eainda em período anterior à inclusão do contrato de gestão no texto constitucional. Aindaassim, nada impede que, atualmente, com a devida legislação regulamentadora, se estabeleçacontratos de gestão com empresas estatais nos moldes pospostos.4.3.3 Outras Organizações45 BRASIL, 1995, p. 47.46 DI PIETRO, 2008, p. 256.

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47 DI PIETRO, loc. cit.67Como um dos objetivos para os serviços não-exclusivos do Estado, O PDRAEcoloca:Transferir para o setor público não-estatal estes serviços, através de um programa de“publicização”, transformando as atuais fundações públicas em organizações sociais,ou seja, em entidades de direito privado, sem fins lucrativos, que tenham autorizaçãoespecífica do poder legislativo para celebrar contrato de gestão com o poderexecutivo e assim ter direito a dotação orçamentária.48

De acordo com Di Pietro, as organizações sociais constituem novo tipo deentidade, chamada de "pública não estatal". Ela é pública, não porque pertença ao Estado, masporque exerce serviço público, sob controle do Poder Público. A relação que se estabeleceentre o ente político titular do serviço e a entidade pública não estatal (Organização Social)passa a ser em grande parte contratual, porque se dá por meio dos contratos de gestão. E aentidade é dita "não estatal" porque não pertence ao Estado, nem se enquadra entre asentidades da Administração Indireta.49

Ressalte-se, porém, como já definido ao se tratar da Administração Gerencial, noprimeiro capítulo, que o setor público não-estatal é mais amplo que o conceito deorganizações sociais, tais entidades são apenas uma espécie de ente possível, imaginada nobojo do PDRAE como uma forma de transferir atividades que naquele momento eramrealizadas pelo Governo Federal.Neste campo, importante a colocação de Saravia, lembrando que nasOrganizações Sociais exige-se a presença do Poder Público em sua direção, através de seusrepresentantes. O mesmo autor coloca ainda que o Governo Federal vem transferindo paraestas entidades várias suas atividades, antes exercidas por instituições pertencentes àadministração pública federal (lembrando que, nestes casos, cada transferência importa emum contrato de gestão), podendo-se destacar as seguintes Organizações Sociais: Associaçãode Comunicação Educativa Roquette Pinto – ACERP; Associação Brasileira de Tecnologia deLuz Síncroton – ABTLuS; Associação Brasileira para o Uso Sustentável da Biodiversidade da

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Amazônia – BIOAMAZÔNIA; Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá –MAMIRAUÁ; Instituto de Matemática Pura e Aplicada – IMPA.50

De acordo com Di Pietro, segundo tudo indica, os Serviços Sociais Autônomos(SESI, SESC, SENAI e outros) serviram de inspiração para o projeto das organizações sociaise, mais proximamente, o Serviço Social Autônomo "Associação das Pioneiras Sociais", com oqual também foi assinado contrato de gestão.48 BRASIL, loc. cit..49 DI PIETRO, loc. cit.50 SARAVIA, 2005, p. 6-7.68Ainda assim, o estabelecimento de parcerias entre o Poder Público e os ServiçosSociais Autônomos não aparece correntemente empreendido através de contratos de gestão, oque seria possível e até recomendável.Tem-se, ainda, as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP),também criadas no afã reformista advindo do PDRAE. Trata-se de uma qualificação parainstituições que integrem o setor público não-estatal. No diploma legal que as instituí, a Lei9.790/9951, temos os termos de parceria, figuras juridicamente equivalentes aos contratos degestão previstos para as organizações sociais.Lembra Saravia que, nas OSCIP, a presença, direta ou indireta, de representantesdo Poder Público na entidade não é estimulada, a qualificação é, por definição, para entidadescriadas no seio da sociedade civil. São entidades privadas que, devidamente registradas equalificadas, tornam-se capacitadas juridicamente para agir na execução de política públicase, eventualmente, receber fundos governamentais, nos termos da lei.52

Pelo até aqui colocado, verifica-se que o contrato de gestão é fórmula genéricapara a contratualização de resultados por parte do Poder Público, em regra proposto econtrolado pelo que o PDRAE chama de núcleo estratégico do Estado. Neste sentido, ocontrato de gestão é instrumento de controle, mas de controle a posteriori, diferindo-sediametralmente do controle a priori comum na administração burocrática, e, assim, é um dospilares da administração gerencial.

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51 BRASIL. Lei n° 9.790, de 23 de março de 1999. Dispõe sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direitoprivado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, institui e disciplina oTermo de Parceria, e dá outras providências. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L9790.htm>. Acesso em: 27 maio 2009.52 SARAVIA, loc. cit.695 CONCLUSÃOA Administração Pública Brasileira é marcada pelos vícios que caracterizam aformação de nosso Estado, notadamente a confusão entre público e privado, definidaconceitualmente como patrimonialismo. Ao longo dos anos foram realizadas inúmerasmudanças administrativas, partindo da busca de uma burocracia racional e impessoal,passando pela criação de estruturas paralelas mais ágeis, que se cristalizaram no que hoje sechama de Administração Indireta. Posteriormente, a Constituição de 1988 trouxe umretrocesso, pois engessou todas as esferas do Poder Público num mesmo rígido regramento.A Reforma Gerencial, implementada a partir de 1995, embora não tenha alcançado aefetividade desejada, lançou sementes para diversas iniciativas modernizantes.A atual estrutura jurídica de nossa Administração reflete este passado. É marcadapor inúmeros entes descentralizados que compõem a Administração Indireta, estes amarradospelos regramentos constitucionais. Também temos pessoas jurídicas de direito privado queintegram o que o PDRAE chamou de espaço público não-estatal. Com os trabalhos doMARE, houve iniciativas de contratualização de resultados com estes dois setores.Assim sendo, os contratos de gestão integram os esforços de implantação de umaAdministração Pública voltada para resultados. Conceitualmente equivalem a contratosvoltados para o estabelecimento de resultados, em troca de benefícios financeiros ouadministrativos, podendo ser firmados com órgão da Administração Direta, entes daAdministração Indireta ou entidades do espaço público não-estatal.É importante ressaltar que o contrato de gestão não é uma panacéia, ele não tem ocondão de eliminar vícios culturais históricos, pelo contrário, em não havendo um controle

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social significativo sua aplicação pode ser deturpada, fazendo com que a autonomia concedidaabra espaço para episódios patrimonialistas.Neste sentido, vale destacar que não se trata de um fim em si mesmo, mas demero instrumento, que depende de uma correta utilização para melhorar a gestão pública.Como exemplo, tal instrumento, se for baseado apenas em autonomia e incentivos,desacompanhado da punição e responsabilização dos dirigentes ineficientes, pode esvaziar ocontrole e não resultar em qualquer aumento de eficácia.No entanto, um aspecto positivo do contrato de gestão relaciona-se exatamentecom o controle da Administração Pública. Ele torna os dados governamentais mais acessíveise transparentes. Neste sentido, o contrato de gestão pode e deve ser instrumento de70transparência a facilitar o controle exercido, pela sociedade e pelos órgãos competentes, sobrea gestão governamental, o que, por si só, já justifica sua disseminação. É também ummecanismo para a apuração de indicadores, de metas, de resultados desejáveis para aspolíticas públicas, permitindo que estas sejam menos vezes reféns dos interesses políticopessoaisdos administradores.Pela pesquisa efetuada, vê-se o fortalecimento de uma Administração Públicagerencial, mais ágil e focada em resultados, admitindo novos formatos de gestão, onde acontratualização aparece destacadamente, tanto em exemplos brasileiros como estrangeiros.Com o presente estudo, conclui-se que o contrato de gestão pode ser umimportante instrumento para a superação de vícios históricos da Administração PúblicaBrasileira, bem como pode permitir uma melhor organização da prestação de serviçospúblicos, isto em todos os entes federados.É necessário reconhecer, porém, que o presente trabalho, pela sua natureza,analisa o contrato de gestão enquanto figura jurídica. Estudos baseados em fatos concretospoderiam avaliar melhor as tendências da utilização, bem como identificar erros e acertos dacontratualização na prática, o que não diminui nem invalida a conclusão de que esteinstrumento traz inúmeras vantagens, já comentadas.

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Novas pesquisas poderiam melhor delimitar a natureza jurídica e asfuncionalidades do contrato de gestão com relação aos casos em que se verifica sua utilização.Pode-se também estabelecer critérios para padronizar sua utilização, evitando deturpações doinstrumento e fortalecendo seus aspectos positivos.